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Poéticas corporais: o corpo no ambiente natural: uma proposta contemporânea em arte visual

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE CENTRO DE EDUCAÇÃO, FILOSOFIA E TEOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO, ARTE E

HISTÓRIA DA CULTURA

PAULA FERREIRA TURA

POÉTICAS CORPORAIS: O CORPO NO AMBIENTE NATURAL –

UMA PROPOSTA CONTEMPORÂNEA EM ARTE VISUAL

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2 PAULA FERREIRA TURA

POÉTICAS CORPORAIS: O CORPO NO AMBIENTE NATURAL –

UMA PROPOSTA CONTEMPORÂNEA EM ARTE VISUAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação, Arte e História da Cultura.

Orientador: Prof. Dr. Norberto Stori

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PAULA FERREIRA TURA T929p Tura, Paula Ferreira.

Poéticas corporais : o corpo no ambiente natural : uma proposta contemporânea em arte visual / Paula Ferreira Tura. – 2014.

95 f. : il. ; 30 cm.

Dissertação (Mestrado em Educação, Arte e História da Cultura) - Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2014.

Referências bibliográficas: f. 88-90.

1.Arte e meio ambiente. 2. Artes visuais. 3. Corpo. 4. Cultura. 5. Natureza. I. Título.

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Poéticas Corporais: O corpo no ambiente natural – uma proposta contemporânea em arte visual

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Arte e História da Cultura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação, Arte e História da Cultura.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________________________________________ Prof. Dr. Norberto Stori – Orientador

Universidade Presbiteriana Mackenzie

__________________________________________________________________________________ Profa. Dra. Petra Sanchez Sanchez

Universidade Presbiteriana Mackenzie

_____________________________________________________________________________ Prof. Dr. Nardo Germano

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5 Afagar a terra. Conhecer os desejos da terra. Cio da terra, a propícia estação. E fecundar o chão*

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a meu orientador, Professor Doutor Noberto Stori que com generosas observações pontuais e precisas ajudou-me a adentrar no campo das artes, aguçou o meu olhar e me indicou possibilidades. Graças às suas observações este trabalho tomou forma e conteúdo.

Agradeço ao Professor Doutor Agnus Valente pelo aceite na composição à banca. Suas indicações bibliográficas foram essenciais para o desenvolvimento da pesquisa. Foi um grande prazer aprender a ver o mundo através de seu olhar. Pude apurar meu senso crítico e estético além de repensar condutas.

Agradeço à Professora Doutora Petra Sanchez Sanchez pelas perguntas realizadas. Sem estas jamais teriam ocorrido reflexões. Sem sua mediação para que eu fosse contemplada com a Bolsa CAPES de pesquisa foram essenciais para que eu pudesse realizar este trabalho.

Agradeço aos Professores Doutores Nardo Germano e Elcie Fortes Salzano Masini por aceitarem o convite à suplência para a banca.

Agradeço ao Mack Pesquisa e a CAPES pela concessão de bolsa de estudos que viabilizaram a realização deste estudo.

Agradeço ao meu marido Wilson Aguiar pela filmagem e fotografia das obras, suas dúvidas, sugestões e olhar crítico. É através de parceria que nossos laços se fortalecem.

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7 E por todas as filhas e velhas que apoiam o que é bom e afastam a obediência cega a qualquer supercultura que premie somente a forma nivelada e deprecie o pensamento Por elas...abençoadas sejam suas belezas, tristezas e buscas; que sempre se lembrem de que perguntas ficam sem resposta, até que sejam consultados os dois modos de enxergar: o linear e o interior.

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RESUMO

Esta pesquisa se utiliza da arte visual para sacralizar o contato do corpo com o ambiente natural. A autora que é uma artista pesquisadora escolheu a Arte Contemporânea como linguagem para suas intervenções. Desta forma, a obra foi escrita em Capítulo Único composto por: intervenção proposta pela pesquisadora com fotos e descrições, seguida de um artista de referência com imagens de seu trabalho e por fim uma análise do trabalho realizado contendo os conceitos e discussão de argumentos. Assim, estão em Body Art obras de pintura corporal, impressão corporal, molde de partes do corpo em gesso; em Performance Art o registro da projeção da sombra do corpo - durante a realização de movimentos de yoga e de projeção da sombra de folhas de árvores sobre o corpo; o encaixe do corpo em raízes de árvore e em espaços de uma construção em ruínas; em Arte Povera há a pintura em tronco de árvore, a construção de corpo feminino em areia com utilização de retalhos e em Land Art há a construção de pequenas árvores de tecido, a grafia na areia da praia, a construção coletiva de amaciamento de pedras, criação de rastros coloridos e caminhos de areia e por fim a intervenção com corante em esculturas e desenhos de areia. Todas as propostas artísticas acontecem em ambiente natural mais precisamente o litoral do Estado de São Paulo em relação ao qual a autora possui grande conhecimento e afinidade. O corpo, objeto principal deste trabalho sente e transparece a marca das inquietações que carrega como os padrões sociais impostos de comportamento e de estética, do tempo acelerado nos grandes centros e do convite à introspecção proveniente do contato com o ambiente natural. Carrega em si as memórias das escolhas feitas e caminhos traçados. As propostas aqui inclusas propõem a expressão que falta à fala, exprimem as dores do trajeto reflexivo, o ouvir, o sentir, o contemplar, o esperar.

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ABSTRACT

This research, through the visual arts sacralizes the contact of the human body with the natural environment. The author who is an artist-researcher has chosen the Contemporary Art as a language to her proposals. The dissertation was written in One Chapter composed as: interventions developed by the researcher with photos and descriptions followed by an artist of reference with images of it´s work and an analysis of the art work proposed by the researcher with concepts and discussion of arguments. To each posture of Contemporary Art there is a range of different art pieces to be viewed: Body Art – there is a body painting and imprinting, and cast´s mold of body parts; Performance Art - there are registration of the shadows produced by the body during an yoga practice and the projection of the shadow of a tree leave on top of a body and the match of the body with a tree and a ruin of a building; Arte Povera – there is a branch painted in red and the construction of a feminine body with sand and cloth; Land Art – there is a construction of little cloth trees, the drawings on the beach sand, a collective work to make rocks softer, the creation of colorful and sand paths and the interventions with ink on sand sculptures found at the beach.The body, main object of this work, feels and become visible the marks of restlessness that carry about the social imposed patterns of behavior and esthetics and the relation with the natural environment. Carry itself the memories of choices made and paths coursed. The art proposals here included express what the speech misses, express the pains of the reflexive path coursed, the listening, the feeling, the contemplation, the process of waiting.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1. Sol Lewitt.

Wall Drawing #146.Combinação das duas partes dos arcos azuis dos cantos para os lados e azul retilíneo, não retilíneo e linhas quebradas,1972

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Figura 2. Paula Tura. Pintura corporal, 2012

24

Figura 3. Paula Tura. Impressão de tronco, 2012

25

Figura 4. Paula Tura. Pintura corporal, 2013

26

Figura 5. Paula Tura. Impressão de tronco, 2013

27

Figura 6. Yves Klein.

Antrhopométrie de l’Époque bleue

, 1960

30

Figura 7. Paula Tura. Impressão de corpo, 2012

31

Figura 8. Escarificação africana

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Figura 9. Escarificação africana

33

Figura 10. Escarificação africana

33

Figura 11. RaioX

33

Figura 12. Paula Tura. Seio, 2012

34

Figura 13. Paula Tura. Ventre, 2012

35

Figura 14. Paula Tura. Mão e braço, 2012

35

Figura 15. Marc Quinn. Self, 2006

37

Figura 16. Paula Tura, Corpo de areia (processo de construção), 2013

38

Figura 17. Paula Tura. Corpo de areia (processo de construção), 2013

38

Figura 18. Paula Tura. Corpo de areia, 2013

39

Figura 19. Ana Mendieta. Silueta Works in Mexico, 1973-1977

41

Figura 20. Paula Tura. Série Yoga: Saudação ao sol, 2012

43

Figura 21. Liu Bolin. Hiding in the city 94: in the woods, 2010

45

.

