JULIANA SPELTA VALBUZA
TRATAMENTO MIOFUNCIONAL PARA OS
TRANSTORNOS RESPIRATÓRIOS DO SONO BASEADO
EM EVIDÊNCIAS.
Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo para obtenção do Título de Doutor em Ciências.
JULIANA SPELTA VALBUZA
TRATAMENTO MIOFUNCIONAL PARA OS
TRANSTORNOS RESPIRATÓRIOS DO SONO BASEADO
EM EVIDÊNCIAS.
Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo para obtenção do Título de Doutor em Ciências.
Orientador: Prof. Dr. Gilmar Fernandes do Prado
Coorientador: Dr. Márcio Moysés de Oliveira
For
Valbuza, Juliana SpeltaTratamento Miofuncional para os Transtornos Respiratórios do Sono Baseado em Evidências./ Juliana Spelta Valbuza - São Paulo, 2010
xx, p.184
Tese (Doutorado) - Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista de Medicina. Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica.
Título em Inglês: Myofunctional Treatment for Sleep Disordered Breathing Based on Evidence.
iv
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA
DEPARTAMENTO DE MEDICINA DISCIPLINA DE MEDICINA DE URGÊNCIA
E MEDICINA BASEADA EM EVIDÊNCIAS
Chefe do Departamento de Medicina: Prof. Dr. Angelo Amato Vincenzo de Paola
v
JULIANA SPELTA VALBUZA
TRATAMENTO MIOFUNCIONAL PARA OS
TRANSTORNOS RESPIRATÓRIOS DO SONO BASEADO
EM EVIDÊNCIAS.
BANCA EXAMINADORA
TITULARES
Prof. Dr. Gilmar Fernandes do Prado Profa. Dra. Rosana Cardoso
Profa. Dra. Cristiane Fiquene Conti Profa. Dra. Maria Ligia Juliano
Prof. Dr. Marcelo Cavenaghi Pereira da Silva
SUPLENTES
Prof. Dr. Reginaldo Raimundo Fujita Profa. Dra. Maria Fernanda Mendes
vi
Agradecimento Especial
Ao Prof. Dr. Gilmar Fernandes do Prado, que dentre tantos, foi o único que
acreditou, incentivou e possibilitou a concretização do meu sonho em atuar no
vii
Agradecimento
À CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), pelo incentivo e concessão da bolsa de estudos.
Ao co-orientador Prof. Dr. Márcio Moysés de Oliveira, incansável na arte de ensinar e devoto amigo, com quem divido todos os méritos das vitórias conquistadadas.
Ao Dr. Flávio Alóe, pot ter despertado meu interesse pela pesquisa, pela acolhida e amizade sinceras, a quem devo os méritos das vitórias conquistadas.
À Profa. Dra. Lucila Bizari Fernandes do Prado e à Profa. Dra. Luciane Bizari Coin de Carvalho, pelo apoio e incentivo.
Aos secretários da Pós-graduação Mauro Ishioka e Anderson Anacleto, que me auxiliaram no que foi necessário quanto à parte burocrática para a concretização desta tese, bem como à Profa. Maria Nilce Pereira que, carinhosamente, fez a revisão final do texto.
Ao Prof. Dr. Álvaro Nagib Atallah, coordenador do Curso de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica, Professor Titular e Chefe da Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina.
Aos Pós-graduandos do Setor de Neuro-Sono, Disciplina de Neurologia do Departamento de Neurologia-Neurocirurgia da UNIFESP, que me mostraram um amplo mundo multiprofissional a percorrer e desbravar na troca de conhecimento e onde fui agraciada com novos amigos.
viii
Dedicatória
À minha mãe Margareth, minha estrela guia que, com seu amor
incondicional, soube em sua sabedoria, comum às mães, apoiar e incentivar-me a
trilhar os caminhos necessários para o meu crescimento pessoal e profissional,
mesmo que isso significasse distanciar-me de seu convívio.
À minha querida irmã Erika: que espelhada em sua força, sustentei toda a
solidez para buscar meus objetivos na vida.
Ao meu marido André, cúmplice de todas as horas, que com suas
demonstrações de amor diárias, bom humor, paciência e atitudes solidárias,
deu-me grande apoio em toda essa jornada.
À família Oliveira: Marcus, Nena, Rafael e Janaina, que me acolheu e
tornou-se a minha segunda família, junto a tudo o que isto representa, ou seja,
atitudes diárias de disciplina, carinho, orientação, apoio e amor.
Aos meus amigos, em especial à Daniela e aos familiares, que me apoiaram
quando esmoreci e incansavelmente permaneceram ao meu lado, tornando esta
ix
Sumário
Agradecimento Especial ... vi
Agradecimento ... vii
Dedicatória ... viii
Sumário ... ix
Lista de Figuras ... xiii
Lista de Abreviaturas ... xiv
Glossário ... xvi
1. APRESENTAÇÃO ... 1
2. RESUMO E ABSTRACT DO ARTIGO 1 ... 4
2.1. Resumo do artigo 1 ... 5
2.2. Abstract do artigo 1 ... 6
3. RESUMO E ABSTRACT DO ARTIGO 2 ... 7
3.1. Resumo do artigo 2 ... 8
3.2. Abstract do artigo 2 ... 9
4. INTRODUÇÃO ... 10
4.1. Considerações ... 13
4.2. Justificativa ... 13
5. REVISÃO DA LITERATURA ... 14
5.1. Medicina baseada em evidências... 15
5.2. Revisão sistemática... 16
5.3. Consort ... 19
5.4. Sono ... 20
5.4.1. Sono normal ... 20
5.4.2. Fases do sono ... 22
5.4.2.1. Sono Não-REM ... 22
5.4.2.2. Sono REM ... 25
5.5. Classificação internacional dos transtornos do sono ... 26
5.6. História ... 28
5.7. Epidemiologia ... 31
x
5.8.1. Síndrome do ronco primário: ... 33
5.8.2. Síndrome da apneia obstrutiva do sono: ... 34
5.9. Fisiopatologia ... 35
3.9.1. Fatores anatômicos ... 36
3.9.2. Alterações funcionais ... 37
3.10. Manisfestações clínicas ... 40
5.11. Diagnóstico dos transtornos respiratórios do sono ... 42
5.11.1. História clínica ... 42
5.11.2. Exame físico ... 43
5.11.4. Avaliação objetiva - polissonografia ... 47
6. TRATAMENTO ... 49
6.1 Medidas comportamentais ... 50
6.1.1. Posição corporal ... 50
6.1.2. Relação entre obesidade e a síndrome da apneia obstrutiva do sono ... 51
6.1.3. Álcool, sedativos e tabagismo ... 52
6.1.4. Higiene do sono... 52
6.2. CPAP (continuous positive airway pressure) ... 53
6.3. Aparelhos intraorais... 55
6.4. Tratamento farmacológico ... 56
6.5. Tratamento cirúrgico... 57
6.5.1. Traqueostomia... 57
6.5.2. Cirurgia nasal ... 57
6.5.3. Uvulopalatofaringoplastia (UPFP) ... 58
6.5.4 Cirurgia ortognática ... 60
6.5.6. Osteotomia mandibular com avanço do genioglosso ... 60
6.5.7. Avanço maxilomandibular ... 61
6.6. Outras intervenções ... 61
6.6.1. Estimulação elétrica ... 61
6.6.2. Didgeridoo ... 65
6.6.3. Exercícios orofaríngeos ... 67
6.6.4. Exercícios de canto ... 70
6.7. Considerações ... 71
7. MATERIAL E MÉTODO ... 72
xi
7.1.1. Geral ... 73
7.1.2. Específico ... 73
7.1.3. Hipóteses testadas ... 73
7.2. Material e métodos ... 74
7.2.1. Tipo de estudo ... 74
7.2.2. Local do estudo ... 74
7.2.3. Tamanho da amostra ... 74
7.2.4. Tipos de estudos primários ... 74
7.2.5. Tipos de participantes ... 75
7.2.6. Critérios de inclusão ... 75
