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A limitação dos livros didáticos do ensino fundamental II : uma análise sob o viés do preconceito e variação linguística

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Academic year: 2023

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A limitação dos livros didáticos do ensino fundamental II:

Uma análise sob o viés do preconceito e variação linguística1

The limitation of elementary school II textbooks: An analysis under the bias of prejudice and linguistic variation

Viviane Guimarães Parente2

Jacimara Ribeiro Merizio Cardozo

RESUMO

O artigo tem como objetivo investigar como a variação linguística é contemplada nos livros didáticos do ensino fundamental II que são disponibilizados nas escolas públicas Estaduais do Espírito Santo na cidade de Serra, com o fito de apontar incompletudes identificadas nos materiais em questão. Para a construção do artigo, foi realizada uma pesquisa qualitativa e bibliográfica, investigando os dois livros didáticos do 6 ano, sendo um da “Geração Alfa” e outro da coleção “Tecendo Linguagens”, dessa forma, a fundamentação teórica está baseada em autores que discutem a sociolinguística e ensino, como a Stella Bortoni Ricardo (2004, 2005, 2014), Carlos Alberto Faraco (2008) e principalmente Marcos Bagno (2003, 2007a).

Palavras-chave: Variação linguística. Ensino. Livros didáticos. Preconceito.

SUMMARY

The article aims to investigate how linguistic variation is contemplated in elementary school II textbooks available in state public schools in Espírito Santo in the city of Serra in the sixth year series, with the aim of pointing out incompleteness identified in the materials in question. For the construction of the article, a qualitative and bibliographical research was carried out, investigating the two textbooks of elementary school II, one of the “Alpha Generation” and the other of the “Tecendo Linguagens”

collection, in this way, the theoretical foundation is based on authors that discuss sociolinguistics and teaching, such as Stella Bortoni Ricardo (2004, 2005, 2014), Carlos Alberto Faraco (2008) and mainly Marcos Bagno (2003, 2007a).

Keywords: Linguistic variation. Teaching. Didatic books. Prejudice

1. INTRODUÇÃO

A escola é um ambiente no qual predomina uma grande variabilidade linguística, pois há pessoas de diversas culturas, crenças, etnias, entre outras pluralidades. Diante disso, é perceptível que a língua não é estática e há uma ampla diversidade linguística, devido a diversos fatores, o que implica direta e/ou indiretamente na pronúncia, vocabulário e construção de sentenças dos falantes. Contudo, a norma padrão da língua portuguesa tem um lugar de hierarquia nas gramáticas e nos livros didáticos, o que permite a existência e disseminação do

1 Trabalho Final de Curso da Pós-Graduação lato sensu em Licenciatura em Letras Português do Ifes Campus Vitória.

2 Viviane Guimarães Parente, Ifes, vivianeguimaraesparente@hotmail.com.

³Professora orientadora, mestre em Letras, docente no Instituto Federal do Espírito Santo

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certo e errado na língua falada. Vale ressaltar que a norma culta é importante para o ensino de língua portuguesa, contudo não deve ser o único meio de aprendizagem, pois é impraticável o monitoramento de todas as regras gramaticais. O educando já sabe o português, ele entra na escola com sua língua internalizada e é capaz de reproduzir seu discurso de maneira coerente em sociedade, porém o ato de a sociedade reafirmar a existência de falas erradas os faz acreditarem que sempre aprenderam a falar errado, então, ao se depararem com tantas regras no ambiente de ensino, julgam o português como difícil. De acordo com Bagno “Todo falante nativo de uma língua sabe essa língua. Saber uma língua, no sentido científico do verbo saber, significa conhecer intuitivamente e empregar com naturalidade as regras básicas de funcionamento dela.” (BAGNO, 2007a, p. 35)

É necessário ser sábio para reagir em certas situações, locais e pessoas diferentes para viver bem em sociedade. Tais práticas já são avanços graduais no ensino-aprendizagem. Em contrapartida, ainda falta desenvolver os níveis, os tipos das variantes e trabalhar mais questões reflexivas para o aluno ir além da transcrição de passar as escritas coloquiais para o português na norma padrão (BORTONI-RICARDO, 2005).

Dessa forma, a questão problematizadora deste artigo é investigar quais são as formas de limitação dos livros didáticos analisados quanto ao ensino da variação linguística. Para isso, o objetivo geral é analisar os livros didáticos do 6º ano, aplicados em 2018, nas escolas públicas estaduais do Espírito Santo na cidade de Serra, apontando incompletudes identificadas nos materiais, buscando evitar disseminação do preconceito linguístico nas escolas.

Vale ressaltar que os objetivos específicos foram baseados nas orientações de Bagno 2007b, que são: investigar se há uma limitação da análise da variação quanto à restrição apenas aos usos da população rural, pobre, analfabeta; Fazer um mapeamento quanto à exploração do nível de variação a fim de investigar se o LD se limita a sotaque e vocabulário ou se há investigação morfossintática; Observar se os livros didáticos analisados apresentam a variação linguística somente como pretexto para dizer que o que vale mesmo é a norma-padrão.

Este artigo organiza-se em seções, a primeira seção é a Revisão da literatura que se ramifica em o Fenômeno da variação que trata de apresentar a mudança da língua e as comparações do momento atual com a idade média, tendo como embasamento principalmente Faraco (2008) e Bagno (2003). O Preconceito linguístico, Mitos que é dissertado acerca de cada mito, expondo as problemáticas dentro do olhar sociolinguista (BAGNO,2007a) e Variação e do ensino, que comenta a respeito da variação linguística no contexto educacional e as consequências que o ensino-aprendizagem sofre por excluir as diferenças comunicativas.

