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Eu e meu filho hospitalizado: concepção das mães

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Academic year: 2018

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EU E MEU FILHO HOSPITALIZADO: CONCEPÇÃO DAS MÃES

I AND MY HOSPITALIZED CHILD: MOTHERS’ CONCEPTIONS

MI HIJO HOSPITALIZADO Y YO: EL PUNTO DE VISTA DE LAS MADRES

AMANDA SILVA RODRIGUES1

MARIA SALETE BESSA JORGE2

ANA PATRÍCIA PEREIRA MORAIS3

O e studo é de na ture za fe no m e no ló gica , q ue pe lo se u m o do de se r, nã o e xiste um ca m inho siste m á tico de a pre ndiza ge m de po stura q ue c o m pre e nde a ve rda de c o m um c a rá te r de pro viso rie da de , m uta b ilida de e re la tivida de . O o b je tivo da pe sq uisa co nstitui-se de co m pre e nde r a s e xpe riê ncia s da m ã e co m o filho ho spita liza do e xplícito s e im plícito s e m se us re la to s. O ca m po de inve stiga çã o fo i à unida de pe diá trica de um ho spita l púb lico do m unicípio de Fo rta le za . A co le ta da s de sc riç õ e s o c o rre u e ntre o s m e se s de a go sto e se te m b ro de 2003. Pa rtic ipa ra m da inve stiga ç ã o o ito m ã e s de c ria nç a s ho spita liza da s, e o pro c e sso de e sc o lha fo ra m a le a tó rio s, te n do vigo ra do o c rité rio de sa tu ra ç ã o te ó ric a , a tra vé s da té cnica de e ntre vista co m ro te iro . Pa ra inte rpre ta çã o da s info rm a çõ e s, utilize i a he rm e nê utica , po ssib ilita ndo te r co m pre e nsã o do se ntido do fe nô m e no . As de scriçõ e s re ve la m q ue a s m ã e s e xpe rim e nta m dive rsa s e m o çõ e s, po r se pe rce b e -re m la n ç a da s n o m u n do de sc o n he c i do do ho spi ta l e n e c e ssi ta m do c u i da do da e q u i pe de sa ú de pa ra se a da pta r e e nfre nta r o so frim e nto q ue e sse e ve nto ge ra .

UNITERMOS: Criança hospitalizada; Mãe acompanhando filho no hospital.

The stu dy ha s a phe n o m e n o lo gic a l n a tu re , whic h, du e to its n a tu re , do e s n o t c o n side r a syste m a tic wa y o f le a rn in g, unde rsta nding the truth thro ugh its cha ra cte r o f te m po ra rine ss, m uta bility a nd re la tivity. It brings into fo cus the phe no m e no n, tha t is, the subje ct-o bje ct re la tio nship, a im ing a t inte rpre ting the ho spita lize d child’s m o the r, with the inte ntio n o f a ppre hending e xplicit a nd im plicit m e a nings in the ir re po rts. The inve stiga tio n wa s co nducte d a t the pe dia tric unity o f a m unicipa l public ho spita l in Fo rta le za /Ce , whe re the m o the r’s o r e sco rt’s right to sta y with the child during the ho spita liza tio n pe rio d is a ssure d. The pe rio d o f study wa s thre e m o nths a nd the da ta co lle ctio n o ccurre d be twe e n August a nd Se pte m be r o f 2003. The subje cts inve stiga te d we re e ight m o the rs o f ho spita lize d childre n, a nd the se le ctio n pro ce ss wa s ra ndo m , pre va illing the crite ria o f the o re tica l sa tura tio n, thro ugh the te chnique o f vide o ta pe d inte rvie ws. In o rde r to inte rpre t the info rm a tio n o bta ine d, I use d He rm e ne utics, b e ca use it m a k e s po ssib le to unde rsta nd the m e a ning o f the phe no m e no n. The de scriptio ns sho w tha t the m o the rs e xpe rie nce diffe re nt e m o tio ns whe n the y a re ca st in the unk no wn wo rld tha t the ho spita l re pre se nts a nd tha t the y ne e d the ca re pro vide d by the he a lth te a m to fa ce the suffe ring pro duce d by this e ve nt.

KEY WORDS: Child, hospitalized; Mother with child in hospital.

