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Usucapião coletiva urbana e regularização fundiária em favelas paulistanas

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Academic year: 2017

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(1)

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

MESTRADO EM DIREITO POLÍTICO E ECONÔMICO

RICARDO COTRIM CHACCUR

Usucapião Coletiva Urbana e Regularização Fundiária em Favelas

Paulistanas

Orientador: Professor Doutor José Carlos Francisco

(2)

RICARDO COTRIM CHACCUR

Usucapião coletiva urbana e regularização fundiária nas favelas

paulistanas

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre.

Orientador: Professor Doutor José Carlos Francisco

(3)

C431u Chaccur, Ricardo Cotrim

Usucapião coletiva urbana e regularização fundiária em favelas paulistanas. / Ricardo Cotrim Chaccur. – 2014.

133 f. ; 30 cm

Dissertação (mestrado em Direito Político e Econômico) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2014.

Orientador: Prof. Dr. José Carlos Francisco Bibliografia: f. 125-133

1.Usucapião coletiva urbana. 2. Regularização fundiária. 3. Favelas Paulistanas. I. Título

(4)

RICARDO COTRIM CHACCUR

Usucapião coletiva urbana e regularização fundiária em favelas

paulistanas

Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito Político e Econômico.

Aprovada em __/__/____.

BANCA EXAMINADORA:

Prof. Dr. José Carlos Francisco

Universidade Presbiteriana Mackenzie

Profa. Dra. Maria Ligia Coelho Mathias

Universidade Presbiteriana Mackenzie

Prof. Dr. José Levi Mello do Amaral Junior

(5)

Agradeço

Aos meus amados pais, Ricardo e Stella, dedico este trabalho, por todos os seus esforços para que eu me tornasse o homem e o profissional que sou hoje, por todos os seus ensinamentos e pelo apoio incondicional em todos os momentos da minha vida, principalmente nos mais difíceis.

A minha namorada, amiga e companheira, Isabella, pelo apoio nas madrugadas intermináveis em que escrevi a minha dissertação.

Ao meu orientador, Professor Doutor José Carlos Francisco pela paciência, disponibilidade em me auxiliar e apoio no momento que mais precisei.

Aos membros da banca, Professores Doutora Maria Ligia Coelho Mathias e Doutor Levi Mello do Amaral Junior, pela colaboração e conselhos.

(6)

RESUMO

A presente dissertação objetiva analisar o instituto da usucapião coletiva urbana, enquanto instrumento de Política Urbana para promover a regularização fundiária e urbanização das favelas na cidade de São Paulo.

No Brasil, atualmente, a legislação dispõe de alguns mecanismos para a efetivação do direito social de moradia, por meio da aquisição da propriedade imobiliária, com a finalidade de inclusão social dos habitantes que residem em moradias precárias ou subnormais e, consequentemente, alcance do desenvolvimento da cidadania.

O direito à moradia é, um direito social e humano, conforme reconhecido pelo art. 6º, caput, da Constituição Federal de 1988 e pela Agenda Habitat, organizada pela Conferência das Nações Unidas sobre Assentamentos Humanos – Habitat II, realizada em Instambul, em 1996.

E, ainda, a necessidade de superação do problema fundiário nos assentamentos irregulares e favelas localizadas em importantes centros urbanos brasileiros, faz pertinente o presente trabalho, a fim de identificar as causas que originaram o conflito fundiário no País, os problemas decorrentes dessas áreas e que refletem na vida dos habitantes urbanos, bem como uma analise de um dos instrumentos jurídicos de tratamento deste problema.

(7)

ABSTRACT

This dissertation aims to analyze the institution of collective urban adverse possession as an instrument of urban policy to promote land tenure regularization and urbanization of favelas in São Paulo.

In Brazil, currently, the law provides some mechanisms for the realization of the right to social housing, through the acquisition of land for the purpose of social inclusion of people living in poor or substandard dwellings and therefore scope for developing citizenship.

The right to housing is a social and human right, as recognized by Art. 6, caput, of the Federal Constitution of 1988 and the Habitat Agenda, organized by the United Nations Conference on Human Settlements - Habitat II, held in Instambul in 1996.

And yet, the need to overcome the problem of land in slums and squatter settlements located in major urban centers, makes relevant the present work, in order to identify the causes that led to the agrarian conflict in the country, the problems arising from these areas and that reflect on the lives of urban dwellers as well as an analysis of one of the legal instruments to deal with this problem.

(8)

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO

1.INTRODUÇÃO

2. A EVOLUÇÃO DO DIREITO À MORADIA E A PROPRIEDADE NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS.

2.1 A diferenciação entre posse e propriedade na legislação pátria

2.2 A propriedade imóvel e a sua função social

2.3 A aquisição da propriedade imóvel como efetivação do direito à moradia e desenvolvimento da cidadania

2.4 Conclusão do Capítulo

3. A EVOLUÇÃO DO CONFLITO DE TERRAS NO BRASIL E O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO NA CIDADE DE SÃO PAULO

3.1 A ocupação do território nacional pela Coroa Portuguesa e a Lei de Terras

3.2 O processo de urbanização no Brasil e em São Paulo na década de 1930 3.3 O desenvolvimento das áreas de favelas na grande São Paulo

3.4 Os problemas decorrentes da ocupação do solo e do processo de urbanização no Brasil

(9)

4. A USUCAPIÃO COMO INSTRUMENTO DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA E DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA

4.1 Evolução histórica do instituto na legislação brasileira

4.2 Conceito e requisitos exigidos para a usucapião

4.3 As Modalidades existentes do instituto na legislação brasileira

4.4 A Usucapião Coletiva Urbana.

4.5 Conclusão do Capítulo

5. A USUCAPIAO COLETIVA URBANA COMO INSTRUMENTO DE

IMPLEMENTAÇÃO DAS POLITICAS PUBLICAS DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E INCLUSÃO SOCIAL NA CIDADE DE SÃO PAULO

5.1 A responsabilidade pela proteção e efetivação do pleno exercício do direito à moradia dos habitantes das cidades que vivem nas áreas urbanas ocupadas por favelas

5.2 Casos práticos da aplicação da usucapião coletiva urbana nas favelas paulistanas

5.3 Os elementos complicadores para a execução e as possíveis soluções para aumentar a eficácia da Usucapião Coletiva Urbana

5.4 Comparação entre o instituto da usucapião coletiva urbana e outros instrumentos de regularização fundiária existentes na legislação

5.5 Conclusão do Capítulo

CONCLUSÃO

(10)

SUMÁRIO ANALÍTICO

APRESENTAÇÃO

1.INTRODUÇÃO...01

2. A EVOLUÇÃO DO DIREITO À MORADIA E A PROPRIEDADE NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS...04

2.1 A diferenciação entre posse e propriedade na legislação pátria...05

2.2 A propriedade imóvel e a sua função social...09

2.3 A aquisição da propriedade imóvel como efetivação do direito à moradia e desenvolvimento da cidadania...11

2.3.1 O Direito à Moradia...12

2.3.2 A Agenda Habitat...15

2.4 Conclusão do Capítulo...16

3. A EVOLUÇÃO DO CONFLITO DE TERRAS NO BRASIL E O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO NA CIDADE DE SÃO PAULO...18

3.1 A ocupação do território nacional pela Coroa Portuguesa e a Lei de Terras,...19

3.1.1 O início da Colonização no Brasil e o Regime das Sesmarias....19

3.1.2 A Lei de Terras de 1850 e seus efeitos...22

3.2 O processo de urbanização no Brasil e em São Paulo na década de 1930 ...23

(11)

