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A emoção e a sugestão na génese das manifestações histéricas

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. ■• - w

A ÊMOçno E n

S U G E S T Ã O

nn GÉNESE Dns M A N I F E S T A Ç Õ E S HISTÉRICAS

(2)

Tip, a vapor da "Enciclopédia Portuguesa, Rua Cândido doa Reis, 47 a 49 —Porto

(3)

A E M O Ç Ã O E

A S u o ESTÃO

na génese das manifestações histéricas

Dissertação inaugural apresentada à Faculdade de Medicina do Porto

P O R

H E R N Â N I B A R R O S A

(4)

Faculdade de Medicina do Porto

D I R E C T O R

Cândido Augusto Correia de Pinho SECRETÁRIO

Á L V A R O TEIXEIRA BASTOS

CORPO DOCENTE

Professores Ordinários e Extraordinários , í Luís de Freitas Viegas I.» classe — Anatomia t _ . _ _ , , T .

I Joaquim Alberto Pires de Lima 2.» classe — Fisiologia e Histologia . .< , , , _ . . . _ .

I José de Oliveira Lima

3­a classe — Farmacologia Vaga

4.a classe — Medicina legal e Anatomia í Augusto Henrique de Almeida Brandão

Patológica | Vaga

1 Joào Lopes da Silva Martins Júnior S­a classe—Higiene e Bacteriologia . .< , , , ^ . _ , . . ,

D & 1 A l b e r t o Pereira Pinto de Aguiar

Í

Cândido Augusto Correia de Pinho Álvaro leixeira Bastos

j Roberto Belarmino do Rosário Frias 7­a classe — Cirurgia . . . , \ Carlos Alberto de Lima

^ António Joaquim de Sousa Júnior í José Dias de Almeida Júnior 8.* classe—Medicina ■ José Alfredo Mendes de Magalhães

^ Tiago Augusto de Almeida

Psiquiatria António de Sousa Magalhães e Lemos.

Professores jubilados José de Andrade Gramaxo Pedro Augusto Dias

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Rrt. 155.°

R Escola não responôe pelas doutrinas expendidas na dissertação e enunciadas nas proposições.

(6)
(7)

J memória do

S

meu

S

amigos mortos

jYíanuel T$ezerra

e

2)/*. João Saavedra,

(8)

A todos quantos teem um lugar

no meu coração

(9)

Aquela que um dia fôr

Santa do meu lar, Mãe

dos meus filhos—Alma

da minha Alma, pela

vida fora, eternamente.

(10)

PfiEFÁ e/o

A Psiquiatria tem sido, adentro da Medicina, em Portugal, o que há alguns anos foi a poesia nefelibata do sr. Eugénio de Castro e quejandos

— Silva esotérica para os Raros apenas.

Decerto que ao médico psiquiatra que propria-mente assim seja chamado—para o ser—se exi-gem qualidades invulgares de Inteligência, de Cul-tura e de Sentimento que lhe marcam um lugar seguro entre os Superiores na selecção social e que, por isso, tornam o estudo especializado deste ramo

das Sciências Médicas tarefa grande demais para o fôlego de qualquer um. E não passe esta propo-sição com intuitos reservados de encarecer a nossa obra _ elaborada, de resto, nos breves lazeres de outros trabalhos por quem, como nós, se sente ainda na mais tenra infância do saber e sem, já se vê, curtir megalómanas pretensões de que ela nos guinde à excelsa galeria dos Imortais. Não— demais será repeti-lo.

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da Psiquiatria passa por ser um luxo dispensável e supérfluo, que só aos intelectuais serve de passa-tempo ao espírito,—e se não veja-se que num país como o nosso em que os loucos e os anormais abundam consideravelmente, só a reforma do En-sino Médico de 1911 obriga aos futuros médicos a uma frequência de três meses de tal especiali-dade—nestas linhas, que aqui deixo, seja-me per-mitido lembrar àqueles que me lerem (se é que a mais dos que por dever de oficio tiverem de o fazer, alguém possa passar por estas laudas os seus misericordiosos olhos) de lhes lembrar, dizia eu, que a Psiquiatria existe e que o conhecimento das questões gerais é sempre de grande utilidade, como de resto todo o saber que se adquire, e mui-tas vezes de tam grande necessidade na prática clí-nica mais terra a terra, que a sua falta só não será sentida por aqueles que votam à sua Arte o mais indecoroso dos despresos e não sentem, como eu

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Aí fica uma afirmação que não se regista vul-garmente. É banal, que os que por aqui passam,

manchem as primeiras páginas do seu trabalho inaugural com platónicos protestos contra a dis-posição legal que os obriga a escrever um livro,

— horror à letra de forma que me parece mais

uma manifestação dessa terrível epidemia que grassa em Portugal, de lés a lés, com um activo de 70 °l0 de casos fatais e que se chama o

anal-fabetismo— de mistura com remoques azedos à arte que professam, donde às vezes nos fica a impressão de que perfilham o que por aí os igno-rantes ousam dizer dos médicos, que são, ainda hoje, com as sogras, quasi que os personagens obrigados de todas as anedotas de qualquer

Al-manaque de Lembranças, que são o passatempo

dos serões das meninas provincianas.

Mas o pior é que alguns dos velhos, prenhes daquela sabedoria salomónica que só a

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experiên-ram principalmente estes, que por lá andavam há muito na vida, que turvaram os primeiros anos do meu aprendizado, que fizeram nascer na minha alma mais que juvenil o negrume do primeiro des-gosto, de quem sente e vê contrariadas as suas

tendências.

Os meus primeiros passos da minha carreira foram dados, com aquela má vontade de um

no-viço, mais propenso a correr aventuras do que ao sacrifício e à clausura abstinente, a quem obrigam a fazer votos...

Lembro-me ainda — e sinto-me bem recordan-do, agora que cheguei ao termo da jornada — dos meus primeiros anos de liceu, que ficava numa velha casa de fidalgos, sombria, húmida, chei-rando a bolor. Era numa ruela estreita, onde mal entrava o sol, mas onde algumas vezes a Dona Peste, cosida com as sombras, andava ceifando vidas, à ilharga de um tribunal e fronteira a outro,

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de ruim fama, junto de duas igrejas, cujos sinos pela hora do meio dia repicavam forte, obri-gando algumas aulas a suspender—o que na-quela vida triste alguma alegria nos trazia, que nós fazíamos às vezes multiplicar à custa de uns vinténs com que presenteávamos o sineiro, o Júlio

corcunda.

Foi nesse ambiente lôbrego, curtindo a minha nostalgia do Sol e do Ar livre, sugeita a uma disci-plina de pavor, que a minha alma de criança sofreu as suas primeiras amarguras, contrariada por me quererem fazer médico, eu que queria estudar as altas Matemáticas, eu que já revelara adentro do liceu uma queda para os números, que me rendeu umas classificações e fama corrida de precoce in-teligência, pois era então, como hoje continuará decerto a ser, a Matemática pedra de toque por onde se infere do valor de cada um.

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sei aonde: "ninguém jamais poude amar o que não conhece,,.

Por isso hoje, na hora suprema desta iniciação, eu quero mais uma vez abençoar a memória de quem me guiou pelo direito caminho, e tantos ser-viços me prestou que toda a minha gratidão fará míngua para os reconhecer.

E a esses, vazios de fé, que maldizem a Arte que professam, que os meus ouvidos os não ouçam mais.

Só com fé se triunfa na vida. Jesus dizia aos seus discípulos quando à volta da Transfiguração eles lhe preguntaram porque não puderam tirar do corpo do rapaz lunático o demo de que era pos-sesso:

" Por causa da vossa pouca fé. Porque na verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e ele há

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E vá que dentro de mim há um mar inexaurí-vel de fé—como só devem sentir os que, como eu, não teem neste mundo categoria nem feitio para vencidos.

