UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
FACULDADE DE HUMINADADES E DIREITO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
RAFAEL MALISANI MARTINS
CONFLITO GERACIONAL E A IDENTIDADE DOS JOVENS
ADVENTISTAS DO SÉTIMO DIA: NEGAÇÃO OU
RECONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE ADVENTISTA POR PARTE
DOS JOVENS
Universidade Metodista de São Paulo
Faculdade de Humanidades e Direito
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião
RAFAEL MALISANI MARTINS
CONFLITO GERACIONAL E A IDENTIDADE DOS
JOVENS ADVENTISTAS DO SÉTIMO DIA: NEGAÇÃO
OU RECONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE ADVENTISTA
POR PARTE DOS JOVENS
Dissertação apresentada à Faculdade de Humanidades e Direito da Universidade Metodista de São Paulo, como parte dos requisitos para obtenção do Título de MESTRE pelo Programa de Pós-Graduação em CIÊNCIAS DA RELIGIÃO.
Área de concentração: Religião, Sociedade e Cultura
Orientação: Prof. Dr. Jung Mo Sung.
FICHA CATALOGRÁFICA
M366c
Martins, Rafael Malisani
Conflito geracional e a identidade dos jovens adventistas do sétimo dia: negação ou reconstrução da identidade adventista por parte dos jovens. Rafael Malisani Martins /-- São Bernardo do Campo, 2012.
139fl.
Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de Humanidades e Direito, Programa de Pós Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo
Bibliografia
Orientação de: Jung Mo Sung
1. Missão integral da Igreja 2. Igreja e sociedade I. Título
A dissertação de mestrado sob o título “Conflito Geracional e a identidade dos jovens
adventistas do sétimo dia: negação ou reconstrução da identidade adventista por parte
dos jovens”, elaborada por Rafael Malisani Martins foi apresentada e aprovada em 23 de
Março de 2012, perante banca examinadora composta por Jung Mo Sung
(Presidente/UMESP), Lauri Emílio Wirth (Titula/UMESP) e Adolfo Semo Suárez
(Titular/UNASP).
____________________________________________
Prof/a. Dr/a. Jung Mo Sung
Orientador/a e Presidente da Banca Examinadora
____________________________________________
Prof/a. Dr/a. Leonildo Silveira Campos
Coordenador/a do Programa de Pós-graduação
Programa: Ciências da Religião
Dedico este trabalho aos meus pais, meus
Irmãos e irmã e minha querida noiva.
Palavras não são o suficiente para expressar minha
gratidão por todo apoio e paciência.
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador, pela sua dedicação e competência que me possibilitaram a
conclusão deste trabalho, o meu muito obrigado.
Ao Pastor Erlo Braun e todos da Associação Paulista Leste da Igreja Adventista
do Sétimo Dia pelo apoio, o meu muito obrigado.
Ao Professor e diretor Benedito de Carvalho Leite e todos os companheiros de
trabalho do Colégio Adventista de São Miguel Paulista, pelas orações, força e
apoio, o meu muito obrigado.
RESUMO
Este presente trabalho, tem por objetivo analisar o conflito geracional e a formação da identidade dos jovens adventistas, com o objetivo de verificar se o conflito geracional é uma demonstração que os jovens estão rompendo com a igreja ou, reconstruindo a identidade. O conflito geracional pode ser notado em diversas esferas da sociedade e inclusive dentro da Igreja Adventista. Todavia, o conflito geracional não é causado por rebeldia, mas sim, por diferentes maneiras de reagir e conviver com as características contemporâneas da sociedade. Sendo assim, os mais velhos não concordam com as novas propostas dos jovens e tão pouco, os mais novos desejam continuar convivendo com as coisas antigas. A Igreja Adventista tem vivido o conflito geracional em dois aspectos principais: o primeiro se evidencia na comunicação; o segundo na cosmovisão. A linguagem sofreu alterações na hora de se comunicar; no contexto atual, a imagem tomou a função das palavras. Por essa razão, uma comunicação pode não alcançar seu objetivo, principalmente aos mais novos, quando expressa somente através de palavras. O outro aspecto que tem causado conflito é a compreensão de mundo que os mais novos possuem. Para eles, o mundo não é sinônimo de pecado como algumas pessoas mais velhas entendem. Por conta desta diferença, certas questões não são aceitáveis dentro da igreja, por serem vinculadas ao mundo e o mundo ser entendido como pecado. Porém, a constatação que faço é que, embora o jovem não entenda o mundo em si como pecado, ele compreende que existem aspectos do mundo que sejam errados. Esses aspectos não são aceitáveis para eles e por isso, eles não desejam romper com a igreja. Mas estão em busca de mudanças significativas que se encaixam com sua visão de mundo. É possível evidenciar essa mesma linha de raciocínio em alguns líderes da igreja, mas os relatos dos jovens expressam que isso não alcançou a prática local. Uma vez que, concebo o pensamento de Hervieu-Leger de que a identidade não é transmitida intacta de pai para filho, mas construída individualmente. Entendo que os jovens estão formando sua própria identidade. Para que essa identidade seja formada de maneira sólida nos princípios adventistas, e aberta as mudanças necessárias da sociedade, se faz necessário, sob minha percepção, uma releitura de Ellen White baseada no pensamento liminar de Walter Mignolo, apresentado e explanado por Adolfo S. Suárez.
ABSTRACT
This present study aims to examine the generational gap and identity formation of young Adventists, in order to verify if the generational gap is a demonstration that young people are breaking with the church or, reconstructing identity. The generational gap can be seen in various spheres of society and even within the Adventist Church. However, the generational gap is not caused by rebellion, but for different ways to react and cope with the characteristics of contemporary society. Thus, older people do not agree with the new proposals of young people and also not even the youngest wish to continue living with the old stuff. The Adventist Church has experienced the generational gap in two main aspects: The first is evident in the communication, the second in the worldview of the world. The language has changed in the time to communicate, in the present context, the image took the words function. Therefore, communication may not reach your goal, especially the younger ones, when expressed only through words. The other aspect that has caused the conflict is the world concept to the youngest. For them, the world is not synonymous with sin as some older people understand. Because of this difference, certain issues are not acceptable within the church, because they are linked to the world and the world is understood as sin. However, my conclusion is that though the young do not understand the world itself as a sin, they
understand that there are aspects of the world that are wrong. These aspects are not acceptable to them and therefore they do not wish to break with the church. But they are looking for significant changes that fit with their worldview. It’s possible to show this same line of reasoning in some church leaders, but the reports of young people express that did not reach the local practice. Once I conceive the Hervieu-Leger’s thought that identity is not passed intact from father to son, but built individually, I understand that young people are forming their own identity. For this identity to be solidly formed on the Adventists principles and opened to the necessary changes in society, it does, in my perception, need to re-read Ellen White based on the thought of Walter Mignolo, presented and explained by Adolfo S. Suarez.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ... 10
1 CAONFLITO GERACIONAL E A VISÃO DOS LÍDERES ADVENTISTAS ... 15
1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ... 15
1.2 CONFLITO GERACIONAL E A LIDERANÇA DA IASD ... 21
1.2.1 Conflito Geracional ... 21
1.2.2 Os pensamentos dos líderes da IASD ... 28
1.3 UM CASO ILUSTRATIVO ... 42
1.4 CONCLUSÕES PARCIAIS ... 44
2 O JOVEM ADVENTISTA E SUA IGREJA ... 46
2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ... 46
2.2 O JOVEM E A IGREJA ADVENTISTA ... 47
2.2.1 O jovem e as Redes Sociais ... 47
2.2.2 O jovem e o “ser” adventista ... 51
2.2.2.1 Grupos nas Redes Sociais ... 52
2.2.2.2 O jovem adventista nas Redes Sociais ... 58
2.3 A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ADVENTISTA ... 68
2.3.1 Transmissão de heranças religiosas e a formação da identidade ... 68
2.3.2 O jovem e a igreja ... 72
2.4 CONCLUSÕES PARCIAIS ... 79
3 MUDANÇAS, ELLEN WHITE E A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ADVENTISTA ... 81
3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ... 81
3.2 OS LÍDERES E A NECESSIDADE DE MUDANÇA ... 82
3.3 DICOTOMIA IGREJA X MUNDO ... 92
3.4 ELLEN WHITE E A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DO JOVEM ADVENTISTA 106 3.4.1 Ellen White e o Pensamento Liminar ... 107
3.4.2 O jovem adventista e a formação de sua identidade ... 110
3.5 CONCLUSÕES PARCIAIS ... 111
CONCLUSÃO ... 113
BIBLIOGRAFIA ... 117
ANEXOS ... 122
Anexo 1 ... 123
Anexo 2 ... 123
Anexo 3 ... 124
Anexo 4 ... 114
Anexo 5 ... 125
Anexo 6 ... 125
Anexo 7 ... 126
Anexo 8 ... 126
Anexo 9 ... 127
Anexo 10 ... 128
Anexo 11 ... 129
Anexo 12 ... 130
Anexo 13 ... 131
Anexo 14 ... 132
Anexo 16 ... 134
Anexo 17 ... 135
Anexo 18 ... 136
Anexo 19 ... 137
Anexo 20 ... 138
INTRODUÇÃO
Era o dia 07 de janeiro de 2012, sábado pela manhã e eu estava assistindo ao culto na
Igreja Central de Peruíbe. Seria apenas mais um sábado típico das minhas férias, mas tudo
mudou quando meu irmão mais novo sentou-se ao meu lado, no meio de dois amigos dele, e
eu presenciei a cena, do começo até o final do culto. Os três com o celular na mão
conversando e pouco prestaram a atenção ao culto. Ele é apenas um pré-adolescente, 12 anos,
e seus amigos gêmeos com 16 anos.
