ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQUISA
CURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
DESIGN INDUSTRIAL COMO FONTE DE
VANTAGEM ESTRATÉGICA –ESTUDO DE
CASO NA INDÚSTRIA MOVELEIRA
MÁRCIA LOUSADA CARDOSO
Rio de Janeiro - 2006! "
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CARDOSO, Márcia. Design industrial como fonte de vantagem estratégica – estudo de caso na indústria moveleira. Rio de Janeiro, 2006. Dissertação (Mestrado em Administração Pública) – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas – Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro, 2006.
Esta pesquisa teve origem na identificação da carência de investigações acadêmicas que reconheçam o design industrial como fonte de vantagens estratégicas. Optou-se pela adoção de uma abordagem ampla, pouco comum nas pesquisas de administração, por intermédio da qual busca reconhecer aspectos comumente não considerados pela maior parte dos autores da literatura de estratégia e marketing. A investigação foi realizada em uma grande empresa brasileira, que atua na indústria moveleira, mais especificamente no segmento de móveis para escritório. Foram selecionados dois casos de desenvolvimento de produtos, um deles classificado pela empresa como sucesso e outro como fracasso. Trata-se de um estudo exploratório, em que foram apontadas algumas questões importantes que poderão servir como base para pesquisas futuras: a existência de conflitos intra-organizacionais entre as áreas de marketing e engenharia; o poder das grandes empresas sobre a conformação dos mercados em que atuam, e a influência do Estado sobre a dinâmica do mercado local.
ABSTRACT
1. Introdução 7
1.1. Apresentação do problema 7
1.2. Alguns ajustes conceituais 10
1.3. Relevância do estudo 11
2. Interfaces entre design industrial, marketing e estratégia 13
2.1. Design industrial 15
2.1.1. Um histórico do design industrial 17
2.1.2. Design industrial no Brasil 21
2.1.3. Design industrial e marketing 23
2.1.4. Conflitos intra-organizacionais 26
2.1.5. A relevância do design industrial para a esfera pública 29
2.2. Marketing: principais aspectos no âmbito dessa pesquisa 33
2.2.1. Um histórico do marketing 34
2.2.2. Orientação para o mercado e as teorias baseadas em recursos 43
2.2.3. Algumas críticas à disciplina 46
2.2.4. A disciplina de marketing em países menos desenvolvidos 50
2.2.5. Uma abordagem mais ampla em marketing 51
2.3. Estratégia: principais questões ligadas ao escopo desta investigação 55
2.3.1. Afinal, o que é estratégia? 55
2.3.2. Duas abordagens em estratégia 57
2.3.3. Público e privado: interface pouco presente na literatura de estratégia 62
2.3.4. O design industrial, as teorias baseadas em recursos e a ação do Estado 66
2.4. Um framework baseado em marketing e estratégia 71
3. Metodologia 75
3.1. Sobre metodologias de pesquisa em ciências sociais 75
3.2. A escolha do método 77
3.3. Alguns procedimentos adotados na pesquisa de campo 81
4. Descrição de resultados 85
4.1. A indústria moveleira 85
4.1.1. A indústria moveleira no mundo 86
4.1.2. A indústria moveleira no Brasil 88
4.2. A empresa 96
4.3. Breve descrição dos casos 102
4.3.1. Caso F – Fracasso 102
4.3.2. Caso S – Sucesso 103
5. Análise dos Resultados 107
5.1. Design industrial e conflitos intra-organizacionais 108
5.1.1. Design industrial e conflitos na empresa investigada 111
5.1.2. Considerações Finais 119
5.2. A configuração do segmento de móveis para escritório 122
5.2.1. A assimetria do mercado 122
5.2.2. A criação de normas técnicas 131
5.2.3. Considerações finais 134
5.3. A influência do Estado sobre o design industrial 135
5.3.1. Design industrial e propriedade intelectual 136
5.3.2. Considerações finais 140
6. Conclusões e Implicações Finais 142
6.1. Conclusões da análise 142
6.1.1. Conflitos intra-organizacionais e design industrial 142
6.1.2. A configuração dos mercados 143
6.1.3. Estado e design industrial 145
6.2. Contribuições do estudo 145
6.2.1. Para a academia 145
6.2.2. Para os praticantes 146
6.2.3. Para a formulação e a implementação de políticas públicas 146
6.3. Sugestão de pesquisas futuras 147
6.4. Limitações da pesquisa 148
7. Referências Bibliográficas 150
1 INTRODUÇÃO
1.1 Apresentação do Problema
Lidar com questões e interesses públicos e privados relacionados a um mesmo tema não
é freqüente ou trivial na administração. A área divide-se em duas: a administração pública e a
administração de empresas. Os pesquisadores tendem a concentrar seus esforços em apenas
um dos lados, que possuem conceitos, teorias e disciplinas próprios. A troca do conhecimento
gerado entre os dois grupos é pouco significativa.
Apesar da existência desta espécie de ‘fronteira’ na academia, a prática e alguns textos
em estratégia e em marketing mostram que há relações de influência mútua entre o privado e
o público (BAILEY, 1999; ARNOLD, 2003; MARTIN, 2003; PORTER, 2003). A
importância dos especialistas em cada um dos lados é indiscutível. O reconhecimento da
permeabilidade desta fronteira, entretanto, indica a necessidade de que pesquisadores lidem ao
mesmo tempo com os mundos privado e público, relacionando teorias e conceitos
inicialmente desenvolvidos para apenas um dos lados.
Não se trata de simplesmente transportar teorias de um contexto para o outro, mas de
aumentar o diálogo entre as áreas, reconhecendo o impacto das ações de uma sobre a outra. O
aumento da compreensão da realidade das empresas privadas pela administração pública e das
particularidades do Estado pela administração de empresas certamente enriquecerá o
conhecimento na área de administração. Além disso, o reconhecimento de relações pouco
investigadas pode aproximar a academia da realidade e de praticantes.
Ainda que mais complexa e arriscada, foi este tipo de abordagem que adotei no
desenvolvimento desta dissertação. Houve um esforço especial para reconhecer a influência
do Estado sobre as empresas privadas e também a atuação das empresas com relação à ação
Em grande parte do mundo, especialmente no que se refere à indústria, o design é uma
reconhecida fonte de vantagem estratégica para as empresas. Correspondentemente, o Estado
também tem mostrado interesse em fortalecer o design industrial, de forma que a atividade
passe a promover resultados vantajosos para o país, com a conseqüente elevação da
competitividade nacional.
No Brasil, o estudo acadêmico do tema apresenta amplas possibilidades, já que a
implantação da primeira escola de desenho industrial brasileira ainda não completou meio
século. Devido ao seu recente estabelecimento, os estudos desenvolvidos no país tendem a
buscar soluções para a própria disciplina, que enfrenta problemas típicos de áreas ainda não
amadurecidas. São comuns as discussões relativas às suas origens e responsabilidades. No
Brasil, a atividade permanece pouco conhecida por áreas com as quais necessariamente deve
interagir, como a administração, a engenharia, a psicologia e a sociologia.
