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Discurso da publicidade: argumentação e retórica

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

ESTER ANHOLETO

DISCURSO DA PUBLICIDADE: ARGUMENTAÇÃO E RETÓRICA

São Paulo

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ESTER ANHOLETO

DISCURSO DA PUBLICIDADE: ARGUMENTAÇÃO E RETÓRICA

Dissertação apresentada ao

Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Letras

Orientadora: Profa. Dra. Aurora

Gedra Ruiz Alvarez

São Paulo

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A596d Anholeto, Ester.

Discurso da publicidade: argumentação e retórica / Ester

Anholeto.

125 f. ; 30 cm

Dissertação (Mestrado em Letras) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2011.

Bibliografia: f. 121-125

1. Retórica. 2. Persuasão. 3. Discurso publicitário. I. Título.

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ESTER ANHOLETO

DISCURSO DA PUBLICIDADE: ARGUMENTAÇÃO E RETÓRICA

Dissertação apresentada ao

Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Letras

Aprovada em

BANCA EXAMINADORA

Prof

a

. Drª. Aurora Gedra Ruiz Alvarez

Orientadora

Universidade Presbiteriana Mackenzie

Prof. Dr. Ronaldo de Oliveira Batista

Universidade Presbiteriana Mackenzie

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela companhia constante neste e em todos os outros percursos. Aos meus pais, por todo apoio, em todos os sentidos.

Ao meu esposo Marcelo, pelo amor demonstrado em muita compreensão, estímulo e paciência.

À querida professora Aurora, exemplo como pessoa e profissional, por sua incansável dedicação e por seus ensinamentos desde a graduação; pelas correções, pela delicadeza, pelo afeto.

À professora Norma Discini de Campos, pelas admiráveis e inesquecíveis aulas; por todas as contribuições dadas a este trabalho.

Ao professor Ronaldo de Oliveira Batista, pelas correções, comentários e sugestões, tão úteis para esta pesquisa.

À professora Elisa Guimarães, eterna orientadora, por me ensinar, incentivar e apoiar desde a graduação.

À professora Egisvanda Isys de Almeida Sandes, pela revisão do resumo em espanhol.

À professora Glória Carneiro do Amaral, que colaborou com a tradução de uma música analisada neste trabalho.

A todos os professores do programa de Pós-Graduação em Letras, pelas aulas enriquecedoras.

Aos colegas de classe, pelo companheirismo.

À Andrea Korps Calderón, pelo apoio emocional, que tem me fortalecido nos últimos anos.

A todos os amigos e familiares que de alguma forma contribuíram nesta caminhada.

À CAPES, por me conceder uma bolsa de estudos, sem a qual não poderia chegar a realizar este trabalho.

Ao Instituto Presbiteriano Mackenzie, pela bolsa de estudos concedida em alguns períodos do curso.

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RESUMO

Partindo do princípio de que todo discurso tem algo de argumentativo e que não existe neutralidade em nenhum texto, ainda mais se esse texto pertence a um gênero marcadamente feito para persuadir, este estudo tem por objetivo verificar as estratégias da retórica da persuasão em dois anúncios publicitários

em vídeo que circularam na mídia televisiva, um da empresa Casas Bahia e um

do Shopping Pátio Higienópolis. Pretendemos mostrar que não só a linguagem verbal, mas também o uso de outras linguagens, como a visual e a sonora, contribuem para que se chegue à persuasão, primeiramente porque o caráter da linguagem já é o de uma manifestação impregnada de intencionalidade, e também, porque é próprio do gênero escolhido ser persuasivo, visto que sua finalidade maior é a de levar o espectador a comprar.

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RESUMEN

A partir del principio de que todo discurso tiene algo de argumentativo y que no existe neutralidad en ningún texto, principalmente si el texto pertenece a un género marcadamente persuasivo, el objetivo de este estudio es averiguar las estrategias de la retórica de la persuasión en dos anuncios publicitarios en

video que circularon en el medio televisivo. Uno es de la empresa Casas Bahia

y otro, del Shopping Pátio Higienópolis. Trataremos de demostrar que tanto el

lenguaje verbal como el uso de otros lenguajes, como el visual y el sonoro, contribuyen a que se logre la persuasión: en primer lugar porque el carácter del lenguaje ya es el de una manifestación impregnada de intencionalidad y, en segundo, porque es propio del género elegido ser persuasivo, dado que su objetivo principal es llevar al espectador a comprar el producto.

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Sumário

Introdução ... 9

1 Argumentação e retórica ... 12

1.1 Uma perspectiva histórica da Retórica ... 12

1.2 Argumentação ou retórica, convencimento ou persuasão? ... 16

1.3 Ethos ... 23

1.4 Paixões ... 28

2 O discurso publicitário ... 32

2.1 Considerações iniciais sobre a publicidade ... 32

2.2 Em busca da adesão dos espectadores ... 36

2.3 Outra tarefa indispensável: conhecimento do público-alvo ... 38

2.3.1 A mulher como público-alvo ... 40

2.3.2 Classes sociais ... 42

2.4 A atuação da publicidade na emoção dos espectadores ... 44

2.5 Técnicas retóricas e associações nos textos publicitários ... 46

2.6 Elementos da publicidade em vídeo a serem considerados ... 50

2.7 Ideologia e propaganda: muito além da relação compra/venda ... 52

3 Dois anúncios e uma possível leitura ... 57

3.1 O anúncio da Casas Bahia... 58

3.2 O anúncio do Shopping Pátio Higienópolis ... 85

3.3 Cotejando os textos ... 114

Considerações finais ... 119

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Introdução1

Somos participantes de uma sociedade em que, dentre os meios de comunicação, a TV é um dos que mais exercem influência sobre a vida do indivíduo comum. Por meio dessa mídia entramos em contato com uma série de anúncios publicitários para cujo poder de persuasão, muitas vezes, não nos atentamos, menos ainda, damos conta dos recursos argumentativos de que lançam mão para persuadir o público, que desfruta a linguagem sem perceber esses mecanismos. Nem sempre observamos a entonação do discurso manifesta no texto, que veicula um fazer persuasivo, envolvente e que imprime juízos de valor de determinado grupo social, até porque a matéria-prima principal de suas ―grandes ideias‖ é o cotidiano. Esta natureza ordinária do comercial de TV dilui as intenções nele inscritas, criando imagens discursivas que são praticamente indiscutíveis para um grupo e facilita a absorção do valor propagado, seja nas escolhas, seja nos comportamentos, seja no modo de ver o mundo dos consumidores. Diante desse fenômeno sedutor, escolhemos para exame anúncios publicitários em vídeo e levantamos as seguintes questões: quais os mecanismos de persuasão de que um texto publicitário pode se valer para manipular seus interlocutores? Quais as estratégias argumentativas mais comuns em textos dessa natureza tomadas como ferramenta de convencimento e persuasão dos enunciatários?

A escolha de um corpus pertencente ao discurso publicitário se dá pelo

fato de esse discurso ser veiculado para um grande número de pessoas e de influenciar direta ou indiretamente seus pensamentos e suas ações por meio de raciocínios que simulam uma imagem de algo que deve ser adquirido.

Para dar forma a este estudo, analisaremos algumas estratégias retóricas que atuam no processo de persuasão nesses vídeos e os expedientes dessa linguagem fílmica que vão à mesma orientação persuasiva: as propriedades verbo-áudio-performático-visual, isto é, estudaremos a linguagem

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verbal, a mise-en-scène dos atores na narrativa fílmica, a escolha da música, a inserção de outros sons, dentre outras formas de expressão.

Nesta pesquisa, pretendemos investigar o quanto os textos publicitários veiculados na mídia fílmica podem se valer de recursos de diferentes

linguagens para evidenciar a tese ou o ponto de vista que defendem – através

da introdução de expressões que se fundam no senso comum, no apelo a valores universais (o prazer, o bem etc.) e no diálogo com a cultura. Partimos do pressuposto de que nada do que é enunciado é ―neutro‖, menos ainda quando se trata de um discurso publicitário, produzido para um grande número de pessoas e com o intuito de vender um produto, um serviço e/ou uma ideia.