Os três frequentam a Igreja Adventista desde pequenos, e eu me questiono: o que
aconteceu? Quando criança, minha mãe nunca me deixou levar um carrinho sequer para
brincar na igreja. Hoje, meu irmão encontrou os amigos e juntos mexeram no celular o culto
inteiro.
O que tem acontecido com os adolescentes e a juventude? Por que a mudança? Mudou
alguma coisa na igreja? Há mais de 20 anos, todas as férias vou à mesma igreja e nunca tinha
visto algo parecido, o que mudou?
Como pastor jovem e na atualidade capelão do Colégio de São Miguel, função que
estou desempenhado pelo terceiro ano consecutivo, tenho convivido todos os dias com
adolescentes e jovens e, a cada dia que passa, vejo o conflito geracional mais presente nos
relacionamentos.
Esse conflito se evidencia em todas as esferas de relacionamento: pais e filhos;
professores e alunos; líderes de igrejas e jovens. É normal escutar nos cultos, pedidos pelos
jovens, pois eles estão “fracos na fé”, estão “frios”, estão se afastando da igreja. O que tem
acontecido com os jovens? Deixaram de ser adventistas?
Em primeiro lugar, quero deixar claro que esta proposta de estudo só fará sentido ao
considerar os jovens adventistas que têm frequentado a igreja. É fato indiscutível que muitos
jovens se afastaram da igreja e deixaram de seguir os princípios ensinados por ela. Mas, não é
a proposta deste estudo analisar os motivos que fizeram esses jovens abandonar os princípios,
uma vez já seguidos por eles.
O objetivo principal deste estudo é analisar o conflito geracional e a formação da
identidade do jovem adventista. O conflito geracional é um assunto que está em voga nos
campos acadêmico e educacional. Encontram-se diversas revistas educacionais que falam
de interatividade, interdisciplinaridade, troca de experiências entre alunos e professores, lousa
digital, tablets e computadores para os alunos, novos métodos, abordagens diferentes.
Diversos teóricos discutem sobre as gerações e a maneira de pensar de cada uma delas. Porém,
no meio adventista pouco ou quase nada se trata deste assunto do conflito geracional e como
equilibrar as distintas partes visando um bem comum.
Encontramos artigos, nos quais os líderes expressam seus medos quanto às novas
tendências que tem surgido, exortando os jovens a permanecerem firmes nos princípios
aprendidos, mas pouco se discute sobre o conflito que existe entre as gerações. Pouco se fala
sobre a maneira de pensar de cada uma das gerações; quando se fala, o foco é a juventude e a
pós-modernidade. Não se encontra reflexões com o intuito de mostrar as diferenças, para
sanar os conflitos.
Ao mesmo tempo, não encontramos nenhuma literatura que expresse a opinião do
jovem sobre sua igreja ou, o que precisa ser feito para que a mensagem atinja aos jovens. Até
mesmo as revistas que são destinadas à juventude ou o “espaço jovem” contêm artigos que
seguem a mesma linha de raciocínio dos periódicos denominacionais destinados a toda Igreja
Adventista. O “espaço jovem” é uma coluna de artigos na Revista Adventista, reservada para
os jovens escreverem, ou para escreverem a eles.
Para exemplificar este último ponto mencionado, vejamos a essência do artigo “Luta
contínua: nossa batalha é permanecer em Cristo”, escrito por uma adolescente de 15 anos, no
“espaço jovem”. A síntese deste artigo está na experiência cristã diária com Cristo e uma
reflexão sobre conflito entre o bem e o mal e do chamado que Deus faz aos cristãos.
Carnassale diz: “Somos chamados a ser Suas testemunhas, a mostrar que Deus está certo e é
justo, e o diabo está errado. E assim como Cristo tornou claro o engano quando esteve neste
mundo, também nós, pelo poder e cheios do Espírito Santo, podemos viver de modo a refletir
o verdadeiro caráter de Deus e desmascarar o inimigo.”1
Este artigo apresentado é um clássico exemplo da temática destinada aos jovens. Sobre
essa questão, apenas destaco que esse tipo de reflexão é importante e significativa, tem sua
relevância e seu papel na formação da identidade dos jovens, mas não se deve limitar a
instrução aos jovens apenas a esses assuntos. Em geral os artigos destinados aos jovens,
tratam sobre assuntos “reflexivos-devocionais” e motivação.
1
Por não encontrarmos material reflexivo sobre o conflito geracional, este assunto
precisará ser analisado de maneira separada, ou seja, em um momento apresentarei o
pensamento dos líderes, e em outro o dos jovens.
Portanto, ao considerar o conflito geracional e a identidade do jovem adventista, tenho
por objetivo iniciar uma análise crítica desta questão. Com isto, desejo contribuir para que
outras reflexões sobre esse assunto possam ser realizadas, com o fim de que as gerações se
compreendam, se aceitem e se equacionem.
Para analisar o conflito geracional e a formação da identidade dos jovens, este trabalho
será dividido em três partes principais, que serão os três capítulos. O primeiro capítulo tem
por objetivo analisar a visão que os líderes da Igreja Adventista possuem sobre a juventude e
os pensamentos pós-modernos. Para tanto, em primeiro lugar apresentarei o conflito
geracional em diversas esferas da sociedade, com exceção da Igreja Adventista, isso será feito
para nos situar no conflito geracional. Tendo conhecimento desta realidade, então sim,
passaremos a ponderar os comentários que os líderes adventistas têm feito sobre a juventude.
Com isso, quero levantar as opiniões, medos, conselhos, alertas que os líderes estão fazendo
para os jovens.
Em resposta à visão dos líderes, o segundo capítulo tratará de responder a duas
questões: Os jovens se consideram adventistas ou querem romper com a Igreja? E, estão os
jovens satisfeitos com a igreja do jeito que ela está hoje? Para responder essas questões,
precisaremos pontuar um assunto importante: a formação da identidade. Sendo assim, os dois
primeiros capítulos mostram as visões dos líderes e dos jovens, tendo assim, uma visão
aproximada da realidade do conflito geracional na igreja.
Uma vez analisadas essas opiniões, o terceiro capítulo tem por objetivo apresentar
algumas reflexões visando superar, pelo menos em parte, a dificuldade de comunicação e
relacionamento entre essas gerações.
Os dizeres dos jovens e dos líderes que iremos analisar nesta pesquisa foram
encontrados em três fontes principais: livros, artigos das principais revistas adventistas e sites
de redes sociais. Nos artigos e livros, encontramos a maioria da opinião dos líderes; nas redes
sociais encontramos o pensamento da juventude. As redes sociais foram escolhidas, pois são
nelas onde os jovens expressam livremente suas opiniões sobre todos os assuntos.
Para análise dessas informações, selecionei alguns conceitos fundamentais, de acordo
com cada temática que iremos ponderar nos capítulos já mencionados. Apresento agora esses
O conflito geracional acontece principalmente pela diferença de pensamento entre
distintas gerações. É verdade que muitos assuntos causam divergências, mas neste estudo
concentraremos nossa atenção na visão de mundo que as gerações possuem, a necessidade de
mudança nas gerações mais novas e a mudança na comunicação.