7.2.7. Critérios de exclusão ... 76
7.2.8. Tipos de intervenções ... 76
7.2.9. Desfechos avaliados ... 77
7.2.9.1. Primários ... 77
7.2.9.2. Secundários ... 77
7.3. Estratégia de busca dos estudos ... 77
7.3.1. Busca eletrônica ... 77
7.3.2. Análise de referências ... 77
7.3.3. Método de revisão ... 78
7.3.3.1. Seleção dos estudos ... 78
7.4. Extração de dados... 78
7.4.1. Análise estatística... 78
7.4.1.1. Dados dicotômicos ... 78
7.4.1.2. Dados contínuos... 79
7.4.1.3. Análises de sensibilidade e de subgrupos ... 79
7.5. Atualização e aprimoramento da revisão sistemática... 80
8. RESULTADOS ... 81
8.1. Resultado geral da metodologia ... 82
9. ARTIGO 1 PUBLICADO ... 84
MÉTODOS PARA AUMENTAR O TÔNUS MUSCULAR DA VIA AÉREA SUPERIOR NO TRATAMENTO DO RONCO: REVISÃO SISTEMÁTICA. ... 85
xii
MÉTODOS PARA AUMENTAR O TÔNUS MUSCULAR DA VIA AÉREA SUPERIOR NO TRATAMENTO DA SÍNDROME DA APNEIA OBSTRUTIVA DO
SONO: REVISÃO SISTEMÁTICA. ... 98
11. CONCLUSÕES ... 113
11.1. Implicações para a prática ...114
11.2. Implicações para a pesquisa ...114
12. REFERÊNCIAS ... 116
13. ANEXOS ... 134
Anexo 1 – Artigo original publicado: ...135
Anexo 2 – Artigo original publicado: ...139
Anexo 3 - Aprovação do comitê de ética ...146
Anexo 4 – Estratégias de busca ...148
Anexo 5 – Escala de Delphi ...152
Anexo 6 – Sigilo de alocação ...153
Anexo 7 – Ficha de extração de dados ...154
xiii
Lista de Figuras
Figura 1 – Hipnograma... 21
Figura 2 –N1 do Sono NREM... 22
Figura 3 – N2 do Sono NREM... 23
Figura 4 – N3 do Sono NREM... 24
Figura 5 – Estágio do Sono REM... 25
Figura 6 – Dionísio... 28
Figura 7 – Willian Wadd... 28
Figura 8 – Clube de Pickwick... 29
Figura 9 – Willian Osler ... 30
Figura 10 – Traçado polissonográfico - ronco... 33
Figura 11 – Traçado polissonográfico – apneia obstrutiva... 35
Figura 12 – Medida da circunferência cervical... 44
Figura 13 – Septo nasal desviado... 44
Figura 14 – Classificação de Mallampati... 45
Figura15 – Palato mole baixo / úvula longa e hipertrofiada ... 46
Figura 16 – Classificação de Brodsky... 46
Figura 17 – Travesseiro reposicionador... 51
Figura18 – CPAP... 54
Figura 19 – Tipos de AIOs... 56
Figura 20 – Uvulopalatofaringoplastia... 58
Figura 21 – Avanço maxilomandibular... 61
xiv
Lista de Abreviaturas
AASM American Academy of Sleep Medicine
AIO Aparelho Intraoral
APSS Associated Professionals of Sleep Society
ATM Articulação Temporomandibular
AVC Acidente Vascular Cerebral
BMJ British Medical Journal
CITS Classificação Internacional dos Transtornos do Sono
CONSORT Consolidated Standards of Reporting Trials
CPAP Continuous Positive Airway Pressure
DPM Diferença da Média Ponderada
EAC Ensaio aleatório controlado
ECG Eletrocardiograma
ECR Ensaio Clínico Randomizado
EEG Eletroencefalograma
EMG Eletromiograma
EOG Eletrooculograma
IAH Índice de Apneia e Hipopneia
IC Intervalo de confiança
IMC Índice de Massa Corpórea
HAS Hipertensão arterial sistêmica
JAMA Journal of the American Medical Association
NNT Número necessário para tratar
NREM Non rapid eyes movement
xv
PSG Polissonografia
REM Rapid Eyes Movement
RNM Ressonância neuromagnética
SAOS Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono
SARVAS Síndrome do Aumento da Resistência da Via Aérea
Superior
TRS Transtorno Respiratório do Sono
UPFP Uvulopalatofaringoplastia
xvi
Glossário
Análise de sensibilidade: Análise utilizada para determinar a sensibilidade dos
resultados de um estudo ou de uma revisão sistemática quando mudamos a
forma de sua realização. Por exemplo, podemos limitar a análise por qualidade do
estudo, incluindo somente estudos onde a ocultação de alocação foi bem feita e
verificar o quanto isso afetaria os resultados. A análise de sensibilidade é utilizada
para avaliar qual o grau de confiança que temos sobre os resultados nas decisões
incertas ou suposições sobre os dados e resultados utilizados.
Confiança estatística: Estimativa da probabilidade de uma associação (efeito) ser maior ou igual ao que é observado em um estudo, por obra do acaso,
geralmente representada como um valor de P (P – value). Por exemplo, um valor
de P de 0,049 para uma diferença de risco de 10% quer dizer que existe menos
de uma chance em 20 (0,05) dessa associação ter acontecido por acaso. Em
outras palavras, poderia ser dito que os resultados são “estatisticamente
significantes” para um P = 0,05. O ponto de corte para significância estatística é
geralmente fixado em 0,05.
Descritores MeSH (Headings or Medical Subject Headings): São termos usados pela Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos para indexar artigos no
Índex Medicus e MEDLINE.
Diferença de média ponderada: Método de metanálise usado para combinar
medidas em escalas contínuas (como peso), em que a média, desvio-padrão e o
xvii
estudo (por exemplo: o quanto cada estudo influenciará nos resultados gerais da
metanálise) é determinado pela precisão de sua estimativa de efeito. Este método
assume que todos os ensaios mediram o desfecho na mesma escala.
Efetividade: Medida do quanto uma intervenção específica, quando usada em condições rotineiras, tem o efeito que se espera.
Eficácia: Medida do quanto uma intervenção específica, quando utilizada em condições ideais, tem o efeito que se espera.
Ensaio clínico quasi-randomizado: Ensaio que usa um método quase aleatório para designar os participantes para diferentes intervenções. Existe um risco maior
de viés de seleção em ensaios quasi-randomizados quando a alocação não é
adequadamente mascarada, em comparação com ensaios controlados
randomizados com sigilo de alocação adequado.
Heterogeneidade (Heterogeneity): Em revisões sistemáticas, heterogeneidade diz respeito à variabilidade ou a diferenças entre estudos na estimativa de efeitos.
Por vezes é feita distinção entre ‘heterogeneidade estatística’ (diferenças nos
resultados dos desfechos), ‘heterogeneidade metodológica’ (diferenças nos
desenhos de estudo), e ‘heterogeneidade clínica’ (diferenças entre os estudos em
características-chave dos participantes, intervenções ou desfechos). Testes
estatísticos de heterogeneidade são usados para determinar se a variabilidade
observada nos resultados de um estudo (tamanho de efeito) é maior que o
xviii
Intenção de tratar: Análise por intenção de tratar é aquela em que todos os
participantes em um ensaio são analisados de acordo com a intervenção para a
qual foram alocados, tenham eles recebido ou não a intervenção.