Figura 22. Vito Acconci. Step piece, 1970

46

Figura 23. Paula Tura. Encaixe I, 2013

48

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11

Figura 25. Paula Tura. Encaixe III, 2013

49

Figura 26. Paula Tura. Raiz, 2013

51

Figura 27. Paula Tura. Corpo folha I, 2013

54

Figura 28. Paula Tura. Corpo folha II, 2013

54

Figura 29. Franz Krajcberg, Escultura em madeira

56

Figura 30. Paula Tura. Tronco sangrando, 2012

57

Figura 31. Franz Krajcberg. Sem tít ulo, Madeira

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Figura 32. Paula Tura. Mulher deitada, 2012

62

Figura 33. Paula Tura. Mulher deitada na areia, 2013

63

Figura 34. Leda Catunda. Paisagem com onça, 2009

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Figura 35. Gustav Klimt. Hope II, 1907-08

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Figura 36. Paula Tura. Árvores da areia, 2013

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Figura 37. Paula Tura. Mensagens, 2011

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.

Figura 38.. Andres Amador, Clouds

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..

Figura 39. Paula Tura. Pedras Macias, 2013

74

Figura 40. Paula Tura. Pedras Macias, 2013

74

Figura 41. Paula Tura. Rastros coloridos, 2013

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Figura 42. Andy Goldsworthy. Green to yellow leaves

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Figura 43. Paula Tura. Caminho de areia, 2013

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Figura 44. Richard Long. A line made by walking, 1967

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Figura 45. Paula Tura. Buracos, 2013

81

Figura 46. Paula Tura. Gato, 2013

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Figura 47. Paula Tura. Monstro, 2013

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 13

INTRODUÇÃO 15

CAPÍTULO ÚNICO 20

CONSIDERAÇÕES FINAIS 85

REFERÊNCIAS 88

APÊNDICE 91

APÊNDICE A – FOTOGRAFIAS 92

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APRESENTAÇÃO

“Quando o rubor de um sol nascente caiu pela primeira vez no

verde e dourado do Éden,

Nosso pai Adão sentou-se sob a árvore e, com um graveto, riscou na argila;

E o primeiro e tosco desenho que o mundo viu foi um jubilo para o coração vigoroso desse homem,

Até o Diabo cochichar, por trás da folhagem: “É bonito, mas será Arte?” (KIPLING apud MANGUEL, 2001, p.30)

Este trabalho se propõe a estudar a relação do corpo com o ambiente natural através da arte contemporânea. Apresenta pesquisas de embasamento teórico sobre algumas linguagens artísticas apontando artistas referenciais; Esta abordagem propõe-se a demonstrar a relação do corpo com o ambiente natural através de produções artísticas contemporâneas realizadas pela pesquisadora.

São articuladas duas Linhas de Pesquisa desenvolvidas dentro do programa de mestrado em Educação, Arte e História da Cultura, são elas: Culturas e Artes na Contemporaneidade que possui como cenário referencial as sociedades contemporâneas e se compromete a investigar as artes em suas expressões eruditas, populares e folclóricas, em diálogo com as mais diversas expressões; e Linguagens e tecnologias onde ocorrem pesquisas de cunho histórico-crítico dos processos de comunicação humana, seus impactos nas áreas das artes, da história e da educação, tendo como eixo as expressões das novas mídias.

Toda pesquisa foi realizada in loco, ou seja, realizada no litoral paulista: Praia de São Pedro e Enseada no Guarujá, litoral sul de São Paulo, Praia da Baleia e Paúba em São Sebastião e Praia do Perez e da Lagoinha em Ubatuba, litoral norte de São Paulo. Foram utilizados elementos naturais encontrados nestas praias, como areia, cogumelos, gravetos, pedras, água do mar, água dos rios, troncos de árvores, flores e produtos industrializados como tecido, pedras, sais de banho, corante e fita adesiva levados pela autora.

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14 toneladas de terra” (KRAUS, 1998, p.333) ou então das práticas de Body Art e Performance Art que recebem como cenário o ambiente natural.

Algumas das obras que serão apresentadas foram realizadas no ano de 2012, enquanto a autora cursava as disciplinas optativas: História e Filosofia do Corpo no Ocidente, ministrada pela Profa. Dra. Marcia Angelita Tiburi, Arte Brasileira e Meio Ambiente com os Profs. Drs. Norberto Stori e Petra Sanchez Sanchez e Sintaxe da Representação, no programa de Arquitetura e Urbanismo com o Prof. Dr. Carlos Alonso. Estas obras, motivadas inicialmente pelos conteúdos que estavam sendo apresentados, foram concebidas com alguma inocência e impulso criativo. Ao longo do tempo a autora aprofundou os conteúdos, pode conceituar e compreender melhor as obras criadas. Assim, cada obra desta dissertação, ao ser citada, trará a motivação e o embasamento teórico que levou a autora a concebê-la e o processo de concepção da mesma.

Todas as propostas apresentadas aqui fazem parte do acervo pessoal da autora, nunca fizeram parte de exposições de arte ou foram comercializadas. No entanto, vez ou outra estas produções são apresentadas como parte de workshops ou palestras proferidas pela autora como foi o caso do II Encontro de Pedagogia Profunda –pedagogiafundamentada em Jung1realizado em outubro de 2012 no Colégio Sidarta, em Cotia, SP.

Nessa perspectiva, é importante ressaltar que a autora dedicou-se por muitos anos a ministrar práticas de yoga e a facilitar vivências com a natureza para grupos, além de obter especializações em yoga e ecologia. Desta forma, é muito interessada nas concepções existentes sobre o corpo e a natureza em diferentes áreas de estudo pois entende que o corpo é a matéria que envolve a alma, servindo de campo de experimentação do mundo. Assim, o corpo é parte do espaço, é extensão do ambiente natural.

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INTRODUÇÃO

“Quando no céu as estrelas se despedem do firmamento e adormecem durante o dia, as estrelas da água saúdam ao céu enterrado no mar iniciando as tarefas do novo céu submarino”. (NERUDA, 1991, tradução nossa)

Desde criança sou frequentadora assídua do litoral paulista. Não havia nada mais importante para mim do que o contato com a água, a areia, o céu, o sol. Estar na praia era existir, era saber que eu pertencia a algum lugar, que minha vida tinha um propósito, que eu estava completa.

O retorno para a cidade era doloroso: Sem a evidência do ciclo do nascer e do pôr do sol, do reflexo nítido das sombras das árvores e dos corpos no chão, longe do cheiro da maresia, eu frequentemente me perdia no tempo e no espaço.

A praia sempre acolhe minhas leituras, meus pensamentos, minhas práticas de yoga, minhas longas caminhadas; restabelece meu corpo e minha mente; me ensina a contemplação; facilita a minha introspecção e criticidade. O convívio com o litoral torna-se, assim, essencial para a manutenção da minha vida na cidade, o que é ao mesmo tempo frustrante, pois vem da praia a energia que preciso para manter minhas atividades diárias longe dela.

A busca por um objeto de pesquisa não poderia ser outro senão o meu contato com a natureza, o litoral, a praia.

Em minha trajetória profissional obtive graduação em Pedagogia (1992-1995), Especialização em Yoga (2007-2009), Especialização em Ecologia, Arte e Sustentabilidade (2010-2011) e então ingressei no curso de Mestrado em Educação, Arte e História da Cultura (2011-2013) objetivando unir Arte e Meio Ambiente.

Cada vez mais com o olhar voltado para as questões de arte e meio ambiente e em paralelo aos cursos anteriormente mencionados passei a estudar:

a) Pedagogia Profunda - Jung na Educação, criada e desenvolvida pela francesa radicada no Brasil desde 1972 Celine Lorthiois, pedagoga e mestre em Psicologia da Educação pela PUC/SP.

