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Metodismo de imigrante e afro-brasileiros: Análise de possíveis tensões inter-étnicas na relação entre imigrantes metodista estadunidenses e população afro-brasileira na região Piracicaba no período de 1867 s 1930

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIENCIAS DA

RELIGIÃO

JOSÉ ROBERTO ALVES LOIOLA

Metodismo de imigração e afro-brasileiros:

Análise de alguns aspectos importantes da relação entre

imigrantes metodistas estadunidenses e população afro-brasileira

na região de Piracicaba no período de 1867 a 1930

.

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JOSÉ ROBERTO ALVES LOIOLA

Metodismo de imigração e afro-brasileiros:

Análise de alguns aspectos importantes da relação entre

imigrantes metodistas estadunidenses e população afro-brasileira

na região de Piracicaba no período de 1867 a 1930

.

.

Dissertação apresentada em cumprimento às exigências do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião, da Universidade Metodista de São Paulo, para obtenção do grau de Mestre.

Orientadora: Profa. Dra. Lieve Troch

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A dissertação de mestrado sob o título ―Metodismo de imigração e afro-brasileiros: Análise de alguns aspectos importantes da relação entre imigrantes metodistas estadunidenses e população afro-brasileira na região de Piracicaba no período de 1867 a 1930”, elaborada apor José Roberto Alves Loiola, foi apresentada e aprovada no dia 15 de Março de 2011, perante a banca examinadora composta por Profa. Dra. Lieve Troch (Presidente/UMESP), Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth (Titular/UMESP) e Prof. Dr. Edemir de Carvalho (Titular/UNESP).

_______________________________________________ Profa.Dra.Lieve Troch

Orientadora e Presidenta da Banca Examinadora

_______________________________________________ Prof.Dr.Jung Mo Sung

Coordenador do Programa de Pós-Graduação

Programa

: Pós- Graduação em Ciências da Religião

Área de concentração

: Linguagens da Religião

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Ao meu Pai, Joaquim Loiola e

À minha mãe, Rosélia Alves que não cessam de orar mim,

Às minhas avós, Maria Ferreira (in memoriam) e Maria Loiola (in memoriam)

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―Nem tudo o que se enfrenta pode ser mod

ificado, mas nada pode ser

modificado se não for enfrentado‖.

James Baldwin, para o epitáfio de

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AGRADECIMENTOS

Aprendi com a minha família desde cedo, que a nossa existência depende de uma enorme teia de solidariedade ampliada na medida em que vamos compreendendo que somos incuravelmente dependentes de outras pessoas. Na vida acadêmica não é diferente. Não se aprende sozinho. Trata-se de uma experiência não apenas criativa, mas profundamente coletiva. Com efeito, minha gratidão vai para:

A Profa. Dra. Lieve Troch, por sua amizade e orientações efetivamente decisivas, disciplinadas e iluminadoras durante a elaboração da presente dissertação;

O Prof. Dr. Geoval Jacinto da Silva, por suas palavras de incentivo que provocaram minha decisão de iniciar os estudos;

O Prof. Dr. Cláudio de Oliveira Ribeiro, pelo incentivo na elaboração inicial do meu anteprojeto de pesquisa e posterior motivação durante os estudos.

O Prof. Dr. Lauri Emílio Wirth, por sua amizade e sugestões preciosas para a conclusão do meu objeto de pesquisa;

A Profa. Dra. Sandra Duarte, por sua amizade e consistentes orientações metodológicas durante o curso;

A minha companheira Lisette Jung com quem compartilho a vida, não apenas pelo incentivo, ajuda nos trabalhos de correção e formatação do texto, pelos constantes questionamentos em relação ao texto, mas, principalmente por sua compreensão.

A minha mãe, Rosélia Alves e meu pai, Joaquim Loiola, pelo grande incentivo e inspiração para continuar os estudos;

Os amigos, Márcio Divino pelo grande incentivo para entrar no programa, mas também pela solidariedade sempre disponível e surpreendente; Tarcísio e Paulo Nogueira pelo apoio e suporte quando de minhas viagens à Piracicaba durante a pesquisa; Márcia, Rubens, Jefferson, Carlos José, Fernando, Marcos David, Marcos Martins, Maryurí Grisales pelo estímulo e companheirismo durante o curso.

O Grupo de pesquisa Netmall, pelas idéias e provocações ao meu projeto de pesquisa.

O Museu da Imigração de Santa Bárbara do Oeste e o Centro de Memória Martha Watts em Piracicaba pelo acesso ao seu acervo.

Agradecimentos especiais ao Instituto Ecumênico de Pós-Graduação em Ciências da Religião, pela hospedagem de qualidade durante o curso e ao Sistema de Bolsas Capes, que através do programa, tornou possível esta pesquisa.

(7)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

...

10

CAPÍTULO I

O CONTEXTO HISTÓRICO DA IMIGRAÇÃO DOS

FAZENDEIROS ESTADUNIDENSES METODISTAS E A REALIDADE

DOS AFRO-BRASILEIROS EM MEADOS DO SÉCULO XIX.

1. Os metodistas estadunidenses e sua herança européia... 14

1.1. A chegada do protestantismo nos Estados Unidos e o surgimento dos metodistas... 16

1.2. Fatores que determinaram a imigração dos metodistas estadunidenses para o Brasil... 22

1.2.1. Fatores econômicos... 26

1.2.2. Fatores políticos... 27

1.2.3. Fatores sociais... 28

1.2.4. Fatores religiosos... 30

1.3. Outras influências protestantes ... 31

1.3.1. Imigrantes alemães e a escravidão... 32

2. O contexto histórico dos afro-brasileiros no século XIX... 33

2.1. O colonialismo e o movimento abolicionista ... 34

2.1.1. A contribuição da mulher no processo da abolição... 41

3. Contexto histórico político brasileiro no século XIX... 43

3.1. Da chegada dos metodistas Confederados à abolição da escravatura ...46

3.2. Os afro-brasileiros e o mercado de trabalho no século XIX... 49

3.3. A religião das populações afro-brasileiras... 50

3.4. Representações dos afro-brasileiros na imprensa piracicabana no Século XIX... 52

(8)

CAPÍTULO II

OS AFRO-BRASILEIROS E A MISSÃO METODISTA

EM PIRACICABA DE 1867 ATÉ 1930.

1. As populações negras no imaginário metodista estadunidense... 57

2. O papel da educação na missão metodista em Piracicaba... 60

2.1. ―Negro não entra na igreja: espia da banda de fora‖... 63

2.2. Ecos da abolição na prática missionária dos metodistas... 65

3. Confederados metodistas e afro-brasileiros: uma convivência tensa... 67

3.1. A realidade dos afro-brasileiros em Santa Bárbara do Oeste ... 69

3.2. Relações inter-étnicas no contexto brasileiro do século XIX ... 71

3.2.1. Relações inter-étnicas em Piracicaba... 73

3.3. Imigrantes metodistas no imaginário dos afro-brasileiros de Piracicaba... 75

3.4. População afro-brasileira: conta vencida da missão metodista do século XIX... 76

4. Conclusão provisória... 78

CAPÍTULO III

INSERÇÃO E ASCENSÃO DOS AFRO-BRASILEIROS

NA INSTITUIÇÃO METODISTA EM PIRACICABA ATÉ 1930.

1. Institucionalização do movimento metodista em Piracicaba... 80

1.1. As questões inter-étnicas e o jornal oficial da Igreja Metodista... 82

2. Afro-brasileiros(as) na história da Igreja Metodista Central de Piracicaba entre 1883 a 1930... 83

2.1. Na membresia da igreja local... 84

2.2. Como pastores e pastoras da igreja local... 86

3. Afro-brasileiros(as) na história do Colégio Piracicabano... 86

3.1. Corpo docente e administrativo... 87

4. Possíveis implicações de tensões inter-étnicas no processo de autonomia da Igreja Metodista Brasileira... 88

5. Limites e horizontes metodológicos... 91

6. Conclusão provisória... 91

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 93

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 97

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LOIOLA, José Roberto Alves. Metodismo de imigração e afro-brasileiros: análise de alguns aspectos importantes da relação entre imigrantes metodistas estadunidenses e população afro-brasileira na região de Piracicaba no período de 1867 a 1930. UMESP. São Bernardo do Campo – SP. 2011.

