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Revista de Guimarães
Publicação da Sociedade Martins Sarmento
A
PONTAMENTOS FOLCLÓRICOS FAMALICENSES.
BRANDÃO, Abílio de MagalhãesAno: 1889 | Número: 6
Como citar este documento:
BRANDÃO, Abílio de Magalhães, Apontamentos folclóricos famalicenses. Revista de
FAMALICENSES
COSTUMES FAMALICENSES
I
As ln aias
No dia 1.0 de maio é costume antiquissimo pendurar às portas e janelas ramos de giesta e maias.
Ainda ha poucos anos, os carros de bois e diligencias, que faziam a carreira de Famalicão para Guimarães, appare-
ciam, neste dia, lindamente enfeitados de giestas e flores. Vão
cahindo em desuso estes costumes-vestígios de mythos pri-
mitivos-e as giestas substituiram-se, modernisaram-se pelos ramos de flores e coroas entretecidas de rosas, que, actual-
mente, temos visto, em algumas casas, pendentes das varan-
das.
Uma nessa gel inforrnadora, deste concelho, explicou-nos consoante vamos contar, esta poetica
Versão das maias 1
Houve antigamente um rei chamado Herodes que ao saber
que tinha nascido, em Bolem, um menino, a que o povo, por toda a parte, chamava o rei dos Judeus, tão furioso ficou que ordenou ir mediatamente aos seus soldados que degolassern todas as creanças ITJBIIOFBS de dons HUIIOS, que encontrassem em Belem.
Herodes presumia que o rei dos Judeus não escaparia d"es- ta carnificina, - t a l era o adio de morte que votava ao meni-
no-que os prophetas tinham vaticinado rei de Israel. Ao
anoitecer do dia 30 de abril, cercaram os judeus os muros de Belem, mas esperaram pela madrugada do dia
1.°
de maio para começarem a dar cumprimentoas
ordens do malvado rei.Apesar de todas as providencias e cautelas ainda receiavarn
os judeus que lhes escapasse o menino e por isso se informa-
ram logo da sua morada-que tinha
a
porta um ramo de maias 2)como sinal -mas, ao romper do sol do
1.°
demaio, todas as casas appareceram milagrosamente com os
mesmos ramos á porta.
Os judeus ficaram tão furiosos que entraram logo em to- das as casas e degolaram todos os meninos, como tinha orde- nado Herodes, e sO escapou o que procuravam, porque seus
1 No districto de Villa Real, costumam as creanças -no
l.°
demaio--enfeitar-se de flôres--priuelpalmente lyrios_e, em pro- cissão, cantam estes versos :
O meu maio moço Chama-se João, Anda na campanha Lindo capitão. Elle a i vai, Elle a i vem Pelas portas de Saltarem.
O meu maio é de lyrios E o vosso de assobios. Elle ahi vai,
Elle ahi vem, etc., etc.
2
poetisada pelo povo 11'esta lenda, temol-a ouvido diversas vezes com
pequenas vacantes,
-
mas geralmente diz-se que o ramo era de gies- tas brancas e 113.0 de mazas.paes, José e Maria, tinham fugido com ele, ainda de noite, para O Egypto. Um judeu, que viu passar a mãe do menino, a cavalo numa jumentinha, ainda lhe perguntou o que leva- va nos braços, envolto no manto com que se cobria, ao que e l a respondeu: «Levo meu ilho!››, mas o judeu retorquiu :
«Se 0 levasses não 0 dirias ››. E deste modo, e pelo milagre das maias, salvou-se milagrosamente o rei dos Judeus.
*
As maias põem-se ás por tas-no
1.°
de maio-para nãoentrar em casa o maio, mas uma nossa perspicaz informadora diz-nos que: ‹‹ muita gente diz o contrario, e é, corno se deve dizer-porque o maio é o Senhor››.
I I
Os farricoeos
Os ar-ricooos ou farricuncos, a que tombem temos ouvi- do chamar cacos--eram humildes penitentes, vestidos de es- curas tunicas de capuz, que os cobria completamente da cabe- ça até aos pés descalços.
Estas tunicas-perfeitos dominou carnavalescos--eram apertadas á cinta por uma corda, cujas pontas ficavam pen- dentes até ao joelho. Os capazes apenas tinham dois buracos na direcção dos olhos, de modo que estes penitentes eram
verdadeiros mascaras que acompanhavam--ainda ha bem
poucos annosl- -as procissões de penitencia.
Era do estylo pegarem os farríco*cos aos andores e ir um, á. frente, a tocar trombeta l
Este costume cahiu radicalmente em desuso.
