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O trabalho esteve, todo tempo, pautado na visibilidade da Escola Especial Ulisses Pernambucano, em especial como agiam as Professoras e as Assistentes Sociais com a lida cotidiana com alunos e familiares.

A inquietação maior que motivou esta pesquisa foi a cultura escolar praticada na EEUP e a problemática que poderia envolver uma escola agregada a um hospital psiquiátrico. Inquietações que se desdobraram em questões como: a relação entre as práticas características do referido hospital e a vida escolar, a existência de uma identificação comum a caracterizar a cultura escolar da EEUP no período, as visões diferentes de educando e escola e seus impactos nas práticas educacionais.

Assim, o objetivo maior do trabalho foi investigar as práticas e a as representações que definiam a cultura escolar da EEUP no período proposto. Especificamente, visando satisfazer nosso leque de questões e o objetivo maior proposto, intentamos, primeiramente, localizar a educação especial em Recife no contexto da história da educação especial do Brasil; para depois investigar as práticas relacionadas ao alunado em referência à sua condição “especial” e identificar quais os principais atores envolvidos; e, por fim, buscamos identificar e analisar a dinâmica da escola em relação às possíveis representações de educação especial que permeavam seus educadores e orientavam suas práticas.

Após o capítulo introdutório, onde se destacou o conceito de representação social em Chartier, apresentamos no Capítulo II a proeminência de Pernambuco no que tange a educação especial à época. Escorados em autores como Tânia Müller, Gilberta Jannuzzi e Marcos Mazzota, vimos que experiências de educação especial no Brasil vêm sendo implantadas desde o Séc XIX. Destacando a consolidação do termo “anormal” no trato com as crianças especiais. Vimos também que a criação da Escola Aires Gama, em 1941, sob influência de Ulisses Pernambucano, se constitui como um marco da educação especial no Brasil. Escola que teve Anita Paes Barreto como sua primeira diretora e que receberá o nome de seu iminente idealizador, chamando-se Escola Especial Ulisses Pernambucano.

No Capítulo III, desdobramos a noção de representação em Chartier como balizamento teórico para a investigação acerca da caracterização da cultura escolar própria da EEUP. Sinalamos duas identidades funcionais cujas práticas constituíam o traço cultural da instituição: Assistentes Sociais e Professoras. Designadamente, identificamos as práticas da Assistente Social da escola que eram também características do hospital psiquiátrico. Salientando que, no âmbito da EEUP, não havia uma identificação comum a integrar as

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práticas da AS com as professoras. Demonstrou-se que, antes de desempenharem uma função em sintonia com uma alguma proposta pedagógica, as Assistentes Sociais tinham seus serviços pautados pela idéia de acompanhamento das famílias, procurando exercer sobre estas a vigilância acerca de hábitos e comportamentos que agravassem ou afligissem a suposta fragilidade mental do aluno. Assim, no contexto da cultura daquela instituição, a identidade formada pela AS, em decorrência de sua prática, sugeria antes a de uma auxiliar de um processo sócio-profilático em relação à condição especial do aluno do que de uma coparticipe de um processo educacional.

A partir dos casos apresentados mostramos como se concretizou a identidade exclusivamente assistencialista do Serviço de Assistência Social da Escola Especial Ulysses Pernambucano. Em suma, apesar de fazer parte do corpo funcional da E.E.U.P a assistência social não era integrada à realidade pedagógica da escola. A assistência social e a educação aos “anormais” não constituíam uma mesma representação a permear e identificar a prática dos sujeitos que atuavam no espaço da EEUP

No Capítulo IV, demonstrou-se que, mesmo no que se refere às funções docentes, não havia uma identidade comungada entre os atores que ensejasse um ideário pedagógico coeso. Para tanto, acionamos, à guisa de norte metodológico, as contribuições do conceito de luta simbólica produzido por Chartier, entendendo que os conflitos simbólicos são disputas de representações que podem ensejar as disputas pelos espaços de poder no seio de uma instituição. Entende-se que tais lutas são também a expressão da tensão entre as ideologias que permeiam os sujeitos.

Assim, no período estudado, 1952 a 1957, demonstrou-se que havia uma disputa quanto ao método de trabalho e quanto à natureza pedagógica da escola. Registrou-se a tensão entre duas visões de como se deveria ser balizada a educação da criança especial, personificada nas práticas empreendidas por Anita Barreto e Noêmia Varela, que correspondia, respectivamente, a uma representação médico-pedagógica da educação especial em confronto com uma representação lúdico-pedagógica, que tentava aproximar a educação especial da arte-educação.

Diante do espectro de tal disputa, se conclui que não se tinha como consolidado e estável um ideário pedagógico para escola, fato que corrobora para a não integração do Serviço de Assistência Social à lógica de um projeto consciente de suas intenções e finalidades. A percepção da tensão entre as concepções que circulavam na escola possibilitou uma melhor compreensão do impacto delas nas práticas educacionais, tendo sido

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demonstrado, segundo as fontes, as ações mais ortodoxas de controle e coerção impetradas quando do retorno da primeira diretora, Anita Barreto, quando os alunos com maior dificuldade de aprendizado e condição cognitiva mais especial são considerados como inaptos a pertencerem ao rol de alunos da escola que, por definição, estava volta para este público.

Diante do exposto, e respondendo às nossas inquietações, concluímos que cultura escolar praticada na EEUP, no período delimitado, não apresentava uma identidade definida em termos de uma natureza especificamente pedagógica. A despeito das inciativas empreendidas no período da gestão de Noêmia Varela, se conservava a representação da educação especial enquanto práticas de natureza médico-pedagógica, de clara herança em Ulisses Pernambucano. A prática assistencialista e profilática da AS, o curso emergencial para a formação de educadores de Crianças Excepcionais e o abando das práticas mais inclusivas impetrado com o retorno de Anita Barreto, nos levam a concluir que a representação da educação especial enquanto práticas de natureza médico-pedagógica, cunhada desde os tempos iniciais da escola, se conservou enquanto uma representação recorrente entre muitos de seus atores.

Por fim, destacamos que a dificuldade com as fontes foi uma barreira a se transpor, pois, por se tratar de fontes nunca antes trabalhadas, vistas ou quiçá analisadas, ficou muito difícil para o pesquisador desenvolver uma forma de analisar as fontes em apenas dois anos, o que pode ser mais trabalhada em pesquisas futuras.

A pesquisa despertou outros objetos de investigação, por exemplo, a relação entre educação especial e gênero, Posto que o segmento docente era compostos completamente por mulheres. Enfim, chegamos até aqui com um trabalho ainda com muitas pontas soltas, mas certamente estamos dando visibilidade a uma parte importante da história da educação em Pernambuco.

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