Quase quatro décadas após a abertura dos primeiros cursos universitários de design e da fundação da primeira associação de profissionais da área, o design continua a ser uma atividade relativamente desconhecida para a grande massa da população e, mesmo para as elites, o seu potencial de realização permanece pouco explorado. (CARDOSO, 2004, p.198)
Alguns aspectos do design mostram maior relevância para os interesses da
administração, como é o caso do design industrial. O design costuma ser apontado como fonte
de vantagem estratégica para empresas e países que souberem utilizá-lo, de acordo com suas
próprias características e com o contexto em que se inserem. Por sua capacidade de agregar
valor à produção nacional, o design tem atraído a atenção dos governos de vários países.
A literatura sobre design industrial é bastante ampla em vários países de economia mais
desenvolvida e vem crescendo em qualidade e volume no Brasil. Apesar disso, poucas vezes
identifica-se uma abordagem do tema que tenha como objetivo compreender sua relação com
a criação de vantagem estratégica para a empresa. Nessa área é maior a ocorrência de
estratégicos para a empresa, relacionados aos mercados em que atua. A influência do
tradicional ‘conceito de marketing’1 ainda parece significativa na literatura de design, apesar
de sua absorção pelo - mais amplo - conceito de ‘orientação para o mercado’ na literatura de
marketing.
Questões estratégicas associadas ao design industrial, que podem assumir importância
nacional por relacionar-se ao domínio de mercados e à redução do poder da concorrência, não
vêm sendo tratadas, demandando maior atenção dos pesquisadores de estratégia e marketing.
No mundo globalizado, a desconsideração pelo Estado, ou por pesquisadores, do poder de
grandes corporações é uma questão preocupante (ARNOLD, 2003). Da mesma forma,
reconhecer o poder das corporações e empresas locais torna-se relevante tanto para apoiá-las
mais adequadamente frente às concorrentes estrangeiras, quanto para evitar que a eventual
liderança em mercados locais impeça uma concorrência “saudável”.
Numa iniciativa de caráter exploratório, esta pesquisa teve como objetivo investigar de
que forma o design industrial é utilizado como fonte de vantagens estratégicas por uma
grande empresa brasileira.
A seleção do setor ao qual a empresa investigada pertence baseou-se na relevância do
design industrial para a atividade. Entre as empresas moveleiras o design industrial é
considerado como o elemento próprio de inovação (COUTINHO, 2001), portanto possível
fonte de vantagem estratégica.
Para investigar a relevância do design industrial em uma grande empresa da indústria
moveleira, mais especificamente do segmento de móveis para escritórios, adotei uma
abordagem que reconhece a importância da interface público/ privado. Ao analisar dois
diferentes processos de desenvolvimento de produtos, este estudo de caso buscou também
identificar a intensidade e o tipo de influência exercida pela área de marketing sobre a
atividade de design industrial.
1.2 Alguns Ajustes Conceituais
Para melhorar a compreensão das questões que apresentei nesta pesquisa é necessário
definir de forma clara o significado da expressão ‘design industrial’. A atividade é
compreendida como “um processo de adaptação dos produtos de uso, fabricados
industrialmente2, às necessidades físicas e psíquicas dos usuários ou grupos de usuários”
(LÖBACH, 2001, p.21).
Neste estudo não foram considerados, portanto, aspectos do design relacionados à
programação visual, desenvolvimento de marcas ou outra atividade qualquer que não diga
respeito ao projeto de produtos industriais.
Uma compreensão mais ampla do design industrial é fornecida por Bonsiepe (1973),
que inclui aspectos mercadológicos, contextuais e estéticos em sua definição:
Industrial design is tightly interwoven with and dependent on the socio-economic context in which it is exercised (...). It is concerned with the improvement of usability of industrial products which forms part of the overall quality of a product. From the point of view of industrial design, a product is primarily an object which provides certain services, thus satisfying the needs of user (...) It is concerned with ‘formal properties’ of industrial products. Formal characteristics refers to the overall appearance of a product, including its three dimensional configuration, its ‘physionomy’, its texture and colour (...) It is an innovative activity. It is one special type of technological innovation... It is concerned with the marketability of the product in that it relates the product to its market in terms of both raw material supply and product demand. (BONSIEPE, 1973)
Nesta dissertação, a expressão ‘design industrial’ foi adotada para designar a atividade
de projetar objetos industriais, levando em consideração tanto as particularidades do mercado
em que serão comercializados (incluindo a participação e o interesse do Estado neste
mercado) quanto as prioridades e limitações da empresa produtora. O foco do estudo não se
restringiu ao ambiente interno ou externo da empresa, pois busquei considerar o conjunto
completo das diferentes influências sobre o design industrial.
1.3 Relevância do Estudo
Esta pesquisa atende a diferentes grupos de interesse: a academia, as empresas privadas
e o Estado. Devido ao reconhecimento das interfaces entre as esferas pública e privada, a
abordagem de administração que adotei possibilitou o preenchimento de lacunas da disciplina,
tanto na administração de empresas, quanto na administração pública. Posso afirmar também
que o uso de casos polares (sucesso x fracasso) contribui para a identificação de aspectos
pouco comuns em estudos de caso em administração.
Mais especificamente, as disciplinas de Estratégia e Marketing - que apresentam maior
relação com o design industrial como fonte de vantagem estratégica - têm sido criticadas por
seu afastamento da realidade e dos praticantes (HUNT, 2002; PIERCY, 2002; FARIA, 2004).
Diferentes autores fornecem sugestões diversas com relação aos meios para se alcançar maior
aproximação entre a academia e a realidade. Na pesquisa realizada, esta aproximação se deu
por meio do reconhecimento de duas significativas questões relacionadas ao tema, mas pouco
presentes na literatura acadêmica: (a) a ação estratégica de grandes empresas é influenciada
pelo setor público, e (b) existem conflitos internos na organização, resultantes de processos
multidisciplinares que envolvem diferentes áreas.
Como benefício para os profissionais e acadêmicos da área de design industrial, esta
pesquisa procurou promover uma abordagem mais realista, portanto menos idealizada, do uso
do design industrial por uma grande empresa brasileira como fonte de vantagem estratégica.
Ao Estado (e aos pesquisadores da administração pública), a investigação proporcionou:
brasileira, concedendo subsídios importantes para a elaboração e adequação de programas
específicos de apoio ao desenvolvimento do design nacional; (b) a possibilidade de considerar
o design industrial sob um enfoque estratégico, mais amplo e próximo do que se observa em
economias mais desenvolvidas; e (c) o reconhecimento da interface entre os setores público e
privado por meio da identificação da influência mútua entre as duas esferas.
Para as empresas e especialmente para os praticantes das três áreas de conhecimento
relacionadas a este trabalho (design industrial, estratégia e marketing), esta pesquisa é
relevante por investigar um tema pouco abordado, sob uma perspectiva menos reducionista.
Para este grupo de interesse, o estudo apresenta alguns aspectos relevantes do design
industrial como fonte de vantagem estratégica, considerando as características do contexto
2 INTERFACES ENTRE DESIGN INDUSTRIAL, MARKETING E ESTRATÉGIA
Nesta pesquisa contemplei o conhecimento desenvolvido por autores de três
disciplinas - design industrial, marketing e estratégia – e adotei uma abordagem que
reconhece a influência mútua entre os âmbitos público e privado. Com base em conceitos da
literatura de marketing e de estratégia relacionados ao design industrial, desenvolvi um
framework que delineou o âmbito da investigação.
Na revisão de literatura tive como objetivo principal a identificação das relações entre
as áreas envolvidas, enfatizando aqueles conceitos mais presentes em cada disciplina.
