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Entre as assistentes sociais e as professoras: representações dos alunos “anormais” da Escola Especial Ulysses Pernambucano (1952-1957)

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO NÚCLEO DE TEORIA E HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

KLEYDSON THYAGO ARAUJO DE OLIVEIRA

ENTRE AS ASSISTENTES SOCIAIS E AS PROFESSORAS:

REPRESENTAÇÕES DOS ALUNOS “ANORMAIS” DA ESCOLA ESPECIAL ULYSSES PERNAMBUCANO (1952-1957)

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KLEYDSON THYAGO ARAUJO DE OLIVEIRA

ENTRE AS ASSISTENTES SOCIAIS E AS PROFESSORAS:

REPRESENTAÇÕES DOS ALUNOS “ANORMAIS” DA ESCOLA ESPECIAL ULYSSES PERNAMBUCANO (1952-1957)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco para a obtenção do título de Mestre em Educação, sob a brilhante orientação do Professor Doutor André Gustavo Ferreira da Silva.

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KLEYDSON THYAGO ARAUJO DE OLIVEIRA

ENTRE AS ASSISTENTES SOCIAS E AS PROFESSORES: NOTAS

SOBRE OS ALUNOS “ANORMAIS” DA ESCOLA ESPECIAL ULYSSES

PERNAMBUCANO (1952-1957)

Dissertação

apresentada

a

Programa de Pós-Graduação em

Educação da Universidade Federal

de Pernambuco, como requisito

parcial para obtenção de título de

Mestre em Educação.

Aprovada em: 30/09/2016.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________________________

Prof. Dr. André Gustavo Ferreira da Silva (Orientador)

Universidade Federal de Pernambuco

________________________________________________________________

Prof. Dr. Carlos Alberto Cunha Miranda (Examinador Externo)

Universidade Federal de Pernambuco

________________________________________________________________

Prof. Dr. Adriana Maria Paulo da Silva (Examinadora Interna)

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, Graça e Ribeiro, a minha irmã, Kilda, e a meu cunhado, Carlos, pela dedicação e paciência que tiveram comigo durante esse longo e árduo trabalho que é escrever. Agraço a meus tios, Rogério e Lauro, que ajudaram de todas as formas possíveis para que eu chegasse até aqui. Obrigado. Agradeço aos meus oito gatos que, em momentos de tanta tristeza, me fizeram sorrir com carinhos e ronronados! Agradeço aos meus avós, que mesmo com tanta dificuldade e incompreensões estão presentes. Agradeço aos meus tios, Bernadete e Correia, pelos votos de sucesso dados a mim à época da aprovação no mestrado, e que sei, foram muitos sinceros. Agradeço a todos os familiares que não citei aqui, mas que estiveram comigo sempre.

Agradeço e dedico esse trabalho a professora Mitz Helena de Souza Santos, que desde minha graduação, em 2009, tem me ajudado de muitas formas e que me deu dicas preciosas de como ser um bom estudante, um bom pesquisador e, acima de tudo, uma pessoa melhor. Já passamos por muitas coisas dentro da UFPE, já enfrentamos de um tudo, mas sempre estivemos ajudando um ao outro, por esse fato que agradeço, mais uma vez o carinho que ele dispende para mim, não tenho palavras para agradecer nem para dizer o quanto sou grato pela sua ajuda seja em momentos doces, seja em momentos não tão doces assim. Obrigado.

Agradeço a meu Orientador o Professor Doutor André Ferreira que me acolheu no Mestrado e sem ele esse trabalho não seria possível, que em momentos de agonia me deu uma luz e sempre ajudou quando eu precisava, sempre me colocando no caminho certo e sempre dando dicas preciosas do que deveria ser feito. Agradeço pela paciência que teve comigo ao longo desses anos e peço desculpas por algo que tenha ocorrido, mas faz parte do processo. Ao senhor, meu muito obrigado.

Agradeço a Professora Doutora Adriana Paulo, que foi minha professora na graduação e me ensinou que a vida é composta de altos e baixos e que esse movimento é necessário para a formação do caráter do indivíduo e hoje posso dizer que sou uma pessoa melhor. Agradeço pelas dicas dadas na fase de qualificação de minha dissertação, elas serviram muito. Obrigado.

Agradeço ao Professor Doutor Carlos Miranda, que me ajudou bastante tanto na graduação como na Pós-graduação, com conversas e empréstimos de livros. Obrigado. Agradeço ao Professor Doutor Geraldo Barroso, que me incentivou a continuar a pesquisar.

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Agradeço a todo o pessoal administrativo, da limpeza, as Psicopedagogas, em especial a professora Mere, hoje aposentada da Escola Especial Ulisses Pernambucano, que me tratou muito carinhosamente na minha primeira ida a escola e se mostrou muito disposta a preservar a memória da Escola. A diretora, à época, da Escola, cujo nome me foi roubado pelo tempo, meu mais sincero obrigado. A vice-diretora que me foi tão gentil em momentos de tão delicada situação, quando fui agredido verbalmente por um funcionário da escola, foi ela que me acolheu e me assistiu quando foi impossível continuar.

Agradeço a professora Noêmia Araújo Varela que, infelizmente, nos deixou nesse mês de maio de 2016, uma perca irreparável. A senhora, que ajudou a tantos alunos a serem donos de si, meu muito obrigado.

Agradeço ao Governo do Estado de Pernambuco, através da FACEPE, que financiou esse projeto e deu a possibilidade de conhecermos mais sobre a Escola Especial Ulisses Pernambucano, abrindo novos horizontes.

Agradeço a todos os funcionários do Programa de Pós-graduação pelo carinho e atenção que foi dispendido a mim; ao antigo coordenador, Professor Doutor Ramón e ao novo coordenador e que tenha muito sucesso. Um agradecimento especial a Marcio Eustáquio, que faleceu recentemente, meu muito obrigado.

A todos os meu colegas e amigos da turma 32-B do Mestrado em Educação, em especial Nathalia Cavalcanti – “ou se é Cavalcanti ou se é cavalgado” – pela força que tem me dado até hoje e pelos conselhos sábios que tem me chamado a razão em tempos de descontrole emocional por razões diversas. Agradeço a companhia na viagem a Florianópolis, ela nos ajudou a sermos melhores pesquisadores, visto as coisas novas que aprendemos no congresso. Obrigado, Nathalia, por ter aguentando meu medo de voar e minha excitação naquele dia. Meu muito obrigado.

Agradeço a Giedre Benatto pelas conversas e pelos desabafos que tivemos ao longo desses dois anos. Agradeço a Cassiana pelas conversas reconfortantes e alegres que tivemos nesse longo e árduo percurso. A Karla Dantas Estrela por aquele presente naquele “amigo segredo” naquela disciplina e pela companhia, principalmente, no primeiro ano de mestrado. A todos que não citei aqui, meu muito obrigado. A Williany Fênix, agradeço as conversas ao longo do mestrado e a amizade retribuída. A Laila Cândida, que me ajudou a esperar com paciência.

Aos meus amigos da Graduação em História meu muito obrigado. À Ghita Galvão (Baby) que sempre esteve comigo, que chorou e riu comigo, que é uma grande amiga e me

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ajudou muito na graduação e esteve comigo sempre nos momentos fáceis e difíceis. Obrigado por ter ido a minha qualificação, por me dar sua amizade, não sabes o quando sua presença me é reconfortante, te amo! A Suzane Batista, que também esteve comigo em muitos momentos, agradeço também por ter ido a minha qualificação, sua ajuda foi extremamente relevante. A Michelle Barros, que esteve e está comigo sempre, conversando, ajudando, dando bronca, que gosta e Djavan e vai comigo aos Shows, que me incentivou a entrar numa nova perspectiva da minha vida, Michelle Barros, se não fosse você eu ainda estaria no mesmo lugar, obrigado. A Diogo Diniz, noivo de Michelle, agradeço igualmente.

A Paula Lourenço, agradeço pela paciência, e pelos conselhos que me deu. Você é muito importante para mim e obrigado por me acompanhar nos shows de Djavan também e vamos em frente, que a luta continua. A Rayanne Christine, que sempre esteve pronta para ouvir meus lamentos sobre a árdua tarefa de analisar fontes, lidar com outras pessoas e qualquer assunto relacionado a vida e suas efemeridades. Merci, ma chèrie! A Rebecca Batista que está comigo sempre, mesmo quando eu sumo por meses, obrigado. A Mirella Rocha, que foi responsável pelo início de minhas pesquisas no campo da loucura. A Kaline Vieira, meu muito obrigado pela companhia e pelas horas discutindo “Star Wars: o despertar da força” e tantas outras séries.

