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Revista de Guimarães Publicação da Sociedade Martins Sarmento

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(1)

Casa de Sarmento

Centro de Estudos do Património Universidade do Minho

Largo Martins Sarmento, 51 4800-432 Guimarães

E-mail: geral@csarmento.uminho.pt URL: www.csarmento.uminho.pt

Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.

https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/

Revista de Guimarães

Publicação da Sociedade Martins Sarmento

S

ÁTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS

.

III.

ALMEIDA, Eduardo de Ano: 1951 | Número: 61

Como citar este documento:

ALMEIDA, Eduardo de, Sátiras políticas de seiscentos. III. Revista de Guimarães, 61 (3-4) Jul.-Dez. 1951, p. 426-454.

(2)

.

.

e

.

I

Sátiras Políticas de Seiscentos

III

POR EDUARDO D'ALMEIDA

Motes aos Fidalgos de Portugal q, hauião

de entrar em hüas festas feitas a elRey de

Castella d. Phelippe 3.°

Determinada a Camara de Lx." a festejar aos Reis de Castella, q. dizimo vir a e l a a instancia dos Ministros do dito Tribunal, ou por bem publico, ou por respeites particulares, tomando eles nesta em- presa por padrinho ao Marques de CastelRodrigo, q. sempre to amigo deste Reyno, e fauorecedor de engenhos surtis, como Manoel de Vasconcellos no tempo presente Presidente da Camara, e Ayres de Saldanha no passado vicerey da India, depois de assentarem, q. a principal festa, q. a Cidade hauía de fazer sertão canas, etorneyos, ordenou a Camara de

Lx." chamar .Poetas de Engenho, q. compusesem os

motes p.** as pessoas notareis, q. sem duvida entra- rião nas ditas encamisadas, o que tudo

se

fez, e acomodou tanto a proposto, que nem Adão no Pa- raiso terreal pos aos anímaes os nomes tão confor- mes a sua natureza. E depois de compostos os celebrados motes os leuou o Draque Procurador da Cidade da

p.*°

delta sua senhora a cada hã dos cauai- gantes, começando pelos titolos, e Ministros.

Duque de Bragança.

. na bandeira; Real sangre; mas pensam.t°fl

(3)

J

SÁTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS

427

Duque de Aueiro. . Eu sou enterrado vício,

E não ajunto dinheiro

poro, tine alabardeiros

na bandeira.

De estudante fui a Duque, e com hã pobre cartapacío somente entrei em Palacio.

Marques de

v_a

Real.

De meu Real sangue em

ter com os Mouros repiques : benção foi de

A.°

Henriques.

Conde do Sabugal.

Adonde acharemos donde

o bom zelo deste Conde.

Conde do» Redondo

Eu, e meu

f.°

Francisco

nos entendemos mñy bem,

mas a nos ambos minguem. Conde da Vidigueira. O humor de mentiroso me causou o ser gotoso.

:

Conde da Atouguia Entro aqui por rabear, E nisto bem me desgauo pois quem rabeia tem rabo.

. f . Conde de

V."

Noua

Navego por outros rumos, São conhecidos meus fumos.

Conde da Calheta.

Sou comprido, sou sesudo, Sofrese hã p a r o mudo.

Conde de S,ta Cruz. Caibo em pequeno lugar

mas por sesudo, e .grane grande lugar em mim cabe.

(4)

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x. g.

(5)

SÃTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS 429. l

Conde do Vimioso.

fiz paruoices subidas

com estas barbas compridas..

Condede Monsanto.

O fogo entre os elementos he o Q. he mais Ieuantado :

quem fogo tem misturado tenha altos pensamentos.

Conde de Mira.

Eu sou io Condede Mira, porem se menos mirara . .

por mais ditoso me achara. Conde de Tarouca.

Eu sou ramo de Menezes, que a Portugal ilustrarão C não souberão, ,mas guerrearão.

Conde de Basto. Pellas mudanças de"estados

se vem homens melhorados...

z.)

Conde de Portalegre.

Não sei derem o q . d i g a

occasíão . .t

não Vl fr. Sebastião

.

.

*na bandeira. '

.

Amigo soude iustiça,

m,ÍO mais da misericordla :

com niflguçm numero concorda.

pois, q. nesta

Conde de l.inhares. Por ser paruo, e por ser louco

ainda a fortuna deu 'pouco. ' Conde da Castanheira.

Sou Conde, mas albardado;

e a albarda anda em. Morgado.

I

I

Conde de

V."

franca. Titolo sou Villa franca, porem não sou Conde franco,

, neste peccado sou manco.

(6)

l .› REVISTA DE GVIMARÃES ~.

-

a .

.

. Conde de Tentugal.

Eu Conde-sou de* Tentugal,

sou homem de bom intento, mas o meu entendim.*°

he de hum Arraes de Setubal. l

Conde ~.da .Atalaya

Conde fui Prouedor, '

outros forço prouedores, . ..

mas eu dos mais sensabores. Conde de Lumiares. . Não me deu meu payamigOs, deu me renda, prata, e ouro, sendo o outro maior tesouro.

Bisconde

M.to tomara*ser Conde,

e d. B.ar de Teue

pode ser que anos o leue. Comendador mór.

Si assi fuera todo el nescio fuera el nescio, de grau prec1o.,z

So p.8 mi I nu

Contador mor.

m_lo conto, e :nda mais contara se o Sabugal me deixara.

na bandeira. MAO monta ter amigos que se estes não tiuera já resistir não pudera. '

Í

4

Monteiro mór. Sou a mesma boniteza

segundo de mi presumo, tudo ayre. tudo fumo.

"na bandeira;

Viua.minha gentileza,

e vira o,meu tribunal, eu uiua, e Fernam Cabral.

430

Presidente do Paço. .

Falto pouco, mas sou certo, não me fez Deos mals esperto.

(7)

I

l

SÁTIRAS po1.íTlcAs DE SEISCENTOS

431

Presidente da Camara

Pouco importa ter talento q,d0 a sorte o favorece, POIS quem t.em menos merece.

D. Luíz de Lancastro. Sou franco, e sou cobarde,

e ainda tenho penhor, que a todos sou tredor.

na bandeira. .

Aparado como nabo, .

besta, mas besta sem rabo.

Marichal. Sou Coutinho Marichal ioga bem de mangoal.

Barão.

