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DIREITO COMPARADO ENTRE AS REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS AMBIENTAIS BRASILEIRA E ESPANHOLA SOB A ÉGIDE DO FEDERALISMO

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DIREITO COMPARADO ENTRE

AS REPARTIÇÃO DE

COMPETÊNCIAS

LEGISLATIVAS AMBIENTAIS

BRASILEIRA E ESPANHOLA

SOB A ÉGIDE DO

FEDERALISMO

MÁSTER EN TERRITORIO, URBANISMO Y

SOSTENIBILIDAD AMBIENTAL EN EL MARCO

DE LA ECONOMÍA CIRCULAR

Trabajo Fin de Máster

Autor:

Armando Luciano Carvalho Agostini Tutores:

Andrés Molina Gimenez

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a minha família – à querida esposa Maria Teresa que me deu forças para trilhar esta longa jornada, bem como meus filhos Arthur e Lara.

Aos dedicados professores do Instituto Universitario del Agua y las Ciencias Ambientales - IUACA, da Universidade de Alicante, em especial a Patrícia Fernández Aracil e ao meu orientador Prof. Dr. Andrés Molina Gimenez, pessoas receptivas e cordiais a quem agradeço imensamente a acolhida durante o período de pesquisa junto ao Instituto.

Agradeço a todos os professores do Curso de Mestrado em Ciência Jurídica da UNIVALI pelos ensinamentos, e o faço na pessoa do meu coorientador Prof. Dr. Marcelo Buzaglo Dantas, que guiou pelo caminho cujo propósito originou esta dissertação, em postura que bem representa o espírito de todo o Corpo Docente.

Agradecimento os meus colegas de mestrado, pessoas dedicadas e altruístas, sempre dispostas a contribuir.

Por fim, agradeço a Assembleia Legislativa de Santa Catarina por conferir todo o apoio institucional necessário para o desenvolvimento desta pesquisa.

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DEDICATÓRIA

De modo especial, dedico a minha fonte inspiradora, a inesquecível mãe Leoniza, que me fez perceber como é importante persistir em nossos objetivos.

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ÍNDICE

RESUMO...p. 05

RESUMEN...p. 06

INTRODUÇÃO...p. 07

1 DA COMPETENCIA LEGISLATIVA AMBIENTAL BRASILEIRA ...p. 10 1.1 Competência ambiental na Constituição brasileira...p.10

1.2 Sistema de repartição de competência legislativa em matéria ambiental no Brasil ...p. 18

1.3 Competência legislativa privativa da União no âmbito ambiental...p.19 1.4 Competência concorrente da União, Estado e Distrito Federal em matéria

ambiental ...p. 21 1.5 Competência legislativa dos Municípios na esfera ambiental ...p. 28

2 DA COMPETENCIA LEGISLATIVA AMBIENTAL ESPANHOLA...p. 34

2.1 Competência ambiental na Constituição Espanhola...p.34 2.2 Sistema de repartição de competência legislativa em matéria ambiental na

Espanha...p.37

2.3 Sistema de Competência da União Europeia em relação a Espanha...p.41 2.4 Competência ambiental nas Comunidades Autonômicas...p. 43

2.5 Legislação ambiental da Uniao Europeia e o Estado autonômico...p. 53

CONSIDERAÇÕES FINAIS...p. 57 REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS...p. 64

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RESUMO

O presente trabalho encontra-se na linha de pesquisa do Direito Ambiental, Transnacionalidade e Sustentabilidade, com área de concentração nos Fundamentos do Direito Positivo. O objetivo científico tem pelo escopo a premente necessidade de reflexão sobre o nosso sistema de repartição de competência, no sentido de buscar um modelo de Estado singular, como é o caso Espanhol, talvez um pouco complexo, mas que tem oferecido respostas a muitos dos problemas espanhóis. A comparação com a federação brasileira talvez possa ser útil, para não se idolatrar o federalismo como solução para todos os males, pois também pode ocasionar uma rigidez excessiva, inviabilizando o convívio, na mesma unidade, de determinadas diversidades históricas. Assim, pretende-se investigar o sistema de repartição de competência legislativa do Brasil e da Espanha sobre o meio ambiente, que se sustenta somente, com descentralização provendo maior proteção a um meio ambiente equilibrado, visto a possibilidade de assegurar o desenvolvimento das características inerentes ao federalismo (autonomia, dinamicidade, unidade na diversidade). A justificativa do tema se dá em razão da importância e atualidade do assunto, especialmente de o Brasil possuir, sobre a questão ambiental, uma grande gama de legislações esparsas na área do meio ambiente, que muitas vezes são ineficazes quando da resolução dos conflitos relacionados aos problemas ambientais.

Palavras-chave: Competência legislativa ambiental – Direitos difusos –

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RESUMEN

El presente trabajo se encuentra en la línea de investigación sobre Derecho Ambiental, Transnacionalidad y Sostenibilidad, con un área de concentración en los Fundamentos del Derecho Positivo. El objetivo científico tiene como alcance la necesidad urgente de reflexionar sobre nuestro sistema de asignación de competencias, en el sentido de buscar un modelo de Estado único, como es el caso en España, quizás un poco complejo, pero que ha ofrecido respuestas a muchos de los problemas. Español. La comparación con la federación brasileña puede ser útil, para no idolatrar el federalismo como una solución a todos los males, ya que también puede causar una rigidez excesiva, lo que hace imposible vivir, en la misma unidad, con ciertas diversidades históricas. Por lo tanto, se pretende investigar el sistema de compartir la competencia legislativa de Brasil y España sobre el medio ambiente, que se mantiene solo, con la descentralización que brinda una mayor protección a un entorno equilibrado, dada la posibilidad de garantizar el desarrollo de las características inherentes a la federalismo (autonomía, dinamismo, unidad en la diversidad). La justificación del tema se debe a la importancia y la actualidad del tema, especialmente porque Brasil tiene, sobre el tema ambiental, una amplia gama de legislación dispersa en el área del medio ambiente, que a menudo son ineficaces para resolver conflictos relacionados con problemas ambientales.

Palabras clave: Competencia legislativa ambiental – Derechos difusos –

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INTRODUÇÃO

O objetivo científico do presente trabalho é discorrer sobre o sistema de repartição de competência brasileiro, no sentido de buscar um modelo de Estado singular, como é o caso Espanhol, talvez um pouco complexo, mas que tem oferecido respostas a muitos dos problemas espanhóis. A comparação com a federação brasileira talvez possa ser útil, para não se idolatrar o federalismo como solução para todos os males, pois também pode ocasionar uma rigidez excessiva, inviabilizando o convívio, na mesma unidade, de determinadas diversidades históricas.

Assim, pretende-se investigar o sistema de repartição de competência legislativa do Brasil e da Espanha sobre o meio ambiente, que se sustenta somente, com descentralização provendo maior proteção a um meio ambiente equilibrado, visto a possibilidade de assegurar o desenvolvimento das características inerentes ao federalismo (autonomia, dinamicidade, unidade na diversidade).