Em sequência, a metodologia da pesquisa é feita sob a análise de livros, em que há recortes e

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comentários de cada parte que aborda a questão da variação. Logo após, tem-se o resultado de análise dos livros e nesta divisão, o estudo é dialogado com os principais autores citados na fundamentação teórica.

REVISÃO DA LITERATURA

2.1 O FENÔMENO DA VARIAÇÃO

A princípio, se faz necessário entender o que é variedade linguística, que segundo Faraco (2007) é o “resultado das peculiaridades das experiências históricas e socioculturais do grupo que a fala”, sendo necessário entender como o grupo se constitui, qual sua condição socioeconômica, qual sua organização social, quais são seus valores e sua visão de mundo, além de sua possibilidade a acessar a escola, e os meios de comunicação. (FARACO, 2007, p.

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Desde que a língua existe, o fenômeno da variação acompanha a sociedade por diversos fatores linguísticos e extralinguísticos, sendo assim, não cabe falar que a língua é homogênea.

Além de ser um meio interacional, é um fenômeno identitário, logo não deveria ser tão discriminado, contudo, os mitos de que a língua deve ser "perfeita'' e “correta” tendem a serem reproduzidos com frequência, então, o preconceito linguístico exclui e silencia parte da identidade de muitos brasileiros.

Mesmo o Brasil sendo um lugar com uma vasta extensão territorial e diversidade, ainda há muito preconceito com a língua no corpo social, pois a ilusão de que a língua é uma unidade, é um mito muito externalizado e por consequência, internalizado. A língua falada possui uma grande variedade dialetal.

[...] a ideia de que existe uma “variedade padrão” “uma língua padrão” ou um “dialeto padrão” quando de fato existe é uma norma padrão no sentido mais jurídico do termo norma, que não é língua, nem dialeto, nem variedade, já que não é falada (nem mesmo escrita) por ninguém, e não existe língua, dialeto nem variedade sem falantes reais;

(BAGNO, 2007b, p.19)

A norma padrão foi repercutida socialmente de maneira danosa, expondo-a atualmente como melhor, mais correta e superior. Ao contrário do que é pensado e disseminado, a língua não é estática, além disso não existe língua correta, errada ou imperfeita, existe diversidade linguística e estranho seria se todo mundo falasse do mesmo jeito e a língua continuasse a mesma por tanto tempo.

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2.2 PRECONCEITO LINGUÍSTICO

Segundo o linguista Marcos Bagno, o preconceito linguístico é qualquer ato desrespeitoso que se refere às variações linguísticas. De acordo com Bagno (2007a) é importante ter ciência de que qualquer falante nativo de uma língua sabe usar sua fala de maneira competente. Além disso, o preconceito linguístico deriva de um padrão imposto pela sociedade que julga como“erro” tudo que sai da norma culta da língua portuguesa.

Portanto, para uma melhor compreensão do preconceito linguístico, é pertinente saber um pouco da história e desenvolvimento desse fenômeno social. A linguística, desde o século XIX, busca uma relação entre língua, linguagem e sociedade, dentro de um contexto histórico social e cultural, a fim de comprovar que a língua falada é mutável.

Dentro dessa perspectiva, vê-se também um duelo no que tange a linguagem, visto que, falantes leigos da língua tendem a taxar a variação de forma negativa, discursando que a variação estaria empobrecendo e degenerando a língua falada. Em contrapartida, outros indivíduos, afirmam que a variação é um sistema linguístico positivo, sinônimo de praticidade e simplicidade. (FARACO, 2008). Então, se for comparado um texto escrito na Idade Média, século XII e um atual, fica visível a dificuldade de compreensão, visto que a linguagem da época era totalmente diferente, então em vista disso, chega-se à conclusão de que a língua portuguesa se modificou ao longo do tempo. (BAGNO, 2003)

2.3 MITOS: CONSEQUÊNCIAS DO PRECONCEITO LINGUÍSTICO

Estudiosos da área afirmam que a língua é sobretudo uma identidade do sujeito que denuncia a regionalidade, escolarização, entre outros fatores externos, então o que deveria ser motivo de enaltecimento e orgulho, virou preconceito. “Essas crenças sobre a superioridade de uma variedade ou falar sobre os demais é um dos mitos que se arraigou na cultura brasileira.

Toda variedade regional ou falar é, antes de tudo, um instrumento identitário, isto é, um recurso que confere identidade a um grupo social” (BORTONI-RICARDO, p. 33, 2004).

Diante do exposto, os mitos que Bagno aborda em seu livro “Preconceito linguístico:

Como é, como se faz?” mostram claramente as consequências dos preconceitos linguísticos, dessa forma alguns em especial são mais disseminados que outros, como por exemplo o mito número um (1)“A língua portuguesa falada no Brasil apresenta uma unidade surpreendente”

(BAGNO, p.15 2007a). Qualquer pessoa que viva socialmente tem em seu dialeto uma imensa variabilidade linguística, além disso, cada ser possui uma realidade distinta da outra, portanto

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a escola deve abominar o termo de que a língua é una, porque também há muita desinformação e desconhecimento da realidade do sujeito para quem se fala.

Em sequência, Bagno mito número três (3) “Português é muito difícil” (BAGNO, p.35, 2007a), tal afirmação só é considerada para quem não leva em consideração o português diversificado do Brasil. De acordo com Bagno “[...] toda e qualquer língua é “fácil” para quem nasceu e cresceu rodeado por ela! Se existisse língua “difícil”, ninguém no mundo falaria húngaro, chinês ou guarani, e, no entanto, essas línguas são faladas por milhões de pessoas [...]”. (BAGNO,2007a, p.36) Diante de tal afirmação, é possível perceber a impossibilidade de viver em um país e não saber a própria língua.