Sou estremadovarão :

sou burrinho de verão. D. GeronimO Cout.°

P."

tudo fui nascido,

pois em mi me cabe tudo :

sou arrogante e sesudo.

il D. Nuno Mascarenhas.

Não quero trazer abanos, nem menos ver castelhanos.

Capitão da Guarda. Sou louro, corado, G fresco e serrado como tudesco.

D. Felipe Lobo.

Terrível negoceador, enfadonho, e sem sabor.

D. Geronimo Bacalhao.

com tres sílabas som.ÍG faço rir a toda a gente.

Frc.° Corres.

Quem sobre pipas se escancha,

e de .parras faz capelas

(8)

I

432 REVISTA DE GVIMARÃES ;

i |

G.10 Pires de Caru.°

Carualho não em deserto, mas carualho em pousado, redondo, e b e m folhado.

Casfiiho Louro.

Natura me deu ser louro,

e meu tio dobrões de ouro.

118 bandeira.

O Castilho q. aqui andas

ficou assi branco do pó, das pedras de seu auó.

D. Luíz da Sylueira.

Encerrase neste couro

O sangue, e a alma de hã mouro.

D. G.co Coutinho.

Nunca deu o patrio Teío

outro engenho semelhante, segundo cuida o Galante.

D. ML¢1Coutinho.. Deos de Amor, e da fortuna contra mi fizerão liga : cruel ele, e l a inimiga. .

D. Henrique Portugal.

A 2.3 filha minha, .

q. eu com o Conde vi casada

me dá o trigo, e'ceuada q..eu bem pouca de mim tinha.

D. João Luiz.

.Sou bom fidalgo,

e no MÓIS

como os outros ammals.

Frc.° de Sousa Mancias. No campo estou em meu centro,

na Cortenão eaou seguro, sou hã fogo de monturo que me destruo por `dentro.

(9)

SÃTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS

433

\ .

1

D. Esteuão de Faro.

O Lacerda, e o Loureiro

me serrem de meu roteiro.

Olhay quem bem.me gouerno, pois são ministros do inferno.

Antoni Pr." .

Deu me fortuna o que tinha, não sei o q. em mim achou,

que eu paruo escudeiro sou. na bandeira.

Lumiar, e Montemor me deu humildes parentes, Ia me nascerão os dentes,

e esta linguasem sabor.

.I

F." do Presidente da' Camara.

De ma aruore mao fruto,

de hã bruto outro bruto.

Eu sou d. Diogo D. Diogo de Castro. fidalgo mór, regedor. D. Luiz Pr." .

Nem coche. nem alcorcoua

p..'¡

ser ministro basta,

triste de quem tempo gasta.

D. Frc.° de Almeida.

Certo q. he cousa medonha não ter hã velho vergonha.. ;

D. Ferram Miz Montemor. Debaixo de ceremonias

8e encerra a parvoice, paruo desde menmice.

Cristouão Soares Secretario. Nas agua nasci do Minho, .

mas mais me derão as do Telo ;

pois com bens, e honras Me veio 9

Q

D. Diogo Carcome.

Viua 0 meu contador, que a custa dos requerentes

(10)

434

Aposentador Mór.

Parelhas correm

em

mim ambas com grande furor, ser pano e sem sabor.

G_ar de Sousa.

Não me farão já ministro ? Não acabarão comigo ?

Maduro são como figo.

P."

o ínfemo se era' esta ma alma, q. tenho, so esse he o meu desenho.

Romanos, e Atenienses tombem forço desterrados -

mas como eu nunca culpados.

Lois da Cunha. Tamanho como belota encho haja casa ate porta.

Alcaide Mor de Abrantes. Querem aquidizer bargantes que sou asnomor de Abrantes.

João Furtado. Paruo como seu irmão, mas não tão gãocapitão.

Reposteiro mór.

Porq. sou pequeno sou reposteiro, v

e a ser maior

ser pano dearmar era milhar.

D.

P.°

de Castelbranco.

D. João de Castro Presidente q. foi.

REVISTA DE GVIMARÃES .‹ .nó .. r .› I

D. Aluaro da Sylueira de Eu ora. Viua o'Portugues Camões,

pois me deu pão, e calções. I

Vasco fiz. Ce~zar.

Sou Cezar, masmil Pompeyos

me espancão, e inpmâo :

tenha eu. elles se riso. '

(11)

SÃTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS

435

D. G.1o da.Costa.

No que traz, e no q. diz

Cavalleiro de Amadiz. De P.° de Alcaçoua. Sou estremado basbaque,

e não tenho só este achaque¿

Nuno Garcia de Noronha. Não faço Iiuros¡ nem trouag,

mas costumá. a dar nonas. . . D. 'An.t0 de. Mello » de Eu ora.

A fortuna Íauorece aos nescios como eu, por isso seus bens me deu,

e não a quem os merece.

D. joão,Soares,

Se os ares são sortis. . : « :f

eu sou sottil com os ares,

vento; e por isso soares.

z E

w .

D. B.ar de Teiue.=

Teue Portugal trabalhos Teíue Portugal governa. q, tem fogo, e alenterna.

na bandeira. .

com estas barbas de açafrão adubo m.tos guisados,

trago os homens encantados.

u

D. Lopo de Almeida.

A densa Versus, e iupiter

me puserão neste estado, doente, e deshonrado.

D. Luiz Cout.° Almourol. Eu as estrelas penetro,

e o que tenho de mal, ou bem não o penetra minguem.

D. An.ÍO Pr." Santareno. Bom pay tine grane. e nobre, pereço Africano pobre.

Í

(12)

I

436 REVISTA DE . GVIMARÃES

João de Saldanha Camarão.

Ministros me comunicão z

seus pensam.t°se votos: .

dão mos sãos, eu doulhos rotes.

P." de Alcaçoua

P."

fazermos trancinhas que mãosinhas são as minhas.

P."

de Mendonça St." clara.

Sou velloeino "de Alcorça

e paruo como Mendoça,

_]oãode Mendoça. Caçoo.

Não sou carne, nem peixe, canastra, ou almofrelxe..

João Gomes da Sylua. Que bojo

p."*

ministro! Mas onde ha hi outro 'íado se uiue desesperado.

Christouão de Almada. Ô demo quanta fossa O demo quanto trapassa; a linguahe testemunha do que a minha mão empunha.

D. Frc.° Mascarenhas. Fui

p."

desapontar

.

. quem não e.staua afrontado, fm por lama,'vim tosquiado.