A Ana Beatriz (Bia) que me salvou de tantos problemas e que me levou para ver filmes em momentos em que eu não aguentava mais o peso da pressão. A Sua mãe, Betânia Souza, que me ajudou muito com conselhos e um carinho especial, muito obrigado.

Aos meus professores da Graduação, em Especial a Virgínea de Almoêdo e Renato Pinto que estiveram sempre dispostos a me ajudar. A Levi Rodrigues, técnico-administrativo da coordenação de história, que sempre ajudou a mim e a todos que necessitassem.

Aos meus amigos da Escola Estadual Frei Caneca, na cidade de Camaragibe, que ajudaram na formação do meu caráter e me fizeram a pessoa que sou hoje. A Eliziane Gomes, meu carinho mais que especial, pois sempre esteve comigo em momentos de pura aflição e em momentos de glória. Que seu Deus abençoe você hoje e sempre e seja sempre feliz e mantenha esse sorriso lindo em todos os momentos, amo-te. A sua irmã, carinhosamente chamada de Poly, meu muito obrigado por compartilhar comigo uma visão muito parecida do que é a academia e pelas tardes em sua casa.

A Karolina Pacheco, meu muito obrigado, que seus Deuses a protejam por onde você andar. Não perca sua essência, continue sendo assim. A Felipe Rodrigo, Jaiton José, Camila Mendes, Rodrigo José, Mariele Ferreira e todos os outros que estiveram nessa fase comigo,

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muito obrigado. Aos meus professores do ensino fundamental e médio, em especial Josenilda e Edna e Vanda Muniz, que aguçaram meu desejo de saber sempre mais.

Aos meus amigos João Ricardhis, que gosta de ser citado sempre em primeiro lugar, Nicole Sebastiao e Adonai Bandeira, meu muito obrigado por me aguentarem nos dias de mais nefasta desanimação e por me aconselharem das melhores formas possíveis. Obrigado por, em meus devaneios, me trazer a realidade e seguir sempre em frente! Amo vocês.

Quero fazer meu mais elogioso agradecimento a presidenta eleita da república Dilma VanaRoussef, que permitiu que fossem expandidas as vagas nas pós-graduações de todo o Brasil nesse período de treze anos onde se inclui o mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Quero deixar meu desagravo ao “novo governo” que já nasceu ilegítimo, por se tratar de um nocaute na jovem democracia brasileira, que em pouco mais de 20 anos já sofreu tanto. Cabe a nós não deixar esse momento passar desapercebido e termos consciência e senso crítico.

Agradeço a Djavan e a Chico Buarque de Holanda por ter escrito músicas que me fizeram ter mais força para enfrentar as dificuldades e me mantiveram acordado durante todo o tempo necessário para que a dissertação fosse feita.

Aqueles que me esqueci de nomear aqui, pois a idade chega para todos e são tantas pessoas dispostas a ajudar, nem que seja com seu carinho e sorriso, meu muito obrigado.

Agradeço a todos os meninos e meninas que cito aqui, neste trabalho, por ter compartilhado comigo um pouco de sua história. Muito obrigado.

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“(...)

As ordens foram servidas Com muito amor e paixão De mil juras prometidas Surge um lindo varão Na festa de “Deus Menino” Após dois anos de corte Levou um menino à lida Quase me levou à morte

(...)

Pelos traços desse filho Dá pra ler a minha estória Um sofrer que vem de longe Acobertado de glória”

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RESUMO

Este trabalho se caracteriza pela análise da Escola Especial Ulysses Pernambucano numa perspectiva teórica pautada nos textos de Roger Chartier e de sua teoria das Representações Sociais. Assim, nos perguntamos: como eram vistos os alunos “anormais” do Recife da década de 1950 matriculados na Escola Especial Ulisses Pernambucano e, a partir das representações que permeavam as professoras e as Assistentes Sociais da Escola Especial Ulysses Pernambucano, quais as práticas relacionadas a educação dos alunos na referida escola? Para responder a tal questionamento caminharemos por três vias complementares: a primeira se baseia em contextualizar historicamente a Teoria das Representações Sociais (TRS), suas divergências e convergências em especial a utilizada por Roger Chartier. Em seguida iremos identificar as primeiras escolas criadas no Brasil para alunos excepcionais e exemplificar o caso de Pernambuco, como vanguarda da criação de espaços educacionais voltados aos “anormais” de forma pública e gratuita, identificaremos as identidades e os signos produzidos dentro do ambiente escolar a partir da perspectiva das Assistentes Sociais e das Professoras. Metodologicamente, iremos nos ater as fontes documentais encontradas no arquivo da escola e a análise dessas, de forma qualitativa.

Palavras – chave: Teoria das Representações Sociais. Escola Especial Ulysses Pernambucano. Educação Especial. Serviço Social.

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RESUMÉ

Ce travail se caractérise par l'analyse d'Ulysse Special School Pernambucano une perspective théorique guidé les textes de Roger Chartier et sa théorie des représentations sociales. Donc, nous demandons: de 1950 anormaux »Recife étudiants comment ont été vus inscrits à l'école spéciale Ulisses Pernambucano et des représentations qui imprégnait les enseignants et l'école spéciale des travailleurs sociaux Ulysse Pernambucano, qui concerne les pratiques éducation des élèves dans cette école? Pour répondre à cette question, nous allons marcher à travers trois voies complémentaires: la première est basée sur contextualiser historiquement la théorie des représentations sociales (SRT), leurs différences et surtout utilisées par Roger Chartier. Ensuite, nous allons identifier les premières écoles établies au Brésil pour les étudiants exceptionnels et illustrent le cas de Pernambuco, comme l'avant-garde de la création d'espaces éducatifs dédiés à «anormal» public et gratuit, nous identifierons les identités et les signes produits dans le milieu scolaire du point de vue des travailleurs sociaux et d'enseignement. Méthodologiquement, nous nous en tiendrons aux sources documentaires trouvées dans le fichier de l'école et l'analyse de ces qualitativement.

Mots - clés: Théorie des Représentations Sociales. Escola Especial Ulisses Pernambucano. Éducation spécialisée. Services Sociaux.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 12

2 APONTAMENTOS SOBRE A EDUCAÇÃO ESPECIAL ... 19

2.1 A EDUCAÇÃO ESPECIAL NO BRASIL ... 19

2.2 AS PRIMEIRAS “ESCOLAS” ... 23

2.3 PERNAMBUCO COMO VANGUARDA ... 27

2.3.1 O legado de Ulysses Pernambucano... 27

2.3.2 Os anos iniciais da Educação Especial no Recife ... 32

3 ALUNOS, PROFESSORES E ASSISTÊNCIA SOCIAL ... 43

3.1 A ASSISTÊNCIA SOCIAL ... 44

3.2 A RELAÇÃO ENTRE A ASSISTÊNCIA SOCIAL E OS ALUNOS ... 48

3.2.1 A aluna S.R.P ... 49

3.2.2 O aluno J.M.S ... 61

3.2.3 O aluno M.L.F ... 65

3.3 Interação Assistente Social e Professoras: uma lacuna ... 68

4 AS REPRESENTAÇÕES DENTRO DO AMBIENTE ESCOLAR ... 70

4.1 A ESCOLA ESPECIAL ULISSES PERNAMBUCANO E A REPRESENTAÇÃO DA ARTE-EDUCAÇÃO ... 71

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 84

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1 INTRODUÇÃO

A ideia deste trabalho surgiu no ano de 2011 enquanto o pesquisador estava na graduação dupla (Licenciatura e Bacharelado) em História pela Universidade Federal de Pernambucano (UFPE) em aula de “História de Pernambuco 1” ministrada brilhantemente pelo Professor Doutor Carlos Alberto Cunha Miranda onde ele apresentou aos alunos alguns prontuários de pacientes que foram internados no Hospital Ulysses Pernambucano situado no bairro da Tamarineira, em Recife, Pernambuco.

A aula e esses prontuários fizeram o pesquisador refletir sobre a importância do estudo da loucura no nosso estado; Pernambuco, estando essa parte da história esquecida em detrimento de outras elencadas como mais importantes como a história do Brasil Colônia, as revoltas de 1817 e 1824, em Pernambuco e a questão da escravidão, entre outras, ficando essa parte “incomoda” para alguns poucos “loucos”.