A visão de mundo que alguns líderes adventistas possuem se diferem da visão de alguns
jovens. Queiruga2 mostra que o pensamento cristão da idade pré-moderna defendia um
afastamento de todo avanço científico, social ou filosófico. Esse pensamento resulta na
dicotomia igreja e mundo, de um lado a igreja detentora do que é sagrado, do outro, o
“mundo” sendo a origem do pecado.
Alguns líderes adventistas, principalmente os mais velhos, tendem a pensar desta
maneira, mas esse não é um pensamento defendido por todos. Hiebert3 diz que cada geração
possui sua cosmovisão de ver o mundo. Sendo assim, da mesma maneira que algumas pessoas
podem ver o mundo como fonte para os pecados, outras observam o mundo de maneira neutra,
podendo ou não ter elementos errados.
A necessidade se baseia no pensamento de Bauman ao dizer que “a modernidade é a
impossibilidade de permanecer fixo. Ser moderno significa estar em movimento. Não se
resolve necessariamente estar em movimento – como não se resolve ser moderno.”4 Segundo
Bauman, a mudança é natural e esperada no mundo moderno. Ele ainda afirma que a questão
da mudança se intensifica nas mentes pós-modernas.5
Neste contexto de fluidez, como dito por Bauman, a mudança na comunicação se
destaca por conta das frequentes melhorias no mundo tecnológico. Como Lyon6 diz, a
comunicação no contexto pós-moderno está muito mais ligada a imagens, do que à
transmissão por palavras. Os jovens por estarem imergidos no mundo tecnológico, onde a
interatividade é constante, sofrem com uma linguagem basicamente discursiva como
usualmente utilizada nos cultos adventistas.
2
QUEIRUGA, Andrés Torres. Fim do cristianismo pré-moderno. Tradução: Afonso Maria Ligorio Soares. São Paulo: Paulus, 2003. 110 p. Apud: Walter Kasper, Introducción a la fe, Salamanca, 1976, p. 20.
3
HIEBERT, Paul G. O evangelho e a diversidade das culturas: um guia de antropologia missionária. Tradução: Maria Alexandra P. Contar Grosso. Brasil: Vida Nova, 2010. 45 p.
4
BAUMAN, Zygmunt. O Mal-Estar da Pós-Modernidade. Tradução: Mauro Gama, Cláudia Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998, p. 92.
5
Ibid., p. 22,23.
6
Através destes três pontos apresentados faremos a análise do conflito geracional. Porém,
este estudo não se limita a evidenciar o conflito geracional nas relações adventistas, mas
analisar a formação da identidade do jovem adventista. Este estudo tem por objetivo
evidenciar se o conflito geracional reflete uma negação de identidade ou reconstrução por
parte dos jovens adventistas. Para tanto, precisamos analisar a formação de identidade.
Dois pensadores serão utilizados para analisar a formação da identidade: Canclini e
Hervieu-Leger. De Canclini7 extraio o pensamento que a identidade é formada na
contemplação de quem não se é. Ou seja, um jovem adventista se vê como jovem adventista
ao ser confrontado com um adventista mais velho. Se for possível escrever a formação de
identidade sobre esta perspectiva, seria algo como: “Sou adventista, mas não como ele.”
Complemento esta ideia com o pensamento de Hervieu-Leger8, o qual apresenta a
formação da identidade religiosa, não como uma transmissão de conteúdo entre gerações, mas
uma construção individual através das experiências sociorreligiosas.
Esses dois pensamentos mostram que a identidade do jovem adventista não pode ser
considerada a mesma dos “velhos” adventistas, não apenas isso, mas que o jovem está em
formação de identidade. E para orientar essa formação de identidade analiso Suárez9 que
apresenta Ellen White e o pensamento liminar de Walter Mignolo. Suárez acredita que Ellen
White possuía um pensamento diferenciado para sua época. Ao mesmo tempo que apoiava a
Igreja Adventista, conseguia criticar o pensamento dominante de maneira construtiva.
Baseado nestas ideias principais supracitadas e através da leitura de alguns líderes
mundiais, incluindo Ellen White, quero responder a opinião dos jovens e apresentar aos
líderes a cosmovisão de mundo e a formação da identidade dos jovens. Minha esperança é que
este trabalho possa ajudar a expandir os horizontes de cada cristão, para que ao entender a
visão do outro possam se unir em um único propósito: viver o reino de Deus.
1 CONFLITO GERACIONAL E A VISÃO DOS LÍDERES ADVENTISTAS
1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
7
CANCLINI, Néstor Garcia. Diferentes, desiguais e desconectados: mapas da
interculturalidade. Tradução: Luiz Sérgio Henriques. 3. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 2009. 48 p. Apud Appadurai, 1996, p. 12-13.
8
HERVIEU-LEGER, Daniele. O peregrino e o convertido. Lisboa: Gradiva, 2005. 62 p.
9
A sociedade contemporânea vive em um crescente relacionamento social, isso aflora
principalmente pela possibilidade de interconectividade entre as pessoas por meio da internet.
O que era impossível alguns anos atrás, onde os meios de comunicação se limitavam a cartas,
telegramas, telégrafos, hoje é possível se comunicar instantaneamente com pessoas em
qualquer lugar do mundo. Os requisitos para tal façanha se limitam em ter um computador
que esteja conectado à internet ou ter sinal no celular e, pronto, você está interligado ao
mundo inteiro.
Inseridos neste meio, onde os mais variados tipos de pessoas convivem e se relacionam
com todos, se faz necessário entender esses “tipos”, pois cada um possui suas características e
peculiaridades e entendê-las se tornou fundamental para um convívio harmônico e sadio.
As lideranças da nossa sociedade estão se conscientizando dessa necessidade, entender
as diferenças para que haja equilíbrio no convívio, melhor aproveitamento das habilidades e
qualidades de cada pessoa.
Um exemplo notório dessa conscientização foi a série produzida pelo Jornal da
Globo10que procurou mostrar as diferenças de pensamento, desejo, expectativa das diferentes
gerações nos ambientes de trabalho e na vida social. Nesta série de reportagens, a Globo
divide as gerações em: “baby boomers”, “geração x”, “geração y” e “geração z”. Os baby
boomers são os filhos dos soldados da segunda guerra mundial, meados dos anos 40, são
aqueles que disseram façam amor não façam guerra. Foram os jovens que lutaram contra a
ditadura, essa é a geração da bossa-nova, jovem guarda, uma ideia marcante nos “baby
boomers” era a de seguir carreira dentro de uma mesma empresa, “fidelidade à camisa”.
A geração subsequente aos “baby boomers” são os nascidos na década de 70, chamados
de Geração X. Essa geração é marcada pela entrada da tecnologia no círculo familiar.
Segundo apresentado nessa reportagem, as pessoas dessa geração são apegadas a títulos, ao
status, porque isso está vinculado ao esforço realizado. Outra característica marcante é que
tanto a inovação como mudança não são bem vistas por essa geração; são pessoas que
10
Os vídeos na íntegra estão disponíveis nos seguintes websites:
<http://empreendedordecadadia.wordpress.com/2010/11/17/jornal-da-globo-serie-geracoes/> <http://empreendedordecadadia.wordpress.com/2010/11/18/jornal-da-globo-serie-geracoes-r2/>
<http://empreendedordecadadia.wordpress.com/2010/11/19/jornal-da-globo-–-serie-geracoes-r3/>
<http://empreendedordecadadia.wordpress.com/2010/11/19/jornal-da-globo-–-serie-geracoes-r4/>
valorizam muito a carreira e ficam à vontade em trabalhar certo prazo para depois ter um
reconhecimento e subir um degrau natural.
Os nascidos no fim da década de 80, início da década de 90 são chamados de Geração
Y; esses querem uma evolução imediata, são impacientes com coisas iguais, estão dentro do
mundo da tecnologia; dentro da empresa buscam mesmo que em pequenos passos subir de
patamar e avançar rapidamente. São pessoas que facilmente fazem mais de uma coisa ao
mesmo tempo; enquanto estão trabalhando podem acessar redes sociais e ouvir música, sem
que isso venha atrapalhar o desempenho do que estão fazendo.