D. l u z de Faro Eu sou

m.¡°

sem sabor,

e ainda .outro m-al trago, que se Jogo nunca pago.

D. Lourenço de Castelbranco.

Tardo, e não arrecado, poro. sou mao namorado.

Geronimo de Mello.

Em q. não queira sou melo, mas muy pouco cortesão, por ql-l€paI'cÇo rascão

a modo de mmmello."

(13)

SÃTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS 437

Breve anotação e novos documentos

«Pelo menos desde o princípio de 1609, trata- va-se de conseguir que Filipe III viesse a Portugal. Neste negócio se empenhava principalmente a Câ- mara Municipal de Lisboa, .alimentando a esperança de que El-Rei, vendo tantas e tão urgentes necessi- dadesque padecia o reino, acudisse a elas com o remédio* necessário. Assim pensavam muitas pes- soas, que parecia quererem atenuar o mal" comum com uma esperança vá». (Fortunato .de Almeida

-

‹História de Portugal››, t o m o l V , pág. 871). . Retorquiu-se' ao desejo com a mingua de recur- sos: se tanto assim o queriam, arranjassem 370.000 cruzados para ajuda do custo da viagem. As câmaras .estontearam z a'miséria esgazeacla, a tome já atró- tica, aS más anezas, a fuga desarvorada «dos imi- grantes, e .

.

.

de um 'Bem e de um Nome perdidos. Lá se ajei- , . tou o pecúlio do oneroso contributo, que era mais outro novo se ridículo vexame ( afinal bem significa- tivo=da pelintrice daquela postiça e efémera grandeza Imperial). Mas adiavam-oa sempre ano‹e.»mais ano. Dizem 'que a instâncias do Duque de Uzeda, que substituira o de Herma, seu pai;em influência unto do 'Monarca. e na intenção de em Côrtes "fazer jurar seu filho herdeiro da coroa, decidiu-se. Em 1611, para _ouando, primeiro, se fixara, taxara- -se O preço e conseguira-se arrecadá-lo. «Com a viagem não se gastou só o produto de derrama, anteriormente lançada sobre o*reino B que a Câ-

mara de Lisboa guardara no seu cofre. A capital

contribuiu com 240.000lcruzados, o resto do País com"270.000›. (Damião Peres-«História de Por-

tugal)›, vol. V, pág. 266, Rebelo

da

Silva- «História

de~PortugaI›,* l.ll, cap. 3.°). .

Saiu Filipe

leal

de Madrid a Badajoz e de Bada- joz H Elvas,onde chegou à noite de 9 de Maio : como .aposentadoria, o Mosteiro de S. Domingos , a 12, também já noite, chega a Extremoz , d a q u i , dia 14, sai para Evora, ‹‹ que regalou Sua Mages-

tade Católica e SS. AA., com um vistoso auto de fé, aquela dor tão funda a roer na alma

(14)

438 REVISTA DE GVIMARÃES i I

:

l

onde figuraram 120 penitenciados (84 homens e 36 mulheres) sendo 12 destes infelizes (4 homens e 8 mulheres), relaxados em carne, isto é queimados em vida; Celebrou-se este grandioso espectáculo, mui cristãmente, . no Domingo, dia de Páscoa do

Espirito Santo, a 19 de Maio, para solenizar a chegada do poderoso soberano das Espanhas e. das lndias›. Ànoite, .ofereceu a Câmara uma grande colação de doces. (Eduardo Freire de- Oliveira

-

Elementos para a História do Municipio de Lis-

boa,

l."

Parte, tomo ll, nota

de

páginas 460 e 468). Desta nota de. viva curiosidade. e sériadocumenta-

trasladar e resumir o essencial. Ali, na Universidade de Evora, assistiu aura defesa de teses, sustentada por D. Rodrigo de- Melo, Mar- quês de -Ferreira, e depois ouviu no Colégio dos Jesuítas a representacão de uma dessas trágí-comé-

dias, mortalmente enfadonhas, carregadas de secas

alegorias, com que os jesuítas pretendiam regenerar o teatro tão impiamente inaugurado por Gil Vicente. Oespectáçulo do abatimento de Portugal. era com- pleto

em

Evora: «o descendente do rei vencido em Aljubarrota assistia triunfante e soberano em.Portu- gal~.à batalha dialéctica ~pu~eril de uma..defesa de te- ses, intentada por um descendente de Nuno Álvares Pereira. » (Púzheíro : Chagas-História de Portugal,

ed. _popular-ilustrada, vol. VH, pág. 2l2l). A 20 sai de Evora para ir dormi.r a Montemor,donde parte 3. 24 para ~3 Landeira, 25 em Cuba, e chega a AI- mada- a 26.. A.5 de Junho passa para o Mosteiro de Belém. Aqui demora-se estranhamente: que estava à espera de .que rematassem as ornamentações: ‹ mas à boca pequena dizia-se-e estes boatos comunicou

à

que vinha‹na.comitiva régia-que o rei aguardava

a chegada «de treze galés de Espanha, pois queria estar bem guardado. » (Damião Peres, ob. cit.).

. , Finalmente, em 29 de Junho, desembarca na

ponte, para» essezefeito construída no Terreiro do Paço, em Lisboa. Um-assombro dominguelho de or- namentações, de ,gales, de solenidades e festejos. Os nobres remordiam-se: Íora-lhes vedado «trazer bordados ou recamadosde ouro ou prata nos vesti-

são, estamos a

sua Corte o Embaixador francês, de- Grenelle,

(15)

SÁTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS

439

dos,.assim de corte como de caminho, sob pena que as pessoas que se cobrirem diante de Sua .Mages- tade, serão. condenadas em mil cruzados ›>. Sempre a vexatória e deprimente subalternização, na tartu- fesca pelintreira de fingida humildade-humilhante ! Mas nem por isso se amortalharam de nojo ou luto. . . De joelhos, com garnacha de cetim negro aprensado, guarnecida. de passamanarias de oiro e prata, forrada com. telas de prata, nas cores branco e. preto da cidade, calças de obra com forros de tela, e da mesma o juba, roupetade cetim preto, com botões de dia- mantes, o Presidente da Câmara entrega-lhe as :cha- ves da cidade. Montou .a cavalo, e, depois do beija- -mão, desfila o processional cortejo. O cais estava juncado de ervas e flores cheirosas, como na procissão de Corpus. Abriam o acompanhamento os dois Pro- curadores da Cidade, eseguiam muitas danças das regateiras, ‹mui'bem vestidas de seda com muitas cadeas de ouro e joias››, e nas mãos arcos de flores e frutas de cera (funambulesca e palhácica mascarada). Os arcos eram monumentos. Havia, primeiro, o dos homens .de negócio,

de

quatro fachadas, com varandas de madeira torneadas, pedestais, colunas,

hastes e estátuas, quadros, alegorias, dedicatórias

( e aqui Filipe desceu do cavalo EB* seguiu: debaixo do pátio) e, a poucos passos, o dos mercadores/ ale- mães. Nas portas da Ribeira;lem lugar dos dois arcos estreitos, demolidos pela Câmara, ergueram. os Ingleses um outro, de 137 palmos dealtura por 50 de largura, com a estátua da figura de Lisboa, de um lado, mais as de D. Afonso Irlenriques,D. Sancho e alguns Cavaleiros Portugueses, e do outro, de Gui- lherme de Longa Espada

e

mais cruzados da* con- quista de Lisboa.: =l'lo alto, S. Jorge, c o m a lança, a vencer o dragão, depois-no Pelourinho Velho, às .

entradas das ruas D. Gileanes, das Carniçarias Ve- lhas, no topo da Padaria, na Porta do Forno,

na

.rua Nova.

.

.

-os dos .oficiais das Bandeiras de S. Jorge e d e S. Miguel, os de corrieiros, aztafonei-' ros, sapateíros e outros ofícios embandeirados, o dos pintores, em S. Giro-com as estátuas da Geo- metria e da Perspectiva, o dos Flamengos... O cor- tejo desfilara. Acenderam-se de noite as luminárias

,

(16)

1

440

REVISTA DE-. GVIMARÃES

houve grandes invenções de fogo. Na

de

1 de Julho, saí ‹‹ mui luzida máscara ». Os da Companhia de jesus, deram, em Santo Antão, uma»Trági-comé- dia ( e era-o, na verdade, .tudo aquilo

.

Padre António

de

Sousa - D . Manuel, "Conquista- d o r d o Oriente. Filipe

leal

entreteve-se a v e r as

padeiras e colarejas bailarem ao som dos adrufos

,

ouvira, até eles enrouquecerem, os Iaudates de Que-

vedo e Rodrzgues Lobo, e mais versalhada,demorou-se

por conventos de frades eâde freiras e, generosa- mente, deu aos pobres vinte mil cruzados.

..

do dinheiro que nos levara pela. gentileza da. visita.

), do

A ela se referem mais os seguintes documentos, que extraio domeu precioso caderno :

Pessoas,.q. acompanharão a elRey d. Phelippe

qd° ueo,a. Portugal no anuo de. 1619.

Com elRey.

O Duque de. Vzeda

do Duque de Lerma. O Duque de Cea neto do Duque de Lerma.

O Conde de Medelhim, fazia oficio de Mordomo mor. O Duque de Pastrana.

O Marques de Pouar capitão da Guardar .O Marques de Fois capitão dos Archeiros.

O Marques de Velada. , O Marques de Malpica. . . O Marques deAImaçan. " . O Marques da Hinoiosa. » . . . . D. Diogo de Zunhiga mordomo m o .

e

Com o Prín ~cepe. I

. E

.

J

,d. Diogo de Menses mordomo

O Mestre de S. A.

d. Baltezar de Zunhiga seu Ayo. . .

O Conde de Saldanha f ° do Duque de Lerma, genro do

D u u e do lnfantado. z : O onde.. de Lumiares. v Y . O Conde de $10 esteuão. Í O Conde de Oliuares. ` . , " mor. . . . O Conde de Castnlho. - . . z , 14. Caualheros de la boca. . . ,

O Patriarca de lndias Capellão mor. . , , .

50 pessoas da capella.. - . ' .. '

100 Archeiros. , . . . 1

200 da Guarda espanhola, e'Alemana.

H

1

I

(17)

SÁTIRAS ~POLÍTiCAS DE SEISCENTOS

441

› « Com a Princesa. Dueñas de honor, d.

M'

de Benauides. d. Margarita de Cordoua. Damas. .

.Madama Capella francesa. .

Madama Heli francesa.

z . d. Isabel de Ia

Cueua. d.

M"

de Cardenas.

d. M

"

de Tauora.

haja Açafata, 4 da Camara. 2 del retrete. As, criadas des- tas senhoras 50. Com 8 Infanta. d.

M'

Henriques. d. Margarita de Tauora. d. Eluira de Gusmam. . d. Joanna de Mendoça. d. Isabel de d. Marianna hüaAçafat.a, 2 Aragão. . Henri%1es menina. .

da amara, haja do retrete. I

t

Jornadas q. eIRey.iez de Madrid ate Líxboa.

\ :fá de Madrid a Mostenes. a Casarubios. a Anouês. a St" Olaya. AI Brauo. a Talauera, a Oropesa. a Alunaras. a Trusilho. a Mayados. a Medelhim. a Talaverola. a Badajos.

. a Eluas a comer . a las aventas de Alcauanica.

a estremes.

a la vento de los Bruceros. .

, 8 eu ora. a Montemor o nono, as vendas nonas. a Pegues. ' 8 Landeira. a Coira. a Almada. . a Belem. , , a.Lixboa.. : " z- 1 .Í « 13 Í 9 I 1 I Q .

(18)

I

\ . " \

\

442

REVISTA DE GVIMARÃES

Pratica, que lhe fez o d. Bertolameu Cacela Conego da Sé d'Eluas na porta de..Oliuença da mesma cidade sabbado I l . de Mayo de 1619 :

Mt°alto e má poderoso Monarcha, legítimo rey, e natural sõr nosso.

A nobreza, e poro desta vossa cidade

pá-"

na venturosa sorte desta pr." entrada, to.dos como má leses, e má ledes vontades deseiamos manifestar a

V. Mag.d° os aluoroços na esperança, as alegrias na presença do grande bem desta vinda, e vista tão desejada, e O{1Sfl{110S tombem dizer merecida, de que todos huns aos outros nos damos mil parabens.