III
A festa do cuco
No dia 22 de maço fazia-se, antigamente, nesta vila uma
festa chamada do Cuco. '
Cerca das duas horas da tarde appatecía nas ruas um ban-
do: dois homens tocando, um bombo e outro caixa, e, de es-
s. exe? O general Cuco: deitem cortinas e luminarias, e quem o não cozer será. castigado com as penas da lei 1. ››
Ás 4 da tarde entrou 11a vila 0 general Guco, acompa-
nhado de numerosa comitiva, crganisada da forma seguinte : A frente um postilhão dando estalidos com o chicote; seguia- se uma guarda de honra cavalgando em jurnentos ordinarios ; atroz o Pae
zé,
vestido de preto e de carapuça vermelha, em-punhando uma canoa de pesca que tinha no
ao,
em legar deanzol, biscoutes que lançava á garotada, mas, quando os ra- pazes corriam a apanhai-os, fugia-lhes com o isco e os garotos
caiam em cambalhotas... A garotada dançava e cantava :
Oh Zé-rin-gan-gué,
Viva o Pae Zo-Zé !
Todo o s'pretinho, Que anda no mato,
Cabeça de fora
Parece um macaco.
Seguia-se uma carruagem com uns velhotes: o general Cuco e a Coca, extravagantemente enfeitados com chifres de bois na cabeça; noutras carruagens vinha o cortejo do Coco- mOr e DO couce viam-se as bagagens em carros e jumentos. Constavam as cargas de tachos velhos, pratos, bacias, etc. etc. Parou este cortejo na Praça da Moita e o general Cuco
soltou pardaes e disse: « a i vai um cuco visitar o cuco da freguezia d e . . . » -ahi vai outro para a freguezia de.
.
._-
e, por ultimo, um da comitiva soltou um cuco e observouque onde e l e se pousasse era o maior cuco da vila. 0 pas- saro levantou um pequeno vão e foi c a i r na cabeça do que
o soltou, o que fez rir a bandeiras despregadas.
*
Omiuímos o costume, que ha em muitas das nossas fre-
1 O Almanack de Lembranças, para 1857, pag. 146, descreve
esta festa. do cuco, dum modo laconismo, mas parece-nos mais original
e completa a que inserimos-que nos foi versada por uma testemu- nha ocular, que presenciou este original costume, pela ultima vez, ha uns 30 anhos.
Desconhecemos a data da origem desta festa.
As Trad. pop. de Port., do s r . J. Leite de Vasconcellos, a pag.
guezias de corwer O galo, pela occasião do Entrudo, porque vem descrito a pag. 149 das Trad. pop. de Porá.
IV
Fogueiras 1
No dia de Natal é ainda costume vulgar nas nossas al-
deias fazer grandes fogueiras nos lares, com um grande cepo; em redor abarca, depois da consoada 27 toda a fami‹
lia em conversa animada ou jogando os pinhões.
Nas festas de S. João, S. Pedro e Santo Antonio é tombem costume vulgar fazer fogueiras pelos largos e pelas ruas.
No dia de Todos os Santos usam-se muito as fogueiras para assar castanhas. A estas fogueiras chamam magustes.
FOLK-LORE
Superstições
Compulsarmos cuidadosamente as 316 paginas das Tradi-
ções populares de Portugal, do nosso velho amigo J. Leite de
Vasconcellos, que nos obrigaram a riscar um grande numero de superstições do concelho de Villa Nova de Famalicão, pelas trazer já publicadas, mas as que apontamos temo-as na conta
de ineditas, a não ser uma 0u outra variante, de alguma já inl- pressa, que ofereça novidade. Tombem as não vimos exara-
1 Vid. Trad. pop. de Porá., pag, 39.
2
cf.
Revista de Etimologia e Glottologia : (( Materiaes para o es-tudo das festas, crenças e costumes populares )) (fase. I), pelo snr. F.
Adolpho Coelho, vid. Revista Lusitana, archivo de estudos philologi- cos e etlmologíeos relativos a Portugal,
n.°
2, 1887, pag. 117 : Elyma-logias Portáuguezas. I. Consoada, pela snr." D. Carolina Michaelis de Vasconcellos, e vid. Archivo Pitoresco, vol. 3.0, pag. 344: Consoada.
das nas Revistas de Etimologia e Glottologia, Revista do Minho,
para o estudo das trad. pop., de Barcellos, Revista Lusitana, archivo dos estudos philologicos e ethnologicos relativos a Portugal, etc., etc., e por isso damos ao leitor, estes Aponta-
mentos foilclorioos, como novidade.
ALMAS PENADAS I
O sonego do Godinho
No lograr do Godinho, freguezía de S. Thiago da Cruz, concelho de Villa Nova de Famalicão, ha uma casa, de mo-
desto aspecto, onde residiu e faleceu 0 cocego do God*1:«nh.o. Depois do seu passamento começaram de aparecer coisas
ruins em casa do finado e a alma do conego por
la
tem em-pecido ás vezes--porque não pode entrar no céu nem no
inferno 1 sem que os seus parentes ou amigos lhe mandem
dizer missas peta alma ou restituam os roubos de grãos de milho que o conego fazia aos seus caseiros 2. Quando os ren-
deiros lhe traziam as rendas, principiava e l e a passear no
sobrado com muita força, e, com os estremecimentos que
dava ao entaboamento, abalava a raza
*,
no acto em que oscaseiros estavam a medir, e assim levava a medida mais
grão.