Instigado pelo professor Miranda, fomos, o pesquisador e mais alguns amigos, trabalhar na documentação existente dentro do hospital e encontramos coisas muito interessantes como, por exemplo, cartas de internos às suas famílias. Foi visto também a forma como eram tratados esses pacientes e como eram calados, relegados a meros coadjuvantes da história.

Há poucos que se ocupam em, como diria Walter Benjamim, contar a história dos vencidos, varrer o passado a contrapelo, dar vida àqueles que morreram calados naqueles corredores inócuos dos manicômios de todo Brasil. Caso emblemático é visto em Barbacena, muito bem relatado por Daniela Arbex no livro “Holocausto Brasileiro”, onde inúmeros atos desumanos, mesmo para época, foram registrados em livro recém-publicado, que vale a leitura para os curiosos.

Em 2014, três anos depois de iniciar os estudos sobre a loucura com trabalhos publicados em congressos científicos, o pesquisador foi aprovado no Mestrado em Educação na UFPE, unindo duas ciências que gosta e respeita muito: história e educação.

Na preparação no projeto de pesquisa para concorrer a uma das vagas da Linha de Pesquisa em “Teoria e História da Educação” o pesquisador deu ênfase na Escola Especial Ulisses Pernambucano, fundada no ano de 1941 e que tratava de crianças “anormais”, a partir daí fez a ligação entre a história e a educação, fazendo com que seu trabalho girasse em torno desse objeto empírico e assim, fosse aprovado na seleção de mestrado no ano de 2014, cuja

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orientação ficou a cargo do Professor Dr. André Ferreira, que fez um trabalho digno de muitos elogios e trazendo o pesquisador para um caminhando onde andar se tornou muito mais fácil.

Escolhemos os anos de 1950 pois o quantitativo de fontes era muito maior, aparecendo registro das Assistentes Sociais e de Professoras, facilitando a pesquisa e foram usados os registros das Assistentes Sociais (A.S) e o livro de ata das reuniões das professoras.

Refinando mais o corte temporal, dentro dos anos de 1950, escolhemos os anos de 1952 até 1957, pois reside nesses anos uma presença consistente de documentação que nos permitiu desenvolver o trabalho. O ano de 1952 demarca o início de nosso trabalho, pois é nesse momento que começa o crescimento de matriculas dos alunos, passando a escola a aceitar alunos com problemas na fala e na escrita. Assim se confere a escola uma demanda muito grande e, dessa forma, um olhar maior sobre a instituição. O ano de 1957 é escolhido como fim, pois há o fim de um ciclo na direção da escola, demarcado pelo retorno da professora Anita Paes Barreto à direção da Escola Especial Ulysses Pernambucano (EEUP), tendo sido substituída no período pela professora Noêmia de Araújo Varela.

Cabe-nos situar o leitor historicamente no processo de criação das primeiras escolas para o público “anormal” no Brasil, e suas dificuldades no decorrer da história do país, a quem essas escolas serviram e como se organizavam educacionalmente e politicamente.

Após a historiografia da educação dos anormais, procederemos com a análise das documentações encontradas na escola e, daí, surge uma questão: como era a cultura institucional que havia dentro da escola? Além disso, cabe perguntar, sendo a escola agregada a um hospital psiquiátrico, qual a relação entre as práticas características do referido hospital e a vida escolar? Ou ainda se havia uma identificação comum a caracterizar a cultura escolar da EEUP no período? Quais as visões diferentes de educando e escola e seus impactos nas práticas educacionais?

Tendo como norte as questões acima elencadas, nosso objetivo maior é investigar as práticas e a dinâmica das representações que demarcaram a cultura escolar da EEUP no período proposto. Para tanto, apontamos enquanto escopos intermediários, que se somarão ao desenvolvimento geral do trabalho, as seguintes metas: localizar a educação especial em Recife, especificamente a EEUP, no contexto da história da educação especial do Brasil; investigar as práticas relacionadas ao alunado em referência à sua condição “especial” e identificar quais os principais atores envolvidos; identificar e analisar a dinâmica da escola em relação às possíveis representações de educação especial que permeavam seus educadores e orientavam suas práticas.

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Diante da literatura consultada, que pode ser encontrada no texto e explicitadas nas referências bibliográficas não notamos a presença de trabalhos relevantes sobre o objeto-problema dessa pesquisa, restando apenas a uma visão ora materialista histórica, como é o caso dos textos de Gilberta Jannuzzi ou mesmo textos mais técnicos, como é o caso daqueles produzidos por Anita Antipoff.

Entretanto, há autores pernambucanos que versam sobre a psiquiatria e psicologia no estado de Pernambuco, que ocuparam, por vezes, boa parte de sua vida acadêmica em estudar, nos mais íntimos detalhes dessa parte da história de Pernambuco. Mas, em nenhum momento se ocuparam para recortar a parte educacional dessa rica história da psiquiatria no estado de Pernambuco, seja por desconhecimento ou por questões epistemológicas mesmo. Textos escritos pelo professor da Universidade Federal de Pernambuco, Carlos Miranda, tecem argumentos e histórias sobre a nossa lida com os “anormais” desde os primeiros anos da colonização e se focam no trabalho de Ulysses Pernambucano e seu legado no estado.

Embora a Escola Especial Ulysses Pernambucano tenho sua gênese nesse legado, nada é falado sobre ela pelo professor, mesmo sendo ela pensada pelo próprio Ulysses e implementada por uma das principais discípulas dele: Anita Paes Barreto. A todo momento a vida da escola se mistura a vida do principal hospital psiquiátrico do estado, seja na ideia de um psiquiatra do serviço de psiquiatria do estado ser designado para tomar conta dos “alunos” da escola, seja para fazer testes nesses alunos no hospital psiquiátrico.

Isso tudo nos leva a querer contribuir com esses autores, mostrando que há elementos que precisam ser estudados e visibilizados, que eleger o que se estudar não é uma opção no meio cientifico, que transformar conteúdos em estudáveis e não estudáveis, consolidando, dentro da academia, temas a serem abordados e aqueles a serem esquecidos. Aqui, neste trabalho, é necessário mostrar que foi pouco estudada a Escola Especial Ulysses Pernambucano e objetivamos visitar seu passado e poder mostrar a comunidade científica e a todos, que ela existe, seus problemas, suas deficiências, suas belezas.

Muitos se detiveram em escrever uma história das instituições de “anormais” e alguns sobre a história das instituições de ensino especial e nessa escrita, discorreram com uma visão distante da escola, mostrando de forma geral como eram essas instituições, sem dar voz aos personagens que faziam parte desse mundo. A falta de registro ou mesmo a destruição desses arquivos, podem ser um dos motivos para tal defasagem. Essa pesquisa teve um acervo documental muito vasto, o que permitiu dar voz aquelas pessoas que de lá fizeram parte, em especial as Assistentes Sociais e as Professoras.

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Nosso objeto problema se respalda na teoria de Roger Chartier no que tange a relação com o mundo social presentes em textos do autor, como por exemplo “o mundo como representação” e em “defesa e ilustração da noção de representação”. Esta relação baseia-se nas “operações de classificação e hierarquização que produzem as configurações múltiplas mediante as quais se percebe e representa a realidade”1, e em “práticas e signos que visam fazer reconhecer uma identidade social, a exibir uma maneira própria de ser no mundo, a significar simbolicamente um status, uma categoria social, um poder”2 e também pelas

“formas institucionalizadas pelas quais uns ‘representantes’ (sujeitos singulares ou instancias coletivas) encarnam de maneira visível, ‘presentificam’ a coerência de uma comunidade, a força de uma identidade ou a permanência de uma poder”3. Desse modo, nos cabe analisar as

relações feitas com o mundo social através de caminhos que se completam e que têm como produto a cristalização da instituição no seio da sociedade recifense dos anos de 1950.

Para alcançar nossos objetivos, estruturamos o texto em quatro capítulos. O primeiro é a introdução do trabalho: delimitação objeto-problema, objetivos do trabalho e linha metodológica.

O segundo capitulo é onde se adentra o leitor nas primeiras iniciativas de uma educação especial para os “anormais” brasileiros, as políticas públicas para os alunos excepcionais, e as origens e as características gerais da EEUP. Especificamente, o segundo capitulo se desenvolve com os apontamentos acerca do início da educação especial no Brasil feitos por Tânia Müller, Gilberta Jannuzzi e Marcos Mazzota.