Para a pesquisa foram levantadas a(s) seguinte(s) hipótese(s):

a) A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estabeleceu um sistema compartilhado de competência, por meio de um sistema de competência legislativa concorrente entre União, Estados e Distrito Federal (art. 24, inciso VI a VIII) e de um sistema de competência administrativa comum (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) (art. 23, incisos III, IV VI, VII e XI). Ainda, é importante destacar, a existência de uma competência legislativa privativa da União (art. 22, incisos IV, XII e XXVI).

b) Na Espanha, no que diz respeito à competência ambiental, atribuem-se competências de distinto grau ao Estado (legislação básica) e às Comunidades Autônomas (desenvolvimento legislativo e gestão). Corresponde ainda ao Estado uma competência residual e supletória em matéria ambiental (CE, art. 149.3), a fim de evitar-se lacunas, assim como a coordenação das normas das Comunidades

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8 Autônomas, mesmo no caso de assuntos atribuída a sua competência, quando exigidos pelo interesse local. (CE, art. 150.3). Vale lembrar que a Espanha não é um estado federal, mas um estado unitário descentralizado, com alto grau de descentralização política e administrativa. Assim, a Espanha é descentralizada nas regiões, denominada "Comunidades Autônomas". A estes o Estado central atribui certos poderes.

c) O modelo espanhol de federalismo pode servir de parâmetros ao Brasil, caso seja estabelecidos critérios que permitam melhor solucionar os conflitos de competências ambientais entre União e Estados-membros na federação brasileira, promovendo descentralização e a possibilidade de utilização de níveis adicionais de proteção.

Os resultados do trabalho de exame das hipóteses estão expostos na presente dissertação, de forma sintetizada, como segue.

Principia–se, no Capítulo 1, a demonstração do funcionamento do sistema de competência ambiental na Constituição brasileira. Em seguida, busca-se verificar o sistema de repartição de competência legislativa, analisando a competência legislativa ambiental dos entes da federação, respectivamente, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

O Capítulo 2, inicialmente, dedica-se a uma breve reflexão sobre a competência ambiental na Constituição Espanhola, após busca-se descrever o sistema de distribuição das competências ambientais. De maneira sintética, aborda-se a relação normativa entre a União Europeia e Espanha. Posteriormente, é descrito a competência ambiental nas Comunidades Autonômicas, tema fundamental para o nosso estudo. E, por fim, trata-se da influência da legislação ambiental entre a União Europeia e o Estado autonômico.

A metodologia baseia-se em uma revisão bibliográfica sobre o tema, pretendendo-se analisar preceitos e definir as competências constitucionais relativas à temática ambiental, buscando para subsidiar as propostas de concretização de

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9 políticas públicas de proteção, preservação e exploração inteligente e racional dos recursos ambientais no Brasil.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados aspectos destacados da Dissertação, seguidos de estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre (assunto tratado na dissertação).

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação1 foi utilizado o Método Indutivo2, na Fase de Tratamento de Dados o

Método Cartesiano3, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia

é composto na base lógica indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do Referente4, da Categoria5, do Conceito Operacional6 e da Pesquisa Bibliográfica7.

1 “(...) momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente

estabelecido (...).” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 14 ed. ver., atual. e ampl. Florianópolis: Empório Modara, 2018. p. 112-113.

2 “(...) pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção

ou conclusão geral (...)”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 114.

3 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE,

Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

4 “(...) explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o

alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 69.

5 “(...) palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma ideia.” PASOLD,

Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 41.

6 “(...) uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita

para os efeitos das ideias que expomos (...)”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa

jurídica: teoria e prática. p. 58.

7 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”. PASOLD,

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CAPÍTULO 1

DA COMPETENCIA LEGISLATIVA AMBIENTAL BRASILEIRA

1.1. Competência ambiental na Constituição brasileira

Apesar da existência de normas relativas à preservação do meio ambiente ser antiga, havendo previsão de sanção para o corte de árvore, por exemplo, desde as Ordenações Filipinas (Livro 5°, Titulo LXXV), jamais, antes da Constituição do Brasil de 1988, o tema ambiental fora tratado, no âmbito constitucional pátrio, de forma especifica e sistemática.

De fato, a CRFB, de forma hodierna e avançada, apresenta uma série de preceitos quanto à tutela ambiental, seja de forma fragmentada em diversos Capítulos, seja em um Capítulo exclusivo ao tema. Assim, inserida entre os direitos e deveres individuais e coletivos8 (Título II, Capítulo I, art. 5°, LXXIII), a legitimidade de

qualquer cidadão de interpor ação popular para anulação de ato lesivo ao meio ambiente.

Especificamente, há o art. 2259 (Título VIII, Capitulo VI), que enumera

em seu § 1°, uma série de normas, algumas de conteúdo meramente programático,

8 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado,

1988. Art. 5°, LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;

9 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado,

1988. Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; (Regulamento)

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11 outras não, para o Poder Público, destacando-se a exigência de estudo prévio de impacto ambiental para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, na forma da lei (inciso IV).

Também de grande relevo a previsão de obrigação de recuperação do meio ambiente degradado, a responsabilização penal das pessoas jurídicas, além da civil e administrativa, por condutas e atividades consideradas lesivas, e a caracterização da Floresta Amazônica brasileira, da Mata Atlântica, da Serra do Mar, do Pantanal Mato-Grossense e da Zona Costeira como patrimônio nacional, nos termos dos § 2°, § 3° e § 4°, respectivamente, todos do art. 225, da CRFB10.

Além disso, descreve Maria Cláudia da Silva Antunes de Souza e Marcelo Buzaglo Dantas11 , asseverando:

Há muitos outros preceitos constitucionais que, embora

reflexamente, regulam a proteção do meio ambiente em suas

II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; (Regulamento) (Regulamento) (Regulamento) (Regulamento)

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; (Regulamento)

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; (Regulamento)

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; (Regulamento)

VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. (Regulamento)

10 Idem. Art. 225. [...]

§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

§ 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. (Regulamento) (Regulamento)

[...].

11 SOUZA, Maria Cláudia da Silva Antunes de. DANTAS, Marcelo Buzaglo. Competência Legislativa

em matéria ambiental no Brasil e a análise das decisões do Supremo Tribunal Federal. Disponível em:http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=a386c7c329ce38ff acesso em 3 de abril de 2020.

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diversas formas. É o caso, por exemplo, de algumas garantias individuais e coletivas, previstas no art. 5º, da Lei Maior, como por exemplo, a reparabilidade do dano moral (incisos V e X), a celeridade dos processos judiciais e administrativos (LXXVIII), além de dois dos quatro instrumentos que compõem o chamado microssistema de tutela jurisdicional de interesses difusos, que são o mandado de segurança coletivo (LXX) e a ação popular (LXX). As outras duas modalidades são também previstas na Carta Magna, a saber: a ação de improbidade administrativa (art. 37, §4º) e a ação civil pública (art. 129, III) – esta última, instrumento por excelência de tutela ambiental. Isto sem falar nas ações de controle de constitucionalidade, pelas quais se tem levado aos Tribunais de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal relevantes discussões acerca da constitucionalidade de regras ambientais.

Logo, infere-se que os Estados Federados em matéria ambiental com a ordem constitucional vigente a partir da CRFB, tanto em relação a competência material ou administrativa quanta legislativa, passaram a exercer um papel fundamental. Assim, "Competências", são as diversas modalidades de poder de que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções, suas tarefas, prestar serviços.