N'outros tempos, era difiicil aparecer caseiro para os bens do Godinho, afirma a nossa informadora, não sÓ por a alma do conego empecilhar por 18 de noite, mas, ainda mais,
porque por melhor que se fechassem as portas das cortes do gado, encontravam-se de manhã abertas e o gado solto
*.
N'estas superstições, tão vulgares, nunca se ouviu aludir ao
cr.
Tradições populares de Portugal, §. 374 : «Almas pena-1
Purgatorio
"I
2
das››.
3 Antiga medida de sêccos (172113).
II
muito vulgar. Vid. Revista de Guimarães, vol. nr,
n.°
portadas ››, pelo nosso conterraneo D. Leite de Castro.Esta superstição de se abrirem as portas e soltar-se O gado é
II
Arnnajonas
Na freguezía de S. Thiago da Cruz, o povo crê que empe- cem almas põe-nadas, em forma de armajonas ou almajonas : mulheres muito altas e muito magras. Estas sombras só appa-
recem na Ponte de Correllos e na Peça do rio. 0 nosso amigo J. Leite de Vasconcellos escreveu nas suas Trai. pop. de Porá., a pag. 278: ‹‹Almazonas, tombem se chamam almajonas,
mulheres muito altas e gordas, deitam os filhos para traz das costas e assim alimentam os alhos às costas (Maia, Minho, Beira-Alta)››, e notou, a pag. 279, que « a lenda das Amazo-
nas sofre uma variante notavel em Gondifellos (c. de Famali- cão)››. Como se vê, pela arraigado crença que ha, neste po- voado de S. Thiago da Cruz, nas almajonas, esta superstição sofre aqui tombem uma notavel variante.
La
Quem se agarrar com devoção às grades do Senhor do
Cabido, da capela do hospital da Lapa, casa cedo--porque
estas grades são casarnenteiras.
2_a
Quem quer saber o anuo em que casa, vai ao Penedo dos
casa-mentos, no dia da romaria de S. Vicente (22 de janeiro),
que se reaisa na freguezia de Sesures, e, na volta da roma- ria, atira com uma ou mais pedras acima do penedo casamen-
teiro, que se encontra no caminho; consoante a primeira, se-
gunda, etc., cae ou não em cima do cabeço do penedo, as- sim casa ou não nesse anuo, no seguinte, etc. 1
1 As Tradições populares de Portugal, pag. 90, citam o Penedo
dos casamentos de ao pé da Povoa de Lanhoso, o de Prazias, ao pé de
l1D1&. va- riante (Testes oraoulos casamenteiros. Estas tradições sao um pouco diferentes da que citamos: no penedo de Sesures ha de
arcar
a pedra no cimo, e I1'est.es basta acertar-lhes. Dizem-nos que, entre o caminhoda Senhora da Abbadia e S. Bento da por ta aberta, ha um Penedo dos casamentos, onde as moças solteiras atiram pedras para saberem se dar›se-hão hem quando casar. Ficando a pedra no cume do penedo se- rão felizes, cahindo abaixo serão desgraçadas.
3_a
A agua que nasce no lograr de Ferreiros, freguezia de Fra-
dellos, secca tudo que regar e nem o gado com sede é ca- paz de a beber.
4.3
Se chover DO dia da feira anual das Cruzes, que se effe- ctua em Barcellos a 8 de maio, ha sol na feira grande de
Famalicão (8 de maio); superstição que, ainda este anão, o
tempo desmentiu, mas que o povo continua a coinpendiar assim : Sol (ou chuva) nas Cruzes,
Chuva (ou sol) na Feira. 5. a
0 bafo do boi é abençoado porque bafejou o Menino Jesus no presepio, e o da mula é amaldiçoado porque soprava ao
Menino e lhe comeu as palhas em que estava deitado. Esta
superstição ahrevia-a o povo nesta phrase :
Abençoado o boi que o aguentava Maldiçoada mula que arrebentava 1.
6_a
Quando a Virgem fugia para o Egypto com o Menino Je- sus, até as silvas se desviavam para lhes dar passagem e a Virgem, ern reconhecimento, benzeu~as assim :
Tão abençoadas sereis Que até na ponta pegareis.