O alicerce teórico estará fundamentado em estudiosos do discurso, da retórica e das linguagens publicitária e fílmica. Alguns dos nomes que figuram no estudo do discurso são: Dominique Maingueneau e Patrick Charaudeau; quanto ao embasamento sobre a retórica, mencionamos, sobretudo, Aristóteles, Chaïm Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca e Antônio Suárez Abreu; a respeito da linguagem publicitária, lançaremos mão de obras como as de Antônio Sandmann, Torben Vestergaard e Kim Schroder; e com relação à linguagem fílmica, citamos Graeme Turner.

Partiremos dos textos desses autores que servirão de base teórica e, só

então, analisaremos o corpus escolhido, observando os fenômenos frequentes

nos anúncios.

No primeiro capítulo, examinaremos os aspectos referentes à retórica e à argumentação. Falaremos de como a retórica foi e é vista, desde suas origens até os dias de hoje, da diferença entre argumentar, convencer e

persuadir, da importância do ethos e do despertar das paixões no processo de

persuasão.

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1 Argumentação e retórica

1.1 Uma perspectiva histórica da Retórica

Os manuais de retórica ensinam que tanto as personagens quanto as pessoas com as quais convivemos se valem das técnicas da retórica. O uso desses recursos não é, portanto, exclusivo do texto literário, mas também está presente nas falas das pessoas comuns.

A gênese da retórica é atribuída, frequentemente, a um tempo e circunstância bem precisos: na Sicília, no século V a.C. Isso porque a população siciliana, vítima de dois tiranos que expropriaram e redistribuíram suas terras, mobilizou grandes júris populares para recuperar o que lhes havia sido tirado. Nesses júris, era necessário que as partes tivessem a maior eficácia possível no uso do discurso, a fim de persuadir os julgadores. Vejamos:

Aliás, foi assim que ela surgiu na Sicília, quando – uma vez desmoronada a tirania – se tratou de permitir aos proprietários espoliados que defendessem sua causa, a fim de recuperar seus bens. Os primeiros advogados foram os intelectuais chamados de sofistas, pois professavam o emprego da sabedoria para intervir em favor do destino das vítimas espoliadas. (MEYER, 2007, p. 19).

E dado o grande proveito dessas técnicas do bem falar, os recursos da eloquência começaram a ser sistematizados. A retórica esteve, pois, relacionada à política desde sua origem. Teve como seus primeiros adeptos Empédocles, Córax, Tísias, Protágoras, Górgias, Isócrates, entre outros. Mas dentre tantos nomes, Aristóteles merece maior destaque, visto que não há

outra obra – através da qual se estabelecessem leis e regras da retórica –

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A retórica aristotélica teve sua importância ao longo dos séculos

seguintes, e a partir do século I a. C. – época em que sua obra foi publicada –

chegou, também, aos latinos, por intermédio do tratado Retórica a Herênio,

atribuído a Cícero, dada a semelhança com outras de suas obras. Nesse

período, a visão do que era retórica – agora considerada a arte do bem dizer –

já se distanciava muito do sentido de sua origem.

Sabendo-se que já foram atribuídos à retórica os sentidos de enganação, encantamento, sedução, todos eles com apreciação negativa, compreendemos por que ela passou a ser vista com certo descrédito ao longo do tempo.

Nos séculos XVII e XVIII, a retórica passou por um processo de esvaziamento, o que fez com que perdesse sua importância para muitos

intelectuais desse período. Roberto Acízelo de Souza (2010, on line), ao

comentar o que diz Peter Dixon, aponta uma série de causas para que isso ocorresse. Dentre elas, destacam-se:

a) [...] a crítica rejeicionista de Montaigne e Bacon, defendendo a precedência de res sobre verba; a disseminação do espírito científico, valorizando a pesquisa e a descoberta, contra a autoridade e a imitação, e erigindo a clareza, entendida como eliminação de ornamentos, em novo padrão do estilo da prosa, especialmente adequado aos relatórios científicos e discussões, segundo proposta da Royal Society of London no século XVII.

b) a combinação de gêneros — que a retórica pretendia puros —

promovida pela tragédia burguesa e a comédia sentimental; a mudança do conceito de poesia operada pelo romantismo.

c) os ―esquemas de caráter‖ impostos pelo treinamento retórico, que

teriam conduzido a uma visão dos seres humanos segundo estereótipos, refratários portanto a qualquer complexidade psicológica e ética.

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Desde então, o termo ―retórica‖ foi vulgarizado, ou seja, tornou-se comum, com sentido disfórico. Passou a significar discurso vazio, sem vínculo com a cientificidade e com a práxis. A retórica deixou de ser interesse de pesquisas por séculos. Hoje, foi reabilitada pelos estudos da Nova Retórica, sobretudo a partir da segunda metade do século XX, graças à Linguística, à Semiótica, à Pragmática e à Análise do Discurso.

Contudo, ainda que, ao longo do tempo, essa ―arte‖ tenha sido vista com um olhar de depreciação, segundo Roberto Acízelo de Souza, ―alguns de seus fragmentos sobrevivem sob a forma de objeto ou motivação de certos empreendimentos intelectuais do século XX bastante heterogêneos‖ (ibidem,

on line). De acordo com o autor, alguns deles são: a estilística, o estruturalismo e a semiologia dos anos 60, a psicanálise, a teoria da argumentação.

Apoiados nos estudos de Ingedore G. Villaça Koch, tomaremos, aqui, os termos ―retórica‖ e ―argumentação‖ como quase sinônimos, como adiante veremos.

Dissemos que a retórica, em suas origens, estava associada à democracia e ao pronunciamento dos discursos em público, pois nos júris em que ela era exercitada, era muito importante que os cidadãos dominassem a arte de bem falar.

Mas é importante refletirmos que, hoje, ela não se limita à arte de falar em público, em praça pública, de modo persuasivo, para conseguir a adesão dos ouvintes a uma determinada tese, como era entendida na retórica antiga. A retórica ou argumentação, atualmente, é vista pelos estudiosos da linguagem como inerente a todo discurso, que, por sua vez, carrega em si uma ideologia subjacente. Sobre isso, observemos as seguintes considerações de Ingedore V. Koch e, em seguida, de Patrick Charaudeau e Dominique Maingueneau:

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imagens recíprocas que entre eles se estabelecem. (KOCH, 2009, p. 19).

A concepção de argumentação estabelecida por Benveniste e comentada por Dominique Maingueneau e Patrick Charaudeau vai ao encontro do que acabamos de dizer: ―Se definirmos a argumentação como uma tentativa de modificar as representações do interlocutor, fica claro que toda informação desempenha esse papel e que pode ser considerada argumentativa nesse sentido‖ (2004, p. 52).

A partir desse pensamento, podemos depreender que todo discurso, ainda que não pareça, tem algo de argumentativo, pois sempre carrega em si a finalidade de interagir com o outro, de se fazer crer, ao menos. E nesse sentido, até mesmo as escolhas feitas para organizar esse discurso são programadas com vistas a algum objetivo. Um discurso nunca é, portanto, neutro.

Voltando a falar do percurso das reflexões sobre a retórica ao longo do tempo, Ingedore V. Koch nos conta que foi com o surgimento da Pragmática que o estudo da retórica ou argumentação passou a ter mais destaque nas pesquisas sobre a linguagem. Primeiramente os filósofos Austin e Searle, nos EUA, deram grande contribuição com o estudo dos atos de linguagem

relacionados ao agir, ao fazer algo por meio do dizer. Eles falaram sobre ―atos

ilocucionários, que encerram a ‗força‘ com que os enunciados são

produzidos, e de atos perlocucionários, que dizem respeito aos efeitos

visados pelo uso da linguagem, entre os quais os de convencer e de

persuadir‖ (2009, p. 18, grifos da autora).