Com melhores palavras, José Afonso Silva12, comentando sobre a

classificação das competências, observando com a devida clareza o seguinte:

Competências é a faculdade juridicamente atribuída a uma entidade, ou a uma entidade, ou a um órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões. Competências são diversas modalidades de poder que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções.

Em outras linhas, assevera José Francisco Alenza Garcia13:

La competencia es la función o funciones atribuidas a una organización pública o a un órgano administrativo en relación a una materia determinada. En el apartado anterior ya se ha examinado la materia ambiental, falta de analizar cómo se atribuyen las potestades normativas y ejecutivas en relación a dicha materia.

12 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 9ª ed. São Paulo: Malheiros, 1994. 13 GARCIA, José Francisco Alenza. Manual de Derecho ambiental. Pamplona: Universidade Pública

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13 É evidente que isso permite falar em espécie de competências, sendo que as matérias que compõem seu conteúdo podem ser agrupadas em classes, segundo sua natureza, sua vinculação cumulativa a mais de uma entidade e seu vínculo a função de governo.

Assim, atentos a esses vários critérios, pode-se classificar as competências, de acordo com a CRFB, primeiramente em dois grupos com suas subclasses: 1) a competência material: a) exclusiva: da União (art. 21), dos Estados, que se extrai de seus poderes remanescentes do art. 25, § 1° e dos Municípios (art. 30, III a VIII); b) comum: da União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 23); 2) a competência legislativa: a) privativa ou exclusiva: da União (art. 22), dos Estados (art. 25, §§ 1° e 2°) e dos Municípios (art. 30, I); b) concorrente entre União, Estados e Distrito Federal (art. 24), onde a legislação da União e de normas gerais e a dos Estados e Distrito Federal de normas suplementares; c) também esta prevista a legislação suplementar dos Municípios (art. 30, II).14

Como já foi dito, o Brasil é uma República Federativa, que compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos da CRFB15. Quando se fala em federalismo quer-se referir a uma forma de

Estado, denominada Federação ou Estado Federal, caracterizada pela união de coletividades políticas autônomas16.

A autonomia federativa assenta-se em dois elementos básicos: existência de órgãos governamentais próprios e posse de competências exclusivas. A Constituição reconhece esses elementos às entidades federativas brasileiras: União, Estados, Municípios e Distrito Federal.

Ademais, torna-se imprescindível para este estudo uma análise sucinta quanto ao Estado federal, do qual ontologicamente decorre a noção de repartição

14 SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. 7ª edição, atualizada. São Paulo: Malheiros,

2009.p. 72

15 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado,

1988. arts. 1° e 18.

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14 constitucional de competências entre os entes federados. O termo federação origina-se, etimologicamente, de foedus, foederis, que significa pacto, aliança, união. Para caracterizá-la, a divisão de competências entre os entes federados - ordens jurídicas parciais -, embora essencial, não basta17.

Ressalvadas algumas divergências doutrinárias, pode-se afirmar que são elementos essenciais para a existência de um Estado federativo, em síntese apertada, a descentralização política, que corresponde a repartição constitucional de competências, a participação da vontade das ordens jurídicas parciais na vontade criadora da ordem jurídica nacional e a possibilidade de auto constituição18.

A divisão de competências entre os entes federados, em regra, segue o denominado princípio da predominância do interesse, segundo o qual compete a União as matérias em que predomine o interesse nacional, aos Estados as de interesse regional e aos Municípios as de interesse local.

Na CRFB, coube aos Estados Federados, via de regra, a competência residual ou remanescente, e a União Federal, as competências expressas ou enumeradas, conforme tradicional técnica consagrada mundialmente de repartição constitucional de competências19.

Quanta a extensão, a competência pode ser classificada em exclusiva, privativa, comum, concorrente ou suplementar. A competência exclusiva, como o próprio vocábulo indica, exclui os demais entes, enquanto a privativa, embora também seja específica de um determinado ente federado, permite, ao contrário daquela, delegação ou competência suplementar.

A repartição de competências entre a União e os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal constitui o fulcro de nosso Estado Federal, dando origem a uma estrutura estatal complexa, em que se manifestam diversas esferas

17 BELTRÃO, Antônio Figueiredo Guerra. A competência dos Estados federados em meio ambiente a partir da ordem constitucional de 1988. Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 105, 16

out. 2003. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=4253>. Acesso em: 28 abr. 2020.

18 TEMER, Michel. Elementos do Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2001.

19 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros. 9° ed.

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15 governamentais sobre a mesma população e o mesmo território: a esfera da União, a de cada Estado ou do Distrito Federal e a de cada Município. A teoria do federalismo costuma dizer que a repartição de poderes autônomos constitui o núcleo do conceito do Estado Federal. "Poderes", aí, significam a proteção de matéria que a Constituição distribui entre as entidades autônomas e que passa a compor seu campo de atuação governamental, sua área de competência, conforme afirma José Afonso Silva20.

Por outro lado, relacionado a Espanha, a repartição de competência é um caso aparte, motivo pelo qual despertou o meu interesse na comparação com as regras constitucionais brasileira.

É importante asseverar que a organização ambiental como matéria de competência espanhola, refere-se expressamente ao meio ambiente em duas finalidades diferentes: na determinação do objeto de um direito subjetivo ou de uma tarefa de Estado, sem a delimitação de uma matéria específica que deverá efetuar a repartição de competências entre o Estado e as Comunidades Autônomas, que será objeto de nosso estudo mais adiante21.

Além disso, o Estado espanhol se organiza territorialmente via constitucional, e posteriormente, distribui as divisões territoriais autonômica para a gestão de seus respectivos interesses. A autonomia é então uma via de articulação funcional entre o órgão central e não central do Estado com a que se pretende dar respostas a necessidade de integração política de um Estado plural.

Vale destacar as palavras de Eduardo Garcia Enterria22 sobre as

medidas preventivas da unidade básica de execução da legislação do Estado:

20SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2002.

21 ROCA, Guilhermo Escobar. La Ordenación Constitucional Del Medio Ambiente. Madrid:

Dykinson, 1995. p. 58

22 ENTERRÍA. Eduardo García. El Ordenamento Estatal Y Los a Ordenamientos Autonomicos,

Sistema de Relaciones. Revista de Administración Pública Nums. 100-102. Enero-diciembre. 1983. p. 267

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Para evitar caer, en los rigorismos de la teoría jurídica de la supervisión y ejecución estatales, todos los Estados federales tienden hoy a promover medidas preventivas que, sin el desgaste político que puede la aplicación de tal teoría ocasionar, permitan alcanzar los mismos objetivos de excluir la desigualdad y las diferencias substanciales en la ejecución descentralizada de la legislación estatal. Estos instrumentos no crispan, sino más bien engrasan el correcto funcionamiento de un Estado compuesto y sus valores de integración.