7.a
À jumento, em que a Virgem ia montada quando fugia
I Varia ii Trad. pop. de Porá., pag. 178.
para O Egypto, levava as ferraduras pregadas às avessas, para
desorientar os Judeus, que a perseguiam, e ao passar por um tremoçal e por um pinheiral começaram os tremoços e os pi- nhões a fazer tal
.
astro selada sic J'il
ue a Vir em os amaldi Oo Ç assim :Quem vos houver de comer Nunca se ha de fartecerl 1
8_a
0uando os galos cantam antes da hora (meia noite), é si-
gnak de morte em casa, e para obstar à morte, corta-se-lhe logo um bocado da crista e diz-se tres vezes :
Morte por morte,
Por ti venha a sorte.
9.8
Conhece-se se uma mulher gravida alcançou rapaz ou ra- pariga, conforme e l a deitar primeiro o pé direito ou o esquer-
do, quando se levantar, e tombem se conhece atirando ao
lume com uma espinha de sardinha, que se encarrapitar (sic)
é rapaz que nasce; não encarrapitando é rapariga 2_ i0_9
As creanças que [l3.SC81l8II1 com as mãos abertas, muito
abertas, hão de ser Iiberaes.
11. a
As creanças são direitas ou esquerdas, isto é, ageitam-se
1 Variante ii Trad. pop. de Porá., pag. 105.
2 Varias in Trad. pop. de Port.`, §§. 335, 277, 201 e 96.
.
..
y a encere un autre signo pour savoir si c'est un garça : il faut prendre garde si la femme remue toujours le pied droit le pre- mier.(Los admirables secrets d'Albert le Grano, pag. 50. A Lyon. M.DCC.LXV1II.
melhor com a mão esquerda ou direita, consoante mamarem a
primeira vez no peito esquerdo ou direito das mães ou das amas.
12.==
As creanças que morrem sem baptismo devem-se (e é cos-
tume) enterrar debaixo da lareira.
133¡
Não se deve chamar macacos às creanças, como geralmen- te se diz de gracejo, porque as creanças crescem pouco.
14.:*
Aquelle arquem faltar palavras de baptismo é atreito a empe-
cer-lhe coisas mas, que aparecem muito nas encruzilhadas dos caminhos; mas a quem tiver cabelos no
uma especte de cruz, não lhe empecem as Maes cousas ruins; e quando apparecem deita-se a fralda da camisa de fora, que tudo desapparece.
peito, que formem
Í5."
Não se deve estar no limiar das portas á hora aberta (Trindades), porque pôde vir um ar de encrabii/zac* (sic), isto é, arcar paralymico.
16. a
Quando nascem tarde os dentes às creanças, é signal de que a mãe é pouco filhareira, o que O ditado corrobora :
Quem tarde indenteae (tem dentes) Tarde irmandece (tem irmãos) 1
Quem tarde adenta
Tarde aparenta.
1 Variante in Trad. pap. de Porá., pag. 200.
ou :
17.&
Não se deve embalar O berço às creanças quando elas
não estão n'elle«-porque lhes faz muitas dores. «A mulher
que tem um ilho pequeno não oonseute que lhe baloicem 0 berço vazio, pois isso o tornaria bravo ››. (Minho-Alrnanack
de Lembrancas, para 1856).
18. a
As creanças que antes de principiarem a faltar, beijarem
ou chegarem os labios aos espelhos ficam mudas. 19.&
Quando cae a imbida (sic), cordão umbilical, deve quei- mar-se logo, porque se os ratos a corneiem, dará em ladra a crença 1.
20.fl
Não se deve dar a comer às criadas focinho de porco, porque quebram a louça.
2l.*
Quem comer coração de porco oca todo o dia atacado de
melancolia.
22.=*
Quem passar descalço por cima de espolinhadowro de burro, ganha DOS pés 7 couros (bolhas na pele) e para se
obstar a esta doença deve-se cuspir tres vezes DO espolinha-
douro e fazer-lhe uma cruz.
.1 ln Trad. pop. de Port, diz-se: ‹‹Nã0.é__1)0IIl os gatos levar a
embzgu, porque a oreança ficara ladra» (Famahcao)-mas temos ouvi-
23."
Quando os porcos estão doentes e não comem (isto, às ve_
zes, é caramelo), passa-se-lhe, em cruz, por cima, umas cal-
ças de homem, apenas acabar de as despir. 24.'**
Quando os cães uivam muito é signal de que morre al- guem da casa, pelo menos é sempre mau signal.
25.**
Quando algum animal se damna enchem-se 10 enfusas de
agua; 9 deitam-se fera e a 10 lança-se na cabeça do animal,
para não estar a penar, que morre logo.
26_a
Quem trouxer ao pescoço um cordão douro não ganha
bexigas na garganta.
27
0uem nascer DH.
mola). manhã de S. João não tem bexigas (va- 28.9
Os gatos que treparem pelo me de junho são os melhores caçadores de ratos, superstição que o povo diz assim :
Os gatos que trepam pelo S. João Dão bons caçadores e melhores são.