Em seguida, Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca deram mais ênfase aos estudos sobre a argumentação, o que pode ser confirmado já pelo título de sua

obra Tratado da argumentação: a Nova Retórica. De acordo com esses

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Não há como falar de argumentação e de retórica sem falarmos, também, em persuasão. Para Aristóteles, o orador devia descobrir pelo pensamento, pela reflexão, em qualquer questão, o que uma tese encerrava de persuasivo (2000, p. XIII). Dessa forma, a retórica argumentativa interessa-se pelo:

[...] discurso proferido num debate declarado e contraditório, estruturado pela intenção (ilocutória) de persuadir, isto é, de comunicar, explicar, legitimar e fazer compartilhar o ponto de vista que ali se exprime e as palavras que o dizem; ou então, ao contrário, de eliminar os discursos concorrentes para reinar soberano em seu domínio. A persuasão (perlocutória) resulta totalmente ou em parte da realização do conjunto dessas intenções. (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2004, p. 376).

Vemos que, tanto na retórica antiga, quanto nos estudos mais recentes, o grande interesse está no que há de persuasivo nos discursos.

Mas, afinal, o que é persuasão?

1.2 Argumentação ou retórica, convencimento ou persuasão?

Dada à imprecisão com que podem ser tomados esses termos, é pertinente que apresentemos, aqui, algumas definições, a fim de que possamos compreender com mais exatidão o significado de cada um deles.

Para Elisa Guimarães, praticamente não há diferença entre argumentação e retórica:

Vemos, pois, a importância da Retórica ressurgir, não mais como uma simples classificação de figuras de estilo, mas vista como um processo argumentativo que, em graus variados, está subjacente a todos os discursos.

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maior ou menor, em todo e qualquer tipo de discurso. (2004, p. 148, grifos da autora).

Ingedore G. Villaça Koch defende que o ato linguístico fundamental é o ato de argumentar. Para ela, argumentar não é criar certezas, mas sim buscar

adesão. A autora também vê argumentação e retórica como ―quase sinônimos‖

e, assim como já dissemos, afirma que a argumentação e a retórica estão presentes, ―em grau maior ou menor, em todo e qualquer tipo de discurso‖ (2009, p. 18). Vejamos ainda:

[...] o ato de argumentar, isto é, de orientar o discurso no sentido de determinadas conclusões, constitui o ato lingüístico fundamental, pois a todo e qualquer discurso subjaz uma ideologia, na acepção mais ampla do termo. A neutralidade é apenas um mito: o discurso

que se pretende ―neutro‖, ingênuo, contém também uma ideologia – a da sua própria objetividade. (2009, p. 17, grifos da autora).

Ao dizer que argumentar é ―orientar o discurso‖ para determinado sentido, Koch já deixa claro que a argumentação é sempre premeditada, com vistas à obtenção de algum objetivo. Desse modo, sua fala também desfaz o mito da neutralidade do discurso, ao dizer que até mesmo a pretensão de ser neutro já aponta determinadas intenções discursivas.

Comentando os estudos de Perelman e Olbrechts-Tyteca, Koch diferencia ―convencer‖ de ―persuadir‖:

Enquanto o ato de convencer se dirige unicamente à razão, através de um raciocínio estritamente lógico e por meio de provas objetivas,

sendo, assim, capaz de atingir um ―auditório universal‖, possuindo

caráter puramente demonstrativo e atemporal (as conclusões decorrem naturalmente das premissas, como ocorre no raciocínio matemático), o ato de persuadir, por sua vez, procura atingir a vontade, o sentimento do(s) interlocutor(es), por meio de argumentos plausíveis ou verossímeis e tem caráter ideológico, subjetivo, temporal, dirigindo-se, pois, a um ―auditório particular‖: o primeiro

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Carlos Ceia considera que argumentação é:

Desenvolvimento de um raciocínio com o fim de defender ou repudiar uma tese ou ponto de vista, para convencer um oponente, um interlocutor circunstancial ou a nós próprios. [...] Argumentamos para persuadir alguém que, à partida, não partilha os mesmos pontos de vista ou as mesmas convicções que nós possuímos. (2010 on line).

De acordo com o autor, a argumentação é um ato racional, programado, que tem como objetivo convencer ou persuadir alguém, cujo ponto de vista não seja o mesmo que o do argumentador.

Para Antônio Suarez Abreu, a retórica também é a arte de convencer e de persuadir. Ele diferencia esses termos e distingue-os do que é argumentar, como nos esclarece:

Segundo o senso comum, argumentar é vencer alguém, forçá-lo a submeter-se à nossa vontade. Definição errada! [...] saber argumentar é, em primeiro lugar, saber integrar-se ao universo do outro. É também obter aquilo que queremos, mas de modo cooperativo e construtivo, traduzindo nossa verdade dentro da verdade do outro. (2002, p. 10).

O senso comum, uma série de fragmentos de discursos articulados e que nos moldam, estabelece que a argumentação se dá pela força, enquanto para o autor, é exatamente o contrário: é na habilidade de nos integrarmos ao universo do outro que conseguimos dele o que desejamos. É, na maioria das vezes, uma atividade mais velada do que explícita. Observemos:

Argumentar é a arte de convencer e persuadir. Convencer é saber gerenciar informação, é falar à razão do outro, demonstrando, provando. Etimologicamente, significa vencer junto com o outro (com + vencer) e não contra o outro. Persuadir é saber gerenciar relação, é falar à emoção do outro. A origem dessa palavra está ligada à preposição PER ―por meio de‖ e a SUADA, deusa romana da

persuasão. Significava ―fazer algo por meio de auxílio divino‖. Mas em

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emoções, é sensibilizar o outro para agir. Quando persuadimos alguém, esse alguém realiza algo que desejamos que ele realize. (ibidem, p. 25).

É interessante notarmos que o autor defende que podemos convencer alguém sem persuadi-lo, ou alguém pode ser persuadido a fazer algo sem estar convencido. Os dois termos são, portanto, distintos.

E é possível reiterarmos que argumentar é uma atividade consciente, programada, que envolve raciocínio e gerenciamento de informação/razão e relação/emoção, para que o outro faça o que nós desejamos. Entretanto, segundo Abreu, isso é feito de forma um tanto quanto implícita: ―Argumentar é motivar o outro a fazer o que queremos, mas deixando que ele faça isso com autonomia, sabendo que suas ações são frutos de sua própria escolha‖ (2002, p. 93).

Examinemos, agora, o que Patrick Charaudeau e Dominique Maingueneau dizem sobre a persuasão:

[...] não é evidente que o ponto final do processo argumentativo seja a persuasão vista como um simples estado mental, uma ‗adesão do espírito‘. O último critério da persuasão completa é a ação realizada no sentido sugerido pelo discurso, sendo que o pathos desempenha um papel essencial nesta passagem ao ato. (2004, p. 377, grifo dos autores).

Perelman e Olbrechts-Tyteca acrescentam:

Para quem se preocupa com o resultado, persuadir é mais do que convencer, pois a convicção não passa da primeira fase que leva à ação. [...] Em contrapartida, para quem está preocupado com o caráter racional da adesão, convencer é mais do que persuadir. (2000, p. 30).

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Para A. S. Abreu, temos que procurar saber o que o outro tem a ganhar fazendo o que queremos. O que nós queremos deve ficar em segundo plano: ―A primeira lição de persuasão que temos a aprender, então, é educar nossa sensibilidade para os valores do outro‖ (2002, p. 72).

É importante ressaltar que os mesmos valores não são impostos a todos. Eles estão ligados a grupos e a emoções. Assim, ―Aquele que quer persuadir deve saber previamente quais são os verdadeiros valores de seu

interlocutor ou do grupo que constitui o seu auditório‖ (ibidem, p. 75). Sem esse

conhecimento do outro não é possível que se obtenham resultados tão eficientes no que diz respeito a persuadir, já que é mais difícil chegar aos desejos do(s) interlocutor(es). Até porque a argumentação sempre depende de um auditório para se concretizar. Ela sempre pressupõe diálogo. Assim, quem argumenta, deve conhecer seu auditório e quanto maior for esse conhecimento, maior a probabilidade de se obter êxito nesse processo.