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b) Vivências com a Natureza (Sharing Nature) – metodologia de atividades com a natureza desenvolvida por Joseph Cornell, educador e naturalista norteamericano. No Brasil, as Vivências com a Natureza são difundidas pelo Instituto Romã que conta com Rita Mendonça, bióloga e socióloga como diretora. Segundo MENDONÇA:

O potencial revolucionário da proposta da Sharing Nature está justamente no fato de conduzir as pessoas a um contato amoroso com a Natureza, e intensificá-lo e ampliá-lo a cada prática, de modo a criar alicerces em nossa experiência, ou seja, em nosso corpo e em nossa alma, preparando-nos para mudanças que conduzam a uma coerência entre o que sentimos e fazemos. (CORNELL, 1998, p. 15)

A partir destas experiências passei a registrar algumas ações que involuntariamente eu já desenvolvia, tais como: reproduzir partes do meu corpo em areia e gesso, a produzir colagem e pintura em tela, a escrever na areia, a pintar objetos encontrados na praia, a fotografar minhas práticas de yoga na praia e a proporcionar a meus alunos de Yoga algumas vivências que uniam Yoga, Natureza e Técnicas Artísticas através de workshops ministrados em minha própria escola de yoga ou em parques da cidade de São Paulo.

Esta pesquisa teve como propósito experimentar e construir objetos e imagens carregados de vida, de emoções, de sensações que possam explicitar a conexão que existe entre Corpo e Natureza. Para tal, faz-se necessário buscar referenciais teóricos, desenvolver projetos artísticos, permitir a ousadia, ser humilde e persistente. A pesquisa indica a criação de uma linguagem contemporânea que possa propor o encontro do homem consigo mesmo; este encontro pode acontecer através da manipulação de objetos exteriores a si, o que provocaria experimentações sensoriais levando-o a experiências de introspecção e reflexão.

Os movimentos que constituem a arte pós-moderna: Arte Conceitual, Body Art, Performance Art, Arte Povera e Land Art são fundamentais para a compreensão da relação do corpo da artista quando em contato com a natureza do litoral paulista bem como da proposta visual que a autora desenvolve, pois entende que a arte tem a possibilidade de trazer à tona o invisível.

Arte Conceitual

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17 Foi o escritor e músico Henry Flynt, em 1961, quem primeiro emprega, de fato, a expressão “arte -conceito”. Como nome, a Arte Conceitual é utilizada pela primeira vez através dos textos publicados por Sol LeWitt (1928-2007) em 1967, em seus “Parágrafos sobre a Arte Conceitual”. Na arte conceitual, a ideia ou conceito é o aspecto mais importante da obra (...) a ideia torna-se a máquina que produz a arte” (WOOD, 2002, p.38) A fotografia é utilizada com frequência pelos artistas conceituais e considerada por estes como um recurso central às suas realizações artísticas. Para o artista Joseph Kosuth (1945-) , segundo Wood, a Arte Conceitual é uma indagação dos fundamentos do conceito de arte (WOOD, 2002, p.43).

Body Art

Escrever sobre o corpo, pintá-lo, cobri-lo de tatuagens, essa é uma maneira de transformá-lo voluntariamente em objeto de arte? (JEUDY, 2002, p.89)

Nas palavras de Pires, “o artista se coloca como obra viva, usando o corpo como instrumento” (2005, p.69). Entendendo o corpo como o meio, o suporte para a arte, a Body Art, pode acontecer com ou sem o público e geralmente é retratada através de fotografias e vídeos. Fluidos, movimentos, sons, sensações, forma, gênero, cor podem ser explorados ao máximo neste segmento passando de pinturas corporais ao sadomasoquismo, perfurações, feridas, queimaduras, podendo chegar a realizações com risco de morte. Alguns exemplos extremos da Body Art são os artistas Chris Burden2 (1946-) que recebe um tiro, a artista Gina Pane (1939-1990) que se corta com lâmina de barbear, Cindy Sherman (1954-) que modifica sua aparência através de cirurgias plásticas para então ser fotografada.

São referências teóricas utilizadas para esta pesquisa os seguintes artistas: Ana Mendieta (1948-1985), Yves Klein (1928-1962), Marc Quinn (1964-).

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Performance Art

A performance se colocaria no limite das artes plásticas e das artes cênicas, sendo uma linguagem híbrida que guarda características da primeira enquanto origem e da segunda enquanto finalidade. (COHEN, 2011, p.30)

A Arte Performática utiliza-se de diferentes modalidades como dança, teatro, música, literatura tendo o corpo do artista como objeto central da obra. Os artistas podem realizar performances sozinhos e serem fotografados ou filmados para apresentação posterior ao público, não sendo necessário assim a participação direta do mesmo.

Durante os anos 60 e 70 esta vertente artística atraiu uma pequena mas influente plateia que faz ressoar até hoje, através de registros fotográficos e vídeos, os acontecimentos performáticos da época. Desta forma, mantém-se latente esse movimento artístico.

O grupo Fluxus é um marco da Arte Performática. Constituído por criticidade e humor, baseado em Nova York, contava com participantes norte-americanos europeus e asiáticos. Obteve como integrantes Yoko Ono (1933-), George Maciunas (1931-1978),e Joseph Beuys (1921-1986) entre outros. Beuys contribui com seu trabalho para o surgimento do movimento “Verde” na Alemanha. Objetiva transformar o trabalho do artista de mero produto comerciável para o conceito de que as produções do artista são um conjunto de ações que derivam inteiramente do trabalho do artista. É bem interessante observar o paradoxo que é criado por estas apresentações para as artes visuais pois as performances possuem em sua maioria crítica às instituições culturais e são apoiadas por ninguém mais do que estas próprias instituições. Esta dependência mútua entre a subversão e o capitalismo continuam em debate.

Algumas referências artísticas para esta pesquisa são os artistas Ana Mendieta, Liu Bolin (1973-), Joseph Beuys, Marina Abramovic (1946-), Carolee Schneemann (1939-), Vito Acconci (1940-), Saburo Murakami (1925-1996).

Arte Povera

Por fim, percebendo que não ia encontrar ninguém vivo, passou a procurar os seus ossos para montar os esqueletos em cima dos desenhos de gente e fazê-los viver novamente (ARAUJO, 1999, p.29)

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19 Ressignificar objetos comuns como obras de arte não seria abrir a possibilidade de reconhecimento do ser humano massificado como sendo dotado de beleza, merecedor de melhores condições sociais, políticas e culturais? Não estaria nesta proposta material um resgate para o imaterial – o que eu sinto, enquanto ser comum, ao ver um objeto de ordem regular ser reconhecido como obra de arte? Sinto-me tal e qual este objeto podendo ser reconhecido ou não, posso assim (in)validar este reconhecimento porque tampouco sou obra de arte?

Artistas como Mario Merz (1925-2003), Alighiero Boetti (1940-1994), Michelangelo Pistoletto (1933-), Giuseppe Penone (1947-), Franz Krajcberg (1921-), Louise Nevelson (1899-1988) são artistas engajados nesta corrente e voltam seus olhos para os processos industriais e a utilização dos recursos naturais; são fontes teóricas para esta pesquisa.

Land Art ou Arte da Terra

Não somos um conjunto de significados privados que podemos escolher entre tornar ou não público aos outros. Somos a soma de nossos gestos visíveis. Somos tão acessíveis aos outros quanto a nós mesmos. Nossos gestos são, eles próprios, formados pelo mundo público, por suas convenções, sua linguagem, o repertório de suas emoções, a partir dos quais aprendemos os nossos. Não por acaso, Morris e Serra produziam no exato momento em que os

romancistas franceses declaravam: “Eu não escrevo; sou escrito”

(KRAUS, 1998, p.322)

Land Art é uma linguagem artística que utiliza o próprio ambiente natural como matéria primeira para sistematização das obras de arte. Solos, árvores, mares, geleiras, montanhas, florestas são a inspiração e o objeto de trabalho dos artistas deste segmento. Através do Land Art, com seu explícito viés ecológico, passa-se a compreender o ambiente natural e a paisagem como o espaço passível de discurso político, cultural, econômico em contraposição a uma noção apenas física e geográfica do espaço. Museus e galerias de arte, como espaços institucionais passam a ser provocados pela característica de segregação e confinamento da arte. Seu viés ecológico é explicito.