Depois passamos a discussão sobre o vanguardismo de Pernambuco, no trato com as crianças especiais, não todas, mas uma boa parte. A frente dessa mudança de postura em relação às crianças “loucas” do estado está Ulysses Pernambucano como o gérmen, com a sua ideia de criar uma escola que atendesse a esse público, nos idos de 1920 e Anita Paes Barreto, que foi diretora da primeira escola do estado para “anormais educáveis”, criada em 1941, sob o nome de Aires Gama.

Como a trajetória de Ulysses Pernambucano, a de Anita Paes Barreto se confunde com a história dos anos iniciais da educação especial no Recife, pois, desde sua inauguração, até

1Defesa e Ilustração da noção de representação. Palestra proferida no Colloque franco-allemand em 7 de maio

de 2010, realizado pelo Institut Historiqu eAllemandde Paris. Tradução de André Dioney Fonseca e Eduardo de Melo Salgueiro. Disponível em <http://www.ufrgs.br/gthistoriaculturalrs/nocaoderepresentacao.pdf>. Acesso em: 27 de agosto 2016.p. 20.

2 Op. Cit. 3 Op. Cit.

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mais de uma década depois ela cuidou da direção da escola. Recebeu muitos alunos e doou seus ensinamentos na tentativa de proporcionar àqueles alunos, uma vida menos sofrida.

Tanto a trajetória de Ulysses Pernambucano como a de Anita Paes Barreto, estão em literaturas publicadas, como nos livros de Paulo Rosas, de Herônides Coelho Filho e de Carlos Miranda, pesquisadores da psiquiatria e da psicologia no estado de Pernambuco. Esses livros se tornaram muito útil a esta pesquisa. Foram consultadas outras fontes, até então esquecidas em arquivos da escola, como em ofícios guardados em caixas empoeiradas nas prateleiras do arquivo morto da escola. Foi consultada a maioria dos arquivos e estes estão no anexo da pesquisa.

O terceiro capitulo discorre sobre a constituição das identidades formadas dentro da escola, aponta, através de exemplos de fichas de alunos, como eram as ideologias criadas dentro da escola e como era formada a cultura escolar dentro do espaço.

No terceiro capítulo está pautado na identificação das identidades formadas dentro da escola, ou seja, perceber, através de exemplos de fichas de alunos como eram as ideologias criadas dentro da escola e como era formada uma cultura escolar dentro do espaço. Primeiramente mostramos as Assistentes Sociais como um serviço pautado no acompanhamento das famílias que tinham, em seu interior, pessoas que sofriam de algum tipo de problema mental e eram alunos da Escola Especial Ulysses Pernambucano (antiga escola Aires Gama), tendo assim um papel de vigilância sobre as famílias dos alunos. Podemos perceber isso através das fichas encontradas no arquivo da escola e estas foram estudadas, lidas e transcritas, algumas das partes mais relevantes para esse trabalho foram colocadas no texto, as demais estão nos anexos.

Elegemos casos emblemáticos na escola, para demonstra como as Assistentes Sociais formavam sua identidade, ou seja, como fala Roger Chartier, como essas pessoas marcavam e marcam, de modo visível as instituições. A partir dos casos apresentados mostramos como se concretiza essa ação de cristalização de práticas do Serviço de Assistência Social da Escola Especial Ulysses Pernambucano e, a partir desse ponto, perceber como elas viam os alunos que lá estudavam. É isso que analisaremos nesse capitulo, como o discurso da Assistente Social impõe uma autoridade e acaba por justificar as suas práticas cotidianas, aplicadas aos alunos diuturnamente.

Por fim, o último capítulo, versa sobre a cultura institucional que se fazia dentro da instituição, como as visões diferentes geriam a escola e como elas eram aceitas dentro do ambiente escolar. Dessa forma, o último capitulo versa sobre esses signos produzidos dentro

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do ambiente escolar a partir da perspectiva das Assistentes Sociais e das Professoras. O mote da discussão continua sendo a teoria de Roger Chartier, que vê no discurso um local para montar estratégias, para assim impor uma autoridade a outrem, isso acaba por criar uma legitimação e/ou justificação para suas práticas. Partindo do mesmo ponto, apenas utilizando outro tipo de fonte, agora o livro de ata da escola, que embora possa não representar fielmente o que se passava na escola, era um indicativo daquilo que estava acontecendo no ambiente.

Retiramos elementos que nos dão embasamento para identificar essas mesmas representações dos alunos partindo do corpo docente, como as professoras viam o alunado, se tinham potencialidades, se não. Da análise, podemos perceber que havia, dentro da escola, na década de 1950, não concomitante, duas diretoras, Noêmia de Araújo Varela e Anita Paes Barreto, que ensejaram a construção do quarto capitulo, onde se trata agora dos signos produzidos por esses atores.

Por último, mas não menos importante, temos as considerações finais, que abraça todas as nossas conclusões e também as nossas dúvidas com relação ao que o trabalho deixou. Através das fontes respectivas para cada segmento (Assistentes Sociais e Professoras) e utilizando o conceito de Representação Social em Roger Chartier, analisamos os documentos levantados. Os tipos de fontes encontradas na escola foram muito grandes e diversificados, o que gerou um problema de escolha da fonte, mas sanado com a ajuda do orientador que esteve presente em todas as decisões do pesquisador. Nas transcrições das fontes, foram mantidas as linguagens originais, para conferir autenticidade. Analisamos vários documentos que estão no arquivo da escola, onde muitos estão desorganizados e em péssimo local de armazenamento e, ao final, uma cópia de todos serão anexados no fim trabalho para consultas futuras e apontamentos para novos trabalhos.

As fontes utilizadas neste trabalho estão contidas num Disco Digital de Vídeo (DVD), ao fim da dissertação, para qualquer consulta que venha a ocorrer no decorrer do trabalho. Essa ideia surge na economia de folhas e se estreita com a ideia de um planeta mais sustentável, onde se equilibram valores econômicos, sociais e ambientais, numa tentativa de transformar o mundo e evitar o desperdício de papel, tinta, energia e insumos agregados.

A consulta ao anexo será feita da seguinte forma: haverá uma pasta de arquivo, onde dentro dela estará contida outras três pastas, cada uma com o nome correspondente ao anexo que será “Anexo – A”, “Anexo – B” e “Anexo – C”, que corresponde, respectivamente, nas fontes do capítulo II, capitulo III e capitulo IV. Teremos, em cada subpasta outras subpastas

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com o número da citação. As imagens em formato de JPG e/ou arquivos no formato PDF e o arquivo estará nomeado da seguinte forma: C38p36OFICIO, onde “C” significa o número da citação no texto, “p” significa a página onde a citação está e, ao fim, o tipo de documento.

Quando um documento for usado para mais de uma citação, será colocado a citação inicial e a final, separadas por um traço, seguindo o mesmo estilo para as páginas. Por exemplo, C41-51p39-42OFICIO No caso de haver mais de uma imagem por documento, cada arquivo receberá uma numeração, ao fim, antecedido por um ponto. Por exemplo, C41-51p39-46OFICIO.2.

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2 APONTAMENTOS SOBRE A EDUCAÇÃO ESPECIAL

A Educação Especial no Brasil, hoje, é um tema amplamente estudado e abordado. Muito se fala de como integrar as crianças com algum tipo de “deficiência” ao meio escolar/social. Entretanto, essa discussão é muito recente, até os anos de 1950 as crianças eram vistas como anormais, sejam por que tinham algum tipo de deficiência motora, ou limitações causadas por má formação genética ou mesmo por não se encaixarem nos padrões de normalidade da época. Neste sentido, objetivamos neste capítulo localizar Pernambuco no cenário da escolarização especial no Brasil, destacando o pioneirismo de Ulisses Pernambuco e da escola especial criada sob sua inspiração.

2.1 A EDUCAÇÃO ESPECIAL NO BRASIL

Aponta-nos Gilberta Januzzi (1985) apud Tânia Müller (1998) que no período imperial havia apenas duas escolas para o público infantil “anormal” e que não desenvolviam de forma apropriada sua razão de ser: uma era o Hospital Juliano Moreira, datado de 1874, em Salvador, capital do estado da Bahia e a Escola México, de 1887, que se situava no Rio de Janeiro, capital. A primeira era uma escola especializada e a outra contava com o ensino regular.

