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Após a emergência das notícias na Web, nem todas as promessas iniciais foram cumpridas. As notícias online, em especial as produzidas por média tradicionais, como os jornais, ainda oscilavam entre dar às audiências curtas notícias de última hora e fornecerem-lhes outras ferramentas e conteúdos de forma a poderem mergulhar num assunto. Novos métodos para produzir e distribuir estórias interessantes online ainda se encontravam muito longe de estarem completamente desenvolvidos (Kolodzy, 2006).

Ainda assim, fenómenos como a convergência deram alguns passos, sobre- tudo a partir do ano 2000, altura em que alguns média iniciaram planos para a convergência das suas redacções. Em 2002, um estudo do International Institute of Infonomics estimava que uma centena de empresas havia adopta- do algum tipo de convergência. Mas esta fase de implantação caracterizou-se por inúmeros problemas de índole prática, um cepticismo generalizado na indústria e um escasso entusiasmo entre os profissionais. Graças à implan- tação dos cibermédia, a convergência conheceria um renovado impulso a partir de 2005 (García-Avilés, 2007).

Em 2006, Rosental Calmon Alves fazia um balanço global pouco positivo da primeira década de ciberjornalismo. Em vez de encararem a Web como um novo meio, com características próprias, dizia o autor, as empresas tradicionais viam-na como uma nova ferramenta para distribuir conteú- dos, produzidos originalmente noutros formatos. Na melhor das hipóteses, via-se a presença na rede como extensão ou complemento do produto tradicional: «Assim, esta primeira década de jornalismo digital foi caracte- rizada por este pecado original: a simples transferência do conteúdo de um meio tradicional para outro novo, com pouca ou nenhuma adaptação. (…)

Mas é justamente isto que tem havido de sobra no jornalismo digital desta primeira década: preguiça das empresas de apostar na Internet como um novo meio capaz de garantir a sobrevivência numa era que se impõe de for- ma avassaladora. No fundo, o jornalismo digital tem sido muito tímido no que se refere à criatividade e à inovação. O medo de canibalizar o meio tra- dicional e a preocupação em obter lucros imediatos limitaram bastante o ímpeto inovador, mesmo quando os problemas iniciais de acesso (velocidade de conexões, por exemplo) foram sendo eliminados. A utilização de narra- tivas que aproveitassem o hipertexto e a multimídia foi deixada de lado, enquanto se optava por ficar com o mais fácil: tomar emprestada uma lin- guagem mais simples, baseada principalmente em texto e na reciclagem de material já usado em outro meio, desperdiçando-se as novas possibilidades narrativas que a Internet oferecia» (Alves, 2006: 94).

A segunda década de jornalismo digital começou, ainda segundo Alves, no meio de uma crise séria dos média tradicionais, agravada pela popula- rização da Web. A ideia de que o ciberjornalismo poderia ser apenas um complemento dos jornais predominou durante a primeira década de exis- tência do novo meio. Porém, desde o início da segunda década, existiam, para o autor, sinais claros de que a difusão de notícias através da Internet tinha consequências negativas na circulação dos diários impressos.

Devido ao que considera ser «proporções revolucionárias que assinalam o início de uma nova era», Alves refere que, além de «midiamorfose», se deve começar a pensar também em «midiacídio», ou seja, a possibilidade de a ruptura tecnológica provocar a morte de meios tradicionais que não tenham capacidade ou não saibam adaptar-se ao novo ambiente mediático em gesta- ção. Este «midiacídio» também incluiria a “morte” de carreiras, como a de jornalistas que não consigam adaptar-se às novas realidades, e de empresas de comunicação «insensíveis» à necessidade de mudar os seus modelos de negócio e as suas linguagens.