Assim, extrai-se das sabias lições do Professor Santiago Muñoz Machado23, sobre o compartilhamento entre o Estado e as Comunidades Autônomas

de competências de natureza organizacional para decidir sobre a estrutura e o regime das empresas locais, o seguinte entendimento:

[…] la cuestión es un punto más compleja porque, además de dicho reparto, es necesario considerar que también las corporaciones locales tienen una autonomía garantizada por la Constitución. El Tribunal Constitucional interpretó, desde su primera jurisprudencia, el reparto de competencias entre el Estado y las Comunidades Autónomas en materia de régimen local afirmando que este, en nuestra Constitución, era “bifronte” de modo que no pertenecía por completo su regulación ni al Estado ni a las Comunidades Autónomas sino a ambas instancias.

El primero tiene la competencia, derivada del artículo 149.1.18.ª, de establecer las bases generales de la organización y régimen jurídico de las entidades locales, y las segundas competencias legislativas complementarias o de “desarrollo”. Sin embargo, considerando que

las corporaciones locales cuentan con autonomía

constitucionalmente garantizada, según acabamos de recordar, debiera corresponderles la potestad de autoorganizarse ya que esta facultad es inherente a la autonomía. Podría distinguirse, para salvar esta última facultad, entre el reparto general de competencias en materia de régimen local y las cuestiones meramente organizativas ya que, respecto de estas, una vez fijadas por el Estado las bases, el resto de las decisiones deberían corresponder a las propias corporaciones locales. Si a la competencia estatal de definición de los principios organizativos se añade una competencia de las Comunidades Autónomas de complementación o desarrollo, queda muy poco espacio para la autonomía organizativa local.

23 MACHADO, Santiago Muñoz. Tratado de Derecho Administrativo Derecho Público General.

Tomo XI. Instituciones Autonómicas Y Locales. 4ª ed. Madrid: Agência Estatal Boletin Oficial del Estado, 2015. p. 19

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17 Ademais, quanto a configuração da autonomia local no sistema autonômico é uma de suas características que os diferenciam substancialmente no federalismo, principalmente porque os municípios e as províncias pertencem a estrutura do Estado. A competência em material local é concorrente e os governos locais são objetivo de controle diretos por parte do governo central.

Observa Muñoz Machado24 em relação a garantia institucional da

autonomia local, que não se pode deduzir que a Constituição imponha a existência de uma legislação geral e uniforme do regime local. Os fundamentos desta legislação residem nas competências específicas do Estado, afetadas pelos limites que já foram indicado. A garantia institucional da autonomia local deve, portanto, ser entendida de maneira diferente. No que diz respeito às competências de administração local, consiste em garantir que as entidades locais possam ser atribuídas como próprias e exercer o poderes necessários para atender aos interesses locais e, além disso, todos os elementos essenciais para poder participar de decisões que afetar esses interesses.

Nesse sentido, extrai-se do referenciado Autor:

La separación entre las esferas de interés local, autonómico y estatal es, en sistemas jurídicos tan complejos como los actuales, extremadamente difícil. Por esta razón, algunos autores (Burmeister, Rotter), en lugar de acotar un ámbito de competencias locales exclusivas, han concebido la autonomía local como un derecho de participación general en cualquier sector de la actividad pública en que los intereses locales queden concernidos. No habría un núcleo esencial de competencias locales, sino que la autonomía municipal se expresaría en un derecho de participación en todos los sectores relevantes para el interés local.

Desse modo, nos resta dizer que o ordenamento jurídico-constitucional espanhol possui algumas semelhanças com o Estado brasileiro, com descentralização territorial de poder. Vale dizer que a descentralização é mais ampla, além de tudo, pode-se afirmar, mais efetiva que a proporcionada pela ordem

24 MACHADO, Santiago Muñoz. Tratado de Derecho Administrativo Derecho Público General. Tomo

XI. Instituciones Autonómicas Y Locales. 4ª ed. Madrid: Agência Estatal Boletin Oficial del Estado, 2015. p. 172

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18 federal brasileira, e que, quanto ao tema meio ambiente, também possui competência de natureza concorrente-compartimentada: a legislação básica, com possibilidade de normas adicionais de proteção, consoante ao art. 149.1.23, da CE.

1.2. Sistema de Repartição de Competências legislativa em matéria ambiental no Brasil

Interessa nesta parte do estudo delimitar a competência das pessoas políticas para elaborar leis sobre matéria atinente ao meio ambiente.

Na elaboração do diploma constitucional, o constituinte preservou os dois métodos de corte de competência: a) o corte horizontal que consubstancia a competência privativa ou exclusiva e b) o corte vertical que caracteriza as competências comum e concorrente.

Sendo assim, por competência privativa ou exclusiva entendemos a competência exercida por um ente da federação com exclusão dos demais. Competência concorrente que, por sua vez, está prevista no art. 24, constitui a competência no quais todos os entes da federação atuam em cooperação; cada qual incumbido de um poder de atuação sobre determinada matéria, mas conservando-se um campo geral restritivamente a União.

Como já mencionado, o constituinte não fugiu a técnica já anteriormente empregada, de forma que as espécies de repartição previstas segundo reconhecimento da doutrina foram: a) competência legislativa: arts. 21, 24, 25, § 1°, e 30, I e II e b) competência político-material: arts. 22, 23 e 30, incisos III a IX.

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1.3 Competência legislativa privativa da União no âmbito ambiental

A competência dada ao Poder Legislativo da União para legislar sobre as matérias descritas na norma disposta no art. 22 da Constituição brasileira é privativa. Isso significa exclusividade no plano horizontal e vertical, de modo que o Congresso Nacional e vedado delegar sua competência legislativa privativa aos Poderes Executivo e Judiciário, bem como aos Estados-Membros e Municípios. A proibição de delegar decorre não apenas da disposição expressa no caput do art. 22 quando diz ser essa competência privativa, mas é ínsita ao sistema constitucional brasileiro.

A possibilidade de delegação vem explicitada no art. 22, parágrafo único, do texto constitucional, prevendo-se que lei complementar federal poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias de competência privativa da União.

A CRFB prevê nos vinte e nove incisos do art. 22 as matérias de competência privativa da União, definindo preceitos declaratórios e autorizativos da competência geral na legislação federal e demonstrando clara supremacia em relação aos demais entes federativos, em virtude da relevância das disposições.

Os Estados federados não possuíam competência alguma, ainda que de forma suplementar, para dispor sobre tais matérias, conforme a Constituição Brasileira de 196725.

De forma bastante distinta, a CRFB adota forma hodierna de divisão de competência em matéria ambiental, correspondentes na fixação de temas comuns aos entes federados, prevendo atuações paralelas, respeitadas, naturalmente, as esferas de atuação de cada um.

25 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. art. 8°, § 2°, da Constituição do

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20 Veja-se o caso do art. 22, inciso I, matérias vinculam-se a ordem jurídica nacional e se estendem a todo o território brasileiro sob a ideia de uma codificação ou consolidação. Entre outros aspectos, manifestam o seguinte detalhe: transcendem o limite do geral e adentram o particular. Na prática, admitimos que em nível municipal ou estadual, existirão normas atinentes a ramos do direito referidos neste inciso.

Há mais um aspecto importante a ser trazido à baila: algumas matérias elencadas no art. 21 estariam mais bem situadas no art. 23 da Constituição da República Federativa do Brasil, tais como a elaboração e execução de planos nacionais e regionais - inciso IX26. Analisando a problemática que um planejamento

centralizante possa ensejar ao relacioná-lo com o federalismo, José Afonso da Silva27 argumenta que:

[...] torna-se problemático conseguir mecanismos que evitem entre cheques, contradição a incoerência entre os planos nacionais, os estaduais e os municipais. Por outro lado, impor uniformidade de cima para baixo consistirá em quebrar as autonomias das entidades regionais e locais.