29.=
Não se deve matar os sapos com paus nem com pedras, porque pode saltar peçonha, e por isso é costume poleal-os
,
30.8
Quando se vir um sapo-que pôde trazer feitiçaria-cos- ae-se tres vezes DO chão e diz-se :
Se és de ferro, Eu sou o`aço,
Se és demoro (ou feitiço) Eu te imbaço 1.
3¶_a
Um dos modos de fazer feitios com os sapos é coser-lhes 1 hocca com retroz vermelho, e deita-os fora; assim como o sapo for seccando, por não poder comer, assim a pessoa, em .Menção de quem for feita a feitiçaria, vai tombem seccando até morrer.
32. a
Quem se deitar em cima da reza de comer vem a ter a
ioença da gosta.
33.fl
Quem beber na adega pela infuso está atreito a dar-lhe
a gota.
34_a
Não se devem lavar duas pessoas na mesma agua, que se
zangarn.
1 ‹‹ Para se fazer fugir uma bruxa que se encontre, cruzam-se as pernas e diz-se (Minho-Alman. de Lembr., 1870, pag. MO) :
Tu és ferro,
E eu sou aço., Tu és 0 diabo E eu me imbaço. ››
35
As amas e as mães não devem beber com as creanças ao colo, que lhes
da
a gosta.sô
Quando alguem está a comer e lhe cae ao chão algum bocado-alguem lhe quer faltar e não pode.
37.a
Quem servir palitos com a mão direita não casa. 38
O primeiro dos noivos que se deitar no dia do casamento, é o que morre Primeiro, e o mesmo succede ao que apagar a
luz primeiro.
39_a
«Quando uma das DOSS3.S orelhas está vermelha, estão a
faltar de nós: em bem se a orelha é a direita, em mal se é a
esquerda (Douro, etc.)» Trai. pop. de Porá., pag. 253; e è mulher se a orelha está a arder, muito vermelha, na parte
de baixo (lufo), e em cima (pavilhão) é homem--e trinca-se
a rogtuzeira (peito da camisa) que o rnaldizente trinca a liugua. 408
Cahindo azeite no chão é desgosto certo na casa. 41.a
A maçá camoés tem muita virtude e por isso não se deve comer, que não é bom, e guarda-se para remedias :
A maçá canoas Não a comas, nem dês :
Foi só para teu bem
42. a
Quando as laranjeiras não dão fructo, é costume dar-lhes wrgaszada, na manhã de S. João, antes de nascer o sol, com uma vara de marmeleiro, e no anuo seguinte dão fructo.
43.=
Quando a parturiente está para dar á luz, põe-se~lhe á ca- beceira da cama uma meada e outra á cabeceira do berço do
nascituro, que é muito bom.
44.-
Deve-se ter uma lamparina de azeite no quarto da partu-
ríente, e não se deve apagar enquanto o Custodio (assim se
chamam as creanças antes do baptismo) não entrar na igreja para se baptisar.
45.a
0ua0do as secundinas não vêm logo depois do parto, é bom, e é costume nas aldeias, apegar-se a parturiente ao pau
do marido e passear pela casa, não esquecendo de pôr o cha-
peu do homem na cabeça.
Tambem é bom soprar com força a uma garrafa (mas melhor é um caldo de perdiz) até que venham as secundinas.
46_3
Quando a parturiente está de cama e passar perto da casa a Extrema-Uncção ou algum de fuucto, deve-se assentar no lei- to, que não é bom arcar deitada.
47.«
Cahindo vinho, uma gota que seja, DO sangue do parto, ou na roupa que ensanguentou, embriaga-se depois facilmen- te a parturiente com qualquer gole de vinho que beber.
197
¿¡8."
Quando as mães têm poucas deres de parto, sofrem mais
dores os alhos, em pequeninos.
49.°
Quem tiver 31 afilhados vai direito para 0 céu. 50. a
‹‹ 0 sardão é amigo dos homens e inimigo das mulheres.
.
(Twad. pop. de Porá.), mas se lhe disser :
›
.
Sardão pinto, Sardão pardo, Vende as vaccas A cruzado. então, ataca tombem OS homens.51.a
0 pão quente não se enceta à faca, porque fica ensebado : ganha uns olhos cheios de humidade e estraga-se, e por isso
só à mão é que se parte.
52."
Quando O pão se não leveda, põe-se umas calças de ho- mem em cima da massa, e faz-se com elias uma cruz em cima da masseira.
Tambem se leveda o pão espetando na massa um rami- nho de oliveira e deítando›Ihe vinagre no buraco que fez o ramo. Ao meter o pão ao forno, diz-se '
Deus te acrescente
Para os pobres e para a gente 1.