Essa série de reportagens termina falando da Geração Z, os nascidos no fim dos anos 90,
virada de século e milênio. São tidos como um “Y” turbinado. Assim chamados porque as
características da Geração Y se afloram de maneira muito forte. De maneira que se a geração
Y era impaciente, essa é muito mais; um dos motivos mais marcantes é por conta da
velocidade da internet e dos meios de comunicação. O mundo dos novos adolescentes e
jovens é visto sob o mesmo prisma do mundo da tecnologia; tudo muda muito rapidamente e
as coisas são instantâneas.
Em síntese, essas são as principais informações que encontramos nessa série de
reportagem.
Independente dos termos utilizados para classificar as gerações, se são ou não os termos
utilizados pelos grandes sociólogos, o fato é que as diferenças existem isso não se pode negar.
O ponto que quero destacar é a iniciativa de uma rede de televisão em mostrar a visão de
mundo que cada geração possui. Essa iniciativa é significativa para mostrar a necessidade de
termos pelo menos uma compreensão básica da visão do outro. Não se pode esquecer que o
objetivo central desta série é a interatividade no ambiente de trabalho. Ou seja, como as
diferentes gerações podem se unir, cada uma com suas qualidades, para que a empresa possa
crescer.
Embora este exemplo esteja focando as gerações no ambiente de trabalho, podemos
extrair o objetivo de se ter um conhecimento da visão do outro. De maneira que, independente
do meio ao qual convivesse e o fim das relações, pode-se ter uma integração melhor das
gerações, pois as características marcantes são mutuamente conhecidas.
Pelo fato de vivermos em uma sociedade com diversas gerações, torna-se natural o
convívio geracional e essa realidade está presente dentro do objeto de estudo deste trabalho, a
Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD). Pode-se notar certa conscientização não apenas do
convívio geracional, mas, além disso, os líderes da IASD estão percebendo a necessidade de
Bill Knott11, editor da Adventist World, revista que atualiza os acontecimentos da IASD
nos países que possuem membros, tratando sobre a ação e o futuro da igreja diz: “Não
profetize para um jovem que um dia ele será famoso.” A forma categórica como ele se
posiciona pode oferecer ao menos duas informações básicas, ou ele está orientando as pessoas
para não agirem desta maneira, ou está alertando uma ação no presente.
Neste breve artigo ele fala da importância dos jovens estarem na liderança da igreja
juntamente com os mais experientes. Ele apresenta a dinâmica da igreja projetando a ação dos
jovens no futuro como sendo errada e equivocada; segundo ele, quando agimos dessa maneira
minamos a atuação dos jovens no presente. Sendo assim, o objetivo da declaração de Bill
Knott foi de alertar a igreja local desse possível erro que pode estar ocorrendo. Knott termina
o artigo fazendo menção aos jovens na assembleia da Associação Geral12, em 2010 dizendo:
“Ao você ler o que disseram os adultos jovens que tão habilmente representaram sua igreja na assembleia da Associação Geral, 2010, comprometa-se a incentivar os jovens e adultos jovens da sua igreja a serem os líderes de hoje. Ajude-os a participar dos cargos – mesmo que isso signifique abrir mão do seu – por meio dos quais, os dons que receberam do Espírito, aumentarão surpreendentemente o poder do nosso testemunho!”13
Embora não tenha nenhuma declaração explícita sobre a necessidade de conhecer as
diferenças das gerações e das peculiaridades de cada grupo, é notória a preocupação de unir as
diferentes pessoas na ação da igreja. Mais ainda, para ele o papel do jovem é de ser líder, estar
dirigindo e movendo as atividades da Igreja local.
A visão apresentada por Knott é muito significativa, pois ela segue a mesma linha de
pensar do Pr. Ted Wilson, presidente da Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia,
entidade que administra a IASD mundial. Ted Wilson foi entrevistado por Bill Knott a
respeito da cultura de serviço por parte dos jovens adventistas e ele afirmou:
“A iniciativa do Reavivamento e Reforma mundial tem deixado claro que há milhares, na realidade milhões de jovens adventistas, aos quais Jesus entregou tremendos dons para ajudar Sua igreja a finalizar a obra. Gostaria que a Igreja Adventista do Sétimo Dia planejasse lançar mão dessa enorme
11
KNOTT, Bill. O Futuro é Agora. Adventist World: Órgão internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 9. Tatuí, p. 3, set., 2011.
12
Assembleia que reuni representantes de todos os continentes para se definir os líderes mundiais da igreja, assim como as principais diretrizes para a igreja mundial.
13
criatividade, energia, que Deus já colocou entre Seu povo, concedendo variados dons aos jovens fiéis.” 14
Os jovens em ação, liderando, fazendo parte do todo, têm sido a visão apresentada pela
liderança mundial da IASD, mas essa visão parece contradizer a realidade que encontramos
nas igrejas locais. Kimberly L. Maran15durante o período da assembleia da Associação geral
entrevistou jovens de diversos países com o objetivo de saber por parte destes quais as
dificuldades da igreja que frequentam, o que eles acharam de representar o país na assembleia
geral, quais pontos a igreja poderia melhorar e outras questões pertinentes a aos jovens e a
igreja local.
Quero pinçar algumas respostas dos jovens com o intuito de mostrar que a realidade da
igreja local não é a mesma apresentada por Bill Knott, o que, como vimos, apresenta a ideia
de que o jovem seja o presente da igreja. Notem a afirmação de Blessings Gonbwe,
representante de Malawi, país vizinho a Moçambique e Zambia: “Somos os líderes do futuro,
por isso temos que aprender das pessoas que têm mais experiência.”16 É nítido que a visão de
Knott não é a realidade nas atividades eclesiásticas apresentada por Gonbwe; de alguma
maneira os jovens estão sendo projetados para o futuro, fazendo com que eles aceitem essa
realidade e isso é refletido neste testemunho apresentado. Comprovando esta realidade
vejamos outros exemplos.
Quando Kimberly questionou sobre o maior desafio enfrentado pela igreja na sua parte
do mundo? Justin McNeilus representante dos Estados Unidos da América disse:
“Na América do Norte, é o envolvimento dos jovens. Muito poucos jovens se envolvem, lideram, e até mesmo estão felizes por ser adventistas. Parece haver uma cultura entre os pastores, líderes da igreja (não necessariamente os líderes jovens), de que você tem que ter cabelos grisalhos, ou algo nesse sentido. Antes que possa ser ancião, ou que possa assumir púlpito para pregar.”17
Justin ratifica sua posição dizendo: “Precisamos permitir que os jovens se envolvam. É
verdade que é arriscado, nós vamos cometer erros. Mas, se não nos envolvermos nesse
14
KNOTT, Bill. Um Ano para Mudar o Mundo. Adventist World: Órgão internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 9. Tatuí, p. 8-10, nov., 2011.
15
MARAN, L. Kimberly. Conheça o Futuro. Adventist World: Órgão internacional dos Adventistas do Sétimo Dia. Vol. 7, nº 9.Tatuí, p. 16-20, set., 2011.
16
Ibid., 17.
17
ambiente, vamos acabar deixando a igreja.”18 A realidade que Justin apresenta nos Estados
Unidos parece ser a mesma apresentada por Gonbwe na África; os jovens não possuem poder
de ação no presente e a liderança mais velha dirige a ação da igreja local. Essas realidades
similares são significativas, pois mundos tão distintos como América do Norte e África, mas
ao mesmo tempo realidades tão próximas podem nos mostrar uma mesma maneira de pensar
por parte dos líderes das igrejas locais. O resultado apresentado por ele é que existe
insatisfação e desânimo por parte dos jovens, sendo então considerado por ele o maior desafio
da igreja nos Estados Unidos na localidade que frequenta.
A última citação que destacaremos foi feita por Samia Henriette, representante de
Sheychelles, arquipélago localizado a norte e nordeste de Madagáscar19. Samia afirma: “A
igreja deveria ajudar os jovens a se sentirem parte dela, parte dos problemas, das pressões, de
tudo. Tenho a sensação de que há um abismo entre a geração mais antiga e a jovem. Talvez as
duas gerações tenham problemas pessoais que poderiam resolver juntos, uma ajudando a
outra.”20
Os três relatos apresentados mostram que os jovens não possuem voz ativa dentro das
atividades da igreja, mostrando mais uma vez a diferença entre o ideal proposto e a realidade
local. Ao que parece o alerta de Bill Knott apresentado é uma realidade em alguns lugares em
diferentes localidades do mundo.
