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A negociação coletiva na resolução de conflitos trabalhistas

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Academic year: 2017

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CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA DE PESQUISA MASTER IN INTERNATIONAL MANAGEMENT - MIM

A Negociação Coletiva na Resolução de Conflitos Trabalhistas

MAURICIO MITSURU TANABE

(2)

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQUISA

MASTER IN INTERNATIONAL MANAGEMENT - MIM

A Negociação Coletiva na Resolução de Conflitos Trabalhistas

Dissertação apresentada ao Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas para obtenção do grau de Mestre em Gestão Empresarial.

Orientador: Yann Duzert

MAURICIO MITSURU TANABE

(3)

Agradecimentos

Agradeço a todas as pessoas que diretamente colaboraram para a conclusão do mestrado nos últimos dois anos.

Agradeço ao corpo docente do MIM que colaborou para meu crescimento acadêmico, em especial ao prof. Yann Duzert, pela paciência e dedicação na orientação sobre o tema proposto.

Agradeço aos Professores Leonardo Sica e Leslie Sherida Ferraz pelas horas de conversas, entrevistas e estudos.

Agradeço a compreensão de meus colegas e amigos paulistas e da minha família pelas ausências e horas de estudo dedicadas ao mestrado.

Agradeço aos amigos que fiz aqui no Rio de Janeiro, que sempre foram importantes para a fase carioca da minha vida.

Agradeço aos meus colegas de mestrado, companheiros de horas intermináveis de estudos.

(4)

Abstract

(5)

Sumário

1. INTRODUÇÃO ... 1

1.1. APRESENTAÇÃO ... 1

1.2. JUSTIFICATIVA DO TEMA ... 4

1.3. METODOLOGIA ... 6

1.4. RESUMO E ESTRUTURA DO TRABALHO ... 6

2. OS CONFLITOS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO ... 8

2.1. INTERESSES INDIVIDUAIS E INTERESSES COLETIVOS ... 11

2.2. COMPOSIÇÃO DOS CONFLITOS COLETIVOS DE TRABALHO ... 15

3. ORGANIZAÇÃO SINDICAL BRASILEIRA E AUTONOMIA PRIVADA COLETIVA ... 21

3.1. FORMAÇÃO HISTÓRICA DO SINDICATO BRASILEIRO ... 22

3.1.1. LIBERDADE SINDICAL ... 27

3.1.2. LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO NO PLANO INTERNACIONAL ... 29

3.1.3. O SINDICATO NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 E A UNICIDADE SINDICAL ... 33

3.2. A AUTONOMIA PRIVADA COLETIVA ... 44

3.2.1. LIMITES À AUTONOMIA PRIVADA COLETIVA ... 46

3.2.2. AUTONOMIA PRIVADA E OS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO ... 49

4. NEGOCIAÇÃO COLETIVA DE TRABALHO ... 54

4.1. IMPORTÂNCIA E PRINCÍPIOS DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA ... 56

4.2. INSTRUMENTOS QUE RESULTAM DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA ... 62

4.2.1. CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO ... 64

5. CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO ... 68

5.1. EVOLUÇÃO HISTÓRIA ... 68

5.2. EVOLUÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO ... 70

5.3. NATUREZA JURÍDICA ... 72

(6)

5.5. CONCEITO ... 79

6. O ATUAL MODELO DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA ... 82

6.1. SUJEITOS LEGITIMADOS NO BRASIL ... 83

6.2. PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO SINDICAL ... 85

6.3. RESULTADOS DA NEGOCIAÇÃO ... 91

7. CONCLUSÃO ... 92

7.1. LIMITAÇÕES DO TEMA E SUGESTÕES PARA ESTUDOS FUTUROS ... 94

(7)

1.

I

NTRODUÇÃO

1.1.

A

PRESENTAÇÃO

Preliminarmente vale a pena destacar que o Direito do Trabalho caminha lado a lado com a gestão estratégica de empresas, na medida em que determina as normas sob as quais estarão sujeitas as relações de trabalho existentes na organização de trabalho de um dado segmento. Esse trabalho é o resultado positivo dessa sinergia.

O presente trabalho tem por objetivo o estudo do atual modelo de resolução de conflitos de trabalho por meio de negociação de convenção ou acordo coletivo de trabalho, especialmente com relação a sua origem, cujas consequências acabaram por justificar a estrutura do atual modelo, abordando ainda sua relação com os sujeitos juridicamente interessados1.

Por se tratar de um estudo voltado para avaliação prática sob a ótica estratégica de administração de empresas, assim como justificar a estrutura do atual modelo, sem prejuízo das conhecidas diferenças de legitimidade e abrangência entre a convenção e o acordo coletivo de trabalho2, optamos pela utilização da expressão convenção coletiva como gênero, para também abranger a modalidade específica do acordo coletivo. A diferença teorica será feita apenas nos casos em que efetivamente existir distinção entre os dois instrumentos, para evitar a repetição desnecessária das expressões.

As dificuldades de resolução de conflitos por meio de negociações de convenção coletiva no ramo empresarial, em especial seu enquadramento, sempre despertaram grande interesse dos profissionais da área de Relações do Trabalho3. Para RUPRECHT, a negociação entre capital e trabalho com celebração de um instrumento fruto do consenso dos sujeitos juridicamente

1 A expressão “juridicamente interessados” designa todas as pessoas jurídicas ou naturais, legitimadas ou não para

negociar condições coletivas de trabalho, que têm interesse jurídico no resultado das convenções ou acordos coletivos de trabalho, na medida que podem sofrer diretamente seus efeitos. O interesse, nesse caso, deve ser entendido em sentido jurídico e não apenas pelo interesse econômico.

2 Ver artigo 611 da CLT.

3 O reconhecimento da convenção coletiva como instrumento normativo fez surgir importantes estudos doutrinários, em

diversas partes do mundo, sobre sua natureza, sujeitos pactuantes, procedimento de negociação, tipos de cláusula, formas de interpretação e hierarquia, em relação às demais fontes do Direito do Trabalho. Orlando Gomes e Elson Gottschalk relatam a existência de inúmeras monografias, escritas durante o século XX, no Brasil e no exterior. In:

(8)

interessados é a forma mais nova e mais digna de consideração que se produziu na história do trabalho assalariado4.

As diferenças de interpretação por parte da legislação, jurisprudência e, principalmente, doutrina nos diversos países, apenas contribuiu para realçar essas dúvidas, com respostas que variam conforme a estrutura adminitrativa e jurídica do país analisado5.

Focando as negociações coletivas no Brasil, a experiência de resolução de conflito com a celebração de convenção coletiva foi prejudicada inicialmente pela curta tradição democrática do país, reflexo dos longos regimes de exceção política, ditaduras e pela ausência de um modelo de efetiva liberdade sindical, que abordaremos mais adiante, requisitos absolutamente necessários ao seu pleno desenvolvimento6 que acabaram por direcionar a construção do modelo de resolução de conflitos para o atual desenho de negociação sindical.

Ainda assim, verificou-se um crescente estímulo à negociação como instrumento eficaz para resolução de conflitos trabalhistas no país, principalmente a partir de 1988, com o reconhecimento constitucional do direito às convenções e acordos coletivos de trabalho7 e a expressa autorização de negociação in pejus8, além da exigência legal da negociação como requisito para implementação de medidas relacionadas, principalmente, com o fomento à criação de empregos9.

A tendência de resolução de conflitos trabalhistas por meio de negociação coletiva é cada vez mais presente, seja pela efetiva consolidação de nossa experiência democrática, seja pela perspectiva de ampliação dos poderes da negociação coletiva10. Dados do Ministério do Trabalho e

4 RUPRECHT, Alfredo J. Relações coletivas de trabalho. São Paulo: LTr., 1995, p. 281.

5 GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Elson. Curso de Direito do Trabalho, Rio de Janeiro: Forense, 16ª ed., 2000. p.