E para rematar as linhas que aí ficam à guisa de proémio, eu deixo exarada a expressão sincera do meu reconhecimento a todos quantos me pres-taram o seu valioso auxílio, especializando os

exmos srs ^rs jo s e- fa Magalhães e gaía Júnior

e o ilustre prof Magalhães Lemos, a quem devo a subida honra da presidência do meu acto grande.

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C A P I T U L O I

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AS CRISES

Dizia Sydenham que a histeria era um ver-dadeiro Proteu que se representava sob tantas cores como o camaleão.

Na verdade, são várias e múltiplas as mani-festações da histeria revestindo todos os aspe-ctos e incidindo sobre todos os aparelhos, que vamos passar em revista neste primeiro capí-tulo, e que servirão de base para nos capítulos seguintes estudarmos a natureza da histeria e a génese das suas manifestações.

Uma das manifestações histéricas que todos os tratados registam quando da descrição clás-sica da histeria, é o grande ataque — a Hysteria Major, a Histeria da Salpêtrière, — tal como Char-cot o descrevia, e a que os autores modernos já não ligam a importância que então lhe ligavam, a ponto de Grasset o considerar como o fenómeno capital da histeria como sintoma e como valor diagnós-tico. Hoje, com efeito, concordam os neurologis-tas e psiquiatras que tais manifestações histé-ricas são excepcionais na clíriica e que as que então se observaram, nada mais eram do que produtos artificiais, que só a sugestão produzia. Mesmo no período em que a histeria assim se manifestava frequentemente, nem em todas as histéricas se verificava o ataque.

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O ataque pode surgir sem causa aparente-mente apreciável. Na maioria dos casos, uma excitação sensível, particularmente dos órgãos genitais, uma impressão psíquica qualquer como uma emoção viva, uma alegria intensa, um pe-sar profundo, a vista de um outro ataque, o de-sejo de se fazer notar, etc., seriam as causas mais vulgares do ataque.

Pode provocar-se por uma pressão leve so-bre as regiões chamadas histerogéneas : o ová-rio; a linha média da cabeça do bregma ao vertex ; o esterno ; os espaços intercostais na vi-zinhança do bordo do esterno ou da espádua abaixo do bordo externo da clavícula; abaixo dos seios ; sobre a linha axilar média abaixo e para fora dos seios ; apófises espinosas de algu-mas vértebras cervicais ou dorsais ou nas res-pectivas goteiras vertebrais; a parte central dos flancos; a prega da virilha, a alguns centí-metros abaixo da crista ilíaca.

Tal como o descrevem a maioria dos auto-res e entre os quais Grasset, que no seu Traité pratique des Maladies du Système nerveux nos dá dele uma maravilhosa descrição, podia-se con-siderar como acusando um período prodrómico, a que se seguiriam quatro períodos perfeita-mente distintos: o período epileptoide, o período das contorsões ou de acrobatismo, o período das ati-tudes passionais e o período terminal, de delírio.

No período prodrómico aparecem, em geral, perturbações consistindo num mal-estar indefi-nido e vago, inquietação, impaciência,

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impossi-bilidade que a doente sente de executar qual-quer serviço e de se conservar sossegada. Muitas vezes a mulher histérica neste período prodró-mico do ataque ri ou chora sem motivos. A es-tas perturbações de ordem geral associam-se outras, incidindo sobre os aparelhos da econo-mia como: perturbações do apetite, da diges-tão, náuseas, dôr e constrição epigástrica, solu-ços, sensação de opressão torácica, suspiros, palpitações, palidez ou rubor excessivo das ex-tremidades, poliûria, espasmos e abalos muscu-lares, trémulos, alucinações, etc.

Estas perturbações, que podem durar alguns dias, colocam a doente num mal-estar de tal ordem que ela chega a desejar a aparição do ataque que a restituirá à sua saúde normal.

O final deste período é constituído pela aura histérica que nada mais é na realidade do que o início do ataque. A aura inicia-se, em geral, por uma dôr surda ou lancinante, partindo de uma das regiões ováricas, mais frequentemente da esquerda, atingindo depois o cavado epigástrico dando uma sensação de constrição dolorosa, o que constitui para Piorry o primeiro nó da aura; depois é uma espécie de globo (bola his-térica) que sobe desde o cavado epigástrico até ao bordo superior do esterno ou até à laringe, produzindo uma sensação de estrangulamento e de sufocação que persiste durante algum tempo, esforçando-se muitas vezes a doente por se libertar de tam grande incómodo.

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fe-nómenos mais elevados : silvos comparáveis aos de uma locomotiva que a doente sente no ou-vido, sensação de martelada na região tempo-ral e obnubilação visual, tudo do mesmo lado do ovário onde a aura se iniciou.

O ponto de partida da aura mais frequente é como atraz ficou dito o ovário esquerdo. Al-guns autores, porém, referem outros pontos de partida como sejam os membros, de onde a aura atinge o tronco e depois o cavado epi-gástrico; noutros casos a aura pode dar de princípio a sensação da bola histérica ou mesmo ser inicialmente cefálica. Para os antigos au-tores o único ponto de partida conhecido era o útero.

A aura pode ser completa compreendendo : o ovário, o epigastro, a garganta e a cabeça; ou incompleta quando se suprime algum ou algum destes estados: epigástrica, cefálica (Bernutz).

A aura segue-se —nem sempre imediata-mente — o primeiro período do ataque.

Período epileptoide. — Neste período o ataque semelha um ataque epiléptico com as suas três fases: tónica, clónica e de resolução. No mo-mento da sensação do estrangulamo-mento a doente dá um ou vários gritos agudos, anun-ciando a perda da consciência, gritos que em nada se assemelham ao dos epilépticos que, como diz Bernutz, é rouco e sinistro, e que an-tes se parecem com os gritos de sofrimento de um operado e que podem fazer-se ouvir durante todo o ataque.

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É nesta altura que a doente cai. Mas em consequência do seu estado consciente durante o primeiro período do ataque ou do pressenti-mento que teem as histéricas do seu início,

a doente escolhe o lugar em que poderá cair sem se ferir ou sem se queimar, como é vul-gar suceder com os epilépticos. A perda de con-sciência é então aparentemente absoluta; mas, a não ser em casos muito graves em que a in-consciência é tam absoluta como na epilepsia, a doente embora sem reagir, não deixa de vêr e ouvir tudo quanto se faz junto de si e pode, findo o ataque, recordar tudo quanto se pas-sou. Muitas vezes uma violenta emoção, um abalo moral poderoso ou a simples vista de um balde com a agua que lhe é destinado podem ser suficientes para terminar o ataque.

Nesta altura a sufocação está no seu auge apresentando a doente o aspecto de quem está em perigo de morte por asfixia.

O pescoço está tumefacto, as carótidas ba-tem violentamente, as veias cervicais ingurgi-tadas de sangue, a fisionomia cianosada, in-jectada, mas de uma expressão perfeitamente normal e assim permanece durante o ataque, o que a diferencia do fácies epiléptico, que apre-senta uum aspecto particularmente repelente,,.

Este estado de aparente asfixia apresenta por vezes uma intensidade tal, que se chegou a emitir a hipótese que as convulsões que se lhe seguem fossem originadas no espasmo laríngeo, tendo-se chegado a fazer traqueotomias com o

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fira de impedir a aparição das convulsões, que, aliás, nenhum resultado deram.

Na primeira fase deste período—correspon-dente à fase tónica de um ataque epiléptico — o corpo da doente está rígido como uma barra de ferro, os membros superiores em adução e rotação externa e os inferiores em extensão, com os joelhos fortemente colados um ao ou-tro, os pés em pé boto equino voltados para fora ou para dentro. Muitas vezes, a princípio, notam-se alguns movimentos lentos e extensos. Numa segunda fase — a fase clónica—apa-recem abalos convulsivos ligeiros, repetidos, afectando todo o corpo. A respiração torna-se irregular; mauifestam-se soluços e da boca da doente surde uma espuma esbranquiçada.