Seguindo, tem-se o Mito número quatro (4) “As pessoas sem instrução falam tudo errado” (BAGNO, p.40, 2007a). Bagno diz que pessoas que falam Cráudia, chicrete por exemplo, trocam o L pela letra R, são taxadas como ignorantes, mas não como reprodutoras de uma variação fonética. Percebe-se claramente que “[...] o problema não está naquilo que se fala, mas em quem fala o quê. Neste caso, o preconceito linguístico é decorrência de um preconceito social.”, além disso, Bagno cita Luís de Camões, o escritor de uma das obras mais conhecidas na literatura brasileira, nomeada como Os Lusíadas. Então Bagno diz que tal material contém essas variações já citadas, como pranta, frauta, ingrês, entre outras expressões que seriam consideradas erradas.

Em consonância, o mito número seis (6) “O certo é falar assim porque se escreve assim”

(BAGNO, p.52, 2007a) é extremamente disseminado nas escolas, pois há professores que corrigem seus alunos e os instigam a crer neste mito. É sabido que a norma padrão é válida, mas não deve ser obrigatória, claro que para momentos deve-se utilizar o vocabulário específico, mas também é preciso levar em consideração os sotaques, como por exemplo Bagno cita: “Diante de uma tabuleta escrita COLÉGIO é provável que um pernambucano, lendo-a em voz alta, diga CÒlégio, que um carioca diga CUlégio, que um paulistano diga CÔlégio.”

(BAGNO, 2007a, p. 52).

Por último, o mito número oito (8) “O domínio da norma culta é um instrumento de ascensão social” (BAGNO,2007a, p.69), é uma inverdade também muito séria, pois leva as pessoas crerem que apenas quem fala culto, é capaz de conquistar oportunidades na vida, mas saber a norma culta não é garantia, pois isso não é suficiente para uma ascensão social. É preciso que haja uma liberdade linguística, para que o indivíduo conheça, sim, a norma padrão,

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mas também tenha acesso às pluralidades do país. O fato é que as conquistas são alcançadas através de acesso a tecnologias, boas leituras, lazer, conhecimento, liberdade, enfim, direitos que todo o cidadão deve possuir. Dentro dessa perspectiva, sabendo que a variedade linguística é a maneira de expressão de um mesmo idioma que varia de acordo com a cultura, crença, faixa etária, gênero, classe social e lugar, julgar a fala do outro é uma problemática postulada pela sociedade, pois a língua é passível a mudanças e um dos principais modos de erradicar mesmo que de maneira gradativa o preconceito linguístico é buscar meios para a expansão da competência comunicativa.

2.4 VARIAÇÃO E ENSINO

Não é incomum ver pessoas de diferentes crenças, lugares e culturas se expressando de maneiras diversas, seja por fatores regionais, sociais, culturais, entre outros, principalmente nas escolas, há uma tendência muito forte na valorização apenas da linguagem padrão, como se fosse a única forma de expressão aceitável, em que professores pregam esta dicotomia de certo e errado na fala, o que evidentemente é prejudicial para o desenvolvimento do ensino- aprendizagem e autoconhecimento do aluno, tal ato é uma prática que exclui a heterogeneidade da língua, e está inteiramente ligado ao preconceito linguístico. Segundo Bagno (2007b),

Muito frequente também é o tratamento da variação se limitar a comparar sotaque léxico do português brasileiro e do português europeu, sem se aprofundar Nas questões mais importantes para o ensino no Brasil e transformando a variação linguística ainda que involuntariamente numa lista de coisas engraçadas e curiosas, uma espécie de anedotário. (BAGNO, p.132, 2007b)

É por isso que o indivíduo passa a acreditar que “seu modo de falar por não estar representado no livro é estranho ou errado, essa crença muda difundida na nossa cultura está bem sintetizada em declarações do tipo.” (BAGNO, p.129, 2007a). Contudo, de acordo com Marcos Bagno “O português são três: uma Norma padrão que não é a língua de ninguém, um conjunto de variedades estigmatizadas e um conjunto de variedades prestigiadas cada um deles é caracterizados pelos grupos sociais específicos” (BAGNO, p.131, 2007b). Ademais,

[...] existe um nível mais profundo de variação linguística que em geral é pouco abordado: a variação morfossintática, ou seja, os usos diferenciados de cada grupo social faz dos recursos gramaticais da língua. E são alguns desses fenômenos morfossintáticos variantes os que deveriam se tornar o foco principal da educação em língua materna, porque da boa compreensão desses fenômenos vai defender todo o

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trabalho do letramento que a escola deve empreender com seus alunos. (BAGNO, p.

132, 2007b)

Diante do exposto, dentro do ambiente escolar, o professor deve desmistificar mitos, apresentando as diversas formas de variações, então, abordar a diversidade linguística juntamente com o impasse do preconceito linguístico no ensino é um grande desafio frente a uma sociedade incorporada por mitos e repleta de preconceitos, dentro dessa realidade, o professor, tendo como ponto de apoio a escola, é interessante que haja uma movimentação para que seja quebrado certos preconceitos através de um ensino dinâmico envolvendo esses assuntos, Bortoni-Ricardo lança o questionamento:

Como levar os professores, sobretudo do ensino fundamental e, mais ainda das séries iniciais, a deixar de acreditar em algo que não existe (o “erro de português”) para, no lugar dessa superstição infundada, passar a observar os fenômenos de variação e mudança linguística de modo mais consistente e cientificamente embasado?