571.

6 MAGANO, Octavio Bueno. Política do trabalho. v. II, São Paulo: LTr., 1995, p.104-5. 7 Artigo 7º, inciso XXVI, da CF/88.

8 O artigo 7º, incisos VI, XIII e XIV, da CF/88, autoriza especificamente a redução de salário e a alteração de jornada

por meio de negociação coletiva.

9 Entre as recentes leis que exigem a negociação coletiva para sua implementação destaca-se: a Lei n.º 9601/98 sobre

contratos de trabalho por prazo determinado e a Medida Provisória nº 2076 sobre contrato a tempo parcial, suspensão do contrato e programa de qualificação profissional. Além dessas, também exigem negociação coletiva a Lei n.º 9958/00 sobre criação de comissões de conciliação prévia no âmbito da Justiça do trabalho; e a Lei n.º 10.101/00, sobre participação nos lucros e resultados, ratificando a Medida Provisória n.º 1.982 do mesmo teor, cujo texto vinha sendo reeditado desde 1994.

10 Entre as propostas legislativas que ampliariam os limites da negociação coletiva, encontrava-se o polêmico projeto de

(9)

Emprego11 indicam aumento, entre 1997 e 2007, de aproximadamente 30% e 97%, respectivamente, no número de convenções e acordos coletivos de trabalho depositados nas Delegacias Regionais do Trabalho do país12.

Nesse cenário, estudaremos a formação da convenção coletiva de forma sistemática, desde a estrutura dos sujeitos juridicamente interessados passando pela forma da constituição do consenso por negociação coletiva para resolução de conflitos e finalmente a instrumentalização do documento formal e seus requisitos legais.

Quanto ao aspecto material analisaremos a resolução de conflito com celebração de convenção coletiva apenas no âmbito do setor privado, sem qualquer referência à possibilidade ou às peculiaridades da negociação coletiva no seio do serviço público. Os planos da existência e da validade, embora relevantes, também deixarão de ser analisados, ficando o presente trabalho limitado a origem e justificativa do atual modelo para construção da convenção coletiva. Portanto, na análise dos fatores do atual modelo, presumiremos sua existência e validade.

No aspecto formal, ficaremos limitados pelo estudo teórico e doutrinário desenvolvido no âmbito da ciência direito e os reflexos da convenção coletiva na economia e gestão estratégica.

Com relação ao âmbito geográfico, focaremos o atual modelo brasileiro, embora seja incontestável a importância do tema em outros países e no próprio Direito Internacional.

As informações surgidas na comparação com outros países serão utilizadas na busca de soluções eficientes que esses outros países do mundo deram para problemas quase sempre semelhantes aos nossos, muito embora, em relação à negociação coletiva, as peculiaridades do sistema de organização sindical brasileiro, ainda estruturado no corporativismo como origem, pouco se assemelham àquelas dos países com liberdade sindical.

abril de 1976, e n° 7.418 de 16 de dezembro de 1985, a legislação tributária, a previdenciária e a relativa ao fundo de garantia do tempo de serviço/FGTS, bem como as normas de segurança e saúde do trabalho. § 2° - Os sindicatos poderão solicitar o acompanhamento da Central Sindical, da Confederação ou Federação a que estiverem filiados quando da negociação de convenção ou acordo coletivo prevista no presente artigo”.

11 http: www.mte.gov.br, acesso em 30.12.2008.

12 Segundo dados disponíveis no site do Ministério do Trabalho e Emprego, em 1997, foram depositados 2.765

(10)

De qualquer forma, não se pretende simplesmente implantar, no Brasil, o modelo de outros países, mas levar em conta sua experiência para melhor entender o atual modelo de negociações coletivas e as relações de trabalho e, a partir daí, colher subsídios para explicar esse modelo brasileiro.

Quanto ao período de estudo, daremos maior foco na evolução histórica da negociação coletiva para demonstrar a origem e justificar a estrutura do atual modelo.

Importante destacar, por oportuno, que as críticas atualmente feitas ao modelo sindical brasileiro bem como a proposta de reforma da legislação sindical não prejudicam o presente trabalho. O estudo, até mesmo pelo seu caráter científico, foi construído com base no atual modelo posto, constituindo, se não uma análise sistemática da atual estrutura para celebração de convenções coletivas, uma avaliação específica do modelo corporativista, iniciado com Getúlio Vargas.

1.2.

J

USTIFICATIVA DO TEMA

A análise sistemática da atual estrutura para resolução de conflitos com a celebração de convenção coletiva justifica-se, antes de mais nada, pela sua riqueza científica e doutrinária.

No limiar do liberalismo, a organização entre os trabalhadores para defesa de interesses comuns, inicialmente proibida, surgiu como um fato social de resistência. Rapidamente passou a ser tolerado, reconhecido e, depois, regulamentado13. Atualmente, está protegido em Tratados Internacionais e Convenções da OIT14.

Nesse cenário de transformações, a negociação e celebração de convenção coletiva mereceu diversos estudos doutrinários e recebeu regulamentação legal das mais díspares, tornando-se, seguramente, um dos instrumentos normativos mais estudados e discutidos ao longo do século XX no âmbito das relações de trabalho.

As fartas teorias sobre a negociação sindical e convenção coletiva já justificariam sua análise no atual modelo de democracia no Brasil, buscando sistematizar, entre outras coisas, sua história, denominação, conceito, natureza jurídica, sujeitos, limites e procedimento de negociação.

13 DE La CUEVA, Mário. Derecho mexicano del trabajo, 2ª ed., t. II, México: s. ed., apud RUPRECHT, Alfredo J.

Relações coletivas de trabalho. São Paulo: LTr, 1995. p. 291.

14 Merecem referência as Convenções n.º 87 e 98 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, respectivamente

(11)

Faz-se mister ainda o estudo do atual modelo no contexto de valorização da autonomia privada coletiva15 e sua crescente utilização como instrumento para implementação de práticas flexibilizadas de relações de trabalho, muitas vezes até em confronto com o princípio protetor, inspirador do Direito do Trabalho no Brasil.

Finalmente, como última e maior justificativa para a escolha do tema para a presente dissertação, encontra-se sua utilidade prática, vez que a experiência profissional apresenta inúmeras situações envolvendo assuntos relacionados à resolução de conflitos de natureza trabalhista, em especial em meio a crises econômicas como atualmente o mundo está sofrendo.

Em adição as questões relacionadas aos efeitos e incorporação das cláusulas normativas da convenção aos contratos de trabalho, em típico elemento de eficácia temporal, nos deparamos, constantemente, com discussões a respeito da supressão de direitos e benefícios previstos na convenção pela denúncia, revisão, revogação ou mesmo pela alteração da representação de um dos sujeitos signatários durante sua vigência, sempre com reflexos consideráveis frente aos respectivos interessados, criando assim obstáculos para a negociação como resolução de conflitos.

Outra questão relevante é a falta de previsão legal a respeito dos efeitos dos instrumentos negociados, o que constitui grave problema para empregados e empregadores: para os primeiros, a expectativa quanto à manutenção de algumas vantagens aplicáveis aos seus contratos e o conseqüente risco de supressão; para os segundos, a incerteza quanto às obrigações que vigorarão ao longo do contrato, dificultando o planejamento estratégico e a gestão de seus negócios.

Em relação a competência geográfica no espaço, a prática também nos mostra problemas complexos, como a delimitação da representação do sindicato e os efeitos de alterações nessa representação ao longo da negociação e vigência da convenção. Essas situações ocorrem, por exemplo, com desmembramentos de sindicatos ou transferências de estabelecimentos.