RESUMO

Os imigrantes metodistas americanos que chegaram ao Brasil em meados do século XIX na região de Piracicaba, são majoritariamente do sul dos Estados Unidos e, portanto, escravocratas. Encontram aqui não apenas a oportunidade de reconstruírem suas vidas devastadas pela guerra de secessão (1861-1865), como também uma nova possibilidade de reviverem seus ideais escravocratas, num país ainda escravagista. Com efeito, a presente dissertação versa sobre alguns aspectos importantes das relações destes imigrantes com a população afro-brasileira, priorizando o recorte histórico entre 1867-1930 e procurando destacar situações históricas na região de Piracicaba. Na tentativa de reconstituir possíveis anseios de liberdade dos afro-brasileiros, sua resistência e luta pela abolição, a pesquisa discute também o contexto de transição do país em face do liberalismo emergente na economia e na política, o que facilitou em muitos aspectos a inserção do protestantismo. Em face do exposto, a fundamentação teórica será feita a partir de autores como Boaventura de Souza Santos (2006), Frantz Fanon (1968;2008), Abdias do Nascimento (1978), Eugene Genovese(1983), Justus Gonzalez (2007), Antonio Gouveia Mendonça (2008), José Carlos Barbosa (2002), Júlio Chiavenato(1988), Eugene Harter (1985), Peri Mesquida (1994), Judith MacKnigth Jones (1967) entre outros. O distanciamento da missão metodista em relação às necessidades das populações afro-brasileiras demonstra que os metodistas direcionaram sua missão mais para si mesmos, como colônia e posteriormente, para as elites. As populações pobres, incluindo os afro-brasileiros da região, não foram contempladas. Isso pode explicar a ausência destes nas instituições metodistas até 1930 quando da autonomia da Igreja Metodista do Brasil em relação à Igreja Metodista Episcopal do Sul dos Estados Unidos.

Palavras chaves:

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RESUMEN

Los inmigrantes metodistas americanos que llegaron al Brasil a mediados del síglo XIX, en la región de Piracicaba, fueron en su mayoría del sur de los Estados Unidos y, por lo tanto, eran favorables a la esclavitud. Encuentran aquí no solamente una oportunidad para reconstruir sus vidas devastadas por la guerra de secesión (1861 – 1865), sino que también ven una nueva posibilidad de revivir sus ideas esclavistas en un país en donde la esclavitud aún existía. De esta forma, la presente disertación aborda algunos aspectos importantes de las relaciones con la población inmigrante africano-brasileño, priorizando el período histórico comprendido entre 1867-1930 y tratando de poner de relieve las situaciones históricas en la región de Piracicaba. En un intento de reconstituir el potencial de la libertad de los afro-brasileña, Llamando la atención para las ansias de libertad de los afro-brasileros, su resistencia y lucha por la abolición, la investigación discute también el contexto de transición del país frente al liberalismo emergente en la economía y en la política, lo cual facilitó en muchos aspectos la entrada del protestantismo al país. Con base en lo expuesto, la fundamentación teórica contará con la contribución de autores como Boaventura de Souza Santos, (2006), Frantz Fanon (1968;2008), Abdias do Nascimento (1978), Eugene Genovese (1983), Justus Gonzalez (2007), Antonio Gouveia Mendonça (2009), José Carlos Barbosa (2002), Júlio Chiavenato (1988), Eugene Harter (1985), Peri Mesquida (1994), Judith MacKnight Jones (1967) entre otros. El distanciamiento de la misión metodista con relación a las necesidades de las poblaciones afro-brasileras demuestra que los metodistas orientaron su misión más para sí mismos, como colonia, y posteriormente para las élites. Las poblaciones pobres, incluyendo los afro-brasileros de la región, no fueron contempladas. Esto puede explicar su ausencia en las instituciones metodistas hasta 1930, año en que se da la autonomía de la Iglesia Metodista Episcopal del sur de los Estados Unidos.

Palabras clave:

(11)

INTRODUÇÃO

A população do Brasil é majoritariamente negra, assim, nossa formação histórico-cultural teve uma forte influência da cultura africana. Contudo, foi somente neste século que a valorização da história e da cultura de origem africana tomou a forma de uma lei, a saber, Lei nº 10.639/03. Esta lei obriga a inclusão no currículo das escolas públicas e privadas brasileiras conteúdos tanto da história, quanto da cultura da África. Daí a relevância do tema.

Este trabalho pretende estudar alguns aspectos da relação dos imigrantes metodistas estadunidenses e a população afro-brasileira da região de Piracicaba entre os anos 1867 e 1930. A pesquisa se desenvolve na perspectiva do método histórico, conforme a definição de Eva Maria Lakatos (1983:14). O método oferece subsídios para o desenvolvimento da presente pesquisa, na medida em que se situa no âmbito teórico da teologia e história, pressupondo um diálogo com outras áreas do saber, especialmente das ciências sociais e humanas.

A delimitação do tema se justifica tanto pelo fato de que a chegada dos imigrantes metodistas se dá exatamente num período em que a escravatura ainda era legal no Brasil, quanto pelo fato de que em 1930 a missão metodista se tornou uma instituição independente dos Estados Unidos. Então, desde o segundo império, passando pela abolição da escravatura, até a proclamação da república os metodistas Confederados tiveram que se relacionar de alguma forma com os negros e negras africanos. A pesquisa propõe não apenas contribuir na discussão da valorização étnico-racial, mas, principalmente explicitar como os primeiros metodistas americanos que imigraram inicialmente para o Brasil se relacionaram com as populações de origem africana.

É importante destacar que o metodismo brasileiro é apenas uma das várias versões do cristianismo protestante que migrara para o Brasil em meados do século XIX. Além de ser também uma segunda versão do metodismo europeu, originado a partir das idéias do padre anglicano João Wesley (1703-1791).

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Num primeiro momento, vêm em busca de novos horizontes econômicos, apostando inclusive no escravismo dos negros. Posteriormente, as constantes imigrações passam a ter cunho vocacional com a chegada do missionário Rev. Junius E. Newman em 1867 na região de Piracicaba-SP. Autores como Jones (1967), Dawsey (2005), Harter (1985) dentre outros serão referenciais chaves para abordagens mais específicas sobre os Confederados que migram e se estabelecem em Santa Bárbara do Oeste e Piracicaba.

Reily (1984:86-87) ao recuperar o contexto histórico da guerra de secessão americana (1861-1865), considera que o perfil dos imigrantes metodistas que vem para o Brasil em

1867; ―derrotados pelo Exército dos Estados unidos e arruinados financeiramente...‖. Isto

posto, a pesquisa suscita a discussão sobre o desenvolvimento do fenômeno religioso metodista em meio aos principais desdobramentos da história dos afro-brasileiros no período dado.

A propósito, o fenômeno religioso não apenas catalisa e modela a cultura, mas também pode interferir na economia e no próprio jogo de poder de uma dada sociedade. Portanto, a religião pode propor transformação ou a manutenção do status quo de uma dada

sociedade. Entretanto, de acordo com Mo Sung (2008:41), tal transformação ou estagnação se deve mais aos sujeitos religiosos que às instituições em si, pois a história é feita por atos de gente.

As idéias de Fanon (1968) serão muito úteis tanto para a explicitação do perfil relacional dos afro-brasileiros em relação aos brancos, quanto na demonstração do papel da religião cristã, no período dado. A importância desse referencial se dá em função de sua pertinência para uma leitura crítica do período colonial na qual recupera a perspectiva dos grupos silenciados, dando-lhes voz e protagonismo.

Para pensar as principais implicações da inserção protestante no Brasil, os autores Duncan A. Reily (1984), Gonzalez (2007), Mendonça (2008), Salvador (1982) serão fundamentais.

Atrás da história oficial do Brasil, há uma história negada e sobreposta, a saber, a dos afro-brasileiros. Para explicitar o seu protagonismo na história brasileira do século XIX, usaremos as idéias de Nascimento (1978), Carneiro (1997), Neves (1986), Genovese (1983), Chiavenato (1988) entre outros.