(BORTONI-RICARDO, 2008, p.8)

É imperativo dizer que há a necessidade de desenvolver a reflexão linguística e extralinguística do alunado acerca no que tange a língua e a linguagem, diante disso, vale contemplar o ensino da gramática dando atenção inclusive ao funcionamento da língua em seus diferentes níveis, além de permitir que os alunos tenham acesso desde a norma culta, até as diversas variedades. De acordo com Bagno (2007b) livros didáticos em sua maioria são voltados ao público urbano.

É por isso que, no tratamento da variação linguística, esses livros são unanimemente recorrem a exemplos de variedades rurais e suas próprias regiões (em geral exemplos não autênticos como Chico Bento) ou de variedades de outras regiões brasileiras.

(BAGNO, p.128, 2007b)

Além disso, ainda de acordo com o linguista:

Alguns livros didáticos parecem abordar a variação linguística simplesmente para cumprir as exigências do Ministério da Educação e poder entrar na lista das obras que vão ser compradas e distribuídas. Com isso, o que a gente vê é uma unidade um capítulo dedicado à variação linguística em termos "politicamente corretos" - em que se denuncia o preconceito linguístico, por exemplo, e se prega a tolerância e o respeito por todas as variedades - em contraste radical Com todo o resto do livro, em que as questões gramaticais são abordadas de maneira extremamente conservadora e autoritária, com insistência na denúncia dos "erros comuns" e na prescrição de formas

"certas", em geral já caídas em desuso, mesmo mesmo nos gêneros escritos mais monitorados. (BAGNO, 2007b, p.135)

Antes de mais nada, o docente deve conhecer a realidade do aluno, para que o indivíduo sinta-se bem e seguro de julgamentos. Tendo ciência disso, Bortoni-Ricardo compreende que:

Os papéis sociais são construídos no próprio processo de interação humana. Isso porque,

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quando se utiliza a linguagem para a comunicação, também é construído e reforçado os papéis sociais próprios de cada domínio.” (BORTONI-RICARDO, p.23, 2004, )

Então, faz-se necessário um olhar de reflexão e acolhimento ao indivíduo em formação, além de um certo grau de conhecimento do professor acerca das variações linguísticas existentes em nosso meio, isso também porque, como afirma em uma de suas obras, a linguista Bortoni-Ricardo: “A escola não pode ignorar as diferenças sociolinguísticas. Os professores e, por meio deles, os alunos têm que estar bem conscientes de que existem duas ou mais maneiras de dizer a mesma coisa.” (BORTONI- RICARDO, p.15, 2005)

Dentro desse olhar, compreende-se a pertinência de o aluno saber que além de não existir a dicotomia certo e errado em nossa fala, é preciso que ele tenha a ciência que existe a variedade linguística e junto a isso, também o preconceito. Sendo assim, o foco é permitir que o aluno se expresse de sua maneira e compreenda a variedade dialetal da própria língua, pois assim será capaz de conviver plenamente em sociedade e diante de diversas situações.

3. METODOLOGIA

Este estudo caracteriza-se por ser uma pesquisa analítica, que visa observar como o livro didático do ensino fundamental II contempla a variação linguística, para que através das observações e apontamentos seja possível provar as limitações e incompletudes expostas nos livros didáticos, além de possibilitar o entendimento do que é e qual a importância desse fenômeno na escola. O corpus de análise será o recorte composto pela coleção “Tecendo linguagens" escrito pelas autoras Tania Amaral Oliveira e Lucy Aparecida Melo Araújo, e

“Geração Alpha Língua Portuguesa” das autoras Cibele Lopresti Costa e Greta Marchetti.

Ambos são utilizados na rede pública Estadual do Espírito Santo, na cidade de Serra, sendo enviado às instituições de ensino através do Fundo Nacional da Educação (FNDE) pelo Ministério da Educação como parte do Programa Nacional do Livro e Material Didático (PNLD).

Então o primeiro passo foi:

● Investigar se há uma limitação da análise da variação quanto à restrição apenas aos usos da população rural, pobre, analfabeta. Isto é, observar se a escrita e as personagens giram em torno apenas desse meio.

O segundo passo foi:

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● Elaborar um mapeamento quanto à exploração do nível de variação a fim de investigar se o LD se limita a sotaque e vocabulário ou se há investigação morfossintática. Ou seja, se trabalha a questão do verbo, regência ou foca mais no vocabulário e expressão.

E por fim, no terceiro passo, o foco foi:

● Observar se os livros didáticos analisados apresentam a variação linguística somente como pretexto para dizer que o que vale mesmo é a norma-padrão. Apresentando atividades que falam de certo e errado, propondo reescritas para retirar a essência da variação, por exemplo.

4. ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS

É inegável dizer que o papel do professor é de suma importância, pois é na sala de aula através do docente que o alunado entenderá de maneira mais clara qualquer questão que tenha ficado duvidosa, desta forma alguns profissionais tendem a adaptá-lo dentro da realidade que os alunos se inserem, o que de fato é pertinente para uma melhor compreensão, além de tornar o conteúdo muito mais interessante.

Conforme Bagno (2007a) a história evidencia que a nossa cultura existe o mito do monolinguismo, devido ao conhecimento de que o brasileiro é falante de português. Mas na verdade é que, no Brasil existe uma pluralidade de línguas como: línguas indígenas, línguas europeias e asiáticas. Pois no Brasil, o plurilinguismo sempre foi emudecido (BAGNO, 2007a).