Elaborei uma seção dedicada a cada uma das áreas e, ao final deste capítulo apresento o
framework multidisciplinar que utilizei como diretriz a pesquisa de campo e o trabalho de
análise.
Na seção sobre design industrial, inicialmente busquei apresentar alguns conceitos
importantes com uma breve descrição do desenvolvimento da área. Num breve histórico,
abordei mais especificamente o design industrial no Brasil. No tópico seguinte procurei
estabelecer uma relação entre design e marketing, e apontar a influência desta última área
sobre o design industrial. A seguir identifico a desconsideração pelas principais abordagens
de marketing e estratégia dos conflitos intra-organizacionais, capazes de afetar atividades
multidisciplinares como o design industrial. Finalizando, abordei a importância do design
industrial para a esfera pública.
Na segunda seção dessa revisão de literatura enfoco a área de marketing. Inicialmente
apresento um breve histórico da disciplina, apontando suas transformações ao longo do
tempo. No tópico seguinte, busco estabelecer uma relação entre o conceito de orientação para
o mercado e as teorias baseadas em recursos, estas oriundas da área de estratégia. No terceiro
tópico descrevo algumas críticas feitas à disciplina por diferentes autores, seguido de breves
defendo a importância da adoção desta abordagem em investigações que reconheçam as
interfaces entre o público e o privado, nos países em desenvolvimento.
Na terceira seção, a disciplina abordada é estratégia. No primeiro tópico apresento
uma breve introdução à disciplina. Em seguida, discorro sobre as duas principais abordagens
escolhidas para a realização desta investigação. No terceiro tópico aponto a constante
ausência da interface entre as esferas pública e privada nas pesquisas de estratégia. A seção
se encerra com a relação entre design industrial, as teorias baseadas em recursos e os
interesses do Estado.
Na última seção da revisão de literatura apresento um framework baseado nas
abordagens atualmente dominantes em estratégia e marketing, que adotei como diretriz da
2.1 Design Industrial
A palavra ‘design’ assume diferentes significados, de acordo com o contexto em que
é empregada. Áreas tão díspares quanto a moda, decoração, engenharia eletrônica e desenho
de produtos industriais são comumente identificadas como atividades de design.
Em uma empresa, o design pode estar associado a uma gama de atividades que inclui
o projeto de novos produtos, a criação e a manutenção de marcas, e a promoção dos bens e
serviços comercializados (WHYTE et al, 2003). Sua adoção como fonte de vantagem
estratégica é freqüentemente relacionada às disciplinas de marketing e estratégia (SANTOS,
2000; DREW & WEST, 2002). Mais especificamente, a importância do design industrial
para a competitividade das empresas tem sido destacada por muitos autores (ACAR FILHO,
1997; HERTENSTEIN et al, 2001; WHYTE et al, 2003).
Nesta pesquisa priorizei a investigação do design voltado para a produção industrial3.
A explicitação do conceito de design adotado teve como objetivo excluir do escopo da
pesquisa atividades de cunho artístico e artesanal.
O design industrial relaciona-se ao projeto de objetos de uso, fabricados por
processos industriais, em busca de retorno para a empresa. Objetos de uso são aqueles
desenvolvidos para atender às necessidades humanas, opondo-se à idéia de objeto artístico.
Os objetos artísticos privilegiam a estética frente ao uso e à funcionalidade, voltando-se,
sobretudo, para a satisfação psíquica do indivíduo. Devido a estas características são
freqüentemente percebidos como arte ou produtos de luxo.
Ainda que o uso e a funcionalidade sejam relevantes, o valor atribuído pelo mercado
ao objeto de uso pode estar associado a suas características tangíveis ou intangíveis. De
acordo com a literatura de marketing, cabe ao design industrial adequar o produto ao tipo de
benefício priorizado pelo mercado alvo (KOTLER & RATH, 1984; MAGALHÃES, 1997).
Um produto é adquirido por diferentes motivações: suas características físicas e
funcionalidades; sua aparência e beleza; ou ainda, algum simbolismo, relacionado a valores
sócio-culturais (BLOCH, 1995; DREW & WEST, 2002; CRILLY et al, 2004). Entende-se
por características físicas e funcionalidades todos os aspectos fisiológicos ligados ao uso do
produto. Sua aparência e beleza estão relacionadas à função estética, são características do
produto que atendem às condições de percepção do consumidor e resultam num estímulo à
aquisição do objeto. (LÖBACH, 2001)
A função simbólica do design industrial é composta por um conjunto de aspectos
espirituais, psíquicos e sociais relacionados à propriedade e ao uso do objeto. Referências
sociais, étnico-culturais, religiosas, políticas etc, conferem significados especiais ao produto
(LÖBACH, 2001). Na sociedade capitalista, os símbolos representados por produtos
industriais funcionam, sobretudo, como evidências da posição social do indivíduo
(CARDOSO, 1998). “A escolha dos bens cria continuamente certos padrões de
discriminação, superando ou reforçando outros.” (DOUGLAS & ISHERWOOD, 2004,
p.114)
Boa parte das pesquisas realizadas no âmbito do design industrial tem assumido uma
perspectiva bastante próxima da engenharia, por privilegiar características físicas e
funcionais do produto e, de certa forma, negligenciar seus aspectos intangíveis. Nas
empresas privadas, as atividades de design industrial e P&D estão freqüentemente
entrelaçadas e sua separação é uma tarefa complexa. A visão da engenharia privilegia
questões associadas à produção e tende a desconsiderar outros aspectos relevantes para o
desempenho do produto no mercado (WHYTE et al, 2003). Em alguns segmentos de
mercado, as características intangíveis do produto assumem maior importância,
principalmente quando as tecnologias de produção mais relevantes encontram-se
design industrial é comumente reforçado com investimentos em promoção e fortalecimento
de marca, com o objetivo de criar uma imagem específica para o produto, ou de associá-lo a
um determinado estilo de vida.
Together with market research, marketing and design are key strategic components of business which have a significant mutual dependence. All three are concerned with connecting to customers and determining the look and feel, features, functionality and appeal of service or product range. (DESIGN COUNCIL, 2002)
A apropriação do design industrial pela estratégia de marketing tem ocorrido aos
poucos (LEE-MORTIMER, 1994). Nem sempre há predomínio do marketing sobre a
atividade, visto que inicialmente esta se vinculava à produção. No próximo tópico apresento
um breve histórico do design industrial, relatando alguns acontecimentos que conferem
especial importância ao caráter estratégico do design industrial, tanto para a empresa privada
quanto para o Estado.
2.1.1 Um Histórico do Design Industrial
O design industrial possui uma longa trajetória, significativamente afetada pelas
transformações econômicas e sociais ocorridas na Europa e nos Estados Unidos, desde a
primeira Revolução Industrial.
A atividade teve início no século XIV, quando a indústria têxtil passou a valorizar os
responsáveis pelo design de tecidos e a oferecer-lhes salários maiores do que aqueles
recebidos pelos funcionários da produção (DORMER, 1993). A Revolução Industrial
conferiu forte importância ao design, que nesta época alcançou maior destaque na Inglaterra.