O art. 21 não esgota a competência exclusiva da União, como demonstra o art. 176, da Constituição Federal, por exemplo, que versa sobre jazidas (Almeida, 1991). Alias, matérias mencionadas no rol dos arts. 21 a 24 e 30 ressoam ou apresentam-se diretamente disciplinadas em outros Títulos da CRFB de 1988, como, por exemplo, o art. 23, VI e VII, que tem sua complementação no art. 225, § 1°.

O certo e que a apresentação de tantas minudências que poderiam ser tratadas em nível infraconstitucional contribuiu para o casuísmo da nossa Constituição.

26ALVES, A. C. Federalismo e Centralização: propostas para a Constituinte. São Paulo: Revista da

Procuradoria Geral do estado de São Paulo, 1985.

(21)

21

1.4 Competência concorrente da União, Estados e Distrito Federal em matéria ambiental

O art. 24 da Constituição da República Federativa do Brasil prevê as regras de competência concorrente entre União, Estados e Distrito federal, estabelecendo quais as matérias que deverão ser regulamentadas de forma geral por aquela e especifica por este.

Dessa forma, é possível o estabelecimento de algumas regras definidoras da competência legislativa concorrente. A competência da União e direcionada somente às normas gerais, sendo de flagrante inconstitucional aquilo que delas extrapolar, enquanto a competência do Estado-membro ou do Distrito Federal refere-se às normas específicas, detalhes, minúcias. Assim, uma vez editadas as normas gerais pela União, as normas estaduais deverão ser particularizantes, no sentido de adaptação de princípios, bases, diretrizes a peculiaridades regionais.

Realizada a delimitação, e decidido pelo intérprete que a matéria objeto da legislação se encontra no âmbito da legislação concorrente (art. 24), ainda assim pode ocorrer um conflito normativo entre as esferas federativas. De fato, pois cabe à União determinar as “normas gerais”, e aos Estados-membros ou municípios complementá-las, e, em alguns casos, mesmo suplementá-las.

Estabelecer o limite do que sejam essas “normas gerais”, e até que extensão pode a União legislar sobre o tema é um dos grandes problemas do regime competencial federativo brasileiro.

Chama atenção Souza28 para o significado do termo “norma geral”,

reconhecendo que embora não haja uma definição uníssona na doutrina, parece que norma geral seria aquela que traçasse parâmetros genéricos, aplicáveis a todo o território nacional, deixando a especificação destinada a adaptá-los às

28 SOUZA, Maria Claúdia da Silva Antunes de. DANTAS, Marcelo Buzaglo. Competência Legislativa

em matéria ambiental no Brasil e a análise das decisões do Supremo Tribunal Federal. Disponível em:http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=a386c7c329ce38ff acesso em 3 de abril de 2020.

(22)

22 peculiaridades regionais e locais para a legislação suplementar dos Estados e Municípios.

Consoante a isso, assevera-se com muita prudência o seguinte entendimento29:

Neste contexto, seria até de se questionar se uma norma

estabelecendo a preservação de determinados limites de

afastamento de cursos d’água ou de entornos de lagos e lagoas naturais ou de reservatórios naturais e artificiais (art. 4° , I a III, do novo Código Florestal) poderia ser considerada uma lei geral para os fins do que estabelece o preceito da Constituição. De fato, em um país de dimensões continentais como o Brasil, as diferenças regionais tendem a ser gritantes, de modo que um curso d’água ou uma lagoa situada em um Estado das regiões Sul e Sudeste são bastante diferentes do mesmo elemento hídrico na Amazônia, por exemplo. Daí ser possível alegar que as normas federais que tratam de temas específicos como esses não atenderiam o disposto no art. 24, § 1°, da CF/88. Contudo, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sempre foi uníssona no sentido de que a lei federal, independentemente do seu conteúdo, é considerada norma geral, de

modo que é implausível imaginar a declaração de

inconstitucionalidade de uma lei que, embora específica, tenha sido editada pela União.

De outro lado, no tocante à competência suplementar dos Estados e Municípios, diga-se que ela é restrita, pois não admite a edição de regras por entes que contrariem a legislação federal em vigor. Entretanto, no âmbito do Direito Ambiental, a doutrina especializada amplamente majoritária vem há tempos sustentando a possibilidade de que os entes federados legislem sobre a matéria em oposição à disciplina federal, para estabelecer parâmetros mais restritivos de tutela do meio ambiente e da saúde.

Observa-se que não haverá possibilidade de delegação por parte da União aos Estados-membros e Distrito Federal das matérias elencadas no art. 24 da CRFB, pois o rol dos incisos destinados à competência concorrente e taxativo, não se lhe aplicando o parágrafo único do art. 22.

Por exemplo, é concorrente a competência para legislar sobre florestas (CRFB, art.24, VI). O Código Florestal brasileiro foi criado pela Lei nº 4.771, de

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23 196530. Após algumas décadas, o código passou a ser regulado pela Lei nº 12.651,

de 201231. Mas, em outubro do mesmo ano, ele foi alterado pela Lei nº 12.727, de

201232. Com efeito, o Código Florestal de 1965, passou a ser considerada norma

geral depois da vigência da Constituição Federal de 1988, isso porque, cabendo às duas pessoas políticas legislar sobre a matéria, os dispositivos do Código Florestal passaram a ser tidos como princípios gerais obrigatórios, podendo os Estados legislar sobre florestas, mas sem infringir as regras genéricas.

Na sequência, exemplifica Vladimir Passos Freitas33:

O Código Florestal considerada de preservação permanente a vegetação natural situada no topo de morro, montes, montanhas e serras. É uma norma Geral que não pode ser contrariada para legislação dos Estados. Certamente com isso a Lei está gaúcha n° 9.519, de 21 de janeiro de 1992, conhecida como Código Florestal do Estado do Rio Grande do Sul, proíbe no art. 23 a supressão de vegetação de preservação permanente estabelecida em lei.

Se assim não fosse, se extrapolasse a lei gaúcha os limites gerais da norma geral de origem federal, certamente seria reconhecida como inconstitucional.

Na área ambiental é difícil imaginar a ausência de norma geral. Tome se o exemplo da pesca. O chamado Código de Pesca34, da mesma forma que o

Código Florestal de 1965, passou a ser considerado norma geral. Agora, vários Estados da Federação promulgam leis próprias e específicas, sempre adaptadas àquele diploma legal.

Vale o registro que no Estado de Santa Catarina o Código Ambiental35

este ano completou onze anos, sendo considerada uma lei complexa, porém, sem

30 Brasil. Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965 (Código Florestal brasileiro de 1967).

31 Idem Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; altera as

Leis nºs 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nºs 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências.

32 Idem Lei nº 12.727, de 17 de outubro de 2012

33 FREITAS, Vladimir Passos. A Constituição Federal e a Efetividade das Normas Ambientais.

3.ed.rev., atual.e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005.