Entra-se então na terceira fase deste perío-do — a fase de resolução após a qual a perío-doente entra no

Período das grandes contracções ou de acroba-tismo. — Primeiro aparecem as contorsões ou atitudes ilógicas de Charcot, atitudes que não correspondem a nenhuma ideia, como as que a doente toma no último período do ataque.

A maior parte das vezes a doente coloca-se em opistotonos, apoiando o corpo simplesmente pela nuca e pelos calcanhares. Outras vezes é em emprostotonos ou pleurostotonos.

Vem depois uma segunda fase caracteri-zada pelas convulsões com a grande extensão dos seus movimentos e a desordem da sua sucessão.

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muito extensos com os membros e a totalidade do corpo, sucedendo-se desordenadamente, mas que se assemelham, individualmente considera-dos, a movimentos fisiológicos, ao contrário das contracções epilépticas. Por vezes, estes movi-mentos podem já representar uma ideia: é uma atitude de luta, de furor, de raiva, com gritos roucos ou agudos ; a doente arranca os cabelos, como que procura arrancar da garganta al-guma coisa que a asfixia.

Depois, dentro em pouco tempo, todos estes movimentos vão diminuindo de extensão, tor-nam-se menos desordenados ; a fisionomia com-põe-se, a doente parece voltar ao seu estado de saúde normal. Assim poderá suceder, mas o que acontece, quando não sobrevem nesta al-tura uma nova crise, é a doente entrar no pe-ríodo seguinte do ataque, o chamado

Período das atitudes passionals em posições plás-ticas, durante o qual o semblante da doente se anima, reflectindo as impressões mais diversas: umas vezes o seu jogo fisionómico exprime um terror intenso, outras uma alegria desmedida; por vezes é uma atitude de ardente voluptuosi-dade que a doente assume, os olhos em alvo, um espasmo cínico da fase, a bacia projectada para d e a n t e . . .

Aparecem neste período alucinações visuais e a doente é por assim dizer uma das persona-gens do drama que à sua roda os seus olhos lhe figuram.

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Período de delírio, em que ao delírio de acção do período anterior se vem juntar um delírio de palavras, muitas vezes indiscreto e comprome-tedor-—pois durante êle as doentes contam fa-ctos da sua vida que lhes interessa esconder, cantam coplas obscenas, etc.

Alucinações auditivas e visuais acompa-nham este quadro.

Por fim uma crise de riso ou de choro con-vulso põe termo ao ataque e a doente volta a si, como quem desperta extremamente fatigado. E eis, em resumo, o grande ataque histérico da Salpêtrière.

A crise histérica, tal como ficou descrita, está hoje, já nós o dissemos, relegada para o rol das curiosidades de museu, permita-se-me a expressão. O que vulgarmente se observa na clínica é o pequeno ataque de histeria — a Hys-teria minor — cuja evolução, segundo Pitres, se pode dividir em três períodos.

1.° — Período preconvulsivo — correspondente ao período prodrómico do grande ataque, apre-senta as mesmas perturbações, porém, atenua-das de intensidade. A aura só difere da do grande ataque porque, em vez de ter o seu iní-cio na região óvárica começa geralmente no epigastro, seguindo o mesmo curso, até à queda da doente O num estado de inconsciência mais

(') Para que o leitor não faça algum reparo em que só fa-çamos referências a doentes histéricos do sexo feminino, aqui

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afir-ou menos completo, segundo a intensidade da crise.

2.0 — Período convulsivo. Na primeira fase deste período — a fase tónica — a respiração é como que suspensa, a face congestionada, o pescoço entumescido, apresentando a doente o aspecto de uma asfixiada.

Depois vem a fase clónica com os seus movimentos ilógicos, extensos, desordenados, o corpo curvando-se levemente em epistótonos, apenas esboçando o arco de círculo. A doente solta gritos, aperta fortemente uma contra a outra as maxilas e da sua boca surde uma es-puma esbranquiçada.

A doente cai depois em resolução.

O período das atitudes passionais mal se manifesta; uma ligeira mímica, um leve gesto expressivo traindo um sentimento interior e nada mais.

3.°—Período post-convulsivo. A doente está em resolução muscular. O delírio de palavras apa-rece, sem gestos, sem mímica, mas quási sem-pre com intonações, inflexões de voz subli-nhando as frases e perfeitamente acordes com a ideia manifestada. Muitas vezes um ataque de riso ou de choro vem, como na grande his-teria, pôr um ponto final à scena desenrolada. A doente volta a si como quem desperta de

mamos não desconhecer a existência da histeria masculina. Somente assim fazemos por ser a histeria muitíssimo mais frequente na mulher.

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um sonho, esfregando os olhos, lançando em roda um olhar de espanto.

E assim termina o ataque histérico vulgar. Claro que nem sempre as crises histéricas se manifestam com a regularidade matemática com que acima as deixamos descritas, antes se conhecem variedades clínicas que interessante será referir.

A vertigem histérica, que não é mais que um ataque frustre e que se reduz a um ligeiro mal--estar, uma obnubilação visual, zumbidos nos ouvidos, uma vertigem que breve passa sem produzir a queda da doente. Esta vertigem ó de difícil diagnóstico como manifestação histó-rica, em doentes ainda não como tal conside-radas, e que não apresentaram ainda outros sinais de tal doença.

0 chamado ataque de espasmos constitui tam-bém uma forma abortada da crise histérica, que neste caso se reduz simplesmente à aura. Uma outra forma clínica da crise histérica particularmente interessante ó o chamado ata-que epileptoide e por outros ataata-que de histero-epile-psia, que o consideram como uma espécie de hibrido da histeria e da epilepsia—o que ó negado pela grande maioria dos autores e en-tre eles Charcot, que diz que as duas afecções podem coexistir no mesmo indivíduo, com as suas crises distintas.

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que sofria também de ataques epilépticos e que casou, tendo conseguido ocultar ao marido a existência da sua epilepsia. Uma gravidez que sobreveio pôs termo à sua histeria, persistindo, porém, as crises epilépticas.

"As duas névroses podem coexistir, diz Grasset, ficando distintas, como pode uma pneumonia atacar um epiléptico ou uma fra-ctura um tuberculoso „.

O ataque epileptoide é hoje considerado como o ataque histérico reduzido ao seu primeiro período — período epileptoide — com as suas três fases, tónica, clónica e de resolução.

O diagnóstico com o verdadeiro ataque epiléptico é que nem sempre, e até frequente-mente, é empresa de fácil realização. Algumas diferenças se apontam, que vamos enumerar, mas que não são muito absolutas.

O ataque epiléptico aparece, em geral, na segunda metade da noite ou então de manhã; frequentemente são acompanhados de inconti-nência urinária e mordeduras da língua, e se-guidos de um longo período do estertor. Nada disso sucede vulgarmente na histeria, mas não se desconhecem casos, raros é certo, em que assim acontece.

A não verificação dos chamados estigmas histéricos também não pode ser concludente porque podem faltar no primeiro período da doença e por outro lado, já acima o dissemos, as duas afecções podem coexistir no mesmo indivíduo.

(29)

Outra diferença seria, para alguns autores, que a primeira crise histérica tem uma causa provocadora qualquer (uma emoção, por exem-plo) ao passo que assim não sucedia com a crise M

epiléptica, que, na verdade, pode aparecer sub-sequentemente a um movimento de cólera, a uma impressão de profundo terror, etc.

Babinski aponta dois sinais muito vulgares na epilepsia (mas não constantes) e que faltam por completo na histeria, não podendo ser simu-lados: o fenómeno dos dedos dos pós (o cha-mado sinal de Babinski) e a lividez do rosto e dos lábios.