Mas, dois autores, Machado (1978) e Arruda (1995), revelam que “o hospício inaugurado em 1874 [...] foi largado à própria sorte, o Asilo e seus ocupantes viveram a própria sorte”4. Não foi diferente com o que ocorreu com o primeiro hospício de Pernambuco,

o Hospício de Alienados. Embora sejam relevantes a criação dessas duas instituições, não se pode afirmar, segundo Tânia Müller, que houvesse, no Brasil da época, um atendimento médico-pedagógico para os infantis.

Só em 1913, com a criação do Pavilhão Bourneville no Hospital Nacional de Alienado, no Rio de Janeiro, foi que se deu início a relação, de fato entre psiquiatria e educação no Brasil. Segundo Magalhães (1913) apud Tânia Müller (1998), esse pavilhão foi o primeiro serviço organizado no Brasil para crianças anormais.

4 MÜLLER, Tânia Mara Pedroso. A primeira Escola especial para creanças anormaes no distrito federal: o

pavilhão Bourneville (1903-1920). Síntese da dissertação de mestrado apresentada a UERJ. Rio de Janeiro,

1998. Disponível em:

<http://www.abpee.net/homepageabpee04_06/artigos_em_pdf/revista6numero1pdf/r6_art05.pdf>. Acesso em: 28 de agosto de 2016.

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Vale lembrar que o Pavilhão Bourneville5 foi criado com o intuito de separar as

crianças internas dos adultos que lá estavam internados. Não havia uma preocupação pedagógica, mas sim de salvaguardar a moral dessas crianças. É bem sabido que Ulysses Pernambucano tentou criar, na década de 1920, uma escola especifica para anormais, sendo diferente da Bourneville, pois não se tratava de separar dos adultos, as crianças, mas sim criar uma escola que atendesse a todos os alunos do Recife e regiões próximas, que necessitassem de um atendimento especializado.

Após essa fase e com a crescente industrialização que o Brasil sofreu nos anos de 1930 com o aumento das fábricas, a necessidade da criação de mão-de-obra apta ao trabalho foi grande e, dessa forma, criaram-se ações governamentais que estimularam a criação de escolas para as crianças especiais junto aos hospitais psiquiátricos ou até mesmo escolas regulares, o que foi um avanço visto o que havia acontecido nos anos inicias do século XX.

Outro autor que estuda a história da educação especial no Brasil, Marcos Mazzotta, divide o seu estudo em duas fases: o primeiro período que vai de 1854 a 1956 onde se encontram iniciativas privadas e públicas não sistêmicas, ou seja, isoladas. O segundo momento (1957 – 1993) é marcado pelo uso das iniciativas oficiais do governo, com a criação de incentivos à educação especial de âmbito nacional.

É bem verdade que no período imperial foi fundado, também, o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos, também no Rio de Janeiro, em 1857. A ideia foi proposta pelo recém-chegado, Ernesto Hüet; francês e professor de direito do Instituto de Bourges. Ele chegou ao Rio de Janeiro em 1855 e conseguiu contato com o imperador que, muito simpático à sua ideia de criar um instituto para surdos-mudos, ordenou que fosse facilitada a tarefa de criar uma escola para esse público; o que foi feito em 1856, quando ocupou o prédio do Colégio Vassimon e criou o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos - que em 1957 muda seu nome para Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). Ainda na década de 70 do século XIX, segundo Mazzota6, havia duas instituições que se voltavam ao atendimento

médico-pedagógico como o Hospital Estadual de Salvador que depois vai se chamar Hospital Juliano.

5O nome “Bouneville” foi dado em homenagem ao médico francês Desiré MagloireBourneville (1840-1909), que ocupou toda a sua carreira em tratar e pesquisar as doenças mentais em crianças e conseguiu criar e regulamentar, nos fins do século XIX, classes especiais para crianças anormais nas escolas Francesas. Seu método consiste em partir de ensinamentos mais simples aos mais complexos. Começava-se pelo andar; depois a educação das mãos, da visão, do olfato, do paladar, da palavra, da higiene pessoal. O ensino primário ministrado aos menos comprometidos e aos adolescentes restava aprender o ensino profissionalizante. 6 MAZZOTTA, Marcos J.S. Educação Especial no Brasil: história e políticas públicas. 4.ed. São Paulo: Cortez,

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Havia, na primeira década do século XX, quarenta locais, um federal e trinta e nove estaduais (39), especializados em algum tipo de atendimento escolar especial a deficientes mentais e outros quatorze; sendo um federal, nove estaduais e quatro particulares, atendiam alunos especiais com outras deficiências. Havia ainda onze instituições especializadas que atendiam deficientes mentais (3) e outras deficiências (8). Segundo Mazzota, essas instituições estavam divididas entre os estados da federação.

Mas, no que tange a educação dos deficientes mentais, o autor nos fala sobre cinco instituições, que nessa primeira fase acolheram crianças com algum problema mental, são elas: Instituto Pestalozzi de Canoas; Sociedade Pestalozzi de Minas Gerais; Sociedade Pestalozzi do Estado do Rio de Janeiro; Sociedade Pestalozzi de São Paulo; Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE- Rio de Janeiro) e Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE de São Paulo).

No geral, o autor se refere a uma mesma instituição apenas diferenciando o local de atuação delas. No caso das instituições Pestalozzi, segundo o autor, todas têm incentivo do Governo Federal, Estadual e Municipal, embora sejam iniciativas privadas. A de Canos, no Rio Grande do Sul, foi a responsável pela introdução, no Brasil, da Ortopedagogia, em 1927.

A de Minas Gerais, só foi possível graças a Helena Antipoff que tinha uma visão diferenciada da educação especial, como já disse Gilberta Januzzi. Foi no estado onde foi criada uma Granja-Escola, nos arredores de Belo Horizonte, onde se estimulava atividades rurais, trabalhos artesanais e oficinas. Lá também se mantinha cursos para qualificação profissional para o atendimento ao público especial.

No Rio de Janeiro, a sua Pestalozzi foi a primeira a criar a orientação pré-profissional de jovens deficientes mentais e foi a responsável pela instalação das primeiras oficinas pedagógicas para o mesmo público. A de São Paulo foi fundada em 1952 aos moldes das do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Além dessas, tivemos o aparecimento das Associações de Pais e Mães dos Excepcionais (APAES) no Rio de Janeiro e em São Paulo, essa extrapola o limite temporal imposto pelo autor. A APAE do Rio de Janeiro Foi criada em 1954 com a ajuda do casal Norte–Americano Beatrice e George Bemis, membros da National Association for Retarded Children (NARC).

É bem sabido que essas classes, criadas pelas “Liga de Hygiene Mental e Saúde Pública”, seguiam o modelo adotado por Benedict-Augustin Morel, que nos fins do século XIX criou o conceito de Degenerescência. Os psiquiatras adeptos dessa visão dos distúrbios da mente acreditavam que agentes biológicos e genéticos influenciavam na doença mental e,

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pior, acreditavam que esse mal aumentava a cada geração provocando uma degeneração progressiva.

Esse mal não era uma doença individual, mas sim uma doença social. “A idéia de degeneração começou a estimular políticas sociais como esterilização, eutanásia e perseguição aos ‘degenerados’” 7. Através da “Liga Brasileira de Hygiene Mental” foram criadas as

chamadas classes especiais, que nada mais eram do que anexos das salas de aulas para alunos regulares. A primeira classe foi criada nos anos iniciais do século XX no Hospital do Juquery, em São Paulo.