Vale dizer que alguns livros não estão adaptados de acordo com a realidade do aluno, do professor e da escola, então, faz-se necessária uma certa modificação para o ensino tornar- se perspicaz, então, espera-se que o aluno use a linguagem para produzir textos orais, leitura e produção de textos escritos que atendam às demandas sociais, além de conhecer e valorizar a diversidade linguística e o grupo social que se insere, fazer utilização do conhecimento atingindo uma análise linguística para ampliar a capacidade do uso da linguagem. É importante salientar que a língua deve ser vista e apresentada como um fenômeno heterogêneo, plural, objeto de comunicação e interação social. O docente deve abranger o trabalho com fenômeno da variação e preconceito linguístico de forma que vá além do livro didático, com o fito de que o aluno possa compreender o papel da língua e se sinta livre para interagir livremente, assim afirma Bortoni-Ricardo (2005).

Portanto, foram analisados dois livros didáticos do sexto ano, tais escolhas foram feitas por serem editoras reconhecidas e adaptadas nas escolas. A priori, é importante dizer que ambos os livros apresentam linguagem simples e objetiva, de acordo com a norma padrão da língua, contudo não são comentadas a existência, tampouco a importância da variação linguística, no

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máximo, os autores apresentam alguns fenômenos de uso coloquial da língua, gírias, estrangeirismos e regionalismos, não exploram os níveis e tipos.

Quadro 1. Descrição dos livros utilizados

LD TÍTULO AUTORES EDITORA ANO ESCOLA

01 Tecendo

Linguagens

Tania Amaral Oliveira, Lucy Aparecida Melo Araújo

IBEP 6º ANO EMEF Sônia Regina

Gomes Rezende Franco/ Serra

02 Geração Alpha

Língua Portuguesa

Cibele Lopresti Costa, Greta Marchetti

SM Educação 6º ANO EMEF Sônia Regina Gomes Rezende Franco/ Serra

Fonte: Próprio autor, 2022.

4.1. A variação da língua e os estigmas sociais

A primeira estratégia utilizada para a análise dos materiais didáticos foi investigar se há uma limitação da análise da variação quanto à restrição apenas aos usos da população rural, pobre, analfabeta. Esta característica foi vista no livro da Geração Alpha em que os autores levam apenas textos rurais para trabalhar a variação linguística, como o conto Os dois papudos, As três onças, a música Oiá eu aqui, que gira em torno do contexto rural, além disso no livro Tecendo linguagens é abordado a expressão “a gente aparecemos”, em uma fala do aluno para seu professor, esta expressão é caracterizada por ser dita por um indivíduo que ainda não foi escolarizado.

O livro “Geração Alpha Língua Portuguesa”, a caminho da seção que aborda a variação linguística, é desenvolvido na Unidade 2 “Conto Popular”, em seu 1º capítulo com o título

“Histórias daqui” uma parte nomeada Variações Linguísticas: variedades regionais nas páginas 50 a 53. Diante disso, inicia-se com atividades relacionadas a variações regionais, acompanhado de um trecho do conto os dois papudos, que são dois personagens rurais sem alto poder aquisitivo, isso instiga o aluno a perceber sotaques e expressões usadas culturalmente em determinadas regiões.

Na letra A é solicitado um trabalho de dedução, assim o aluno deve relacionar o ato de tocar viola com outra expressão caipira apresentada no texto; na letra C pede ao aluno para mudar a expressão “pinicava as cordas” para “tocar viola”, para que se aproxime mais de uma linguagem formal, contudo, inibirá toda a essência e riqueza da variação linguística regional;

na letra E, pergunta porque e por quem a expressão anterior foi registrada, para dessa forma o

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aluno entender que está em um contexto rural. Portanto há uma limitação pois o foco foi apenas o uso da população rural.

Figura 1 - Respostas às atividades.

Fonte: Costa, 2018.

Figura 2 - Atividades de variação linguística.

Fonte: Costa, 2018.

Posteriormente, há uma breve conceituação do que é o fenômeno da variação linguística, além de trechos denominados “Anota aí” há explicações de como ocorre a variedade regional, o que são as variedades urbanas de prestígio e da norma padrão, tal espaço traz informações que são de extrema importância, pois possibilita que o aluno tenha um entendimento inicial sobre determinado assunto, além de permitir com que ele possa contextualizar as variações regionais através de contos, músicas e crônicas. Sendo assim, então, vê-se que o material didático do 6º ano do ensino fundamental II tem como objetivo focar na variedade regional, social e na norma padrão.

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Figura 3 - Anota aí.

Fonte: Costa, 2018.

Na figura 4 e 5, os autores fazem uso da música “Óia eu aqui de novo” o eu lírico trabalha as questões regionais, pois é uma dança pernambucana do Nordeste brasileiro, vê-se claramente pelo vocabulário e construção de frases rurais. Na letra A, pergunta o que é a palavra “xaxado”, para a partir daí o aluno entende que a música é de uma região específica, já na letra C, o autor pergunta qual termo vai em desacordo com a norma padrão fazendo com que a expressão da canção nordestina perca a essência, assim reforçando a soberania da norma padrão.

Figura 4 - Canção (parte 1).

Fonte: Costa, 2018.

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Figura 5 - Canção (parte 2).

Fonte: Costa, 2018.