Como diferenças mencionam-se ainda, a in-tegridade dos reflexos tendinosos, cutâneos e oculares na histeria, a terminação da crise his-térica por uma forte compressão ovárica, o aspecto normal da fisionomia e a frequente sucessão em série dos ataques histéricos epi-leptoides, enquanto as verdadeiras crises epilé-pticas são isoladas. Com efeito, muitas vezes quando o ataque parece já próximo do seu termo, um outro sobrevêm, e logo outro, su-cedendo-se em série, às vezes bastante dura-doira. Charcot cita um caso em que os ataques desta ordem se sucederam consecutivamente durante dois meses. Só num dia contaram-se 150 a 200 ataques desde as 9 horas da manhã às 8 horas da noite.

O ataque demoníaco caracterizado pela predo-minância dos fenómenos próprios do segundo

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período. Contorsões, movimentos estranhos e desordenados, gritos de furor, de raiva, às ve-zes, contracteras e alucinações.

O ataque de acrobatismo também com predomi-nância dos fenómenos do segundo período, mais frequente na infância. O doente executa gran-des movimentos gran-desordenados ou ritmados, salta obstáculos, dà cambalhotas, etc., sem perda, pelo menos absoluta, de consciência, reconhecendo as pessoas — tudo como se esti-vesse desempenhando o seu papel numa pan-tomina de circo.

O ataque de êxtases ou de atitudes passionals em que a doente, com ou sem prévia aparição da aura, toma uma atitude passional, como que mergulhada num sonho interior, indiferente a tudo que a cerca, insensível a qualquer picada ou contusão cutânea. Muitas vezes um gesto, algumas palavras explicam o que se passa den-tro de si.

O despertar desta crise pode ser brusco ou pelo contrário muito longo. As crises desta or-dem poor-dem intervalar com outras de natureza convulsiva.

O ataque sincopai, em que a doente após uma aura de curta duração se sente desfalecer e cai, com perda de consciência, abolição das sensa-ções e dos movimentos, resolução muscular, suspensão ou, pelo menos, enfraquecimento

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no-tável das pulsações cardíacas e dos movimen-tos respiratórios. Algumas vezes esboçam-se pequenos movimentos e a doente solta alguns soluços ou chora.

O ataque de sono em que a doente após a aura se sente progressivamente invadida por uma so-nolência, ou então cai bruscamente num sono profundo.

A sua aparência é a de quem dorme natu-ralmente ; o rosto ligeiramente corado, as pál-pebras animadas de pequenas vibrações, re-sistindo fortemente à abertura. As maxilas cerradas, as pupilas sensíveis, os membros li-geiramente contracturados conservam as ati-tudes que se lhes imprime ; a respiração muitas vezes é normal, mas superficial. O pulso con-serva o ritmo normal; as sensibilidades geral e especiais parecem absolutamente abolidas ; mas, de facto, as sensações são percebidas e conser-vadas, recordando-se a doente, após a crise, de tudo quanto se passou. As doentes podem mes-mo receber sugestões durante o ataque.

A duração destas crises é muito vai-iável: de algumas horas, alguns dias, alguns meses e até, raramente, alguns anos.

Pode a doente despertar com uma hemiple-gia motora e sensitivo-sensorial ; mas, ordina-riamente, é uma crise convulsiva, de riso ou de choro, ou um delírio de palavras que põe termo ao ataque.

(32)

ictus histérico, que pode às vezes simular apo-plexias orgânicas determinadas por lesões em foco do encéfalo ou por uma intoxicação, parti-cularmente o coma urémico.

Os antecedentes, o frémito das pálpebras, os movimentos de saudação que as doentes executam, as atitudes passionais esboçadas, a falta de elevação ou de abaixamento de tempe-ratura, a ausência do sinal de Babinski, permi-tem a maioria das vezes pôr o diagnóstico de ictus histérico.

Muitas vezes as histéricas apresentam fenó-menos de automatismo ambulatório, muito semi-lhantes ao automatismo epiléptico. A doente abandona a sua casa, deixa as suas ocupações e empreende verdadeiras viagens, ficando de-pois muito surpreendida, ao terminar a crise, de se achar em tal ponto. Não ó sempre incon-scientemente, mas às vezes determinada por uma ideia, que a doente toma o seu caminho.

AS MANIFESTAÇÕES FUNCIONAIS NOS DIVERSOS APARELHOS DA ECONOMIA

Não são menos interessantes de conhecer as manifestações histéricas nos diversos aparelhos da economia do que propriamente as crises; já porque estas não aparecem em todos os casos de histeria averiguada, dando as estatísticas, aliás pouco concordes, uma média de 50

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(Bri-quet) a 63 (Pitres) por cento, revelando-se nos restantes casos a doença por perturbações fun-cionais de qualquer ordem ; já porque as mani-festações funcionais da histeria simulam as afe-cções orgânicas localizadas nesses aparelhos e o seu perfeito diagnóstico importa um método de tratamento próprio e um prognóstico bem di-verso do que haveria a formular no caso de le-são orgânica existente.

Começaremos o nosso estudo pelas Perturbações digestivas

Vários autores e entre eles Lasègue e Char-cot assinalam a existência de uma anorexia his-térica, mais vulgar nas raparigas, que pode re-vestir todos os graus desde o mais benigno ao mais grave.

Quando a anorexia apresenta uma certa in-tensidade, o emmagrecimento e o enfraqueci-mento consecutivos poderão ser de tal ordem que a doente fica impossibilitada de executar qualquer movimento, mesmo o voltar-se no leito. Uma anorexia corn tal carácter, não tra-tada convenientemente, comporta um prognós-tico dos mais sombrios, podendo mesmo chegar a doente a um tal estado de decadência orgâ-nica em que já não é possível regeneração al-guma, e só é de esperar uma terminação fatal. Charcot assinala 4 casos desta ordem, que ter-minaram pela morte das doentes.

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a existência desta perturbação funcional em indivíduos psiconevrosados, não anuem a filia-da na histeria (Dutil e Laubry), preferindo des-crevê-la sob a denominação de anorexia mental (primitiva ou secundária). Mais tarde nos refe-riremos a este assunto.

A disfagia e o esofagismo histéricos consistindo na contracção espasmódica faringo-esofágica, que sobrevem na ocasião da passagem dos ali-mentos e que pode ser absoluta e portanto grave pela inanição que acarreta, ou eletiva, de carácter muito mais benigno.

Os vómitos, acompanhando muitas vezes a disfagia ou a anorexia histéricas, outras vezes aparecendo isoladamente, podem ser passagei-ros ou persistentes e incoercíveis ; sobrevir ime-diatamente ou muito depois da ingestão dos alimentos, acompanhados ou não de dores na região epigástrica e até acompanhar-se de um cortejo sintomático — e os casos são frequentes — que fazem pensar, a uma primeira impres-são, numa lesão orgânica do estômago, como a úlcera redonda. (9

Estes casos são, como dissemos, vulgares na clínica de todos os dias. Observamos já uma

(') É um princípio adoptado na clínica de doenças de estô-mago, no caso de lesões orgânicas, que o que regula a intensidade dos sintomas gástricos e mede a gravidade do prognóstico é a maior ou menor permeabilidade do piloro. 6Não se poderá explicar, portanto, a sintomatologia apresentada pelas histéricas por uma contractura do músculo gástrico na região pilórica, limitando a sua abertura? Parece-nos que assim possa ou deva ser; por isso aqui deixamos a nossa opinião, que nunca vimos emitida por autor algum.