É valido salientar que ainda na década de 1930 é cunhado o termo “educação emendativa” que, segundo Gilberta Januzzi (2004), vem do latim emendare que significa corrigir, tirar o defeito. Getúlio Vargas, afirma que o Ensino Emendativo deveria servir aqueles que fossem anormais de inteligência e, por eles, ficaria responsável o Instituto Nacional de Pedagogia e o Serviço de Assistência a Psicopatas. Já aos inaptos morais, deveriam prestar constas ao Ministério da Justiça. Nas palavras de Getúlio Vargas, retiradas do livro “Educação nas Mensagens Presidenciais” temos uma discrição do que seria, para o momento o ensino emendativo:

“ensino emendativo, de aplicação difícil e restrita, também vai receber ampliações, abrangendo os fisicamente anormais, os retardados de inteligência e os inadaptados morais. Destinados aos primeiros, já existem o Instituto Benjamin Constant e o Instituto Nacional de Surdos e Mudos. Em ambos se fizeram, no correr do ano passado, valiosos trabalhos de pesquisa pedagógica, cogitando-se, presentemente, de remodelar as suas instalações. Relativamente ao ensino dos anormais da inteligência, a ação do poder público se exercerá de acordo com as normas fixadas pelo Instituto Nacional de Pedagogia, em conexão com o Serviço de Assistência a Psicopatas. O ensino dos inadaptados morais está ainda a cargo do Ministério da Justiça e foi tratado no capítulo referente a esse departamento de Estado”.8

Além disso, é notória a criação acentuada de entidades filantrópicas especializadas em pessoas com deficiências o que propicia o surgimento de formas diferentes de atendimento a esse público: em clínicas, em institutos psicopedagógicos; centros de reabilitação. Essas iniciativas são percebidas com mais ênfase em 1941 quando da criação do Serviço Nacional de Doenças Mentais “sob a administração do doutor Adauto Botelho que iniciou um processo

7 ANDERSON, André Augusto et al. A origem da Liga Brasileira de Higiene Mental e seu contexto histórico.

Revista de Psiquiatria, Carta aos Editores. Rio Grande do Sul, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rprs/v31n1/v31n1a15.pdf>. Acesso em: 27 de agosto de 2016.

8 BRASIL. MEC - INEP. A Educação nas Mensagens presidenciais: período 1890 – 1986. Disponível em:

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de construção e ampliação de hospícios, fundando novos ambulatórios, incentivando e implementando novas técnicas terapêuticas” 9, o que ganha corpo e força em 1950.

Em 1954 Getúlio Vargas, concede aos cegos o direito ao voto, pois isso faz parte importante da recuperação social. Depois dessa vitória dos marginalizados sociais, apenas quase uma década após conseguir votar e ter uma relevância social é que a educação emendativa ganha novos contornos com a criação, em 1961, da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), onde se foca especificamente na educação do excepcional.

O Cap. III do Título X, diz claramente que: “A educação de excepcionais, deve, no que fôr possível, enquadrar-se no sistema geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade”10 e fomenta a criação de órgãos particulares quando diz que “tôda iniciativa

privada considerada eficiente pelos conselhos estaduais de educação, e relativa à educação de excepcionais, receberá dos poderes públicos tratamento especial mediante bôlsas de estudo, empréstimos e subvenções”.

Apenas no governo de João Goulart é que se propõe uma mudança no ensino emendativo tanto no ensino primário quanto no médio. Faz-se uma política de incentivos as escolas especiais designando 2 bilhões de cruzeiros com a finalidade de atender o maior número de jovens carentes especiais na educação. Entretanto, pondera Gilberta Jannuzzi (2012), que “tais promessas não se refletiram nos documentos pesquisados” 11.

2.2 - AS PRIMEIRAS “ESCOLAS”

Há uma mudança gradual na sociedade brasileira, como afirma Gilberta Jannuzzi, onde o latifúndio foi perdendo terrenos para as fábricas e há um crescente ritmo na industrialização brasileira que tem força já no fim da década de 1940, como nos aponta Jannuzzi apud Basbaum (1976). Em 1926, continua Jannuzzi, no Brasil as técnicas empregadas ainda eram a da enxada, facão de mato e foice e, embora, em 1927, caísse à exportação de café, continuávamos como grande exportar desse grão o que impulsionou mais

9 MIRANDA, Carlos Alberto Cunha. A utilização da convulsoterapia nos hospitais psiquiátricos nos anos 30, 40 e

50. In: AGUIAR, Sylvana Maria Brandão de. Gestão Pública: práticas e desafios. – Recife: Bagaço, 2009.

10 BRASIL, Congresso Nacional. Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Lei nº 4.024 de 20 de dezembro de 1961.

Fixa as Diretrizes e bases da Educação Nacional. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1960-1969/lei-4024-20-dezembro-1961-353722-publicacaooriginal-1-pl.html>. Acesso em: 28 de agosto de 2016.

11 JANNUZZI, Gilberta de Martinho. A educação do deficiente no Brasil: dos primórdios ao início do século XXI. –

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o setor industrial. Para se ter uma ideia do tamanho da expansão industrial brasileira, em 1910 havia 3.424 indústrias, com 159.600 operários, já na década seguinte, esses números pulam para 13.336 e 275.512 respectivamente, sendo muito desse crescimento financiado pelo capital estrangeiro.

É nesse cenário de crescimento industrial e das cidades ao redor das fábricas, que a educação geral no Brasil tem seus primeiros passos. De início, a educação estava ligada ao “Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos”, que foi substituído em 1891 pelo “Ministério da Justiça e Negócios”. Apenas em 1930, no governo provisório de Getúlio Vargas, cria-se o “Ministério dos Negócios e da Educação e Saúde Pública” que em 1937, já no Estado Novo, muda de nome para “Ministério da Educação e Saúde”.

Nesse momento o alfabetizador passou a ser visto como aquele que ajudaria o povo a votar, ou seja, tirá-los-ia da classe dos analfabetos e por causa de sua condição não tinham o direito ao sufrágio, tendo na escola um local de grande importância para a promoção de uma educação republicana. A educação passou a ser considerada o ingrediente fundamental para mudar o homem, a sociedade e o sonho republicano de educar a todos. A importância capital dos educadores voltou nessas Ligas Nacionais e em outros movimentos sociais como o Bloco Operário e Camponês (BOC) e na Aliança Liberal.

Segundo Januzzi (2000, p. 57), as condições do momento foram decisivas para que a educação seguisse o rumo da formação do homem para o trabalho, ou seja, para o rendimento social, isso para a educação dos considerados “normais”. Vale salientar que nos anos iniciais do século XX apenas 41 em cada mil habitantes eram escolarizados, esse número aumenta para 54 em 1932.

Quando observamos o número de espaços para a educação dos deficientes mentais notamos que foi pouca. Em Pernambuco, por exemplo, tínhamos, em 1920/1930, três instituições, onde apenas em 1941 se cria, no estado, uma escola pública para esse público, a escola “Aires Gama”, que funciona até hoje, sob outro nome, na cidade do Recife. No Rio de Janeiro, em São Paulo e em Minas gerais havia uma em cada estado. Já no Rio Grande do Sul, duas escolas.

Em 1934, diante de muita pressão popular (oposição a Vargas, movimentos operários e etc.), foi criada uma nova constituição que, pondera Januzzi,

“não tocou no problema da terra, mas incorporou algumas reivindicações operarias que estavam no contexto da sociedade [...] [mas] o excepcional não é citado nessa constituição de 1934, mas o artigo 149 afirma que a educação é direito de todos,

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que deve ser gratuita e obrigatória e que isto se estenderia progressivamente ao ensino ulterior, a fim de torná-lo mais acessível a todos.” 12

Isso não cria processos efetivos de incorporação dos excepcionais e poucas instituições são criadas para este fim. Como afirma a autora, o problemas com os excepcionais não chegava a ser um problema nacional e dessa forma não era digno de ser

resolvido. A educação emendativa vai se modificando também, mas de forma lenta, visto que

agora há, mais do que antes, a necessidade de três fundamentos importantes para o trabalho fabril: ler, escrever e contar. A escola vai se adentrando nos capilares sociais formando mão-de-obra qualificada.

Nesse momento a educação especial de cegos e surdos estava contida no Instituto Benjamim Constante (IBC) e no Instituto de Surdos-Mudos (ISM) que contavam com investimento do governo federal. O I.B.C ficou fechado por boa parte do período do estado novo para, segundo o Ministro Campanema, se tornar mais adequado à educação do público anormal. Entretanto, em 1943, abriu-se a imprensa Braille, primeira editora do gênero no país e se imprimiu a Revista Brasileira para Cegos, que teve força no segundo governo Vargas (1951 -1954), onde distribuiu 2.446 livros para as regiões Norte, Nordeste, Sudeste e Sul.