Já na Figura 6 é explorada “A variação linguística e a caracterização de personagens”

onde há atividades que utilizam o conto “Trezentas onças” de João Simões Lopes Neto. Contos gauchescos. Porto Alegre: Globo, 1976; também entrelaçando a variação linguística e norma padrão com o texto literário com perguntas reflexivas, mas limitadas somente ao que está sendo apresentado, sem dar chance ao aluno de refletir dentro do seu contexto social e familiar. O material apresenta a diversidade linguística existente nas diferentes regiões do país (Nordeste), sendo o falante é de comunidade rural primeiramente pelo título já citado “onças” que se refere ao dinheiro, que é uma expressão nordestina, em “vendas de gados” já é perceptível a ruralidade. Além de tentar desenvolver a norma padrão expondo que a língua sofre mudanças constantes, ou seja, não é estática. Contudo, as autoras limitam o processo de ensino- aprendizagem, pois se voltam apenas para as variantes regionais e sociais, contextualizando-as a textos literários.

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Figura 6 - Caracterização das personagens.

Fonte: Costa, 2018.

Com a interpretação desse conto, os discentes são instigados a entenderem um pouco das variedades regionais relacionando-as com o texto literário, dessa maneira será possível perceber o estilo e informações acerca do personagem, inclusive dos dialetos que ele utiliza, como tais: onças, vancê, acoquine, entre outras; são palavras reproduzidas que poderiam ser substituídas por palavras que fazem parte da norma culta, outro exemplo é a expressão

“pinicava cordas” que significa “tocar viola”, conforme é notado no exercício da figura abaixo.

Figura 7 - Perguntas caracterização dos personagens.

Fonte: Costa, 2018.

Todavia, há uma limitação da análise da variação, pois o foco é somente quanto aos usos da população rural, pobre, como é mostrado na figura 8 e 9. Vale ressaltar que o problema é como usar os textos para uma pedagogia da variação linguística, há uma limitação da análise da variação, pois o estudo da variação promovido pelo LD se limita a sotaque e vocabulário, não há investigação morfossintática e limita-se a complexidade da variação linguística, pois o livro reforça apenas a soberania da norma-padrão/ linguagem formal.

Figura 8 - Perguntas caracterização dos personagens.

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Fonte: Costa, 2018.

Figura 9 - Perguntas caracterização dos personagens.

Fonte: Costa, 2018.

4.2 Sotaque e vocabulário ou análise morfossintática

Em seguida foi possível elaborar um mapeamento quanto à exploração do nível de variação e analisar que ambos os livros focam mais no sotaque e vocabulário. Além disso, os livros didáticos apresentam a variação linguística somente como pretexto para validar apenas norma-padrão, colocando-a como superior, de tal forma que apresentam atividades que propõe reescritas para retirar a essência da variação, por exemplo na parte que pede para trocar a expressão caipira “pinicava cordas” com “tocar viola”, ou procurar no dicionário a palavra

“xaxado”. Na atividade da letra A, da figura 10, é possível observar novamente o uso da palavra

“xaxado” e palavra, porém, não há aprofundamento em outros níveis de linguagem como a morfossintaxe.

Figura 10 - Palavra “xaxado”

Fonte: Costa, 2018.

Na figura 11, o autor questiona se é possível acontecer durante uma comunicação esse tipo de construção de falas, se referindo ao uniforme da escola e porque os leitores chegaram a

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esta conclusão, em vista disso, a pergunta gera o mínimo de pensamento crítico-reflexivo. É um tipo de atividade que permite apenas que o aluno reproduza o que ele aprendeu sobre a norma culta, dessa maneira reescrevendo a frase apresentada.

Na sequência, especificamente nas figuras 11 e 12, são feitas perguntas sobre a linguagem formal e informal apresentando um pequeno texto com expressões contendo gírias, em seguida, o livro propõe para os alunos refletirem e responderem algumas perguntas, contudo tais não instigam o pensamento crítico, visto que são moldadas a partir de questões de fixação.

O que gerará um pensamento reflexivo é elaborar perguntas que façam o aluno pensar além daquilo que ele vê em sala de aula, é exigir posicionamento e promover questionamentos.

Sendo assim, há a ausência desse requisito nas questões “A” e “D” da página 89 (figura 11), isso porque pede a opinião do estudante, contudo na sequência, o autor indaga se os personagens da imagem anterior falaram corretamente, no momento que é pensado que ele vai fazer uma pergunta mais fora do comum ele traz a questão do certo e errado na gramática, já a letra "D'' pede para o aluno reescrever com a linguagem formal, e aí fica esse ciclo de linguagem formal e informal o tempo todo, como se a língua fosse movida a isso.

Figura 11 - Linguagem formal e informal.

Fonte: Oliveira, 2018

Figura 12 - Molde Para Questões De Fixação.

Fonte: Oliveira, 2018.

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Figura 13 - Aplicando Conhecimentos.

Fonte: Oliveira, 2018. Figura 14 - Exercícios.

Fonte: Oliveira, 2018.

Na imagem acima (figura 13), é apresentada uma charge que faz crítica à educação dos brasileiros, nela contém um personagem que lê a notícia relacionada a escassez da escolarização, já o outro personagem responde que não entendeu a notícia, confirmando essa crítica realidade. As questões propostas para esse texto (figura 14), tem o intuito de instigar a reprodução do conteúdo através do que o professor provavelmente deve ter explicado em sala.

Na letra “A”, é cogitado ao leitor se o texto critica e ironiza a fala do segundo personagem, em sequência, na questão “B” o autor insiste no mesmo assunto citando a linguagem formal e informal, já na questão “C”, mostra que o escritor explora a questão da variedade estilística, pois pergunta ao aluno se em determinado momento é permitido usar o tipo de linguagem das personagens.