Algumas dessas questões, com todas as suas variações no âmbito legal, são lembradas por AMAURI MASCARO NASCIMENTO ao analisar exemplo de alteração da convenção coletiva pela mudança da base territorial da empresa16. A hipótese descrita não propicia dúvidas quanto à divergência sobre o tema, deixando patente a necessidade de entender o modelo de negociação para que ao término do conflito, esse tipo de divergência não seja remanescente.

15 Amauri Mascaro Nascimento utiliza a expressão “autonomia privada dos particulares” e “autonomia privada dos

grupos”, que será aqui utilizado como sinônimos de autonomia privada coletiva. In; NASCIMENTO, Amauri Mascaro.

Compêndio de Direito Sindical. 2ª ed. São Paulo: LTr., 2000, p. 268 e segs.

(12)

1.3.

M

ETODOLOGIA

Em relação às técnicas de pesquisa, foram feitas consultas às fontes primárias, por meio entrevista com Professor LEONARDO SICA, autor do livro “A Justiça Retaurativa e Mediação Penal” e de pesquisa documental – convenções e acordos coletivos, legislação, jurisprudência dos tribunais, regulamentos de empresa, estatutos de classe – e às fontes secundárias, realizadas em bibliografias nacionais e estrangeiras.

1.4.

R

ESUMO E ESTRUTURA DO TRABALHO

Como a análise do atual modelo de resolução de conflitos por negociação e celebração de conveção coletiva não poderia ser feita sem a exata compreensão do significado desse instituto e o entendimento da atual organização sindical brasileira, apresentaremos o trabalho dividido em cinco itens.

Iniciaremos o estudo no item dois abordando objetivamente o problema dos conflitos nas relações de trabalho, separando o interesse coletivo do individual, para analisarmos as formas de solução coletiva dos conflitos, da qual a negociação coletiva constitui importante instrumento.

No item três analisaremos o conceito de autonomia privada coletiva e o modelo de organização sindical brasileiro, ainda fundado na representação da categoria e na unicidade sindical, contrapondo-se à liberdade de associação profissional, prevista no art. 8º, caput, da CF/88 e na Convenção nº 87 da OIT. Com isso, estaremos aproximando a negociação coletiva de sua origem histórica que justifica a atual estrutura de negociações no âmbito nacional, sem o que, o estudo teria pouca utilidade prática.

No item seguinte faremos uma análise da importância da negociação coletiva para solução dos conflitos trabalhistas e a característica normativa que reveste os resultado da negociação, os princípios que devem ser observados e a necessidade de serem materializados nas convenções, acordos e contratos coletivos de trabalho17.

No quinto item, faremos uma abordagem das principais características da convenção coletiva como instrumento formal de resolução do conflito materializado como resultado da

17 A referência aos contratos coletivos de trabalho justifica-se pela sua expressa previsão na Lei n.º 8630 de 1993,

(13)

negociação, procurando analisar seus elementos constitutivos: história, natureza jurídica, denominação, conceito, sujeitos, conteúdo, limites, procedimentos de elaboração e formas de rescisão.

O próximo item faremos uma abordagem da evolução da negociação coletiva paralela a da organização sindical no Brasil, explicando com base na doutrina científica as razões que acabaram por fazer nascer o atual modelo de negociação sindical e, os motivos que, mesmo com as fragilidade do sistema, vem sendo o instrumento mais importante na resolução de conflitos decorrentes das relações de trabalho.

Na conclusão, apresentaremos, de forma objetiva e direta, os principais aspectos extraídos da pesquisa.

Por fim, justificaremos as limitações do tema e faremos sugestões de estudos empíricos futuros.

(14)

2.

O

S

C

ONFLITOS NAS

R

ELAÇÕES DE

T

RABALHO

As relações de trabalho derivadas do vínculo de um trabalhador com um indivíduo ou empresa para qual presta seus serviços, a exemplo da própria vida em sociedade18, nem sempre se desenvolvem com a normalidade e harmonia desejadas19, mesmo porque os interesses do empregador e do empregado são normalmente conflitantes.

Importante destacar que há uma diferença natural de interesses entre as partes da relação de emprego, o que por si só já justificaria o conflito de interesses, pois a melhoria da condição social do trabalhador tem como contrapeso o aumento do custo da produção, que onera a empresa20 na já conhecida relação capital vs. trabalho, na medida em que o empregador é quem efetivamente realiza o pagamento do salário como contraprestação pelo trabalho do empregado.

Todo empregador tem o objetivo de auferir lucro, pretendendo que seus empregados produzam sempre mais e melhor com os mesmos ou até menores salários; ao empregado interessa a percepção de maiores salários e melhores condições de trabalho21, gerando os conflitos. Conforme limitação dada ao tema, não abordaremos nesse tópico os interesses indiretos de outros sujeitos existentes nas relações de trabalho, quais sejam a Receita Federal, Caixa Econômica Federal e o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no Brasil.

A palavra Conflito deriva do latim conflictus, de confligere e, na linguagem jurídica, significa “embate”, “oposição”22. Para MAGANO significa divergência em face de determinado interesse23.

Na mesma linha, WALTON e MCKERSIE também consideram o conflito no âmbito das negociações trabalhistas como a diferença de objetivos que se opõem entre duas partes que se relacionam24.

18 A vida em sociedade ocasiona, por força de sua própria natureza, diversos tipos de desacordo fruto da competição ou

da oposição. Os grupos humanos não passam de unidades de frágil contextura. In: DAVIS, Kingsley. A sociedade humana. Rio de Janeiro: Fundo de cultura, 1964, p. 197.

19 O conflito estimula a busca de alternativas, gerando novas condutas, reflexos e criações. E síntese, o conflito

contribui para o desenvolvimento. Sobre o problema da competição e do conflito ver Donald Pierson. In: Teoria e pesquisa em sociologia. São Paulo: Melhoramentos, 1962, p. 191.

20 SILVA, Antônio Álvares da. Unidade e pluralidade sindical. Direito Sindical Brasileiro, Estudos em Homenagem ao

Prof. Arion Sayão Romita, Ney Prado (coord.) São Paulo, LTr, 1998, p. 62.

21 GITELMAN, Suely Ester. A convenção coletiva de trabalho no direito brasileiro. Dissertação Mestrado PUC – SP.

São Paulo, 2001, p. 35.

(15)

Não há unanimidade entre os autores quanto à conceituação do fenômeno genericamente denominado conflito. Usam-se expressões como conflito, dissídio, controvérsia,

medida conflitiva, reclamação, embora nem sempre tomadas no mesmo sentido25.

Cabe-nos explanar com base na doutrina científica, as peculiadades que as distinguem. O conflito diferencia-se da controvérsia e do dissídio. A controvérsia seria o conflito em fase de ser solucionado e o dissídio, o conflito submetido à apreciação do Poder Judiciário, podendo ser individual ou coletivo, econômico ou jurídico26. Para RUPRECHT a primeira distinção é artificial e, na realidade, os dois termos devem ter o mesmo significado, além do que, a apresentação do problema ante o órgão estatal competente para resolvê-lo não muda sua natureza27.

De fato, a divergência acaba por gerar o conflito quando a atitude de uma das partes tende à exclusão da outra28, normalmente pela resistência das entidades empregadoras em satisfazer o interesse do empregado29. Entretanto, nem sempre a divergência de interesses gera conflitos, seja porque a parte envolvida não o exterioriza, seja porque a pretensão é atendida30.

Há diversas formas de onde se originam os conflitos: quando uma das partes lesa o direito da outra; quando as partes divergem na interpretação ou alcance de uma cláusula ou; quando crêem que é necessário mudar as condições de trabalho existentes31.

Sob uma visão pragmática, quando duas ou mais pessoas têm interesse pelo mesmo bem ou situação, que a uma só possa satisfazer, dar-se-á um conflito de interesses32 que pode se materializar também no âmbito das relações de trabalho..