(13)

Em face do exposto, a presente pesquisa tem como problema principal a seguinte questão: Há indícios de que houve uma tensão inter-étnica na relação entre imigrantes metodistas estadunidense e a população negra na cidade de Piracicaba?

No primeiro capítulo, será discutido o contexto histórico da imigração dos metodistas estadunidenses e os principais fatores que motivaram sua vinda para o Brasil. Será investigado se os fatores foram exclusivamente missionários. Como pano de fundo serão enfatizados aspectos da realidade brasileira no século XIX, no sentido de explicitar o ambiente social e político quando da chegada dos Confederados. É propósito também nesse capítulo, situar historicamente os afro-brasileiros, destacando suas condições sociais e econômicas. Assim como sua resistência, luta, abolição e contribuições para a sociedade brasileira. Finalmente, será discutido alguns estereótipos das populações negras na imprensa de Piracicaba e em que medida, tais representações faziam parte do imaginário dos imigrantes metodistas.

No segundo capítulo, a pesquisa propõe uma reflexão sobre possíveis tensões de imigrantes Confederados metodistas e afro-brasileiros a partir do contexto de implantação da missão metodista, limitando-se até 1930. Será discutida as possíveis representações dos Confederados no imaginário afro-brasileiro. Sabe-se que entre 1867 a 1930, aconteceu o processo de abolição. A intenção é tentar responder quais foram as principais contribuições dos metodistas nesse processo? E Como estes receberam a proclamação da libertação dos escravos? Para tanto, buscar-se-á identificar até que ponto a perspectiva racista do velho Sul estadunidense esteve presente entre os Confederados e como esse imaginário aparecia nos vários tipos de relacionamentos com os afro-brasileiros. Será também abordado no capítulo em questão em que medida pode ser verificado na proposta pedagógica do colégio piracicabano a preocupação com os afro-brasileiros.

Serão testadas as hipóteses de que os imigrantes metodistas Confederados não migraram por motivos estritamente missionários; que o metodismo de imigração ignorou as populações afro-brasileiras e que em função disso, é muito difícil identificar a inserção e ascensão destas populações nas instituições metodistas no período de 1867 a 1930.

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I. O CONTEXTO HISTÓRICO DA IMIGRAÇÃO DOS

FAZENDEIROS ESTADUNIDENSES METODISTAS E A

REALIDADE DOS AFRO-BRASILEIROS EM MEADOS DO

SÉCULO XIX.

Introdução

Este capítulo aborda a transição do metodismo estadunidense para o Brasil e os fatores determinantes desta imigração. Ao tentar delinear o construto epistemológico desses imigrantes metodistas que chegam inicialmente advindos de Juquiá, Iguape, Americana, Santa Bárbara do Oeste até Piracicaba no final do século XIX, o capítulo abordará um breve histórico do metodismo americano, e posteriormente, a história de origem e de luta dos negros afro-brasileiros, procurando situá-los no Brasil do século XIX , a partir dos condicionamentos sócio-econômicos, sob os quais viveram. Será dada maior ênfase aos afro-brasileiros1 da cidade de Piracicaba.

1.

Os metodistas estadunidenses e sua herança européia

A priori, é importante afirmar que o metodismo americano deve ser pensado no contexto dos desdobramentos históricos do colonialismo euro-americano, tendo seu epicentro na Inglaterra. A propósito da advertência de Santos (2006:40-41) que ao abordar sobre a

―essencialização e a provincialização da Europa‖, afirma que apesar de sua influência

subalternizante no mundo, ela não deve ser pensada como um ―ente‖ monolítico. Ou seja, não

se deve pensar o colonialismo apenas a partir da Inglaterra por exemplo. Todavia, do ponto de vista metodológico parece ser mais adequado começar pela Europa, por ser de direito e de fato, o arcabouço histórico-epistemológico dos imigrantes metodistas americanos.

1

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Em Santos (2006:53), há a convicção de que a recuperação da indignação mesclada à memória-histórica dos atores silenciados que entraram para a história ―ilustrada‖ como

espectros, se constitui numa etapa fundamental para que na reinvenção do passado, seja restituída a capacidade de explosão e redenção num presente ampliado.

[...] ―Articular o passado historicamente não significa reconhecê-lo ‗como verdadeiramente foi‘. Significa apoderarmos de uma memória tal como ela

relampeja num momento de perigo ‖[...] tornando impossível o

inconformismo dos mortos, torna impossível o inconformismo dos vivos[...] ( BENJAMIN apud SANTOS, 2006. p54)

Assim como Santos (2006:54) chama a atenção, é com a intenção de acordar os

―mortos e os vivos‖ que será desenvolvido a seguir a incursão histórica, procurando explicitar

o ―espírito‖ epistemológico europeu, a partir do século XVI e a sua ―encarnação‖ histórica a

partir do século XVII na América. Nesse sentido, a presença de aspectos míticos, religiosos e filosóficos nas narrativas historiográficas analisadas, lançam luz sobre a história de formação da cultura norte- americana, amplificando as vozes e ações das populações afro-americanas como denunciantes de um colonialismo europeu que na tentativa de sufocamento dessas vozes, se utilizou ora do discurso da religião, ora do discurso hegemônico da ciência moderna.

Acredita-se que a explicitação histórica da resistência e luta dos colonizados afro-americanos e a sua influência nas transformações políticas econômicas e religiosas dos Estados Unidos, corrobora a idéia de que as populações africanas em tempo algum, foram passivas durante a instituição escravista, o que para Santos (2006), é uma precondição para pensarmos uma teoria da emancipação social a partir do passado, e de algum modo, virarmos as costas para um futuro supostamente predeterminado.

Nesse sentido, antes do início da investigação a respeito das causas motivadoras do fluxo imigratório dos metodistas do sul dos EEUU para o Brasil de 1867, convém revisar um pouco a história do protestantismo americano como fruto das transformações históricas da Europa. A propósito, é fundamental sublinhar desde já, que o protestantismo americano é um projeto de inspiração européia. E isso nos remete automaticamente ao mito Europa tão bem explicado por Bauman (2006:7-20). Segundo ele, a cultura européia sempre se impôs como

―uma busca pelo infinito, uma verdadeira ―aventura‖.

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mesma perspectiva, por sua vez Hinkelammert (2008:8) recupera o mito de Prometeu, O titã que roubou o fogo dos deuses dando-o a humanidade. Que enganou a Zeus e que no seu suplício no Cáucaso personificou a liberdade, a sabedoria e a serenidade. O mesmo é eternizado na busca incessante pelo conhecimento e pelo aperfeiçoamento da vida, ainda que sempre provisória. De certo modo, também pode ser comparado ao ethos do protestantismo metodista estadunidense, quando relacionado à ―doutrina do destino manifesto‖.

Hinkelammert (2008) lembra-nos que a cultura ocidental foi alimentada pelo fogo e pelos contraditos de Pandora, presentes do titã, descobrindo não apenas a ―consciência‖, mas

também o que é ―ser humano‖ e de sobra, aprendendo a manipular os deuses. E esse conhecimento ou esse fogo esclarecedor faz emergir a ―era da civilidade‖ ou a civilização européia. Para Hinkelammert, o cristianismo ocidental inverteu a proposição teológica: ―Deus se fez homem‖ para; ―Homem se fez Deus‖ ou ―Deus se fez cristão‖, desenvolvendo um teísmo prometéico, fundindo civilização ocidental com cristianização ocidental.

Posteriormente a doutrina do ―destino manifesto‖ irá refletir essa idéia, alimentando o seguinte moto: Os Estados Unidos são brancos, protestantes e democráticos e é exatamente a partir dessa perspectiva que as treze colônias se tornariam independentes da Inglaterra em 1776.

1.1.

A chegada do protestantismo nos Estados Unidos e o surgimento

dos metodistas.