Por fim, percebe-se que o livro não expôs que o fenômeno da variação é um aspecto essencial e natural da língua e, portanto, não possibilitou o leitor a pensar que a língua homogênea é uma visão do senso comum não é científica, além disso, os exercícios visam mais uma reprodução do conceito. Vale ressaltar que o material do 6 ano não amplia a variação linguística e firma a reprodução de estereótipos mostrando a variação em tirinhas e não incita o aluno a pensar, pesquisar e sequer valorizar a própria língua, cultura e identidade. Portanto, há uma limitação morfossintática, pois o estudo da variação promovido pelo LD se limita a palavras/expressão, além de reforçar a soberania da norma-padrão/ linguagem formal.

(18)

4.3 Variação linguística como pretexto para a norma padrão.

No livro tecendo linguagens, especificamente na capa final (Figura 15), cita variações de nomes de alguns alimentos, o que instiga o leitor a pensar que o material didático valorizará a variedade linguística em maior parte do conteúdo contido no livro.

Figura 15 - Última Capa.

Fonte: Oliveira, 2018.

Contudo ao abrir o material, já se observa no sumário (Figura 16) que não há sequer um capítulo abordando a pluralidade da língua. Os títulos dos capítulos não condizem com o que será abordado na unidade, vê-se por exemplo na parte “Da escola que temos à escola que queremos”, é o eixo que há uma parte que diz mostrar sobre a variação linguística na página 88, porém nada que tem neste capítulo explica e/ou mostra questões para responder tal frase exposta na unidade, sendo assim, torna-se desnecessária a escrita, além de causar o sentimento de decepção aos leitores com a ausência de conteúdo e coerência.

(19)

Figura 16 - Sumário “Da Escola Que Temos À Escola Que Teremos”.

Fonte: Oliveira, 2018.

Figura 17 - Atividade Norma Culta E Norma Não Culta.

Fonte: Oliveira, 2018.

O tópico da figura 17 se inicia com a frase “a gente aparecemos” que faz destaque à fuga da norma padrão, em seguida é questionado ao leitor se a frase está correta de acordo com as regras gramaticais, isso faz com que prevaleça a preferência em adotar a dicotomia do certo e errado, por consequência reforçando o preconceito linguístico. Além disso, todo o contexto se assemelha ao conto "nóis mudemo” da obra de Fidêncio Bogo, onde também denuncia a realidade de um aluno que é julgado por fugir da norma padrão da língua portuguesa em sua fala.

(20)

Figura 18 - Norma padrão vista como superior

Fonte: Costa, 2018.

Figura 19 - Reescrita para a norma padrão

Fonte: Costa, 2018.

Vê-se na figura 18 que o autor coloca a soberania da norma padrão e na figura 19, também na letra C, o livro pede para “os alunos reescrevem o texto de acordo com a situação de uso e a norma-padrão”

5. Resultado das análises

O fenômeno da variação está sendo integrado de maneira gradual nas escolas, vê-se nos livros das coleções analisadas ao percorrer deste artigo. A abordagem sobre a diversidade linguística, exploração e valorização do tema ainda é pouco abordada, pois não apresenta os tipos e níveis do dialeto brasileiro.

[...] a verdade é que no Brasil, embora a língua falada pela grande maioria da população seja o português, esse português apresenta um alto grau de diversidade e de variabilidade, não só por causa da grande extensão territorial do país — que gera as diferenças regionais, bastante conhecidas e também vítimas, algumas delas, de muito preconceito. (BAGNO, 2007a, p.16)

Compreende-se que durante anos somente a gramática normativa foi ensinada e, portanto, validada na língua portuguesa, sendo assim, podemos identificar o mito número um e número três que são afirmados por Bagno, visto que a nossa cultura é um mito do monolinguismo, em consonância o mito número três de que o português é muito difícil, sendo este um dos fatores por existir essa inveracidade. É imperativo dizer que a variação não é um impasse, pois o único problema é crer que existe uma língua perfeita e acabada (BAGNO, 2007a).

(21)

Diante disso, é possível observar a inclusão da sociolinguística mesmo com algumas faltas nos materiais que visariam um melhor entendimento e compreensão do público-alvo. A linguista Stella Maris Bortoni-Ricardo (2004), alega que “é papel da escola, portanto, facilitar a ampliação da competência comunicativa dos alunos, permitindo-lhes apropriarem-se dos recursos comunicativos necessários para se desempenharem bem, e com segurança, nas mais distintas tarefas linguísticas [...]” (BORTONI-RICARDO, 2004, p.74).

O livro Tecendo linguagens aborda o leitor sobre a norma gramatical, tanto que na primeira atividade ele pede para o aluno colocar a frase dentro das regras gramaticais, isto é pede uma correção na parte “a gente aparecemos” e logo após as questões giram em torno de uma linguagem formal e informal, como se a variação fosse só isso, dessa forma, há o prevalecimento e a preferência em adotar a dicotomia do certo e errado e por consequência o reforço do preconceito linguístico, reafirmando o mito é uma unidade da língua portuguesa (BAGNO, 2007a), além disso, não gera pensamento crítico e posicionamento do aluno.

Sendo assim o mito é muito prejudicial à educação porque, ao não reconhecer a verdadeira diversidade do português falado no Brasil, a escola tenta impor sua norma linguística como se ela fosse, de fato, a língua comum a todos os 160 milhões de brasileiros, independentemente de sua idade, de sua origem geográfica, de sua situação socioeconômica, de seu grau de escolarização etc. (BAGNO, 2007a, p.15)

Vale ressaltar que este material não amplia o entendimento e reconhecimento da variação linguística, não incita o aluno a pensar, pesquisar e sequer valorizar a própria língua, vale salientar também que o grau de complexidade do conteúdo da variação é de pouca abordagem, pois deveria ser mais bem explorado com os recursos literários que se dispõe nos livros. Portanto, há uma limitação morfossintática, pois o estudo da variação promovido pelo LD se limita a palavras/expressão, além de reforçar a soberania da norma-padrão/ linguagem formal.