A materialização de um conflito constitui um fato real, um fenômeno social concretizado com a oposição de interesses33 que se opõem. Para MENEZES CORDEIRO, as lutas laborais constituem um tema nuclear no estudo das relações de trabalho e do Direito Coletivo do Trabalho. Para o autor português, esses conflitos deixaram de ser meros fatos sociológicos para

24 WALTON, Richard E; MCKERSIE, R.B.A Behavioral Theory of Labor Negotiation. New York, McGrawHill, 1965 25 BELTRAN. Ari Possidonio. A Autotutela nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr., 1996, p. 49.

26 Os conflitos econômicos também são conhecidos como conflitos de interesse e os conflitos jurídicos como conflitos

de direito.

27 RUPRECHT, Alfredo J. Relações coletivas de trabalho. São Paulo: LTr., 1995, p. 670-1.

28 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras Linhas de Direito Processual Civil. V. 1. São Paulo: Saraiva, 1985, p. 4. 29 LOBO XAVIER, Bernardes da Gama. Iniciação ao Direito do Trabalho. Lisboa: Editorial Verbo, 1994, p. 78. 30 Ocorreria a satisfação da pretensão quando o empregado tem interesse por uma promoção e é contemplado pelo

empregador sem reivindicá-la.

31 RUPRECHT, Alfredo J. Relações ... ob. cit., p. 667. 32 BELTRAN. Ari Possidonio. A Autotutela... ob. cit., p. 38.

33 DE BUEN, Néstor. A solução dos conflitos trabalhistas no México. In: DE BUEN, Néstor (coord.) A solução dos

(16)

constituírem, nos dias de hoje, uma realidade do mundo da gestão empresarial e do Direito do Trabalho34.

As consequências dos conflitos em relações do trabalho extrapolam a esfera das partes envolvidas e atingem a sociedade em geral. Por isso, é interesse do Estado resolver o conflito de forma pacífica e eficiente. Entretanto, não se pode confundir o próprio conflito com os meios para resolvê-lo, nem se esquecer das peculiaridades pertinentes às relações de trabalho, gestão empresarial e da organização dos trabalhadores.

Sob o âmbito do direito privado civil, ambas as partes estão em igualdade de condições e, portanto, a lei lhes permite resolver seus conflitos com paridade. Por outro lado, é mandatório deixarmos claro que, na ordem trabalhista, a inferioridade econômica e moral – da relação de subordinação do empregado em relação ao seu empregador – impede que as diferenças se resolvam como ocorrem na esfera estritamente privada35, uma vez que no âmbito trabalhista, o Poder Judiciário tende a tratar de forma desigual as partes desiguais para assim compensar essas diferenças existentes entre as partes da relação de trabalho.

A solução para o problema da desigualdade dos sujeitos está intimamente relacionada com o processo de negociação coletiva como forma de resolução dos conflitos trabalhistas, uma vez que acaba por promover o equilíbrio entre os dois pólos contrapostos36 conforme veremos adiante. Aliás, na própria evolução história das relações de trabalho, marcadas pela lutas sociais, deve ser realçado o peso dos conflitos e das negociações coletivas nas mudanças e na evolução da legislação37, em especial no que se refere ao segmento do direito coletivo.

Importante realçarmos que, a negociação coletiva produz alterações que afetam a vida de cada empregado individualmente considerado, muito embora o resultado da negociaão vise a coletividade dos trabalhadores a ela subordinados. Por isso, a compreensão desse fenômeno e a análise de suas conseqüências na vida do trabalhador passa pela diferenciação do interesse coletivo do individual que será abordado no tópico adiante.

34 CORDEIRO, Antonio Menezes. Manual de Direito do Trabalho. Coimbra: Almedina, 1994, p.353. 35 RUPRECHT, Alfredo J. Relações coletivas.... ob. cit., p. 676.

(17)

2.1.

I

NTERESSES INDIVIDUAIS E INTERESSES COLETIVOS

Sob uma visão generalista, a diferença entre interesses individuais e coletivos pode parecer simples se entendermos que o interesse individual é pertinente à pessoa singularmente considerada, enquanto o coletivo, ao grupo38.

Essa avaliação generalista, embora correta, não explica adequadamente o tema à luz das relações de trabalho, na medida em que, muitas vezes, um mesmo fato pode interessar individualmente a um trabalhador ao mesmo tempo que abrange ao grupo.

Esse é o caso, para fins de exemplificação, da concessão de uma cesta básica de alimentos pelo empregador: se visto sob a ótica de um único empregado, há interesse individual na concessão, todavia, como o mesmo bem abrange a todos os empregados, com base no princípio da isonomia, o interesse torna-se coletivo.

Ainda na esfera trabalhista, algo de interesse específico de um único empregado e de um empregador situa-se normalmente no plano do direito individual39, embora possa estender-se a um grupo de trabalhadores pessoalmente considerados40 enquanto o interesse coletivo transcende o aspecto imediato, concreto e personalizado dos trabalhadores. Há uma configuração maior, identificada por um conjunto de trabalhadores com características comuns.

O professor WAGNER D. GIGLIO destaca que, nos conflitos individuais, há oposição de interesses concretos de pessoas determinadas enquanto nos conflitos coletivos se discutem interesses abstratos de uma categoria composta por um número indeterminado de pessoas41 que podem se desligar do empregador ou serem admitidos, sem que haja a necessidade de uma nova negociação de condições de trabalho que abrange a empresa ou setor.

Podemos então afirmar que, no interesse coletivo não se pode individualizar cada um dos seus integrantes, vez que abrangidos, além dos trabalhadores atuais, pelos que serão admitidos ao trabalho, ingressando posteriormente no grupo.

38 Essa é a diferenciação inicialmente feita por Walqüire Lopes Ribeiro Da Silva. In: Autonomia privada coletiva e

Direito do Trabalho. Revista de Direito do Trabalho. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, ano 26, n.97, p. 32-3, jan.-março, 2000.

39 MANUS, Pedro Paulo Teixeira. Direito do trabalho. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 213.

40 MARTINS, Idélio. Classificação dos conflitos coletivos de trabalho. In: FRANCO FILHO, Georgenor de Souza

(coord.). Curso de Direito Coletivo do Trabalho. Estudos em homenagem ao ministro Orlando Teixeira da Costa. São Paulo: LTr., 1998, p. 261.

(18)

Em linha similar, para o professor TEIXEIRA MANUS o interesse coletivo é aquele de que é titular a categoria ou parcela da categoria. Vai além das pessoas, porque indeterminadas, sendo titular o grupo, cujos participantes podem vir a ser identificados a cada momento e estão ligados entre si por pertencerem à mesma empresa, setor ou categoria profissional42. Não é a soma dos interesses individuais, mas a sua combinação.

Numa visão pragmática, o interesse coletivo distingue-se do interesse individual de cada um que o integra podendo até ser contrário ao mesmo. Nesse sentido, poderia um empregado, individualmente considerado, ser contrário à troca de um seguro de vida por um plano de saúde, conforme proposto pelo empregador em negociação coletiva, porque já encontra-se abrangido pelo plano de sua esposa. No entanto, a mesma proposta poderia atender ao interesse coletivo, se agradar à maioria dos empregados da empresa, nela também incluída o primeiro empregado. Como se pode ver, nas relações de trabalho há uma prevalência do interesse coletivo sobre o individual43.

Cabe-nos ainda diferenciar o interesse coletivo da mera acumulação de interesses individuais44. A distinção se mostra relevante no caso, por exemplo, de um empregador apresentar proposta de redução salarial aos empregados em razão de uma crise financeira, para consentimento mediante a oposição de assinatura individual.