Devido ao fato de os projetos serem realizados in loco há a dificuldade em trazê-los para os museus e galerias, a não ser através de fotos ou filmes dos projetos realizados.

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CAPÍTULO ÚNICO

POÉTICAS CORPORAIS: O CORPO NO AMBIENTE NATURAL – UMA PROPOSTA

CONTEMPORÂNEA EM ARTE VISUAL

“O ser humano precisa sentir-se natureza. Quanto mais mergulha nela, mais sente quando deve mudar e quando deve conservar em

sua vida e em suas relações”. (BOFF, 2004, p.116)

A Arte Contemporânea surge na década de 60. Previamente ao seu surgimento e concomitantemente ao término da Segunda Guerra Mundial, que devasta parte da Europa, ocorre o movimento Expressionista-Abstrato (década de 40) em Nova York transferindo o centro artístico da Europa (Paris) para a América (EUA). Há uma grande concentração de artistas em Nova York ávidos pela liberdade de expressão, o que ajuda a impulsionar a arte norte-americana. Dentre os vários artistas que compõem o movimento Expressionista-Abstrato cita-se: Willem de Kooning (1004-1997), Jackson Pollok (1912-1956), percursor do Action Painting (Pintura de Ação) e Mark Rothko (1903-1970). Este movimento traz influências do abstracionismo de Piet Mondriam (1872-1944) e do Construtivismo Russo através de Kazimir Malevich (1878-1935). Funda-se assim a Escola de Nova York.

A Arte Contemporânea caracteriza-se por apresentar uma ampla disposição para a experimentação, levando os artistas a realizarem uma verdadeira fusão de linguagens, materiais e tecnologias. Os artistas contemporâneos, como em toda a história, mostram através de sua arte o pensamento de determinada época, a sociedade em que estão vivendo, as questões políticas, religiosas, econômicas e sociais que os envolvem.

Uma superfície sem limites de possibilidades foi reduzida a um tipo de receptáculo aonde cores inautênticas e expressões artificiais, são pressionadas uma contra a outra. Por que não esvaziar o receptáculo, liberar a superfície?... Por que se preocupar com a posição da linha no espaço? Por que determinar um espaço? Por que limitar? Uma linha pode apenas ser desenhada de forma longa, para o infinito; entre todos os problemas de composição ou de dimensão. Não existe dimensão no espaço aberto. (TAYLOR, apud MANZONI, 2005, p.12.)

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21 Com o intuito de embasar as obras desta dissertação, a artista apresentará em seguida as produções que constituem a proposta Poéticas Corporais fundamentadas pelas linguagens artísticas contemporâneas com as quais elas dialogam. Cada linguagem artística apresentará obras de artistas que a representam e que agregam valor as Poéticas Corporais por seu reconhecimento histórico cultural. Ressalta-se que a autora não se baseou nas obras destes artistas para desenvolver suas peças, no entanto, pode ter se inspirado nos conceitos e pensamentos destes artistas. Assim, Poéticas Corporais não são releituras das demais obras aqui inclusas.

Sobre a Arte Conceitual e as Poéticas Corporais

Partimos do pressuposto de que quanto maior for o conhecimento de técnicas, do processo histórico-cultural, das possiblidades de crítica e reflexão, mais estaremos preparados para trilhar o caminho da obra de arte. Assim, estabelece-se aqui uma aproximação entre a Arte Conceitual e o conjunto de obras denominadas Poéticas Corporais.

Para a Arte Conceitual a ideia que leva a concepção da obra pode ser considerada como a obra em si, pois apresenta a indagação de seus fundamentos e o conceito que deseja expressar:

Já me utilizei da expressão arte conceitual para fazer referência a uma forma histórica de vanguarda que floresceu no final da década de 60 e ao longo década seguinte. O termo era correntemente empregado na época, para designar uma multiplicidade de atividades com base na linguagem, fotografia e processos, as quais se esquivavam do embate que então se efetuava entre, de um lado, a arte minimalista e várias práticas antiformais e, de outro, a instituição do modernismo, num contexto de crescente radicalismo cultural e político. (WOOD, 2002, p. 07)

O conjunto de obras que Poéticas Corporais perpassa a Arte Conceitual ao mesmo tempo que encontra suas obras delineadas pela Body Art, Performance Art, Arte Povera e Land Art. As obras enquadradas na designação Poéticas Corporais foram em sua maioria fotografadas e a fotografia foi um dos marcos da Arte Conceitual que a utilizava como forma de registro. Foi partindo de um conceito trazido de textos e inquietações que as obras de Poéticas Corporais foram tomando forma, ou seja, em primeira instância o que havia era um conceito que posteriormente tomou forma.

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Fig. 1. Sol Lewitt.

Wall Drawing #146. Combinação das duas partes dos arcos azuis dos cantos para os lados e azul retilíneo, não retilíneo e linhas quebradas,1972. Giz azul, dimensões variáveis. Guggenheim Museum, NY. Vista da instalação: Villa Menafoglio Litta Panza, Biumo Superiore, Varese, Setembro 16, 1981. Fotografia Giorgio Colombo, Milano

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Poéticas Corporais em Body Art

Os projetos artísticos desenvolvidos pela autora em relação à Body Art abrangem a pintura corporal, a impressão corporal em tecido e moldes de partes do corpo em gesso. “O corpo não para de exibir seus sinais “naturais”. Escrever sobre o corpo, pintá-lo, cobri-lo de tatuagens, essa é uma maneira de voluntariamente transformá-lo em objeto de arte?” (JEUDY, 2002, p.89).

A motivação inicial para o desenvolvimento destas obras foram os textos de Michael Foucault (1977) referentes à Biopolítica e Microfísica do poder. Levando-se em consideração pensamentos sobre os mecanismos sociais de controle sobre os corpos (sua forma, peso, formas de vestir e portar, transporte, educação, alimentação), pois "as disciplinas do corpo e as regulações da população constituem os dois pólos em torno dos quais se desenvolveu a organização do poder sobre a vida" (FOUCAULT, 1977, p.131); a coisificação dos corpos (a redução do corpo a ele mesmo eximindo qualquer possibilidade de reflexão acerca de si, do outro, das relações sociais; sobrepondo-se a estas reflexões apenas as ações referentes às necessidades diárias dos indivíduos).

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Experimentos em Body Art

a) Pintura e impressão corporal

Existem três (03) obras que compõem o título Pintura impressão corporal. A primeira obra é designada como a.1) Pintura e impressão corporal de tronco em preto a segunda obra a.2) Pintura e impressão corporal de tronco em vermelho e a terceira obra designada a.3) Pintura e impressão corporal.

Optou-se por manter o título de Pintura e impressão para estas obras devido ao processo de pintura do corpo com tinta guache e impressão do corpo em tecido. Embora estas três obras que serão apresentadas a seguir possuam um processo de concepção similar, poderá o leitor notar as diferenças visuais e conceituais que cada uma apresenta.

a.1) Pintura e impressão de tronco em preto

Fig. 2. Paula Tura. Pintura corporal, 2012. Fotografia Will Aguiar. Acervo da artista

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25

Fig. 3. Paula Tura. Impressão de tronco, 2012. Guache sobre tela, 98 x150cm. Fotografia Will Aguiar. Acervo da artista

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26

a.2)

Pintura e impressão de tronco em vermelho

Vestida de sangue deita-se na relva

Empresta o corpo para o mundo ao experimentar o ventre vivo

Percebe-se mamífero em suas formas Repete o ciclo da vida e da morte

Sem palavras para descrever sensações envolve-se em cores na tentativa de compreender-se

(TURA, Paula, 2013)

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27

Fig. 5. Paula Tura. Impressão de tronco, 2013. Guache sobre tela, 100 x 105 cm. Fotografia

Will Aguiar. Acervo da artista

A autora atribui a escolha da cor vermelha considerando que esta obtém a qualidade de cor de sangue pois estando grávida e entendendo-se como mulher em processo de criação, possui uma quantidade elevada de sangue correndo em suas veias para a manutenção do seu corpo e para a formação do feto.