Estes prazeres com estes aluoroços tão geraes se acompanhão de hã grande desejo de render gra- ças iguaes a fauor tão singular, como he a Real presença do aspeito de V. Mag.'*° igualm.*e benigno, e venerando, q. pellos olhos de todos em todos

esta influindo alegres esperanças das ms., das liber-

dades, dos priuilegios, das honras auantajadas, que

como de sua propria fonte bretão da Real Magnifi- Cencia erdada do sangue Austríaco do grande Mestre

de Reynar o Magnificentissimo Sõr o Sõr d. Phelippe vosso pay, q. deos tem, q. hora vay em 40. anhos emnobreceo esta mesma entrada, e illustrou com o resplendor de sua amantissima presença estoicidade,

este reyno de Portugal, altíssima perola, q. com tanto

gosto seu, e tanta gloria nossa engastou, e deixou en- gastada por remate na coroa, e Monarchia espanhola. O Rey dos reis, q. estabelece os estados, pros- pera os Reynos, perpetua os imperios, z

perpetue, prospere, e estabeleça os estados, os reynos do impero de V. Mag_de com perpetua successão de Princepes, e infantes, e Reis, com plena felicidade de successos venturosos por mar, e terra de ambos os urbes, te render e sogeitar os ceptros imigos ao ceptro espanhol sempre AuguSto, q. V. Mag.‹*° goze com grandes prazeres na felicidade' de "S. A. q. nosso Sõr gd.° a todos Amear.

. Resposta delRey. .

yo os agradesso mocho todo lo q. me haueis

dicho en nombre desta. ciudad, y Reyno. yo os lleuaré. en memoria pá. todo lo que se offresiere.

(19)

SÁTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS

443

Pratica, q. lhe fez 0 Juiz de fora de estremes

;

M_t0

alto.'e e

Sôr nosso. Alegrese Portugal com todos

unidos

a

esta coroa, .particularm.*° se alegre esta notauel villa de estremes com esta m. q. Deos lhe faz na boa vinda e visita de V. sacra Mag.‹*° a este seu Reyno, a qual todos conhecemos por milagrosa, e bem se deixa conhecer .em ser tão repentina, e de tanto tempo esperada, por serem assi todas as cousas q. Deos obra por « milagre; pello qual vemos hoje

cumprida aquella promessa

q.

Deos ez. a este Reyno delle amado, qd° ao seu. pré e sá, Rey lhe disse q. poria os olhos nele atenuado, ez o restauraria na decifra sexta geração. V.Mag.<1°, ,Augustissimo Mo- narca, fazendo boa computação, he o prometido, e

esperamos. não só uer. este reyno restaurado, mas

má dilatado. Não conhecemos nos por menor mila- gre a eleição q.

V.

Mag."° fez do caminho p&~ esta sua villa rica com o mais real,

o ceo goza, o~da Rainha St° Isabel verdadeira ascen- dente de V. Maga' E se o ceo goza o milhordella

que he a alma, . .

m.*°

poderoso catholico Roy,

os reynos

e puro coração, q.

, com outro posto,

q.

não sá festejamos todos a V." Mag.*I° tão aparelhados a. por a vida como espe- ramos ms.. Nesta Real benígnídade dante mão rece- bemos a maior, com a real .prezença do Principe nosso Sõr, 'q. Deos nos gd.° com felícissima geração, e acrescentam." de nouos Reynos, que temos por sem duuida, por estarem com tantos prodigios no seu nascimt° prometidos, com o qual esperamos uer postradosa esses reais todos os da conquista

destes Reynos de e q. Deos nos guarde

por larguisssímos anhos. .

pes

.V. Magd.

Pratica, q. lhe fez o juiz de. fora da Cidade de Eu ora:

Se assi como

Sacra, catholica, e Real Magd.°.

apresentamos as .chaues desta cidade a V. Mag.'*°

nos fora' possivel manifestar o zello com q.. as ofíe-*

recemos, e o~. contentam*°, q.= temos todos os mora- dores .delta .em ver cousa .tão desejada, como he a

(20)

I

I

444 REVISTA DE GVIMARÃES

Real presença de V.z Mag.‹1° dentro nestes' muros, vira V. Mag.'*° 'nesta cidade segunda do Reyno, q. assi. como entre todos os' Reynos de suaincompara- vel coroa* de nenhum delles he mais amado, q. de' Portugal, q. nesse amor não fica a Eu ora z em pré lugar nenhum de todos os-pouos delle; O mesmo se.uira na lealdade de nossos animes, q. he a verda- deira chaue dos pouos, se se pudera fazer patente com as chaues, e posto q. a lealdade he, e sempre foi particular costume, ou natureza dos.'Portugueses pá com seus Reys, dos quaes V. Mag.¢I° erdou tantos Reynos com ela ganhados, e conseruados, e a ela juntam.*°, com *tudo esta he a Cidade escolhida em' todo este occidente de cuja

fe

fiou Sertorio sua pessoa contra o impero Romano, e com a mesma seruiosempre a seus Reis passados de gloriosa memo- ria, dos quais sendo muy frequentada a remunerarão comlhe fazerem m. de nos tratarfmais como a fi-Ihos, q. 'como a subditos, e esperamos de .alcançar de V. Mag.<I° esta m. de querer ser seruido de se pare- cer com eles nesta vontade

connosco, confir- mandonos nestas liberdades, e príuilegios,de q. não podemos duuidar, pois estão fundadas nossas espe- ranças na benignidade do mais benigno e poderoso Rey do Mundo, 'donde procede teremos por certo, q. esta boa vinda de V. Magd.°

a

estes seus Reynos seja pá grande acrescentam." do bem comum deles, pá ~q. o Seia tombem ~da gloria do amplissimo nome de~V. Mag.

,

q. vira largos, e felíces anhos.

Pratica, q. lhe fez em Montemor o Nono o iuíz de fora Ante Barreto de Albergaria: .

Mt° alto, catholico, e poderoso Rey, e Sôr. He tão grande a luz, e resplendor, que a presença de V. sacra, e Real Mad.° causa em todo este seu Reyno, e poro, que a todos nos cega os enten- dim.*°$, e faz e m u d e c e r a s linguas com que ouue- ramos de render as devidas graças a V. Magd.° por querer por =os olhos .neste»seuReyno, eco no nosso legítimo, verdadeiro, e natural Rey, e Sõr econfortar o paterna! amor, e cortar por todos os inconvenien- tes pá esta gloriosa jornada, q. de todas as

p.*°$

se puzerão, e por cima de todos honrar e alegrar este

(21)

SÁTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS

445

seu Reyno, e poro e poros delle com sua Realpre- sença e benignidade. Se todo este, Reyno, e poro de Monte mor pudera manifestara V. Magd.° seus Cora-

ções neles se virão osjubílos de extraordinaria alegria

,

e B

mais propriamfe em suas almas, q. em suas casas, mas bastão os olhos, «os rostos, o aluoroço, q.todos opinião, q. por us Portugueses, cuja leal-

V. Magd.'*°

amparo nosso, e de toda a Chrístandade.

agora leal vontade, q. todos tem de receber a V. Magd. .