Intervalo de confiança: Intervalo dentro do qual se espera encontrar o valor ‘verdadeiro’ (por exemplo: tamanho do efeito de uma intervenção), com
determinado grau de certeza (por exemplo: 95% ou 99%).
Metanálise: Aplicação de técnicas estatísticas em uma revisão sistemática para
integrar os resultados dos estudos incluídos. Algumas vezes usado como
sinônimo de revisão sistemática, quando a revisão inclui metanálise(s).
Modelo de efeito fixo: Modelo estatístico que estabelece que as unidades
analisadas (por exemplo: pessoas em um ensaio, ou estudo em uma metanálise)
são de interesse e, portanto, constituem a população total de unidades. Considera
que apenas a variação intraestudo influencia a incerteza dos resultados (o que se
reflete no intervalo de confiança) de uma metanálise que usa um modelo de efeito
fixo. Variações entre as estimativas de efeito de cada estudo (heterogeneidade)
não afetam o intervalo de confiança em um modelo de efeito fixo.
Modelo de efeito randômico: Modelo estatístico algumas vezes usado em metanálise no qual tanto erros de amostragem intraestudo (variância) como
variações entre estudos são considerados e incluídos na determinação da
incerteza (intervalo de confiança) dos resultados de uma metanálise. Se existir
xix
de efeito randômico vão apresentar intervalos de confiança mais largos do que os
modelos de efeito fixo.
Número necessário para tratar (NNT): Número de pacientes que precisa ser
tratado para prevenir um desfecho desfavorável.
Padrão ouro (Gold standard): Método, procedimento ou medida que é amplamente aceito como sendo o melhor disponível, contra o qual novas
intervenções deveriam ser comparadas.
Review Manager (RevMan): Programa de computador desenvolvido para a Colaboração Cochrane para auxiliar revisores no preparo de Revisões Cochrane.
Risco relativo (RR): sinônimo: razão de risco. A divisão do risco no grupo de
intervenção pelo risco do grupo controle. O risco (proporção, probabilidade ou
taxa) é a divisão do número de pessoas com um evento em um grupo pelo total
de pessoas no grupo. Um risco relativo de valor 1 indica que não há diferença
entre os grupos de comparação. Para desfechos indesejáveis, um RR menor do
que 1 indica que a intervenção foi efetiva em reduzir o risco daquele desfecho.
Sigilo de alocação: o processo usado para prevenir o conhecimento antecipado da alocação de grupos em um ensaio randomizado controlado, que deve ser visto
como distinto do mascaramento. O processo de alocação deve ser independente
de qualquer influência do indivíduo que faz a alocação, o que é obtido
xx
não participe do recrutamento de participantes; por exemplo, uma farmácia
hospitalar ou um escritório central. O uso de métodos de alocação como data de
nascimento ou número de registro de casos é sujeito à manipulação. Métodos de
alocação adequados incluem: esquemas de randomização centralizados;
esquemas de randomização controlados por uma farmácia; recipientes
numerados ou codificados contendo cápsulas de aparência idêntica, os
recipientes numerados são administrados sequencialmente; sistema de
computador local, onde as alocações estão guardadas em arquivos protegidos; e
envelopes opacos, selados e numerados sequencialmente.
Valor de P (P-value): A probabilidade (variando de zero a 1) de que os resultados observados em um estudo (ou resultados mais extremos) possam ter ocorrido por
acaso.
Viés (Bias): Erro ou desvio sistemático nos resultados ou inferências. Em estudos
de cuidados em saúde, vieses podem surgir de diferenças sistemáticas nos grupos
de comparação (viés de seleção), do cuidado aos participantes (que deve ser igual
para todos os grupos) ou da exposição a outros fatores além de intervenção de
interesse (viés de condução), de perdas ou exclusões de pessoas incluídas no
estudo (viés de seguimento), ou de como os desfechos são verificados (viés de
2 Esta tese objetiva a busca por evidências científicas para o tratamento dos
Transtornos Respiratórios do Sono (TRS) por meio de métodos que visam o
aumento do tônus muscular da via aérea superior (VAS) bem como de uma
revisão sistemática.
Devido à relevância do assunto, torna-se necessária a inclusão de uma
dissertação geral sobre a Medicina Baseada em Evidências, o Sono e os TRSs,
desde os aspectos históricos aos do tratamento.
Portanto o corpo deste trabalho consiste na revisão de literatura e nos
dois artigos realizados, que são apresentados na seguinte ordem:
Revisão de literatura – Transtornos Respiratórios do Sono (Síndrome
da Apneia Obstrutiva do sono e o Ronco Primário).
Artigo 1 - Métodos para aumentar o tônus muscular da via aérea
superior no tratamento do ronco: revisão sistemática.
Artigo 2 - Métodos para aumentar o tônus muscular da via aérea
superior no tratamento da Síndrome da Apneia Obstrutiva do sono:
revisão sistemática.
Inicialmente será apresentado o resumo e abstract originais dos artigos.
3 originais publicados (anexos 1 e 2) , a aprovação do Comitê de Ética (anexo 3), as
estratégias de busca para as revisões (anexo 4), os quadros de classificação dos
estudos (anexos 5 e 6), ficha de coleta de dados (anexo 7) e a Classificação
Internacional dos Transtornos do Sono (CITS) (anexo 8).
As referências da Introdução e Revisão da Literatura estão dispostas no
final da tese e os artigos apresentam suas listas de referências em seguida a seus
5
2.1. Resumo do artigo 1
aaVersão do artigo publicado
Introdução: O Ronco é o ruído causado pela vibração da úvula, palato e paredes faríngeas durante a inspiração, cujas causas envolvem diversos fatores. Objetivo: O tratamento do ronco pelos métodos para aumento do tônus muscular da via aérea superior tem sido controverso e pouco relatado, portanto uma revisão sistemática em busca de evidências é necessária para avaliar a efetividade destes métodos. Método: Revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados ou quasi-randomizados, duplo-cegos para o tratamento do ronco, com métodos que visam o aumento do tônus da via aérea superior, tais como fonoterapia e fisioterapia. Desfechos: diminuição ou cura do ronco, qualidade do sono, qualidade de vida e efeitos adversos. Resultados: Três estudos elegíveis foram potencialmente analisados, porém nenhum deles foi capaz de prover evidência científica suficiente para favorecer a intervenção. As análises objetivas de um estudo demonstraram melhora do ronco, entretanto as subanálises objetivas e as análises subjetivas demonstraram resultados controversos. Os efeitos adversos não foram relatados. Conclusão: Não existe evidência científica suficiente para sustentar a recomendação de métodos para aumentar o tônus muscular da via aérea superior no tratamento do ronco. Ensaios clínicos randomizados bem elaborados são necessários para avaliarmos a efetividade de tais métodos e uma padronização com métodos mundialmente aceitos de intervenção para o ronco seriam necessários para pesquisas futuras.