A artista utilizou-se de tinta guache, espalhando-a com as mãos (fig. 4) sobre o tronco como fez com a pintura corporal na cor preta. Novamente deitada teve o tronco coberto com tecido de tela (fig. 5) e passou pela experiência de ter seu tronco tocado sob o tecido. Com as formas arredondadas da gestação é notória a diferença da impressão do corpo que neste experimento surge mais arredondado e volumoso diferenciando-se do formato de “cara de cachorro” que apresenta a impressão na cor preta.

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28 a) o corpo que foi pintado na cor preta é hoje um corpo morto. Entende-se corpo morto por ser um corpo que nunca havia gestado. O processo de gestar implica em deixar-se moldar para conceber a nova vida; este novo molde do corpo envolve tomar uma nova forma física de arredondar-se, aquecer-se, abaular-se e abrir-se para que o pequeno corpo do bebê saia. Concomitantemente à nova forma física e gestação do bebê ocorre a morte da mulher gestante tendo como seu último suspiro o momento do nascimento do bebê para que nasça com este a mulher-mãe. Desta forma, as experiências sensoriais do corpo pintado e impresso na cor preto mantem-se com as memórias sensoriais de um corpo ávido e satisfeito por uma experiência artística mas, por mais que esta experiência tenha sido internalizada ela se mantem num nível superficial se se comparada à experiência de ter o ventre tocado quando preenchido pela gestação de um bebê.

b) despir-se em ambiente natural toma relevância e se sobrepõe ao ambiente fechado uma fez que propicia a sensação de corpo ilimitado e integrado ao ambiente natural, fresco, repleto de árvores, flores, folhas, cheiro de relva e habitado por animais como cobras e insetos.

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29 Em igrejas, favelas, bares

Colégios, festas, em todos os lugares Colorado

Quando menos se espera Lá está ele

Sem muita pressa Com a camisa no peito

A cor do sangue A cor do respeito A cor dos ianques A cor do inferno

No verão ou no inverno Em contraste com o azul Simplesmente vermelho

Simples simplesmente No copo da Coca-Cola Nos seios de uma garota Na porta da escola

O vermelho estará sempre presente

Simples simplesmente Como o vermelho da camiseta E o vermelho das besteiras”

(WARPECHOWSKI, 1998, p.96)

Em 1960, o artista francês Yves Klein apresenta ao público: “Antropometria do período azul. Três modelos nuas, cobertas de tinta azul imprimem seus corpos sobre enormes telas seguindo as ordens do artista enquanto uma orquestra executava a Sinfonia Monótona de Pierre Henri. As modelos “transformadas em pinceis vivos” segundo Klein, serviam para levar a extremos a Action Painting de Pollock, originando assim uma via particular e independente” (GLUSBERG, 1986, p.31, tradução nossa).

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30 Fig. 6. Yves Klein. Antrhopométrie de

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31

a.3)

Pintura e impressão corporal

Fig. 7. Paula Tura. Impressão de corpo, 2012. Guache sobre tecido. Fotografia Will Aguiar. Acervo da artista

Utilizando-se de tinta guache na cor preta a autora cobre seu corpo com o auxílio de um pincel. Retirando excesso de tinta escreve palavras em diferentes partes do corpo sendo:

- face: ódio - tronco: liberdade

- perna esquerda: angústia - perna direita: amor

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32 Curiosamente os braços da autora não foram impressos uma vez que diferentemente dos experimentos anteriores: a.1 e a.2, a autora não contou com auxílio para a impressão do seu corpo e realizando a impressão sozinha precisou levar em consideração o tempo de secagem da tinta guache o que exigiu rapidez no ato de espalhar a tinta sobre o corpo, na remoção da tinta com pincel para o surgimento das palavras e realização da impressão.

Esta obra foi realizada na residência da autora na cidade de São Paulo.

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33

Fig. 8 Fig. 9 Fig. 10

Escarificação de tribo africana provocada por corte na pele seguida de cicatrização com a utilização de planta venenosa para causar a queloide.

Outra ideia que esta Impressão Corporal pode remeter são dos exames de raios-x como se pode observar:

Fig. 11. Raio-x

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34 imaginar que “o invólucro do corpo tem por função esconder essa mecânica que produz a putrefação” (JEUDY, 2002, p.122) e que apenas de maneira tecnológica estas palavras podem ser vistas uma vez que são alcançadas através do Raio- X. Interessante pensar que o Raio- X é utilizado na medicina como uma tecnologia de diagnóstico, que pode mostrar o que esta por trás. Nesta obra, a autora tem a intenção de explicitar o que sente, de mostrar, de deixar-se ver. Muitas vezes os pacientes com prescrição para Raio-X não querem saber a leitura dos exames ou entrar em contato com seus diagnósticos pois isto implicaria em tomar consciência, em saber-se vivo e esta tomada de consciência indica na direção de uma ação e tomada de decisões. Acredita-se assim que entender o corpo como matéria formada por peças de encaixe, palpáveis e manipuláveis é um meio de conhecer-se a si mesmo, de facilitar a nomeação de sentimentos, de nomear as múltiplas identidades do humano, de entender através da matéria o abstrato ser humano.

b)

Moldes de partes do corpo

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35 Fig. 13. Paula Tura. Ventre, 2012. Molde em gesso. Fotografia Will

Aguiar. Acervo da artista

Fig. 14. Paula Tura. Mão e braço, 2012. Molde em gesso. Fotografia Will Aguiar. Acervo da artista

Para a realização destas obras foram utilizados: gesso em pó e água.

Em datas distintas foram realizados os moldes das partes do corpo da autora: seio, ventre, braço e mão. Foram experimentos solo onde a autora misturou o gesso à água até obter uma mistura homogênea e em seguida distribuiu esta mistura sobre seu seio, sua barriga e seu braço – mão.

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36 mistura: ao ser preparada a mistura apresenta-se em temperatura ambiente e quando passa para o processo de endurecimento vai aquecendo homogeneamente estando pronto para ser retirado do corpo assim que esfriar.

Indica-se que durante a realização de moldes sobre a pele, que esta seja besuntada com glicerina ou óleo. A autora não preparou sua pele e desta forma recebeu a mistura direto em seu corpo, o que solicitou bastante cautela quando da retirada do gesso seco pois os pequenos pêlos que cobrem a cútis grudaram no gesso endurecido.

“Uma parte do corpo tem sua beleza própria; ela pode fazer parte de um conjunto composto ou existir soberanamente em seu isolamento” (JEUDY, 2002, p.98). Um corpo em partes é ao mesmo tempo objeto de fascinação e de repúdio. Ao observar-se um pedaço do corpo imagina-se um corpo morto, um corpo inteiro ou a imitação de uma parte do corpo? Para existir um corpo é preciso alma? Quantas partes de um corpo é preciso para que se chame ao corpo de corpo? Uma parte do corpo tem alma? O corpo tem alma? Os materialistas podem dizer que é o corpo e seu calor que mantem a alma atada a si, assim, uma parte do corpo não é corpo, pois, é incapaz de manter-se viva por si só. É preciso que as funções vitais do corpo estejam em pleno funcionamento para que a alma sinta-se atraída pelo corpo e nele permaneça e exista. Assim, pode-se pensar que sem corpo a alma não existe, pois, precisa da matéria para fazer-se viva.

Se pensarmos que a morte pode não ser apenas física mas também simbólica, pode-se imaginar hoje um planeta Terra habitado quase que em sua maioria por mortos. Corpos mortos e belos deambulando pelas grandes metrópoles embora externamente inteiros, estão internamente fragmentados. Pode-se também imaginar, neste exercício do pensar, que a alma precisa de alimento imaterial e este alimento pode ser encontrado no ambiente natural, por isto, aqueles que estão afastados do contato com a natureza estariam mortos.