Na larga ousencia de

V.

Magd.° /má alto, pode- I'OSO e clementissimo Rey Sõr nosso/se pudera dizer por esta nobre, e leal cidadeo q. por Gerusalem no tempo de seus trabalhos, cidade tão populosa, senhora das gentes, princesa das Prouincias, como está desamparada feita quasi' víuua. Porem

comeste alegre vista de V. Magd.°,. «e *dos Prince- pes senhores nossos h e t à o grande .o contentam.*° destes vassallos, q. nem se pode declarar com pa- lauras, nem representar com festas interiores, e so podemos dizer que esta geral alegria se iguala com ia rezão, qllei todos temos de festejar na alma a grande m. q. V. Magd,° nos .faz em vir com sua Deos o fez Sõr, entregando-lhe o gouerno desta coroa, com a qual ficou este soberano ímperio escurecendo os que os Asslrios, Persas, Gregos, e Romanos conquistarão tiranícam.t°, pois he tanto maior o nono Mundo, q. depois delles se descobria de hã e outro polo, q. V. Magd.°, e seus predecessores tem con- quistado com zelo da propagação da fé deX.*°, e assi ha ele de permitir, q. esta grande monarchia edificada sobre columnas da fecatholica, e iusfiça com q. V; Magd.°

V. Magd.° por.

m.*°$

e felices anhos, e depois seus descendentes pa sempre, e que esta entrada Seia

mostrãopflse V. Magd.° confirmar na nos fazer m. tem destes se

dade -espero q. V. Mag.*1° experimente em todas as ocasiões, em .q. deles se seruir, q.zpermita a seja por muyiargos a n o s pá? bem, e Pratica, q. lhe fez o D. Ignácio Fer" Deputado da mesa. da Conciencia na Cidade de Lx" no arco do Pelourinho em 29. de unho de 1619:

Real presença honrar este seu Reyno, de

*qL

(22)

446

REVISTA DE GVIMARÃES

i

I

I

tão prospera,. e temida dos enemigos, .como era desejada de nos, e necessaria pa .toda Espanha. Digo Sõr pa toda Espanha, poro. seu amparo e aug- mento .consiste em V. Magd.° fazer cabeça deste

. impero esta antiga, e ilustre cidade m.aís digna dele,

` q. todas as do mundo, assis.tindo aqui sua real corte,

pois he o coração e meyo ›de todos seus estados, donde se poderá com a morfacilidade acudir a todas as

p.*e3

sem se perder occasião..

Seja. pois V. Magd.° má bem vindo, e o s Prin- cepes nossos Senhores, pa daqui exercitarsuaforta- leza, e liberalidade, a temperança, a mansidão, e a paternal afabilidade, de q1. Deos .o dotou, tendo sem- pre diante dos olhos esta preciosa ioya. As chaues entregamos agora 'H V. Magd.°, os corações a

21.

a n o s . Sempre V. Magd.°"os achará muy leses e animosos em seu seruiçoƒ Elles são a p r " porta por onde V. . Magd.°~ ia 'tem entrado. . O amor 'he o verdadeiro ' muro. e fortaleza desta cidade. Entre

V . . Magdl.° nesta cidade q. ia neste dia parece

senhorado Mundo, e permitirá Deos, que Seia esta hora tombem afortunada q. possa V. Magd.° daqui domar todas as barbaras nações, E igualar seu poder com o querer, pa tombem com sua liberalissima con- dição enriquecer com grandes ms. a todos seus vassallos, e nos vira

m.*°§,

e prosperos. arnos.

. Na veia satirica dos Motes aos Fidalgos de

Portugal corria sangue de. boa tradição portuguesa.

Aquele mofar destemido, por vezes irreverente e sar- cástico ex sua lágrimas bem amargas, imprimindo ao sorriso da máscara os vincos do esgar, e arfam na da cortezania incontidas ânsias. Ao nosso modo antigo, em que muito se inspirou Gil Vicente. Abanada no mais comum sentimento lírico e romântico, pouco es- clarecida e fundadamente havidos, e exagerados à deturpação mórbida, como as predominantes caracterís- ticas do nosso carácter-a nossa graça, o bom riso forte e generoso," mesmo o tonitruar da gargalhada épica dos nossos estorvados Lidadores, Guerreíros e

Navegantes, nos intervalos e repouses das aventu- .ras e . das campanhas e dos` temerosos riscos, ou nos

(23)

\

'>

SÃTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS 447

Ã

deleites dos saraus e cortes de amor, a malícia zom- beteira e calma do nosso povo artífice e lavrador,

pelas feiras e romarias ou noSdos cantos namora- dos e nos curiosos serões, .a nossa sátira, (e cum- pre louvar aqui o trabalho-ensaio do ilustre catedrá- tico da Universidade de Salamanca, Francisco Elias

Tejada Spínola

-

A Sátira Política em Portugal du- rante o Século XV, na colecção Cultura Politica) com

tanta ou Mais personalidade que as duas outras fei- ções, não mereceu ainda, e era-lhe devida, a cuidada atenção dos investigadores e historiadores da vida lite- rária nacional, sem embargo, e devido relevo, de frag- mentárias e dispersas menções nos melhores tratados. Que estavam os motes na boa tradição iàcil- mente, e sem mais alardo, o mostra só o relembrar

certos passos das Cantigas d'Amzgo e Sirventenses,

como, e sobretudo, das Cantigas d'escárneo e mal-

dizer. Até mesmo no Cancioneiro da Ajuda (1). Magníficas sátiras são, ilustrações históricas da vida, homens e costumes do tempo, por ex. no CanciO-

neiro Geral de Garcia de Resende, os Arrenegos de Gregório Afonso, criado do Bispo de Evora:

Arrenego de ti, Mafoma,

e de quantos crêem em ti.

Arrenego de quem- toma

o alheio pera si. .

Renego de quantos vi de quem foram esquecidos.

Arrenego dos perdidos por cousas não mui honestas. .Renego também das festas

que trazem pouco proveito.