34 BRASIL. Decreto-lei 221, de 28 de fevereiro de 1967. Código de Pesca.

35 SANTA CATARINA. Lei n° 14.675, de 13 de abril de 2009. Institui o Código Estadual do Meio

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24 dúvida, consistiu em um grande avanço para a proteção e o uso racional dos recursos naturais, reafirmando o conceito de que as florestas e a vegetação nativa são bens de interesse comum, advindo daí o comprometimento com a preservação do patrimônio vegetal e com a biodiversidade.

Não obstante a isso, Freitas36 chama atenção para uma situação

curiosa ocorrido no Estado do Paraná. Segundo ele, a Lei paranaense n° 8.946, de 5 de abril de 1989, proíbe a pesca predatória. Todavia, com apenas dois artigos (o 3° limita-se a revogar disposições em contrário), a referida Lei não particularizada absolutamente nada. Surgem então dúvidas sobre sua necessidade, uma vez que a Lei Federal n° 7.679, de 23 de novembro de 1988, já seria suficiente para tratar da matéria.

É necessário dizer que a CRFB adotou a competência concorrente não cumulativa ou vertical, de forma que a competência da União está adstrita ao estabelecimento de normas gerais, devendo os Estados e o Distrito Federal especificá-las por meio de suas respectivas leis. É a chamada competência suplementar dos Estados-membros e do Distrito Federal37.

Observa-se, que no âmbito da legislação concorrente, a doutrina tradicionalmente classifica-a em cumulativa sempre que inexistirem limites prévios para o exercício da competência, por parte de um ente, seja a União, seja o Estado-membro, e em não-cumulativa, que propriamente estabelece a chamada repartição vertical, pois, dentro de um mesmo campo material (concorrência material de competência), reserva-se um nível superior ao ente federativo União, que fixa os princípios e as normas gerais, deixando-se ao Estado-membro a complementação.

A competência suplementar dos Estados-membros e do Distrito Federal pode ser dividida em duas espécies: competência complementar e competência supletiva.

36 FREITAS, Vladimir Passos. A Constituição Federal e a Efetividade das Normas Ambientais.

3.ed.rev., atual.e ampl. – São Paulo: Editora RT, 2005.

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25 A primeira - competência complementar dependerá de previa existência de lei federal a ser especificada pelos Estados-membros e Distrito Federal.

Por sua vez, a segunda, competência supletiva, aparecerá em virtude da inércia da União em editar a lei federal, quando então os Estados e o Distrito Federal, temporariamente, adquirirão competência plena tanto para edição das normas de caráter geral, quanto de normas específicas, conforme estabelecem os dispositivos dos §§ 3° e 4° do art. 24 da CRFB.

A inércia da União em regulamentar às matérias constantes no art. 24 da CRFB não impedira ao Estado-membro e ao Distrito Federal a regulamentação da disciplina constitucional da Competência supletiva. Note-se que, em virtude da ausência de lei Federal, o Estado-membro ou o Distrito Federal adquirirão competência plena tanto para a edição de normas de caráter geral, quanto específico.

A competência plena adquirida pelos Estados ou Distrito Federal e temporária, uma vez que, a qualquer tempo, poderá a União exercer sua competência editando lei federal sobre as normas gerais. A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.

De fundamental importância convém examinar algumas tentativas realizadas pela doutrina brasileira no sentido de estabelecer um conteúdo para “normas gerais”. E, também, a posição do Supremo Tribunal Federal sobre o tema.

Desse modo, ao investigar o termo “normas gerais”, Raul Machado Horta38 aponta para um quadro em que é elaborada pela União, cabendo aos

Estados complementá-las para o atendimento de peculiaridades locais. Com isso, a legislação federal é reveladora das linhas essenciais, enquanto a legislação local

38 HORTA, Raul Machado. Direito Constitucional. 4ª Edição revista e atualizada. Ed. Del Rey. Belo

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26 buscará preencher o claro que lhe ficou, afeiçoando a matéria revelada na legislação de normas gerais às peculiaridades e às exigências estaduais.

Com outro olhar Manoel Gonçalves Ferreira Filho39, “são princípios,

bases, diretrizes que hão de presidir todo um subsistema jurídico.

Nota-se que de todos os autores expostos, que não esgotam, de modo algum, a doutrina constitucional brasileira a respeito do tema, observa-se a dificuldade inerente à definição de um conceito tão indeterminado. E que, mesmo assim, há alguns que devem ser destacados.

Sobre isso, Nilo Marcelo de Almeida Camargo40 assevera:

O primeiro seria de que as “normas gerais”, enquanto legislação da União, objetivam conferir maior uniformidade ao tratamento da matéria, e, para a consecução desse objetivo, devem ater-se a alguns aspectos básicos, com a finalidade de que o básico seja aquilo que possa ser igual a todos. Outro ponto em comum é o fato de que as “normas gerais” não podem exaurir o tema sem deixar qualquer margem a complementação pelos Estados. Essa compartimentação legislativa (verdadeira espécie de condomínio, na expressão do Ministro Celso de Mello), exige que haja a confluência de todos os entes federados. O exaurimento do tema, além de infringir o âmbito de autonomia do Estado-membro (com a consequente inconstitucionalidade), faz com que inexista espaço para atendimento às peculiaridades locais.

O referido Autor arremata dizendo que o verdadeiro limite das “normas gerais” consiste nessa abertura à legislação dos Estados-membros para poderem legislar sobre suas peculiaridades, complementando a legislação federal.

Mesmo com discordância doutrinaria, o entendimento do STF a respeito do termo “norma geral” aponta para uma lei de princípios gerais, objetivando uniformidade e homogeneidade, esperando-se que a legislação complementar somente preencha os vazios, ou lacunas, deixados pela legislação

39 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Vol. I.

Editora Saraiva. São Paulo. 1990. p. 195

40 ALMEIDA CAMARGO, Nilo Marcelo de. A resolução de conflitos competências ambientais entre

União e Estados membros no Brasil: aportes comparados com Espanha e União Europeia. (Tesis Doctoral Inédita) Sevilha: Universidad de Sevilha. Sevilha: 2017. Disponível em: <https://idus.us.es/xmlui/handle/11441/61111> Acesso em: 13 de maio 2019.

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27 federal41. Na mesma direção, as decisões no ADI nº 3.035/PR, ADI nº 3.645/PR, ADI

nº 2.396/MS, ADIMC nº 1.086/SC, ADI nº 2.656/SP.

Nesse sentido, exemplifica Almeida Camargo42, buscando sintetizar

perfeitamente a concepção do STF sobre as normas gerais, o seguinte trecho do voto proferido pela Min. Ellen Gracie, relatora do ADI nº 2.396/MS:

[…] Como se vê, a Lei nº 9.055/95 dispôs extensamente sobre todos os aspectos que dizem respeito à produção e aproveitamento industrial, transporte e comercialização do amianto crisotila. A legislação impugnada foge, e muito, do que corresponde à legislação suplementar, da qual se espera que preencha vazios ou lacunas deixados pela legislação federal, não que venha a dispor em diametral objeção a esta. É essa a compreensão que o Tribunal tem manifestado quando se defronta com hipóteses de competência legislativa concorrente. Dentre as decisões precedente desta Casa, destaco a ADI 903/MG-MC, Rel. Min.Celso de Mello […]

A respeito disso, salienta o mencionado Autor “Pode-se concluir, no entanto, que esse entendimento tem-se mostrado insatisfatório para a resolução dos conflitos competências federativos, além de não apresentar uniformidade conceitual a respeito do tema.”