El e stu dio e s de n a tu ra le za fe n o m e n o ló gic a , po r su m a n e ra de se r, n o e xiste c a m in o siste m á tic o de a pre n diza je de po stura pa ra co m pre nde r la ve rda d co n ca rá cte r te m po ra l pro viso rio , m uta b le y re la tivo . Ella dirige su m ira da ha cia e l fe nó m e no , o se a , e n la re la ció n de suje to /o b je to . La inve stiga ció n se ce ntró e n la unida d pe diá trica pe rte ne cie nte a un ho spita l púb lico de l m unicipio de Fo rta le za , a llí se le a se gura a la m a dre o a l a co m pa ña nte su pe rm a ne ncia junto a l niño dura nte to do e l tie m po de inte rna ció n. Dicho e studio duró tre s m e se s y la o b te nció n de la s de scripcio ne s re co gida s fue e ntre lo s m e se s de a go sto y se ptie m b re de l 2003. En e l pro ce so de inve stiga ció n pa rticipa ro n o cho m a dre s, cuyo s hijo s e sta b a n ho spita liza do s, e l pro ce so de e le cció n fue a le a to rio , vigo ra ndo e l crite rio de sa tura ció n te ó rica , po r m e dio de la té cnica de e ntre vista co n guió n. Pa ra la inte rpre ta ció n de la s de scripcio ne s fue utiliza da la he rm e né utica , pe rm itie ndo la co m pre nsió n de l se ntido de lo s fe nó m e no s. La s de scripcio ne s re ve la n q ue la s m a dre s e xpe rim e nta n distinta s e m o ci-o n e s c u a n dci-o pe rc ib e n q u e de b e rá n e n fre n ta rse c ci-o n e l de sc ci-o n ci-o c idci-o m u n dci-o de l hci-o spita l y pre c isa n de la a yu da y e l cuida do de l e q uipo de sa lud pa ra a da pta rse a e sta situa ció n y e nfre nta r e l sufrim ie nto ge ne ra do po r e se a co nte cim ie nto .

PALABRAS CLAVES: Niño hospitalizado; madre acompañando hijo en hospital.

1 Acadêmica do Curso de Enfermagem da UECE. 9 º semestre. Artigo elaborado a partir da monografia de conclusão de curso.

2 Enfermeira. Docente. Doutora em Enfermagem pela EERP/USP. Universidade Estadual do Ceará e Mestrado Acadêmico em Saúde Pública.

Pesquisadora CNPq. Líder do Grupo Saúde Mental, Família e Práticas de Saúde.E-mail: masabejo@ bol.om.br

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Rev. RENE. Fo r taleza, v. 6 , n. 3 , p. 8 7 - 9 4 , set./dez.2 0 0 5 8 8

O INTERRESSE PELO TEMA

Ao adentrar o mundo do hospital, através dos estági-os curriculares, deparei-me com o universo de emoções que emergem do adoecimento e da hospitalização. Senti necessidade de compreender as implicações que a doença e a hospitalização têm sobre as crianças e sua família, em especial sobre as mães, que desde cedo se mostram nutrizes do desenvolvimento do grupo familiar e por isso, iniciei este estudo. Parecia-me claro que, enquanto estudante e futura profissional, minha prática deveria transcender o operacional, para oferecer um cuidado que garantisse o bem estar de toda a família.

A hospitalização é um evento que provoca impactos em várias dimensões do ser humano e para garantir uma assistência que atenda a todas as necessidades deste ser, preservando sua autenticidade, é importante conhecer so-bre as experiências de quem vivencia esse fenômeno. A fa-mília que enfrenta essa experiência é regida pelo sofrimento, pela insegurança, e para enfrentar tal acontecimento é ne-cessário o redimensionamento de sua vida, visto que seu padrão habitual de funcionamento foi interrompido.

Dentro da família, é com a “mãe” que a criança estabelece o vínculo mais forte, uma vez que é esta figura que lhe gere, nutre. A presença da figura materna é funda-mental para a criança, tendo em vista que aquela irá orientá-la, protegê-la durante suas descobertas no mundo1.

Os pais constituem as figuras mais importantes no processo de socialização da criança, e a partir das trocas afetivas que se processam nesse subsistema, surgirão recur-sos emocionais para suportar adversidades2. A ligação afetiva

entre a criança e sua família e, mais precisamente, com a mãe, é imprescindível para assegurar que as bases de for-mação psicológica do futuro adulto sejam mantidas em situações de privação do convívio familiar.