3.2.2 A Urbanização na cidade de São Paulo...25

3.3 O desenvolvimento das áreas de favelas na grande São Paulo...26

3.4 Os problemas decorrentes da ocupação do solo e do processo de urbanização no Brasil...30

3.4.1 O Problema dos Incêndios decorridos das instalações elétricas e moradias precárias...30

3.4.2 O Problema das enchentes e inundações...31

3.4.3 O Problema dos escorregamentos e deslizamentos de encostas...33

3.4.4 O Problema da proliferação de doenças por falta de saneamento básico...35

3.4.5 O Problema da mobilidade urbana...36

3.4.6 Os problemas da violência urbana e da segregação sócio-espacial...38

3.4.7 Quadros Ilustrativos com o mapa da Região Metropolitana da Cidade e da cidade de São Paulo...40

3.5 A legislação brasileira em relação as soluções para a ocupação do solo urbano...45

3.6 Conclusão do Capítulo ...47

4. A USUCAPIÃO COMO INSTRUMENTO DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA E DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA...50

4.1 O instituto da Usucapião na legislação brasileira...51

(12)

4.3 As Modalidades existentes do instituto na legislação

brasileira...57

4.3.1 Usucapião Extraordinária...58

4.3.2 Usucapião Ordinária...58

4.3.3 Usucapião Especial Rural...59

4.3.4 Usucapião Familiar...59

4.3.5 Usucapião Administrativa...60

4.3.6 Usucapião Especial Urbana...61

4.4 A Usucapião Coletiva Urbana...61

4.5 Conclusão do Capítulo...64

5. A USUCAPIAO COLETIVA URBANA COMO INSTRUMENTO DE IMPLEMENTAÇÃO DAS POLITICAS PUBLICAS DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E INCLUSÃO SOCIAL NA CIDADE DE SÃO PAULO...66

5.1 A responsabilidade pela proteção e efetivação do pleno exercício do direito à moradia dos habitantes das cidades que vivem nas áreas urbanas ocupadas por favelas...66

5.1.1 Urbanização, Urbanificação e Urbanismo...67

5.1.2 Políticas Urbanas...69

5.1.3 O Papel do Poder Público na regularização fundiária e na efetivação do direito à moradia...75

5.2 Casos práticos da aplicação da usucapião coletiva urbana nas favelas paulistanas...82

5.2.1 Do Processo da Usucapião Coletiva Urbana...83

(13)

5.2.1.2 Da Legitimidade para a propositura da Ação...83

5.2.1.3 Dos Efeitos da Ação...84

5.2.1.4 Do Direito à Assistência Judiciária Gratuita...84

5.2.1.5 Organograma do Processo...85

5.2.3 As Ações de Usucapião Coletivas Urbanas ajuizadas por Comunidades na cidade de São Paulo – Casos Práticos...86

5.2.3.1 O Caso da Favela do Moinho...86

5.2.3.2 O Caso da Favela Americanópolis...92

5.2.3.3 O Caso da Favela Jardim Paraná...94

5.2.3.4 O Caso da Favela Amadeu...97

5.2.3.5 O Caso do Assentamento Irregular do Parque Florestal...104

5.2.3.6 O Caso do Assentamento Irregular do Jardim dos Álamos...106

5.3 Os elementos complicadores para a execução e as possíveis soluções para aumentar a eficácia da Usucapião Coletiva Urbana...107

5.3.1 Principais obstáculos para o sucesso da usucapião coletiva como instrumento de regularização fundiário...107

5.3.2 Possíveis soluções para tornar o instituto mais eficiente...108

5.4 Comparação entre o instituto da usucapião coletiva urbana e outros instrumentos de regularização fundiária existentes na legislação...110

5.4.1 Bens Imóveis que não podem ser usucapidos...111

5.4.2 A Concessão de uso ou concessão de uso especial para fins de moradia...112

(14)

5.5 Conclusão do Capítulo...119

CONCLUSÃO...121

(15)

APRESENTAÇÃO

O presente trabalho foi elaborado a partir da linha de pesquisa da “Cidadania modelando o Estado”, uma vez que pretende expor o instituto da usucapião coletiva urbana como instrumento jurídico de regularização fundiária nas favelas paulistanas na perspectiva do direito à moradia.

Dessa forma, inicia-se do entendimento de que a cidadania depende de um conjunto de elementos, dentre eles a condição digna de vida que passa pelo acesso a moradia digna que promova segurança, paz e dignidade ao indivíduo.

Para o alcance de tal objetivo, o objeto deste estudo visa expor, brevemente, sobre as causas que resultaram no problema da ocupação do solo nos centros urbanos brasileiros, bem como os problemas decorrentes de tal processo e, ainda, analisar o instituto da usucapião coletiva urbana desde o seu surgimento, há treze anos, quando entrou em vigor o Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257 de 2001.

Realizado o corte temático, há a vinculação com a linha de pesquisa “A Cidadania modelando o Estado”, uma vez que é realizada uma reflexão e análise mais de um dos principais instrumentos de regularização fundiária que, por consequência, tem o objetivo de atender aos princípios constitucionais e efetivar o direito à moradia como forma de inclusão social da população de baixa renda que habita áreas ocupadas de forma irregular e, por conseguinte, é uma das manifestações do direito de cidadania.

(16)

1. INTRODUÇÃO

O planeta Terra atingiu, recentemente, o número de 7 Bilhões de habitantes no mundo1 e, com esta marca inédita, a questão de onde abrigaremos todos estes novos moradores do planeta Terra, esta na agenda de todos os países do Globo Terrestre.

Diante deste aumento na população mundial, da falta de espaços nas principais cidades do mundo e no temor da falta de recursos para todos os residentes deste planeta, num futuro próximo ou, ainda, mesmo que distante, é notório que o mundo vive uma crise habitacional causado pelas aglomerações desorganizadas em grandes centros urbanos, principalmente em países em desenvolvimento, como no caso do Brasil.

Nesta lista de déficit habitacional, encontra-se o Brasil figurando como um dos países que possui um dos maiores problemas de ocupação do solo2. A falta de moradia ou de pessoas morando em habitações precárias e sem infraestrutura alguma é um dos problemas fundamentais que impedem o progresso do País, tendo em vista que refletem negativamente na economia e na sociedade dos grandes centros urbanos brasileiros.

Dessa forma, o presente trabalho pretende discorrer, brevemente, sobre a origem da ocupação do solo por assentamentos irregulares e favelas nos centros urbanos do País, bem como os problemas decorrentes destas áreas que refletem por toda a cidade e que resultam num caos urbano.

1

Dados extraídos do artigo: “Lotado, mundo bate a marca de 7 bilhões de habitantes” publicado em

31 de outubro de 2011 pela Reuters no site:

http://br.reuters.com/article/topNews/idBRSPE79U09G20111031

2 Em recente trabalho divulgado pelo IPEA, aponta que, baseado nos dados que

(17)

Atualmente, a cidade de São Paulo, considerada centro financeiro da América Latina, contabiliza mais de 1000 favelas espalhadas pelas cinco zonas urbanas, mas com uma densidade maior nas regiões mais afastadas do centro da cidade, isto é, nas regiões mais periféricas.

Entretanto, os problemas decorrentes das áreas de favelas refletem e irradiam por toda a cidade, causando inúmeros problemas para seus habitantes e prejudicando a qualidade de vida dos que residem na capital paulista, além, de ser, estas áreas, polos de segregação socioespacial, o que impossibilita o desenvolvimento da cidadania na cidade de São Paulo.

Dessa maneira, o presente trabalho é pertinente, tendo em vista que o tema ocupa, atualmente, a agenda política e de organizações paraestatais que visam o tratamento da falta de moradia ou de moradias subnormais por meio da regularização fundiária e urbanização de tais áreas.