Ainda que aceita pela totalidade dos empregados, a alteração não seria válida por propiciar prejuízos, pois, como uma alteração individual, sujeita-se aos efeitos do art. 468 da Consolidação das Leis do Trabalho45. Difere assim da aceitação coletiva, tomada em assembléia conduzida pela entidade sindical após negociação coletiva, e válida para o caso, conforme art. 7º, XIII, da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, os interesses coletivos são considerados uti universi enquanto os interesses individuais são uti singuli46. Quando um interesse se manifesta entre um grupo de trabalhadores e um ou mais empregadores, diz-se que o conflito, além de ser trabalhista em razão da

42 MANUS, Pedro Paulo T. Negociação coletiva e contrato individual de trabalho. São Paulo: Atlas, 2001, p. 26. 43 MARTINS. Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 15a ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 723.

44 BELTRAN. Ari Possidonio. A Autotutela nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr., 1996, p. 50.

45 Art. 468 da CLT “Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo

consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.”

(19)

atividade que desenvolvem os sujeitos, é coletivo, porquanto pertence à coletividade47 assim entendido o grupo de trabalhadores que possuem um elo comum entre si.

Não resta dúvida, portanto, que o interesse geral da sociedade está acima do interesse individual, pois leva-se em conta a defesa do grupo, da coletividade, às vezes em detrimento do indivíduo48.

Por outro lado, não podemos confundir o interesse coletivo dos trabalhadores com o interesse público. Esse diz ao interesse da sociedade ou da coletividade como um todo49, onde a presença do Estado se afigura em primeiro plano50. O interesse coletivo diferencia-se do público porque diz respeito apenas à um grupo de pessoas, sem constituir interesse de toda a comunidade ou sociedade51.

A diferenciação teórica entre interesse coletivo, interesse público e interesse individual nem sempre resolve o difícil problema da identificação dos diferentes interesses em conflito.

Nessa linha, para KROTOSCHIN, o conflito coletivo deve preencher dois pressupostos, sempre em conjunto do lado dos trabalhadores: o quantitativo, para haver uma pluralidade considerável de pessoas, dando-lhe assim o caráter coletivo e; o qualitativo, para referir-se ao interesse comum de determinada coletividade, ainda que sua origem tenha sido um conflito individual52.

Já PLÁ RODRIGUES apresenta três critérios como base para a classificação dos conflitos: (i) o primeiro, chamado de critério subjetivo, envolve o número de sujeitos: se um empregado, o conflito é individual; se mais de um empregado, coletivo; (ii) o segundo, chamado objetivo, considera a natureza da norma em discussão: verifica se o conflito nasce da aplicação do contrato individual ou da convenção coletiva para identificar se o conflito é, respectivamente,

47 RUSSOMANO, Mozart Victor; CABANELLAS, Guilhermo. Conflitos Coletivos de Trabalho. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 1979, p. 03.

48 RUPRECHT, Alfredo J. Relações coletivas de trabalho. São Paulo: LTr., 1995, p. 283.

49 MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo – meio ambiente, consumidor e outros interesses

difusos e coletivos. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 03. O autor também diferencia o interesse coletivo do difuso pelo sua origem, pois ambos são indivisíveis: os difusos supõem titulares indetermináveis, ligados por circunstâncias de fato, enquanto os coletivos dizem respeito a grupo, categoria, ou classe de pessoas ligadas pela mesma relação jurídica básica.

50 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Interesses difusos – conceito e legitimidade para agir. 3ª ed. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 1994, p. 26. Sobre a assunto ver ainda: LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e coletivos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

51 SILVA, Walqüire Lopes Ribeiro da. Autonomia privada coletiva e Direito do Trabalho. Revista de Direito do

(20)

individual ou coletivo; (iii) o terceiro, preferido pelo autor, considera sempre o interesse em jogo: será individual se os interesses em jogo forem concretos, de uma ou mais pessoas determinadas; será coletivo se o interesse é abstrato, da própria categoria53.

Esse critério numérico, embora ajude em muitos casos, não é decisivo na classificação dos conflitos porque pode ocorrer, na prática, a situação de um único trabalhador desencadear controvérsia que transcenda o seu interesse individual, afetando o grupo e, assim, originando um conflito apenas aparentemente de caráter individual54.

Nesse sentido, a simples existência de uma pluralidade de trabalhadores não é condição suficiente para que se possa falar tecnicamente, em um verdadeiro conflito coletivo, desde que inexista, de forma concorrente, o interesse coletivo55.

Face a abrangência conceitual, a solução para verificar a natureza do interesse discutido parece ser mesmo a análise de cada situação concreta, verificando se abrange uma totalidade de sujeitos determinados ou um grupo não limitado de pessoas, embora identificáveis a partir de uma característica comum, sempre ligada ao trabalho.

Caso esteja presente o interesse coletivo, estaremos diante das relações coletivas de trabalho, nas quais os seus titulares atuam, em regra, na qualidade de representantes de grupos sociais e econômicos56, em geral entidades sindicais dos trabalhadores e das empresas, buscando a solução dos conflitos a partir das formas permitidas em lei.

52 KROTOSCHIN, Ernesto. Tratado Prático de Derecho del Trabajo. V. II. Buenos Aires: Depalma, 1965, p. 795, nota

1.

53 PLÁ RODRIGUES, Américo. Estudo preliminar. DE BUEN,Néstor (coord.). A solução dos conflitos trabalhistas-

perspectiva Ibero-americana. São Paulo: LTr., 1989, p. 10.

54 É caso do confronto formado pela dispensa de um empregado na condição de representante de pessoal ou comitê de

fábrica, pois, embora envolva apenas um empregado, o interesse no ato abrange a toda coletividade representada.

(21)

2.2.

C

OMPOSIÇÃO DOS CONFLITOS COLETIVOS DE TRABALHO

Os sistemas de regulação e fiscalização das relações de trabalho guardam, na sua dinâmica constante e imperturbável, uma característica muito particular: não esperam os acontecimentos, adiantam-se a eles57.

Sendo assim, embora não possam evitar os conflitos inerentes às relações de trabalho, sistema de regulação e fiscalização, assim como o sistema jurídico, seja da esfera constitucional à administrativa, criaram mecanismos para solucionar os conflitos decorrentes das relações de trabalho.

Para MARTINEZ VIVOT, o importante será diminuir o número e a gravidade dos conflitos e, no caso de verificar-se, resolvê-los com a maior brevidade e menor prejuízo para as partes, assim como para o resto da comunidade58, sempre levando-se em consideração os reflexos negativos que a falta de pagamentos de salários acarreta à família e a economia da sociedade como um todo.

Em função da limitação apresentada para o presente estudo, interessa-nos apenas as modalidades de solução de conflitos coletivos, vez que os individuais apresentam princípios e características bastante distintas, merecedoras de estudo específico em outra oportunidade59 conforme tópico com sugestões de estudos futuros ao final.

O Brasil optou, em princípio, pela solução jurisdicional dos conflitos coletivos, ou seja, por meio do Poder Judiciário, inclusive os de natureza econômica, inspirado na Carta del Lavoro italiana60. Posteriormente, somente na década de 50, foi incentivada a modalidades de solução por

57 MARTINS, Idélio. Classificação dos conflitos coletivos de trabalho. In: FRANCO FILHO, Georgenor de Souza

(coord.). Curso de Direito Coletivo do Trabalho. Estudos em homenagem ao ministro Orlando Teixeira da Costa. São Paulo: LTr., 1998, p. 256.

58 MARTINEZ VIVOT, JÚLIO J. Formas de composição dos conflitos coletivos. In: TEIXEIRA FILHO, João de Lima

(coord.) Relações coletivas de trabalho. Estudos em homenagem ao Ministro Arnaldo Lopes Sussekind. São Paulo: LTr., 1989, p. 533.