Diante das mudanças sentidas no cenário nacional, acerca da educação dos anormais, alguns estudiosos se destacam: Norberto Souza Pinto e Helena Antipoff, que têm posicionamentos completamente contrários. Segundo Januzzi, o primeiro “estava preocupado com os anormais de escola, os retardados, com a ortofrenia” 13 pois os anormais patológicos,

ou seja, aqueles que viviam em hospícios pertenciam aos campo médico-pedagógico que eram esses os “imbecis, idiotas do 1º e 3º graus; idiotas microcéfalos, hidrocéfalos, epiléticos”14

Ele elaborou o conceito de deficiência mental baseado em preceitos das regras escolares e seria nesse ambiente que se manifestariam as anormalidades. Embora seu discurso estivesse voltado para uma divisão apenas didática para facilitar na lida com os alunos, ele subdividiu os doentes mentais em três categorias: (I) os retardados de inteligência são aqueles que estão atrasados de dois a três anos no seu percurso de estudo, mas que sabem se comunicar escrita e oralmente; (II) os instáveis são aquelas crianças que em sala de aula são indisciplinados, que espalham pela sala a tagarelice, a truculência, a hipocrisia e a delação e,

12JANNUZZI, Gilberta de Martinho. A educação do deficiente no Brasil: dos primórdios ao início do século XXI. –

Campinas, SP: Autores Associados, 2012. p. 67

13Ibidem. p. 97 14Ibidem. p. 98

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por fim, (III) uma junção dos retardados de inteligência e com os instáveis e esses dois últimos necessitavam de classes especiais

Segundo Januzzi, o conceito de deficiência mental, nos escritos de Norberto Pinto, não é transparente, ele classifica, em determinado momento, os deficientes mentais como aqueles que apenas possuem esse tipo de deficiência. Norberto Pinto trabalhou de escolas anexas a sanatórios e sua opinião sobre os alunos desses locais são divergentes. Para a autora,

“Vão desde afirmações de que as crianças anormais eram seres ‘pobres de corpo e paupérrimas de espírito ... verdadeiros miseráveis, dignos de compaixão, vegetando sobre a terra; são crianças com o cérebro totalmente vazio, sem uma idéia, sem noção de coisa alguma; impedidos de serem úteis à pátria e à família” 15

Na outra ponta está Helena Antipoff que trazia em seus escritos um conceito de criança excepcional um pouco confuso, como afirma Gilberta Jannuzzi, não deixando claro a diferença entre “debeis”, “anormais” e “criança retardada”. Mesmo assim, foi muito valiosa suas críticas sobre as ações feitas no Brasil, sobre o assunto, em especial aquelas praticadas em Pernambuco.

No artigo “a função social da assistência às crianças excepcionais”16, originalmente

publicado na revista de Neurobiologia, número nove de dezembro de 1946, Helena Antipoff argumenta sobre a importância de Pernambuco no cenário nacional quanto das técnicas e métodos utilizados em Recife e que muitos deles foram adotados em Minas Gerais, entre outros pontos. Além disso, ela alega que a criação de classes especiais propicia uma melhora na educação das crianças comuns, pois retira da pedagogia “o peso morto” que são as crianças sem proveito escolar.

Além disso, inspirada em Alice Descoeudres do Instituto J. J. Rousseau, de Genebra, Antipoff critica o termo “anormal”. A autora afirma que, sendo professora autora de obras de psicologia e pedagogia, viu-se “moralmente” obrigada a mudar a terminologia, por muitos consideradas improprias e vexatória. Esse termo acentua o sentimento de inferioridade do aluno, chocando seus pais que geralmente estão bem sensíveis ao fato de seu filho ser menos dotados.

15Ibidem. p. 99

16 ANTIPOFF, Helena. A função social da assistência às crianças excepcionais. In: CAMPOS, Regina Helena de

Freitas. (Coordenadora).Helena Antipoff: textos escolhidos. 1. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo; Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2002. p. 247

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2.3 PERNAMBUCO COMO VANGUARDA

Pernambuco foi um estado vanguardista, não deixando a desejar ante Rio de Janeiro, Capital Federal à época, ou São Paulo, onde foram instalados Hospitais psiquiátricos de referências e que despertam o interesse de muitos historiadores ainda hoje. A frente deste processo de visibilidade nacional da Escola de Psiquiatria do Recife, podemos destacar dois nomes de suma importância: Ulysses Pernambucano e Anita Paes Barreto.

Podemos destacar em Ulysses Pernambucano a sua vontade em modificar o cenário dos manicômios de Pernambucano nos primeiros anos do século 20, trazendo para sua lida, aqui na capital pernambucana, a vivência e experiências que aprendeu em outros espaços e ambientes, o que possibilitou uma mudança, não tão significante assim, mas um avanço ante a situação de degradação que o atendimento manicomial no estado passava. Foi diretor do Hospital de Doenças Nervosas do Recife, teve grande influência na forma como lidar com os pacientes psiquiátricos e criou uma escola para crianças excepcionais.

Já Anita Paes Barreto, foi discípula de Ulysses Pernambucano e dedicou sua vida aos cuidados e ensino de crianças “anormais” além de ter uma vida política muito intensa. Criou diversas formas de reprodução de testes de medição de capacidade de alunos o que gerou um grande destaque para o estado em todo território nacional, o que traz consigo o vanguardismo de Pernambuco nesse aspecto.

2.3.1 O legado de Ulysses Pernambucano

É sabido que Ulysses Pernambucano ficou muito conhecido no circuito da psiquiatria no país, e, segundo Bruno Nascimento, sendo citado com grande euforia por seu primo, o Sociólogo Gilberto Freire como criador de uma “Escola considerada pelos mestres da universidade de Paris pioneira, inovadora, abridora de novo caminho e, como tal, contribuição do Brasil, em setor tão importante, de valor universal” 17. Foi elogiado também por José Lins

do Rego e colocado em uma posição impar por Jamesson Ferreira, quando diz que a escola por Ulysses criada foi a mais importante de medicina de Pernambuco.

Para que a Escola fundada por Ulysses fosse inovadora algumas características são apontadas por alguns estudiosos. A prática docente, carro-chefe da Escola era acompanhada

17NASCIMENTO, Bruno. A Escola de Psiquiatria do Recife: fundação e 1º sucessão – de Ulysses Pernambucano

a José Lucena. 2007. 262 f. Dissertação (Mestrado em Neuropsiquiatria) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Pernambuco. p. 123.

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de perto pelo rigor cientifico; como podemos observar na revisão de alguns testes, que eram aplicados no exterior, a realidade brasileira, feito, muitos deles, por Anita Paes Barreto, discípula de Ulysses, como veremos mais à frente. A abertura para outras formas de pensamento, agregando cosmovisões em um grupo eclético, onde eram abraçados educadores, antropólogos, médicos entre outros profissionais.

Embora se tentasse, com a criação da Escola de Psiquiatria do Recife (EPR), uma melhoria dos serviços de assistência aos psicopatas alguns estudiosos apontam que mesmo com toda a carga de inovações que Ulysses Pernambucano trouxe ao Recife, não houve mudança significativa na forma de tratamentos dos doentes no hospital psiquiátrico do Recife. Além disso, pode-se destacar a insípida “criação” (idealização) da escola para anormais, ainda nos anos de 1920, como foi relatado por Heronides Coelho Filho, na passagem abaixo.

“Estendendo as suas atividades de psiquiatra, psicohigiernista e educador, tentou a fundação de uma escola para Anormais (nome com que então se rotulavam os excepcionais mentais). Entretanto verificou logo não ser possível o seu funcionamento sem a previa realização de um acurado estudo das condições, qualidades e quantidades de excepcionais, pseudo-excepcionais e fronteiriços existentes na massa da população” 18

Pouco tempo depois, em 1925, ele cria; juntamente com um grupo de educadores, o Instituto de Psicologia, que tinha como objetivo padronizar e aplicar os testes psicológicos para o ingresso dos alunos ou na escola Normal ou nas escolas particulares. No período de criação do Instituto foram aplicados inúmeros testes de inteligência na Escola Normal – muito antes da criação da escola Aires Gama -, para atender os escolares que tivessem os Q.I’s muito baixo, baixo ou muito alto.

Foram aplicados testes de Northumberland, de vocabulário e de inteligência. Foi aplicado também o ilustrado de Ballard, de Goodenough. Foi padronizado, por Anita Paes Barreto, outro teste, o coletivo de inteligência; o de Puzzle de Mira; o de découpage. Entretanto “frente a estes testes psicológicos dificilmente uma criança poderia ser considerada ‘mentalmente sadia’”19.