Olivier Reboul também chama nossa atenção para o auditório, entendido como os leitores, os espectadores etc. Sua importância no texto argumentativo se dá pelo fato de que sempre se argumenta diante de alguém que deve ser considerado com particularidade: ―Um auditório é, por definição particular, diferente de outros auditórios. Primeiro pela competência, depois pelas crenças e finalmente pelas emoções‖ (2004, p. 93). É o que, no discurso publicitário, chamaremos de público-alvo, como veremos mais adiante.

A partir desse ponto de vista, o autor defende que, até mesmo o fato de

algum orador considerar que um auditório seja universal – como ocorre nos

discursos políticos, em que todos devem ser atingidos –, pode parecer apenas

um ―truque retórico‖. Além disso, a criação desse auditório universal é de grande utilidade para o argumentador, que mostra falar a todos, sem exceção. Nesse caso:

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universal não é um engodo, mas um princípio de superação, e por ele se pode julgar da qualidade da argumentação. (ibidem, p. 93-94).

É como se não houvesse escapatória para os interlocutores. Se eles se sentem participantes de um grupo para o qual o orador fala, há grandes chances de serem convencidos e/ou persuadidos. E se o orador fala ―a todos‖, esses interlocutores também tendem a ser atingidos, pois, provavelmente, não quererão ficar de fora do que aparentemente serve para todos.

Aquele que argumenta não deve somente saber quais são os valores dos seus interlocutores, pois nem sempre estes têm a mesma importância para

uma pessoa. Sobre isso, Abreu (2002, p. 77) considera: ―[...] a maneira como o

auditório hierarquiza os seus valores chega a ser, às vezes, até mais importante do que os próprios valores em si‖. Essas hierarquias variam de acordo com a cultura, com as ideologias, com a história pessoal de cada um.

Assim, um enunciador não pode rejeitar um valor do auditório, se quiser

persuadi-lo. Para Abreu, o enunciador pode ―re-hierarquizar‖ esses valores.

Deve haver um ajuste entre o enunciador e as características, os gostos de seu enunciatário.

Perelman e Olbrechts-Tyteca (2000, p. 18) auxiliam-nos igualmente ao dizerem que ―com efeito, para argumentar, é preciso ter apreço pela adesão do interlocutor, pelo seu consentimento, pela sua participação mental‖. Eles ainda declaram: ―Propomo-nos chamar persuasiva a uma argumentação que

pretende valer só para um auditório particular e chamar convincente àquela

que deveria obter a adesão de todo ser racional‖. (ibidem, p. 31).

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Retomando, todo discurso é argumentativo, pois visa a alcançar algum objetivo. E argumentar é uma tentativa de convencer e de persuadir. O convencimento está relacionado à razão, ao desenvolvimento de um raciocínio que leve o interlocutor a crer em uma tese. Já a persuasão mantém laços com a emoção e impulsiona aquele que é persuadido a agir.

Faz sentido pensarmos que a argumentação não é necessária quando há evidências ou uma verdade, pois estas não necessitam ser comprovadas, defendidas, aderidas.

Argumentar é procurar coerência onde existe dúvida, é descortinar sentido num paradoxo, mas também pode ser dar sentido a uma absurdidade ou contradição. [...] Mas para que seja convincente, a argumentação precisa de um elevado grau de credibilidade. (CEIA, 2010, on line).

O fato de um orador argumentar não garante que sua tese seja verdadeira, mas ela deve parecer verdade, deve ao menos ser razoável para o auditório, pois é este que tem que confirmar o quanto as propostas da tese são

convincentes, aceitáveis: ―Para atingir o fim da razoabilidade pode, em

qualquer caso, o arguente utilizar figuras da retórica ou outros artifícios de linguagem e composição que acompanham, regra geral, todo o texto argumentativo‖ (ibidem, on line).

O enunciador pode, então, valer-se dos mais diversos tipos de argumentos e recursos quando deseja convencer e/ou persuadir seu público. Dentre esses recursos, um dos mais relevantes é a própria figura do locutor, como veremos agora.

Em sua Arte Retórica, Aristóteles diz que o homem é sempre propenso a

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nós. Dentre estas últimas, existem as que residem no caráter moral do orador, as que se fundamentam nas disposições que se criam no ouvinte e as que se ancoram no próprio discurso.

Falaremos, agora, das duas primeiras espécies de provas: as que

residem no caráter moral do orador – chamado ethos – e as que se

fundamentam nas disposições que se criam no ouvinte – as quais

relacionaremos com as paixões, pathos, definidas por Aristóteles. Quanto às

que se ancoram no próprio discurso – logos –, deixaremos para tratar no

capítulo de análise.

Passemos a refletir sobre o ethos.

1.3 Ethos

O termo ethos, advindo da retórica antiga, significa personagem,

―designa a imagem de si que o locutor constrói em seu discurso para exercer uma influência sobre seu alocutário‖ (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2004, p. 220).

O primeiro a elaborar conceitualmente a noção de ethos foi Aristóteles.

E, para ele, conforme comentam Charaudeau e Maingueneau, ―trata-se da

imagem de si que o orador produz em seu discurso, e não de sua pessoa real‖ (ibidem, p. 220).

Partindo desses conceitos e, principalmente, do uso do vocábulo ―imagem‖, que sugere um sentido simbólico, de representação,

compreendemos que o ethos não necessariamente corresponde aos atributos

reais de um dado enunciador, mas é atribuído a ele, às representações que

passa por meio de seu discurso – verbal e não verbal – propositalmente ou

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Antônio Suárez Abreu caminha na mesma direção ao afirmar que um enunciador precisa, sobretudo, parecer honesto: ―Para ter credibilidade é preciso apenas comportar-se de modo verdadeiro, sem medo de revelar propósitos e emoções‖ (2002, p. 40).

Dominique Maingueneau, ao comentar o que Ducrot entende por essa noção, diz que ―o ethos se mostra no ato de enunciação, ele não é dito no enunciado. Ele permanece, por sua natureza, no segundo plano da

enunciação, ele deve ser percebido, mas não deve ser o objeto do discurso‖

(2008, p. 14).

Todas essas considerações permitem-nos inferir que o ethos não só

está situado no plano do ser, mas também – e com maior relevo – no plano do

parecer ser.

O ethos deve ser visto tanto nos textos orais quanto nos textos escritos,

que sempre têm um ―tom‖ e deixam transparecer, através das escolhas feitas

pelo autor – escolha de vocabulário, de estrutura sintática, de ordem das

sentenças etc., – um modo de ser e de apresentar-se discursivamente.

Maingueneau ainda cita Declercq, que resume com clareza os

elementos que o ethos mobiliza:

tudo o que, na enunciação discursiva, contribui para destinar a imagem do orador a um dado auditório. Tom de voz, fluxo da fala, escolha das palavras e dos argumentos, gestos, mímicas, olhar, postura, aparência etc., todos signos, de elocução e de oratória, indumentários ou simbólicos, pelos quais o orador dá de si mesmo uma linguagem psicológica e sociológica (apud MAINGUENEAU, 2008, p. 14).

O ethos corresponde, pois, a uma maneira de dizer e de ser, a um modo de presença no mundo. E como todas essas instâncias provocam sentimentos e reações no auditório, torna-se perceptível que essas reações estão intimamente relacionadas a aspectos culturais e ideológicos dos interlocutores.

Sobre isso, Charaudeau e Maingueneau consideram: ―A imagem discursiva de

(26)

que determinam, parcialmente, a apresentação de si e de sua eficácia em uma determinada cultura‖ (2004, p. 221).

Tais atitudes e características do enunciador constroem seu ethos,

sejam elas planejadas conscientemente ou não, e também confirmam a

impossibilidade de um discurso ser ou pretender ser neutro. Aliás, o eu que

enuncia sempre leva em conta um tu ao construir seu enunciado e isso reitera

a não neutralidade de um discurso. A respeito desses actantes da enunciação, José Luiz Fiorin diz: ―Ambos constituem o sujeito da enunciação, porque o primeiro produz o enunciado e o segundo, funcionando como uma espécie de

filtro, é levado em consideração pelo eu na construção do enunciado‖ (2008, p.

137).