59 Entre as modalidades de solução de conflitos individuais de trabalho a merecer um estudo sistemático encontra-se a

arbitragem e a mediação que, ao lado da solução jurisdicional, integram as formas de heterocomposição dos conflitos coletivos de trabalho no Brasil.

(22)

meio da negociação coletiva61, embora a solução jurisdicional, materializada pelo poder normativo da Justiça do Trabalho, ainda persista em nosso sistema.

No decorrer do século XX, apesar do caráter intervencionista do Estado brasileiro, verificou-se uma ampla aceitação da negociação coletiva como forma de solução de conflitos. Essa tendência é explicada por AMAURI MASCARO NASCIMENTO em razão de múltiplos fatores: a) a grande flexibilidade de que seria adotada, ajustando-se aos requisitos precisos de muitos setores industriais ou profissionais; b) porque serve para aplicar princípios amplamente admitidos de eqüidade e justiça social; c) porque permite a participação dos trabalhadores na adoção das soluções, transformando o que antes era unilateral em processo bilateral de decisões; d) sendo uma solução consensual, maior será a estabilidade nas relações obreiro-patronais, pois, segundo o autor, o consentimento garante a estabilidade62.

Cabe-nos esclarecer que são três as formas tradicionais de solução de conflitos no sistema jurídico brasileiro63: (i) autotutela64; (ii) heterocomposição e; (iii) autocomposição.

No caso da autotutela, ou autodefesa, as próprias partes procedem à defesa de seus interesses65. Poderia até ser sustentado que não se trata propriamente de um meio de solução de conflito, mas sim de um atributo do próprio conflito66, pois significa a defesa direta do próprio interesse pela parte67, sem a necessidade de esperar a concordância da outra ou a intervenção de um terceiro, como ocorre no caso de uma greve.

61 A Constituição brasileira em vigor exige, em seu art. 114, § 2º, a negociação coletiva como requisito para a

instauração do dissídio coletivo de trabalho.

62 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. A negociação coletiva no contexto democrático: sistema brasileiro e avaliação de

experiências pós-corporativas estrangeiras. LTr: revista legislação do trabalho. São Paulo, ano 49, n.10, p. 1169, out. 1985.

63 Essa classificação não é pacífica na doutrina: Magano especifica a existência de tutela (função jurisdicional),

autocomposição e autodefesa In: MAGANO, Octavio Bueno. Manual de Direito do Trabalho – Direito Coletivo do Trabalho. v. III, 3. ed. São Paulo: LTr, 1993, p. 213; Amauri Mascaro fala apenas da autocomposição e da heterocomposição In: NASCIMENTO. Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 28ª ed. São Paulo: LTr: 2002, p. 557, e Compêndio de direito sindical. 2ª ed. São Paulo, LTr., 2000, p. 255.

64 A autotutela, também conhecida por autodefesa, pressupõe o exercício da própria defesa, sendo assim a mais

primitiva forma de solução de conflitos. In: BELTRAN. Ari Possidonio. A Autotutela nas Relações de Trabalho. São Paulo: LTr., 1996, p. 25.

65 MARTINS. Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 15 ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 710.

66 Essa é a posição defendida por Amauri Mascaro Nascimento. In: Compêndio de direito sindical. 2ª ed. São Paulo,

LTr., 2000, p. 256.

67 Na autotutela não há a solução, mas apenas a pressão para a outra parte se render. A solução só virá no momento em

(23)

Já para o professor TEIXEIRA MANUS é direito dos empregados lançarem mão de outra forma de tentativa de solução do conflito coletivo, quando o empregador nega-se à negociação68.

Quanto a heterocomposição o conflito não é solucionado pelas próprias partes, mas por um terceiro, geralmente o Estado que intervém na relação. A composição do conflito coletivo se dá por meio de uma fonte ou de um poder suprapartes, por estas admitidos ou imposto pela ordem jurídica, como a arbitragem, a mediação69 e a jurisdição, estando a última caracterizada pelo poder do Estado dirimir os conflitos, via Justiça do Trabalho.

Cabe destacar que a arbitragem constitui um meio de solução de conflitos pouco prestigiado no âmbito das relações de trabalho no Brasil, talvez por uma questão de desconfiança das partes conflitantes, ou pela dificuldade de se eleger um árbitro ou, ainda, pelo fato de os empregadores, no gozo de suas prerrogativas, não se submeterem à intervenção de um terceiro e os empregados, por sua vez, terem receio de aceitar árbitros de confiança do empregador70.

No caso da arbitragem, as partes, após tentativa frustada de negociação, devem concordar que o conflito seja solucionado por um árbitro, ou seja, é um acordo e ao mesmo tempo uma divergência: não concordam com a solução do conflito oferecida pela outra parte mas concordam que suas divergências sejam solucionadas por um terceiro, alheio aos acontecimentos.

Com relação a mediação, trata-se da intervenção de terceiro, tendente à solução do conflito, através da realização de um negócio jurídico. A mediação, portanto, não é o acordo e sim a atividade de terceiro conducente à realização do acordo71. A mediação sofre dos mesmos problemas de desconfiança e falta de tradição da arbitragem, com o agravante de exigir o consenso das partes, na medida em que o mediador apenas facilita a solução dos conflitos sem decidir.

68 MANUS, Pedro Paulo Teixeira. Direito do trabalho... ob. cit., p. 217.

69 Novamente há divergência doutrinária na inclusão da mediação como forma de heterocomposição de conflitos

coletivos: Para Sérgio Pinto Martins, o mediador é um terceiro, chamado pelas partes, que vem solucionar o conflito mediante propostas aos interessados. In: Direito do Trabalho. 15 ed. São Paulo: Atlas, 2002, p 710. Já Amauri Mascaro classifica a mediação como autocomposição porque o mediador não substitui a vontade dos envolvidos restringindo-se a propor a solução às partes, que terão plena liberdade de aceitar ou não a proposta. In: Compêndio de direito sindical. 2ª ed. São Paulo, LTr., 2000, p. 260.

70 SÁ, Maria Cristina Haddad de. Negociação Coletiva de Trabalho no Brasil. São Paulo: LTr., 2002, p. 78.

71 MAGANO, Otávio Bueno. Procedimentos de autocomposição dos conflitos coletivos. LTr: revista legislação do

(24)

Ainda nessa modalidade de resolução de conflitos, vale a pena destacar o modelo restaurativo que vem sendo utilizado no âmbito penal72. Esse modelo restaurativo é um novo conceito que constitui um novo paradigma, que reformula o modo convencional de definir crime e justiça, com grande potencial transformador do conflito na medida em que intervém de modo mais efetivo na pacificação das relações sociais73.

O conceito de justiça restaurativa contemplado pela Organização das Nações Unidas (ONU), é aquele enunciado na Resolução nº 2002/12, editada pelo seu Conselho Econômico e Social, podendo ser entendida como uma aproximação, através de um processo cooperativo, que privilegia toda forma de ação, individual ou coletiva, onde as partes interessadas, na determinação da melhor solução, buscam corrigir as conseqüências vivenciadas por ocasião da infração, a resolução do conflito, a reparação do dano (lato senso) e a reconciliação entre as partes74.

Sob a ótica penal, o modelo restaurativo se baseia num procedimento de consenso, em que a vítima e o infrator, e, quando apropriado, outras pessoas ou membros da sociedade afetados pelo crime, como sujeitos centrais, participam coletiva e ativamente na construção de soluções para a cura das feridas, dos traumas e dos danos causados pela infração penal75.