É a mãe que acumula as atividades de educadora dos filhos e dona de casa, ainda que tenha emprego fora do lar, o que a torna especialmente vulnerável a todas as mu-danças enfrentadas pela vivência de seu filho com a doença e a internação. Desta forma, é esperado da mãe que ela lide com todos os aspectos modificados, além dos senti-mentos e emoções vivenciados pela condição de enfermi-dade da criança3.

Assim como as relações familiares intrínsecas são usadas por seus membros como mecanismos de enfrenta-mento, tal mãe-filho, a família, também, pode apresentar situações e padrões de funcionamento individual, que pro-piciem a fragilização da saúde.

Um dos critérios avaliadores da saúde mental dentro de grupos familiares, é a expressão de um intercâmbio não-adaptativo à demanda maior do sistema, a nível familiar4.

Nes-se ínterim, Nes-se especialmente a mãe, ao vivenciar a hospitalização da criança, não conseguir redefinir seus papéis junto ao pe-queno ser que acompanha, pode gerar desvios nas trocas afetivas e comprometer, também, a saúde mental desse ser.

Ao cuidar da criança hospitalizada e de suas mães, respeitando suas individualidades e gerando independên-cia, a Enfermagem, não só promove saúde mental à famí-lia, como também humaniza a atenção à saúde prestada no hospital, pois contribui para a implementação de uma nova práxis, pautada em princípios humanísticos, sem destituir as pessoas de seus aspectos existenciais, para torná-las ob-jetos, números de leitos.

Ciente da problemática que consiste em promover saúde mental à população, entendo que o presente estudo poderá oferecer um conjunto de conhecimentos e práticas com implicações sobre a saúde mental dos vários sujeitos envolvidos no processo de hospitalização. Compreendo a saúde mental como área que emerge do campo da saúde pública, e acredito que compete à enfermagem cuidar do ser humano contextualizando-o segundo suas dimensões biológicas, psicoemocionais e sociais, valorizando sua cul-tura, sua família e suas emoções, promovendo saúde men-tal em todos os níveis de atenção à saúde. Diante do exposto, o objetivo foi compreender as experiências da mãe com o filho hospitalizado explícitos e implícitos em seus relatos .

EIXO TEÓRICO- METODOLÓGICO

Como eixo teórico-metodológico, utilizei conceitos da fenomenologia interpretativa e existencial, com a finali-dade de c o mpr eender as nuanç as da ho spitalizaç ão vivenciadas pelas mães.

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racionalismo científico. Ela se propunha a compreender e interpretar situações de vida, experiências e sentimentos do homem, respeitando seu contexto sociocultural5.

Utilizando o legado de Husserl, o “ser-no-mundo”, Martin Heidegger parte do “ser-aí” para dar sentido à existência humana, criando uma série de categorias e conceitos, para elucidar sua proposta de reflexão sobre o ser e a existência. Heidegger chamou de ser-aí o ente humano, onde a í se refere ao mundo e indica que a compreensão da existência só é possível a partir da relação do homem com o mundo em que ele vive. Sendo a existência a essência do homem, existir significa estar lançado num sem número de possibilidades, onde a realidade se manifesta num contínuo “vir-a-ser”6.

Ao refletir sobre o conceito de se r, Heidegger coloca que o homem de-cai de si mesmo para se lançar no cotidi-ano do mundo circundante, deparando com suas inúmeras possibilidades de existir. O homem transcende continua-mente de si quando direciona para um poder ser mais, através de sua capacidade de se sentir livre para romper e superar os próprios limites.7

Por vezes, aquilo que há de novo e que vem ao en-contro do homem quotidianamente, pode ser percebido como algo danoso, fazendo com que o ser humano se feche às possibilidades de vir a ser. Em contraponto, quando o ser humano enfrenta aquilo que se lhe apresenta, aproxi-ma-se da transcendência.

A compreensão permite ao homem estruturar suas possi-bilidades de existir no mundo, e atesta sua singularidade. Para compreender, há que se atribuir significados, de forma que não basta ter algo diante de si para se compreender esse algo.

O falatório é apontado por Heidegger como fenô-meno imprescindível para a compreensão e interpretação da pre-sença cotidiana. A linguagem eqüivale a um pro-nunciamento, que guarda em si uma interpretação da com-preensão da pre-sença e ambas, linguagem e interpretação, preservam uma compreensão originária do mundo e da presença dos outros seres humanos. Ela revela a situação de um ente que existe em si e para outros entes.