Os profissionais da área publicaram um dos primeiros periódicos dedicados ao design
industrial, o Journal of Design and Manufacture. Os artigos debatiam a perda de qualidade
dos produtos industriais em geral, que passaram a ser cada vez mais padronizados. Esta
constatação era associada pelos autores à redução da capacitação dos operários das fábricas,
único tipo de atividade. A divisão de tarefas típica do modo de produção capitalista extinguiu
a possibilidade de que um único indivíduo controlasse todas as etapas da produção, como era
comum nas antigas corporações de ofício (CARDOSO, 2004).
Durante a primeira metade do século XX, marcada pelas duas grandes guerras mundiais, o design oscilou sempre entre orientações formalistas, herança das escolas de belas artes, e outras que buscaram uma superação dessas interpretações. Mas, todas as orientações coincidiram num aspecto: a partir de 1865 e 1870, com as guerras de unificação da Alemanha e da Itália, na Europa, da Revolução Meiji, no Japão e a Guerra Civil, nos Estados Unidos, foi irreversível a preponderância da ideologia industrialista sobre concepções artesanais, mais condizentes com os regimes agrários e semi-feudais contra os quais esses movimentos políticos se posicionaram. (SOUZA, 2004, p.16)
A Alemanha tem reconhecida tradição em design, iniciada pela famosa Bauhaus
(1919-1933) e, posteriormente, mantida pela Höchschüle für Gestaltung (1955-1968), em
Ulm. A Bauhaus foi uma escola lembrada pela corrente do design que priorizava a função do
produto e condenava o uso de adornos. A simplificação do design era defendida como forma
de facilitar a produção em massa. A escola de Ulm voltava-se marcadamente para a
indústria. Ali, as disciplinas ligadas às artes foram excluídas do currículo escolar e
substituídas por matemática, sociologia, ergonomia e economia. Em Ulm, buscou-se
estabelecer métodos padronizados de trabalho para o designer, aproximando o profissional
das necessidades da indústria (DORMER, 1993). Ao contrário da Bauhaus, esta escola
conseguiu estabelecer parcerias com a indústria alemã, “em especial com a Braun, na área de
projetos de aparelhos eletrodomésticos” (CARDOSO, 2004, p.169).
Nos Estados Unidos, apenas depois do fim da Primeira Guerra Mundial identificou-se
maior valorização do design industrial. O término do conflito promoveu o aumento da
capacidade produtiva, seguido de uma explosão do consumo, posteriormente oprimida pela
Grande Depressão de 1929. Naquela época, a importância dos designers para o desempenho
da indústria já havia sido percebida pelas empresas do país. Algumas delas passaram a
The first World War stimulated an enormous expansion of America´s productive capacity, which was converted after 1918 into a consumer boom. (...) Standartization and rationalization, improved production methods and new materials could do much to reduce unit costs, while an emphasis on visual form became an important instrument to boost sales, not least because, with the growth of advertising, the visual image was frequently more widely diffused than the product itself. (HESKETT, 1980, p.105)
A associação do marketing e da propaganda ao design industrial nos Estados Unidos
contrasta com a ênfase nas características técnicas do design alemão, mais próximo da
engenharia industrial.
Ainda na década de 20, surgiu uma importante corrente do design, que ganhou força
nos anos 30 e consolidou-se após a Segunda Guerra Mundial. O Estilo Internacional foi um
movimento de designers de origem européia, que defendiam uma única forma ideal,
simplificada e definida segundo sua adequação funcional, para todos os objetos. Esta
abordagem do design foi significativamente impulsionada pelo Museu de Arte Moderna
(MOMA) de Nova Iorque. Diversas exposições sobre o padrão modernista de ‘bom design’,
realizadas entre 1932 e 1939 e depois entre 1950 e 1955, conferiram projeção mundial ao
conceito. Paradoxalmente, o Estilo Internacional favoreceu a expansão das multinacionais,
apesar de originalmente influenciado por ideologias coletivistas, em busca de sociedades
mais igualitárias (CARDOSO, 2004, p.152-154).
Um dos fenômenos mais notáveis do pós-Guerra tem sido o império das grandes empresas multinacionais. A impressionante expansão dessas empresas para além das fronteiras nacionais de suas matrizes decorre de uma política consciente de internacionalização econômica, desenvolvida desde a década de 1940 para coordenar a recuperação e futura operação da economia mundial. (CARDOSO, 2004, p.151)
Este período foi marcado pelo crescimento da produção industrial, inclusive em
países até então essencialmente agrários, como o Brasil, que necessitaram suprir a ausência
No pós-guerra, a elevação da capacidade de produção transformou-se em um sério problema
a ser enfrentado pelas empresas e países, devido ao grande excedente produzido.
A solução encontrada nos Estados Unidos baseou-se na reunião de duas principais
iniciativas: a ampliação do crédito ao consumidor, pelo governo federal, e a adoção do
conceito de obsolescência estilística4, pelas empresas do país. O estímulo ao consumo de
reposição, reforçado pelo aumento dos recursos para crédito de curto prazo em mais de cinco
vezes, criou um ambiente especialmente propício ao estabelecimento da sociedade
consumista. A euforia de consumo resultante deste contexto gerou uma confiança ilimitada
no ‘american way of life’ (CARDOSO, 2004). Associado a este modo de vida baseado no
consumo, o ‘american look’ serviu para difundir características tipicamente associadas aos
produtos industrializados fabricados naquele país.
O crescimento acelerado da indústria promoveu a aproximação do marketing e do
design industrial nas grandes corporações dos Estados Unidos, que utilizaram as ferramentas
das duas áreas em sua estratégia para a conquista de novos mercados. Propositadamente,
foram divulgados aspectos diferentes daqueles associados à tradição européia, buscando-se
valorizar a indústria norte-americana e promover a produção nacional como um todo. O
objetivo era estabelecer os pilares de uma cultura própria, associada ao sucesso pessoal e
almejada por consumidores de outros países (DORMER, 1993, p.121). O design assumiu
importância estratégica para as empresas e o Estado, passando a ser valorizado por grande
parte das sociedades ocidentais, com seu consumo relacionado ao sucesso e ao bom gosto.
Nos países em desenvolvimento, este valor estratégico do design só foi compreendido
a partir do reconhecimento dos resultados obtidos pela indústria dos países mais
desenvolvidos (BONSIEPE, 1991). Este atraso resulta, em parte, também de seu tardio
processo de industrialização, condição indispensável para a valorização do design industrial
(tal como considerado neste trabalho). Nestes países, a inserção tardia do design no mundo
empresarial parece ter contribuído para sua freqüente associação a atividades de cunho mais
artístico do que propriamente econômico, ou mesmo político (AMIR, 2002).
Neste breve histórico do design industrial procurei destacar o efetivo uso estratégico
da atividade, tanto por empresas privadas, quanto pelo Estado. O reconhecimento desta
possibilidade demorou a ocorrer nos chamados países menos desenvolvidos, nos quais a
industrialização tardia contribuiu para o atraso do desenvolvimento do design industrial.
No próximo tópico apresento maiores detalhes sobre a atividade no Brasil.