RENATO S. G. PINTO observa que o crime, para a justiça restaurativa, não é apenas uma conduta típica e antijurídica que atenta contra bens e interesses penalmente tutelados, mas, antes disso, é uma violação nas relações entre o infrator, a vítima e a comunidade, cumprindo, por isso, à Justiça identificar as necessidades e obrigações oriundas dessa violação e do trauma causado e que deve ser restaurado, oportunizar e encorajar as pessoas envolvidas a dialogarem e a chegarem a um acordo, como sujeitos centrais do processo, sendo ela, a Justiça, avaliada segundo sua capacidade de fazer com que as responsabilidades pelo cometimento do delito sejam assumidas, as necessidades oriundas da ofensa sejam satisfatoriamente atendidas e a cura, ou seja, um resultado individual e socialmente terapêutico seja alcançado76.

72 PRUDENTE, Neemias Moretti, Justiça Restaurativa em Debate. Artigo originalmente publicado na Revista IOB de

Direito Penal e Processo Penal, Porto Alegre, vol. 8, n. 47, dez. 2007/jan. 2008.

73 NUNES, Dayse Carolina de Queiroz. Justiça restaurativa e sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro.

Revista da Esmape, Recife, v. 10, n. 22, jun./dez. 2005.

74 MCCOLD, Paul; WACHTEL, Ted. Em busca de um paradigma: uma teoria de justiça restaurativa.Disponível em: http://www.restorativepractices.org/library/paradigm_port.html#top Acesso em: 10 dez. 2008.

75 GOMES PINTO, Renato Sócrates. Justiça restaurativa é possível no Brasil? In: SLAKMON, C.; DE VITTO, R.;

GOMES PINTO, R.; (Org.). Justiça Restaurativa: coletânea de artigos. Brasília: Ministério da Justiça e PNUD, 2005.

76 GOMES PINTO, Renato Sócrates. A construção da Justiça Restaurativa no Brasil. O impacto no sistema de Justiça

criminal. Jus Navigandi, Teresina. a. 11, n. 1432, 3 jun. 2007. Disponível em:

(25)

No âmbito trabalhista, a justiça restauradora lamentavelmente não encontra o mesmo terreno fértil para se desenvolver como no âmbito penal. Conforme mencionado anteriormente, a mediação sofre problemas de desconfiança e falta de tradição, com o agravante de exigir o consenso das partes, na medida em que o mediador apenas facilita a solução dos conflitos sem decidir.

Em adição, considerando que no caso da mediação trabalhista, não há plena autonomia privada das partes em negociarem diretamente, revestidos de força normativa, em razão da própria limitação do direito brasileiro, acabam por incentivar outras formas de solução de conflitos que garantam que a vontade das partes seja exequivel em caso de descumprimento. Nessa via, a sentença normativa em dissídio coletivo e a convenção coletiva garantem essa exequibilidade.

Por fim, cabe salientar a opinião do Professor Doutor LEONARDO SICA77, que entende que já existem iniciativas para resolução de conflitos com base em alguns princípios da Justiça Restaurativa sob o o manto das comissões de conciliação prévia apenas para resolução de conflitos individuais. Entende ainda SICA que ainda carecem estudos na aplicação da Justiça Restaurativa para solução de conflitos coletivos.

Mas cabe salientar que algumas iniciativas vem sendo tomadas nesse sentido, baseado na iniciativa penal brasileira quanto ao modelo restaurativo78, que poderá ser objeto de novos estudos futuros.

Atualmente no Brasil, a forma mais comum para a heterocomposição de conflitos se efetiva pela atuação do Poder Judiciário nos dissídios coletivos de natureza jurídica ou econômica, servindo o primeiro para interpretar o sentido da norma existente e, o segundo, para criar novas condições de trabalho aplicáveis às partes interessadas por meio de uma ação judicial.

Já com relação a terceira hipótese, a autocomposição, trata-se da modalidade de solução de conflitos que mais nos interessa no momento, por abranger a negociação coletiva, dá-se a técnica de solução pelas próprias partes, mediante ajustes de vontade79. Atualmente no Brasil, é a forma de resolução de conflitos coletivos mais adotada.

Segundo TEIXEIRA MANUS reconhece-se, à unanimidade, a negociação direta como a melhor e mais eficaz forma de solução de um conflito coletivo, pois ninguém possui mais

77 Entrevista com o Professor Leonardo Sica realizada no dia 22 de abril de 2009 das 11h00 às 12h00.

78 SICA, Leonardo. Justiça restaurativa e mediação penal – O novo modelo de justiça criminal e de gestão do crime.

Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

(26)

conhecimento a respeito do problema a ser resolvido quanto as próprias partes que nele se envolvem80. Também para ZARTMAN, a negociação direta é o caminho mais curto para a resolução de conflitos econômicos81.

Atualmente no Brasil, a negociação coletiva constitui um procedimento de solução de conflitos recomendado pelo Estado. Com o advento da Constituição Federal de 1988, além de serem reconhecido os acordos e convenções como um direito dos trabalhadores urbanos e rurais82, foi condicionado o ajuizamento de ações judiciais de dissídios coletivos de natureza econômica à negociação prévia efetiva83 entre as partes envolvidas84, exigindo-se uma declaração das partes indicando expressamente o encerramento das negociações.

A negociação coletiva constitui um procedimento encadeamento de atos que se sucedem ao sabor das necessidades de ambas as partes, na tentativa de solucionar o conflito existente85. No item seis abordaremos a questão e as etapas da negociação com mais propriedade.

O resultado da negociação coletiva para solução de conflitos trabalhistas materializa-se na forma autocompositiva clássica que é a celebração da convenção coletiva de trabalho, das quais resultam as cláusulas debatidas e pactuadas pelos sindicatos e empresas, que vigorarão por um certo prazo, disciplinando as relações e os contratos individuais de trabalho86 de um grupo de trabalhadores.

O Brasil tem uma tradição de solução de conflitos centrada na atuação jurisdicional, fruto de um longo processo histórico de intervenção estatal, inclusive em questões de política salarial87 e da marcante participação do poder normativo da Justiça do Judiciário na decisão dos conflitos coletivos.

80 MANUS. Pedro Paulo T. Direito do Trabalho... ob. cit. p. 215.

81 ZARTMAN, Willian I. Conceber a teoria da negociação como meio de resolver conflitos econômicos. In: DUZERT,

Yann (org.). Manual de Negociações Complexas. Rio de Janeiro: FGV, 2007, p.15.

82 Art. 7º, XXVI, da Constituição Federal de 1988.

83Dissídio Coletivo - Negociação Coletiva Prévia - Exaurimento - Necessidade - Orientação Jurisprudencial Nº 24 da

SDC do TST. Consoante a Orientação jurisprudencial nº 24 da c. SDC, não é suficiente, para efeito de atendimento da exigência de negociação coletiva prévia e efetiva, a realização de uma única mesa-redonda perante a DRT. Recurso ordinário não provido . Tipo: RODC Número: 23313 Ano: 2002, PROC. Nº TST-RODC - 23.313/2002-900-08-00.6, SDC, outubro de 2002, Rel. Ministro Milton de M. França.

84 Art. 114, §2º da Constituição Federal de 1988; item I, da Instrução Normativa n.º 04 do TST, de 14.06.1993 e; art.

310 do Regimento Interno do TST.

85 O art. 612 e seguintes da CLT, como oportunamente será analisado, definem os requisitos e procedimentos

necessários para a efetivação da negociação coletiva.

(27)

Esse quadro precisa ser alterado, privilegiando-se a atuação dos próprios interessados na solução dos problemas. Nossa sociedade, como sustenta CARLA TERESA M. ROMAR, deve assumir a responsabilidade que antes delegara ao Estado e encontrar soluções céleres, justas e eficazes para seus conflitos de trabalho, que são inevitáveis e multiplicam-se mais que os Tribunais podem se multiplicar88.