Embora não seja objetivo deste estudo mostrar como a personalidade e nem a
consciência de ação do jovem é formada, mas a impressão que passa nos relatos deste artigo
que estamos analisando é que as crianças crescem com a mentalidade de que quando
chegarem a uma certa idade poderão agir.
Esta questão que tende projetar a ação do jovem no futuro é percebida não somente nos
dizeres relatados aqui, mas se evidencia no título do artigo: “Conheça o Futuro”, artigo este
destinado a falar da ação dos jovens na Igreja. Questiono o intuito do artigo em falar de algo
que não acontecerá no presente. Teria por objetivo a autora apresentar os jovens que serão o
futuro da Igreja para que eles sejam apenas conhecidos?
É interessante ainda pensarmos que Kimberly Maran é editora assistente da revista
“Adventist World”, revista da qual Bill Knott é editor. Enquanto a visão do editor é que o
jovem tem papel como líder no presente, a editora assistente demonstra a visão oposta, a qual
18
Ibid., 18.
19
Fonte: <http://www.worldmapfinder.com/Pt/Africa/Seychelles/>
20
o futuro da igreja está na juventude. Não é objetivo deste estudo fazer especulações, mas a
impressão é que a editora assistente, assim como alguns jovens, carrega a ideia de que a
liderança da igreja só pode ser composta por pessoas de “cabelos grisalhos” como dito por
Justin McNeilus.
Como vimos até aqui, independente da localidade, a realidade parece indicar a mesma
direção, os jovens estão deslocados das atividades e da liderança da igreja. Se por um lado
representantes mundiais dizem que a posição do jovem deve ser de ação e de liderança, por
outro encontramos uma liderança local que não tem se encaixado nesta visão de trabalho.
Faz-se necessário ainda destacar que os jovens ao analisarem a realidade local, além de
mostrarem que estão ausentes da ação, é perceptível uma diferença de pensamento entre as
gerações, isso se evidenciou nas palavras de Samia: “Tenho a sensação de que há um abismo
entre a geração mais antiga e a jovem.”, palavras já mencionadas e que mostram uma
realidade conflitante entre as gerações.
Diante deste quadro apresentado, passaremos a analisar o conflito geracional, assim
como a visão, preocupações e medos que os líderes possuem da juventude. Embora esse
esforço de conhecer melhor a juventude seja algo mundial, queremos destacar a realidade
brasileira.
1.2 CONFLITO GERACIONAL E A LIDERANÇA DA IASD
Tratar sobre o conflito geracional não é uma tarefa fácil, porque embora seja algo que
pode-se notar, não é um assunto que se aborda de maneira franca e direta dentro da IASD. Por
este motivo, analisarei a existência do conflito geracional dentro da sociedade, não
considerando a IASD. Em seguida pinçarei dizeres dos líderes da IASD sobre a juventude e a
sociedade contemporânea, para no próximo capítulo apresentar o pensamento dos jovens.
Com isso, temos as visões das gerações que formam a realidade da vivência religiosa dentro
da IASD.
Mudança de geração é uma realidade em qualquer instituição, independente do fim que
possui. Isso acontece com times de futebol, empresas, bancos, escolas, igrejas, e todos os
outros grupos que possuem uma representação. O motivo é óbvio, nenhum ser humano é
eterno, logo um dia precisa ser substituído.
Cada geração é marcada por algumas peculiaridades que a tornam singular para aquele
momento e essas características podem perdurar, deixar de existir, ou podem ser esquecidas
por um tempo e reaparecer. Para exemplificar, basta lembrar que nos anos 70 em que a moda
ditava a calça com “boca de sino” como sendo o modelo. No presente momento, no ano de
2012, a moda traz a tendência com as calças com a barra apertada, completamente diferente.
É interessante pensar que no futuro, próximo ou distante, existe a possibilidade da tendência
dos anos 70 voltar, e depois ir embora.
Independente do que acontecerá, destacamos que em cada geração existe algo, podendo
ser novo ou não, que deixa sua marca. Mudanças são naturais, muitas vezes necessárias, e não
existe nada de errado na mudança em si. Mas muitas vezes estas causam choques, e estes
quebram uma rotina; tiram as pessoas da zona de conforto; confrontam velhos paradigmas
com novas ideias e tendências; desafiam líderes. Os choques são inevitáveis em toda mudança,
principalmente tratando de gerações distintas.
Vejamos um exemplo deste conflito de gerações nos dizeres de Renata Filippi Lindquist,
sócia-diretora da Mariaca21, entrevistada por Gama (2010, p. B23), tratando sobre a nova
geração denominada nesse artigo como “Geração Y”. Renata disse: “As empresas já
perceberam que têm de estar mais próximas desses jovens, que precisam fazer mais
avaliações de troca de expectativas, trazê-los para mais perto da estratégia.”
Somente o fato desse comentário de Renata iniciar com o verbo “perceber” significa
que no passado ou na geração anterior, não se atinava para isso. Tendo assim uma realidade
diferente, logo precisou uma mudança no agir da geração anterior para conseguir entender a
geração atual resultando em um melhor convívio e progresso dentro da empresa.
Gama apresenta uma mudança na hierarquia, do tradicional na vertical, algo como de
submissão, de cima para baixo, mandar e obedecer, para novos modelos na horizontal, uma
tendência de um relacionamento mais aberto e franco entre chefes e subordinados, troca de
experiências e valores. Nas palavras de Renata, na mesma entrevista já mencionada: “Não se
tem mais a hierarquia de maneira tão marcada como antes. Isso já começou a aparecer na
arquitetura dos escritórios.”
21
Um exemplo citado neste artigo dessa nova tendência é a Tectoy Digital22 que no seu
espaço físico possui poucas paredes de separação entre os escritórios; todos entram e saem
pela mesma porta e bebem água no mesmo bebedouro, trazendo evidências dessa nova
maneira de dinamizar o relacionamento e mostrar uma certa igualdade entre chefes e
subordinados.
Cristiano Stefenoni23 mostra como evitar o conflito geracional dentro da realidade de
trabalho. Ele contextualiza seu artigo nas gerações que dividem as atividades empresariais.
Três gerações convivem juntas, de um lado os nascidos a partir de 1978, possuem entre 20 e
30 anos, são chamados de Geração Y, pois nasceram no mundo da tecnologia e na maioria das
vezes foram criados com mães que trabalham fora, são reconhecidos por serem talentosos. Do
outro lado, os profissionais mais experientes são chamados de Geração X (1964-1977) e
baby-boomer (1946-1964). Neste entre mundos de gerações, como evitar os conflitos entre os
jovens e os mais experientes?
Ele apresenta uma situação que vivenciou dentro do jornal em que trabalha. A redação
do jornal passou por uma reformulação geral, a partir daquele momento o material do jornal
impresso, do rádio e da internet seriam produzidos todos juntos, compartilhando o conteúdo
entre si. Os jovens lideram com essa situação de maneira muito natural, mas os mais velhos
tiveram dificuldade com o momento. A diferença básica que Stefenoni diz é que a Geração Y
lida muito fácil com a mudança, já os mais experientes são mais tradicionais e cautelosos com
a mudança.
Nessa dinâmica empresarial, para se evitar o conflito geracional Stefenoni enumera
cinco dicas para as duas gerações, são elas:
1. Para a geração Y: Respeite seu chefe. Ele pode não saber tanto de tecnologia quanto
você, mas sabe exatamente como demiti-lo se for preciso; para a geração X: Tenha paciência
com os mais novos na empresa. Quando você começou, alguém também teve que ensiná-lo,
lembra?