6
2.2. Abstract do artigo 1
Introduction: Snoring is the noise caused by vibration during the in-breath; and which structure actually vibrates depends on many factors. Objective: The treatment of snoring with methods to increase muscle tonus of upper airway has been controversial, and poorly reported, thus a review of evidence is necessary to evaluate the effectiveness of these methods. Method: A review of randomized or quasi-randomized, double blind trials on snoring treatment that have employed any method to increase muscle tonus of upper airway like phonotherapy or physical therapy among others. Outcomes: decrease or completely stop of snoring, sleep quality, quality of life, and adverse events. Results: Three eligible trials were potentially analyzed, but none of them could provide good scientific evidence favoring the intervention. The objective analyses of one study showed improvement of snoring, although the objective sub-analyses and subjective analyses showed controversial results. The adverse events were not reported. Conclusion: There is no enough evidence to support the recommendation of methods to increase muscle tonus of upper airways in treatment of snoring. Well designed RCTs are needed to asses the efficacy of such methods, and a standard and worldwide accepted method for snoring assessment would be useful for future researches.
8
3.1. Resumo do artigo 2
bbVersão do artigo publicado
Objetivo: O tratamento da Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono com métodos para o aumento do tônus muscular da via aérea superior tem sido controverso e pouco relatado, portanto uma revisão sistemática em busca de evidências é necessária para avaliar a efetividade destes métodos. Método: Desenho: Revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados. Fontes de
dados: Cochrane Library, Medline, Embase e Scielo, registro de ensaios em andamento, teses indexadas na BIREME/PAHO-WHO (Biblioteca Regional Medicina/Panamerican Health Organization of the World Health Organization), e lista de referências de todos os ensaios incluídos na busca. Métodos de análise: revisão de estudos ranzomizados ou quasi-randomizados, duplo-cegos na SAOS. Dois revisores independentes aplicaram os critérios de elegibilidade. Um revisor verificou a qualidade e os dados extraídos dos estudos, que foram checados por outro revisor. O desfecho primário foi a redução do índice de apneia/hipopneia (IAH) <5 episódios/hora. Outros desfechos avaliados foram qualidade subjetiva do sono, qualidade do sono medida pela polissonografia, qualidade de vida medida por meio de medidas subjetivas e eventos adversos associados aos tratamentos. Resultados: Três estudos elegíveis foram incluídos. Dois estudos mostraram a melhora das medidas objetivas e subjetivas, e um estudo mostrou melhora do ronco, mas não do IAH e das medidas subjetivas. Os efeitos adversos foram relatados e não foram significantes. Conclusão: Não existe evidência científica suficiente de que métodos para aumentar o tônus muscular do sistema estomatognático são eficazes na redução do IAH abaixo de cinco eventos/hora e ensaios clínicos randomizados bem elaborados são necessários para avaliar a efetividade de tais métodos.
9
3.2. Abstract do artigo 2
Objective: The treatment of OSA with methods to increase muscle tonus of the upper airway has been controversial, and poorly reported, thus a review of evidence is necessary to evaluate the effectiveness of these methods. Method: Design: Systematic review of randomized controlled trials. Data Sources: Cochrane Library, Medline, Embase and Scielo, registries of ongoing trials,
thesis indexed at BIREME/PAHO-WHO (Biblioteca Regional
Medicina/Panamerican Health Organization of the World Health Organization), and reference list of all recovered trials. Review methods: A review of randomized or quasi-randomized, double blind trials on OSA. Two reviewers independently applied eligibility criteria. One reviewer assessed study quality and extracted data and these processes were checked by a second reviewer. The primary outcome are decrease of apnea/hypopnea index (AHI) <5 episodes/hour. Other outcomes were subjective sleep quality, sleep quality measured by night polysomnography, quality of life measured by subjective measures, adverse events associated with the treatments. Results: Three eligible trials were included. Two studies showed improvement of the objective and subjective analyses, and one study showed improvement of snoring but not of AHI, and the subjective analyses showed no improvement. The adverse events were reported, and they were not significant. Conclusion: There is no accepted scientific evidence that methods aiming to increase muscle tonus of the stomatognathic system are effective in reducing AHI below 5 events/hour and well designed RCT are needed to asses the efficacy of such methods.
11 Os transtornos respiratórios do sono (TRSs) resultam do estreitamento ou
colabamento da via aérea durante o sono, provavelmente relacionado a uma
combinação de fatores anatômicos e neuromusculares que culminam no
desequilíbrio das forças que mantêm a patência do corredor aéreo, causando a
limitação do fluxo aéreo (ronco), colabamento parcial (hipopneia) e ou total
(apneia) da via aérea, com consequentes efeitos tanto na qualidade do sono
como nas trocas gasosas da respiração 1,2,3.
Os TRSs podem variar dentro de uma escala crescente de gravidade
desde a Síndrome do Ronco Primário até a Síndrome da Apneia Obstrutiva do
Sono (SAOS) nos graus leve, moderado e grave 3.
No geral, os TRSs são acompanhados de sonolência excessiva diurna,
cansaço, falta de disposição para tarefas rotineiras, irritabilidade, quadros
depressivos, aumento do risco para acidentes com automóveis e ainda de perda
cognitiva, queda na qualidade de vida, hipertensão, impotência, resistência à
insulina, arritmia cardíaca, infarto e acidentes vasculares cerebrais 4-7.
Os tratamentos atuais para os TRSs podem variar desde procedimentos
muito simples, como as mudanças comportamentais, conhecidas como Higiene
do Sono; algumas opções medicamentosas pouco utilizadas; redução e controle
do peso; passando por técnicas pouco invasivas, como os aparelhos intraorais e o
CPAP (continuous positive airway pressure), podendo-se chegar às alternativas
cirúrgicas de tratamento, como as cirurgias de tecido mole e até mesmo as
cirurgias de tecido ósseo 8,9.
O tratamento dos TRSs pelos métodos que visam o aumento do tônus da
VAS é recente e envolve efetividade menos estabelecida quando comparado aos
12 Para responder à questão sobre efetividade de uma intervenção, o melhor
modelo a ser utilizado é a revisão sistemática, que é um tipo de estudo
secundário, o qual reúne de forma organizada resultados de pesquisas clínicas,
auxilia na explicação de diferenças encontradas entre os estudos primários que
investigam a mesma questão, facilita a elaboração de diretrizes clínicas, e é
extremamente útil para “tomadores” de decisão na área de saúde 13, 14.
Além disso, as revisões sistemáticas também contribuem para o
planejamento de pesquisas clínicas, mapeando a área de saúde estudada quanto
à verificação de ensaios clínicos de boa qualidade 14, 15.
A revisão sistemática tem como objetivo responder a uma pergunta
claramente formulada, utilizando métodos sistemáticos explícitos e predefinidos
com busca ampla e independente de idioma, para identificar, selecionar e avaliar
criticamente estudos primários relevantes e coletar dados de estudos incluídos na
revisão. Esse rigor metodológico assegura seu grande valor científico, evita
vieses e confere reprodutibilidade à revisão sistemática 16-20.
A medicina baseada em evidências é o uso consciencioso, explícito e
judicioso da melhor evidência disponível nas decisões sobre a saúde dos
pacientes de forma individual. A prática baseada em evidências implica em
integrar a experiência individual com a melhor evidência clínica proveniente das
revisões sistemáticas 21-24.
Embora o tratamento clínico dos TRSs esteja relativamente
fundamentado, ainda não existem evidências da efetividade dos tratamentos que
visam o aumento do tônus muscular da VAS e considera-se importante a
13
4.1. Considerações
A finalidade deste estudo foi identificar ensaios clínicos, independente de
idioma ou fonte de informação, que utilizaram técnicas para aumentar o tônus
muscular da VAS no tratamento dos TRSs, verificar sua efetividade e segurança
e, se possível, combinar dados para realização de metanálise.
Há vários tratamentos para os TRSs, alguns com pouco embasamento
científico, dependentes fundamentalmente de ensaios clínicos com metodologia
inadequada, estudos abertos, séries de casos e outros baseados em estudos
clínicos com desenho bem elaborado.