O século XVI coincidiu com a transição da idade média para a moderna, ocasião em que novamente, o cristianismo se reconfigura e assume a agenda cultural vigente. Inevitavelmente a reforma protestante se tornou emblemática para entendermos os primórdios do modernismo que irá lançar as bases para o individualismo, a liberdade e a ampliação da

―cultura européia para todas as terras‖, em nome de uma ―missão‖. Todavia, convém atentar para o que Weber (2004:30) afirma: ―a Reforma significou não tanto a eliminação da

dominação eclesiástica sobre a vida de modo geral, quanto a substituição de sua forma vigente

por uma outra‖. O autor exemplifica denunciando que a dominação do calvinismo em

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Oportunamente, Weber demonstra como a ―consciência-doutrinária‖ protestante opera

associada à ideologia capitalista. Essa doutrina instauraria uma prática social que procura refletir a visão de mundo retratada nela mesma. Desse modo, Weber (2004:29-83) procurar construir conceitualmente ―o espírito capitalista‖ analisando as diferenças teológico-doutrinárias entre o catolicismo e o protestantismo alemão identificando aspectos de alguns tipos do protestantismo clássicos e suas conexões com as anotações de Benjamim Franklin.

Ao considerar a indicação de Gonzalez (1987:31), sobre a doutrina do ―Destino Manifesto‖, surgida a partir de 1845 entre norte- americanos protestantes e a indicação de Mendonça (2008:89-90) sobre a ―Doutrina da Igreja Espiritual‖, formulada a partir do velho

sul estadunidense como forma de racionalização teológica do escravismo, talvez seja possível inferir, guardadas as devidas proporções do contexto histórico, uma razoável relação com a tese weberiana.

Todavia, mesmo considerando algumas pertinências do pensamento de Weber, esta pesquisa não o considera um referencial adequado para explicitar a consciência de ―rebeldia‖2

das populações afro-americanas e afro-brasileiras, acentuadamente abafadas pelos discursos dominantes tanto na historiografia católica, quanto na protestante.

Com efeito, retomando a história do cristianismo, o protestantismo europeu, ao contrapor-se ao ―monarquismo‖ preconizado pelo catolicismo, irá a partir do contexto burguês, semear o que viria a ser o republicanismo e a democracia. A propósito, Cairns (1995:288) indica a ―Paz de Westfália‖ em 1648, não apenas como o fim da guerra dos 30 anos, mas principalmente como um redesenhamento da cartografia européia na qual os territórios da Holanda, França, Suécia e a Prússia seriam reconhecidos como independentes. Esse fato, portanto, ajudou na superação do feudalismo e na instauração definitiva do laicismo (separação da Igreja do Estado).

Segundo Cairns (1995:248-250), essa mudança de cosmo-visão irá provocar intensas perseguições em particular às várias formas de protestantismos emergentes; luteranos, anglicanos, radicais e reformados e os fluxos migratórios serão conseqüências dessas perseguições; europeus que vão para a Holanda, Prússia, África do Sul e para as Carolinas do Sul e do norte nos Estados Unidos. Conforme Mendonça (2008:75-76), antes mesmo da imigração, o primeiro sermão protestante naquela região foi proferido por Francis Fletcher

2

(19)

em 1579. Afirma que a Igreja Anglicana estabeleceu definitivamente os primeiros protestantes na região de Jamestown, Virgínia e em 1607, em Maryland:

[...] mas os protestantes que iriam marcar o espírito do protestantismo americano seriam os puritanos e os sucessivos desdobramentos do puritanismo. Perseguidos por questões político-religiosas, os puritanos da Inglaterra emigraram em grande número para terras da América. Em 1620, os Pilgim Fathers atravessaram o oceano no Mayflower e fundaram a colônia de Massachusetts. A emigração puritana foi muito intensa entre 1628 a 1640[...] (MENDONÇA; 2008 p.76).

Mendonça indica que os primeiros grupos protestantes presentes na América do Norte, anglicanos, congregacionais e presbiterianos, teologicamente eram calvinistas. Os primeiros missionários metodistas para a América começaram a chegar a partir de 1768.

De acordo com Gonzalez (2007:21), em fins do século XVIII, o governo britânico começa a assumir mais formalmente o governo das colônias. Os colonos por sua vez passam a reivindicar sua independência rejeitando tanto a presença dos regimentos militares britânicos em suas terras, como se negando a pagar os altos impostos à coroa. Sucessivos conflitos armados entre colonos e governo britânico irão apressar a proclamação da independência dos Estados Unidos, em 4 de Julho de 1776.

Em face do exposto, parece que o metodismo inglês esteve associado aos mesmos objetivos da colonização européia na América,

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necessidade de mão de obra barata, assim como o alto ―ônus‖ pago pelas populações

indígenas ao perder seus territórios, suas vidas, culturas e religião.

Para Boaventura de Souza Santos (2006:28), não se pode perder de vista ao analisar sociedades colonizadas, os padrões discriminatórios latentes. A partir de Gonzalez (2007:19-28) é possível inferir que no caso dos Estados Unidos, as constantes migrações durante seu

processo ―civilizatório‖, tanto provocou o ―encobrimento do outro‖3 no caso, os índios e os

negros, como ajudou também na construção de uma sociedade marcadamente fragmentada cultural e religiosamente, o que explica as profundas tensões inter-étnicas na história americana.

Nessa linha de pensamentos, um dos padrões discriminatórios muito presente na história dos Estados Unidos foi a visão ―essencialista‖ que dicotomizou as relações entre

brancos e negros; indígenas e hispânicos, americanos e asiáticos. Não é gratuito, que o

―denominacionalismo religioso‖, tenha seu berço histórico nos Estados Unidos.

Gonzalez (2007: 20,37-42) ainda chama a atenção para o impacto da cultura colonialista na religiosidade estadunidense:

[...] Boa parte da ideologia que serviu de base para o movimento separatista, e para o estabelecimento da democracia capitalista norte-americana, consistia de uma religiosidade ―ilustrada‖ e anti-dogmática, como a que vimos surgir na Europa [...] A providência era, sobretudo um princípio de progresso. A nova nação era prova palpável do progresso humano [...] (GONZALEZ, 2007.p.20)

O autor entende que desde 1784, as relações polarizadas entre americanos nortistas e sulistas irão explicitar cada vez mais os interesses antagônicos entre o sul agrário escravocrata e o norte liberal com vocação cada vez mais industrial. Prova disso, foi a organização da Igreja Metodista Episcopal do Sul, na Conferência de Natal e a exclusão simultânea dos metodistas que insistiam em possuir escravos. Gonzalez indica que

[...] Tanto os metodistas como os batistas, a fim de atrair os brancos do sul, amoldaram-se progressivamente ao fato da escravidão, até o ponto em que em 1843, havia cerca de mil e quinhentos escravos nas mãos de mil e duzentos ministros e pregadores metodistas [...] Outras denominações adotaram posturas igualmente ambíguas [...] (GONZALEZ, 2007. p37).

3 Dussel, Enrique. ―1492 o encobrimento do outro‖. O autor analisa a origem do mito da modernidade como

(21)

Ainda para este autor, a partir de 1845 o termo ―Destino Manifesto‖ irá consolidar a

formação ideológica americana a partir da combinação das idéias de progresso e liberdade com a de superioridade do protestantismo sobre o catolicismo, reforçada pela atitude racista com base no fato de que a raça branca era superior, o que fundamentava a instituição da escravidão de pessoas negras e o saque dos territórios indígenas.

[...] Desde a chegada dos ―peregrinos‖ do Mayflower, existia a idéia de que

as colônias britânicas da América do Norte haviam sido fundadas com o auxílio divino, para cumprir uma missão providencial. Para muitos dos imigrantes posteriores, a América do Norte era uma terra prometida de abundância e liberdade [...] (GONZALEZ, 2007.p.31)

De maneira muito visível o tema da escravidão dos negros é um fio que perpassa toda a história dos protestantes e em especial dos metodistas americanos. Os Batistas, Presbiterianos e Metodistas sempre estiveram divididos em torno da questão. Em 1844, segundo registro de Reily (1984:86), os abolicionistas metodistas norte-americanos conseguiram que a Conferência Geral condenasse o Bispo da Geórgia, Osgood Andrew, que era dono de escravos. Este bispo nomearia o rev. Fontain Pitts em 1832 como missionário ao Brasil. Bem, a decisão da Conferência provocou a saída dos metodistas sulistas do resto da Igreja, oportunizando o surgimento da Igreja Metodista Episcopal do Sul em 1846;

[...] Em 1846, foi assim criada a Igreja Metodista Episcopal do Sul (IMES), que aceitou Andrew como bispo e ainda elegeu bispo William Capers um outro ministro sulista dono de escravos[...] (REILY, 1984. p86).