Seguindo a ideia da morte simbólica, o pedaço de um corpo pode remeter os pensamentos a um corpo vivo pulsante e em pleno funcionamento, ao sentido da vida ou a um corpo morto fisicamente e fragmentado como os corpos estudados nas escolas de medicina. Opta-se aqui por imaginar que um pedaço de corpo pode nos remeter a ideia da vida. E que vida é esta? Uma vida arqueológica: que remete ao passado, ao presente, ao futuro? Uma vida cultural: com uma razão de ser e existir, aos contrapontos de uma sociedade espetacular onde o ideal sobrepõe-se ao real? A uma vida superficial onde a alteração estética de uma parte do corpo é capaz de produzir mudanças comportamentais e felicidade imediata?

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37 Como ilustração aos Moldes de partes do corpo da autora, encontra-se a seguir uma obra do artista britânico Marc Quinn que fez o molde de sua cabeça utilizando sangue do seu próprio corpo. Para tal foi retirado cinco litros de seu sangue. A peça é mantida em refrigeração.

Interessante observar que o sangue aproxima a obra da reflexão morte – vida uma vez que sua coloração é um vermelho pulsante. A cabeça do artista, diferentemente do braço-mão, seio e ventre apresentados pela autora remete à memória das grandes batalhas greco-romanas onde o que interessava era ter a cabeça do inimigo apresentada em bandeja de prata. Já um seio nos faz pensar, no inconsciente coletivo feminino, sobre amamentação ou câncer de mama e o ventre as solicitações estéticas da moda e a gestação; o braço-mão nos traz referência aos ladrões que nos países do oriente médio tem estes membros cortados para não mais praticarem furtos. As partes do corpo exercitam nossos pensamentos sobre culturas. “Se há cultura, é o corpo

que o exprime

. Tal seria o adágio atual que outorga ao corpo o lugar de origem da transmissão cultural e de sua perspectivação em tempos futuros” (JEUDY, 2002, p.76).

Fig.15. Marc Quinn. Self, 2006. Escultura em sangue do próprio artista 80 3/4 x 25 5/8 x 25

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c)

Corpo de areia

Sua areia negra desperta curiosidade

Recebe um corpo que lhe empresta uma forma

Que lhe enfeita com flores perfumadas e pedras brilhantes Um corpo que sente-se vivo quando sente sua textura contra a pele

Quando sente o cheiro da maresia que te impregna Quando te olha e se vê em você

(TURA, Paula, 2013)

Fig. 16. Paula Tura. Corpo de areia, 2013. Fig. 17. Paula Tura. Corpo de areia, 2013. (processo de construção) (processo de construção)

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39 Fig. 18. Paula Tura. Corpo de Areia, 2013. Flores, pedras, cogumelos em areia.Fotografia

Will Aguiar. Praia do Perez, Ubatuba, SP. Acervo da artista

A construção deste trabalho foi realizada na praia do Perez que tem acesso através de uma trilha que fica entre a praia da Lagoinha e a praia Dura, no litoral sul de Ubatuba. Esta praia foi escolhida para este trabalho devido à coloração de sua areia que é composta de areia escura e areia clara.

A artista, deitada de barriga para cima sobre a areia escura, contou com ajuda de um auxiliar para ter seu corpo contornado . Foi utilizado areia clara sobre areia escura no contorno do corpo, pedras transparentes que são comercializadas em lojas de jardinagem e decoração, foram colocadas no contorno da cabeça, flores do tipo maria-sem-vergonha contornaram as mãos e os pés foram contornados por cogumelos; as flores e os cogumelos foram colhidos in loco no momento da realização da obra. A região de Ubatuba é bastante úmida, desta forma, cogumelos e plantas se reproduzem com bastante facilidade.

Ousa-se aqui atribuir através da literatura de Clarice Lispector uma personalidade à areia que recebe emprestada a forma de uma mulher:

A mulher não recebe transmissões nem transmite. Não precisa de comunicação.

Depois caminha dentro da água de volta à praia, e as ondas empurram-na suavemente ajudando-a a sair. Não está caminhando sobre as águas – ah nunca faria isso depois que há milênios já haviam andado sobre as águas –

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40 opõe resistência à sua saída puxando-a com força para trás, mas então a proa da mulher avança um pouco mais dura e áspera.

E agora pisa na areia. Sabe que está brilhando de água, e sal e sol. Mesmo que o esqueça, nunca poderá perder tudo isso. De algum modo obscuro seus cabelos escorridos são de náufrago. Porque sabe – sabe que fez um perigo. Um perigo tão antigo quanto o ser humano. (LISPECTOR, 1982, p. 85)

Ao sair do mar acomoda-se sobre a areia escura e permite que seu corpo seja adornado com elementos naturais como flores, pedras, cogumelos. Seu quadril toma uma forma levemente arredondada para que o ventre aconchegue a vida que carrega. Gradativamente solta o peso do corpo no chão entregando-se à força da gravidade e assim mescla-se ao ambiente terrestre. Seu novo corpo com pele de areia continua a brilhar água, sal e sol, e é através deste seu novo invólucro que sente-se maresia, flor, folhas, água, areia, céu, terra, mar, pedra, concha.

A obra Corpo de Areia é um ritual de metamorfose onde uma mulher nasce a partir da forma de si mesma. Como ritual, há uma função de transformação, de morte, de descoberta, de efemeridade uma vez que não é possível que a obra permaneça intacta devido ao ambiente em que está sendo construída. Este ritual é em si sutil e passível de interferências da ordem do natural.

O Corpo de Areia, depois de construído e contemplado foi apagado pela maré cheia. Os únicos elementos recuperados pela autora foram as pedras transparentes. Assim, a mulher do conto que saiu do mar retorna a ele, com a subida da maré, metamorfoseada após liberar-se de condutas e conceitos morais arraigados que pertencem ao mundo dos humanos e que ela entra em contato quando recebe um corpo material (de areia).

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41

Fig. 19. Ana Mendieta. Silueta Works in Mexico, 1973-1977. Fotografia19 3/8 x 26 9/16 inches. The Museum of Contemporary Art, L.A, USA

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42 No trajeto desenvolvido pela autora dentro da Body Art percebe-se o esboço do “corpo que irrompe, o corpo que descobre outros horizontes, o corpo-mundo (...) O desafio é, portanto, político” (JEUDY, 2002, p. 139-140). E para que este desafio tome mais consistência segue-se com as obras de Performance Art.

Poéticas Corporais em Performance Art

O artista deixou de ser aquele ser com habilidades especiais e específicas. É agora um agente do mundo. (Pereira, 2012, p. 555)

As Performances são veículos de comunicação que podem dramatizar conceitos sem que estes precisem ser interpretados por interlocutores (mesmo que seja registrada em vídeo ou foto sem qualquer plateia) uma vez que o artista utiliza seu corpo de forma cênica, exalando emoções, sentimentos, questionamentos, posicionamentos. Não significa que isto não aconteça em outras vertentes artísticas mas no caso da Performance não são necessários intermediários, o corpo do artista fala por si só e pode ser lido pelo espectador diretamente. “A performance se colocaria no limite das artes plásticas e das artes cênicas, sendo uma linguagem híbrida que guarda características da primeira enquanto origem e da segundo enquanto finalidade” (COHEN, 2011, p.30).

A artista realizou Performances que propõem a desconstrução do corpo no ambiente natural como se de alguma forma a realização de experimentos artísticos neste ambiente propusesse um novo contexto ao corpo. O ambiente natural é composto por incertezas: mudanças climáticas, encontros inesperados com animais, presença de sons desconhecidos; estas incertezas trazem à tona a vulnerabilidade humana e a clara falta de controle do homem sobre a vida, fatos que ficam impressos no corpo, este que é a expressão das emoções e sentimentos.

Experiências em Performance Art

a)

Série Yoga: Saudação ao Sol

Na praia da Baleia, no litoral norte do estado de São Paulo por volta das 12:00hs num

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43 O critério para a escolha das fotos que compõem esta série foi através da projeção que a sombra da postura produzia na areia. Escolheu-se desta forma a sombra que mais se aproximava da postura realizada pelo corpo.