A seguir apresentamos dois trabalhos envolvendo o tratamento do ronco
primário e da SAOS por meio de métodos que visam o aumento do tônus
muscular da VAS, resultante do nosso projeto de revisão sistemática.
4.2. Justificativa
Dentro das opções clínicas propostas para o tratamento dos transtornos
respiratórios do sono, métodos que visam o aumento do tônus muscular da VAS
têm sido recentemente relatados, mas nunca foi realizada uma análise crítica de
forma sistemática da efetividade e segurança de tais métodos, justificando a
15
5.1. Medicina Baseada em Evidências
Segundo Sackett et al 24 (1996), a medicina baseada em evidências é o
uso consciencioso, explícito e judicioso da melhor evidência disponível nas
decisões sobre a saúde dos pacientes de forma individual. A prática baseada em
evidências implica em integrar a experiência individual com a melhor evidência
clínica disponível, se possível proveniente de revisões sistemáticas.
Na busca de melhores evidências, como em qualquer pesquisa, a
primeira e mais importante decisão é criar um foco específico de pesquisa,
transformando o problema clínico em uma questão clínica 14. A elaboração da
pergunta é essencial para determinar a estrutura de uma revisão sistemática, pois
direciona as estratégias de busca nas bases de dados, como também a seleção
dos estudos e crítica de sua relevância e validade 25.
Existem alguns componentes-chave para uma questão clínica bem
formulada e estes devem ser colocados como critérios para selecionar estudos
para revisão. Os componentes-chave são: o tipo de desenho de estudo, o tipo de
participante, o tipo de intervenção e os tipos de desfechos de interesse. Em geral,
quanto mais precisa é a pergunta, mais específica é a revisão e assim ela passa a
ser crucial para encontrar a evidência mais adequada para resolver o problema 14,
25,26.
As histórias da revisão sistemática e da metanálise começam no início do
século XX, embora sua popularidade tenha crescido somente no final da década
de 90.
A primeira metanálise foi publicada em 1904 no British Medical Journal
16 Em 1955 apareceu a primeira revisão sistemática sobre uma situação
clínica, publicada no Journal of the American Medical Association (JAMA)
intitulada “O poder do placebo” 28.
Antes dessa data, surgiram algumas publicações abordando métodos
estatísticos para combinar resultados de estudos independentes 29, 30.
O termo metanálise surge pela primeira vez em 1976, em artigo da revista
Educational Research 17.
As revisões sistemáticas com metanálise na área de saúde
consolidaram-se no final da década de 80 com a publicação do livro Effective Care During
Pregnancy and Childbirth 31.
Em 1992 foi fundado o Centro Cochrane do Reino Unido, dando início à
Colaboração Cochrane. Nesse mesmo ano, uma publicação no BMJ enumera os
objetivos de uma colaboração dedicada à facilitação e disseminação de revisões
sistemáticas 32.
Em 1994 são definidas, em outra publicação no BMJ, as estratégias de
busca de ensaios clínicos aleatórios em bases de dados 32,33.
5.2. Revisão Sistemática
A revisão sistemática é definida como um tipo de estudo secundário que
facilita a elaboração de diretrizes clínicas, sendo extremamente útil para os
tomadores de decisão na área de saúde. Além disso, também contribui para o
planejamento de pesquisas clínicas; reúne de forma organizada, grande
quantidade de resultados de pesquisas clínicas e auxilia na explicação de
diferenças encontradas entre estudos primários que investigam a mesma
17 primeira e mais importante decisão é criar um foco específico de pesquisa,
transformando o problema clínico em uma questão clínica 13, 14.
A expressão revisão sistemática surgiu em oposição à expressão revisão
narrativa.
As revisões narrativas são bastante apropriadas para descrever a história
ou desenvolvimento de um problema e seu gerenciamento, bem como para
discutir o assunto do ponto de vista teórico ou contextual, estabelecer analogias
ou integrar áreas de pesquisas independentes com o objetivo de promover um
enfoque multidisciplinar 14.
No entanto as revisões narrativas não fornecem respostas quantitativas
para questões clínicas específicas 14.
Os ensaios clínicos randomizados (ECRs) são os eleitos para responder
às perguntas sobre intervenções, e os estudos coorte e caso-controle sobre fator
causal.
O nível hierárquico da evidência é diretamente proporcional ao poder
estatístico do estudo. Isso permite, quando o tema central da pergunta clínica é a
intervenção, a construção de uma hierarquia baseada na força de diferentes
desenhos de estudo, a qual pode ser assim estruturada 34:
I - Revisão Sistemática
II - Megatrial (>1.000) pacientes
III - Ensaio clínico randomizado
IV - Estudo coorte
V - Estudo caso-controle
VI - Série de casos
18 Uma hierarquia similar é aplicada para discriminar os graus de
recomendação para a prática clínica, segundo as diretrizes do Centro de
Revisões e Disseminação da Universidade de York 35:
- Grau de recomendação A diz respeito às revisões sistemáticas de
ensaios clínicos de alta qualidade sem heterogeneidade e com boa precisão;
- Grau de recomendação B são os ensaios clínicos de qualidade duvidosa
(sujeito a vieses) e/ou os estudos observacionais de qualidade alta;
- Grau de recomendação C são os estudos observacionais de baixa
qualidade metodológica ou estudos série de casos;
- Grau de recomendação D é a opinião de especialista.
Sendo assim, é importante que a qualidade metodológica dos artigos
científicos seja considerada, pois a literatura científica pode ser mal-interpretada
devido à inconsistência na forma dos artigos científicos 35,36.
As escalas de avaliação da qualidade metodológica de ensaios clínicos
randomizados enfocam diferentes aspectos metodológicos. Uma randomização
adequada nos ensaios clínicos é necessária para gerar uma comparação sem
viés entre os grupos 37.
Os critérios do Handbook (Manual Cochrane) avaliam a forma de
alocação dos pacientes, classificando os estudos em A, B, C ou D26. (Anexo 6)
A escala de Delphi avalia os ensaios clínicos randomizados por meio de
questões sobre o método de randomização utilizado, realização da ocultação de
alocação, mascaramento do avaliador, do terapeuta ou do paciente e a análise
19
5.3. Consort
O enunciado CONSORT: são as recomendações revistas para o
aperfeiçoamento da qualidade dos relatórios dos estudos de grupos paralelos
escolhidos ao acaso e controlados 39.
Para poder entender os resultados de um estudo aleatório e controlado
(EAC), os leitores devem compreender a sua concepção, a maneira como foi
conduzido, a sua análise e a sua interpretação. Esse objetivo só poderá ser
atingido pela transparência completa por parte dos autores 39.
Não obstante os esforços educativos ao longo das últimas décadas, a
transcrição dos EACs precisa sempre de correção 39.
No meado dos anos 90, a fusão de duas iniciativas distintas, que tinha por
objetivo aperfeiçoar a qualidade dos relatórios dos EACs, levou à publicação do
enunciado CONSORT (Agrupamento das normas relativas aos relatórios de
estudos) 39.
Desenvolvido por um grupo internacional de pesquisadores, de
bioestaticistas, epidemiologistas e de redatores médicos, o CONSORT está
apoiado por um número de jornais médicos que aumenta progressivamente, por
grupos de editoriais e também se encontra disponível na Internet 40-44.
O enunciado CONSORT foi desenvolvido para ajudar os autores a
aperfeiçoar os seus relatórios, empregando uma lista de controle assim como um
organograma 39.