Refletindo mais sobre as dimensões abarcadas pela noção de ethos,

Maingueneau acrescenta:

Esse ethos recobre não só a dimensão verbal, mas também o conjunto de determinações físicas e psíquicas ligados ao ―fiador‖

pelas representações coletivas estereotípicas. Assim, atribui-se a ele

um ―caráter‖ e uma ―corporalidade‖, cujos graus de precisão variam segundo os textos. O ‗caráter‘ corresponde a um feixe de traços psicológicos. Quanto à ―corporalidade‖, ela está associada a uma

compleição física e a uma maneira de vestir-se. Mais além, o ethos implica uma maneira de se mover no espaço social, uma disciplina tácita do corpo apreendido através de um comportamento. O destinatário a identifica apoiando-se num conjunto difuso de representações sociais avaliadas positiva ou negativamente, em estereótipos que a enunciação contribui para confrontar ou transformar: o velho sábio, o jovem executivo dinâmico, a mocinha

romântica...‖ (2008, p. 18).

(27)

É interessante que toda essa visão que o auditório tem de um enunciador pode iniciar-se antes mesmo de um discurso ser proferido. Vejamos:

O ethos está crucialmente ligado ao ato da enunciação, mas não se pode ignorar que o público constrói também representações do ethos do enunciador antes mesmo que ele fale. Parece necessário, então, estabelecer uma distinção entre ethos discursivo e ethos pré-discursivo. Certamente existem tipos de discurso ou de circunstância para as quais não se espera que o destinatário disponha de representações prévias do ethos do locutor: assim é quando lemos um texto de um autor desconhecido. Mas isso funciona de outro

modo no domínio político ou na imprensa ―de celebridades‖, por

exemplo, em que a maior parte dos locutores, constantemente presentes na cena midiática, é associada a um tipo de ethos não-discursivo que cada enunciação pode confirmar ou infirmar. (MAINGUENEAU, 2008, p. 16).

Como neste estudo tratamos do discurso publicitário, citamos como exemplo a presença de um comediante conhecido em uma determinada peça publicitária. Antes que ele fale ou se expresse por meios não verbais, o enunciatário, somente em ver sua imagem, já cria uma expectativa de que haverá algo de humorístico no vídeo a que irá assistir. Tal expectativa poderá se confirmar ou não.

Mas ainda que uma pessoa esteja diretamente relacionada a uma

imagem, devemos sempre considerar seu ethos inserido no discurso, em uma

situação comunicativa bem definida. A esse respeito, Maingueneau diz:

- o ethos é uma noção discursiva, ele se constrói através do discurso,

não é uma ‗imagem‘ do locutor exterior a sua fala;

- o ethos é fundamentalmente um processo interativo de influência sobre o outro;

(28)

Se o ethos é um processo de influência sobre o outro, como vimos acima, então ele está estreitamente associado à persuasão. Segundo Aristóteles, é o tipo de prova mais importante para se persuadir um auditório.

Obtém-se a persuasão por efeito do caráter moral, quando o discurso procede de maneira que deixa a impressão de o orador ser digno de confiança. [...] o caráter moral deste constitui, por assim dizer, a prova determinante por excelência. (s/d, p. 33).

O filósofo grego considera que o caráter atribuído a nós é o que nos fará ou não dignos de confiança. É o que gera persuasão. Mais uma vez

confirmamos o que dissemos sobre o ethos estar mais no plano do parecer ser

do que no plano do ser. Basta observarmos o uso do termo ―impressão‖ na fala de Aristóteles, que ainda acrescenta:

Para inspirar confiança, importa sobremaneira [...] que aquele que fala mostre-se sob certo aspecto, faça crer que se encontra em determinadas disposições a respeito dos ouvintes, e, além disso, encontre estes nas mesmas disposições a seu respeito. (ibidem, p. 97).

É importante atentarmos para o fato de que um enunciador não pode contentar-se em tentar passar uma imagem de si próprio a um auditório, pois se esses ouvintes não crerem nessa representação, não haverá confiança e, consequentemente, não haverá convencimento ou persuasão. Isso porque o ouvinte é um juiz, que avalia a figura e o discurso de seu interlocutor a todo momento.

Para Dominique Maingueneau, a persuasão não se dá apenas porque o

auditório reconhece o ethos do orador. Deve haver uma identificação bem

(29)

A persuasão não se cria se o auditório não puder ver no orador um homem que tem o mesmo ethos que ele: persuadir consistirá em fazer passar pelo discurso um ethos característico do auditório, para lhe dar a impressão de que é um dos seus que ali está. (2008, p. 15).

Esse estudioso também oferece fundamentos teóricos para nosso

estudo ao relacionar suas reflexões sobre o ethos com a publicidade. Ele diz

que o discurso publicitário contemporâneo mantém uma ligação privilegiada

com o ethos, já que associa os produtos oferecidos a uma maneira de habitar o

mundo. E essa ligação não deve ser tão implícita, tão velada: o ethos

publicitário é feito para ser imediatamente reconhecido.

José Luiz Fiorin acrescenta que a eficácia do discurso está ainda diretamente ligada à adesão do enunciatário ao discurso:

O enunciatário não adere ao discurso apenas porque ele é apresentado como um conjunto de idéias que expressa seus possíveis interesses, mas sim, porque se identifica com um dado sujeito da enunciação, com um caráter, com um corpo, com um tom. Assim, o discurso não é apenas um conteúdo, mas também um modo de dizer, que constrói os sujeitos da enunciação. O discurso, ao construir um enunciador, constrói também seu correlato, o enunciatário. (2008, p. 157).

Dito isso, voltemos nosso olhar para o segundo tipo de prova: aquela que se fundamenta nas disposições que se criam no ouvinte.

1.4 Paixões

Antônio Suarez Abreu lembra-nos de que somos mais emocionais do que racionais. Sendo assim, é importante estimular as emoções dos ouvintes nos mais diversos tipos de discurso, sobretudo naqueles cujo objetivo

(30)

audiência empática. PATHOS, em grego, além de enfermidade, significa

sentimento. EM, preposição, significa dentro de. Ouvir com empatia quer dizer,

pois, ouvir dentro do sentimento do outro‖ (2002, p. 39). Deste ponto de vista,

consideramos que esse ato de ―ouvir com empatia‖ precisa fazer parte dos

propósitos de um orador, que quer penetrar no sentimento de seus ouvintes, os quais, por sua vez, também se sentirão envolvidos pela empatia daquele que enuncia.

Segundo Abreu, nossas emoções básicas, primárias são: a alegria, a tristeza, a raiva, o medo e o amor. Dentre elas, a alegria e o amor são consideradas emoções eufóricas, às quais estão ligados nossos valores. Já a tristeza, o medo e a raiva são emoções disfóricas. Qualquer uma destas pode ser despertada em um dado discurso, dependendo do objetivo do enunciador.

Nos primeiros capítulos do livro dois da Retórica, Aristóteles reconhece o

fato de que é necessário que um orador reconheça as paixões, os sentimentos que influenciam os ouvintes no julgamento de um discurso. O orador precisa saber o que pensam, sentem, opinam, esperam aqueles a quem se deseja persuadir. O enunciatário não é, pois, um ser passivo. Para o filósofo, as paixões são: cólera, calma, amor, ódio, temor, confiança, vergonha, imprudência, favor, piedade/compaixão, indignação, inveja, desprezo. Assim

como o ethos, elas devem ser observadas em uma situação discursiva e não

como sentimentos definitivos.

Devemos ter em conta que as paixões não são provocadas aleatoriamente, mas têm que ser observadas de acordo com as tendências dos ouvintes em manifestá-las. Além disso, é necessário considerar o que o orador

deseja com seu discurso. A esse respeito, Aristóteles afirma: ―De sorte que,

quando for vantajoso para a nossa causa excitar o temor nos ouvintes, convirá

levá-los a acreditar que estão ameaçados de sofrer – dado que outros mais

poderosos que eles também sofreram‖ (s/d, p. 111).

(31)

paixões são ao mesmo tempo modos de ser (que remetem ao ethos e determinam um caráter) e respostas a modos de ser (o ajustamento ao outro)‖

(2000, p. XLVII). O pathos, então, contamina o ethos. Um auditório, de acordo

com suas características, expectativas, desejos, influencia na construção do

ethos de um orador.