Uma das maneiras do mundo vivenciado se revelar ao homem é através de sua convivência com as outras ‘pre-senças’, com os outros entes. Na relação com o outro, o cuidado se expressa através da ocupação e da preocupação, estando aquele presente na relação do homem com as coisas e com o

mundo cotidiano, e este, presente na sua relação com as pessoas c om que c onvive. Quando adota uma postura inautêntica, o homem limita-se a ocupar-se do outro, desti-tuindo-o, assim, do caráter autêntico de sua existência.

A preocupação com o outro eqüivale à solicitude, que pode ser autêntica e inautêntica. A solicitude inautêntica está relacionada com as situações em que o cuidado que se presta ao outro gera dependência, embotando a capacidade que o outro tem de ser senhor de sua existência, agente de seu viver autêntico. Por outro lado, na solicitude autêntica, o cuidado respeita o outro como um ser humano independente, e visa oferecer-lhe apoio, para que ele mesmo busque e exerça suas potencialidades. A relação que é significativa e envolvente é denominada de solicitude, ou maneira de cuidar, e pressu-põe que haja consideração e paciência com o outro8.

É por propor um cuidado autônomo, que este estudo intenta uma compreensão das experiências de mães que têm seus filhos hospitalizados, procurando conhecer as lacunas da assistência prestada em hospitais às crianças e à sua família, já que a Enfermagem, enquanto provedora de cuidado/conforto profissional, deve ter a família como um dos focos de atenção9.

TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

A experiência humana é a essência da pesquisa qua-litativa e também é o ponto de partida da fenomenologia. Trata-se de um estudo c om enfoque nos c onc eitos da fenomenologia heideggeriana.

O campo de investigação foi a unidade pediátrica de um hospital público do município de Fortaleza-CE, onde é assegurado o direito da mãe ou acompanhante, de permane-cer com a criança durante o período de internação. O perío-do perío-do estuperío-do foi de 3 meses e as coletas das descrições ocorreram entre os meses de agosto e setembro de 2004.

Os sujeitos investigados foram mães de c rianç as hospitalizadas que se encontravam nas fases inicial e inter-mediária da infância, que compreendem, respectivamente, de 1 a 6 anos e de 6 a 1 2 anos. Para obtenção das descri-ções iniciei com 5 mães de crianças hospitalizadas e o pro-cesso foi aleatório, tendo vigorado o critério de saturação teórica, mas ao final da pesquisa participaram oito.

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Rev. RENE. Fo r taleza, v. 6 , n. 3 , p. 8 7 - 9 4 , set./dez.2 0 0 5 9 0

As informaç ões foram interpretadas através da hermenêutica, possibilitando ter compreensão do sentido do fenômeno. A partir dos relatos das mães, busquei a es-sência contida no vivido por elas e, para tanto, apropriei-me de conceitos utilizados na fenoapropriei-menologia heideggeriana. O estudo obedeceu à resolução nº 1 9 6 /9 6 , do Con-selho Nacional de Saúde, sobre pesquisas envolvendo seres humanos, e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade.

OS MODOS DO SER- AÍ NOS DISCURSOS

Os conceitos elaborados dos discursos com leituras atentivas, buscando o sentido, são modos da pre-sença, os quais estão destacados e interpretados à luz da fenome-nologia interpretativa e existencial heideggeriana.

O Ser- Aí no mundo do hospital

A internação é um fenômeno que altera o estilo de vida de toda família, sua rotina e a dinâmica de suas rela-ções internas. A mãe que acompanha seu filho durante esse momento enfrenta diversos sentimentos e emoções por se perceber lançada em um mundo desconhecido, repleto de incertezas e medos relacionados a chances de recuperação e à integridade biológica da criança, agindo assim como ser-aí ( Dasein)1 0. Por um lado, sente-se segura por garantir

assistência à saúde do filho, permanecendo internada com ele, por outro, sente medo diante do universo desconheci-do que o hospital representa, onde há pessoas estranhas, novas rotinas, lógicas de convivência e de comportamento totalmente desconhecidos:

Pra m im nã o é ruim fic a r a q ui po rq ue po r

um la do a ge nte te m tudo . O ruim é fica r na

e xpe cta tiva ( ...) e u m e sinto b e m o nde e u fo r a rra nja r o b e m pra e le ( ...) Nã o é b o m nã o

fic a r a q ui, po rq ue só de e sta r num ho spita l

já é ruim ( ...) m a s po r o utro la do é b o m , po rq ue é pra m e lho ra r a sa úde de le ( ...) Eu te

-n h o m e d o d e t u d o a q u i , p o r q u e é u m

ho spita l, né ?! Te m de tudo a q ui, e a s ve ze s a

pe sso a e ntra co m um a co isa e pe ga o utra e

pa ssa m a is te m po a inda inte rna da ( ...) .