Ar renego do direito

que se vende por dinheiro .

..

e Garcia de Resende a Rui de Figueiredo, que lhe

mandou preguntar se poderia pousar com ele em Almeirim :

Tenho as casas despejadas

podeis vir quando quiserdes,

de reposteiros armadas,

e cal'Ilãs^m1¡i consertadas

para vós, e quem trouxerdes.

‹1

) José Joaquim Nunes - Crestomatía Arcaica, pág. 272,

381, 398, e 406 Cancioneiro da Ajuda - Prefácio e notas do Prof. Marques Braga -Ed. da Livraria Sá da Costa.

(24)

. Í /

448

REVISTA DE GVIMARÃES / Í

I/

z' l l

Por serdes bem recebido,

trazei no alforge pato

com pescoço mui comprido,

que faça mais aparato

que um 'Papa revestido

.

.

.

\

i

Í

Perdizes, captes, galinhas, frangãos, roas, e vitelas, .

passarinhos de esparrelas, pasteis, tortas, escudelas, são víandaSmui daninhas. Tereis, senhor, ao jantar

vaca magra sem toucinho, .

com seu quartilho de vinho, com que possais arrear, e não me chamar mesquinho. A' ceia da vaca fria,

rabão, queijo, e salada, .

é comer que o corpo cria:

o mais é velhacaria,

e fazenda mal gastada

.

. .

I

Do Cordel-mor a Henrique de Almeida sobre as

.Cortes que o Príncipe D. _]oro,' estando seu Pai ~(D. Afonso V I ) em França, reuniu em Montemór-o-

-Novo, em 1477:

No mês de Janeiro, e ano de sete, '

na era que mete dez sete primeiro, em mór Monte novo os povos se ajuntam, respondem, perguntam. Se o que cá passa

quereis lá sabe-lo,

não Seia escassa .a mão escrevê-lo.

. Mas pois o letreiro

( o ) ponto não erra,

contará primeiro

o estado da terra.

A dois o vermelho, não v .ale mais 0 branco,

a dez o coelho,

perdiz faz de rance.

A vinte a galinha,

de graça mil frutos, .

doze tendes curtos aquela chinfrinha;

(25)

\\

\ SÁTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS 449

ii

Lisboa que sonha

no conde a lado, mordomo Noronha tombem deputado. Hi é Portimão, . Alvito, Penela Beringel cometa que faz o sermão...

E

dos Bispados, queo Rei D. João deu".em Sintra, e a

Garcia de Melo,dando-lhe regras para se saber ves-

t i r e tratar o . Paço

:

ainda de Fernão da Silveira sobre a Repartição

Duas cousas que não calo

há no Paço de seguir :

uma é saber vestir,

a outra saber tratá-lo.»

A quais ponho por escrito em estilo verdadeiro

. . .

Ou de Gonçalo Mendes ‹Çacoto› a uma dama que

ia para

o

Paço e lhe pedira alguma instrução do costume dele :

Formosura e fidalguia,

herdeira de mil riquezas, «

sem nos meios de tal via .

se converta* em vilania

com outras muitas pobrezas. Quando a dama não embica,

e se conserva sem grossa, estem a graça que lhe fica :

. a mais pobre 'faz mais rica a mais feia mais formosa. .

De Garcia de Resende a Ruí . de Figueiredo, que estava determinado fazer-se frade.

.

.

E muitas mais, destacando-se, pelo especial interesse histórico de pessoas e costumes e enredos da corte, os célebres

‹porás que foram achados no paço en Setuual no tempo del rrey dom _/oam sem saberem quê os fez›

.

Mais aproximadamente ainda quanto aos Motes, notaremos a frequência, no Cancioneiro, de se dirigi-

i

a u

(26)

/

450 REVISTA DE GVIMARÃES

rem uns aos outros os Eidalgos-Poetas, como Afvaro

de Brito a Luís Fogaça,.vereador em Lisboa Para OS ares correntes

desse çydade sayrem

08 devassos . torpes feytos desolutos

cumpre que logo se tyrem

sem trespassos.

ou de Alvaro Barreto a Alvaro de Almada e a outros

.

Gil Castro a Henrzkzue de Almeida, dando-lhe con-

selhos

na

sua ida a Castela . ' *

por nom levantar rrezões falar pouco depois de cea:

de Francisco da Silveira, Cordel-mor, a Alvaro da Cunha, que saíra do Paço em magro rocim e com

grande alforrada; do célebre Contador da Guarda

joão Rodrzgues de Castelo Branco a António Pa-

checo, vereador em Lisboa, em que lhe diz como, na Beira, perto da serra onde habitam os pastores, do

.petego, magro, coytado

se tornara robusto, disforme, beirão, e homem bom

da terra, etc. .

. Conversas escritas que, por vezes, atingem o

tom satírico, não raro livre, ao gosto do tempo, -Cousas de folguar. E D. João de Menezes a Uma dama que a rufiava e beirava D. Guiomar de

Castro, em que intervêem Fernão da Silveira,

D. Rodrigo de Castro, D. Pedro da Silva; a de

Henrique de Almeida à barguilha de D. Guterre, em

que colaboram com novas cantigas o Coudel-mor, D. Alvaro de Atazde, joão Correa, Fernão da Sil-

veira, e outros , de Henrique da Mota a D. joão de

Noronha e seu irmão. D. Sancho por se terem ido

confessar na metade do verão, levando o gordo Vigário de Óbidos: como viessem,depois, jantar ao lugar dos Giraldos não acharam vinho p.ara beber... etc. Algumas poesias são

¡â

torneios galantes dos Fidalgos-Poetas-‹O Cuydar, .‹fi Sospirar › - , em que muitas entram com suas cantigas e trovas

,

ou quando Fernão .da Silveira oferece brocado para

(27)

\*¬.

\ C

SÁTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS

451

um íubão a quem fizer -a melhor trova de louvor a D. Filipa de Vilhena,para o que' aparecem vários

concorrentes, como ao Coudel-mor Francisco da Sil-

veira, quando pede lhe respondam a.certa cantiga, o fazem não só nobres e poetas, como várias damas

-

D. Filipa, Beatriz de Ataúde, Catariha

Henriques, D. Urraca, D. Guiomar, D. Branca, D. Margarida Henriques, D. juana

de'

Melo, D. Mar-

garida Furtado.. , . . .

f

. .

.