Em relação a competência privativa dos Estados-membros encontra-se descrita no art. 25, § 1°, da CRFB, que dispõe: "são reservados aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas per esta Constituição". Verifica-se aqui um sistema de coexistência em que “(....) tudo podem os Estados-Membros, contanto que não infrinjam os princípios que limitam sua autonomia e tudo pode a União, desde que respeite os direitos dos Estados", de acordo com FERRAZ43.

O campo de atuação dos Estados-Membros, nos termos da Constituição pátria, incide nas áreas não abrangidas pelos arts. 21, 22, 24 (campo da norma geral se a União não a editou) e 30. São reservadas aos Estados as

41 ADI 2396/MS, voto da Rel Min. Ellen Gracie, p. 7225;Cf. também ADIMC nº 3.035/PR, voto do Min.

Gilmar Mendes.ADI 3054/PR, Rel. Min. Gilmar Mendes.

42 ALMEIDA CAMARGO, Nilo Marcelo de. A resolução de conflitos competências ambientais entre

União e Estados membros no Brasil: aportes comparados com Espanha e União Europeia. (Tesis Doctoral Inédita) Sevilha: Universidad de Sevilha. Sevilha: 2017. Disponível em: <https://idus.us.es/xmlui/handle/11441/61111> Acesso em: 13 de maio 2019.

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28 competências que não forem privativas da União e dos Municípios. Isso significa dizer, ainda, que “[...] o Constituinte Estadual não está intitulado a impor padrões de conduta aos entes locais, mas tão-somente a definir a organização dos Poderes Estaduais”44.

O legislador não enumerou as competências dos Estados-membros. Elas são obtidas por exclusão, conforme assevera NETTO45 , e ficam a cargo do

legislador que elabora a Constituição Estadual, respeitando-se, é claro, a ordem jurídica nacional, ou seja, os termos do art. 180 da CRFB.

Colhe-se das Lições de Anna Cândida da Cunha Ferraz46 a respeito do

âmbito de poder legiferante dos Estados-Membros, a seguinte ideia:

Embora o Poder Constituinte dos estados-Membros seja um poder de direito posto pela Constituição Federal, sua função é de caráter nitidamente constituinte, partícipe que e da obra do Poder Constituinte Originário que, sem a sua cooperação, não cumpriria o desígnio de instituir um Estado do tipo Federal. Em outras palavras, a substância do Poder que elabora a Constituição primeira de um Estado Federal é a mesma do que elabora a Constituição de um Estado-Membro.

Isso significa dizer, pois, que, no âmbito de elaboração da Constituição Estadual, não deve haver simples reprodução do conteúdo normativo da CRFB, o que implicaria restrição de autonomia, princípio basilar que norteia o Estado Federal47.

1.5 Competência legislativa dos Municípios na esfera ambiental

A competência legislativa e exercida pela Câmara de Vereadores, que é o órgão legislativo do Município, em colaboração com o prefeito, a quem cabe

44 SUNFELD, Carlos Ari, Regime Constitucional do Município. São Paulo: Revista da

Procuradoria-Geral do estado de São Paulo, 1990.

45 NETTO, A. L. 3. Competências Legislativas dos Estados-membros. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1999.

46 FERRAZ, A.C. da C. O Poder Constituinte dos Estados-Membros. São Paulo: RT. 1979.

47 ALMEIDA, F. DJ, de. A constituição do Estado Federal e das Unidades Federadas. Brasília: Revista

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29 também o poder de iniciativa das leis, assim como o poder de sancioná-las e promulgá-las, nos termos propostos como modelo, pelo processo legislativo federal.

Dessa forma, a atividade legislativa municipal submete-se aos princípios da CRFB com estrita obediência a Lei Orgânica dos Municípios, a qual cabe o importante papel de definir as matérias de competência legislativa da Câmara, uma vez que a Constituição Federal não exaure, pois usa a expressão interesse local como catalisador dos assuntos de competência Municipal.

Assim, a primordial e essencial competência legislativa do Município é a possibilidade de auto organizar-se por meio da edição de sua Lei Orgânica do Município, diferentemente do que ocorria na vigência da constituição anterior, que afirmava competir aos Estados-membros essa organização. A edição de sua própria Lei Orgânica caracteriza um dos aspectos de maior relevância da autonomia municipal.

As competências legislativas do Município caracterizam-se pelo princípio da predominância do interesse Local, consubstanciando-se em: competência genérica em virtude da predominância do interesse local (art. 30, I, da CRFB); competência para estabelecimento de um plano diretor (art. 182, da CRFB); hipóteses já descritas, presumindo-se constitucionalmente o interesse local (arts. 30, III a IX e 144, § 8°, da CRFB); e, competência suplementar (art. 30, II, da CRFB).

Apesar de difícil conceituação, interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente as necessidades imediatas do Município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União).

A CRFB enumera algumas hipóteses, de competência municipal, conforme estabelecem os arts. 30, III a IX e 169, § 5°, presumindo a existência de interesse local.

Nesse norte, salvo as tradicionais e conhecidas hipóteses de interesse local, as demais deverão ser analisadas caso a caso, vislumbrando-se qual o interesse predominante (princípio da predominância do interesse).

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30 Já a Competência Suplementar do Município para Legislar, ou seja, a competência privativa dos Municípios e desprendida sobremaneira no art. 30. O art. 30, inc. I, do atual diploma constitucional pátrio, trata da competência privativa não enumerada dos mesmos, baseada no interesse local. Por outro lado, o inciso I também pode ser lido como manifestação da competência concorrente. O fato de ela ser privativa não significa que a matéria a ser regulada não interesse a outros entes da federação. Já os demais incisos de tal dispositivo enquadram-se na competência enumerada. A discriminação das competências privativas constitui a novidade instituída pelo legislador constituinte, em relação às constituições anteriores48.

Sob a égide do atual diploma constitucional, os Municípios passam a gozar dos quatro elementos que compõem a autonomia, apontados por Jose Afonso da Silva49, quais sejam: capacidade de auto-organização, mediante a elaboração de

lei orgânica própria; capacidade de autogoverno pela eletividade do Prefeito e dos Vereadores as respectivas Câmaras Municipais; capacidade normativa própria, ou capacidade de autolegislação, mediante a competência de elaboração de leis municipais sobre áreas que são reservadas a sua competência exclusiva e suplementar; e, capacidade de auto-administração (administração própria, para manter e prestar os serviços de interesse local).

Como já esclarecemos, a atual Constituição resgata o compromisso com a autonomia municipal e ainda traz em seu bojo o reconhecimento formal de que os Municípios integram a federação50, afirma Roque Antonio Carrazza, nos

termos dos artigos 1° e 18. O reconhecimento formal de o Município integrar a federação implica uma reestruturação do poder e passa a informar reconhecidamente o conteúdo do federalismo brasileiro.