A permanência dentro dos limites do hospital e a r e s tr iç ã o da s vis ita s de fa m ilia r e s r e pr e s e n ta um enclausuramento para as mães e as faz experimentar um sentimento de isolamento do mundo, de privação. Nesse contexto, o sentimento de solidão surge e é relacionado não só à liberdade diminuída em decorrência da demanda de ter um filho doente e aos cuidados especiais que essa condição requer, mas também, ao constrangimento de es-tar em um lugar estranho, convivendo com pessoas estranhas:

No i n í c i o e u só q u e ri a i r e m b o ra , c ho ra va

q ua ndo vinha m visita r a ge nte e e u nã o po

-dia ir e m b o ra junto . Po rq ue a ge nte te r q ue

fica r, se m e sta r a co stum a da a co nvive r num

luga r, se m sa ir pra ca nto ne nhum e co m um

m o nte de ge nte e stra nha , é ruim de m a is ( ...)

po rq ue a q ui nã o se po de fa ze r o q ue q ue r na

ho ra q ue q ue r( ...) o nde se viu m e nino do e

te te r ho ra pra a pe rre a r?!( ...) e u já m e de se

n-te ndi co m um a m ã e po rq ue e u ta va co m m e u

m e n in o do e n te e e la ve io da r o pin iã o . Nã o

te m co m o , m ulhe r, co nvive r co m pe sso a q ue

a ge n te n ã o c o n h e c e , q u e n u n c a vi u , n ã o

te m co m o da r ce rto se m pre .

Em meio a esse mundo novo e desafiante, onde a mãe se vê imersa, a quebra da rotina familiar e de sua rotina de mulher, de ser-no-mundo, gera sofrimento. Uma série de alterações lhe são exigidas para acompanhar a reestruturação do mundo da família de que depende o enfrentamento da criança à sua nova condição. Nos depoi-mentos, o sentimento de saudade da estabilidade familiar anterior à doença e à internação, assim como a tristeza, aparecem quase sempre interligados, denotando a varieda-de varieda-de emoções com que as mães necessitam lidar:

te m ho ra que fico pe nsa tiva , pe nso lá e pe nso

cá , e m e le m bro de no ssa vidinha a nte s...e ssa

m e nina nunca a do e ce u pra pre cisa r de sa ir

do inte rio r...dá vo nta de de cho ra r só de im a

gi-na r co m o e ra a nte s e co m o tá se ndo de sde que

e la a do e ce u ( ...) m a s e u sinto fa lta da m inha

ca sa , da s m inha s co isa s, de tudo , sinto fa lta de

ca sa .( ...) a ve m a ria , é a m a io r do r da m inha

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O medo foi um sentimento recorrente nos depoimen-tos e surge com grande amplitude, relacionado ao medo de morte da criança, a possíveis agravos da doença, ao universo desconhecido do hospital, e ainda à possibilidade de falhar como cuidadora. Para as mães, o adoecimento da criança e a possibilidade de complicação da doença ou do contágio, por outras patologias, representam sua falha como mãe, como protetora de seus filhos. Por se sentir responsável pelo bem estar e pela integridade de seus filhos, as mães experimen-tam a culpa por não serem capazes de poupar seus filhos do estresse decorrente do adoecimento e da hospitalização.

( ...) é difícil, po rque de po is da cirurgia e le po de

pe ga r pne um o nia m a is fá cil, fico u m a is fra

-quinho , te m que te r m uito cuida do co m e le ( ...)

é difícil , m a s e u cuido de le dire itinho , se i que

e le de pe nde de m im , a í num de sgrudo de le ,

De us m e livre ( ...) e u fico to da ne rvo sa po rque

e le nã o po de a do e ce r, te nho que pre sta r m uita

a te nçã o a e le , te nho que te r cuida do re do bra

-do . Fo i c o m o se o m u n -do ti ve sse a c a b a -do ,

qua ndo disse ra m que e le tinha que se o pe ra r,

po rque na m inha m e nte e le ia m o rre r ( ...) a

in-da ho je qua ndo e u im a gino que e le po de m o

r-re r, fa lto m e a c a b a r, m o rro de m e do de e le

m o rre r de po is de to da e ssa luta .