2.1.2 Design Industrial no Brasil
As primeiras manifestações do design brasileiro ocorreram por volta dos anos 30,
ainda ligadas a uma prática artesanal, desempenhada por modernistas que criavam peças de
mobiliário desprovidas de ornamentos. Ainda não se pode falar de design industrial, apenas
de peças de autoria, com produção restrita. Nos anos 50 e 60, a crescente industrialização do
país possibilitou o início efetivo do design industrial no país, com ênfase na indústria
moveleira. O conceito de móveis seriados, modulados, com preços mais acessíveis, começou
a ser difundido. Naquela época, a Mobília Contemporânea destacou-se com sua produção de
móveis residenciais ergonomicamente projetados e montados pelo próprio cliente. Outras
empresas importantes neste segmento foram a OCA e a Mobilinea. Também naquela época,
passaram a ser comercializados no país móveis com design europeu e dos Estados Unidos,
por meio de parcerias entre empresas brasileiras e estrangeiras sem produção local (LEAL,
2002).
Em 1962, teve início o “primeiro curso regular estável de design em nível superior no
arquitetura na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, em São Paulo (CARDOSO,
2004, p.170). No ano seguinte foi fundada, no Rio de Janeiro, a primeira escola de design
brasileira, a Escola Superior de Desenho Industrial (ESDI), cujas diretrizes foram fortemente
influenciadas pela escola alemã de Ulm.
Ainda que já houvesse profissionais com formação específica, as empresas brasileiras
que desejavam bom design, em geral, compravam no exterior ou recorriam à cópia,
dificultando o desenvolvimento de características próprias do produto nacional (MORENO,
2002). Enquanto os Estados Unidos divulgavam o “american way of life”, o Brasil
continuava importando conceitos estéticos e formais desenvolvidos pelo design estrangeiro e
pagando por licenciamentos ou royalties para replicar itens desenvolvidos em outros países.
Durante os anos 70 e 80, foram feitos importantes investimentos públicos na criação
de laboratórios, como no Instituto Nacional de Tecnologia – INT, para promover o
desenvolvimento do design brasileiro. Também neste período, a Federação das Indústrias de
São Paulo – FIESP criou um Núcleo de Desenho Industrial, primeira iniciativa da indústria
local voltada para a disseminação do design entre o empresariado nacional (LEAL, 2002).
Nos anos 80, foram criados prêmios para as diferentes áreas do design. Estas
premiações ajudaram a ampliar o reconhecimento da sua capacidade de gerar valor, mas
também contribuíram para a vulgarização do termo. Inicialmente usada apenas para
identificar as atividades de projetar objetos ou de desenvolver trabalhos gráficos5, a palavra
‘design’ posteriormente foi associada a outras atividades – cabeleireiros, decoração, moda –
freqüentemente com o objetivo de lhes conferir uma imagem de sofisticação.
O nível ainda reduzido de investimento em design pela indústria nacional pode ser
parcialmente explicado pela crença de que o retorno correspondente não é satisfatório. Ainda
é comum a opção pelo plágio ou pela aderência a tendências impostas por grandes empresas,
freqüentemente de origem estrangeira, com produtos desenvolvidos fora do país e apenas
produzidos no Brasil, quando não são integralmente importados.
No país, apesar de iniciativas do Estado e da sociedade civil em prol da estruturação
da área, o design – aqui não se fala apenas do design industrial - ainda convive com uma
ampla fragmentação e com uma frágil formalização. A própria profissão de designer não é
regulamentada no Brasil. Não é possível identificar uma instituição robusta que represente o
design no país, seja formada por praticantes ou por pesquisadores da área. Diversas
associações já foram criadas, mas nenhuma delas é capaz de representar o design brasileiro
como um todo. Em geral, seus objetivos limitam-se a uma área de atuação específica, a uma
região do país ou a um propósito único (premiações, por exemplo).
A relação do design com outras áreas de saber contribui para sua divulgação, ao
mesmo tempo em que ‘contamina’ os conceitos próprios do design com idéias originais de
outras disciplinas. Aloísio Magalhães afirmava que o Desenho Industrial,
(...) não dispondo nem detendo um saber próprio, utiliza vários saberes; procura sobretudo compatibilizar de um lado aqueles saberes que se ocupam da racionalização e da medida exata – os que dizem respeito à ciência e à tecnologia – e de outro, daqueles que auscultam a vocação e a aspiração dos indivíduos – os que compõem o conjunto das ciência humanas. (MAGALHÃES, 1998)
Neste tópico apresentei um breve panorama do design no Brasil, identificando sua
frágil estruturação, resultante, em grande parte, de seu próprio histórico de desenvolvimento
no país. A relação do design industrial com a área de marketing será abordada no próximo
tópico.
2.1.3 Design Industrial e Marketing
O design é comumente reconhecido nas literaturas de design e de marketing como
uma importante fonte de vantagem estratégica para a empresa. Esta vantagem é relacionada
forma, superior ao da concorrência. Deve-se reconhecer que investimentos em promoção
também podem ter influência sobre a difusão dos benefícios do produto, sejam estes
funcionais, estéticos ou simbólicos.
A associação de um aspecto simbólico ao produto industrial freqüentemente resulta
do uso de técnicas de promoção e propaganda que ressaltam aspectos do design (DREW &
WEST, 2002). Estas ferramentas são usadas para criar ou reforçar os atributos intangíveis do
produto. Determinados valores são associados ao seu uso e propriedade, de acordo com os
objetivos definidos pelo planejamento do marketing (público alvo, imagem do produto,
posicionamento relativo à concorrência). Neste tipo de abordagem, a relação entre marketing
e design é muito próxima e ambos desenvolvem suas atividades com foco no cliente.
De forma geral, pode ser identificada uma significativa presença da abordagem
dominante de marketing - que defende a orientação para o mercado6 - na literatura de design
industrial. Os textos voltados para os problemas da gestão do design de produtos costumam
defender o atendimento das necessidades do cliente e o acompanhamento do que é ofertado
pela concorrência (ver, por exemplo, URBAN & HAUSER, 1993; MAGALHÃES, 1997;
DESIGN COUNCIL, 2002).
O conceito de marketing – ou, mais especificamente, o de orientação para o cliente -
é um dos aspectos da orientação para o mercado que recebe maior atenção na literatura de
design industrial. Argumenta-se que ao manter “o foco no cliente, a gestão estratégica do
processo de design irá reduzir sensivelmente as possibilidades de fracasso do produto”
(SANTOS, 2000, p.77).
As literaturas de design e de marketing indicam o gerente de marketing como a
principal interface entre o mercado consumidor e o design industrial. O gerente de marketing
deve identificar as necessidades dos clientes e delinear as principais características do
produto. Somente depois dessa etapa estas características seriam especificadas segundo a
linguagem da engenharia. Este tipo de literatura atribui ao marketing um papel ‘passivo’ com
relação ao mercado. A preocupação excessiva com a coleta de informações acerca do
consumidor (ver, por exemplo, IRIGARAY et al, 2004, p.47), subentende que a empresa não
é capaz de interferir no mercado.
O poder de determinadas empresas sobre os mercados não costuma ser considerado
pela maior parte dos autores de marketing (ver FARIA, 2004). Há uma aceitação implícita de
que oportunidades de mercado não são passíveis de criação pelas empresas. Confere-se, em
geral, um papel reativo às empresas, que apenas investiriam na identificação de
oportunidades surgidas no mercado (ver KOTLER, 1999, p. 55), em lugar de construí-las
conforme seus interesses.