Meyer acrescenta que os homens devem ser classificados segundo suas paixões, seus sentimentos preponderantes, para que os oradores possam abordá-los em seus discursos e agir sobre eles:

As paixões servem para classificar os homens e descobrir se o que sentem é necessário para que quem quer convencê-los aja sobre eles. Há tantas paixões quantos auditórios, talvez mesmo julgamentos, com seus lugares-comuns, seus topoi. (ibidem, p. XXXVIII).

O estímulo aos sentimentos está intrinsecamente ligado à persuasão. Provocar paixões é um ato tão poderoso, que influencia no julgamento que se

pode fazer de um discurso ou de um orador: ―Obtém-se a persuasão nos

ouvintes, quando o discurso os leva a sentir uma paixão, porque os juízos que proferimos variam, consoante experimentamos aflição ou alegria, amizade ou ódio‖ (ARISTÓTELES, s/d, p. 33). E ainda: ―Ora, as paixões são as causas que introduzem mudanças em nossos juízos, e que são seguidas de pena e de prazer‖ (ibidem, p. 97).

Aristóteles observa que, como temos desejos acompanhados da razão,

nossa inteligência nos persuade a procurá-los: ―A maior parte dos desejos vão

acompanhados de algum prazer; quer nos recordemos de os ter experimentado, quer esperemos vir a experimentá-los, gozamos de uma espécie de prazer‖ (p. 71).

Para despertar determinado sentimento, é preciso, além de se conhecer o auditório, que ouvintes e oradores se identifiquem. Essa identificação é

(32)

representações que fazemos dos outros, considerando-se o que eles são para nós, realmente ou no domínio de nossa imaginação‖ (MEYER, 2000, p. XLI).

José Luiz Fiorin também considera que deve haver uma harmonia entre o ethos do enunciador e o pathos do enunciatário para que um discurso seja eficaz:

A eficácia do discurso ocorre, quando o enunciatário incorpora o éthos do enunciador. Essa incorporação pode ser harmônica, quando éthos e páthos ajustam-se perfeitamente (é o caso do enunciatário da Folha ou do Estado) ou complementar, quando o éthos responde a uma carência do páthos (é o caso dos manuais de auto-ajuda, em que a um enunciatário inseguro, confuso, que busca segurança, corresponde um enunciador cheio de certezas. (2008, p. 157).

Para Michel Meyer, a estrutura retórica das paixões é constituída por: orador, ouvinte e imaginação. Segundo ele, é a imaginação que mantém presentes as sensações causadas pelos/nos discursos. As paixões são representações, que visam a definir a identidade do sujeito em relação ao outro. A referência ao outro varia se ele é visto como superior, igual ou inferior. De acordo com esse estudioso, ―Identidade e diferença, supostas ou reais, eis o que na verdade parece governar a estrutura aristotélica das paixões‖ (MEYER, 2000, p. XLIX).

(33)

2 O discurso publicitário

2.1 Considerações iniciais sobre a publicidade

Os autores que nos dão apoio teórico sobre a linguagem e as técnicas da publicidade, em geral, não estabelecem diferença entre os termos ―publicidade‖ e ―propaganda‖. Entretanto, Armando Sant‘Anna, Ismael R. Júnior e Luiz F. D. Garcia, embora reconheçam que as duas palavras sejam, hoje, usadas indistintamente, mostram-nos que há, sim, uma sutil diferença de significados. Eles consideram:

Publicidade deriva de público (do latim publicus) e designa a qualidade do que é público. Significa o ato de vulgarizar, de tornar público um fato, uma idéia, enquanto propaganda é definida como a propagação de princípios e teorias. [...] muitos preferem usar publicidade em vez de propaganda; contudo, hoje em dia, ambos os termos são usados indistintamente, particularmente no Brasil. (2010, p. 59).

Já Antônio Sandmann define:

Em português publicidade é usado para a venda dos produtos ou serviços e propaganda tanto para a propagação de idéias como no sentido de publicidade. Propaganda é, portanto, o termo mais abrangente e o que pode ser usado em todos os sentidos. (2010, p. 10).

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Diante disso, é possível pensar que os textos publicitários retratam e ao mesmo tempo criam uma sociedade. Eles têm conquistado cada vez mais espaço porque vivemos no mundo do consumo, em que há uma parcela da população que pode consumir além dos produtos apenas de subsistência e porque há um mercado de massa e meios de comunicação para que essa publicidade chegue até ela.

Não é por acaso que sua expansão se deu no final do século XIX, com o aumento das tecnologias e da produção em massa, e com o surgimento das primeiras agências publicitárias. E como várias empresas produziam mercadorias de qualidade mais ou menos igual a preços mais ou menos iguais, houve, então, superprodução e subdemanda, o que gerou a necessidade de estimular o mercado. Por isso, a técnica publicitária transitou da ―proclamação‖ para a ―persuasão‖, com o objetivo de vencer os possíveis concorrentes. Jorge S. Martins (2008, p. 24) aponta, de forma bem precisa, o ano de 1808 como marcante para a publicidade brasileira, pois foi nesse ano que o jornalismo chegou ao Brasil e trouxe consigo a propaganda impressa, que divulgava a venda de casas, escravos, medicamentos etc., valendo-se de uma linguagem bastante adjetivada, simples e objetiva. A primeira agência brasileira de propaganda, denominada ―Empresa de Publicidade e Comércio‖, foi criada em 1891. Já a partir do século XX, os textos publicitários passaram a ser cada vez mais aprimorados e foram criadas escolas de propaganda.

Esse estudioso considera que não há uma ―língua própria da publicidade‖; o que há são técnicas e estratégias linguísticas recorrentes nos

anúncios. Dentre elas, segundo o autor (ibidem, p. 33), destaca-se o uso da

norma linguística falada, que facilita a compreensão dos destinatários. Hoje, a linguagem desses textos está ainda mais dinâmica e sintética, com o objetivo de promover maior adesão do público. Vejamos:

(35)

Para conseguir levar a sociedade ao consumo, a linguagem publicitária apresenta, portanto, tanto características reais de um produto, quanto características subjetivas.

A tentativa de persuasão nos textos dessa natureza faz todo sentido se levarmos em conta que não temos apenas necessidades básicas materiais de consumo, mas também temos necessidades sociais: amor, amizade, aceitação social, reconhecimento do outro. Sobre isso, T. Vestergaard e Kim Schroder consideram que: ―os objetos que usamos e consumimos deixam de ser meros objetos de uso para se transformar em veículos de informação sobre o tipo de

pessoa que somos ou gostaríamos de ser‖ (2004, p. 7,8).

Além dos produtos essenciais ao nosso cotidiano, consumimos também artigos ―supérfluos à nossa sobrevivência‖ e, quanto mais ―desnecessários‖ forem, mais eles têm de ser anunciados de forma persuasiva e não apenas informativa. Dessa forma, para um anunciante chegar ao valor social de um produto, ele precisará valer-se da persuasão e o discurso publicitário enquadrar-se-á perfeitamente no âmbito dos textos declaradamente persuasivos. O filme publicitário, neste caso, é forte aliado na campanha para vender melhor. Por isso há um grande investimento também neste setor, pois a construção desses filmes envolve muitos profissionais e empresas a serviço da venda. Com tantos interesses econômicos em jogo, a empresa anunciante fará de tudo para conseguir atingir seus espectadores.

O discurso da publicidade é permeado pela venalidade. É uma enunciação que quer e tem que vender. É, pois, um discurso autoritário, já que precisa persuadir e direcionar para o consumo.

(36)

Uma vez captada a atenção do leitor, o anúncio deve mantê-la e convencê-lo de que o tema daquele anúncio específico é do interesse dele. Além disso, o anúncio tem de convencer o leitor de que o produto vai satisfazer alguma necessidade – ou criar uma necessidade que até então não fora sentida. Por fim, não basta que o cliente em potencial chegue a sentir necessidade do produto: o anúncio deve convencê-lo de que aquela marca anunciada tem certas qualidades que a tornam superior às similares. (2004, p. 71).