Os aspectos compreendidos na lista de controle tratam dos conteúdos do
título, do resumo, da introdução, da metodologia, dos resultados e da conclusão
20 Os aspectos foram escolhidos porque certos dados empíricos indicam
que uma omissão desta informação está associada a estimações influenciadas
relativas aos efeitos do tratamento ou porque a informação é essencial para poder
julgar a viabilidade ou a pertinência dos resultados 39,43.
Prevemos que o organograma detecte a passagem dos participantes por
meio de um EAC. O organograma revisado descreve a informação das quatro
fases de um desses estudos (a inscrição, a repartição dos tratamentos, o
acompanhamento e a análise dos resultados) 39, 42,43.
O diagrama inclui explicitamente o número de participantes em cada
etapa do estudo que estão incluídos na análise primária dos dados, permitindo
assim ao leitor julgar se os autores executaram uma análise com o objetivo de
tratar 39, 41,42.
Em resumo, o enunciado CONSORT tem como objetivo melhorar a
transcrição de um EAC para permitir aos leitores a melhor compreensão da
maneira como foi conduzido o estudo e de avaliar a validade dos seus resultados
39, 41,42.
5.4. Sono
5.4.1. Sono normal
É possível conceituar o sono como sendo um processo ativo, onde ocorre
uma sequência de diferentes fases, caracterizadas por padrões
cardiorrespiratórios e neurofisiológicos, portanto um complexo conjunto de
21 O sono normal é composto de dois estados bem caracterizados que se
alternam ciclicamente: o sono REM (Rapid Eye Movements) que apresenta um
eletroencefalograma (EEG) dessincronizado com ritmo misto, atonia muscular e
propício aos sonhos; o sono Não-REM (fases ou N1, N2, N3) com sincronia
variável, apresentando Fusos de Sono, Complexos K e ondas lentas, associados
a baixo tônus muscular e mínima atividade psicológica 46.
A arquitetura do sono normal é dividida da seguinte forma: N1 ocupa
entre 2 e 5% do tempo total do sono; a fase 2, entre 45 e 50%; a fase 3, entre 15
e 25% do tempo total do sono. Portanto N1, N2 e N3 também denominadas sono
Não-REM, ocupam entre 62 e 80% do tempo total do sono. O sono REM ocorre
em aproximadamente 20 a 25% do tempo total do sono 46.
Em conjunto, estes quatro estádios de sono (N 1, N2, N3 e REM)
constituem os ciclos de sono que têm uma duração total de 90-100 minutos cada.
Estes ciclos repetem-se de quatro a cinco vezes por noite 46 (Figura 1).
FIGURA 1: Hipnograma com estádios do sono c
22
5.4.2. Fases do sono
5.4.2.1. Sono Não-REM
N1:
A fase de sono N1 é caracterizada pelo início do sono, acompanhada por redução
do tônus muscular, respiração uniforme, movimentos oculares rotatórios lentos e
intermitentes e o eletroencefalograma mostra uma atividade cerebral mais lenta
comparada ao estado de vigília, com ondas teta, na frequência de 4 a 7 Hz de
baixa voltagem e frequência mista, aparecendo algumas ondas típicas
denominadas “ondas agudas do vértex” 46 (Figura 2).
FIGURA 2: N1 do sono NREM d
23 N2:
A fase do sono N2 caracteriza-se pela presença de dois tipos característicos de
grafoelementos: os Fusos de Sono e os Complexos K. Ambos são intermitentes;
os Fusos de Sono duram no mínimo 0,5 a 1,5 segundos ( 3,0 a 10,0 segundos em
crianças) e os Complexos K duram cerca de 0,5 a 1,0 segundo e ocorrem em
média três a cinco vezes por minuto 46 (Figura 3).
FIGURA 3: N2 do sono NREM e
e Amostra cedida pela Dra Lucila B F Prado do laboratório de sono do Hospital São Paulo, setor de
24 N3:
O sono de ondas lentas ou N3 apresenta uma atividade elétrica de base de baixa
frequência na faixa de 0,5 a 3 HZ com amplitude de mais de 75 micro-volts,
ocupando mais de 20% da época de sono (época definida com o tempo de 20 ou
30 segundos de sono) 46 (Figura 4).
FIGURA 4: N3 do sono NREM (época de 30seg) f
25 5.4.2.2. Sono REM
O sono REM não é dividido em fases e caracteriza-se pela
dessincronização eletroencefalográfica com atividade de baixa amplitude.
Caracteriza-se por episódios de movimentos oculares rápidos
(rapid-eye-movement) e atonia muscular. Há uma ativação do sistema nervoso autônomo
simpático, produzindo variações cardiorrespiratórias, além de ereções penianas.
Relatos de sonhos indicam atividade mental, gerando surtos eletromiográficos
que provavelmente estão relacionadas com o conteúdo dos sonhos46 (Figura 5).
FIGURA 5: Estádio do sono REM g
26
5.5. Classificação internacional dos transtornos do sono
A classificação internacional dos trantornos do sono (CITS) foi
inicialmente criada para ser um instrumento para diagnóstico, epidemiologia e
pesquisa; tornou-se mundialmente difundida, promovendo uma padronização
melhor na pesquisa do sono. Foi atualizada e publicada em 2005 (CITS-2 / 2005),
quando várias mudanças relativas a cada transtorno do sono foram efetuadas 47.
A classificação completa da CITS-2/2005 encontra-se no final desta tese
(Anexo 8), e divide os transtornos do sono em oito categorias :
1- Insônia;
2- Transtornos respiratórios do sono;
3- Hipersonias de origem central;
4- Transtornos do ritmo circadiano;
5- Parassonias;
6- Trantornos do movimento relacionados ao sono;
7- Sintomas isolados, variantes aparentemente normais e assuntos não
resolvidos;
8- Outros transtornos do sono.
Dentro destas categorias, encontram-se os Transtornos Respiratórios do
Sono (TRS). Neste grupo estão todos os transtornos do sono relacionados à
função respiratória durante o sono e podemos dividi-lo nos seguintes subgrupos:
a) Síndrome da Apneia Central: esse sub-grupo inclui os transtornos onde
o esforço respiratório está diminuído ou ausente devido ao sistema nervoso
27 b) Síndrome da Apneia Obstrutiva do Adulto: trata dos transtornos
respiratórios que ocorrem durante o sono em função de uma obstrução parcial
(hipopneia) ou total (apneia) ao longo da via aérea na presença de esforço
respiratório.
c) Síndrome da Hipoventilação Hipoxêmica Relacionada ao Sono: o termo
hipoventilação alveolar representa o resultado fisiológico de um transtorno ou
combinação de transtornos que levam à elevação da taxa de dióxido de carbono
arterial. Essa elevação chamada de hipercapnia reflete o desequilíbrio entre a
produção metabólica de dióxido de carbono e a eliminação do dióxido de carbono
através da expiração.
d) Síndrome da Hipoventilação Hipoxêmica Relacionada ao sono,
causadas por Condições Médicas: a hipoventilação hipoxêmica pode acontecer
de forma idiopática em pacientes com propriedades mecânicas pulmonares
normais, mas comumente é secundária a condições médicas que alteram as
funções mecânicas dos pulmões e ou músculos ventilatórios.
e) Outros Transtornos Respiratórios do Sono: esse diagnóstico é para ser
utilizado para outras formas de TRS que não podem ser classificadas ou não se
ajustam às categorias acima citadas, mas que se acredita serem distúrbios
respiratórios durante o sono. Para alguns casos esses diagnósticos podem ser
estabelecidos de forma temporária, porém futuras avaliações mais detalhadas
serão necessárias para determinar o tipo específico de anormalidade respiratória
28
5.6. História
O primeiro relato de trantornos respiratórios do sono tem mais de 2 mil
anos. O texto, elaborado aproximadamente 360 anos a.C. descreve a sonolência
excessiva e a dificuldade de despertar de Dionísio, um homem com insaciável
apetite, que se tornou extremamente corpulento, o que dificultou até mesmo sua
capacidade de alimentar-se 48 (Figura 6).