2. Para a geração Y: Procure respeitar também os funcionários mais antigos da empresa,
demonstrando interesse, afinal, se você quiser ser um gestor algum dia, precisará do trabalho
deles; para a geração X: A melhor forma de perder o medo de ser substituído é estar sempre
22
Um braço da empresa Tectoy, fundada em 1987, por Daniel Efraim Dazcal, com objetivo de desenvolver e produzir brinquedos de alta tecnologia. A Tectoy Digital é responsável pela produção de games (jogos eletrônicos) da Tectoy. Para mais informações veja <www.tectoy.com.br> e <www.tectoydigital.com>
23
atualizado. Portanto, faça cursos de qualificação. Não é vergonhoso reconhecer que precisa
aprender algo novo. Aliás, essa atitude demonstra humildade e respeito com seu trabalho;
3. Para a geração Y: Use suas habilidades tecnológicas para ajudar a empresa e não para
se promover; para a geração X: Ensinar também é uma ótima forma de aprender. Portanto,
ensine;
4. Para a geração Y: Não seja autossuficiente. Peça orientação, pergunte, procure
aprender, seja humilde e participativo; para a geração X: Não se esqueça de que o jovem de
hoje pode ser seu chefe de amanhã. Por isso, nada de exclusão. Trate-o bem;
5. Para a geração Y: Não se esqueça de que ninguém é promovido se não tiver
experiência. Por isso, se a ideia é ter uma carreira de sucesso, amadureça primeiro antes de
querer trocar de empresa ou de cargo. Para a geração X: As mudanças são necessárias e
inevitáveis, você gostando ou não. Esteja preparado para elas.
Essas dicas apresentadas por Stefenoni, que é por profissão jornalista e consultor de
carreiras, são significativas na maneira que mostra os possíveis conflitos pelas características
das gerações. Ou seja, analisando essas dicas podemos saber as diferenças das gerações e, por
conseguinte os conflitos mais frequentes.
Destas questões apresentadas neste artigo quero destacar a facilidade de mudança que a
chamada Geração Y possui. Zygmunt Bauman24fala dessa tendência da sociedade moderna ao
denominá-la como líquida. A ideia de Bauman25 se torna interessante por mostrar que a
fluidez das pessoas modernas não impedem de ter formas, mas de permanecer nas formas. Ele
diz “a modernidade é a impossibilidade de permanecer fixo. Ser moderno significa estar em
movimento. Não se resolve necessariamente estar em movimento – como não se resolve ser
moderno.”26 A mudança não é um empecilho para as pessoas na sociedade moderna, elas
acontecem naturalmente. Diante das mudanças, de acordo com o movimento as pessoas se
moldam e se adaptam de acordo com a necessidade.
Por isso, conseguimos entender essa diferença que Stefenoni apresentou em seu
ambiente de trabalho. Os mais tradicionais tiveram dificuldades e alguns deles tiveram que
mudar de emprego. Em contrapartida, como mencionado, os mais novos se adequaram as
novas exigências sem grandes dificuldades.
24
ZYGMUNT, Bauman. Modernidad líquida. Tradução: Mirta Rosenberg. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2004.
25
Cf. Ibid., 13.
Mudando o foco do trabalho para a área educacional, a revista “Atividades e
Experiências”27, revista produzida pela Editora Positivo, tem tratado frequentemente sobre a
nova dinâmica no relacionamento e aprendizado das novas gerações. Somente nos mês de
Setembro de 2011, dedicou dois artigos para falar das características da nova geração e os
conflitos que podem surgir por conta dessas diferenças.
O primeiro artigo escrito por Fernanda Zattar28trata sobre o relacionamento entre pais e
filhos, principalmente na fase da adolescência. Sua afirmação é que em “Diferenças de
geração, gênero, cultura ou visão de mundo podem acarretar ruídos de comunicação e
conflitos.”, mas mesmo dentro de crises e conflitos é possível com diálogo e boa vontade
manter um bom relacionamento familiar.
Para que haja esse bom relacionamento, Zattar mostra que embora as famílias de hoje
sejam menos rígidas com os filhos, aparentemente um ponto negativo, quando comparado
com a educação anterior, o relacionamento é mais aberto e democrático, trazendo “poder” de
voz para toda a família e fortalecendo assim os laços familiares.
Zattar cita Betina von Staa29, colunista do site da Positivo e pesquisadora em
Tecnologia Educacional, que defende a ideia de que o mundo moderno com as invenções
tecnológicas têm aproximado mais os jovens dos seus pais ao invés de afastá-los. Embora seja
uma fase na qual os jovens descobrem tudo o que podem criticar sobre os pais, e isso pode
causar afastamento, os estudos têm mostrado que nunca na história houve um período em que
os pais estivessem tão próximos dos filhos.
Um dos motivos para que o relacionamento esteja se estreitando e perdurando é que os
filhos estão retardando a saída de casa, casando mais tarde, demorando em ter sua própria
casa e assumir assim uma vida independente.
27
FORMIGHIERI, Ruben. Revista Atividades e Experiências. São Paulo, nº 16, p. 8, 30, set., 2011, Positivo.
28
ZATTAR, Fernanda. Que Fase! Revista Atividades e Experiências. São Paulo, nº 16, p. 30, 30, set., 2011, Positivo.
29
Para ter acesso a alguns textos na íntegra, consulte:
<http://blog.educacional.com.br/articulistaBetina/o-que-ainda-podemos-ensinar-aos-nativos-digitais/>
Quero destacar uma citação que Zattar faz de Betina sobre a dinâmica entre as relações,
ela diz que “É importante entender por que o outro pensa de determinada forma e tentar se
fazer entender aceitando as diferenças.”30
Destaco esse pensamento, pois em gerações distintas a possibilidade de conflitos é
grande e ter a visão do outro se torna muito significativo. Significativo pelo conceito que
Todorov31 apresenta sobre ser “civilizado” que está em reconhecer a plenitude da humanidade
do outro. Assim afirmar que um determinado pensamento é o certo e o outro errado, sem ao
menos buscar entender as razões do pensamento adverso, é simplesmente desconsiderar a
visão alheia. Isso é se considerar superior e por consequência desconsiderar a plenitude da
humanidade do outro como ser civilizado. Todorov diz que ser civilizado significa o ato de
“...reconhecer plenamente a humanidade dos outros. Portanto, para atribuir tal qualificativo, é necessário transpor duas etapas: no decorrer da primeira, descobre-se que os outros têm modos de vida diferentes dos nossos; e, durante a segunda etapa, aceita-se que eles aceita-sejam portadores de uma humanidade aceita-semelhante à nossa.”32
O oposto desta atitude é denominado barbárie, atitude esta que Todorov apresenta como
o sentido absoluto de bárbaro. Para ele “os bárbaros são aqueles que, em vez de reconhecerem
os outros como seres humanos semelhantes a eles, acabam por considerá-los como
assimiláveis aos animais, ao consumi-los ou ao julgá-los incapazes de refletir e, portanto, de
negociar (eles preferem a briga)...”33. Sendo assim, a barbárie segundo Todorov34 é o negar a
plena humanidade do outro, negar também as alegrias e aos bens que são objeto de desejo.
Aplicando a essência desse pensamento de Todorov aos conflitos geracionais que
estamos analisando, considerar uma geração detentora da verdade absoluta, deve ser
entendido como barbárie, já que desconsideramos uma outra visão sobre o mesmo assunto.
O que se torna significativo é que Todorov35 ainda afirma que a barbárie é uma
característica natural do ser humano, sendo praticamente impossível extinguir a possibilidade
da barbárie na história humana, levando-nos a pensar que em um conflito de ideologias não é
impossível que um determinado lado queira ter a razão.
30
ZATTAR, Fernanda. Que Fase! Revista Atividades e Experiências. São Paulo, nº 16, p. 30, set., 2011, Positivo.
31
TODOROV, Tzvetan. O medo dos bárbaros: para além do choque das civilizações. Tradução: Guilherme João de Freitas Teixeira. Petrópoles: Vozes, 2010. 32,33 p.
32
Ibid., p. 32,33.
33
Ibid., p. 26,27.
34
Ibid., 31,32.
35
Por essa característica que o ser humano tende a sobrepujar a visão do outro como
apresentado por Todorov que podemos entender mais claramente a posição de Betina
apresentada por Zattar, ideia que mostra a importância de entender o que o outro pensa,
superando a diferença de pensamento.
O segundo artigo tem por título “Te orienta garoto!”, escrito por Max Haetinger36; ele é
professor, mestre em Educação, especialista em criatividade e em tecnologias aplicadas na
educação e psicopedagogo. Este artigo fala sobre a escolha de profissão e como isso pode
causar conflitos entre as gerações (pais e filhos). Max diz que os conflitos têm surgido por
conta da pressão que os adolescentes estão sofrendo para escolher uma profissão cada vez
mais cedo. Por um lado os filhos não sabem que profissão seguir, por outro os pais vivem a
angústia da indecisão dos filhos. Para completar essa situação as carreiras são transitórias, os
jovens mudam de curso frequentemente nos primeiros anos de faculdade e novas frentes de
trabalho que rompe com as atividades tradicionais tem surgido.