Tiago Barreto, em sua obra sobre roteiros para filmes publicitários, chega a dizer que a originalidade desses textos pode garantir a atenção do público: ―Há comerciais que vendem por causa do produto, e outros, por causa da idéia‖ (2004, p. 46). Para Barreto, a propaganda deve ser surpreendente, marcante, memorável e inteligível, além de despertar a curiosidade do espectador, pois, segundo ele, a curiosidade é o método de pesquisa mais antigo e mais moderno que existe. É interessante que para conseguir ser marcante, o comercial não tem de apresentar nada tão fora do comum. O autor diz que o roteiro deve contar uma história e que sua matéria-prima principal deve ser o cotidiano.

Apesar de terem um alto custo para veiculação, as peças publicitárias em vídeo transmitidas pela tevê têm grande vantagem sobre as impressas ou radiofônicas. A televisão atua sobre as atividades psicológicas, políticas, criativas, culturais, morais, econômicas, educacionais, entre outras. Ela ainda possibilita que o produto seja mostrado de forma dramatizada, como se fosse ao vivo e permite que se combine linguagem escrita, falada e visual, o que garante à ideia o máximo de força.

(37)

gêneros apresentados. Antônio Sandmann também crê que conquistar a atenção do público é um grande desafio da linguagem da propaganda:

Tendo em vista que o destinatário da mensagem propagandística, o comunicatário, principalmente o urbano, vive num universo saturado de estímulos, que o mesmo, nem que se disponha a isso, não consegue dar atenção e assimilar todas as mensagens que lhe chegam via rádio, televisão, jornal, revistas, outdoors, etc., a linguagem da propaganda enfrenta o maior dos desafios: prender, como primeira tarefa, a atenção desse destinatário. [...] Prender a atenção do leitor ou ouvinte parece ser a porfia maior. (SANDMANN, 2010, p. 12).

Após ser definido um bom tema para atrair o público, há outros passos a serem percorridos pelos publicitários.

2.2 Em busca da adesão dos espectadores

Vestergaard e Schroder comentam como Lund resume a tarefa do homem de propaganda. Este deve seguir os seguintes passos: ―1. chamar a atenção; 2. despertar interesse; 3. estimular o desejo; 4. criar convicção; 5. induzir à ação‖ (2004, p. 74).

Quanto às duas primeiras tarefas, os autores declaram que muitos anúncios as apresentam integradas em uma só unidade, porque um dos meios mais comuns de chamar a atenção é mostrar a alguém que o produto oferecido é de seu interesse. ―Os elementos de um anúncio responsáveis por essa tarefa, como vimos, são o título mais a ilustração e o slogan, se os houver‖ (ibidem, p. 84).

(38)

autores para as imagens dos vídeos também. Refletiremos mais sobre os

títulos e slogans no momento em que analisarmos as peças publicitárias.

De acordo com Vestergaard e Schroder, os meios mais comuns para despertar a atenção do receptor são: fazer uma afirmação favorável do produto

no título ou no slogan; usar frequentemente recursos como hipérboles,

generalizações; prender a atenção por meio de uma pergunta; despertar a curiosidade do leitor; induzir algo inesperado para o contexto; usar figuras de retórica como o trocadilho, a metáfora, o paralelismo, a rima, a linguagem coloquial; fingir que o texto não é um anúncio, ou seja, apresentá-lo na forma de outro gênero, como uma história em quadrinhos, por exemplo. (p. 88-93).

Sobre as duas tarefas seguintes – estimular o desejo e criar convicção –

os estudiosos afimam:

Para criar verdadeira convicção sobre a superioridade de um produto em relação aos concorrentes, o anunciante precisa de uma ‗Proposta Única de Venda‘ (PUV), mas, no atual nível tecnológico, é muito raro

que um produto exiba uma qualidade que esteja faltando por completo nos concorrentes. Por isso, o mais provável é que as PUVs que surjam sejam essencialmente estéticas [...], como o sabonete transparente ou a pasta de dentes com listas. (VESTERGAARD; SCHRODER, 2004, p. 96).

A partir dessa perspectiva, podemos inferir que tanto o produto, quanto o consumidor e o anúncio passam por um processo de estetização. Este procedimento mostra o esforço dos anunciantes em vencer a concorrência. Sobre isso, os autores complementam: ―Em termos literais, ‗fazer a estética‘ quer dizer alguma coisa parecida com ‗agradar por meio de impressões sensoriais‘[...]‖ (ibidem, p. 240). Fazer estética também é dar uma ideologia ao

produto. Por exemplo, mostrar uma família e caracterizá-la como ―família feliz‖.

(39)

A liberdade que os anunciantes têm de elogiar a qualidade de seus produtos torna as afirmações menos dignas de crédito. Há várias formas de evitar isso. Um dos métodos é pôr uma celebridade recomendando o produto, diretamente ou por associação. (p. 97).

Os anúncios também podem ganhar credibilidade afirmando que fazem o que todos reconhecem como positivo e relevante. Por exemplo, preservar o meio ambiente. Enfim, mostrar credibilidade é muito importante nesses textos, já que a publicidade sempre desperta desconfiança na sociedade.

Sobre a tarefa de induzir à ação, ou persuadir, Vestergaard e Schroder (ibidem, p. 99) expõem que o ―homem de propaganda‖ não deve parecer estar se impondo ao público, pois isso pode gerar uma reação negativa à mensagem. O anúncio deve, então, induzir à ação e é o que a maioria deles faz.

Os autores dizem até que, dificilmente, uma peça publicitária utiliza-se do imperativo ―compre‖. Para eles, os verbos mais frequentes são: ―experimente, peça, adquira, tome, pegue/solicite, use, chame/faça, corra,

venha/veja/dê/lembre-se/descubra, sirva/apresente/escolha/procure‖ (p. 100).

Todos esses verbos garantem que a venalidade fique em segredo, atenuam a ideia de que se está querendo que o consumidor compre. ―Comprar‖ tem uma carga de significado que reporta a algo negativo: desfazer-se de alguma coisa para obter outra, enquanto que ―adquirir‖, por exemplo, implica conquistar, passar a ter posse de algo. Às vezes, os anúncios vêm em forma de aparentes conselhos. É o contexto que nos dirá se um enunciado está mais mascarado em forma de conselho ou se ele de fato apela à ação.

(40)

Segundo Tiago Barreto (2004, p. 35, 36), há alguns pontos a serem levados em consideração quando o assunto é público-alvo, na linguagem dos

publicitários, target. Para ele, há alguns pressupostos fundamentais: 1) O filme

publicitário não é feito para agradar qualquer público; 2) Não se devem fazer filmes ―parados‖, pois o espectador não é estático; 3. Se for para mudar uma

atitude ou preconceito do target, isso tem de ser feito de forma delicada; 4. Não

se deve insultar a inteligência do espectador; 5. É fundamental que seja impactante, pois uma pessoa recebe cerca de 10.000 mensagens/dia e um filme publicitário não pode ser apenas mais uma dessas mensagens; 6. O produto deve ser apresentado como algo que traz não só um benefício pessoal, mas também como algo que traz um benefício social; 7. O filme publicitário não deve impor um comportamento, mas deve ajudar o espectador a escolher. Ele acrescenta:

Você deve saber o que o target pensa, o que gosta e o que não gosta de ver, o que ele espera do produto, que pontos de sua personalidade são tocados mais facilmente. Aja como um psicólogo. Quanto mais você conhecer esse paciente-consumidor, mais fácil será entrar em sua mente e colocar lá dentro –na área de ―produtos preferidos‖ – o seu produto. (BARRETO, 2004, p. 35).