É evidente na história do movimento metodista americano o fato de que as tensões inter-étnicas sempre foram conseqüências da assimilação da epistemologia hegemônico-européia por parte do aparelho institucional e colocado em prática pelo pragmatismo eclesiástico. A propósito, segundo Cobra (1999) nessa época as relações entre brancos e negros tinham como referencial o racismo científico de Gobineau (1816-1882)4 e Chamberlain (1855-1927). Portanto, pressupõe-se que os metodistas americanos do século XIX, desenvolvessem esse tipo de mentalidade em suas relações inter-étnicas. Todavia, se

4

(22)

faz necessário esclarecer que a propósito das considerações feitas, não se está afirmando que João Wesley tenha sido escravagista. Barbosa (2002:82-83) ao abordar o tema da escravização negra, lembra-nos que Wesley se manifestou inúmeras vezes contrário à escravidão:

[...] Em seu diário de 23 de abril de 1737, por ocasião de sua permanência na América do Norte, ele registra a conversa amistosa que teve com uma jovem escrava. Ao perceber o profundo interesse dela pelos ensinamentos bíblicos que ele estava ministrando, J.Wesley anotou em seu diário o

seguinte: ― A atenção com a qual esta pobre criatura escutou os

ensinamentos é indescritível‖[...] (BARBOSA, 2002. p82).

Barbosa entende que além de Wesley se opor ao tráfico de escravos africanos, demonstrou tacitamente seu interesse pelo trabalho catequético para admissão destes no movimento metodista.

[...] As convicções de Wesley foram fundamentais à formação da mentalidade antiescravagista do metodismo norteamericano. Os primeiros Concílios metodistas nos Estados Unidos continuaram refletindo esse compromisso. No Concílio de Baltimore, realizado em 1780 com a presença

de 17 pastores metodistas, foi redigida a seguinte declaração: ―A escravidão é contrária às leis de Deus, do homem, da natureza e danosa à sociedade‖.

Nesse mesmo Concílio foi aprovada uma norma proibindo os membros da Igreja Metodista de possuir escravos. Caso os tivessem, eles deveriam ser alforriados, e não vendidos [...] (BARBOSA, 2002. pp82-83).

O supracitado autor entende que a Igreja Metodista americana originária tinha posições bem contrárias ao regime da escravização negra. Lembra-nos dos tempos dos grandes avivamentos quando muitos negros se tornaram pastores, pregadores e pregadoras metodistas.

[...] Em 1786, primeiro ano de uma estatística distinguindo a raça dos membros, entre um total de 18.791 metodistas havia 1.890 negros, portanto, mais de 10%. Em 1790 esse número aumenta para 11.682 e, em 1797, já havia 12.215, significando um quarto da totalidade dos seus membros [...] (BARBOSA, 2002. p84)

(23)

líderes, passam a defender a ênfase da conversão espiritual do escravo e não a sua emancipação sócio-econômica. E é no sul que esta perspectiva irá consolidar uma fundamentação bíblica da escravidão. Assim, o protestantismo tem início usando essa ênfase como uma estratégia para driblar os senhores de escravos. Depois, tal estratégia se transforma em controle social do escravo, relegando sua emancipação para a divina providência, a partir da famigerada doutrina da ―Igreja Espiritual‖. Esse, portanto, é o tipo de metodismo que

―arrumaria as malas para o Brasil‖.

1.2.

Fatores que determinaram a imigração dos metodistas

estadunidenses para o Brasil

De acordo com Jarnagin (2005, apud DAWSEY, 2005:112), não se pode perder de vista que a vinda dos confederados para o Brasil em 1867, cumpre uma agenda maior. Eles são parte da mutação do capitalismo europeu emergente ampliado pelas dinâmicas

identificadas pela autora como ―expansão e contração‖, com o objetivo da anexação do Brasil à economia americana, orientada pela lógica Centro-periferia.

Para Santos (2006:84), esse tipo de lógica capitalista global, neo-liberal e européia, tende a privilegiar o centro em detrimento da periferia. O que leva o autor a concluir, que nesse tipo de relação, não se leva em conta as ―diferentes circunstâncias e as aspirações dos povos, classes, sexos, regiões, etnias, etc. Bem como as relações desiguais, de exploração e de

vitimização [...]‖. Isto posto, pode se afirmar que em seu turno, o processo da imigração de metodistas estadunidenses no contexto brasileiro, não escapa à crítica ao colonialismo de Santos (2006:85), quando este, ao contrastar o ―conhecimento-regulação versus conhecimento-emancipação‖5, deixa claro que a principal conseqüência da hegemonia que se

utiliza da lógica centro-periferia é a falta de solidariedade.

Conforme bem registra Gonzalez (2007:37-41) no Grande Sul, os confederados lutaram desde 1818 contra a emancipação dos afro-americanos. Lutariam em 1888 em favor dos afro-brasileiros?

5

(24)

O pensamento hegemônico americano pode ser identificado também na crescente importação de maquinários agrícolas que a partir do método da globalização econômica, aos poucos foram determinando os rumos da economia brasileira. A propósito, posteriormente Sarah Bellona Smith Turner Ferguson (1943, apud DAWSEY 2005:85), descendente de confederados, iria narrar a história dos imigrantes sulistas, destacando a contribuição euro-americana na modernização de um Brasil sem casas de tijolos, de uma agricultura tradicional, e outros.

[...] Hoje, trens passam [...]e apitos invisíveis ecoam. As buzinas de automóveis acelerados ressoam pelas estradas, enquanto aviões zunem nos céus. E nem um eco sobrou para comemorar a existência dos trabalhadores, acostumados à labuta, poeira e calor, cujos passos não são mais ouvidos. Mas quem se importa?[...] Uma coisa é certa: essas coisas – condições –

ainda teriam sido as mesmas se a Inglaterra e outros países não tivessem começado a construir ferrovias e a desenvolver os lugares. Se pudéssemos dar uma olhada nas pessoas e seus costumes naqueles tempos, seria quase inacreditável. O carroceiro, por exemplo, andava descalço, com a camisa para fora; e a esposa, vestia-se numa chemise e braços expostos, uma saia larga amarrada na cintura, também descalça e com a cabeça descoberta [...] (FERGUSON apud DAWSEY, 2005. p85)

Laura Jarnagin (2005 apud DAWSEY, 2005:111-133), refletindo sobre a realocação dos imigrantes no atlântico juntamente com o capital econômico mundial, afirma:

(25)

do clero, diplomatas, oficiais militares, estadistas e uma porção de outras atribuições burguesas e de elite[...] (DAWSEY, 2005. p113)

Em termos políticos, o liberalismo dos imigrantes estadunidenses encontraria entre os liberais tupiniquins brasileiros, uma aliança assaz estratégica. Mas, por ora, é importante se manter o foco no contexto histórico do êxodo estadunidense a fim de que sejam claramente explicitados os possíveis fatores causais.

Reconstituindo o contexto da emigração sulista para o Brasil, Dawsey (2005)6 entende que

[...] Quando os exilados confederados deixaram os Estados Unidos, em meados da década de 1860, eles estavam reagindo a uma combinação de

fatores e condições de ―atração e expulsão‖, alguns reais, outros imaginários [...] essas condições muitas vezes envolviam teias complexas de relacionamentos pessoais e institucionais que se estendiam pelas fronteiras nacionais. O desapontamento em relação ao resultado da Guerra Civil foi a razão principal para o movimento. A maioria dos imigrantes consistia de pessoas que faziam parte do tecido social e militar do Velho Sul, pessoas essas que, com grande lealdade para os ideais da Confederação, não suportaram a idéia de se sujeitar ao domínio dos odiados yankees. Alguns desses sentimentos foram mantidos no Brasil, conforme demonstrado pela proeminência continuada da bandeira de batalha dos confederados na capela americana do Campo, próximo de Santa Bárbara do Oeste [...] assim como

pelas inscrições enfáticas nos túmulos do cemitério ao lado dele: ―Uma vez

rebelde, duas vezes rebelde, para sempre rebelde‖[...] (DAWSEY: 2005. p.49).