Com esse choque, o conselho de Max para os pais é que eles se atualizem, entrem no
mundo dos jovens para entendê-los e muita conversa. Ele termina o artigo dizendo: “Pais,
professores e comunidade: nessas horas tão difíceis para os jovens e suas famílias, o afeto é a
melhor ferramenta para ajudar nossos filhos a decidirem sua colocação social e para nos
colocarmos no lugar de parceiros e companheiros desses jovens.”37
Mais uma vez podemos ver a necessidade de compreender a visão de mundo da outra
pessoa. Essa necessidade se acentua quando falamos de gerações distintas, pois são mundos
diferentes. A infância, a educação, os costumes, a cultura, a sociedade, a condição
socioeconômica, a tecnologia, tudo isso mudou e tem mudado e por consequências a realidade
de duas pessoas que vivem na mesma casa ou na mesma rua podem ser tão diferentes.
Esses exemplos mencionados mostram como é real o conflito de gerações e a
necessidade de desenvolver o conhecimento das novas gerações que estão surgindo e
despontando. Na atualidade, diversos termos têm sido utilizados na tentativa de explicar a
geração do momento, termos como: Modernidade, Modernidade líquida, Pós-modernidade,
Pós-colonialismo, Geração Y, Geração Z, cada qual mencionando algumas características
socioculturais.
Independente do termo designado na tentativa de definir essa geração, o que não se
pode negar é que essa geração surge com várias características que se chocam com as
36
HAETINGER, Max G. Te orienta garoto! Revista Atividades e Experiências. São Paulo, nº16, p. 8, set., 2001, Positivo.
37
gerações anteriores, e esses choques passam a ser realidade em todas as esferas da sociedade e
dos relacionamentos.
Mediante isso, em qualquer lugar que nos depararmos com o conflito de gerações, em
menor ou maior grau, de uma maneira ou de outra, vamos nos deparar com ideais divergentes.
Assim sendo, nas empresas, nos relacionamentos familiares, na comunidade religiosa, e em
qualquer outra instituição que tem por base o relacionamento interpessoal essa divergência
acontecerá, de maneira que um mútuo conhecimento de como o outro é e pensa se torna
imprescindível.
Uma vez tendo visto que o conflito geracional acontece em lugares distintos da
sociedade como empresas, escolas, famílias, passarei a analisar o objeto de estudo, a IASD,
pois os mesmos conflitos podem ser presenciados.
1.2.2 Os pensamentos dos líderes da IASD
Minha leitura da IASD é que assim como outras instituições, ela tem passado por
conflitos referentes à diferença de pensamentos entre as gerações. São diferenças que se
notam no convívio com pessoas de diversas idades. Analisar essas questões gera um pouco de
dificuldade, pois estamos levantando preocupações a partir de pressupostos pessoais.
Embora parto de pressupostos pessoais, a manifestação desse conflito é visível e
podemos vê-lo ocorrendo em discussões entre representantes de distintas gerações sobre
ideias controversas, assim como a produção literária por parte de alguns líderes receosos com
alguns comportamentos da geração atual.
Os escritos que partem do líderes não abordam esse assunto de forma direta; ou seja,
dificilmente vamos encontrar um texto dizendo: “Os jovens estão fazendo...” ou “Eles não
podem fazer...”. Mas podemos ver a preocupação dos líderes pela maneira como eles falam e
a quantidade de material que tem sido produzido levantando alertas e considerando questões
que focam a juventude de forma geral.
Passarei a analisar a leitura que os líderes da Igreja Adventista têm feito sobre a
juventude e a sociedade contemporânea. Lessa38, editor da Revista Adventista, escreveu um
artigo em Dezembro de 2009 tratando sobre as influências da pós-modernidade em seis
38
aspectos da vida cristã cotidiana: namoro, casamento, entretenimento, conversação, música,
crenças. Em todos os casos analisados, Lessa39 defende que a influência pode ser causada pela
perda de foco por parte das pessoas, isso por conta das novas ideologias propostas pela
pós-modernidade.
Outros líderes possuem essa mesma preocupação que vimos neste artigo citado. Em
entrevista para a Revista Conexão JA40, revista voltada ao público jovem, o Pastor Elias
Brenha é questionado sobre alguns pontos referentes à juventude da Igreja Adventista.
Quando questionado sobre o papel da instituição religiosa defronte a tendência dos jovens
pós-modernos buscarem a espiritualidade, mas não gostarem tanto assim de placas de Igreja,
Brenha então afirma que essa é uma tendência desse momento e ainda diz: “A igreja precisa
encontrar novos caminhos, sem ferir seus princípios. É necessário, com urgência, reavaliar
alguns conceitos e quebrar paradigmas, a fim de conduzir melhor os jovens pós-modernos,
que não têm culpa da cultura que herdaram e que exerce profunda influência sobre eles.”41
Nestes exemplos apresentados fica claro que o conflito entre gerações existe e é notório
a preocupação dos líderes. Chama-nos atenção que a cultura “pós-moderna” está sendo
apresentada como responsável pela divergência de pensamento, se possível for, podemos
concluir que as ideologias pós-modernas seriam a origem dos conflitos entre as gerações. Já
que essa “nova” maneira de pensar e viver tem gerado esses conflitos.
Nesta mesma edição da Revista Conexão JA42a matéria de capa traz por título: “Jesus
Sim, Igreja Sim”, tratando da questão da nova tendência que as pessoas possuem em buscar
espiritualidade, mas não desejam um comprometimento formal com uma igreja. Para Wendel
Lima “o homem do século 21 prefere dizer que é espiritual em vez de religioso; que crê no
sobrenatural em vez de professar alguma confissão ou se vincular a alguma denominação.”43
O fundamento para tal conceito são as ideias pós-modernas que predominam na sociedade.
Lima44 contextualiza a situação contemporânea apresentando as sociedades anteriores.
Na Idade Média a igreja era o centro da sociedade, a modernidade reagiu a essa paradigma e
instituiu a racionalidade e a ciência como os fornecedores de sentido a vida. Ele diz que neste
39
Ibid., p.10.
40
LIMA, Wendel. Autenticidade na Igreja. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 6,7, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira.
41
Ibid., p. 6.
LIMA, Wendel. Jesus Sim, Igreja Sim. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 8-11, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira.
43
Ibid., p. 9.
44
momento começou a secularização da sociedade, pois a vida religiosa e a fé que eram o centro
da vida foram colocadas de lado e passaram a representar aspectos da vida particular.
A pós-modernidade é a reação a essas duas fases anteriores: à religião institucional da
Idade Média e à racionalidade e ciência da Modernidade. Para Lima “A sociedade
pós-moderna valoriza e se vale do conhecimento científico, especialmente quando esse gera
tecnologia, conforto e progresso; no entanto, não acredita na utopia que vê na ciência a
solução para todos os problemas da humanidade, inclusive os éticos.”45
Concluindo este pensamento Lima46 diz que o mundo pós-moderno nega a ciência como
solução para os problemas porque carrega na história duas guerras mundiais, nas quais a
ciência mostrou que suas descobertas podem se virar contra o ser humano. Quanto a religião
tradicional, “por causa dos pecados históricos da Igreja Cristã e do testemunho de professos
cristãos, os pós-modernos associam a instituição religiosa à intolerância, arrogância,
prepotência e falsidade.”47
Diante desse quadro, Lima48 diz que o homem do século 21 “anseia encontrar sentido
para a vida e acredita que a espiritualidade pode lhe trazer respostas, função que a
racionalidade e a ciência já se mostraram ineficazes em cumprir, porém, pensa que uma igreja
tradicional é o último lugar em que poderá ter seu espírito satisfeito.” Embora essa verdade
seja mais comum nos Estados Unidos da América e na Europa, essa realidade também é
presente no Brasil. Lima49 apresenta o Censo de 2000 o qual mostra que 9,3% dos brasileiros
entre 15 a 24 anos se identificam como “sem-religião”, a maioria desse grupo não são ateus
ou agnósticos, mas pessoas que buscam espiritualidade sem formalizarem um compromisso
com uma entidade religiosa.