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mulher que apresentava toda a sintomatologia da úlcera do estômago: dores muito intensas após as refeições, localizadas no epigastro, que se calmavam quando um vómito lhe permitia fazer a evacuação do conteúdo estomacal, e até acusava hematemeses. Estas hemateme­ ses, nunca ninguém as viu e só por a doente as referir se soube da sua existência; demais, estava sendo cuidada há uns dois meses, se a memória me não falha, por quem tinha mais que sobeja competência profissional, sujeita a um regime dietético rigoroso e que era rigoro­ samente cumprido (tratava­se de uma doente internada no Hospital Geral de Santo Antó­ nio). Não acusava melhoras apreciáveis, tendo­ ■me declarado por esse tempo que tivera de noite duas pequenas hematemeses, a que o pes­ soal da enfermaria não assistiu e de que eu não vi sequer vestígios.

A doente acusava a existência de crises his­ téricas e o seu aspecto era de quem gosa uma saúde muito regular e de modo algum o de quem vinha fazendo uma úlcera gástrica há mais de dois meses com perdas contínuas de sangue, embora pouco abundantes, e uma gas­ trite ha uns dois anos.

Pus o meu diagnóstico de manifestações histé­ ricas gástricas simulando a úlcera redonda. Ainda me passou pela mente, a mim que já andava projectando a confecção deste trabalho, obser­ var mais profundamente o caso, tanto mais que consegui averiguar que uma companheira da

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doente, cozinheira da casa em que ela servira, padecia do estômago, apresentando uma sinto-matologia que me pareceu ser de uma úlcera gástrica. Pensei mesmo em fazer um pouco de psicoterapia à mulher, mas bem pronto desisti, bem depressa me capacitando de que estava a sonhar com o impossível tam falho de recursos e meios me topei — eu que me não tinha recor-dado que a prática hospitalar da nossa Facul-dade era mais uma das obras de Misericórdia da Santa Casa do Porto.

Não foi este o único caso hospitalar de que tive notícia, nem sequer o único que passou pelas enfermarias do serviço da 2.a clínica mé-dica, o que até certo ponto mostra a sua fre-quência, que nunca será demais fazer notar; pois, muitas vezes um tratamento instituído no

sentido de combater a afecção orgânica, que a falsa gastropatia simula, é de resultados inver-sos, fazendo persistir e até agravar o mal em vez de o curar. O que nestes casos sucede, su-cede também com todos os falsos gastrópatas de origem nervosa, que durante anos e anos vão arrastando a sua vida pelos consultórios de especialistas tratando uma doença que não teem e do tratamento colhendo resultados contrapro-ducentes. 0 facto de se julgar muito ingrata a clínica das doenças do estômago deve ser ori-ginado na reconhecida ineficácia do tratamento em muitas gastropatias, cuja origem psíquica o especialista não descobriu, porque o seu espí-rito, orientado no sentido da sua especialidade,

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não lhe consente olhar livremente em volta de si, e reconhecer, depois de uma cuidada análise, sem ideias preconcebidas, como deverá sempre proceder quem merece o nome de bom clínico, de onde vem o mal.

A timpanite é outra manifestação histérica, generalizada a todo o abdomen ou localizada, aparecendo concomitantemente com as crises ou nos seus intervalos, aparecendo umas vezes bruscamente, outras lenta e progressivamente, de evolução passageira ou de longa duração.

_ A timpanite pode simular tumores abdomi-nais e até uma gravidez —de que trataremos noutra parte deste capítulo.

A péritonite histérica, que apresenta todo o quadro sintomático de uma verdadeira périto-nite, com vómitos, constipação intestinal, hipe-restesia abdominal, mas a que falta a febre. Outras vezes é o quadro de uma oclusão intes-tinal, que se instala, aparecendo a doente com meteorismo, constipação absoluta e vómitos ali-mentares; muitas vezes também os vómitos fe-caloides aparecem, mas a sua existência afigu-ra-se duvidosa, antes parecendo que as doentes voluntariamente deglutem as fezes, apresen-tando depois esses vómitos que elas próprias fizeram.

Pode muitas vezes simular a apendicite com todo o seu quadro clínico. Berthier e Milian re-latam um caso de apendicite récidivante, apre-sentando duas crises, em que a doente foi ope-rada e que após a intervenção apresentou uma

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nova crise apendicular, que curou pelo simples tratamento psíquico.

Observa-se também o espasmo ano-rectal, produzindo uma constipação absoluta, acom-panhando-se de vivas dores e opondo-se ao to-que rectal, to-que simula um aperto orgânico do recto.

São estas as manifestações funcionais, mais importantes, interessando o aparelho digestivo.

Estudaremos agora as Perturbações respiratórias

Entre as perturbações respiratórias produzi-das pela histeria, as que ocupam um lugar mais importante são as manifestações laríngeás.

São, por exemplo, as manifestações larín-geás, aparecendo segundo um ritmo regular, que se acompanham de certos ruídos, soluços, bocejos e sons que imitam a voz dos animais, coexistindo com hiperestesias, sensação de cor-po estranho, ou cor-pontos dolorosos nas vias res-piratórias superiores.

O soluço, que constitui uma manifestação histérica vulgar e que é produzido por uma con-tracção brusca do diafragma, de origem reflexa peritonial, gástrica, esfógica ou laríngea, não é propriamente um fenómeno de ordem respira-tória mas costuma ser descrito neste lugar.

A tosse histérica é outra manifestação muitas vezes observada. Aparece, em geral, nas rapa-rigas na ocasião da puberdade e produz-se, por

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paroxismos perfeitamente regulares, de três em três ou de quatro em quatro expirações que a doente executa.

Não se manifesta durante a noite, não pro-duzindo por isso a insónia, tam vulgar nas tos-ses de origem orgânica; surge em consequência de uma emoção, de uma inflamação passageira das vias respiratórias superiores ou por imita-ção de um ataque de tosse observada noutra pessoa. A leitura em voz alta, a distracção, cer-tas atitudes que se mandam tomar à doente fa-zem-na desaparecer.

Algumas vezes a tosse histérica apresenta um carácter mais grave, manifestando-se por ver-dadeiros ataques coqueluchoides, acompanhan-do-se de espasmos do diafragma e da glote e de sufocação. Nestes casos, estas crises de tosse são precedidas de uma aura (bola histérica) e são motivadas por qualquer emoção moral. Não se observam durante a noite e não se acompa-nham de expectoração, nem de opressão, ou fa-diga consecutivas. De resto, pode desaparecer bruscamente e é curável pelos meios psicote-rápicos.

Os espasmos laringeos notam-se também nas histéricas. Traduzem-se por uma sufocação que a doente sente, acompanhando-se de pieira e tiragem supra-external. Podem aparecer a se-guir a uma emoção e tomar um carácter paro-xístico ou permanente. O exame laringoscópico mostra a glote e as cordas vocais perfeitamente abertas. Não se acompanham de cianose,

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des-aparecem durante o sono, diminuem de inten-sidade durante a insónia e quando a doente se não julga observada; o estado geral é bom e são susceptíveis de curar pelo tratamento moral.

Outra perturbação de localização laríngea é a afonia histérica — que não deve confundir-se com o mutismo histérico, que será estudado mais adeante. A afonia, muitas vezes acompanhada por uma anestesia da mucosa laríngea e da pele das regiões supra- e infra-hioideas, manifesta-se pela impossibilidade que a doente sente de se poder exprimir em voz alta, vendo-se obrigada a falar como que em segredo; no entanto, esta impossibilidade de emitir a voz com a sua in-tensidade e timbre normais não existe já para o canto ou para as palavras proferidas durante o sonho. A tosse é igualmente sonora. O exame laringoscópico não acusa paralisia alguma das cordas vocais.

Os tratadistas que versam a histeria assina-lam a existência de hemoptises de origem histéri-ca, considerando-as como hemorragias suprindo a ausência de menstruação O. E, se todos eles estão de acordo em que as doentes as acusam, já o mesmo não sucede quanto à sua importân-cia e significação que para alguns — como De-jerine — não passam, como as hematemeses, de factos que só devem ser atribuídos à simulação.