Essa informação pode ajudar não apenas a construção do perfil dos imigrantes, considerando que eram na sua maioria famílias de militares e colonos escravistas, mas também a inferência de sua conivência na instituição da escravização dos negros afro-americanos. Afinal, um dos motivos principais da Guerra de secessão, teria sido a decisão contumaz destes em manter a escravatura no sul dos Estados Unidos. Citando Goldman, Mesquida (1994:34-35) pontua os principais:

[...] Para Frank Goldman, a história da emigração dos cidadãos do Sul norte-americano teve a ver com quatro fatores fundamentais; a) o

6 Cyrus B.Dawsey e James M. Dawsey são descendentes de confederados e organizadores do livro; Americans:

(26)

desenvolvimento dos Estados Unidos, b) a expansão para o oeste, c) a escravatura, d) o destino manifesto [...] ( MESQUIDA, 1994. p.34)

Destaca-se, portanto, o fato desses imigrantes terem vivido a tensão em torno da abolição da escravatura em sua terra e virem para o Brasil num período em que a escravidão ainda era legal, além da expressiva propaganda do Brasil feita por marinheiros e aventureiros americanos. Daí, a nossa questão fundamental: como lidaram com os mesmos problemas aqui em 1888 e como se relacionaram com as populações afro-brasileiras?

Parte dessas perguntas foi respondida por Barbosa (2002:94-95), ao contrastar a idéia propagada entre os republicanos do Brasil da época de que os lavradores americanos viriam praticar apenas o trabalho livre.

[...] Partindo-se de uma perspectiva diferente, pode-se considerar que a proposta de imigração de sulistas norte-americanos ao Brasil tinha outra motivação. Diferentemente da motivação alardeada pelos liberais brasileiros, substratos sociais, conservadores, sobretudo do Sul dos Estados Unidos, viam com otimismo a preservação e o respaldo dados pelo governo imperial brasileiro ao regime e à grande propriedade escravocrata [...] (BARBOSA, 2002. p.94).

A propósito, este autor cita um trecho da carta do rev. Richard Hennington, de 18 de maio de 1867: ―O que mais chama atenção são os escravos negros, justo como em nosso país

antes da guerra. Tudo que existe por aí pode também ser encontrado aqui‖. Hennington ainda teria dito que em suas terras poderia se obter escravos a 800 dólares.

Dawsey (2005: 115) admite essa possibilidade, mas ao mesmo tempo não a confirma de todo.

[...] A continuação da escravidão também oferecia estímulos para, pelo menos, alguns dos migrantes empreendedores, apesar de a história subseqüente da população migrante revelar [...] que poucos compraram escravos e, os que assim fizeram, aparentemente não ficaram com eles por muito tempo. Esse aspecto da experiência confederada no Brasil tem representado um certo dilema para os historiadores: teria sido a escravidão um fator importante de atração, favorecendo a decisão de emigrar?[...] (DAWSEY, 2005. p115).

(27)

[...] Levaram 15 dias na estrada até alcançarem Campinas, lá ficaram algum tempo especulando terras, até lançarem suas vistas para a planície que se estende de Campinas até a Vila Nova da Constituição, mais tarde Piracicaba. Compraram terras da sesmaria de Domingos da Costa Machado, alguns quilômetros antes da Vila de Sta Bárbara, onde as terras lhes pareceram boas e planas para plantar algodão. Compraram os pretos Manuel e Jorge para os serviços da terra e Olímpia, para servir dentro da casa na falta da família. À custa de muita mímica e de muito esforço os escravos conseguiram entendê-los e chegaram a falar inglês muito bem depois de certo tempo [...] (JONES, 1967. p66)

Nesse sentido, é possível também notar que os imigrantes vêm em busca de sossego, estabilidade econômica, além de estarem exaustos e traumatizados com a guerra em sua terra. Portanto, dificilmente os imigrantes estadunidenses foram movidos por ideais missionários. A seguir alguns possíveis fatores causais de sua imigração para o Brasil em 1867.

1.2.1

Fatores econômicos

Barbosa (2002:78-79) sugere que o antigo puritanismo inglês perdera paulatinamente o fervor cristão face ao desenvolvimento econômico do sul estadunidense. Dentro desse contexto, deve-se lembrar da influência da Inglaterra na cultura escravagista americana, o que fortaleceu o comércio de escravos. Conforme nos lembra Reily (1981:166).

[...]―os marinheiros ingleses, atraídos pelo lucro fácil da venda de escravos

africanos para os colonos espanhóis na América do Sul, entraram no tráfico no fim do século XVI. Quando a Inglaterra começou a colonizar a América do Norte, a escravidão não tardou a aparecer lá[..] (REILY, 1981.p166). Barbosa chama a atenção para o fato de que ainda em 1667 já se verificava a idéia de que a concessão do sacramento aos escravos não significava sua libertação da escravidão. Desde cedo, portanto, o sul iria aprender a racionalizar teologicamente o escravismo, a fim de manter o status quo, negando inclusive acesso de escravos afro-americanos à educação.

(28)

Nos Estados Unidos, a tensão em torno da escravidão tivera majoritariamente uma motivação econômica, o que não quer dizer ausência de racismo. De acordo com Jones (1967: 31-32), enquanto o desenvolvimento econômico do sul teria aumentado por conta do aquecimento das exportações de algodão e tabaco para a Europa, a industrialização teria sido o ―carro-chefe‖ da economia nortista, que com a fabricação de maquinário agrícola, possibilitara também sua inserção no mercado da exportação. Todavia, como a base da mão de obra no sul era escrava, os lucros do sul eram maiores.

Jones relata que 57% da exportação nacional era de algodão produzido no sul, enquanto o norte precisava pagar a sua mão de obra. Somente depois de inúmeras incursões políticas o norte consegue proteção aduaneira, enquanto o sul se vê em desvantagem no senado, o que o levou à implementar a doutrina da soberania dos estados. De acordo com a autora, desde 1820 a 1850 foram feitos vários acordos políticos a fim de equacionar a situação norte-sul, todavia sem nenhuma aliança consistente.

1.2.2

Fatores políticos

Conforme Jones (1967:32-43), no cenário político, abolicionistas e escravistas caminhavam cada vez mais para uma secessão dos estados. Finalmente, a partir de 1861 invocando a soberania dos estados, a Carolina do Sul, Mississipi, Flórida, Alabama, Louisiana, Arkansas e Texas se separam da União, tornando-se estados confederados. Com o fim do mandato do Presidente Buchanan e início do mandato do Presidente Lincoln, explode a guerra. Jones registra passionalmente: ―Foi uma temeridade, coragem, audácia, loucura, aqueles agricultores, só 25% dos quais possuía escravos, levantar-se numa guerra contra o norte industrializado e com uma população três vezes maior‖ (JONES, 1964:43).

Nesse sentido, as divergências políticas e econômicas vividas entre o norte e o sul já haviam demarcado no protestantismo americano duas características internas: uma escravagista e outra abolicionista, conforme nos lembra Gonzalez (2007)

(29)

bem avançada no século XX, boa parte dos membros do Klan eram também membros de igrejas [...] (GONZALEZ, 2007. p.41).

Conforme já analisamos anteriormente, as idéias de Weber parecem ter eco em nossa discussão, na medida em que se constata na história dos Estados Unidos uma relação sistêmica entre doutrina religiosa e conduta política; protestantismo e movimento republicano; metodismo e escravagismo; expansão territorial e evangelização. A propósito, Mesquida (1994:102-103), lembra que desde a emancipação do metodismo americano da Inglaterra, a Igreja Metodista americana é parte essencial da história dos Estados Unidos. O autor corrobora citando discursos de alguns ex-presidentes americanos, A. Lincoln e Roosevelt, nessa ordem.

[...] A Igreja Metodista... é, pelo número de membros, a mais importante denominação americana...Não causa surpresa que a Igreja Metodista tenha enviado mais soldados aos campos de batalha, mais enfermeiras aos hospitais e mais orações aos céus que qualquer outra. Deus abençoe a Igreja Metodista [...] Penso que em nenhuma parte do mundo a Igreja Metodista desempenhou um papel tão importante e tão especial quanto nos Estados Unidos. Sua história está indissoluvelmente ligada à história do nosso país [...] (MESQUIDA, 1986.p 102).