A área de marketing costuma desconsiderar estratégias empresariais que têm como
objetivo a conformação, o domínio e o controle de mercados. Em contraponto ao conceito
mais clássico de orientação para o mercado, defendido pela literatura dominante em
marketing, alguns autores das áreas de estratégia e de estratégia de marketing vêm
desafiando este paradigma (ver, por exemplo, HARRIS, 2002 e FARIA, 2006). Segundo
estes autores, as grandes empresas utilizam diferentes práticas de controle dos mercados em
que atuam e buscam direcioná-los de acordo com seus objetivos.
Neste tópico tive como objetivo mostrar que a literatura de design tende a seguir a
literatura tradicional de marketing, principalmente o conceito dominante de orientação para o
mercado. Há uma tendência a se desconsiderar determinadas características da empresa e do
próprio contexto em que esta se insere, capazes de criar vantagens estratégicas. A seguir,
apresento questões relacionadas à existência de conflitos intra-organizacionais, normalmente
2.1.4 Conflitos Intra-organizacionais
Com significativa influência sobre o design industrial, a literatura dominante de
marketing tem como principal foco o ambiente externo da empresa. Entretanto, o design
industrial sofre influências de diversas áreas, sendo marcado pelas diferentes prioridades que
existem no ambiente interno da empresa.
Segundo a abordagem das teorias baseadas em recursos7, o design industrial pode
configurar-se como parte do conjunto de capacitações da empresa (PRAHALAD &
HAMEL, 1990). Esta perspectiva em estratégia afirma que são capacitações de uma empresa
aquelas atividades ou processos desenvolvidos por ela de forma única, e capazes de
representar vantagens estratégicas (BARNEY, 1991). As capacitações podem ser
representadas por processos voltados para o ambiente externo da empresa, como o
marketing; para o ambiente interno, como a engenharia de produção; ou podem relacionar-se
com os dois ambientes, como é o caso do design industrial, neste caso podem ser
classificadas como spanning process (DAY, 1994). O design industrial interage tanto com
áreas da empresa voltadas para o mercado – como o marketing, quanto com áreas
essencialmente preocupadas com características internas da empresa – como a engenharia.
Uma das falhas apontadas nas perspectivas dominantes em estratégia e marketing é a
desconsideração de conflitos dentro das organizações, os quais podem ser causados pela
escassez de recursos ou por interesses antagônicos das diferentes áreas envolvidas nas
práticas da empresa. É freqüente pressupor a predominância de uma ‘racionalidade
econômica’ em toda a organização, que direcionaria todas as iniciativas de seus profissionais
para a otimização do uso dos recursos disponíveis8.
7 Os conceitos defendidos pelas teorias baseadas em recursos serão apresentados mais
De modo mais amplo, a literatura de negócios tende a abordar o tema ‘conflitos
intra-organizacionais’ sob uma perspectiva negativa. Afasta-se da realidade ao não reconhecer a
possibilidade de que os processos de negociação de conflitos apresentem resultados positivos
para a empresa (EISENHARDT & ZBARACKI, 1992). Especialmente nas disciplinas de
marketing e estratégia, os conflitos são apontados como problemas a resolver (MENON et
al, 1996).
Parece razoável afirmar que a existência de diferentes objetivos dentro da
organização propicia o surgimento de divergências intra-organizacionais. O poder de
negociação de cada uma das áreas envolvidas em uma determinada atividade direciona o tipo
de estratégia a ser privilegiada pela empresa. Nestas circunstâncias, a análise das
negociações para a resolução de conflitos intra-organizacionais parece oferecer uma
perspectiva mais real dos processos de implementação da estratégia.
Os planos estratégicos representam o resultado de barganhas estabelecidas entre as
diferentes áreas. A estratégia da empresa resulta, em parte, do processo de planejamento
formal e, em parte, de alterações incrementais, surgidas no dia-a-dia da empresa e absorvidas
ao longo do tempo (ANDERSON, 1982). O papel do marketing no planejamento estratégico
não está pré-determinado, mas inclui, acima de tudo, a incisiva defesa da adoção dos
conceitos de orientação para o cliente e orientação para o mercado9.
Em empresas industriais, a atividade de design industrial envolve interações
complexas entre a produção e o marketing. Os processos estratégicos costumam envolver
lógicas e prioridades específicas de cada uma destas áreas (MUKHOPADHYAY & GUPTA,
1996). Alguns trabalhos na área de marketing ressaltam a oposição entre os interesses do
P&D e da engenharia e aqueles do marketing. Este antagonismo pode resultar em conflitos
entre estas áreas, com impactos específicos sobre o design industrial (ADLER, 1976;
RUEKERT & WALKER, 1987; BERRY et al, 1999).
O design industrial é influenciado tanto pelas demandas apresentadas por marketing
quanto pelas características e limitações do processo produtivo, priorizadas pela engenharia.
A relação entre áreas técnicas como a engenharia, e áreas mais voltadas para o ambiente
externo como o marketing, tende a se caracterizar pela existência de conflitos, apesar de a
literatura dominante de marketing não se preocupar com questões deste tipo. Segundo o
conceito de orientação para o mercado, marketing tende a privilegiar o atendimento de
necessidades do cliente e a elaboração de respostas a ameaças da concorrência; enquanto a
engenharia busca viabilidade técnica e funcionalidade (RUEKERT& WALKER, 1987).
Manufacturing would like design done right the first time, few subsequent changes in design, simpler design with few moving parts, design with ease of testing, ease of service and repair. (...) Marketing would like design to reflect product performance according to customer preferences. It would also like design to be flexible enough to easily incorporate a variety of options to provide to the customers (...) Thus the goal of keeping design simple (as preferred by manufacturing) brings marketing at odds with design.. (MUKHOPADHYAY & GUPTA, 1996, p.102)
Parece improvável que todas as possíveis fontes de conflito sejam controladas, o que
ressalta a importância de se reconhecer e investigar os processo de conflitos que ocorrem
entre as áreas da empresa. Segundo Adler (1995), a existência de rotinas operacionais na
empresa confere razoável estabilidade à relação entre as áreas envolvidas em um processo.
De forma contrária, pode-se esperar que naqueles processos menos rotineiros, nos quais não
é possível implementar uma formalização rígida, ocorram mais conflitos. Este é o caso do
design industrial, que envolve atividades ligadas à criação, portanto não rotineiras. Ruekert
& Walker (1987) defendem que a ocorrência de conflitos entre as áreas envolvidas nestes
processos aumenta de forma proporcional à intensidade do investimento da empresa no
lançamento de novos produtos. Por esta razão, estratégias que enfatizem a renovação do
não devem ser percebidos como fatores intrinsecamente negativos, mas como oportunidades
para solucionar diferenças entre áreas de forma positiva para a empresa.
Neste tópico, apontei essencialmente a importância de se reconhecer a existência de
conflitos no interior das organizações, freqüentemente ignorados pelas literaturas de
estratégia e marketing. Especial destaque foi dado à atividade de design industrial e sua
relação com as áreas de marketing e engenharia.
No tópico seguinte procurei apontar a importância do design industrial sob a
perspectiva do Estado.
2.1.5 A Relevância do Design Industrial para a Esfera Pública
A atuação em mercados globalizados encontra-se hoje entre as prioridades da grande
maioria dos países. No Brasil, a expansão do liberalismo econômico, a desregulamentação de
mercados e as privatizações expuseram as empresas nacionais à concorrência global e
disponibilizaram uma ampla oferta de bens e serviços aos consumidores. A concorrência
baseada em custos foi substituída por uma ampla gama de vantagens desenvolvidas por cada
empresa.