(') Não se pode aceitar essa interpretação porque estas he-moptises se observam também nos homens atacados de histeria.

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Perturbações circulatórias

São perturbações de ordem vaso-motora e motivadas por um agio-espasmo ou por uma angio-paralisia, produzindo equimoses subcutâ-neas, edemas e hemorragias.

É em consequência de um espasmo localiza-do que uma picada numa histérica pode não san-grar, como qualquer outro traumatismo ligeiro.

É uma angio-paralisia que dá lugar a equi-moses subcutâneas, que tomam, às vezes, aforma de letras, corações, cruzes, etc., que se aplicam sobre a pele (dermografismo), como a certas he-morragias (epistáxis, hematúrias, suores de san-gue, lágrimas de sangue), às hematemeses e he-moptises, cuja existência real é hoje duvidosa, e aos edemas (azul, branco e vermelho).

Todas estas manifestações gosam do cará-cter comum das manifestações histéricas, que é poderem ser reproduzidas ou suprimidas por sugestão. Luys curou por este processo uma larga mancha facial de côr vinosa existente no rosto de uma doente e o prof. Júlio de Matos relata um caso por êle observado de edema do seio, doloroso e unilateral.

São ainda fenómenos devidos a angio-es-pasmos e a angio-paralisias a pseudo-angina pec-toris e a pseudo-vertigem de Mérnière. Alguns au-tores também explicam a poliúria e a anuria histéricas e a perda de consciência por angio--espasmos ou angio-paralisias viscerais.

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não as registam os autores. Talvez porque, como diz Dejerine, "de todas as funções da economia, a circulação é talvez a que, em menor grau, pode ser modificada pela vontade. Enquanto, numa certa medida, se pode deter a respiração, enquanto uma simples representação mental sem o concurso de manifestações emotivas, é susceptível de entravar os fenómenos da diges-tão, no que respeita à circulação tal não existe. As acções voluntárias, as representações men-tais de toda a ordem, são por si mesmas incapa-zes de modificar a contracção cardíaca, de lhe alterar o ritmo ou de lhe modificar a potência. „

Perturbações urinárias

Principalmente nos homens sofrendo de his-teria, assinala-se algumas vezes uma poliúria intensa que pode atingir 10, lõ, 20 e até 25 li-tros de urina diariamente emitida. Esta poliúria vem acompanhada de polidipsia intensa.

Para alguns autores nas desmesuradas po-liúrias não deixaria de entrar a simulação.

Outra manifestação urinária é a anuria histé-rica, ou simplesmente iscúria, negadas por alguns autores como manifestação histérica, porque não dependendo da vontade a secreção urinária não poderia ser perturbada por uma representação mental e para os quais os casos conhecidos e descritos como tais, seriam de pura simulação, que uma apertada vigilância dos doentes per-mitiria descobrir ou então evitar.

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No entanto, a anuria histérica foi admitida e descrita por vários autores e entre eles Char-cot, Fernet, Regnard, etc., que relatam vários casos dessa ordem. A anuria vem muitas vezes acompanhada de vómitos contendo ureia em proporção notável; outros consideram a anuria secundária aos vómitos.

A retenção urinária acompanhando-se de anes-tesia da mucosa vesical seria para aqueles auto-res uma outra manifestação histérica, já admis-sível, visto estar sob a influência da vontade. Seria curável pela psicoterapia.

Perturbações genitais

Na esfera genital assinalam-se o vaginismo e as contracturas dos adutores, o apetite gené-sico exagerado de muito vulgar observação, e pelo contrário a frigidez sexual.

Mas as perturbações genitais mais curiosas e que mais importa conhecer são as que consti-tuem a pseudo-gravidez histérica.

Devido a uma auto-sugestão, as doentes muito desejosas de ser mães ou muito receosas de conceber, podem apresentar todos os sinto-mas de uma gravidez: desde a supressão das regras, abaulamento progressivo do hipogastro (devido a modificações da consistência da pa-rede muscular), modificações dos seios próprios de uma gravidez fisiológica, calores, vómitos, coloasma uterino, etc.

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época própria, a doente entra num falso traba-lho de parto. E o diagnóstico da falsa gravidez só então, às vezes, se pode fazjer, tam perfeita-mente ela é simulada.

Perturbações neuro-musculares: as paralisias e as con-tracturas. Perturbações da sensibilidade geral e especial

Entre os acidentes histéricos teem a maior importância as manifestações que incidem so-bre o sistema neuro-muscular, algumas das quais lhe são características.

Todos os músculos, quer lisos, quer estria-dos, podem ser atingidos de contracturas e pa-ralisias histéricas.

Dejerine define assim a contractura e para-lisia :

" Contractura é uma contracção tónica persis-tente e involuntária de um ou mais músculos da vida de relação.,,

"A paralisia é constituída pela abolição mais ou menos completa da motricidade voluntária (músculos estriados) ou da motricidade reflexa (músculos lisos).,,

A contractura pode ser monomuscular, ou atacar um grupo de músculos, um segmento de um membro, um ou mais membros comple-tos. O músculo ou grupos musculares contractu-rados apresentam uma rigidez extrema.

As paralisias podem apresentar o tipo

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Tanto as contracturas como as paralisias aparecem a maior parte das vezes bruscamen-te, a seguir a uma violenta emoção, mas podem também aparecer lentamente atingindo o seu máximo só ao cabo de alguns dias.

Podem durar de alguns minutos a alguns anos.

O que caracteriza tanto as paralisias como as contracturas histéricas é que estas não apre-sentam como as orgânicas nem abolição (para-lisias nevríticas) ou exagero (para(para-lisias e con-tracturas ligadas a alterações dos feixes pirami-dais) dos reflexos tendinosos, nem atrofia mus-cular com reacções de degenerescência (*).

(L) Não estão lodos os autores de acordo quanto à

anormali-dade dos reflexos nas paralisias histéricas.

No livro Les Manifestations fonctioner-elles des Psychonévroses — Leur traitement par la Psychothérapie de Dejerine e Gauckler encontra-se o seguinte que para aqui traduzimos fielmente :

«Nas histéricas, fora dos acidentes, podem observar-se estados diferentes dos reflexos. Mas o problema interessante é levantado pe-las modificaçõea que podem sofrer os reflexos no decurso dos aci-dentes histéricos e em particular das paralisias. Pode, nas para-lisias histéricas, observar-se um exagero mais ou menos considerável dos reflexos tendinosos. iÊste exagero da reflectividade pode ir até à produção do clonus do pé? De facto, um de nós poude observar, pondo de parte toda a associação orgânica, pondo-se ao abrigo de toda a simulação possível, factos positivos da produção deste fenó-meno nas histéricas; mas trata-se de um fenófenó-meno muito raro: A histeria, directamente ou indirectamente, seria pois capaz duma verdadeira libertação do automatismo medular.

Na histeria, no decurso das paralisias ou das hemianestesias pudemos verificar num certo número de casos e de uma forma abso-lutamente positiva a desaparição do reflexo cremasteriano. No que respeita ao reflexo cutâneo plantar, nunca encontramos nas

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hisléri-Uma das manifestações mais frequentes de paralisia histérica é a hemiplegia histérica, à pri-meira vista de aspecto muito similhante a he-miplegia orgânica. Dela se diferencia por vários caracteres a saber: é, em geral, uma hemiplegia incompleta, tendo a sua sede de preferência do lado esquerdo do corpo; mas enquanto na he-miplegia orgânica o doente tem uma marcha helicópoda, o hemiplégico histérico anda arras-tando o seu membro paralizado, como, diz Todd, "se se tratasse de um objecto de matéria inanimada,,. E esta marcha, arrastando o mem-bro paralizado atraz de si, um dos melhores ca-racterísticos da hemiplegia histérica, que, aliás, ao contrário da hemiplegia orgânica respeita quási sempre a face ; e, se alguma perturbação a face apresenta é um hemiespasmo

glosso-la-cas u. flexão dorsal do dedo grande (sinal de Babinski). Pelo contrá-rio, julgamos que o reflexo cutâneo plantar assim como o do tensor do faseia lata, podem estar abolidos nestes doentes, do lado he-mianestesiado. Um de nós observou três exemplos no seu serviço no decurso do último ano. Nestes três doentes, duas mulheres e um homem, atingidos de hemianestesia absoluta, a planta do pé não correspondia a qualquer excitação e o reflexo do tensor do fas-eia lata estava igualmente ausente. Do lado são a reacção dos dedos e do tensor do faseia lata efectuavam-se como no estado normal. Dois destes doentes curaram-se da sua hemianestesia e recupera-ram então o reflexo cutâneo plantar e o do faseia lata.