Fig. 20. Paula Tura. Série Yoga: Saudação ao sol, 2012.Fotografia Will Aguiar. Praia da Baleia, São Sebastião, SP. Acervo da artista

Se bem se utiliza o corpo como matéria prima, não se reduz (o corpo) somente a exploração de suas capacidades, pois trata-se de abordar outros aspectos, tanto individuais como sociais, vinculados com o fato principal do artista transformado em sua obra, ou melhor, do artista como sujeito e objeto indissolúvel de sua arte. (GLUSBERG, 1986, p.35, tradução nossa)

A Série Yoga: Saudação ao Sol é o registro de uma sequência de “Ásanas, posturas corporais

com nome de animais ou coisas relacionadas à natureza (...) similares ao que conhecemos como exercícios de alongamento” (ROJO, 2006, p. 54) provenientes da prática do Yoga que podemos entender como sendo um estado especial da mente, um dos cinco dárshanas ou pontos de vista do hinduísmo, a união com o Todo.

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44 necessidade constante de álibis para aquilo que nos dá prazer? Se o esporte dá prazer, essa é uma razão suficiente para praticá-lo” (BERTHERAT, 2002, p.100). Assim, com a ideia de quebrar o paradigma de ver o corpo em ação a autora passa a registrar a sombra dos movimentos do corpo projetados na areia, tendo assim um não corpo e um não movimento quando comparados ao registro do corpo que faz o movimento. Há assim dois corpos, dois eus, duas situações para uma mesma personalidade. Um corpo eu-objeto-imóvel-pertencente ao além mundo mas que pode pelo distanciamento observar o mundo e outro corpo sendo o corpo eu-movimento-matéria no mundo que inspira, expira, sente, interage e é o mundo.

Podemos dizer que há na realização da Série Yoga: Saudação ao Sol, estes dois eu: um corpo e uma sombra, um corpo ao qual podemos nos referir como sendo uma escultura viva, uma vez que um dos princípios dos ásanas é a imobilidade, e um não corpo que é a sombra. Sobre o corpo imóvel pode-se pensar num corpo estátua , objeto de cobiça, inveja e admiração. A sombra, factível de mobilidade independente do movimento corporal uma vez que conta com fatores externos para sua projeção, neste caso o sol, é não palpável, imaterial.

A prática do yoga é culturalmente marcada como sendo uma prática transcendental devido seu caráter meditativo. Faz assim um convite para que as emoções densas sejam sutilizadas, que se adentre ao mundo das emoções e sentimentos. Observa-se assim que para tal confrontamento interno seja necessário entrar em contato com o invólucro que acomoda estas emoções e isto se dá primeiramente através das posturas que colocam o praticante diretamente em contato com seu corpo e os limites e habilidades que este dispõe. Na prática do yoga, o corpo é a morada da alma e como tal é invólucro das emoções, assim, é o primeiro a ser desconstruído pois nenhum corpo é igual a outro e não permite que padrões externos possam subjugá-lo. Ao observar as sombras projetadas na areia, o corpo perde a exatidão de suas formas: estatura e largura, cor da pele, dos olhos, cabelos, idade, sexo ficam não identificáveis; se coloca em suspensão as questões culturais e sociais referentes a este corpo exatamente pela impossibilidade de identificar os detalhes que o compõem.

A natureza quer para nós a beleza da forma, não segundo as manias do momento, mas de acordo com as leis dela. Não se cansa de criar miríades de seres humanos belos, virtualmente perfeitos. E todos idênticos. Quero dizer idênticos quanto à essência de suas estruturas. Por mais que os cinco dedos da mão sejam diferentes quanto à pele branca ou preta, sob a pele as estruturas da mão são estritamente as mesmas.

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45 Não estaria Liu Bolin3 (fig. 21) com esta sua foto parafraseando o trecho acima de Thérèse Bertherat4 ?

Fig. 21. Liu Bolin. Hiding in the city no 94: in the woods, 2010. Fotografia 63cm x 80cm.

A autora e o artista Liu Bolin se utilizaram de ambientes naturais para a realização de suas obras. O ambiente natural propõe uma reflexão acerca do corpo. Na Série Yoga: Saudação ao Sol, há a proposta de observar a sombra de movimentos corporais o que propõe um novo corpo, um corpo composto por areia e portanto, passível de modelagem. Sabe-se que a performance foi realizada às 12:00hs e neste momento o sol estava a pino, se fosse realizada em qualquer outro horário as projeções do corpo seriam completamente diferentes uma vez que o sol estaria em outra posição. Liu Bolin mescla sua imagem a de uma árvore, é preciso olhar atento para identificar o artista. O ambiente

3

Liu Bolin – artista chinês conhecido por seu trabalho de camuflagem com o ambiente

4

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46 natural, em ambos os casos sugere amplitude, não restringe o corpo, pois não possui limites laterais ou superiores, o corpo naSérie Yoga: Saudação ao Sol pode movimentar-se livremente e a árvore de Liu Bolin não tem impedimentos para crescer. O corpo que está no ambiente natural retoma sua origem primitiva de contato com a natureza onde as regras não são estabelecidas a partir de pressupostos sociais ou culturais, pois as mudanças climáticas não são ditadas pelos desejos humanos.

Voltando-se para a questão do movimento e da sombra, a autora apresenta uma performance do norteamericano Vito Acconci (fig. 22) onde há também a projeção da sombra de seus movimentos na parede. Com a ideia de enaltecer a questão da desconstrução do corpo inclui-se aqui as fotos desta performance:

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47

b)

Série Encaixes, Raiz e Série Corpo-folha

As fotografias a seguir foram tiradas nas Ruínas da Lagoinha, localizadas na Praia da Lagoinha em Ubatuba, SP originalmente chamada de Fazenda da Lagoinha. Local de fácil acesso, recebe a visita de inúmeros turistas durante o verão. As Ruínas da Lagoinha já contaram com apresentações teatrais e saraus – um deles organizado pela própria autora em agosto de 2011 para sua monografia no curso de especialização em Ecologia, Arte e Sustentabilidade cursado no Instituto de Artes da UNESP.

O ubatubense Washington Oliveira em seu livro Ubatuba – documentário (1977, p. 72) conta que:

Capitão Romualdo, homem bastante abastado e empreendedor, que, além de possuir vasta cultura de café e cana de açúcar, fazia funcionar seus engenhos, com o que fabricava aguardente e açúcar mascavo, produtos que embarcava para o estrangeiro.

Com o seu espírito progressista planejou exportar a aguardente devidamente embalada, necessitando porém de vasilhame apropriado

Foi quando deu início à construção de uma fábrica de garrafas, nas proximidades da praia, que não conseguiu concluir, e cujos pilares ainda permanecem de pé, eretos, atestando o espírito progressista e empreendedor dos antigos homens ubatubenses.

b.1)

Série encaixes

Côncavo e convexo? Árvore que gera? Corpo pedra Corpo árvore? Poesia na forma

Pedra sobre pedra colada com óleo de baleia Misturados a conchas trituradas

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Fig. 23. Paula Tura. Encaixe I, 2013. Fotografia Will Aguiar. Ruínas da Lagoinha, Ubatuba-SP.Acervo da artista

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Fig. 25. Paula Tura. Encaixe III, 2013. Fotografia Will Aguiar. Ruínas da Lagoinha, Ubatuba-SP. Acervo da artista

A Série Encaixes é composta por três obras que retratam o corpo grávido da autora. As fotos que compõem o Encaixe I e II (fig. 23 e 24) evidenciam o ventre gestante em encaixe côncavo e convexo com a cavidade. Para a realização destas duas obras a autora colocou algumas pedras no solo produzindo um degrau no qual subiu permitindo assim que seu ventre alcançasse a altura necessária para moldar-se à cavidade. Também foi necessário segurar com as mãos na parede, acima da cavidade, para manter o corpo estável e imóvel.

A realização do Encaixe III (fig. 25) exigiu que a autora permanecesse agachada e recostada sobre o tronco de uma árvore permitindo moldar seu ventre à curva de uma das raízes presas ao muro de pedras.