1.2.3

Fatores sociais

Barbosa (2002:35) pontua que após a guerra de secessão, o saldo devedor coube ao sul: ―bancarrota, miséria, desolação, fome, destruição e saque‖. O autor identifica duas

opções que o velho Sul tinha nessas condições: submeter-se ao norte ou emigrar.

Apesar da pouca cientificidade dos textos de Jones (1967:47-53) a autora nos fornece informações que não se deve ignorar sobre os quatro anos de guerra civil devastaram o sul. Em imagens7 que falam por si, conforme se vê nos Anexos 1 e 2, a guerra foi incalculavelmente trágica tanto para os americanos do sul, quanto para os do norte. Harter (1985:15-24) reproduz a letra de uma canção popular do Sul de pós-guerra que ilustra tanto as atitudes dos confederados diante do exército da União, quanto aspectos de uma subjetividade marcada pelo ódio, melancolia, frustração e orgulho. Os danos subjetivos foram tão reais quanto os materiais para a população de confederados. Conforme já mencionado, a recessão

7 Imagens do acervo do Museu da Imigração em Santa Bárbara do Oeste, retratam as conseqüências da guerra

(30)

econômica e a baixa auto-estima do sul associado a uma profunda necessidade de se reconstruir tanto política, quanto economicamente sob a liderança do norte, o forçaria a se submeter a lideranças de ex-escravos e ianques (nortistas).

Impossibilitado de utilizar a mão de obra escrava, o sul, a médio e longo prazo, foi se enfraquecendo e motivando uma significativa onda migratória para várias partes do mundo, incluindo a América do Sul. Jones (1967:48) lembra que ―a nação foi levada à guerra, não pelo desejo de libertar os escravos; foi levantada a libertar os escravos pelo desejo de ganhar a guerra‖.

Contudo, conforme a mesma autora, vale salientar que durante o período da colonização, tanto no norte quanto no sul a escravatura teria sido prática generalizada em todos os Estados Unidos. Mas, por questões de ajustes climáticos e pouca rentabilidade, a escravização dos negros foi deixando de ser viável no norte.

Quanto aos reais motivos da imigração, há que se pesquisar um pouco mais. Por exemplo, Harter (1985:38, 76) admite os confederados estavam seduzidos pela possibilidade de comprar escravos. E de fato muitos compraram; os Olivers, Witackers, Thatchers, Fergusons, Halls, Harises, Lands e Coles. Os que não compraram, foi por não terem condições financeiras, além do fato de muitos escravos alforriados acompanharam voluntariamente os confederados. Todavia, o autor entende que o desejo dos americanos imigrarem para o Brasil não se restringia ao interesse de escravizar, pois se assim fosse, os confederados poderiam ter ido para Cuba, bem mais próximo e mais fácil de se estabelecerem lá.

Segundo o autor, também não seria um motivo econômico. ―A oportunidade econômica, sobretudo para os agricultores, estava bem próxima de seus quintais‖. Poderiam

ter comprado terra no Oeste a $1,25 o acre. Segundo o autor, fosse só a questão econômica, se mudar para o Oeste seria bem mais rentável se comparado às despesas brutas com a

colonização no Brasil. Na perspectiva do autor, ―estavam envoltos na lembrança da guerra e

(31)

1.2.4

Fatores religiosos

Apesar do grande despertar em fins do século XVIII promover milhares de conversões de escravos e não escravos nos estados do sul, conforme Barbosa (2002:83-89), a convivência entre brancos e negros nas igrejas ainda mantiveram a segregação racial.

Portanto, em busca de novos ares, protestantes sulistas migram para o Brasil, motivados pela esperança de encontrar paz e prosperidade, ainda que considerada a

perspectiva do ―Destino manifesto‖, inicialmente não teria sido também o único motivo.

Todavia, do ponto de vista da religião, viriam influenciados por uma mentalidade religiosa comparada à perspectiva fundamentalista que marcou o século XX.

Barbosa (2002:38-40) entende que após tentativas fracassadas entre 1836 a 1841, o movimento missionário metodista finalmente passou a ter cunho vocacional com a chegada do missionário Rev. Junius E. Newman, em 1867, na região de Piracicaba-SP. Contudo, as evidências históricas demonstram até aqui que num primeiro momento, os imigrantes vieram em busca de novos horizontes econômicos, apostando inclusive no escravismo dos negros afro-brasileiros. Posteriormente, o metodismo de imigração irá se cruzar com o metodismo de missão que por sua vez inspirado na "Doutrina da Igreja Espiritual‖ não irá considerar as populações afro-brasileiras como alvo missionário. Conforme Andrade (1995:150)

[...] pode-se afirmar que, durante o período que a antecedeu, ou mesmo

depois da libertação ―libertação dos escravos‖, a Igreja Metodista jamais

(32)

Newman, em 1867. Na verdade, o primeiro missionário oficialmente enviado pela Igreja Metodista Americana foi o Rev. John J. Ransom, que chegaria em 1876 e no mesmo período o Rev. James W. Koger, todos na região de Piracicaba, SP.

Apesar do foco desta pesquisa priorizar o metodismo de imigração, julga-se adequado apresentar um breve panorama de como outras formas de protestantismos no Brasil podem se inserir nesta discussão, afinal não foram somente os protestantes metodistas que vieram para o Brasil.

1.3.

Outras influências protestantes

Netto (2000:31) lembra em tempo, que já em 1630, protestantes calvinistas holandeses sob a liderança do Conde Maurício de Nassau, fariam a primeira tentativa missionária no Brasil no estado de Pernambuco.

[...] Nesse período, a pastoral calvinista, em processo de organização de sua Igreja no Brasil, baseado no modelo das Igrejas Reformadas Holandesas, decide pela concessão de liberdade religiosas, mesmo sendo exclusivas dos holandeses, procurou respeitar a tolerância às diferentes religiões. Essa liberdade religiosa e mesmo o trabalho livro dos escravos duraram pouco tempo. Com o objetivo voltado mais aos seus interesses econômicos do que aos pastorais, os calvinistas holandeses promoveram uma grande recaptura de escravos para trabalharem nas lavouras de cana-de-açucar[...] (NETTO, 2000. p31)

Conforme Reily (1984; 09, 25, 26), ―o protestantismo brasileiro tem profundas raízes e

vínculos com a Grâ-Bretanha, a Alemanha e os Estados Unidos‖. A propósito, o autor indica que o anglicanismo inglês, a partir de 1781 se beneficiou da abertura dos portos do Brasil para os países amigos de Portugal. Estes iriam instalar Capelas no Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco, São Paulo, Minas Gerais e no Belém do Pará.

(33)

1.3.1

Imigrantes alemães e escravidão

Sobre a relação dos luteranos com os escravos no Rio Grande do Sul, há um instigante artigo escrito por Elio E. Müller (2001) onde ele relata resultados de sua pesquisa sobre o então pastor Carl Leopold Voges (1848) através de depoimentos colhidos de pessoas idosas da localidade, quando de seu pastorado nos anos 70. Ele constata que tanto o pastor como vários outros colonos da época possuíam escravos e destaca a história, o papel e a influência da escrava Maria, da nação Nagô, na comunidade.

[...] Com base no Registro Eclesiástico, verifica-se que o primeiro dono de escravos na Comunidade Evangélica fora o próprio pastor Voges. Existe o assentamento de que, no dia 18 de janeiro de 1848, ele batizara o menino Anton, nascido em 18 de novembro de 1847, filho de Maria, da Nação Nagô, escrava do pastor Carl Leopold Voges, constando como padrinhos Magdalena Eigenbrodt e Catharina Jacoby[...]Conforme a tradição oral (FHO nº 01), a compra de escravos por parte de pastor Voges tivera a seguinte motivação: ao término da Revolução Farroupilha, o pastor Voges, vendo que a construção que servia como igreja e escola estava decaindo, propôs que se fizesse uma nova igreja, mais sólida, de pedra. Ele viajara muitas vezes até a Vila de Torres e assim pudera observar que os católicos da Colônia São Pedro também estavam com plano idêntico. Ele não desejava ficar para trás. Os colonos protestantes receberam o plano com satisfação. Porém, ninguém se dispunha a assumir o trabalho de talhar pedras. Diziam que uma tal tarefa só poderia ser destinada a condenados ou escravos[...] Na primeira viagem a Porto legre, ele seguiu até o mercado de escravos[...] Adquiriu então alguns escravos[...] (MÜLLER, 2001. p.75-78). Ainda conforme Reily (1987:102-103), os congregacionais teriam chegado com Robert Reid Kalley, a partir de 1858. A propósito da escravidão, o autor reproduz um documento no qual Kalley exorta sobre a escravidão. ―O que Deus dá ao escravo é para ser usado por ele, em seu próprio proveito. É escravo? Ninguém tem o direito de fazê-lo escravo, roubando-lhe a

liberdade pessoal...‖.