Para perseguir este objetivo, a dissertação inicia o seu trabalho explicando de forma breve sobre a evolução histórica da ocupação das terras no Brasil, desde o período do seu descobrimento, passando pelos períodos de colonização, instalação do império e início da República, fazendo uma síntese sobre as normas para a aquisição da propriedade imóvel para, num momento seguinte, expor o processo de urbanização brasileiro, explanando, assim, os motivos prováveis que culminaram na ocupação irregular de áreas periféricas e de risco dos grandes centros urbanos brasileiros, mais especificamente, o ocorrido na cidade de São Paulo.

Pretende a dissertação, também, apontar, em síntese, alguns dos reflexos causados pela ocupação irregular periférica na cidade de São Paulo, que resultam numa exclusão social de parte da população e, consequentemente, no regresso ao desenvolvimento da cidadania no País.

(18)

O trabalho, ainda, possui como objetivo, principal, analisar o instituto da usucapião coletiva urbana, considerada, por muitos, como um instrumento de política urbana, capaz de promover a regularização fundiária de parte das áreas ocupadas por favelas, tendo em vista que só é possível no tratamento das favelas que ocupam áreas privadas.

Para isso, faz uma breve exposição histórica sobre o instituto, os seus requisitos e as modalidades previstas em nossa legislação para, no momento seguinte, iniciar a analise da modalidade da usucapião coletiva urbana, com a exposição de suas peculiaridades em relação às outras modalidades, os seus requisitos, os procedimentos e efeitos da ação e, ainda, a exposição de seis casos práticos da tentativa de utilização do instituto em favelas e assentamento irregulares paulistanos, em trâmite perante o Poder Judiciário de São Paulo.

(19)

2. O DIREITO À MORADIA, À PROPRIEDADE E À POSSE NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

No presente capítulo, pretende-se relacionar a efetividade do direito à moradia e o alcance da cidadania à aquisição da propriedade, no caso, da propriedade imóvel.

Para isso, se faz pertinente, iniciar o trabalho, diferenciando, de forma breve, os conceitos de posse e propriedade, uma vez que ambos os direitos, apesar de estarem relacionados e possuírem efeitos e conflitos entre eles, observa-se que no caso particular da usucapião, objeto principal de estudo nesta dissertação, o direito à posse se sobrepõe ao direito de propriedade, entretanto, isso ocorre, justamente, porque em nossa legislação, o direito individual do titular da propriedade imobiliária possui como limitador constitucional e legal, o cumprimento da função social da propriedade, tendo em vista que o direito absoluto do proprietário na legislação anterior a Constituição Federal de 1988, sofreu uma alteração no seu paradigma, ao ascender o direito da coletividade à uma importância maior do que o direito individualista da propriedade liberal, prevista, anteriormente, no Código Civil de 1916.

Essa limitação imposta ao direito do proprietário visa proteger os interesses da coletividade e extinguir com as propriedades especulativas e não produtivas, importando, caso não haja o cumprimento da função social do imóvel, na perda do mesmo para um possuidor que tenha o animus domini, isto é, a vontade de ser proprietário do bem e de zelar por ele, seja tornando produtivo ou para fins de moradia, requisitos que resultam na diminuição dos prazos para a aquisição prescritiva, conforme previstos no Código Civil de 2002.

Além dessa distinção necessária e importante entre os conceitos de posse e propriedade, para o desenvolvimento do trabalho, é realizada uma breve exposição das características e da previsão legal da função social da propriedade.

(20)

propriedade imóvel como forma de promover a inclusão social da população de baixa renda e, consequentemente, desenvolver a cidadania no país.

2.1 A diferenciação entre posse e propriedade na legislação pátria

Atualmente, apesar de tênue, a diferenciação entre posse e propriedade é notada no modo em que cada uma é tratada em nossa legislação, uma vez que entre os dois institutos pesem diferenças importantes em relação aos seus efeitos.

Esses dois institutos já tiveram uma relação mais estreita no início da história do Brasil, quando na fase colonial, especialmente no período em que houve a vigência do regime das sesmarias, a propriedade só era possível de ser adquirida se houvesse a posse produtiva do imóvel.

O distanciamento entre a posse e a propriedade se deu com o surgimento da Lei de Terras que transformou a propriedade imobiliária em mercadoria, afastando a necessidade da posse da terra ser produtiva para a aquisição da propriedade como ocorria no regime das sesmarias.

Cláudia Fonseca Tutikian, esclarece que:

A legislação modificou drasticamente a forma de aquisição de imóveis – especialmente em função de que a terra passou a ser considerada mercadoria quando adquiriu valor venal -, passando da exclusiva doação de terras públicas para a compra e venda de terras públicas e privadas, tendo inclusive, sido vetada a aquisição de terras pela posse. Destarte, com esta legislação houve a ruptura jurídica e definitiva, e que vigora até os dias de hoje, da posse e propriedade, estas foram categoricamente “descasadas”3.

Assim, a Lei de Terras causou a separação entre os dois institutos e permaneceu até a vigência do Código Civil de 1916, uma vez que não estabeleceu a necessidade do proprietário de um imóvel exercer a posse produtiva ou para fins de

(21)

moradia, resultando numa propriedade cuja característica era de absoluta, que resguardava os direitos individuais do proprietário em detrimento da coletividade, uma vez que pouco importava qual seria a finalidade com que teria o título de proprietário do bem, sem se preocupar em ocupar e exercer a posse daquela propriedade imóvel, podendo, inclusive, ser utilizada de forma especulativa em prol do mercado imobiliário.

Tutikian explica que:

A Lei de terras vigeu de 1850 a 1916, quando o Código Civil de 1916 foi promulgado. Apesar das diversas mudanças na legislação, na parte da posso e da propriedade, a normatização anterior foi mantida; portanto, no Código Civil de 1916, a questão da posse e da propriedade permanecia nos mesmos moldes: “descasada”. Em razão disto, a legislação do Código Civil de 1916 chancelou a não necessidade do titular da propriedade imobiliária exercer a posse produtiva ou de moradia.4

Assim, a noção individualista e absoluta da propriedade imobiliária foi mantida pelo Código Civil de 1916 e permanece influenciando até hoje o modelo de aquisição da propriedade imobiliária em nosso País, bem como os efeitos gerados pela posse e pela propriedade de um bem imóvel.

Atualmente, observa-se que a posse e a propriedade são protegidas pela nossa legislação. Entretanto, cada uma delas possui efeitos distintos e que influenciam o outro de forma a se chocarem quando temos em conflito o direito de um proprietário e o direito de um possuidor sobre o mesmo bem imóvel.

Neste sentido, Azevedo Júnior explica que:

Existe um choque entre o direito de propriedade e a posse. Esse choque acontece porque, ao mesmo tempo em que a lei protege o direito do proprietário, ela protege, em certas circunstâncias, o direito do possuidor. Nos dias de hoje, o choque fica mais evidente porque a proteção do direito do proprietário já não é tão robusta como foi antigamente. E a proteção do direito do possuidor é cada vez mais forte. Uma diminui e a outra aumentou. Tanto que cada vez mais, a lei

4TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica,

(22)

facilita a conversão da posse em propriedade por meio do usucapião.5

O direito de propriedade sofreu limitações desde a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988 e, posteriormente, do Código Civil de 2002, enquanto a posse ganhou maior importância em nossa legislação ao tratar da aquisição de bens imóveis e seus efeitos.

Isto ocorreu porque a propriedade liberal, que privilegiava o direito individual do proprietário em detrimento da coletividade, no Código Civil de 1916, foi substituída pela ideia de coletividade e função social pelo legislador da Constituição e do Código Civil de 2002.