Ao experimentar essas sensações, a mãe se distancia dos outros, no sentido de que, por mais que alguém enten-da sua condição, não conhece exatamente a angústia que esses sentimentos provocam. É nesse contexto que surge a sensação de desamparo, de solidão.

( ...) e to da ve z q ue ve m a lgué m q ue va i e m

-b o ra e u cho ro , sinto vo nta de de ir e m -b o ra ( ...)

a ge nte nã o e stá a co stum a da a um luga r de

s-se , s-se m sa ir pra ca nto ne nhum e q ua ndo o s

o utro s ve m e vã o e a ge nte te m q ue fica r so

zi-nha co m o filho da ge nte ( ...) é ruim .

A tr anscendência

A hospitalização faz com que as feridas no universo da mãe, provocadas pelo adoecimento de sua criança, res-surjam ainda mais dolorosas. Ao vivenciar esse evento, as

mães lutam contra seus próprios medos, numa tentativa frenética de vencê-los, para garantir o apoio aos seus fi-lhos. A angústia que surge com os momentos de desespero, repetidamente descritos nos depoimentos, aproxima-as da autenticidade e aparece nos discursos, relacionada a lem-branças de hospitalizações anteriores de seus filhos, reve-lando sentimentos como tristeza, desespero, desilusão:

o pio r de tudo e ra a e xpe cta tiva do que ia vir

de po is, e a té ho je o pio r é a ince rte za de co m o

e le va i fica r. Isso m a ltra ta m uito a ge nte ( ...) a

ge nte fica ne rvo sa co m tudo , sa be , e che ga da va

u m a c o isa ru im q u a n do e u ta va e spe ra n do

um e xa m e , um a co isa . ( ...) da o utra ve z e u m e

de se spe ra va po rquê ca da um dizia um a co isa

e e le nã o m e lho ra va , cho re i dia e no ite a té e le

sa ir ( ...) e de ve z e u qua ndo e u fe cho o s o lho s

a qui e pa re ce q tá a co nte ce ndo de no vo .

As mães se revestem da responsabilidade de cuidar do filho, abdicando da própria vida, para enfrentar com ele as implic aç õ es existenc iais do ado ec imento e da hospitalização. Ao se envolver, ao tomar para si a responsa-bilidade pelo cuidado da criança, a mãe se angustia diante das incertezas da integridade biológica do pequeno ser e do universo desconhecido que o hospital representa.

Essa angústia é positiva e aproxima a mãe de uma existência autêntica, na medida em que possibilita o retor-no a sua condição mais primitiva de ser-retor-no-mundo, de ente, que é inerente a sua existência. Somente na angústia per-manece a possibilidade de uma abertura privilegiada na medida em que ela singulariza, esta singularização retira a presença de sua decadência e lhe revela a propriedade e impropriedade como possibilidades de seu ser1 1.

A pr eocupação r evela a solicitude

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no mundo, a mãe, encontra-se em processo de reestru-turação, absorvida no cuidado ao filho hospitalizado9.

A mãe preocupa-se, não apenas com sua criança doente, mas também com os filhos que ficam em casa, com as atividades domésticas, alterações financeiras no or-çamento da família, demonstrando que os muros do hospi-tal não são suficientes para distanciá-la do mundo exterior, da vida anterior à doença e à hospitalização. Através dos discursos, pude perceber que a consciência dessa proble-mática gera sofrimento para as mães:

é ruim fica r lo nge po rque te m o s o utro s e de

i-xa r trê s filho s pe que no s e um a m ã e pa ra lítica

e m ca sa é um b o ca do ruim ( ...) e e u se m pre

pe nso no s o utro s que fica ra m lá so zinho s( ...)

e u m e pe go a le m bra r de lá do s bichinho s que

fica ra m só , e a í, na m e sm a ho ra e u o lho pra

ca m a e ve jo m inha filha do e nte e e u cho ro , e

fico co m a ca be ça que nte ( ...) ,lá m e u e spo so

tá pa ra do , tá se m tra ba lha r, po rque que m va i

cuida r do s o utro s e da ca sa e do ga do e do sítio

se e le nã o fica r lá ?! ( ...) se i que se e u pre cisa r

fica r m uito te m po a qui va i se r difícil po rque

nó s nã o te m de o nde tira r dinhe iro nã o .