Quero pinçar dois últimos comentários que Lima faz em seu artigo, mas não sobre a
sociedade contemporânea e sim sobre a postura da Igreja Adventista diante desse quadro.
Primeiro ponto que destaco é que a “relevância da Igreja Adventista depende da fidelidade a
sua identidade e da ousadia de seus métodos. Traduzindo: conservar doutrinas e modernizar
as abordagens.”50
45
Id.
46
Id.
47
LIMA, Wendel. Jesus Sim, Igreja Sim. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 9, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira. Apud.: Entrevista do pastor Kleber Gonçalves para a Revista Ministério jan-fev 2010, pág. 5-7.
48
LIMA, Wendel. Jesus Sim, Igreja Sim. Revista Conexão JA. Tatuí, ano 04, nº 16, p. 9, out-dez., 2010. Casa Publicadora Brasileira.
49
Ibid., p. 9,10.
50
Para Lima a existência da Igreja se justifica em sua fidelidade a sua identidade. O risco
que ele apresenta é que a cultura pós-moderna pressiona os adventistas a se idealizarem como
mais uma religião entre muitas outras, cuja relevância está em cuidar dos pobres e aflitos,
oferecer fuga para a alma, mas deixar de pregar crenças impopulares. Ele diz que os
adventistas não podem se calar quanto à sua mensagem, mas devem pensar em variar a sua
abordagem:
“Quanto aos métodos evangelísticos, formato da adoração, e modelos administrativos, não podemos deixar que o tradicionalismo baseado no gosto pessoal ou no saudosismo de alguns, e não em princípios bíblicos, ‘engesse’ o avanço da igreja. Não é necessário pesquisar muito na Bíblia para perceber que Deus se revelou de diferentes formas em contextos distintos; que usou a linguagem de cada tempo para se fazer entender.”51
Segundo ponto que destaco é a ênfase que Lima52 dá à mudança que a Igreja Adventista
passou nos últimos 150 anos. De uma denominação rural, em 1862, com cerca de 3,5 mil
membros e 125 congregações, para uma igreja com 16,3 milhões de fiéis em 206 países. Com
o crescimento, vieram os desafios. Um dos principais desafios segundo a visão dele é alcançar
a mente urbana. Ao considerar essa questão ele diz:
“Historicamente, os adventistas têm associado a vida nas cidades ao pecado, e há razão para isso; no entanto, desde 2008, mais de metade da população mundial vive nas zonas urbanas. Entender as necessidades dos moradores dessas regiões é facilitar que a mensagem da salvação chegue a mais da metade das pessoas a que fomos chamados a salvar.”
Refletir sobre esses dois pontos considerados por Lima em seu artigo é muito
interessante, pois a impressão que temos é que ele flutua em dois contextos, ou ideologias, ao
mesmo tempo. Por um lado ele considera elementos de atualização, renovação e
contextualização de maneiras interessantes, por outro ele parece voltar no tempo e se fincar
em um paradigma pré-moderno.
Entre diversas características da pós-modernidade53, duas delas nos chamam atenção e
em poucos comentários queremos considerá-las. A primeira é a relatividade e o fim da
meta-narrativas. Esta filosofia tem por finalidade dizer que não existem verdades absolutas para
Ibid., p. 10,11.
52
Ibid., p. 11.
53
todas as pessoas e todos os tempos, isso acontece porque uma das características marcantes é
a valorização do local ao invés do universal. Ao isso acontecer nos deparamos com conceitos
que se diziam universais, mas não dão conta no âmbito local, logo eles são desconsiderados.
Ao ver Lima abordando a necessidade de modernizar, contextualizar, “tirar o gesso”
quanto à forma, vejo uma demonstração do “local” superando o “universal”. Assim, tratar das
pessoas e das necessidades particulares se torna mais importante que conceitos
pré-estabelecidos. Por contra partida, é notório sua postura bem sólida ao manter a mensagem
(doutrinas) protegida de qualquer alteração.
Um segundo ponto que Lyon54 menciona que está vinculado a contextualização
mencionada é a mudança na comunicação. Ele diz que existe uma mudança do livro impresso
para a tela da TV, a migração da palavra para a imagem, do discurso para a representação.
Essa realidade está cada vez mais intensificada com o avanço tecnológico e a exploração do
consumismo. Esse ponto está ligado diretamente ao que foi dito sobre a necessidade de
alcançar as pessoas onde elas estão focando o uso das tecnologias e da comunicação.
Queiruga fala sobre a dialética modernidade/pós-modernidade, ao tratar da modernidade,
ele apresenta a realidade antes desse período, ou seja, a pré-modernidade. A primeira questão
que ele menciona é a “estreiteza dogmática” que caracterizou o confronto entre a
modernidade e o cristianismo. Comentando a modernidade e tratando da realidade
pré-moderna ele diz:
“A modernidade, ao menos em uma parte muito importante,
caracterizou-se por uma insatisfação direta e global em face da herança cristã [...] Por sua inculturação nos velhos esquemas teóricos que agora eram questionados e, sobretudo, por sua posição de poder e predomínio na sociedade, o cristianismo aparecia como inimigo dos novos avanços e como negador da ilusão de futuro que se abria diante da cultura emergente. Infelizmente, essa impressão ia sendo renovada a cada passo pelos conflitos provocados, de maneira quase fatal, por todo avanço científico, social ou filosófico. Até o ponto de, há algumas décadas, Walter Kasper ter chegado a escrever que ‘Não há uma só descoberta científica importante e moderna que não tenha sido condenada ou olhada com desconfiança em alguma ocasião por esta ou aquela Igreja. ’55”
54
Ibid., p. 17.
Esta citação de Queiruga elucida bem a realidade do mundo pré-moderno, realidade esta,
centralizada nos dogmas eclesiásticos e nas diretrizes dos líderes religiosos. Fica evidente que
Lima, ao mencionar que historicamente a Igreja Adventista vincula o viver na cidade ao
pecado, carrega esse conceito consciente ou inconscientemente. Afinal de contas, essa era a
postura da Igreja (independente da placa) ao retratar qualquer coisa que colocava em perigo a
superioridade dela. Assim também a Igreja Adventista tendia em considerar a cidade,
questões desvinculadas da igreja, como algo pecaminoso.
O que me chama muita atenção é o fato de Lima tratar tanto das questões
“pós-modernas”, mas manter esse pensamento pré-moderno, pois após dizer a atitude da igreja em
considerar a vida na cidade como “pecaminosa”, afirma que existe razão para isso. Quero
deixar claro que não é intuito deste trabalho julgar a posição do articulista; não estou tratando
de conceitos para julgá-lo; tão pouco estou me posicionando a favor ou contra a ideia
apresentada, mas o intuito é buscar entender as preocupações dos líderes quanto às novas
ideias apresentada pela sociedade contemporânea. Com isso apenas queremos destacar o fato
dele abordar esses novos conceitos, impensáveis na sociedade pré-moderna e depois abordar
um conceito pré-moderno que pode ser insustentável em um pensamento e contexto
pós-moderno.
Este artigo analisado trata diretamente da importância da igreja se contextualizar,
permanecer fiel à sua mensagem e ao mesmo tempo mostra uma preocupação existente entre
a vida na cidade e o pecado. Os próximos artigos que mencionarei não tratam de forma tão
direta essas questões, mas levantam assuntos que tem preocupado os líderes. Sendo assim,
mencionarei essas informações de forma direta com intuito de mostrar essa realidade.
Alguns artigos foram dedicados para falar sobre a TV, internet, mídias e seus perigos,
destes artigos; vejamos algumas preocupações sobre algo tão real para a sociedade e
principalmente a juventude que nasceu com essa ferramenta nas mãos.
Ozeas Moura56, editor da apostila “Intimidade com Deus” destinada à reflexão diária
durante quarenta dias consecutivos, trata sobre “Permanência versus televisão e internet – I”
no sétimo dia dessa “jornada espiritual” como assim é chamada. Em suas considerações ele
fala o quanto a internet e televisão podem prejudicar a vida espiritual de uma pessoa. Alguns
pontos destaco em sua reflexão.
Primeiro ponto: “Satanás induz as pessoas ao pecado através das avenidas da alma.” Ao
tratar de avenidas da alma, está se referindo aos sentidos: o que vemos, ouvimos, sentimos,
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