TALHAR 1
I
Coser pés ou pulsos abertos
Vira-se um pucaro, cheio d'agua a ferver num alguidar e ahi se deixa com o fundo voltado para cima, onde se collo- ca um novelo, uma agulha eufiada em linha branca e umas tesouras.
Pega a benzedeiro na agulha com a mão direita e sustem o novelo na esquerda. Seguidamente interroga o padecente do pé ou pulso aberto :
-Eu que coso ?
-Carne aberta,
ao
torto-alfirma o doente.---Isso mesmo é que eu coso--corrobora a benzedeiro, e, in continenti, atravessa dum lado ao outro o novelo com a agulha enfada. Todas estas perguntas e cerernonias se fazem
tres vezes e em tres noites consecutivas. Se o pulso ou pé
está aberto, a agua, que está no alguidar, sobe para dentro do pucaro, -quer-nos levar a crer a nossa gel e crente iu- formadora.
II
Talhar a. erysipela 2
Molha-se um ramo de oliveira em azeite e benze-se o ery-
1 Talhar-é benzer, recitar orações para curar qualquer doen-
ça. Coser pés ou pulsos abertos
-
é destorcer, endireitar com benzedu- ras algum tendão torcida ou osso deslocado -explica-nos a nossa in- formadora.-
Omittirnos muitas superstições que coleccionamos pelas termos visto publicadas ou com pequenas variantes • ln Livro de Lei- tura, ‹‹ Continuação dos erros acerca de alguns animaes››, pelo sr. Au- gusto Luso, lemos a formula para talhar o bicho e bichas (lombrigas),pag. 73 a 74. ln Tradições populares de Portugal vem as formulas ' 1 4 , tatha-r o ar, pag. 28, talhar as se- soes, pag. 120, talhar a lua, pag. 121, fogagem e cobrêlo (herpes), pag. 122 a 123 ; dadas, pag. 203.
2 ln Trad. pop. de Porá., a pag. 123 lemos tombem uma ora- ção completamente diferente, para talhar o ezípellado (sic), mas a que exalamos parece-nos mais original.
sipelado nove vezes 1,
e 110
em
um P. N. e A. M.: dizendo a seguinte oração outras tantas,Pedro Paulo foi a Roma Nosso Senhor encontrou, O Senhor lhe perguntou 1
-Pedro Paulo que ha por lá "P
-Senhor! morre muita gente
De zípella. zipellão
'
-Torna lá, oh Pedro Paulo : Com oliva se benzerão,
E todos eles sararão,
Pelo imprenso poder
De S. Pedro, Paulo, Silvestre
E do Senhor que é 0 mestre.
III
Talhar intuas
Ás Trindades (hora aberta), aponta-se com o index a mais
'reluzente estrela que se enxergue no firmamento e diz-se tres vezes e em tres noites seguidas :
Minha estrela reluzente, A minha ingua
Diz que saques tu, Eu digo que saque ela E que reluzas eu 2.
IV
Talhar ennpigens
Molha-se O index na bocca, ao levantar da cama, e esfre-
1
colleeionamos, é que todas se repetem trás vezes, esta é a urtica que se diz nove.
2 Esta formula encontra-se nas Trad. pop. de Porá., pag. 29, com pequena variante, para--talhar empigens nas mãos-mas parece-nos que o nosso amigo J. Leite de Vasconcellos foi mal informado, poro ue a oração, que O povo reza geralmente para talhar empigens é a que a
seguir exalo, e que o Almanack de Lembranças, de 1861, já. trouxe
publicada, com pequena variante.
ga-se a empigem tres das consecutivos, repetindo-se tres ve- zes esta oração e cuspindo fora, no
em
de a recitar :Empija, rabuja Soe-te daqui
,
Assim como eu hoje comi e bebi Assim tu medres aqui.
V
Talhar O tcrçôgo (terçol) 1
Quem tiver 0 terço! volta-se para uma pessoa qualquer, de
quem não for amiga, por exemplo, e diz, com os seus botões,
tres vezes :
Terçôgo, terçôgo
Vai para aquele olho.
Cura-se, tombem, O terço lavando os olhos na agua em que beberem as galinhas !
Para o terço não crescer, não augmentar, costuma o povo
passar ouro (um aunel por exemplo) pela empolinha I
VI
Talhar as belidas
Mastiga-se, em jejum, uma folha de loureiro e bafejasse seguidamente o olho que tiver a belída (nevoa branca im-
plantada na cornea).
1 Em Traz-os-Montes talha-se o terçol da seguinte firma: faz-se
um quadrado com palhas, deita-se-lhe fogo e grita-se tres vezes •
Alíeluia 7
Queima-se alleluía, a casa da terçolharla.
.
Nas Trad. pop. de Port., pag. 39, vem uma formula diversa, que 0 povo usa na Beira-Alta, Minho, Douro, etc., para ralhar 0 terço.