Entretanto, cumpre ressaltar que a posse e a propriedade continuam separadas, apesar do poder constituinte e do legislador do Código Civil de 2002 terem estabelecido a função social da propriedade como limite ao uso desta, uma vez que a função social estabelecida por ambos, não deixou claro os requisitos ou critérios para que uma propriedade imóvel atinja a sua função social, deixando a cargo da doutrina interpretar.

Tutikian, dissertando sobre o tema, esclarece que:

Apesar de o princípio da função social ter sido recriado na Constituição Federal e no Código Civil vigente com a pretensão de revincular a posse e a propriedade, não conseguiram atingir seu escopo. A tentativa da função social de “recasar” a posse e a propriedade foi infrutífera por duas razões principais: a primeira é que o termo vago da “função social” não definiu essa circunstancia, deixando a conceituação ao intérprete; a segunda é que o restante da legislação, a respeito da posse e da propriedade, permaneceu exatamente nos mesmos moldes da legislação anterior, o que propiciou a manutenção da não ligação dos institutos. Ainda em relação à propriedade imobiliária rural, a Constituição Federal, há alguma construção, especialmente no sentido de exigir que o titular da terra a utilize produtivamente, mas em relação à propriedade imobiliária urbana não há previsão legal. Assim, a posse e a propriedade continuam “descasadas” e somente haverá uma mudança na estrutura quando a função social for devidamente aprimorada ás necessidades – é aqui justamente que se precisa realizar a

5 AZEVEDO JR, José Osório de. Direitos imobiliários da população de baixa renda. São Paulo:

(23)

autopoiese do subsistema para adaptar e evoluir a expectativa cognitiva desapontada (função social).6

Apesar do exposto, a alteração de paradigma é notada quando se observa os prazos para a usucapião, pois todos os prazos das modalidades previstas no Código Civil de 1916 sofreram uma diminuição substancial no Código Civil de 2002, demonstrando a preocupação do legislador pátrio em proteger a posse dos indivíduos que utilizam o bem imóvel para moradia, cumprindo, assim, com a função social da propriedade, em detrimento do direito do proprietário que por algum motivo não cuidou de sua propriedade.

Cumpre ressalvar que mesmo na modalidade da usucapião em que a lei não estabelece a necessidade do possuidor morar no imóvel ocupado, como no caso do caput do artigo 1228 do Código Civil de 20027, que trata da usucapião extraordinária, houve diminuição do prazo de 20 para 15 anos, mesmo se o possuidor estiver de má-fé.

Esta proteção dada ao possuidor, em detrimento do direito do proprietário do bem imóvel, tem como fundamento o objetivo de alcançar a função social da propriedade toda vez que o proprietário não o fizer, abrindo, assim, a possibilidade do possuidor que cuida do bem e zela por ele como se fosse seu, de adquirir o bem em questão.

Sobre os argumentos e fundamentos desta proteção da posse, Azevedo Junior sustenta que:

6TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica,

Econômica, Social e Jurídica. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p. 176/177.

7José Pedro Lamana Paiva explica que:A Usucapião Extraordinária é aquisição da propriedade pelo

prolongado exercício da posse. Isto é, independe de justo título e da boa-fé, não necessitando que o requerente faça prova. O único requisito que o autor da ação deve comprovar é a posse; a posse qualificada: com ânimo de dono, mansa, pacífica, ininterrupta e contínua, nos termos do artigo 1.238 do Código Civil. Esse dispositivo legal também traz dois prazos distintos de usucapião. Não em razão da proximidade espacial do proprietário e do possuidor, mas em razão da finalidade da posse. Dessa forma, em regra, o prazo da usucapião extraordinária é de quinze anos. Contudo, esse prazo é reduzido para dez anos, se a posse concretizar o direito à moradia, ou se no imóvel o possuidor realizou obras ou serviços de caráter produtivo (posse-trabalho), consoante o parágrafo único do artigo 1.238 do Código Civil.” PAIVA, João Pedro Lamana. Usucapião extrajudicial e sua viabilidade

no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em:

(24)

A lei defende a posse em nome da paz social. Na verdade, o passar do tempo traz alterações na vida social e acaba alterando o próprio direito. O que era justo e compreensível em uma época já não é mais em outra. Por causa dessa nova situação, a lei entendeu de dar direitos ao mero possuidor de uma coisa mesmo sabendo que, antes, ele não tinha direito algum sobre aquela coisa.

Observa-se, assim, que no início da ocupação do solo brasileiro pelos portugueses, a noção de função social estava presente na Legislação que regulava esta ocupação na época, uma vez que tornava obrigatória a efetiva ocupação e cultivo da área doada pela Coroa Portuguesa para que o Capitão não perdesse o direito sobre a ocupação da terra doada.

Entretanto, esta noção de função social da propriedade, desaparece com a Lei de Terras, quando esta estabelece que para a aquisição da terra não houvesse mais a necessidade de cultivar ou ocupar a mesma, instante em que tornou a propriedade em mercadoria e, portanto, adquirida pela compra mesmo sem intuito de ocupar ou cultivar o solo, protegendo o direito do proprietário numa época que a propriedade passou a ter uma característica absoluta.

Atualmente, a função social da propriedade esta presente em nosso ordenamento jurídico, prevista tanto em nossa Constituição Federal como no Código Civil de 2002, alterando a noção da propriedade imóvel e os efeitos em relação a posse e propriedade.

2.2 A propriedade imóvel e a sua função social

A Constituição Federal de 1988 estabelece, no artigo 5º, inciso XXII, o direito de propriedade como um direito fundamental e, ainda, dispõe, no inciso XXIII, que a propriedade deverá atender a sua função social.8

8Constituição Federal de 1988: Título II: DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS: Capítulo

(25)

Assim, nota-se que a propriedade imóvel privada, individualista e absoluta do Código Civil de 1916, oriunda de um conceito liberal, na qual os direitos do proprietário não sofriam limitações, sofreu alterações importantes em nossa legislação mais recente, uma vez que passou a ser limitado a sua utilização ao cumprimento de sua função social.

Observa-se que o princípio da função social introduzido pela Constituição Federal de 1988 e pelo Código Civil de 20029 teve como principal objetivo relativizar o caráter absoluto e individualista da propriedade imobiliária liberal, com o intuito de acabar com a propriedade privada especulativa e, ainda, fazer com que a propriedade cumpra um papel econômico e social em prol do bem-estar coletivo.

Sobre o assunto, José Afonso da Silva explica que:

A função social manifesta-se na própria configuração estrutural do direito de propriedade, pondo-se concretamente como elemento qualificante na predeterminação dos modos de aquisição, gozo e utilização dos bens. Por isso é que se conclui que o direito de propriedade não pode mais ser tido como um direito individual. A inserção do princípio da função social, sem impedir a existência da instituição, modifica sua natureza.10

Entretanto, nota-se, que tal princípio se mostra bastante vago, uma vez que o legislador não aponta critérios que definam quando uma propriedade imobiliária cumpre ou não a sua função social, conforme visto no item anterior, deixando a interpretação aberta ao intérprete.

Para que a função social seja atingida, a propriedade imobiliária deve ser explorada, tornando-se produtiva ou servindo de moradia para um indivíduo ou uma família e, ainda, respeitando o meio-ambiente, evitando a degradação ambiental decorrente da utilização do bem imóvel, conforme entendimento do Código Civil de 2002.

seguintes: (...) XXII – é garantido o direito de propriedade; XXIII – a propriedade atenderá a sua função social.”

9

Parágrafo 1º do artigo 1228 do Código Civil: “o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.” (grifo nosso).