Todavia, como oportunamente lembra WAGNER D. GIGLIO, o resultado da autocomposição depende da liberdade da negociação, sendo que esta liberdade requer igualdade de situação89. Assim, antes de analisarmos a negociação coletiva como instituto jurídico, é necessário estudar a situação dos sindicatos no Brasil, o problema da liberdade sindical e da falta de representatividade, decorrentes da estrutura corporativista, ainda existentes, com seus graves reflexos na autonomia privada dos grupos. Esse é o cerne do trabalho proposto, na medida em que ao atual modelo de negociações guarda cicatrizes profundas de suas origens.

3.

O

RGANIZAÇÃO

S

INDICAL

B

RASILEIRA E

A

UTONOMIA

P

RIVADA

C

OLETIVA

A materialização do resultado da solução de conflito trabalhista por negociação coletiva traduz-se na celebração da convenção coletiva, que basicamente representa a exteriorização da autonomia privada coletiva, caracterizada pela capacidade dos grupos negociarem condições de trabalho, normalmente mediante a representação e a atuação dos sindicatos de classe.

A evolução histórica da negociação coletiva e da celebração de convenção coletiva caminha lado a lado com a história do sindicalismo no Brasil, estando tão estreitamente entrelaçadas que é impossível analisá-las separadamente90. É justamente esse entrelace que acabou por gerar um modelo de negociação coletiva peculiar à luz das relações de trabalho no Brasil, uma vez que a origem das estruturas sindicais do Brasil e o atual regime sindical derivado comprometem o livre exercício da autonomia privada coletiva, como veremos adiante.

88 ROMAR, Carla Teresa Martins. Solução dos conflitos de trabalho: a autocomposição como forma a ser privilegiada.

In: ROMAR, Carla T. M.; SOUZA, Otávio A R. (coord) Temas relevantes de direito material e processual do trabalho: estudos em homenagem ao Professor Pedro Paulo Teixeira Manus. São Paulo: LTr, p. 529, 2.000.

89 GIGLIO, Wagner D. Solução dos conflitos coletivos: conciliação, mediação, arbitragem, resolução oficial e outros

meios. LTr: revista legislação do trabalho. São Paulo, ano 64, n.03, p. 311, mar. 2001.

(28)

3.1.

F

ORMAÇÃO HISTÓRICA DO SINDICATO BRASILEIRO

No período anterior a independência do Brasil não havia clima social capaz de autorizar o associativismo, ou seja a união de pessoas com um objetivo comum. Entretanto, vários elementos históricos indicam a existência de confrarias organizadas à margem da lei, de natureza administrativa e fins religiosos, com a finalidade de aglutinar profissões, semelhante aos propósitos do sindicato moderno. Nesse cenário, mesmo que remota ou indiretamente, houve no Brasil colonial traços de atividade afim à sindical91.

Esse cenário persistiu por muitas décadas e invadiu o período pós independência praticamente inerte. Nem mesmo o status de país independente trouxe qualquer avanço no desenvolvimento na organização sindical brasileira, pois, em 1822, ainda apresentávamos uma economia fundamentalmente rural, estruturada na mão-de-obra escrava.

Nenhuma alteração significativa ocorreu com a promulgação da primeira constituição do período independente. A Constituição Imperial, de 25 de março de 1824, nada dispôs sobre sindicato ou negociação coletiva de trabalho, em omissão plenamente justificada à época92. Muito embora fosse assegurada “a liberdade de trabalho93”, referida Constituição baniu “as corporações de ofício, seus juízes e mestres94” sem apresentar qualquer capítulo reservado aos direitos sociais ou algo assemelhado, numa demonstração autoritária de que eventuais conflitos de natureza trabalhistas seriam solucionadas de acordo com a vontade do empregador ou do Estado, em detrimento das expectativas do trabalhador.

Com a libertação dos escravos pela Lei Áurea de 1888 e a posteriormente a proclamação da república, podemos afirmar que iniciou-se de maneira bastante discreta o desenvolvimento do Direito Coletivo no Brasil: (i) o fim da escravidão propiciou o crescimento de

91 RUSSONAMO, Mozart Victor. Princípios de Direito Sindical. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 29-30.

92 Segundo informa Süssekind, no início do século XIX, a organização sindical era proibida e considerado delito na

maior parte do mundo. Destarte, a sindicalização, foi proibida pela Lei Chapelier (1791); considerada crime pelos “Combinations Acts” da Bretanha (1799/1800) e pelo Código Penal francês (1810). Somente foi tolerada na Grã-Bretanha em 1824, mediante revogação dos citados atos e, na França, com a modificação do Código de Napoleão em 1864. O reconhecimento como direito surgiu ainda mais tarde: na Grã-Bretanha, com o “Trade Unions Act” obtido por DISRAELI (1871) e; Na Framça, com a Lei Waldech-Rousseau, de 1884. Tornou-se um direito universal apenas com o Tratado de Versailles em 1919, para depois conquistar a hierarquia de um dos direitos humanos fundamentais com a nova Declaração Universal dos Direitos do Homem em 1948. In: SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. A OIT e o princípio da liberdade sindical. In: FRANCO FILHO, Georgenor de Souza (coord.). Curso de Direito Coletivo do Trabalho. Estudos em homenagem ao ministro Orlando Teixeira da Costa. São Paulo: LTr., 1998, p. 51.

(29)

uma grande massa de trabalhadores, assalariados principalmente na agricultura; (ii) o novo regime republicano ajudou a roer os alicerces de uma estrutura combalida e enfraquecida, permitindo o início do nosso desenvolvimento econômico.

Finalmente, com a Constituição de 24 de fevereiro de 1891, a primeira da fase republicana, foi assegurado, ainda que genericamente, o direito de associação e reunião95, fato que permitiria a posterior organização e regulamentação das entidades sindicais, ocorrida no século XX. Nessa época surgiram as associações de classe, ainda sem a forma de sindicatos96 mas o Brasil já demonstrava os primeiros sinais de que o Estado estava se abrindo para organizadas estruturas de relações de trabalho que já haviam despontado em países como Alemanha e Itália.

Saliente-se que as primeiras normas versando sobre sindicato no Brasil foram o Decreto n° 979, de 6 de janeiro de 1903, à respeito dos sindicatos dos profissionais da agricultura e indústrias rurais97 e o Decreto n° 1.637, de 05 de janeiro de 1907, sobre sindicatos urbanos, em ordem justificada pela prevalência da economia rural com a cultura de cana-de açúcar e o início do ciclo do café no Brasil.

Cabe ainda destacar que RODRIGUES PINTO nos lembra que as normas formais não bastariam sozinhas para impulsionar o movimento sindical, dependendo de uma conjugação de fatores econômicos, culturais e sociais.

Nessa esteira, a autorização constitucional da associação teve papel importante por permitir e indiretamente estimular os primeiros passos do sindicalismo brasileiro98 ainda predominandemente agrícola.

Além da legislação, alguns fatores internos e externos auxiliaram no surgimento e desenvolvimento das organizações sindicais brasileiras, seja no terreno político, como o Manifesto Comunista de Marx e Engels, a Encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII e a criação da OIT

95 Art. 72, § 8º, da Constituição do Brasil de 1891: “a todos é licito associarem-se e reunirem-se livremente e sem

armas, não podendo intervir a política senão manter a ordem pública”.

96 Arnaldo Süssekind relata o aparecimento das seguintes associações: Sociedade União dos Foguistas (1903 ), União

dos Operários Estivadores (1903), Associação de Resistência dos Cocheiros, Carroceiros e Classes Anexas (1906), União dos Operários em Fábricas de Tecidos (1917). In: SUSSEKIND, Arnaldo Lopes et al. nstituições de Direito do Trabalho. v. 2. 18 ed. São Paulo: LTr., 1999, p. 1086-1087.

97 Pelo Decreto os sindicatos eram considerados pessoas jurídicas de direito privado e o processo de criação era

simplificado, bastando o registro no cartório competente da sede do sindicato.

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