Não insistiremos mais sobre esta questão dos reflexos. 0 único ponto doutrinário que nos importa verdadeiramente é saber que, numa larga medida, influências puramente psíquicas são capazes de arrastar modificações nos fenómenos, habitualmente considerados como puramente automáticos.

Não há, de resto, nada a admirar, se se pensar na existência evidente, como manifestações funecionais das psiconevroses, per-turbações que, como os espasmos e as contracturas não são em

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bial. Além disso, a histérica apresentará outros sinais que ajudam a confirmar o diagnóstico.

Babinski estabeleceu um quadro dos sinais que permitiam distinguir uma hemiplegia or-gânica de uma hemiplegia histérica e que, re-sumidamente, aqui apresentamos :

" 1 .o Nesta, a paralisia não é, como naquela, "limitada a um só lado do corpo, particular-m e n t e na face eparticular-m que as perturbações são ge-ralmente bilaterais.

"2.° A paralisia orgânica não ó sistemá-t i c a . Se, por exemplo, na face os movimensistemá-tos "unilaterais são muito enfraquecidos, a impo-nência aparece também com nitidez do lado "da hemiplegia durante a execução dos movi-m e n t o s bilaterais sinérgicos. O contrário se "observa nas hemiplegias histéricas.

suma mais do que reflexos permanentes, persistentes, estereotipa-dos de alguma maneira».

No mesmo livro, quando discute o facto das contracturas his-téricas desaparecerem ou não durante o sono dizem os autores :

«Se a contractura histérica se desfizesse durante o sono, 6como se poderia explicar, em algumas destas doentes de retracções fibro-sas, que, às vezes, somos obrigados a vencer sob a acção do cloro-fórmio ? Já vimos uma doente contracturada de três membros há anos e na qual existiam com toda a evidência retracções fibrosas periarticulares, que persistem ainda hoje se bem que a contractura tenha desaparecido completamente há muito tempo Se nesta mu-lher a contractura tivesse desaparecido durante o sono, ou seja du-rante oito a dez horas por dia, em 24 horas, não é verosímil que estas modificações anatómicas se tivessem produzido. Vimos igual-mente uma contractura dupla dos adutores datando de quatro anos consecutiva a uma tentativa de violação e na qual existiam retra-cções fibro-musculares que foram muito duras de romper sob o sono cloro fórmico».

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"3.° A paralisia orgânica atinge alem dos "movimentos voluntários conscientes, os movi-m e n t o s voluntários inconscientes ou subcon-scientes, o que não sucede na histeria em que "estas duas últimas categorias de movimentos "persistem.

"Portanto, não se notará nas histéricas o "sinal do cuticular nem & flexão combinada da coxa

ue do tronco.

"4.° Nas paralisias orgânicas a língua é, "em geral, ligeiramente desviada para o lado "da paralisia. Nas paralisias histéricas a lín-"gua pode ser desviada também ligeiramente "para o lado da paralisia; mas aqui o desvio "pode ser muito acentuado ou então operar-se "do lado paralizado.

"5.0 Na paralisia orgânica, há principal-"mente no início, hipotonicidade muscular, que "pode traduzir-se na face pelo abaixamento da "comissura, o abaixamento da sobrancelha, etc., "e no membro superior pelo que o autor chama "a flexão exagerada do ante-brago. Nenhum destes "fenómenos se observam nas hemiplegias histé-r i c a s ; quando alguma assimethisté-ria facial existe "ela é devida a um espasmo.

"6.° Os reflexos tendinosos e ósseos são "inicialmente perturbados (abolidos, enfraque-c i d o s ou exagerados) e numa fase mais adean-"tada sempre exagerados nas hemiplegias or-g â n i c a s — podendo notar-se a trepidação epi-"leptoide do pé. Nenhum destes fenómenos "acusam as hemiplégicas histéricas.

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"7.° Os reflexos cutâneos estão perturba-d o s na hemiplegia orgânica.. Entre eles os "reflexos abdominal e cremasteriano, são no "princípio abolidos ou enfraquecidos. Alem "disso apresentam o chamado sinal de Babinski. "Nas hemiplegias histéricas todos estes refle-x o s estão normais.

"8.° A forma de contractura na hemiple-"gia orgânica tem um aspecto particular que "não pode ser, como a histérica, reproduzida "por uma contracção voluntária dos músculos.

"9.° A evolução da hemiplegia orgânica é "regular; a contractura sucede à flacidez; as "melhores são progressivas, a paralisia não ó "sujeita a remissões transitórias. Pelo contrário "a hemiplegia histérica é de uma evolução ca-prichosa, podendo ficar indefinidamente flá-"cida, ou ser inicialmente espasmódica. Os "fenómenos espasmódicos podem associar-se, "principalmente na face aos fenómenos para-líticos. As perturbações podem variar, apre-s e n t a n d o criapre-seapre-s de exacerbação ou de atenua-r ã o , alteatenua-rnando,,.

A paraplegia histérica pode ser completa ou incompleta e acompanhar-se de perturbações amiotróficas, podendo simular perfeitamente uma paraplegia orgânica, sintomática de uma mielite transversa, de um tumor medular, de um mal de Pott, etc. A integridade dos refle-xos, a ausência de perturbações esfincterianas, a ausência do sinal de Babinski permitem pôr o diagnóstico de paraplegia histérica.

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As histéricas podem apresentar alem das perturbações referidas, todo o cortejo sintomá-tico de uma coxalgia, e cujo diagnóssintomá-tico com a verdadeira coxalgia é de extrema dificuldade. A sua evolução é rápida e o seu início, a dôr superficial (pode-se, ás vezes, percutir o grande trocanter sem que a doente acuse dôr alguma), a ausência de tumefacção e de calor, a integri-dade dos reflexos do lado doente e a desapari-ção dos sintomas quando se submete a doeute à narcose clorofórmica — são circunstâncias que farão pender o nosso diagnóstico para o lado de uma pseudo-coxalgia histérica.

Além das contracturas e paralisias dos mús-culos dos membros podem ainda as histéricas apresentar contracturas e paralisias doutros músculos, como sejam dos músculos da face, dos olhos e do pescoço.

Na face, muitas vezes se assinala, coexistin-do ou não com contracturas coexistin-dos membros, a contractura do orbicular das pálpebras. Este blefaroespasmo, que é na maioria dos casos unilateral, pode apresentar duas formas: uma forma tónica, acompanhando-se de dores peri--orbitárias, de fotofobia e em que a pálpebra se apresenta pregueada, resistindo à abertura e sob a qual se consegue descobrir o globo ocu-lar desviado para cima e para dentro; e uma forma pseudo-paralítica em que a doente apre-senta uma ptosis palpebral, que semelha a ptosis observada nos casos de paralisia do

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le-vantador da pálpebra, de que se distingue pelo sinal da sobrancelha de Charcot.