FIGURA 6: Dionísio h
Somente em 1816, um novo relato surgiu. William Wadd, cirurgião do rei
da Inglaterra, apontou a associação entre obesidade, respiração periódica e
sonolência diurna no trabalho intitulado “Comentários sobre corpulência ou
obesidade considerada como uma doença: com um exame crítico das opiniões
antigas e modernas relativas à sua causa e cura” 48 (Figura 7).
FIGURA 7: William Wadd i
Em 1836, o novelista inglês Charles Dickens, publicou o Diário Póstumo
do Clube Pickwick, onde o personagem Joe, um menino obeso que passava a
hImagem de domínio público: http://www.soleryllach.com/subastas/Subasta1058-1/imgLotes/00/0013g.jpg
29 maior parte do tempo comendo ou dormindo, guarda grande semelhança com os
relatos atuais de pacientes com trantornos respiratórios do sono 48 (Figura 8)
FIGURA 8: Diário Póstumo do Clube Pickwick j
Em 1877, as apneias são descritas por Broadbent neste texto: “quando
uma pessoa de idade avançada, deitada de costas, cair em sono profundo e
roncar ruidosamente, é comum que de tempos em tempos aconteça falha na
inspiração; então, ocorrerão dois, três ou quatro períodos respiratórios de
movimentos torácicos inefetivos, para finalmente o ar entrar com um ronco
barulhento ou rugido, após o qual ocorrerão inspirações profundas
compensatórias” 48.
Em 1887, o francês Lamacq e, em 1889, o britânico Caton descreveram
casos de pacientes com sonolência relacionada com obstrução da via aérea
superior durante o sono, chamando a atenção dos otorrinolaringologistas para a
relação entre obstrução de vias aéreas superiores e o desempenho intelectual 47.
Em 1918, William Osler, usou pela primeira vez o termo “pickwickiano”
referindo-se aos pacientes hipersonolentos e obesos que lembravam as
características do personagem Joe da obra de Charles Dickens 48.
30
FIGURA 9: Willian Osler k
Em 1935, Loomis et al 49descreveram os critérios eletroencefalográficos
para o estadiamento do sono humano.
Em 1965, os neurologistas franceses Gastaut, Tassinari e Duron
decidiram estudar seus pacientes durante o sono ampliando o número de
variáveis habitualmente utilizadas no Eletroencefalograma (EEG). Ao realizarem o
registro poligráfico, descobriram que os pacientes Pickwickianos apresentavam
despertares repetidos e precedidos por paradas respiratórias 48.
Rechtschaffen & Kales 50, em 1968, desenvolveram um sistema
padronizado de contagem dos registros eletroencefalográficos durante o sono,
que é utilizado ainda na atualidade.
O primeiro Congresso da APSS (Associated Professionals of Sleep
Society) aconteceu em 1971 em Bruges na Bélgica; nesta oportunidade os
professores da Clínica de Trantornos do Sono da Universidade de Stanford, que
havia sido fundada um ano antes, convidaram o Prof. Dr. Christian Guilleminault
para se juntar a eles em Stanford, o que ocorreu no ano seguinte, intensificando
os estudos sobre transtornos respiratórios durante o sono 51.
31 Em 1973, Guilleminault, reunindo os conhecimentos sobre as causas, os
sinais e os sintomas, substituiu a terminologia pickwickiana por Síndrome da
Apneia Obstrutiva do Sono 48.
Nas últimas décadas a medicina do sono materializou-se. Surgiram
sociedades do sono em todo o mundo e apareceram periódicos dedicados ao
tema.
5.7. Epidemiologia
É claramente reconhecido que os TRS, são comuns na população em
geral, mas as estimativas de sua prevalência variam muito. Essas diferenças
estão principalmente relacionadas à percepção subjetiva do companheiro (a) de
quarto e como a pergunta é feita pelo médico 52,53.
Young et al 52 (1993) usaram dados do Wisconsin Sleep Cohort Study, um
estudo longitudinal da história natural das desordens cardiopulmonares
relacionadas ao sono, para estimar a prevalência dos TRSs não diagnosticadas
entre adultos e esclarecer seu impacto na saúde pública. Foram randomizados
602 funcionários do estado de Wisconsin, Estados Unidos da América do Norte,
(EUA), homens e mulheres entre 30 e 60 anos de idade. O estudo revelou que a
prevalência do TRS, definido como IAH > 5/hora, foi de 9% entre as mulheres e
24% entre os homens da amostra, e ainda estimou que 2% das mulheres e 4%
dos homens na população em geral apresentam o critério mínimo de diagnóstico
para Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono.
Bixler et al 54(1998) apresentaram estudo sobre prevalência em homens
de acordo com a idade no estado da Pensilvânia, EUA, estimando que a
32 anos de idade, sendo que ao longo do tempo, a prevalência seria de 1% no grupo
mais jovem, 5% no grupo de homens de meia idade, e caindo para menos de 2%
em homens da terceira idade.
Em 2001, Bixler et al 55 publicaram um novo estudo direcionado a
esclarecer o quanto os TRSs afetam o sexo feminino; avaliaram 12.219 mulheres
e 4.364 homens em sua primeira fase, entre 20 e 100 anos de idade, definindo
como critério de diagnóstico um IAH > 10/hora e sintomas diurnos. Os resultados
mostraram que a prevalência em homens foi de 3,9% e nas mulheres 1,2%,
resultando numa proporção de 3,3 homens para uma mulher. A prevalência antes
da menopausa apresentou-se bastante baixa (0,6%) quando comparada ao
período pós-menopausa (2,7%), sendo que as mulheres que passaram por
terapia de reposição hormonal durante a menopausa apresentaram prevalência
muito parecida àquela do período pré-menopausa (0,5%); esses resultados
demonstram que a menopausa se constitui num fator de risco para TRS.
Em outro importante estudo populacional, realizado na Espanha, Duran et
al 56 (2001), analisando 2.148 participantes onde 35% deles eram roncadores
habituais, 6% apresentaram pausas respiratórias durante o sono, e 18%
hipersonolência diurna. O mesmo estudo ainda revelou que a hipersonolência
diurna foi encontrada em 21% dos homens e 26% das mulheres com IAH > 5/hora
e em 12% dos homens e 28% das mulheres com IAH < 5/hora, mostrando que a
hipersonolência diurna é prevalente mesmo na população com menos de cinco
eventos por hora.
A maior prevalência em homens, apontando o sexo masculino como fator
de risco, já foi investigada em alguns estudos; embora nenhuma diferença
33 o comprimento da via aérea e também o volume do palato mole nos homens são
substancialmente maiores quando comparado aos das mulheres, provavelmente
resultando numa via aérea mais colapsável em virtude dessa diferença anatômica
57,58.
5.8. Tipos de Transtornos Respiratórios do Sono – Ronco
Primário e Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono
5.8.1. Síndrome do Ronco Primário:
O ronco é um ruído respiratório de alta frequência produzido somente
durante o sono pela vibração da úvula, pálato mole e paredes faríngeas. De
acordo com a Classificação Internacional dos Transtornos do Sono, o ronco
primário é definido pela presença de roncos durante o sono em pacientes sem
evidências polissonográficas de SAOS ou hipoventilação, sem despertares, e
ausência de sonolência excessiva diurna e /ou insônia 3 (Figura 10).