Para muitos, entre eles Castro Nunes, Pontes de Miranda e Jose Afonso da Silva, o Município não constitui peça essencial do federalismo, porém, no federalismo brasileiro, os Municípios merecem tratamento distinto, tendo em vista as bases históricas do municipalismo no Brasil, somado ao novo comando normativo

48 SILVEIRA, P. A. da. Competência Ambiental. Curitiba: Juruá: 2005.

49 SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1997.

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31 estabelecido com a Constituição de 1988. Um estudo sobre o federalismo no Brasil há de deitar necessariamente análise sobre o municipalismo, pois foi peça fundamental na estruturação do nosso Estado e hoje alcança posição diferenciada, em relação aos diplomas constitucionais anteriores.

A expressão “interesse local” não compunha as Constituições anteriores. Nossas Constituições republicanas vinham utilizando a terminologia peculiar interesse. Na atual Constituição figura a expressão interesse local51.

Para Manuel Gonçalves Ferreira Filho52 essa alteração provocou

reações diferentes na doutrina, de forma que identificamos dois posicionamentos, com base na interpretação conferida a tais expressões. Há quem atribua sentido distinto a tais expressões, com a seguinte particularidade: a terminologia interesse local implica redução da competência municipal, pois, na medida em que determinada questões interessar ao Estado-Membro, a regulação da mesma passa a pertencer-lhe. Isso porque, nesse caso, acredita-se que o campo do peculiar interesse e o que significa preponderância e não exclusividade.

Em sentido diametralmente oposto, há quem sustente uma ampliação do âmbito de competência dos Municípios e que agora os mesmos não necessitam demonstrar que dada matéria e de seu peculiar interesse, este mais restrito que interesse local53, relata Carrazza. Na verdade, a extensão da competência municipal

vai depender em muito da ideia que se atribuem ao conteúdo e ao sentido dessa terminologia no caso concreto.

Tendo em vista o grau de abstração de interesse local, por ele ser um conceito indeterminado, o Poder Judiciário ocupara papel fundamental na resolução de conflitos que envolvam a repartição de competências.

51 SILVEIRA, P. A. da. Competência Ambiental. Curitiba: Juruá: 2005.

52 FERREIRA FILHO, Manuel Gonçalves. Comentários à constituição brasileira de 1988. São Paulo:

Saraiva. 1990.

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32 A doutrina apresentou inúmeros conceitos de interesse local, todavia, no entendimento de Roque Carrazza54, interesse local é tudo aquilo que o próprio

Município, por meio de lei, vier a entender de seu interesse. E complementa: “[...] interesses dos Municípios são os que atendem de modo imediato, às necessidades locais, ainda que com algumas repercussões sobre as necessidades gerais do estado ou do País.”

Em outro vértice, Celso Bastos55 assim define interesse local: “Os

interesses locais dos Municípios são os que entendem imediatamente com as suas, necessidades imediatas e, indiretamente, em maior ou menor repercussão, com as necessidades gerais.”

Acrescenta-se o fato de que o poder de legislar sobre interesse Local e expresso e congrega poderes implícitos, necessários à concreção e poder expresso, ainda que o próprio conteúdo de interesse local seja indeterminado. Em certos casos será difícil que dado interesse local não possua repercussão em nível estadual. Então, o que há de prevalecer é a predominância do interesse, mas isso pode constituir também uma questão de fundo político ou econômico. Devemos nos ater ainda a seguinte constatação: quando a pauta de discussão envolver receitas e não encargos, haverá um potencial maior da ocorrência de conflitos de competência.

Ao dissertar sobre a descentralização na Espanha, Parejo-Alfonso56

posiciona-se no sentido de que o sistema de distribuição de competência e muito complexo, de forma que a simplicidade e o desapego da enumeração de competências seriam o ideal.

Graff Leuzinger57 atrelam o art. 30, I a interpretação do art. 24, da

CRFB dando primazia aos Estados-membros, caso contrário, haveria a possibilidade de "coexistirem num mesmo Estado, legislações municipais contraditórias relativamente a uma matéria já regulada por lei estadual". Mas isso implica

54 Idem

55 BASTOS, C. Comentários a Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva. 1988.

56 PAREJO ALFONSO, Luciano. Código del Medio Ambiente. (Colección Códigos Básicos) Ed. 5ª,

Madrid: Thomson Aranzadi, 2007.

57 GRAF, Leuzinger. A Autonomia Municipal e a Repartição Constitucional de Competências em

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33 atenuação do campo de autonomia dos Municípios, e não nos parece a interpretação mais acertada. Tanto os Estados-Membros como os Municípios integram a federação e gozam de autonomia. Se a ideia da autora fosse razoável, a repartição do poder não retrataria o espírito do federalismo brasileiro, tendo em vista o artigo 24 c/c art. 1°; art. 18 e art. 30, inc. I, da CRFB.

O art. 30, II, da CRFB preceitua ao município suplementar a legislação federal e estadual, no que couber, o que não ocorria na Constituição anterior, podendo o município suprir as omissões e lacunas da legislação federal e estadual, embora não podendo contraditá-las, inclusive nas matérias previstas do art. 24 da CRFB.

Assim, a Carta Magna brasileira prevê a chamada competência suplementar dos municípios, consistentes na autorização de regulamentar as normas legislativas federais ou estaduais, para ajustar sua execução a peculiaridades locais, sempre em concordância com aquelas e desde que presente o requisito primordial de fixação de competência desse ente federativo: interesse local, aponta Silveira58.

(34)

34

CAPÍTULO 2

DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA AMBIENTAL NA ESPANHA

2.1 Competência Ambiental na Constituição Espanhola

Em relação a questão ambiental na Constituição Espanhola, o art. 45, assim estabelece:

Artículo 45.

Todos tienen el derecho a disfrutar de un medio ambiente adecuado para el desarrollo de la persona, así como el deber de conservarlo. Los poderes públicos velarán por la utilización racional de todos los recursos naturales con el fin de proteger y mejorar la calidad de la vida y defender y restaurar em medio ambiente, apoyando en la indispensable solidaridad colectiva.

Para quienes violen lo dispuesto en el apartado anterior, en los términos que la ley fije se establecerán sanciones penales o, en su caso, administrativas, así como la obligación de reparar el daño causado.

Do referido disposto constitucional, Almeida Camargo leciona que ainda podem ser extraídas as seguintes funções, de acordo com Perez Luño59:

(1) uma função preventiva, de onde se pode extrair um mandamento constitucional de os Poderes Públicos tutelarem o meio ambiente, velando por sua utilização racional e protegendo a qualidade de vida; (2) uma função restauradora, devendo os Poderes Públicos “reparar, cuando sea posible, los daños y agresiones de que haya sido objeto”; (3) uma função promocional, já que a “Constitución española no sólo prevé uma tutela estática del medio ambiente, sino

59 ALMEIDA CAMARGO, Nilo Marcelo de. A resolução de conflitos competências ambientais entre

União e Estados membros no Brasil: aportes comparados com Espanha e União Europeia. (Tesis Doctoral Inédita) Sevilha: Universidad de Sevilha. Sevilha: 2017. Disponível em: <https://idus.us.es/xmlui/handle/11441/61111> Acesso em: 13 de maio 2019. p. 440 apud PEREZ LUÑO, Antonio Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución. 6ª Ed.

Referências

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