10 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros Editores,

(26)

Mais importante, ainda, é que a propriedade imóvel privilegie o interesse social da coletividade, a fim de promover o bem-estar social por meio da regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por uma população vulnerável economicamente e socialmente11.

Neste sentido, Dallari e Ferraz explicam que:

A ideia de função social da propriedade envolve a prevalência do interesse social, do bem coletivo e do bem-estar da coletividade, bem como da persecução e consecução da regularização fundiária e a urbanização das áreas ocupadas por populações de baixa renda.12

Assim, a importância da função social da propriedade é que as políticas públicas devem orbitar em torno dela, a fim de promover a inclusão social dos moradores excluídos da cidade legal por meio da regularização fundiária e, posterior, urbanização das áreas de favelas, possibilitando, assim, o desenvolvimento da cidadania da população vulnerável economicamente e socialmente.

2.3 A aquisição da propriedade imóvel como efetivação do direito à moradia e desenvolvimento da cidadania

Desde o início de nossa história, a aquisição de uma propriedade imóvel era sinal de status ou ascensão social, uma vez que a propriedade, a partir da Lei de Terras, de 1850, tornou a propriedade em mercadoria, adquirida apenas por meio da compra do bem imóvel.

Dessa maneira, a distribuição de riqueza, em nosso país, está intimamente relacionada com o poder aquisitivo de cada indivíduo, se tornando num item de

11A vulnerabilidade econômica e social se dá pelo fato da população que habita as áreas de favelas

estarem excluídos da cidade legal, notada pela segregação sócio-espacial e, ainda, por não possuírem condições financeiras ou recursos que permitam a aquisição de uma moradia digna.

12 DALLARI, Adilson Abre, FERRAZ, Sérgio. (coord.). Estatuto da Cidade. Comentários à Lei Federal

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desejo de qualquer cidadão brasileiro e, ainda, mais importante, necessário para que esteja inserido numa condição digna de vida.

Por esta razão, aqueles que moram em moradias precárias, localizadas em assentamentos irregulares ou ilegais, em áreas de risco, sem infraestrutura básica de saneamento, eletricidade e outros serviços públicos básicos, encontram-se às margens da cidade considerada legal e, portanto, estão inseridos numa massa de excluídos socialmente.

Diante dessa explanação, é necessário ressaltar que a moradia é um parâmetro de mensuração da qualidade e padrão de vida de um indivíduo, considerado como necessidade básica para que seja configurada que determinado indivíduo possua uma vida digna, conforme entendimento da Agenda Habitat, na qual trataremos nos subitens a seguir.

2.3.1 O Direito à Moradia

O direito à moradia é um dos direitos sociais previstos no artigo 6º da Constituição Federal de 1988, inserido de forma expressa por meio da Emenda Constitucional nº 26/2000 e, teve, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, a sua fonte originária no direito internacional dos direitos humanos, sendo reconhecida como uma necessidade básica da pessoa humana.

Nelson Saule, explica que:

Na Declaração Universal dos Direitos Humanos, o direito à moradia tem a sua origem no artigo XXV, que dispõe sobre o direito a um padrão de vida adequado da seguinte forma: 1. Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem estar, alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.13

13 SAULE, Nelson Junior. A Proteção Jurídica da Moradia nos Assentamentos Irregulares. Porto

(28)

Saule, ainda, sobre a origem do direito à moradia em nosso ordenamento jurídico, explica que a compreensão deste direito e as suas formas de proteção internacional são decorrentes de um conjunto de normas previstas por diversos instrumentos internacionais de direitos humanos, na qual se podem citar o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, ambos ratificados pelo Brasil14 por meio dos Decretos 591 de 6 de julho de 1992 e 592 de 6 de julho de 1992, respectivamente.

Nestes Pactos, das quais foram ratificados pelo Brasil, o artigo 11 do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais estabelece que: “Os Estados-partes no presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa a um nível de vida adequado para si próprio e sua família, inclusive à alimentação, vestimenta e moradia adequadas, assim como a uma melhoria contínua de suas condições de vida.”15

Saule, afirma que: o artigo 11 do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, contém o principal fundamento do reconhecimento do direito à moradia como um direito humano, do qual gera, para os Estados-partes signatários, a obrigação legal de promover e proteger esse direito, sendo este o principal fundamento para o Estado brasileiro ter essa obrigação e responsabilidade.

Nas palavras de Saule Junior:

O tratamento constitucional sobre o direito à moradia deve ser extraído dos princípios constitucionais das normas estabelecidas sobre os direitos fundamentais, sobre a repartição de competências entre as entidades da Federação Brasileira e sobre a política urbana, no que diz respeito à proteção deste direito nas cidades brasileiras.16

Contudo, sendo ou não responsabilidade do Estado brasileiro, depreende-se que o direito à moradia, também, é meio para garantir outros direitos sociais e

14Existem outras Convenções e Pactos Internacionais ratificados pelo Brasil e que tratam de direitos

sociais, dos quais o direito à moradia encontra-se protegido, entretanto, o presente trabalho optou por não abordá-los, uma vez que se pretende, apenas, demonstrar a origem do direito à moradia no nosso ordenamento jurídico.

15 Artigo 11 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966.

16 SAULE, Nelson Junior. A Proteção Jurídica da Moradia nos Assentamentos Irregulares. Porto

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fundamentais ao cidadão, dispostos pela Constituição Pátria, como saúde, segurança, liberdade de ir e vir, de fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, entre outros não citados aqui.

É notório que as moradias precárias que se localizam numa área de favela, local onde, geralmente, possui o tráfico de drogas controlando a área, além da falta de saneamento básico e do acesso de um transporte público descente pela falta de infraestrutura básica, resultam no cerceamento de outros direitos sociais e fundamentais, como os citados acima.

Isto se deve ao fato de que nas favelas, controladas pelo tráfico, existem o toque de recolher, o que cerceia o direito de ir e vir do cidadão; a falta de infraestrutura básica impede o acesso de serviços públicos básicos como o recolhimento de resíduos sólidos e de agentes de saúde; as ruelas estreitas impedem o acesso de um ônibus, atrapalhando, inclusive o meio de ida e vinda do trabalho do cidadão.

Promover a regularização fundiárias e a urbanização dessa áreas é uma forma de incluir os cidadão residentes dessas moradias precárias na cidade legal, na qual o cidadão tenha a oportunidade de se desenvolver profissionalmente, economicamente e socialmente.

Nesse sentido, Tutikian esclarece que:

É importante ressaltar que a legalização da propriedade imobiliária, antes de ser interesse da cidade e condição para o progresso, é uma forma de alavancar a cidadania, de trazer as pessoas que vivem à margem da sociedade para “dentro do sistema”.17

Dessa forma, além de fundamental, o direito à moradia é imprescindível para a consecução de outros direitos sociais e fundamentais garantidos pela Constituição Federal de 1988.

17TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica,

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3.3.2 A Agenda Habitat

Na Conferência das Nações Unidas sobre Assentamentos Humanos – Habitat II, realizada em Instambul, em 1996, na qual originou a Agenda Habitat, último documento internacional relevante sobre o direito à moradia e, que reconheceu este direito como um direito humano, teve como principais temas globais a Adequada Habitação para Todos e o Desenvolvimento de Assentamentos Humanos Sustentáveis de um Mundo em Urbanização. 18

Neste sentido, Saule Junior esclarece que:

Resulta desta norma que a moradia, como uma necessidade de toda pessoa humana, é um parâmetro para identificar quando as pessoas vivem com dignidade e têm um padrão de vida adequado. O direito de toda pessoa humana a um padrão de vida adequado somente será plenamente satisfeito com a satisfação do direito a uma moradia adequada.(...) A finalidade do direito à moradia, que pode ser extraído das normas internacionais de direitos humanos, é fruto da combinação dos valores da dignidade da pessoa humana e da vida que resulta na finalidade de toda pessoa ter um padrão de vida digno.O alcance da finalidade do direito à moradia depende do resultado da equação moradia e padrão de vida. Se o resultado for pessoas com moradia adequada igual a pessoas com padrão de vida adequado, a finalidade do direito à moradia estará sendo atingida. (...) O direito à moradia pode ser considerado plenamente satisfeito a partir da existência de três elementos que são: viver com segurança a partir da existência que são: viver com segurança, viver com paz, e viver com

18A definição da Agenda Habitat sobre a adequada habitação, que deve ser sadia, segura, protegida,

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dignidade. O núcleo básico do direito à moradia é constituído, portanto, pela segurança, pela paz e pela dignidade.19

A Agenda Habitat, ainda, estabeleceu, um plano global de ação como forma de orientar os esforços nacionais e internacionais para melhoria nas condições dos assentamentos humanos, fundamentados em princípios, metas e compromissos, também estabelecidos pelo documento.

No preâmbulo do documento, reconhece que o acesso à habitação sadia e segura e aos serviços básicos são essenciais para o bom estado físico, psicológico, social e o bem-estar econômico dos seres humanos, além de ser fundamental que hajam ações urgentes voltadas para a parcela de 1 bilhão de pessoas que não possuem condições dignas de vida.

2.4 Conclusão do Capítulo

Em síntese, nota-se que tanto o direito à posse como o direito à propriedade são protegidos em nosso ordenamento jurídico. Como visto, houve uma alteração no paradigma do direito à propriedade diante da função social da mesma como limitador do direito do proprietário de bem imóvel, cuja concepção, individualista e absoluta adotada pelo Código Civil de 1916 (que era influenciado pela propriedade liberal), foi substituída por um entendimento de prevalência do bem-estar social e dos interesses da coletividade sobre os direitos individuais do proprietário imobiliário.

Esta alteração de paradigma do direito de propriedade encontra-se fundada nos direitos fundamentais e sociais da Constituição Federal de 1988 que, por conseguinte, influenciou o dispositivo que trata da propriedade imóvel no Código Civil de 2002, bem como nas alterações dos prazos para usucapir um bem imóvel.

O direito social à moradia, trazida para a nossa Constituição Federal por meio da Emenda Constitucional nº 26 de 2000, teve a sua origem na Declaração Universal dos Direitos Humanos, na qual reconheceu este direito como necessidade básica para um ser humano.

19

SAULE, Nelson Junior. A Proteção Jurídica da Moradia nos Assentamentos Irregulares. Porto

(32)

Além da Declaração Universal dos Direitos Humanos, vários documentos originados de Pactos e Convenções Internacionais trataram do direito à moradia, sendo, posteriormente, ratificados pelo Brasil como, por exemplo, os Pactos Internacionais de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e dos Direitos Civis e Políticos.

Como último documento relevante que trata do assunto, tem-se a Agenda Habitat, que reconhece o direito à moradia como um direito humano e fundamental para o bom desenvolvimento psicológico, físico e social de um indivíduo, além de parâmetro para identificação da existência ou não do mínimo existencial para a dignidade humana.

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3. A EVOLUÇÃO DO CONFLITO DE TERRAS NO BRASIL E O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO NA CIDADE DE SÃO PAULO

Nesse capítulo, pretende-se demonstrar a origem do conflito de terras no Brasil, as causas para a ocupação do solo nos centros urbanos que resultou no surgimento das áreas de favelas, bem como os problemas decorrentes dessa favelização, na qual promove uma segregação sócio-espacial de exclusão de parte significativa da população brasileira, que habita as cidades, impedindo o desenvolvimento da cidadania2021 no País; bem como uma análise, breve, da relação dessas áreas com os problemas que serão elencados.

O conflito de terras no Brasil tem sua origem no modelo de ocupação implantado pela Coroa Portuguesa, desde o início da colonização do solo brasileiro, por meio da distribuição das terras, após divisão das Capitanias Hereditárias.

Além desse modelo de distribuição e ocupação do solo pela Coroa Portuguesa, observa-se que alguns eventos, no decorrer da história do país, colaboraram para o caos urbano e o conflito por terras que temos nas principais metrópoles brasileiras.

Assim, pode-se citar que: a Lei de Terras, como primeiro diploma legal a tentar promover a regularização fundiária, diante da falta de fiscalização da Coroa Portuguesa, que não conseguia controlar se as terras doadas estavam sendo

20SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São

Paulo: Editora Cortez, 1997.p.243, citando Marshall explica que: “A Cidadania não é monolítica; é constituída por diferentes tipos de direitos e instituições; é produto de histórias sociais diferenciadas protagonizadas por grupos sociais diferentes.”

21 Boaventura ainda tratando sobre cidadania expõe que: “Os direitos cívicos correspondem ao

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cultivadas e ocupadas, conforme o regime das sesmarias; a Lei Áurea22 que concedeu a liberdade aos escravos brasileiros, mas que libertos não tinham oportunidade de sobreviver de forma digna e tão pouca possibilidade de uma moradia digna, tendo que ocupar cortiços e espaços que não possuíam valor para o mercado imobiliário da época; o modo como ocorreu o processo de urbanização nas principais cidades do país a partir da década de 30, quando o país ingressava no período industrial e entrava em vigor uma legislação trabalhista que não tutelava o direito dos trabalhadores rurais, atraindo esse contingente de mão de obra para os centros urbanos de maneira intensa e sem um planejamento do poder público para suportar a demanda, bem como os altos preços das propriedades imobiliárias ditadas pelo mercado imobiliário da época, que culminaram na ocupação dessa massa em espaços periféricos da cidade ou em loteamentos clandestinos, das quais não interessavam ao mercado imobiliário, bem como outros fatores que será tratado nesse capítulo.

3.1 A ocupação do território nacional pela Coroa Portuguesa e a Lei de Terras

3.1.1 O início da Colonização no Brasil e o Regime das Sesmarias

A ocupação do solo brasileiro, com o objetivo de colonização teve início em 153023, portanto, trinta anos após o descobrimento do Brasil pela expedição chefiada por Pedro Ávares Cabral. Neste inicio de colonização e ocupação do solo brasileiro, os poderes para realizar a ocupação das terras brasileiras se concentrava na figura do governante e representante direto do rei, denominado, também, de Capitão-mor.

22 Cumpre esclarecer que o entendimento não orbita no sentido de que a liberdade dos escravos só

poderia estar condicionada ao direito de propriedade privada para os mesmos, mas a observação se faz necessária a fim de justificar e relacionar os efeitos que a Lei Áurea teve na distribuição e ocupação do solo brasileiro.

23TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica,

(35)

Entretanto, alguns anos após o início da colonização e ocupação do solo brasileiro, este poder centralizado passa a ser compartilhada e dividida entre os titulares das capitanias hereditárias24.

A partir deste instante, o território brasileiro passa a ser dividida em quinze capitanias hereditárias doadas pela Coroa Portuguesa aos Fidalgos de confiança do Rei, para ocupação e cultivo da terra, forma de expandir o território colonizado, conforme ilustração abaixo.

MAPA DA DIVISÃO DAS CAPITANIAS HEREDITÁRIAS25

É necessário esclarecer que as capitanias tinham como características a inalienabilidade, indivisibilidade e hereditariedade, o que significava que o titular da capitania, não poderia subdividi-la, nem mesmo alienar a concessão recebida pela Coroa portuguesa, sendo apenas transferido o direito de concessão aos seus sucessores, após o falecimento de seu titular.