FIGURA 10: Traçado polissonográfico – Ronco l
lImagem de domínio público:
http://img.medscape.com/fullsize/migrated/491/438/sin491438.fig1.gif
34 O ronco acomete mais de 40% dos adultos e geralmente piora com a
idade, peso e ingestão de álcool 53. Há relatos de roncos que atingem níveis
acima do nível minimamente aceitável (recomenção da Organizacão Mundial da
Saúde de 30 decibeis), causando assim desajustes conjugais em cerca de 45%
dos casos e constrangimento para o portador. Além disso, roncos altos causam
estresse psicológico no cônjuge, alterações na quantidade, continuidade e
qualidade do sono 59-62.
Existe controvérsia se somente o ronco primário pode expor o paciente a
quadros de morbidades, já comprovados para a SAOS, como hipertensão arterial
sistêmica e acidente vascular cerebral (AVC) 63. O mais importante significado
clínico do ronco é ser o indicador da possível presença dos TRS, como a SAOS,
descrita a seguir.
5.8.2. Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono:
A SAOS é uma doença crônica, progressiva e incapacitante de alta
prevalência e alta morbidade-mortalidade cardiovascular 1,64,65. É definida como
uma síndrome causada por pausas respiratórias associadas com quedas
repetitivas e intermitentes da saturação arterial de oxigênio (hipóxia intermitente)
ocorrendo durante o sono 66.
As pausas respiratórias são definidas como uma parada (apneia) ou
redução de mais de 50% (hipopneia) ou redução de menos de 50% (limitação de
fluxo) do fluxo de ar pela VAS com duração mínima de 10 segundos observada
35 O número total de eventos ocorridos durante o sono, dividido pelas horas
de sono nos dá o número de eventos por hora de sono, ao qual denominamos
Índice de Apneia e Hipopneia (IAH) 1.
A American Academy of Sleep Medicine (AASM) recomenda a
classificação da SAOS em: leve (5-15 eventos por hora), moderada (15-30) e
grave (acima de 30) 66.
FIGURA 11: Traçado polissonográfico – Apneia obstrutiva m
5.9. Fisiopatologia
A vasta literatura relacionada à via aérea e particularmente à fisiologia de
seus músculos, atesta a importância desse campo de pesquisa na compreensão
dos transtornos respiratórios durante o sono.
A característica funcional principal da VAS dos pacientes com ronco
primário e dos pacientes com SAOS é a instabilidade que leva ao colapso
exclusivamente durante o sono 67-71. A instabilidade que causa este colapso é o
produto final da interação entre fatores anatômicos e funcionais que causam um
36 desequilíbrio entre a pressão de sucção inspiratória intrafaríngea e as forças
dilatadoras dos músculos faríngeos da via aérea superior 68-72.
Os mecanismos que causam as pausas respiratórias obstrutivas durante
o sono são semelhantes aos mecanismos do ronco. A obstrução da VAS ocorre
devido ao colapso da orofaringe e hipofaringe (faringe posterior), pela aposição da
língua, paredes laterais da orofaringe, hipofaringe e palato mole. Na maioria dos
pacientes, o colapso da VAS durante o sono ocorre em mais de um local 68,70-72.
Uma vez ocorrido o colapso da VAS e ausência de fluxo de ar, o músculo
diafragma não interrompe a sua movimentação, e a pessoa permanece tentando
respirar, exercendo pressões intratorácicas progressivamente mais negativas, até
que começa a se fazer sensível a hipoxemia. A pressâo negativa intratorácica
gerada pelo esforço respiratório estimula mecano-receptores na parede torácica e
na VAS, conduz ao despertar, momento em que há uma reabertura da via
respiratória, seguida de readormecimento; estes fenômenos se repetem e podem
ocorrer centenas de vezes durante a noite 72.
3.9.1. Fatores Anatômicos
As anormalidades anatômicas que causam estreitamento da VAS podem
ocorrer em todos os níveis. Podem ser alterações macroscópicas, como
micrognatia, retrognatia, hipertrofia tonsilar, macroglossia ou depósito de gordura,
ou alterações microscópicas na mucosa devidas ao trauma mecânico do ronco.
Estas alterações de mucosa são edemas, infiltrados inflamatórios mucoso e
submucoso, alterações histológicas musculares e lesão axonal 69, 70, 73-76.
37 uma modificação geométrica na VAS, alterando também o controle
neuromuscular e a sensibilidade dos quimiorreceptores respiratórios 69, 70, 72-75, 77.
Contudo a maioria dos pacientes apresenta alterações anatômicas discretas que
só podem ser demonstradas por meio de técnicas especializadas. Tais técnicas
comprovam que o tamanho da VAS durante o sono e em vigília é menor nos
pacientes com SAOS do que em roncadores e pessoas hígidas 69, 70,72. A
geometria da VAS está alterada na SAOS. Cortes transversais na ressonância
neuromagnética (RNM) de orofaringe mostram que o eixo maior situa-se no
sentido ânteroposterior, ao contrário dos indivíduos sadios cujo eixo maior
situa-se no situa-sentido láterolateral. O estreitamento láterolateral dos pacientes obesos é
causado pelo espessamento das paredes laterais da faringe. Estudos com
espectroscopia de prótons demonstraram que este espessamento da parede
ocorre devido ao aumento de tecido mole e não por depósito de gordura ou
edema. Portanto as paredes laterais das regiões retropalatal e retroglossal
desempenham um papel crítico na determinação do calibre da VAS e
fisiopatologia do colapso 74.
3.9.2. Alterações funcionais
A disfunção neuromuscular da VAS durante o sono pode ter causa
específica evidente como, por exemplo, em doenças como pontomielite,
Síndromes de Shy Drager, de Arnold-Chiari, de Parkinson, degeneração
olivo-ponto-cerebelar, acidente cérebro-vascular, seringomielia, esclerose múltipla 47.
Contudo, à semelhança das alterações anatômicas, as alterações funcionais são
38 A VAS de pacientes com SAOS comporta-se diferente daquela de
pessoas sadias. O grau de redução do tamanho (volume e área) da VAS quando
submetida à uma pressão negativa é significativamente maior em pacientes com
SAOS. A pressão crítica (valor numérico da pressão negativa quando a VAS
colaba) de fechamento da VAS é positiva em pacientes com SAOS quando
deveria ser negativa como em pessoas sadias 69-71, 76. Existem evidências
mostrando que a atividade e o controle da musculatura dilatadora da VAS na
SAOS estão alterados 76. O estreitamento anatômico da VAS (obesidade ou outro
fator anatômico) está relacionado a uma hiperatividade tônica neuromuscular para
manter a VAS aberta durante a vigília. Portanto o nível basal de ativação
neuromuscular tônica da faringe é substancialmente mais alto no paciente com
SAOS para compensar a redução do calibre da VAS 76-79.
Durante o sono, o fenômeno compensatório neuromuscular diminui,
contribuindo para o colabamento transitório da VAS. Os episódios obstrutivos são
caracterizados por perda transitória dessa hiperatividade muscular e a obstrução
é resolvida com uma intensa atividade fásica e traumática da musculatura
dilatadora faríngea acima do basal que ocorre centenas de vezes durante a noite
76-79.
A hipóxia e hipercapnia durante as apneias causam depressão da
atividade neuromuscular do genioglosso, palatoglosso, tensor do veu palatino,
piorando ainda mais a disfunção da VAS 76-79.
A disfunção neuromuscular da VAS também se acentua com
fragmentação do sono, isto é, o intervalo de tempo entre a resposta de despertar
ao final do evento respiratório aumenta e os eventos respiratórios aumentam de