Já o livro da Geração Alpha, também do sexto ano, limita-se apenas a variação diastrática (regional), em contrapartida, os autores utilizam uma maior diversidade de gêneros textuais como música, revista e conto popular para apresentar o conteúdo. Vale salientar que tal espaço foi de extrema importância para que o aluno tivesse consciência das variedades linguísticas que variam de região para região através de textos literários diversos, assim aumentando o campo de conhecimento dele. Dessa forma, afirmando a ideia de Bagno sobre o mito número cinco (5): Não existe nenhuma variedade nacional, regional ou local que seja intrinsecamente melhor, mais pura, mais bonita, mais correta que outra. Toda variedade linguística atende às necessidades da comunidade de seres humanos que a empregam

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(BAGNO, p.47, 2007a). Há uma limitação da análise da variação, pois o estudo da variação promovido pelo LD se limita a sotaque e vocabulário, não há investigação morfossintática e limita-se a complexidade da variação linguística, pois o livro reforça apenas a soberania da norma-padrão/ linguagem formal.

Sabe-se que nenhum material didático de ensino fundamental vai abordar com profundidade toda o fenômeno da variação, visto que o tempo de abordagem dos conteúdos são limitados e devem estar de acordo com o calendário escolar, além disso os alunos não precisam saber os detalhes, os autores e sociolinguistas renomados, entre outras instrumentos técnicos. Mas, é imprescindível o alunado ter ciência dos níveis e tipos da variação para que tenham consciência da existência dessa pluralidade da língua portuguesa e não ocorra o preconceito linguístico nem a disseminação dos mitos que Bagno (2007a) coloca em seu livro, pois é partir desses mitos que o preconceito é disseminado e heterogeneidade da língua é apagado.

Por fim, no quadro disposto a seguir, foram colocados alguns questionamentos que giram em torno da pesquisa, os quais visam analisar os livros com mais precisão.

Conclusão

A pesquisa teve como objetivo analisar como os livros didáticos do ensino fundamental II trabalham a variação linguística, além de investigar a importância do fenômeno da variação no livro didático. Diante da análise feita, os principais resultados mostram que o fenômeno da variação é integrado gradualmente nas escolas e a abordagem acerca da variação linguística, exploração e valorização do tema ainda é pouco inquirida, pois não apresenta os tipos e níveis do dialeto brasileiro, tampouco instigam a valorização dele através de pesquisas que vão além dos livros.

Percebe-se que variação é apresentada com um grau de complexidade limitado, porque ao mesmo tempo que é dito da existência das variações, o conteúdo prende-se a apenas uma ou duas diversidades linguísticas por meio de atividades que não desenvolvem o conhecimento e reconhecimento do alunado acerca desse fenômeno.

É pertinente ressaltar que o LD muitas vezes é utilizado em sala de aula como um único meio de ensino, então fica difícil internalizar no aluno que existem as variações, sendo que no livro não é reforçado de maneira completa e perspicaz. Vale ressaltar que foi possível observar e apontar paradoxos, incoerências e incompletudes nos livros didáticos adotados nas redes públicas da cidade de Serra, Espírito Santo das turmas de sexto ano.

(23)

De qualquer forma, é inegável não ressaltar que o fenômeno está sendo gradativamente integrado nas escolas, pois não é abrangido somente a variação como a língua formal e informal, isso porque os livros agora tratam da variação estilística, regional, diastrática e diafásica; além dos gêneros textuais diversos como charge, notícias, tirinhas, artigos de opinião entre outros. Em contrapartida, fica em déficit o desenvolvimento de tais recursos e a inclusão dos outros tipos e níveis da língua, promoção de pesquisa do aluno sobre a própria língua e consequentemente a valorização do próprio dialeto.

Com base nos sociolinguistas Bortoni-Ricardo (2004) e Bagno (2007ab) foi identificado quão é desafiadora a aplicabilidade do conteúdo em sala de aula, que trabalha o fenômeno das variantes linguísticas, principalmente de maneira reflexiva e fora dos moldes tradicionais, por isso, ainda há o mito de que o português é difícil e o ensino continua maçante, mas de qualquer forma é importante o aluno entender que a língua é um fenômeno social, mutável, instável e inacabado.

Por meio deste artigo, diante dos três caminhos analisados, foi possível confirmar a limitação dos livros didáticos quanto a variação linguística, podendo ser vista tanto pelo tipo de variação que é exclusivamente regional, quanto ao seu nível que ficou restrito a morfologia das palavras e expressões, não sendo feita uma análise morfossintática, bem como os materiais analisados evidenciam a supremacia e a dicotomia da norma padrão, isto é, tudo deve se ajustar a ela.

Referências:

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BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 49ª edição. São Paulo:

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BAGNO, Marcos. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística.

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BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Heterogeneidade lingüística e o ensino da língua: o paradoxo da escola. In: BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Nós cheguemu na escola, e agora? Sociolinguística e educação. São Paulo: Parábola, 2005.

BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Educação em língua materna: a Sociolinguística na sala de aula. São Paulo: Parábola, 2004.

BORTONI, Ricardo, Stella Maxis. Manual de sociolinguística / Stella N4aris Bortoni- Ricardo. São Paulo: Contexto, 2014.

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Profa. Ma. Jacimara Ribeiro Merizio Cardozo Instituto Federal do Espírito Santo

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