24

Segundo Tutikian: “Apesar das capitanias hereditárias serem consideradas a primeira forma de propriedade imobiliária no país, suas características pouco se assemelham com a propriedade atual. A propriedade de capitanias se caracterizava por elementos diversos dos conhecidos atualmente e com o objetivo preciso de garantir a soberania da Coroa sobre a colônia”. TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica, Econômica, Social e Jurídica. São Paulo: Quartier Latin, 2011

25 MAPA DA DIVISÃO DAS CAPITANIAS HEREDITÁRIAS Imagem extraída do link:

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Este direito de concessão, observa-se que era apenas o direito à posse26 e não à propriedade, pois, como já mencionado, as capitanias hereditárias não podiam ser alienadas, nem subdivididas, mas apenas transmitidas aos sucessores do titular das capitanias que continuariam a serem os únicos responsáveis perante a Coroa pela ocupação e exploração das terras brasileiras.

Esta concessão, também, estipulava que o exercício da posse pelo titular da capitania deveria ser de 20% do território total da capitania, devendo o restante da área ser concedida para outras pessoas que tivessem o interesse de cultivá-la, podendo a concessão do direito à posse ser cassada pela Coroa, caso a área concedida não se tornasse produtiva, surgindo, assim, o regime das Sesmarias27.

O regime das sesmarias possui duas fases, na qual a primeira se caracteriza pela concessão apenas da posse da terra, uma vez que a propriedade continuava a ser totalmente da Coroa portuguesa.

Na segunda fase do sistema das sesmarias, a Coroa, visando dirimir os conflitos oriundos das falhas de fiscalização sobre as áreas concedidas e da falta de controle sobre as mesmas, uma vez que a própria Coroa Portuguesa desconhecia quem eram os sesmeiros e se estes estavam cultivando as terras de fato, inicia o processo de regularização fundiária, transferindo o título de domínio da terra para os sesmeiros que comprovassem o cumprimento das condições28 de cultivo da terra, moradia, demarcação da área utilizada e o pagamento do dízimo à Ordem de Cristo.

Segundo Cláudia Tutikian, o surgimento do sistema das Sesmarias foi que originou os latifúndios de terras no Brasil, cujos efeitos são sentidos até os dias de hoje e principal causadora da conjuntura desordenada do território nacional. E

26 TUTIKIAN explica que:

“O instituto jurídico utilizado na época era uma analogia ao hoje conhecido direito real de usufruto, em que a nua-propriedade era de Portugal e o domínio útil – a potencialidade de cultivo e de moradia das terras era dos titulares das capitanias.” TUTIKIAN, Cláudia Fonseca.

Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica, Econômica, Social e Jurídica.

São Paulo: Quartier Latin, 2011, p.90.

27TUTIKIAN ensina que:

“A estrutura das sesmarias, na sua primeira fase, não previa nenhum título de propriedade. (...) A propriedade destes imóveis, ou melhor, de todo o território brasileiro, continuava a ser de um único proprietário: a Coroa Portuguesa.” TUTIKIAN, Cláudia Fonseca.

Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica, Econômica, Social e Jurídica.

São Paulo: Quartier Latin, 2011, p.92.

28 TUTIKIAN expõe que:

“Foi diante da conjuntura de completo caos nas terras da colônia que Dom Pedro II decidiu expedir a Carta Régia de 1795, dando início à segunda fase das sesmarias, momento que o processo da propriedade principia no país.” TUTIKIAN, Cláudia Fonseca.

Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica, Econômica, Social e Jurídica.

(37)

observa, ainda, a autora, que isto ocorreu pelo fato dos territórios das sesmarias serem muito grande e pela falha de fiscalização da Coroa em averiguar se as terras concedidas estavam mesmo sendo cultivadas e se não havia mais de uma área concedida para uma mesma pessoa.29

Como resultado deste processo, da qual das capitanias hereditárias surgem as sesmarias, temos o surgimento da propriedade imobiliária privada como forma derivada da propriedade imobiliária pública, sendo o regime das sesmarias a responsável pela origem embrionária da propriedade privada que conhecemos atualmente.30

3.1.2 A Lei de Terras de 1850 e seus efeitos

O regime das sesmarias, em sua segunda fase, na qual regulava a aquisição da propriedade imobiliária, durou até 1822. Após este período, que coincide com o início do período imperial no Brasil, a normatização sobre o modo de aquisição do domínio de terras no país só encontrou previsão na Lei de Terras de 1850, portanto, praticamente trinta anos após o fim do regime das sesmarias.

Durante estes trinta anos em que não houve uma legislação do modo de aquisição da propriedade imóvel, o que ocorreu foi a ocupação do solo mediante a posse desordenada e sem fiscalização do Império, culminando num cenário imobiliário caótico de ocupação do solo brasileiro.

Assim, a Lei de Terras teve como objetivo principal a regularização do caos fundiário no país31, promovendo a delimitação das terras públicas e privadas, bem como a regulamentação da titularidade e registro destas propriedades que se deram

29TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica,

Econômica, Social e Jurídica. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p. 93.

30 TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva

Histórica, Econômica, Social e Jurídica. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p. 97.

31TUTIKIAN explica que: “A primeira medida da Lei de Terras foi reconhecer o direito dos sesmeiros e

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por meio do Registro do Vigário32, estabelecido pelo decreto nº 1.318 de 1854, que regulava a Lei de Terras.

A Lei de Terras de 1850, apesar de ter papel importante na regularização fundiária do caos imobiliário presente na época, acabou com o mecanismo de retomada de terras improdutivas, tornado o caráter da propriedade imóvel, a partir da sua vigência, absoluto, uma vez que bastava ao proprietário ter o título de domínio da terra sem a necessidade de torná-la produtiva ou para fins de moradia.

Como consequência deste fato, a Lei de Terras acabou com a primitiva noção de função social da propriedade imóvel no país, pois os proprietários de terras não precisavam mais cultivar ou morar nas suas áreas, sob pena de perder o seu direito à terra no caso de não cumprir com as condições de utilização do solo.

Dessa maneira, cabe ressalvar, para melhor entendimento sobre a alteração da noção de propriedade imobiliária trazida pela Lei de Terras, que anteriormente a esta Lei, a terra era cedida gratuitamente com o ônus para o adquirente de torná-la produtiva, mas com a vigência da Lei de Terras, as terras passam a ser adquiridas mediante um valor pecuniário, portanto, sem mais a gratuidade e, também, a contraprestação de ter que cultivá-la33, tendo um resultado bastante danoso para a expansão territorial e distribuição de terras no Brasil.

3.2 O processo de urbanização no Brasil e em São Paulo na década de 30

3.2.1 As causas impulsionadoras do êxodo rural no Brasil

O processo de urbanização brasileiro inicia-se de forma mais intensa na década de 1930, com o êxodo rural, migração das áreas rurais para as áreas urbanas, impulsionada, dentre outros motivos, principalmente pela política de

32 Segundo TUTIKIAN:

“Assim se denominava exatamente porque era realizado nas paróquias das localidades, uma vez que a Igreja encontrava-se unida oficialmente ao Estado, pois a separação se deu apenas com a proclamação da República. Os padres, baseados nos documentos e nas informações que os titulares de propriedade lhes forneciam, faziam o cadastro dos imóveis do seu respectivo lugarejo.” TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica, Econômica, Social e Jurídica. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p.104.

33TUTIKIAN, Cláudia Fonseca. Propriedade Imobiliária e o Registro de Imóveis: Perspectiva Histórica,

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incentivo à industrialização e pela consolidação das leis trabalhistas que contemplavam direitos para o trabalhador urbano, mas não o rural, impulsionando os trabalhadores das áreas rurais a buscarem melhores oportunidades e condições de vida nas cidades brasileiras34.