São justas Reais as que se realizam em Evora,

pelo casamento do Príncipe D. Afonso, (que veio a morrer desastrada mente), filho herdeiro de D. João II, com a Princesa D. Isabel de Castela; Os nobres apresentam-se com alegorias ou figurados e diz cada um seu significado simbólico, como Pedro Homem, que,~em louvor da noiva, trazia a estátua

de

Vénus

Si esta agracia y hermosura puede daria

de vos iene de tomaria.

E 'Garcia Afonso, coá a Lua Ante Ia luz de su Iumbra

de vuestagran ciaridadz'

es Ia desta escurídad.

E em Gil VzbenteP Temos de ouvir Mestre Gil,

sempre moço, esperto e oportuno. A viva lição da sua obra magnifica é 0 requisito imprescindível neste desasado apendículo, o licet, para seguirna mesma traça das glosas anteriores. .

Nas Certes de júpíter, representada no Do- mingo 4 de Agosto de 1521, perante D. Manuel e a Corte, na véspera da partida da Infanta D. Bea- triz para Saboia, Júpiter organiza-a e dispõe :

Partira esta alta esposa,

no ponto de prea mar, com sua frota lustrosa.

na conjuntam mais ditoso

que lha podemos guisar.

E ao desferir das velas faremos que vá tombem

com todas mas donzelas.

que ajam saudades delas,

. e elas nam de minguem.

1

(28)

I I

452

REVISTA DE GVIMARÃES

E‹por mais solenidade. e sua alteza . folgar,

saírem desta cidade, toda a geralidade dos nobresfper esse mar.

l

l

\

e

. J

Depois o Infante D. Luís, sabido em cisnes brancos,_loão de Saldanha, feito arenque da Alema- nha, o precioso Cardial, D., Fernando, Infante Belo, O lnfanted. Henrique, em cama de arminhos a brin- car com dois anjinhos, Diogo- Fernandes, porta do Cancioneiro,

E Gracia de Resende

feito peixe tamboril ; e indo que tudo entende,

irá dizendo por onde :

Tristam da Cunha irá

em congro da Pederneira,

o Estribeiro-mór, convertido em peixe mú' e vá-

rias damas. . ‹

Quando O Velho da Horta, em transes de mal penado amor senil, esmorece, logo a alcovitería, so- lícita, desfia a ladainha :

\

\

O' precioso Santo Arelhano

martyr bem aventurado

tu que foste marteírado `

neste mundo cento e hum anuo;

ó San Garcia

Moniz, tu que hoje em dia. '

fazes milagres dobrados.

da-lhe esforço e alegria.

pois que es da companhia

dos penados,

O' apostolo San joão Fogaça

tu que sabes a verdade,

pela tua piedade ~. .

que tanto mal não se faça.

-Ó Senhor : . .

~ Tristão ~~da~ Cunha~ Confessor,

Ó m a r y Simão de Sousa, polo vosso santo amor lívrae o velho 'peccador de .tal cousa; .

.

. .

(29)

*)

SÁTIRAS POLÍTICAS DE SEISCENTOS

453

E as

,invocações prosseguem

Ó santa Dona Maria

d'Ataíde, fresca rosa

nacida,,em hora ditoso, quando Jupiter se ria

. .

.

.

com o apelo a donas também. z .

Mas o exemplo mais frisante e corroborativo da tradição, em que falamos, ainda Mestre Gil é quem o nas ‹OraçOes .

dos* grandes de Portugal a

N. Senhora, depozS de enterrado ElRei› .

(D.

Manuel):

O Duque de Bragança . .

Senhora Virgem Gloriosa,

que Ieixaste sepultado

o verbo deificado

' vestido de carne vossa,

do mundo desamparado' este vosso* encomendado

Rei, que tanto vos queria, que lhe dês tanta alegria; como nos leixa cuidado neste dia. "

Mestre de Santiago, o Mar- de Marialva, o Bispo de Evora, o Conde de Tentu- gal, O Condeda Feira, O Conde de Penela, .O Conde de Alcoutim e o Conde de Portalegre. '

E ainda, e finalmente, o ‹Aqui diz o Autor o

que cada hum dos Senhores de Portugal dírião* ao b e i j a d a mão›.° . ,. .

Resam, depois, o

quez de Vila Real, o Marquez de Torres, o Conde

diria mui humilhado

o senhor Duque de Bragança:

Alto Rei, nossa esperança; deos que vos.deu o reinado

vos dará sempre bonança.

Esta supita mudança bem parece obra divina;

e com esta segurança

fazer que vossa balança seja fina.

O- Mestre de Santiago, o Marquez de .Vila Real,

a

lagrimeiarzz

Governas polo antigo

que este posto está em p'r¡go

,

\

(30)

I .

454

REVISTA DE GVIMARÃES \ I I I O Bispo de Conde de Penela

Évora, O Conde de Marialva, o

Sede isento e liberal. `

provedor dos lavradores e pae dos povos menores.

Mais os Condes de Tentugal, da Feira, de Al- coutim, de Portalegre, de Vila- Nova ,

não ouçais mexefiqueíros,

nem' os que forem primeiros

n-ãozvos façam =ser irado, sem ouvir os derradeiros. O Conde de VimiosO :

. O Conde Almirante, o Bispo do Funchal. E a

vez do Regedor. Seguem-se os Vereadores. E por fim o Povo :

l

\ K

. . .

Conselho-vos, Rei: meu senhor. por vossa honra e proveito que deis ao bom servidor antes renda que .favor muito estreito.

Diria gi Povo em geral :

bonança nos seja dada, que a tormenta passada

fo: tanta e tão desigual, ,

que no‹ mundo he soada. .

E pois que a mão vos he"dada,

fazei-nos sorte dítosa, .

e praza á VirgeM gloriosa que guardeis esta manada*

como vossa. (1) .

Desconfio, «tenho minhas aquelas» -como di- zem, de que a «manada povo)›, sempre que «a mão

é novamente dada», no transcurso. dos séculos, re- pete branda e suplícantemente a .mesma lmpetração, ao passar de mais tormentas, sem que a «ditosa como ‹sorte,›, lhe saíaaflnal íámais..

.

>›

(1)^ Servi~me, como nas anteriores", das Obras Comple-

tas de Gil Vicente, ed. Sá da Costa, com Prefácio e Notas

do Proa Marques Braga,-, vol. .IV,pág. 234

,

V, pág. 161, e Vl, pág. 207 e 217. ø

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