I
ADIVINHAS POPULARES
1. a
Piolho
Na escuridão dum bosque emaranhado O soturno vivente foi nascido,
Com leite de purpure cor ereado,
D'um ovo qual semente produzido. A terra onde nasceu come esfaimado, Morde, fere, ao covarde, ao destemido
E
quando tristeem
não tem d'estoiroE porque lhe não foi veneno ao eoíro.
*
Passeando, navegando
Nunca está esmorecido, Mesmo nas anotas da morte Entre os dedos retorcido.
2_a
Moinllo
Ando e não venço caminho
Mastigo e não enguia, Quando eu Ia dentro bulo So em volta do meu ninho.
38
Nome
O que é, que é Que em tudo se põe?
4_a
Vinagre e vinho Nós somos ambos irmãos E da mesma natureza. 1 Um vai sempre p r a casinha Outros levzun-no pra reza.
*~
Irmãos bonitos e corados ' Um fica sempre na eosinha, A dar bom gosto aos guisados, E o outro vai para a reza
5. a
Moncos
O que é, que é Que OS
E os ricos aproveitam ?
pobres fera deitam
6_a
Estopa
És-s~és, minha menina
To~to, toma sentido, Sabes Iêr e escrever
Pa-a-pa, 0 que quer dizer ?
7.3
Ovo
O que é, que é
Branco como um pomba! Nao tem porta nem portal ?
8_a
Ouriço e a castanha 1
Tenho armas defensivas De que nada me aproveito
,
Ao rir se me abre a hoeeaCae-me o que tenho no peito. Uma joio preciosa,
Mais estimada que eu, Ao longe se vai gastar; Eu fico com quem me deu.
9. Novello 2
O que é, que é,
_
Redondinho, redondo.,_
Cabe n u m ninho de plmpalhao ?a
1
10.==
Sino
O que é, que é
Um velho que tem um só dente E só chama por toda a gente ?
".a
Ferreiro 1Um peso com um duro,
Lom dois colatrões (?) Faz O fructo aos empurroes.
12.a
Cravo
É pelo rigor do frio
Que chego à porta da lança, Mentido n u m fulipínho
Mostrando minha esperança. Pelo cheiro me conheces,
No pé me dão unhadas. Agora adivinha lã. Cabeça de cá-que-ra-cá.
13.=~
Feto
Qual é a coisa, qual é ella,
Que nasce no monte com
As maos amadas na cabeça ?
14.8 Candeia É burro de ferro Albarda de linho Atiça, atiça SÓ com um pausinho.
1 Um peso é o martelo. Um duro é a bigorna.
15.==
Espingarda
Que é, que é :
Quando vai para O monte Leva a bocca virada para casa,
E, quando vem para casa, traz A bocca virada para 0 monte.
16.=~
Videira
Sou velha, minguem 0 nega Foi-se a minha mocidade,
Mas i d a (Festa idade Deus de alhos me carrega. O inverno me faz cega › Olhos me abre 0 verão, Tenho um ilho por brazão, Que é mui forte e valente,
Faz perder a omita gente
Honra, brio, estimação.
17.a
Corno 1
Lua nova, lua cheia,
Tem um R por bandeira
N, 0 por ser constante,
Adivinha estudante.
18. a
Melancia
Qual é a coisa, qual é ela,
Que tem a capa verde
E 0 coraçao vermelho
Í*
19 . 8
Mosca
. Í
Era e não era,
No tempo da guerra,
Meu pae era vivo, Minha mãe por nascer
1 Variante in Revista de Guimarães, pag. 112. A lua nova tem
a forma dum C e a lua cheia d u m 0. Um R por bandeira, com 0 cons-
Puz os pés na cinta E deitei a correr. 20.3 ' G l Tumba O que é, que é '
Que nasce no monte (madeira) E vem-nos fazer chorar a casa ?
F OLK-LORE
LENDAS DE MOURAS ENCANTADAS I
O buraco do Olheiro
Na freguezia de Santa Eulalia de Arenoso, concelho de Villa Nova de Famalicão, na fada do monte vulgarmente chamado
de Santa Baía, proximo á Ponte do Olheiro, que atravessa um
fragoso regata, ha uma lapa a que o povo, desde remotas eras, dá o nome dei-Buraco do Ollzeiro.
0 Buraco do Olheiro
*
é um suhterraneo que tem aproxi- madamente um quarto de legue até ao monte de Palhares,onde antigamente havia um castelo dos mouros 27 e por signal
que ainda se encontram, por 18, pedras e tijolos do castelo.
Mas Jesus! ha que tempos que isso foi: eu
ja
o ouvia contarTemos feito reparo que em quasi todas as lendas deste theor,
subterrâneos que têm communicação, como o desta tradícão, natos
1 Esta lenda tivemos o prazer de ouvíl-a_consoante
a vamos
contar-dos labios ingenuos duma velha aldeãs, de Santa Eulalia de Arenoso, que nol-a contou piamente convencida da veracidade da tra-
dição.