Também em jeito de balanço da primeira década de ciberjornalismo, Salaverría, embora reconhecendo progressos, considerava que as empre- sas de comunicação mostraram pouco interesse em experimentar formas

novas de relatar a informação e resistiram a aproveitar as possibilidades comunicativas do ciberespaço, em particular no que ao diálogo directo com os leitores (amplamente utilizada desde há muito nos blogues) diz respei- to: «Para além de desaproveitar as possibilidades comunicativas da Rede, detectou-se também pouco interesse em criar equipas de redacção sólidas e em formar os jornalistas nas novas destrezas profissionais que exige a in- ternet. Hoje em dia, os jornalistas que trabalham nos cibermeios continuam a ser pouco valorizados e as suas condições laborais são com frequência piores que a dos colegas dos média tradicionais. Quando começaram a apa- recer os primeiros cibermeios em meados dos anos 1990, esperava-se uma exploração mais fecunda da linguagem jornalística na Rede e vaticinava-se uma consolidação profissional dos jornalistas muito mais rápida. Apesar disso, dez anos depois, a realidade não alcança as expectativas que se ge- raram então» (Salaverría, 2006: 132). Não obstante, o autor considera que os cibermédia saem reforçados da sua primeira década de vida e hoje já ninguém questiona que a Internet seja uma plataforma prioritária para o jornalismo. No entanto, assinala ainda, há pelo menos quatro incógnitas ou desafios a enfrentar: a exploração de novas linguagens jornalísticas para aproveitar as possibilidades comunicativas da rede mundial; a consolidação de novos standards profissionais para o exercício do ciberjornalismo; a ins- tauração de modelos de negócios sustentáveis na Internet; a formação dos jornalistas no uso das novas tecnologias.

Em 2013, a Associação Mundial de Jornais (WAN-IFRA) concluiu, no seu relatório anual, que, embora a Internet fosse um meio comum para obter in- formação, os sites de jornais não atraíam utilizadores durante muito tempo.

Um dos maiores desafios para os editores continuava a ser como aumentar a interacção das audiências com as plataformas digitais, indicava o relató- rio, que abarcava dados de 70 países, entre 2006 e 2012. Apesar de mais de metade da população digital visitar sites de jornais, estes eram uma parte pequena do total de consumo na Internet, representando apenas 7 por cen- to das visitas, apenas 1,3 por cento do tempo gasto e apenas 0,9 por cento do total de páginas visitadas. O relatório referia ainda a importância dos dispositivos móveis. Telemóveis e tablets estavam rapidamente a tornar-se

o meio escolhido por muitos consumidores de notícias, representando 20 por cento das páginas visualizadas nos mercados onde existiam dados (Pereira, 2013a).

O ciberjornalismo desenvolveu-se em várias direcções e ritmos, assumindo várias formas em diferentes projectos noticiosos online. Em muitos casos, estes projectos ficaram muito aquém daquilo a que Domingo (2006) chama as utopias do ciberjornalismo, formuladas sobretudo nos anos 90. O conceito de utopias é aqui usado para descrever a distância em relação à realidade das definições iniciais de ciberjornalismo e o seu papel como ideais, con- siderados, em vários estudos académicos, como impossíveis de alcançar.

Muita da investigação dos anos 90, nota o autor, concentrou-se na constru- ção das utopias e, mais tarde, na denúncia de que a indústria dos média não estava a aproveitar o potencial da Internet.

Autores de referência, como Pavlik, previam então o desaparecimento das empresas jornalísticas e a sua substituição por software de redacção de no- tícias. A tecnologia iria provocar grandes transformações inexoráveis na sociedade e no jornalismo. Académicos e jornalistas pareciam reunir-se à volta do consenso de que as novas tecnologias digitais iriam tornar possí- vel um jornalismo melhor, após anos de crise profunda nos standards da profissão. O jornalismo tinha de se reinventar ou morria. A Internet era a salvação. Algumas das utopias (e.g. utopias relacionadas com hipertex- to, multimédia, interactividade) foram adoptadas pelas redacções digitais, outras foram adaptadas às necessidades e cultura dos jornalistas e outras foram ignoradas. As utopias do ciberjornalismo, acrescenta Domingo, pro- metiam a salvação da profissão e um reconquistado compromisso com os cidadãos e a sociedade, mas acabaram sobretudo por recriar os velhos hábitos jornalísticos.

Não obstante os balanços menos positivos, o certo é que as notícias digitais desafiaram todas as previsões. Produziram formas inovadoras de pro- dução e distribuição da informação, exigiram novos modelos de negócio, ameaçaram a complacência e responderam à inovação (Scott, 2005).

CONTEXTO NACIONAL DO CIBERJORNALISMO