A preocupação é um dos modos do cuidado existencial se manifestar, uma vez que ela se aplica na relação do ho-mem com as outras pessoas, que também se encontram lançadas no mundo1 1. A inautenticidade que o homem in-corre no cotidiano faz com que ele coisifique as pessoas, ocupando-se delas, ao invés de preocupar-se com você mesmo. Sendo assim, a mãe preocupa-se com o filho, na medida em que, na sua relação de cuidar, ela o considera como igual, como um ser autêntico, dotado de sentimen-tos e necessidades próprios, e divide com ele o sofrimento de enfrentar a hospitalização. Essa atitude de solidarieda-de, de responsabilidasolidarieda-de, apresenta-se como inerente à con-dição de progenitores.

A preocupação com o outro de solicitude, que é uma atribuição do ser humano que adota uma maneira autênti-ca de cuidar do outro, com zelo, atenção, respeito às sin-gularidades do ser1 0. As descrições desvelam a autenticidade do cuidado oferecido pelas mães a suas crianças, expressos através da solicitude. Pude perceber que a mãe expressa

esse modo de cuidado ao deparar com o sofrimento dos filhos, por vivenciar a doença, a dor e os procedimentos invasivos:

fic o do idin ha q u a n do vã o fu ra r e la , é a m e

s-m a c o isa q u e s-m e s-m a ta r, po rq u e e u só po sso

o lha r a do r de m in ha filha ( ...) dá u m a a

fli-ç ã o tã o gra n de de ve r m e u filho n a m ã o do s

o u tro s, te n do q u e se r fu ra do , q u e pa ssa r po r

u m a c i ru rgi a ( ...) e u só q u e ri a po de r a ju

-da r e le .

Os caminhos da esper ança

O aspecto religioso revelou sua forte representação no imaginário das mães e o modo de enfrentamento utili-zado por elas foi a confiança em Deus, a resignação à pro-vidênc ia divina. Essa po stura aparec e maquiada no s depoimentos através de frases como “Deus é quem sabe”, “Nosso senhor me conforma”, que contradizem emoções que expressaram, até mesmo, através do pranto. Os mo-mentos de angústia relatados são alternados por momo-mentos de alívio, geralmente fundamentado na esperança de cura e na resignação diante da vontade de Deus:

( ...) m a s se r m ã e é isso , m ã e te m q ue pa ssa r po r tudo m e sm o e m no m e do s filho s, a té co m a m ã e de Je sus fo i a ssim ( ...) a ge nte te m é q ue pe dir à De us pra e le da r o je ito da ge nte a güe nta r, e le é q ue sa b e q ua l de ve se r o de sti-no da ge nte ( ...) te m ho ra q ue e u a cho q ue De us m e de u e sse filho do e nte pra se r um a pro va ç ã o n a m in ha vida , pra se r u m a difi-c ulda de á m a is q ue e u te nho q ue e nfre nta r ( ...) fa ze r o q ue e ntã o , se De us pe rm ite q ue e ssa s c o isa s a c o n te ç a m n a vida da ge n te é po rq ue a ge nte te m q ue pa ssa r po r isso .

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Na presença, a angústia mostra o ser para o poder-ser mais próprio, isto é, o ser-livre para a liberdade de assumir e esco-lher a si mesmo. A angústia arrasta a pre-sença para o ser-livre, a interpretação e o discurso cotidiano constituem a prova mais imparcial de que a angústia, enquanto disposição fundamental, empreende uma abertura1 1.

Até que ponto incentivar a resignação à vontade de Deus, como forma de enfrentar mais facilmente a hospi-talização e a doença, é uma atitude autêntica, é um cuidado que visa promover uma existência autêntica? Embora seja indubitável a importância da religiosidade, como mecanis-mo de enfrentamento que se mecanis-mostra eficaz, há que se aten-tar para o comprometimento que essa posição pode causar ao cuidado autêntico que a Enfermagem intenta oferecer.

PONTOS DE REFLEXÃO

A hospitalização emergiu dos discursos, como uma circunstância difícil de ser enfrentada, que gera um des-conforto emocional na criança enferma e em sua família. Por outro lado, as políticas de saúde vigentes, por permi-tirem que hospitais superlotados e sucateados, com nú-mero insuficiente de trabalhadores, configurem-se como uma realidade da Saúde Pública brasileira, incrementam a problemática da hospitalização no universo da família que a vivencia.