(34)

regular no Rio de Janeiro em 1861. Reily também não tem dúvida sobre as expectativas desses protestantes também oriundos do Sul dos Estados Unidos.

[...] Atraídos pela boa terra a preços acessíveis, pelo clima e pela ajuda do governo imperial, e ainda a possibilidade de adquirirem escravos no Brasil, o que não lhes era mais possível na sua terra de origem, estabeleceram colônias em diversos locais do Brasil. A que mais prosperou foi a colônia de Santa Bárbara do Oeste, onde foram constituídas Igrejas Presbiterianas, Batistas e Metodistas[...] (REILY, 1987. p111).

Mendonça (2008:50) chamou atenção para o fato de os confederados de Santa Bárbara terem servido de atração para os batistas, os quais também teriam sido escravocratas no velho sul. O autor registrou a fundação da primeira igreja batista brasileira em 1º de Setembro de 1871, em Santa Bárbara.

A seguir será analisado o cenário histórico, político, social e econômico brasileiro, quando da chegada dos imigrantes metodistas estadunidenses. Contudo, será priorizado inicialmente um breve levantamento das origens e da história de luta dos negros afro-brasileiros, buscando recuperar sua contribuição nos processos emancipatórios.

2.

O contexto histórico dos afro-brasileiros no século XIX.

Como bem denuncia Franz Fanon (2008:103-126), o negro, mormente é pensado a partir do período colonialista. É como se não tivesse história antes do regime escravocrata. A

imposição modernista da ―história única‖ tem emaranhado a real história das civilizações colonizadas. Portanto, a história dos negros não começa no Brasil em 1503-1535 com a

chegada das primeiras ―peças‖ (escravos).

(35)

Segundo a Universidade Emory8 de Atlanta/EUA, no período de 1501 a 1866, o Brasil recebeu 4.864.374 escravos africanos. Há que se escrever ainda a história dos negros afro-brasileiros.

Oportunamente, Fanon (2008) afirma que as várias histórias coloniais internalizaram no negro sua inferioridade. Razão porque é muito importante a desconstrução do discurso colonial e um contra-discurso valorizando as vozes silenciadas e histórias negadas como a dos negros afro-brasileiros. Lembra-nos Fanon, que os judeus foram discriminados por sua etnia e os negros, pela cor da pele. É de causar espanto o fato de na historiografia brasileira não ser enfatizada o protagonismo e a contribuição do negro na formação do país que ajudaram a construir.

2.1. O colonialismo e o movimento abolicionista

Conforme Santos (2006:182-183), a inferiorização dos índios e dos negros durante a colonização no Brasil é parte da estratégia de dominação européia e se manifesta através da

―guerra‖, da ―escravatura‖, do ―genocídio‖ e do ―racismo‖. E é diante desse construto que se torna urgente a recuperação das ―imagens desestabilizadoras‖ propostas por Santos (2006:81-82) há que se recuperar o espanto e a rebeldia- rebeldia como um antídoto ao conformismo, articulando ciência, ética, emancipação social e política.

Bernard Lepetit (1989,) ao discorrer sobre a micro-história, contrapõe-se à idéia de totalização e nos desafia a recompor as partes fazendo o trabalho inverso, mesmo correndo todos os riscos de certo positivismo histórico.

[...]As primeiras justificativas epistemológicas da microstoria atestam a pregnância do modelo macroanalítico. De um lado, os micro-historiadores pretendem se introduzir nos interstícios da análise serial e chegar até o

―vivido‖ e a experiência individual inacessíveis aos estudos agregados [...] (LEPETIT, 1989.p84).

Numa pesquisa bibliográfica, pinçar biografias negadas não é tão simples, pois esbarra-se com normas técnicas para se validar resquícios literários que nem sempre dispõem das informações para cumprir as exigências da academia moderna. É preciso garimpar autores, fatos, depoimentos, fragmentos literários, documentos, etc.

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O arquivo que se encontra disponível no site www.slavevoyages.org, contém cópia de quase 35.000 documentos

(36)

Parafraseando Fanon (1968:38), pode se afirmar com base em Lepetit que os colonos americanos que chegaram ao Brasil em 1867, faziam história e sabiam disso. E por isso se referiam constantemente à história de sua metrópole natal. A partir das obras de Harter (1985), Dawsey (2005) e Jones(1967) parece que os confederados estadunidenses alimentavam a idéia de que o Brasil era o prolongamento dos Estados Unidos,uma espécie de anexo. A propósito do colono, continua Fanon

[...] A história que escreve não é, portanto a história da região por ele saqueada, mas a história de sua nação no território explorado, violado, esfaimado. A imobilidade que está condenado o colonizado só pode ter fim se o colonizado se dispuser a por termo à história da colonização, a história da pilhagem, para criar a história da nação, a história da descolonização [...] (FANON, 1968. p38)

Um claro exemplo disso é o caso dos protestantes anglo-saxões em sua experiência de colonização na América nos idos de 1630, como já vimos anteriormente. O diagnóstico fanônico pode ser aplicado a eles à medida que se estabeleceram a partir das treze colônias na América, desterritorializando os índios e posteriormente escravizando os negros. Todavia, a história de luta dos afro-americanos, prova que apesar de toda a domesticação e amordaçamento que a religião possa provocar nas consciências dos colonizados, estes ainda podem irromper sua descolonização. Segundo Genovese (1983:26-27), em fins do século XVIII as revoltas de escravos tomaram outro sentido. Ao invés de ―assegurar a liberdade‖,

passaram a buscar tentativas de eliminar a escravidão como sistema social. Citando a revolta

de São Domingos, o autor chama a atenção para o caráter ―hemisférico‖ e quiçá, mundial desses movimentos.

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congelou ―perante o realismo grotesco do que se aceita só porque existe. Urge uma

reinvenção do passado como negatividade, produto da iniciativa humana‖, pois é a partir desta reconstrução que se pode ter interrogações viscerais e poderosas.

Genovese (1983:108) concorda que as revoltas negras contribuíram significativamente para os novos tempos de liberdade e igualdade para as populações negras.

[...] À parte as formas de militância e ação guerreira negras, tais como elas se manifestaram durante a grande guerra americana de 1861-1865, a eficácia direta da insurreição escrava se faz presente mais notavelmente nas bem sucedidas guerras quilombolas do Caribe e nas lutas quase insurrecionais dos escravos, nas Índias Dinamarquesas Ocidentais e no Brasil, durante as crises abolicionistas de 1848 e 1871-1889, respectivamente. Muito antes da emergência do abolicionismo e da Era da Revolução, as guerras quilombolas e as revoltas de escravos inibiram, mesmo moderadamente, a expansão e consolidação da escravidão [...] (GENOVESE, 1983. p108). Nesse sentido, a história de espanto das populações negras no Brasil e no mundo, pode inspirar principalmente a tomada de consciência cidadã frente às várias formas de escravidão ainda em curso. A propósito, o profetismo da religião cristã, apesar de suas profundas contradições históricas, ainda pode ser viável a partir do seu legado revolucionário dos hebreus a Jesus de Nazaré. O autor nos lembra que;

[...] O cristianismo dos escravos celebrava a liberdade e a salvação e fundia-se facilmente com a mensagem política da guerra revolucionária. A religião dos escravos, pelo menos durante o século XIX, normalmente evitava os apelos à insurreição e seguia o caminho da sobrevivência a longo prazo, num mundo de desigualdades sem esperanças, mas poderia voltar-se para canais revolucionários em determinados momentos[...] (GENOVESE, 1983. p122).

Referências

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