18FILHO, Heronides Coelho. A psiquiatria no País do Açúcar. Joao Pessoa: Editora União, 1977. p. 121

19CUNHA MIRANDA, Carlos Alberto. Quando a Razão Começa a Julgar a Loucura: a institucionalização do

sistema manicomial em Pernambuco. Cadernos de história: oficina de história: escritos sobre saúde, doenças e sociedade. / [Departamento de história da UFPE]. – ano 1, n.1, (2003). Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2011. p.81

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Essa antiga aspiração de Ulysses Pernambucano, de criar uma escola para anormais, só vem se concretizar nos anos de 1940, com o ato número 137 de 27 de janeiro de 1941 que cria a Escola Aires Gama, externato primário para Anormais educáveis.

Ao lado de Ulysses Pernambucano, Anita Paes Barreto, ora chamada por uns de Ana ajudou a concretizar o sonho de Ulysses Pernambucano de criar uma escola para “anormais” (termo utilizado para designar, até meados do século XX as crianças com algum tipo de deficiência ou problemas na aprendizagem) educáveis, no começo da década de 1940.

Primeiramente, junto com Ulysses, Anita publica, em 1927 um texto de quarenta e três páginas, intitulado de “Estudo Psicotécnico de Alguns Testes de Aptidão” relatando os resultados de pesquisas realizadas pelo I.P, baseado em cinco provas de aptidão: “o Teste de Permutações de Claparède, o Teste de Memória das Quinze Palavras segundo Claparède, o Teste das Frases Absurdas, o Teste de Formação de Palavras com Letras Dadas e o Teste de Analogias”.20 É datado dos primeiros trinta anos do século XX a padronização por Ulysses e

Anita de testes coletivos de inteligência, como foi o caso do “Teste das 100 Questões de Ballard” aplicado em mais de 3000 mil alunos do Recife, de ambos os sexos e de várias classes sociais, publicado posteriormente em 1940.21

A revisão pernambucana mais importante foi a da Escala métrica de inteligência de Binet-Saimon-Terman. Este teste foi criado na França, em 1905, por Binet e Simon e posteriormente levada para os EUA até a Universidade de Stanford onde, depois de algumas revisões passou a se chamar Escala de Stanford-Binet.

Em Pernambuco a nova leitura dos testes foi feita a partir de uma revisão feita nos EUA, a primeira. A daqui, foi conseguida à custa de repetidas experiências das provas que constituem a escala de Termam – que revisou o teste pela primeira vez nos EUA. Foi feita a inserção de novas provas e as retiradas de outras, para se adaptar ao cenário pernambucano, como a nossa realidade geografia e cultural. Um exemplo foi a mudança da pergunta relativa ao “frio”, na idade de 4 anos substituindo-a por “fome”, como podemos ver no texto escrito por Mª de Fatima Alencar, sobre Anita Paes Barreto. Diz a autora:

“A padronização foi conseguida à custa de repetidas experiências das provas que constituem a escala de Terman, introduzindo-se novas provas e retirando-se outras que existiam, deslocando-se algumas de uma idade para outra conforme se mostraram fáceis ou difíceis para o nosso meio, que afinal permitiu atingir o nível máximo de 19 anos e 6 meses de idade mental. Além dessas modificações, foram feitas algumas adaptações à nossa realidade geográfica e social, entre as quais

20 DINIZ, Maria de Fátima de Alencar. Anita Paes Barreto. In: ROSAS, Paulo. Memória da Psicologia em

Pernambuco.1. ed. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2001. p. 89.

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realçamos a pergunta relativa ao frio, na idade de 4 anos, a qual foi substituída pela fome”.22

Todo esse trabalho de revisão permitiu que fosse organizada a Revisão Pernambucana da Escala Métrica de Inteligência de Binet-Simon-Terman, seus resultados foram publicados de forma parcelada entre os anos de 1933 a 1935, nos Arquivos da Assistência a Psicopatas de Pernambuco e nas Revistas de Neurobiologia nos anos de 1940. Além desse teste, muitos outros foram experimentados por Anita, como o Teste de Columbian e a Prova de Dearborn; e outros criados como um Teste de inteligência, fundamentado nas experiências do Instituto de Psicologia. Há vários questionamentos na literatura sobre a utilização desses testes, mas que aqui não nos interessa.

Estudou-se também, no I.P as chamadas “técnicas projetivas”, em especial o psicodiagnóstico de Roschach, sendo este detalhe omitido muitas vezes, por desconhecimento, da literatura sobre a psicologia no Brasil. Esse teste é considerado o mais profundo e completo instrumento de investigação psicológica. Consistia na interpretação, pelas crianças, de machas simétricas em lâminas de papel e foi criado em 1921 pelo Suíço Hermann Rochach. Podemos perceber no excerto abaixo, do texto de Mª de Fatima. Segue ela:

“ O Instituto de Psicologia voltou-se também para o campo das Técnicas Projetivas, com seus métodos de estudo da estrutura profunda da personalidade global, em seus componentes afetivos e cognitivos”.23

Em 1930 foi desenvolvida no Recife um serie de pranchas do teste de Rocharch, o que para José Lucena deveria ser denominada de “Serie Paralela Pernambucano – Paes Barreto, sendo a prova irrefutável do pioneirismo de Pernambuco, também na área das técnicas projetivas. Continua a autora:

“Por conseguinte, é inquestionável a existência, nos meados dos anos 30, desenvolvida no Recife, de uma serie paralela das pranchas do teste de Rocharch, e é justo, como escreveu o mestre José Lucena (1949), que seja denominada Série Paralela Pernambucano – Paes Barreto, prova irrefutável do pioneirismo de Pernambuco, também na área das Técnicas Projetivas”.24

Esse pioneirismo foi reconhecido por Helena Antipoff, no artigo publicado em 1946, “a função social da assistência às crianças excepcionais”. No artigo, a autora diz que Ulysses Pernambucano é um “homem extraordinário” e se sente honrada em falar para a fundação

22 Ibidem, p. 90. 23 Ibidem. p. 92 24 Ibidem. p. 93

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Ulysses Pernambucano, podendo ajudar nos próximos passos e nos projetos vindouros daquela instituição. Diz a autora:

“ Neste dia em que parentes, discípulos e admiradores de Ulysses Pernambucano se reúnem em torno do seu nome com a vontade firme de concluir a obra deste homem extraordinário, sinto-me honrada de poder também juntar a minha fraca voz para que a fundação Ulysses Pernambucano seja a realização póstuma de projetos do seu patrono”. 25

Faz alusão aos feitos ocorridos em Recife, quanto ao recolhimento de dados sobre as crianças; as revisões das escalas psicológicas; a padronização dos testes para o uso na escola; a criação da clínica psiquiátrica; o serviço de orientação profissionais. Muitos destes foram utilizados por Helena Antipoff em seus estudos, provando o vanguardismo de Ulysses e seus companheiros. Continua a autora:

“Bem antes de que Minas Gerais, com seu laboratório de psicologia da Escola de Aperfeiçoamento pedagógico, tivesse realizado as suas pesquisas, aqui no Recife fazia-se uma abundante colheita de dados sobre a criança, revisão de escalas psicológicas, estandardização de um sem número de testes mentais, para o uso quotidiano da escola, da clínica psiquiátrica, do serviço de orientação profissional. Várias formas adaptadas, traduzidas, escalonadas em Recife foram também por nós adotadas, como os Testes de Alfa, Ballard, etc”.26

Além da autora colocar o pioneirismo de Ulysses Pernambucano como referência para Minas Gerais, ela concorda com Gilberto Freire no que tange do pioneirismo ante todo o Brasil, afirmando que Ulysses Pernambucano, quinze anos antes, fez muita coisa em Recife que só o Rio de Janeiro estava fazendo agora pelo Brasil. Afirma a autora:

“Tem razão Gilberto Freire afirmando que os trabalhos de Ulysses Pernambucano e dos seus colaboradores colocam Pernambuco em situação de pioneirismo no Brasil em iniciativas e organizações esta ordem, pelo fato de se ter feito no Recife, há quinze anos, muita coisa que só agora o Rio está tentando fazer para o Brasil inteiro...”.27

Ou seja, o pensamento de Pernambucano era vanguardista, mesmo diante dos exageros da política, onde ela diz que houve momentos de um “silencio imposto pela força maior e durante mais de 5 anos”28, sendo uma clara referência a prisão de Pernambucano. Esse caso

25ANTIPOFF, Helena. A função social da assistência às crianças excepcionais. In: CAMPOS, Regina Helena de

Freitas. (Coordenadora).Helena Atipoff: textos escolhidos. 1. ed. São Paulo: Casa do Psicólogo; Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2002. p. 247.

26Ibidem. p. 247 27Ibidem. 28Ibidem.

Referências

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