A preocupação surge de uma relação empática com o filho hospitalizado, uma vez que a mãe, não apenas “se ocupa de”, não coisifica sua criança, mas sim, compreen-de-a como ser autêntico, dotado de sentimentos, emoções e vontades próprios que devem ser respeitados. O cuidado que as mães revelam é autêntico e chamado por Heidegger de solicitude.

Há nessa relação o compromisso e interesse de com-partilhar com o filho o sofrimento pela internação e ainda, de fornecer um porto seguro, uma referência no novo mundo que se apresenta à criança hospitalizada. A mãe cuida com envolvimento, com preocupação e amor. Porém, ao perce-ber que seus esforços não garantem, por si só, a recupera-ção de seus filhos, as mães se angustiam ainda mais e dessa forma têm a oportunidade de existir autenticamente, pois a angústia aproxima o ser de sua condição ôntica no mun-do, fazendo-o perceber-se como ser que sempre pode ser mais, ao enfrentar seus medos e dificuldades.

Para que as mães transcendam o estresse advindo da ho spitalizaç ão , é nec essário que c o nstruam relaç õ es empáticas e autênticas com os profissionais de saúde, pois estes compõem o cenário onde elas vivenciam essa experi-ê nc ia e s ã o ta m b é m c uida do r e s de s e us filho s . O distanciamento entre os que cuidam e a pessoa que recebe cuidados, assim como sua família, contribuem para que surjam sentimentos como medo, ansiedade, angústia, inse-gurança entre outros, gerando sofrimento psíquico1 2.

Porém, os profissionais do hospital parecem não perceber as alterações nos comportamentos das mães como produto do desc onforto advindo do adoec imento e da hospitalização de suas crianças, muito menos como fatores que podem comprometer a saúde mental desses sujeitos, já que eles negligenciam o cuidado à família, em detri-mento da responsabilidade de tratar fisicamente das crian-ças. Através das descrições, percebi que esse contato com a família da criança hospitalizada, muitas vezes é manipula-do pela equipe de saúde, que se distancia e superficializa o cuidado oferecido às mães, na medida em que não há res-peito a suas individualidades nem a sua capacidade de se-rem senhoras de sua própria transcendência.

Creio que há ainda muito a ser entendido e compar-tilhado, no que diz respeito aos sentimentos vivenciados pelas mães e na influência que eles têm sobre o bem-estar de seus filhos. Acredito que o desenvolvimento de estudos como este aproximam os cuidadores daqueles que rece-bem esse cuidado e contribuem, assim, para a construção de uma nova prática dentro dos hospitais, pautada numa relação autêntica, que priorize a individualidade do ser humano e suas singularidades. Por outro lado, desde já percebo a necessidade de haver redimensionamento nas políticas públicas de saúde a fim de viabilizar o aperfeiço-amento técnico dos profissionais, mas também de aprimo-rar seu papel de “entes” cuidadores de outros seres humanos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Rev. RENE. Fo r taleza, v. 6 , n. 3 , p. 8 7 - 9 4 , set./dez.2 0 0 5 9 4

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4 . Berenstein I. Família e doença mental. São Paulo: Es-cuta; 1 9 8 8 .

5 . Penha J.O que é existencialismo. São Paulo: Brasiliense; 1 9 9 8 .

6 . Neman FA. Experienciando a hospitalização com a famí-lia:cuidado cm conforto. 2ª ed. São Paulo: Fiuza; 2002. 7 . Silva LF. Cuidado de enfermagem em terapia intensiva cardiológica: hermenêutica do conceito fundamenta-da na fenomenologia heideggeriana [ tese] . Fortaleza: Universidade Federal do Ceará; 2 0 0 2 .

8 . Heidegger M. Ser e tempo parte II. 2 ª ed. Petropólis: Vozes; 1 9 9 0 .

9 . Motta MGC. O ser doente no tríplice Mundo da crian-ça, família e hospital:uma descrição fenomenológica das mudanças existenciais. Florianópolis: UFSC Centro de Ciências da Saúde; 1 9 9 8 .

1 0 . Heidegger M. To do s nó s, ninguém: um e nfo que fenomenológico do social. São Paulo: Moraes; 1 9 8 1 . 1 1 . Heidegger M. Ser e tempo parte I. 4 ª ed. Petrópolis:

Vozes; 1 9 9 3 .

1 2 . Silva MSA. A pessoa enferma e a hospitalização. Rio de Janeiro: Ed. Anna Nery/UFRJ; 2 0 0 1 .

RECEBIDO: 1 5 /1 2 /0 3

Referências

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