Essas considerações de Barreto aproximam-se muito do que vimos no capítulo anterior, sobre conhecer o auditório. Conhecer bem o público a quem nos destinamos não é apenas um acessório, mas é uma das mais necessárias e indispensáveis estratégias de comunicação. Isso fica ainda mais evidente se

falamos em público-alvo de peças publicitárias. A escolha do ethos que vão

mostrar, dos protagonistas dos vídeos, dos seus papéis sociais, tudo importa para haver uma identificação com o público-alvo. Uma personagem pode

personificar a imagem tradicional e desejável de família – de mãe, por exemplo,

se o produto apresentado for um alimento a ser oferecido a crianças. Observemos:

(41)

de opinião, procuram determinar os valores e imagens que exercem maior apelo junto ao público de uma dada publicação. (VESTERGAARD; SCHRODER, 2004, p. 108).

Conhecendo bem os espectadores/leitores, os anúncios tentam preencher as necessidades desse público ―de modo que a carência de uma

identidade se transforme na carência do produto‖ (ibidem, p. 109).

Como dissemos, diante da tevê, por exemplo, não captamos absolutamente todas as informações que nos são transmitidas. Filtramo-las, captamos as mais importantes, eliminamos as irrelevantes e, das informações que ficarem, aceitamos as que estão de acordo com as opiniões e valores que já possuímos. É uma espécie de economia de armazenamento de informação. E esses filtros são diferentes de pessoa para pessoa, dependendo de sexo, idade, classe sócio-econômica, etc. Desse modo, dependendo da ênfase que um anunciante quer dar, deve fazer as ideias veiculadas pelo texto publicitário irem ao encontro do público que quer atingir.

Uma das distinções comumente feitas entre diferentes públicos é a de gênero. Existe uma demarcação bem precisa de gêneros nas peças publicitárias, da mesma forma como existe na sociedade. Geralmente, não há espaço para mulheres ―masculinizadas‖ ou homens ―efeminados‖ nesse gênero de texto. Como escolhemos para análise peças cujos alvos são traçados por pertencerem a diferentes classes sociais e, também, por uma delas demonstrar ter a mulher como alvo, falaremos sobre a mulher como receptora e sobre a abordagem feita quando se tem em vista uma dada classe econômica.

2.3.1 A mulher como público-alvo

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os anúncios oferecem produtos que facilitem sua vida, dizem que sabem que ela conhece o preço das coisas, valorizam-na como dona de casa e trabalhadora. Permitem, pois, no mundo fantástico da propaganda, que a mulher exerça bem seus dois papéis sociais: dona de casa e profissional.

Em contrapartida, a mulher não é só elogiada e valorizada. Ela também fica presa a um ideal de beleza. Essa é a imagem dominante nos textos publicitários atuais. Isso mostra e cria ao mesmo tempo uma mudança de prioridades femininas. Se antes as mulheres queriam ser boas mães e donas de casa, agora elas querem ser tudo isso e também bonitas, com boa aparência física. Esse fator mudou a maneira como os homens olham para as mulheres, como elas se olham entre si e a mulher se transformou em um objeto para ser admirado.

Vestergaard e Schroder aprofundam-se na análise da mulher como público-alvo, ou melhor, da imagem distorcida e irreal que se passa sobre o feminino nas propagandas, já que nesses textos negam-se até mesmo características naturais das pessoas: ―A publicidade lida com uma arma poderosa ao sugerir que certos traços físicos (e até naturais!) são tema de maledicência e vitimam as mulheres que não estão à altura dessas definições de feminilidade‖ (2004, p. 123).

Como exemplo, os autores citam o seguinte caso manifesto em uma publicidade de cosmético:

Se os cílios da mulher não são compridos e escuros, conforme o modelo, é preciso fazer alguma coisa: a linguagem da propaganda não lhe dá a oportunidade de decidir se ela deseja seguir o modelo, mas apenas a de como se tornar uma perfeita versão de si mesma. (ibidem, p. 129).

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necessariamente como pagadora das despesas, mas como compradora oficial dos produtos que, supostamente, irão proteger o lar e os familiares.

Há anúncios – sobretudo os voltados para homens – em que a figura

feminina não parece ter outro objetivo em mente que não seja atrair o sexo oposto. Contudo, as mulheres modernas querem ser respeitadas pela sociedade, mostrando suas competências sociais de boa profissional, boa mãe etc. E os comerciais, na maioria das vezes, abordarão esse perfil de mulher, sem apelar claramente para a sensualidade. Em um dos anúncios analisados nesta pesquisa, observaremos a imagem dessa mulher moderna.

Mas não é só pelo sexo que o público-alvo é traçado. As classes sociais a que os destinatários pertencem também importam muito.

2.3.2 Classes sociais

É sabido que nem toda empresa oferece seus produtos e serviços às mesmas pessoas. É um tanto improvável, por exemplo, que uma propaganda de um carro de luxo seja destinada às camadas mais populares. Logo, as linguagens usadas na construção dos textos publicitários que visam a uma determinada classe econômica terão que se adequar ao que cada público compreende e espera.

Se o auditório a que se deseja persuadir toma como fator essencial o baixo preço de uma mercadoria, então faz sentido que o anunciante construa seu discurso sobre essa necessidade. Já no caso de um auditório que valoriza o luxo, independentemente do preço de um produto, o discurso será mais persuasivo quanto mais apresentar estes valores.

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classes média alta, média baixa, etc. Entre os trabalhadores, por exemplo, há os trabalhadores braçais, os empregados de escritório, entre tantas outras subdivisões e os autores reconhecem isso. Mas mesmo admitindo as diversas nuances sócio-econômicas da sociedade, eles comentam genericamente sobre as classes dominante, média e trabalhadora. Para os estudiosos, a classe dominante é a que mais aceita e busca a ideologia da competição individualista, até porque já é privilegiada em termos econômicos.

Faz sentido, então, que, se um público-alvo pertence a essa camada social, sejam-lhe oferecidos produtos que lhe garantam exclusividade e acentuem a sua individualidade.

Os anúncios dirigidos à classe média destacam o desejo de aspiração desse público. Individualiza-se a pessoa, o que lhe confere certa impressão de também pertencer ou poder pertencer à classe dominante.

E quando o alvo são as classes econômicas mais baixas, Vestergaard e Schroder consideram que ―neste caso, a publicidade exerce a função de catálogo, o qual permite aos leitores ambiciosos entrar em contato com os padrões da classe média que desejam imitar‖ (ibidem, p. 176).

Os autores dizem que as propagandas trabalham com o mito da Cinderela, mostrando aos espectadores uma possibilidade de mudar de classe.

Os anúncios querem garantir que nossa posição social está diretamente associada à quantidade de produtos que consumimos. Ao mesmo tempo, instigam-nos a desejar vivenciar o que só as classes econômicas superiores à nossa vivenciam. Há algo em comum desejado por todos: fazer o que todos fazem, manter-se à altura de todo mundo. E se há públicos diferentes, com aspirações diferentes, explica-se o fato de a linguagem da propaganda também ser distinta quando quer atingir uma ou outra camada social.

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Esse seria o primeiro conceito básico, que teria como causa o público a que se destina: um público, quando não analfabeto, com muito pouca familiaridade com a língua escrita. Isso, como se sabe, determina o tipo de linguagem utilizada e o próprio vocabulário. (2010, p. 27, 28).

Definido e estudado o público-alvo e conquistada a sua atenção, os publicitários vão em busca de alcançar a emoção dos espectadores.

2.4 A atuação da publicidade na emoção dos espectadores

Dissemos no primeiro capítulo que a estrutura retórica das paixões é constituída por orador, ouvinte e imaginação. Dentre estes, chama-nos a atenção a imaginação, pois dificilmente consideramos esse elemento como parte de um processo em que se busca a persuasão. E já que estamos tratando de textos publicitários, vale dizer que esses textos estão entre os que mais exploram a fantasia. A propaganda não só reflete o mundo real, mas também o do devaneio. Examinemos as considerações a seguir:

A maioria das pessoas concordará que muitos anúncios, tomados individualmente, funcionam ao nível do devaneio. Mostrando gente incrivelmente feliz e fascinante, cujo êxito em termos de carreira ou de sexo – ou ambos – é óbvio, a propaganda constrói um universo imaginário em que o leitor consegue materializar os desejos insatisfeitos da sua vida diária. (VESTERGAARD; SCHRODER, 2004, p. 179).

Referências

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