De forma geral, o confronto de empresas brasileiras com as empresas transnacionais
freqüentemente se estabeleceu em patamares desiguais, desfavorecendo a indústria nacional
(FURTADO, 1999). As vantagens das grandes empresas estrangeiras resultam muitas vezes
de seu porte gigantesco e relacionam-se não apenas a seus produtos, mas também a questões
ligadas ao poder econômico e político (MURTHA & LENWAY, 1994).
O reconhecimento deste fato não é comum nas literaturas de estratégia e marketing,
mas alguns autores de outras áreas apontam práticas adotadas por estas organizações que
incluem a manipulação da esfera pública em países menos desenvolvidos (ver BAILEY,
1999; ARNOLD, 2003 e MARTIN, 2003). No Brasil, a promoção da indústria local, com a
criação de vantagens para as empresas nacionais, está relacionada também à solução de
entraves impostos pela esfera pública ao desenvolvimento econômico nacional.
Sob a perspectiva do Estado, o design industrial pode contribuir para a expansão da
economia, com a geração de vantagens estratégicas para as empresas nacionais. O
reconhecimento da relevância estratégica do design para os países resultou na elaboração de
diversos programas de apoio público à atividade. Tais questões não costumam ser
reconhecidas pelas literaturas de estratégia e de marketing devido à ausência de diálogo entre
as áreas de administração de empresas e de administração pública.
What is intriguing is that several countries have explicitly recognized design´s potential by crafting policies and programs that amplify the good results that accrue to individual corporations. (WALTON, 2004)
Ainda que nem sempre tenham sido programas tão amplos como aquele desenvolvido
pelos Estados Unidos no período posterior à Segunda Guerra Mundial, verifica-se a
existência de diferentes formas de apoio público à atividade. Os critérios e modelos adotados
diferem bastante, em função do nível de desenvolvimento sócio-econômico, da capacitação
dos profissionais locais, da estrutura existente e mesmo das prioridades estabelecidas em
cada país (para mais detalhes ver, por exemplo: BONSIEPE, 1973; BERNSEN, 1987;
AMIR, 2002; GRZECZNOWSKA & MOSTOWICZ, 2004).
design terá primeiramente que atacar as deficiências do seu próprio contexto, que só poderão ser identificadas com uma compreensão apurada dos fatores que o influenciam. (RAULIK, 2004)
No Brasil, a primeira escola de design foi implementada em 1962, na cidade do Rio de
Janeiro. A partir da década de 70, o Estado aumentou o investimento de recursos públicos na
área, com o objetivo de implementar laboratórios em escolas de desenho industrial e no
Instituto Nacional de Tecnologia10. Mas foi apenas na década de 90 que o país passou a contar
com um programa federal dedicado à estruturação do design nacional.
A criação em 1996 do Programa Brasileiro de Design (PBD) (...) e de programas estaduais congêneres de promoção do design, se insere como a mais recente etapa dessa longa trajetória, afirmando a continuada crença no poder do design como elemento estratégico capaz de agregar valor à produção industrial nacional. (CARDOSO, 2004, p.190)
O Programa Brasileiro de Design (PBD) tem um formato híbrido; atua tanto por meio
de iniciativas estruturantes como de subprogramas setoriais. A gama de objetivos do PBD é
bastante ampla, procura resolver problemas de ordem social, técnica e educacional. Diversas
ações buscam melhorar a infra-estrutura voltada para o design, corrigir inadequações do
sistema educacional e capacitar micro e pequenos empresários para investir em design.
Os cinco subprogramas voltados para o fortalecimento da estrutura ligada ao design
assumiram as seguintes diretrizes temáticas:
- conscientização, promoção e difusão;
- informação, normalização e proteção legal;
- capacitação de recursos humanos;
- integração e fortalecimento da infra-estrutura para o design;
- articulação e fomento.
Os outros cinco subprogramas desenvolvem ações focadas em ramos específicos da
indústria: moveleiro, joalheiro, software, calçadista e cerâmico. A execução de cada
subprograma é descentralizada, encontra-se distribuída pelos diferentes níveis da
administração pública, por diferentes agentes econômicos e sociais11. As diferentes ações
desenvolvidas no âmbito do PBD têm atingido mais amplamente pequenas e micro empresas,
principalmente aquelas que fazem parte de Arranjos Produtivos Locais – APL´s12.
Além do programa federal, existem iniciativas similares de alcance estadual. Seus
formatos foram definidos segundo as características locais, e a execução encontra-se em
diferentes níveis de andamento. De forma geral, existe algum tipo de ligação com o PBD.
O PBD, apresentado de forma resumida neste tópico, representa um dos inúmeros
tipos de influência do Estado sobre o desempenho das empresas. Todo o ambiente
sócio-político-econômico de um país apresenta impacto sobre os resultados da indústria local, seja
apenas com relação ao design industrial ou à sua competitividade em geral. Ainda assim, a
interface entre as esferas pública e privada é comumente desconsiderada pelas disciplinas de
estratégia e marketing, conforme poderá ser verificado nas seções seguintes dessa revisão de
literatura.
11 Ver www.seade.gov.br/ sert/ dieese/ pbd.html
2.2 Marketing: principais aspectos no âmbito dessa pesquisa
Nos últimos anos, em consonância com uma tendência percebida na área de
Administração em geral, a literatura de marketing tem sido dominada por um foco gerencial.
Esta perspectiva tende a privilegiar o gerente enquanto usuário do conhecimento da área, e a
desconsiderar os interesses de outros agentes como: consumidores, acionistas, Estado e
sociedade civil. Esta abordagem nem sempre foi dominante. A disciplina, próxima de seu
primeiro século de existência, já esteve significativamente mais envolvida com interesses de
outros grupos (WILKIE & MOORE, 2003).
Hoje dificilmente são encontradas referências às atividades do Estado e suas
conseqüências sobre a atuação da empresa. A interferência das ações tomadas no âmbito
público sobre as empresas privadas é comumente ignorada, estejam elas relacionadas à
proteção de consumidores ou à promoção da indústria local. Paradoxalmente, na prática do
mercado, verifica-se que a importância do Estado é reconhecida pelas empresas, que
freqüentemente procuram influenciar decisões de governo. Indicando a relevância desta
interface para a prática do marketing, Bailey (1999, p.95) argumenta que “iniciativas do setor
público podem moldar as oportunidades de negócios no mercado”.
Correspondentemente, o interesse público pela atividade das empresas privadas
também é pouco considerado pela área. Ainda que o Estado possa atuar como regulador,
mediador ou promotor da atividade produtiva local, assuntos ligados à política industrial
dificilmente são tratados pela literatura de marketing. O desempenho das estratégias
governamentais depende da qualidade da estrutura organizacional de cada Estado e do
reconhecimento das particularidades das instituições afetadas, incluindo as empresas
privadas e os mercados em que atuam (TEECE et al, 1997).
A literatura dominante na área resulta de uma série de transformações sofridas pela
eminentemente dos Estados Unidos, tendem a ser privilegiadas (STEEMKAMP, 2005). Nos
estudos desenvolvidos pela área de marketing considera-se essencialmente a produção de
bens de marca por grandes empresas, comercializados em mercados de milhares de
consumidores com pouco poder individual de negociação (ARNDT, 1985).