2
de mouras encantadas, em castellos ou tapas, se alude a caminhos
.
com re-‹, ou r i o s : - « e era, aventa a nessa informadora, para os mouros
levar os bois e os burros a beber ››.
Cf. Tradições populares de Portugal, de J. Leite de Vasconcellos. Pag. 280. vi. Moiros.
Vid. Revista de Guimarães, vol. 11, n.0 4, pag. Dara a archeclogia do concelho de Guimarães z Sarmento. 192: «Materiaes pelo snr. Martins
I
6.0 ANNO_ I 15J
á minha rnãesinha (que Deus lhe falte na alma) que já lh'0 contava o paesinho d'ella. Ora, como eu ia dizendo, viveu
nesta freguezia, 110 tempo dos pagãos e dos mouros 1, um
lavrador que tinha uma manada de bois que mandava pastar ahi para ao pé do Buraco do Olheiro. Uma das vaccas 2
vinha
do monte sempre mais farta do que as outras, mas o que admirava era que a vacca tinha uma cria, e quando recolhia á
corte nunca trazia leite.
.
.
0 lavrador descontou que l h o ti- ravam por lá, e, vai ao depois, foi-se por 8 vigia e viu que a vacca entrou para o Buraco do Olheiro, e quando ela já ia longe, foi a correr atroz e ainda se lhe agarrou ao rabo. Avacca foi indo, indo, por baixo do subterraneo, e, quando
chegou lá para ao pé do monte de Palhares, paz-se a pastar
n u m prado de rica herva. Entrementes, apparecerazn as mou-
ras e muitos mouros, que nada disseram ao lavrador, que es- tava benzido do que via.
..
Um dos rnouros, foi tirar o leiteá. vacca
*,
mas o lavrador nunca se desamarrou do rabo, se não ficavaIa
encantado. A vacca depois de ter pastado até fartar veio-se embora e 0 lavrador seguiu-a, sempre amarra-do, e quando chegou a casa contou tudo à mulher, mas tão
tolhidinho ficou que, passados tres dias, morreu. Foi assim que se soube que 110 Buraco do Olheiro ha rnouras e mouros
encantados; muita riqueza e até sinos doiro, que o homem- zinho (Deus lhe falte n'alma) viu lá dentro 4. Ainda hoje ne-
1 Em muitas freguezías, é costume antiquissimo e vulgar ainda
(ia 0 presenciei em Mouquím) dizer a madrinha do neophito a coma- dre :
Entregou-me um PAGÃO Aqui lhe trago um christão, Ensine-lhe as orações Que lhe deitarei as benções.
2 Nestas lendas figuram sempre as vaceas e jamais ouvi alguma
em que entrem bois.
3 Cf. Lendas de moiras encêmtadas, i i Fragmentos de Mythoíogia
popular portugueza, pag. 2, por J. Leite de Vasconcellos.
4 Não conhecemos outra tradição de mouras encantadas em que
se falte de sinos douro. No concelho de Guimarães, perto de Britei- ros, ha uma Fonte chamada da Caeáda, que tem tombem sinos doiro
la
dentro-temos ouvido dizer ao povo. Lemos, algures que 0 snr. F.Martins Sarmento descobriu, numa pedra desta fonte, gravada exte- riormente, uma fossete.
hum mancebo, ainda que seja um valentão, se atreve a pas- sar de noite, perto do Buraco do Olheiro porque empecem lá
coisas ruins e feitiçarias 1.
Temos apontamentos de outras lendas de Mouros encanta- das, que andamos a coleccionar e que breve publicaremos.
Já colhemos uma versão do Penedo da Moura, n0 monte de S. Miguel, freguezia de S. Julião, e outra da Cova da Moura, de Fradellos, mas aguardamos que outros informadores DOS
corroboram a veracidade das. tradições. Se o leitor amigo sabe alguma destas ou doutras tradições far-nos-bia favor especial em communical-as.
Aproveitamos a occasião de agradecer ao nosso amigo s r .
Augusto Moreira, da casa da Carvalheira, respeitavel cavalhei- r0 deste concelho, intelligente procurador 8 junta geral do districto de Braga, a fineza das informações que nos colheu do
Penedo da Moura.
ABILIO DE MAGALHÃES BRANDÃO.
1
coesas ruins e coisas mas e a oração (que vamos exalar) que reza ao delta? e levantar da cama :
Uma prova irrefragavel da crença arraigado que 0 povo liga às
Com Deus me deito Com Deus me levanto,
Deus me cubra com seu manto : Se com ele for coberto,
Não terei medo nem pavor Nem de coisa que ruim for.