Neste processo de migração das áreas rurais para os centros urbanos, teve-se um aumento repentino da população urbana em relação à população rural, com a superação da população urbana em relação a rural a partir da década de 1970, mas com um crescimento bastante acentuado da população urbana desde a década de 40, tendo, ainda, como projeção para 2050, uma população urbana brasileira, superando a casa dos 230 milhões de habitantes, enquanto que a ONU aponta uma diminuição contínua da população rural no Brasil, conforme se depreende com o quadro a seguir:

QUADRO DE CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO URBANA VERSUS RURAL NO BRASIL ENTRE 1940-200035

34 MARICATO, Ermínia. Metrópole, Legislação e Desigualdade In Estudos Avançados nº 48, 2003, p.

152.

35QUADRO DE CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO URBANA VERSUS RURAL NO BRASIL ENTRE

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Entretanto, este movimento migratório não incentivado diretamente pelo governo36, encontrou as cidades brasileiras despreparadas para suportar a demanda dos novos moradores.

Concomitante a esta falta de planejamento, as elites locais também dificultaram bastante o acesso desta massa migratória ao centro da cidade, sobretudo pelo motivo do mercado imobiliário ter nestas regiões como as mais valorizadas, sobrando, assim, as moradias que se encontravam mais afastadas do centro urbano.

Diante deste cenário, o contingente migratório do campo para a cidade se viu impedido de habitar o centro das cidades brasileiras, ocupando, assim, o solo urbano nas regiões periféricas da cidade, o que resultou nas ocupações de áreas de mananciais, encostas e outras áreas que, por se encontrarem em uma localização perigosa, era também, áreas mais desvalorizadas e, assim, passíveis de ocupação por esta massa sem moradia e sem poder aquisitivo vinda do campo.

3.2.2 A Urbanização na cidade de São Paulo

Na cidade de São Paulo, o processo de urbanização do município paulistano e na sua região metropolitana se deu, de forma mais significativa, na década de 1950. Porém, foi a parir da década de 1960 que a cidade começa a ter ocupada a suas regiões mais distantes, saindo para além das fronteiras centrais da cidade e ocupando áreas periféricas, de várzeas e encostas, onde a terra era desvalorizada e, por este motivo, não pretendida pelo mercado imobiliário da época.

Estas ocupações crescentes em áreas mais afastadas da cidade, durante as últimas décadas, trouxeram problemas para a cidade e para a população residente destas áreas.

Exemplo dos resultados desta ocupação sem planejamento são as inundações constantes, em épocas de chuvas, das áreas ribeirinhas ocupadas, pela

36MARICATO ao explicar a intensidade do processo migratório campo-cidade, observa que: “essa

grande massa que se instalou nas cidades, o fez por sua própria conta e risco”. MARICATO, Ermínia.

(41)

proximidade com os postos de trabalho e dos serviços públicos, às margens dos rios Tietê, Tamanduateí e Pinheiros37.

Neste contexto, temos o caso da Baixada do Glicério como exemplo histórico do modelo de ocupação do solo urbano na cidade de São Paulo, seguida pela ocupação, na década de 1990, das áreas localizadas às margens das represas Billings e Guarapiranga ao Sul, a encosta da Serra da Cantareira ao Norte e das várzeas localizadas nos extremos leste e oeste da cidade38.

Dessa forma, nota-se que a falta de planejamento para absorver os novos habitantes das cidades e, ainda, o mercado imobiliário especulativo que impunha uma barreira invisível ao acesso desses novos moradores à região mais centralizada da cidade, causa reflexos até hoje na qualidade de vida da população paulistana.

3.3 O desenvolvimento das áreas de favelas na grande São Paulo

Originada pela forma como se deu o processo de urbanização na cidade de São Paulo, as favelas39 surgiram na década de 194040, mas foi a partir da década de 197041 que elas se desenvolveram em larga escala às margens da cidade, formando um cinturão que cresce desorganizadamente, em locais de difícil acesso, sem infra-estrutura básica e considerados de risco por estarem em áreas de alagamento ou desmoronamento.

37FREITAS, José Carlos. Ocupações Irregulares

– Riscos sociais decorrentes da falta de saneamento inTemas de Direito Urbanístico 6 – Áreas de Risco. São Paulo: Imprensa Oficial do estado de São Paulo: Ministério do Estado de São Paulo, 2011. p. 225-226.

38FREITAS, José Carlos. Ocupações Irregulares

– Riscos sociais decorrentes da falta de saneamento inTemas de Direito Urbanístico 6 – Áreas de Risco. São Paulo: Imprensa Oficial do estado de São Paulo: Ministério do Estado de São Paulo, 2011. p. 226-227.

39TASCHNER, Suzana Pasternak. Favelas em São Paulo Censos, Consensos e Contra-sensos. p.

13. < http://revistas.pucsp.br/index.php/metropole/article/viewFile/9294/6898 >. Segundo definição da Secretaria Municipal da Habitação e Desenvolvimento Urbano, tanto as definições das pesquisas da Prefeitura Municipal (1973, 1975, 1987 e 1993), como a de 1980 do IPT-Fupam consideram favela “todo o conjunto de unidades domiciliares constituídas de madeira, zinco, lata, papelão ou alvenaria, em geral distribuídas desorganizadamente em terrenos cuja propriedade individual do lote não é legalizada para aqueles que os ocupam”. Acesso em 04.05.2013.

40TASCHNER, Suzana Pasternak. Espaço e População nas Favelas de São Paulo. p. 04.

<.http://www.abep.nepo.unicamp.br/docs/anais/pdf/2002/GT_MA_ST21_pasternak_texto.pdf> Acesso em 04.05.2013.

(42)

Este processo de favelização, isto é, do crescimento do número de favelas e seus habitantes na cidade de São Paulo e Região Metropolitana tem tido um aumento significativo nas últimas décadas, principalmente em relação ao crescimento da população do município, demonstrando que o problema cresce de forma exponencial e preocupante.

Conforme estudo publicado por pesquisadores na Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, na década passada, sobre a favelização na cidade de São Paulo e Região Metropolitana, apontaram o seguinte42:

A população favelada de São Paulo tem crescido a taxas superiores às da população do município, o que equivale a dizer que sua proporção se elevou na última década. Os dados de setores subnormais, embora subestimados, apontam para um importante crescimento da população favelada entre 1991 e 2000, numa taxa de 3,7% ao ano, quatro vezes superior à média da metrópole. Nossa estimativa indica uma taxa mais reduzida – 2,97% a.a., mas muito superior à taxa de crescimento da população total – 0,9% a.a. Esse crescimento se deu principalmente pela elevação da área total de favelas (que cresceu 24% na década), mas também pelo aumento da densidade média das favelas (que subiu de 360 para 380 habitantes por hectare – 6% de aumento). Os dados apontam, portanto, para um importante processo de favelização no município de São Paulo na década de 1990.

Atualmente, a Secretaria da Habitação indica que na cidade de São Paulo existam, aproximadamente, 1643 favelas43, que ocupam uma área de 24 quilômetros quadrados, distribuídas por todas as cinco regiões da cidade, conforme mapa a seguir.

42MARQUES, Eduardo; TORRES, Haroldo da Gama e SARAIVA, Camila. Favelas no Município de

São Paulo: Estimativas de População para os anos de 1991, 1996 e 2000. in Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, Vol. 5, N1: 2003.

43Informações obtidas por meio do site: http://www.habisp.inf.br/principal/busca?tipo=favela . Acesso

Referências

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