Um breve histórico do desenvolvimento do marketing é apresentado no próximo
tópico, no qual busquei mostrar aspectos relevantes da disciplina, mas que hoje tendem a ser
pouco considerados.
2.2.1 Um Histórico do Marketing
Historicamente, pode-se dizer que a disciplina de marketing surgiu de uma lacuna na
economia, que desconsiderava problemas relacionados à distribuição da produção, de
importância crescente no início do século XX. Os primeiros estudos de marketing, realizados
por volta de 1910, voltavam-se para a atividade agrícola. Eram enfatizadas pesquisas sobre
as práticas de formação de preços, a eficiência dos mercados e o bem-estar público. Naquele
período, “in contrast to today, marketing was frequentely examined as a social instrument”
(WILKIE & MOORE, 2003, p.121), ainda que numa visão de otimização de resultados e
eficiência econômica.
Um dos principais objetivos desses estudos era o desenvolvimento de modelos de
comercialização capazes de harmonizar benefícios para produtores e consumidores
(BROWNLIE et al, 1999, p.2). Os debates giravam em torno da coibição das liberdades do
mercado e da necessária proteção de alguns setores. No início do século XX, o papel do
governo era comumente discutido. O Estado era visto como facilitador da organização dos
mercados então nascentes; não como um mero agente regulador (WILKIE & MOORE, 2003,
A disciplina desenvolveu-se rapidamente entre os anos 20 e 50, anos marcados por
uma alternância entre períodos de euforia e depressão econômicas e por duas guerras
mundiais. Em 1936, foi fundado o Journal of Marketing, ainda hoje importante referência
acadêmica na área. Em suas primeiras décadas de existência, um dos temas mais discutidos
nos artigos publicados era a proteção do governo à concorrência e às empresas. O periódico
parecia estimular o debate de temas controversos e eventuais críticas ao sistema e às práticas
mais comuns. A maioria das contribuições (45%) era de praticantes, com uma pequena
participação (15%) de representantes do governo. (KERIN, 1996, p.3-6; WILKIE &
MOORE, 2003, p.119 e 122).
Este período entre o nascimento da disciplina e os anos 50 caracterizou-se por uma
abordagem bastante distinta da atual. Havia maior preocupação em descrever a realidade,
sem necessariamente resolver problemas de gerência. Questões econômicas, sociais e
políticas eram incluídas na avaliação do desempenho do sistema de marketing em geral,
buscando-se identificar seu impacto sobre a sociedade.
As we look back over the field (...) it is clear that marketing academics had a very different orientation to the study than we do today. Their approach was much more descriptive of marketing operations and less oriented toward solving managerial problems. Significant attention was paid to external developments and the exigencies of the time. Evident in the textbooks and JM is a willingness to ask important economic, social, and political questions about marketing´s impacts on society. Appraisals of the performance of the marketing system are embedded in many discussions about the costs of distribution, value of advertising, and pricing policies that appeared. Finally, in an important sense, it appears that marketing thinkers viewed their scholarly and professional roles more broadly than we do today.
(WILKIE & MOORE, 2003, p.123)
No final da década de 40 e início dos anos 50, a prosperidade do pós-guerra
impulsionou o crescimento da indústria e possibilitou o surgimento dos mercados de massa.
As grandes empresas enfrentaram situações e problemas inéditos, relacionados com a nova
crescente industrialização mundial. A literatura de marketing passou a discutir o mercado de
massa, a questão do emprego e o desenvolvimento nacional.
The world of marketing was now dealing with an exploding mass market. This was driven by pent-up demand from the war years´ restriction on supplies and goods, as well as an explosive growth in population. (...) Overall, the scope of the real world of marketing in the United States was becoming much larger and much more national in character. This changing world offered huge new opportunities but at the same time demanded significant adaptations, trials, and risks by companies and their marketing managers. (WILKIE & MOORE, 2003, p. 125)
O período entre os anos 50 e 60 foi marcado pela polarização mundial entre
capitalismo e comunismo, e pelo conseqüente estabelecimento da Guerra Fria. O atual
predomínio do foco gerencial nas pesquisas acadêmicas de marketing teve início nestas
décadas. A abordagem anteriormente adotada pela disciplina, que incluía outros agentes e
instituições, restringiu-se às prioridades da gerência e passou a ser direcionada pelo ‘conceito
de marketing’. No contexto da Guerra Fria, o conceito de orientação para o cliente atendia às
prioridades da ideologia capitalista, pois colocava o consumidor como principal beneficiário
da economia de mercado, em contraste com as sociedades de economia planejada.
O conceito de marketing era de importância estratégica para as grandes corporações e para o governo dos EUA porque suprimia a idéia (a teoria rival) de que uma economia sem um mercado de empresas ‘livres’ e monopolizada pelo Estado pudesse ser mais benéfica para cidadãos e consumidores. (FARIA, 2004)
O conceito de orientação para o cliente - e posteriormente a orientação para o
mercado - e a ampla adoção de uma abordagem gerencialista restringiram o foco da
disciplina aos clientes e à concorrência. A importância dos demais agentes tornou-se cada
vez menor. Os diferentes níveis de desenvolvimento econômico e social de cada mercado,
com suas configurações sócio-políticas particulares foram, paulatinamente, excluídos do
escopo de marketing, em prol de uma pretensa universalidade da disciplina (ARNDT, 1985).
Conceitos amplamente utilizados até hoje - segmentação de mercado, os 4P´s, ‘análise,
de técnicas voltadas para a atividade gerencial (WEBSTER, 1992). Segundo o ‘conceito de
marketing’, o sucesso da empresa estava vinculado à capacidade de satisfazer as
necessidades e desejos do cliente melhor do que a concorrência (HOOLEY et al, 2001, p.6).
A orientação para o cliente foi um dos mais difundidos e influentes pilares do marketing
(HUNT, 1976) e pode ser apontado como uma das bases do conceito de orientação para o
mercado (JAWORSKI & KOHLI, 1993).
Neste mesmo período, a sofisticação e a especialização alcançadas pelos
departamentos de marketing adequavam-se às grandes organizações constituídas desde o fim
da Segunda Guerra Mundial. Estas empresas foram as propulsoras da economia dos Estados
Unidos, e também as responsáveis por parte significativa do poder que o país detém. A
difusão dos valores do ‘american way of life’ por meio do design foi coordenada pelas
grandes empresas do país. A divulgação do ‘american look’ buscou estabelecer uma cultura
que associou o consumo ao sucesso pessoal, contribuindo para o predomínio mundial da
ideologia capitalista (DORMER, 1993, p.121).
A obsolescência estilística foi outro conceito introduzido nos mercados de consumo
neste período do Pós-Guerra, momento em que o crescimento das vendas motivadas por
necessidades funcionais parecia ter atingido seu limite. A idéia de que um produto pode ser
considerado ultrapassado mesmo que em perfeitas condições de funcionamento foi adotada
como estratégia mercadológica para resolver o problema do excedente de produção.
Em um sistema em que a prosperidade depende de um consumo sempre crescente, a idéia de produtos descartáveis passa não somente a fazer sentido, mas se torna uma realidade. (CARDOSO, 2004, p.149)
Nos anos 70, o aumento do protecionismo e de acordos entre empresas estatais e
governos impulsionado pela crise do petróleo provocou grandes transformações nos
mercados mundiais. Nas empresas, o papel estratégico do marketing foi reduzido devido à