ESTÁTUA DE SAL
JOÃO BARROS
Mas a mulher de Ló olhou para trás
e ficou convertida em uma estátua de sal.
Gênesis 19.26
Lambari é peixe ou Coisa que o valha?
Como dantes (DANTE?) Ferindo o lamaçal a
Mente Memória
Paisagem
Em conformidade com o discurso
Procurei nas entrelinhas os vestígios
Da minha voz Mas
Ouvisomente o silêncio Pelos
corredores
O que ela vestia era pura seda Rasgava-se inteira no meio da ruaAbaixo do sol na chuva
Do lado de fora Havia imagens E poesia
Manhãs, promessas Meretrizes
Em forma de flor E tudo
É sonho
Penumbra E dor
Parlamentares Discutem
Para lamentares O discurso
Liquidares os vãos Que se abrem
Na tua alma
(Barulho, barulho) E calma
Panfletos jogados na rua
Tornam místicos os ascetas E sacralizam os poetas
Com suas roupas de algodão Macio
Nocio
O rio está totalmente seco Comotudo
Mais
Porventura se discute sob Aplausos ou vaias
O comprimento das saias Que circulam no salão?
Por certo que a loucura Dissimula a descrença Disfarça a caricatura
De uma mula que não pensa
Discretamente fui deixando
De lado a velha mania De me apegar a manias Velhas
De propósito arrumei as malas E fui morar em um depósito
Longe dos vícios que me Arrastam sem propósito
Frioé o fim da noite
É o começo do dia É o olhar da
musa É a cor da blusa É essa mágoa
Mágica
Fantasma
que crava
Em mim o punhal
Uma
facaFria
Depois de constantes pesadelos
Parei de me olhar no espelho Mas as vitrines
Assumiram o papel do crime Absurdo do nada
Do tudo
Que silencia a própria VozAlgoz da decrepitude que se Espalha pelo tempo
Sobre a palha e o Vento
És a finitude sem graça A virtude degradada
A falta de tudo o que Faz falta no mundo Que passa
Não há nada de bonito Na ideia do escrito
Sem razão de infinito E nobre requisito
De uma ideia pobre:
Plebiscito.
A imagem do rio é assombrosa
É
como um poema em prosa Que
se insere numa imensa Folha estendida na
planície
Voltemos
à essência das coisas
(Dascoisas não-essenciais):
Comoo velho instinto dos homens Ea primavera do conhecimento Eo fogo que queima qualquer
Palavra
ou qualquer silêncio Enfim,
eterna só a vontade.
Nocomeço a única certeza era o fimNo
fim só era certeza o começo Masnada de tão definitivo
Aconteceu
nesse meio tempo
O gosto convence o pássaro
O pouso sobre o muro A visão da rua deserta Incide com a marcha A guerrilha os
pormenores
O leve pulso o engate Das horas na dura
paisagem
Soba blusa fina e branca Opeito arfava como se Quisesse
sair. Minhas mãos Apertaram-no
e um gemido
Sefez ouvir. Seus olhos Brilharam
mais do que as Luzes
dos postes. Estava frio
Eo silêncio acordou. Tarde Danoite e ela ainda
Cheirava
a amanhecer.
Só não quero
Ter que alimentar Teus filhos
Nem se fossem
Jovens o suficiente Para um assalto
Ou um crime Mais brutal.
Umhomem velho deve Saber
a cor de cada Coisa
como um novo
Ovalor de sua dama
Umamulher de juízo
Nãose entrega a qualquer Umsem pagamento
Adiantado
Opichador não seria Aquele
com o spray Namão?
Apoesia já morreu
Faztempo, mas o velório Continua.
A moça chegou e disse
Meu marido desapareceu.
O policial perguntou Quando o viu pela
última vez?
Ela respondeu
Antes dele desaparecer.
Com o pensamento em paralelepípedos
Fui calçando a minha rua. Bastou uma
Chuva para a lama
reequilibrar as forças
E minha memória voltar ao campo das
Ideias infundadas.
As nuvens formam
desenhos sem formas.
Ou não são desenhos que elas formam,
Mas apenas formas sem desenhos?
O deserto é um campo sem estações.
Não sei onde tudo começa
Se do fim da saia pra baixo
Ou do fim da saia pra cimaA total nudez
responderia.
A paz é um vazio no olhar
Umolhar vazio
Umanoite sem chuva Umachuva no rio
Apresença do bem Aausência do mal Umvestígio implícito Umaficção real.
Quando
cruzei com ela na rua percebi que a lua brilhava em seus
olhos.
Eladisse oi Eudisse oi Eufiquei Elafoi.
Nossa
casa não tinha tamanho certo Sóprojeções
Nosso
humor dizia o quanto estávamos bemE
o que era de cada um.
Àsvezes a cama era minha Comtudo que havia em cima.
Àsvezes, só o sofá da sala.
Umasentença indicava mais ou menos Oporquê do castigo.
Um dia ela pegou Minhas coisas e
Colocou numa Mala e disse pra Eu ir embora.
Atéhoje ela me procura pelos cantos silenciosos e escuros
Comos olhos vidrados e as mãos crispadas
Nummisto de tristeza e raiva
Quea faz lembrar que ainda não estava pronta.
“O pensamento não é
coisa da mente, ele tem sua origem no tempo, nas folhas que caem levemente, sem
ruído, sem dor no meio da tarde. A memória é uma
cicatriz em que se passa a mão e lembra-se do corte.”