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50 habitat para os animais silvestres e veem crescer aleatoriamente as ervas daninhas, as maria-sem-vergonha, as raízes e copas das árvores. Serviu assim de cenário perfeito para um corpo que também se expandia sem qualquer controle, pois, a gestação lhe oferecia quadris largos, ventre arredondado, pernas grossas e pés gordos o que lhe indicava que estava inserida nos ciclos naturais e que nada, absolutamente nada poderia conter a expansão de sua nova forma e da vida que se fazia crescer dentro de si. “Uma performance é um resgate da história no sentido de que ao deixar de lado o estereótipo corporal, o número de possibilidades de ação pode acontecer das mais variadas formas, dentro da nossa cultura e sociedade e fora dela” (GLUSBERG, 1986, p.73).

Moldar-se às pedras exigiu imobilidade, equilíbrio e atenção. A autora precisou manter-se sobre algumas pedras para que seu ventre ficasse à altura da cavidade a qual pretendia preencher. Foram muitas tentativas de registro até que a angulação ficasse adequada. Mãos tocavam levemente as pedras geladas para manter o equilíbrio. Imóveis e estáveis as pedras permaneceram como se sempre estivessem estado ali. Frias e um tanto arredondadas apresentavam musgos e serviam de habitat para formigas e outros insetos. Ao olhar atentamente pode-se constatar verdadeiras comunidades de minúsculos seres que passam imperceptíveis ao olhar desatento. Com relação ao Encaixe III (fig.25) exigiu-se além de concentração, uma disposição física maior para se manter agachada permitindo que o ventre e a raiz da árvore encontrassem em perfeita angulação.

Os artistas corporais utilizam seu próprio corpo como material para suas performances, oferecendo obras que de alguma maneira referem-se à arte primitiva e pré-histórica daquelas culturas em que o ornamento feito sobre o próprio corpo era, em efeito, uma das primeiras manifestações artísticas. (GLUSBERG, 1986, p. 109, tradução nossa)

A proposta de moldar-se à natureza surgiu com a intenção de metamorfosear o corpo transformando-o no objeto com o qual este interage. Inúmeras são as referências culturais em diferentes linguagens como literatura, música, vídeo que propõem uma conexão do homem com a natureza, um retorno às origens. Seguem algumas observações sobre os objetos com os quais a autora interagiu:

- sobre o elemento pedra: sessões espíritas de Umbanda, chamadas de Giras, evocam Xangô para clamar justiça, pois este é o guardião das pedreiras, muitas vezes oferendas como comidas, velas, cânticos são realizados nas pedreiras, consideradas a morada desta entidade, em solicitação a um pedido de ajuda.

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51 Outros exemplos poderiam ser dados, no entanto, a questão que se propõe é de que ao encaixar-se na pedra em côncavo e convexo ou emoldurar o ventre na raiz de uma árvore, que o corpo possa não apenas preencher estes espaços naturais fisicamente como possa o performer preencher-se destas substâncias invisíveis que nutrem as pedras, as árvores, o solo, o vento. Que se possa reverenciar o primitivo, incorporando sua essência na alma e se possível deixando sulcos na pele para que a impressão do que se experienciou seja explícita. “Por baixo da terra, a árvore venerável abriga ‘uma árvore oculta’, feita de raízes vitais constantemente nutridas por águas invisíveis” (ESTES, 2007, p.29)

b.2) Raiz

Raiz que havia em mim sem nunca saber-se existir Descobre-se brotando de cima abaixo

Confunde-se com musgos, insetos e fungos Brota firme e lânguida como suas ancestrais Deliciosamente macia e flexível

Pronta pra fixar-se no tempo (TURA, Paula, 2013)

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A obra Raiz foi como a Série Encaixes (fig. 23, 24, 25) realizada nas Ruínas da Lagoinha. Em continuidade à Série Encaixes, a obra Raiz aprofunda a proposta de moldar-se à natureza. Nesta proposta, o encaixe do corpo exige que este mantenha a pele em total contato com o elemento natural, neste caso, a raiz de uma árvore. Na Série Encaixes, o contato da artista com os elementos naturais eram de apoio para seu equilíbrio pois não havia possibilidades de se encaixar fisicamente à pedra ou à raiz que envolvia o ventre. Foi necessário manter um distanciamento técnico para que o encaixe do ventre com a pedra e com a raiz da árvore pudesse acontecer. Por outro lado, a intenção original de preencher o espaço fisicamente e sair do cenário preenchido com os elementos invisíveis que constituem o natural se estendem da Série Encaixes para a obra Raiz.

Na obra Raiz, a artista está nua com o corpo colado ao tronco da árvore como que abraçada à árvore. Sente a textura macia do musgo, a rugosidade da casca da árvore com seus relevos e abcessos, obstrui o caminho das formigas no transporte de seus alimentos. Tem o olfato inebriado pelo cheiro da terra úmida, pois estava fechada num cerco de raízes que não permitem o alcance dos raios solares.

E que árvores! Aquele lugar era mesmo especial. Olhando assim, à primeira vista, elas pareciam apenas lindas árvores cheias de fruta; mas chegando bem pertinho, descobria-se que elas eram mulheres- árvores.

Na verdade, aquelas árvores-mães eram mães de verdade. Pelo menos foram, até o dia em que a aldeia onde elas moravam com seus filhos foi invadida por uma outra tribo inimiga que, como castigo, matou o marido delas e levou as crianças. E elas ficaram tão, mas tão tristes por perder os filhos, que resolveram ficar para sempre ali, à espera deles. Plantadas como árvores, aguardando de braços abertos a volta das crianças. (FRANCO; CATUNDA 2004, p.91)

O processo de desenvolvimento desta performance solicitou que a performer mantivesse-se atenta a toda extensão de sua pele, aos cheiros exalados pelo ambiente, aos zumbidos dos insetos. Sentiu a firmeza e a flexibilidade desta raiz com a qual se abraçava, confidenciou segredos e foi ouvida, teve a pele acariciada pela leve rugosidade da raiz e o corpo utilizado como ponte para insetos que a confundiam com uma estátua. Não sabe relatar se ouviu confidências das raízes por não ter o ouvido treinado para tal ou se porque as raízes como transportadoras de nutrientes são mais reservadas. Sabe apenas dizer que as árvores pertencem a uma antiga comunidade de mulheres que protege os segredos mais antigos da humanidade.

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53 minúsculos é colocar a sua pele também à disposição destes mínimos seres; os ouvidos são presenteados com a identificação de inúmeros sons devido ao silêncio do ambiente; e para que todas estas sensações sejam percebidas, os olhos devem manter-se fechados, pois apenas assim o corpo encontra seu eixo e os demais sentidos tornam-se passíveis de tomar consciência do que está acontecendo.

A busca do desenvolvimento pessoal é um dos princípios centrais da arte de performance e da live art. Não se encara a atuação como uma profissão, mas como um palco de experiência ou de tomada de consciência para utilização na vida. Nele não vai existir uma separação rígida entre arte e vida. (COHEN, 2011, p.104)

A performance da obra Raiz solicita introspecção, complacência, contemplação e entrega. Entrega esta que se relaciona à devolução do corpo ao seu local de origem e pertencimento: o ambiente natural.

b.3) Série Corpo-folha

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54 Fig. 27. Paula Tura. Corpo folha I, 2012.

Fotografia Will Aguiar. Ruínas da Lagoinha, Ubatuba-SP.Acervo da artista

Fig. 28. Paula Tura. Corpo folha II, 2012. Fotografia Will Aguiar. Ruínas da Lagoinha,

Imagem

Fig. 2. Paula Tura. Pintura corporal, 2012. Fotografia   Will Aguiar. Acervo da artista
Fig. 4. Paula Tura: Pintura corporal, 2013.
Fig. 11. Raio-x
Fig. 12. Paula Tura. Seio, 2012. Molde em gesso. Fotografia Will   Aguiar. Acervo da artista
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Referências

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