As histéricas podem apresentar contractu-ras dos músculos dos olhos (muito mais rara-mente paralisias, negadas aliás pela grande maioria dos autores). Essas paralisias incidem sobre todos os músculos do olho, que fica pa-rado, impossibilitado de se dirigir para qual-quer lado, quando voluntariamente solicitado. No entanto, os movimentos automáticos efe-ctuam-se quando a doente não é observada. Contractures isoladas não existem; somente os autores apontam raríssimos casos de estrabis-mo convergente.

O hemiespasmo facial histérico descrito por Charcot, e depois por Brissaud e Pierre Marie, é uma contracture dos músculos da face, que pode semelhar o espasmo facial periférico que ó produzido por uma excitação do nervo facial e cujos caracteres distintivos, descritos uns por Brissaud e Pierre Marie e outros por Babinski, são os seguintes :

"O hemiespasmo facial periférico é rigoro-s a m e n t e unilateral.

. " ^s ^ b ^0 9 musculares no hemiespasmo

fa-scial periférico são parcelares ou fasciculares. "As contracções do hemiespasmo periférico S ã o déformantes, dando lugar a uma incurva-"ção do nervo e a uma foceta mentoneira.

"As contracções no hemiespasmo periférico "associam-se de uma maneira paradoxal (por "exemplo, a contracção do orbicular das

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páipe-"bras associando-se a uma elevação da sobran-celha).

"As contracções do hemiespasmo facial pe-riférico persistem durante o sono.„

São estes os sinais de diagnóstico das duas manifestações.

A paralisia facial histérica, existe ou isolada-mente ou concomitanteisolada-mente com paralisias dos membros ou com hemiespasmo glosso-la-bial, que tem geralmente a sua sede do lado oposto ao da paralisia. A paralisia facial pode ser unilateral ou bilateral, incidindo sobre todo o território do facial inferior ou de alguns músculos somente, tornando-se mais manifesta quando se provocam movimentos voluntários. Não se conhecem casos em que a paralisia possa invadir toda a face.

Babinski enumera um certo número de si-nais que permitem diferençar a paralisia facial histérica de uma paralisia orgânica, e que re-sumidamente vamos apresentar:

"O abaixamento da comissura labial na pa-ralisia histérica, não é consequência de um "relaxamento muscular, mas de um espasmo "da comissura oposta ou de uma contracção "dos músculos que fazem baixar o lábio.

"Na paralisia histérica não se nota nem o "abaixamento da sobrancelha nem a desapari-ç ã o das pregas frontais.

"O desvio da língua para o mesmo lado da "paralisia, nas histéricas, pode ser muito pro-" nunciado e devido a espasmo da língua. Pode

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"a língua também aparecer desviada para o "lado oposto.

"Na paralisia histérica as perturbações são "raramente unilaterais.

"A paralisia histérica é geralmente uma "paralisia sistemática.

"A paralisia histérica tem uma evolução "muito caprichosa, que se não cumpre com "aquela regularidade peculiar às paralisias or-gânicas.,,

Registam-se também casos de torticolis histé-rico, produzidos ou por contractura dos múscu-los do pescoço ou por paralisia. Esta forma é muito rara; a cabeça inclina-se para o lado oposto dos músculos em que a paralisia se ma-nifesta, posição de que é muito fácil desviá-la quando se toma a cabeça entre as mãos e se a desloca. Quanto ao torticolis por contractura, mais vulgar na histeria infantil, a atitude varia com o grupo de músculos atingido. A sua mar-cha apresenta remissões, intervalando com no-vas manifestações. Pode acompanhar-se de pon-tos dolorosos, e simular então um torticolis sintomático de um mal de Pott.

Entre as manifestações histéricas interes-sando o sistema neuro-muscular, figura a asta-sia-abasia, já observada por Jaccoud e estudada por Charcot e Richer em 1883 e por Blocq em 1888.

Consiste, como se infere da denominação que lhe foi posta, na impossibilidade que a

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doente sente de se conservar de pé e de execu-tar os movimentos necessários para a marcha. Esta impotência é puramente funcional, pois a doente quando sentada ou deitada pode execu-tar todos os movimentos como qualquer indiví-duo normal, apresentando as pernas o vigor e a força mais que necessários para poder desem-penhar as suas funções.

Muitas vezes, esta astasia-abasia e sistemáti-ca, isto é, a impotência funcional existe só para a marcha e para a estação de pé, podendo a doente executar todos os outros movimentos. Numa das lições do curso de Psiquiatria e Neu-rologia, foi-nos apresentado pelo prol Maga-lhães Lemos um caso, em que a doente não podia andar mas conservava-se de pé; no en-tanto essa doente subia e descia escadas per-feitamente e chegava mesmo a andar, quando no sobrado se desenhavam uns riscos a giz dis-tanciados uns dos outros do comprimento de um passo.

Deserevem-se várias formas clínicas da asta-sia-abasia: & forma paralítica, em que os membros se flectem e ficam inertes, quando a doente quere andar ou manter-se de pé ; a, forma ataxica, coreiíorme ou trepidante, conforme a incoorde-nação é produzida por grandes movimentos de flexão das pernas e do corpo ou por uma espé-cie de trepidação dos membros inferiores; a forma saltitante e a forma rígida.

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o espasmo saltatório, estudado por Brissaud em 1890 e já anteriormente conhecido.

Consiste numa série de contracções sucessi-vas e alternantes dos flexores e extensores da perna e algumas vezes da coxa, o que faz com que o doente, quando está de pé, e surge o ata-que, por efeito de uma emoção ou de um abalo qualquer, começa bruscamente saltando como se executasse uma dansa incoordenada e gro-tesca, tornando-se a marcha impossível. Quando em decúbito horizontal, a menor excitação da planta do pó, a flexão brusca do pó sobre a perna e a percussão dos tendões de Aquiles e da tibia bastam para provocar o espasmo. É de uma evolução muito pouco regular.

Descrevem-se também, como manifestações histéricas, duas formas de coreia: uma coreia rí-tmica e uma arrirí-tmica.

A primeira é a mais frequente e pode atin-gir os membros, a face, o pescoço ; limita-se ge-ralmente aos membros do mesmo lado do corpo, constituindo uma hemicoreia, ou só a um mem-bro. Os acessos sobreveem de uma maneira in-termitente; os movimentos não são ilógicos, desordenados, mas teem uma orientação como se se tratasse de desempenhar uma determi-nada função ; assim haverá uma coreia sanato-ria, uma coreia natatósanato-ria, uma coreia maleató-ria, etc. As vezes, no indivíduo portador desta coreia existem zonas frenadoras cuja pressão faz desaparecer o acesso.

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A coreia arrítmica é caracterizada por movi-mentos involuntáiios irregulares e contraditó-rios análogos aos da coreia de Sydenham, e tanto que este assunto foi muito discutido na Sociedade médica dos hospitais, onde alguns autores afirmaram que se tratava na realidade de uma coreia histérica visto as doentes apre-sentarem os chamados estigmas histéricos ; ou-tros quizeram classificar como coreia histérica a própria coreia de Sydenham; outros, como Charcot, diziam que se tratava de uma asso-ciação da histeria com a coreia vulgar.

Na realidade em muitos casos, esta última opinião se poderá fazer valer; mas outros em que a coreia arritmica se desenvolve por imita-ção, ou por sugestão, não se poderá deixar de a considerar como uma manifestação histérica.

Babinski apresentou mesmo um sinal — a flexão combinada da coxa e da bacia — que existiria na coreia de Sydenham do lado em que os movimentos são mais pronunciados e não nas coreias histéricas.

Estudaremos agora os trémulos histéricos. Po-dem ser generalizados ou parciais — limitados a um lado do corpo, aos membros inferiores ou a um só membro — e caracterizam-se por se-rem essencialmente polimorfos, lentos ou rápi-dos, leves ou tam intensos que chegam a per-turbar a marcha e os movimentos naturais. Podem simular os trémulos do alcoolismo, do hidraginismo, da paralisia agitante, da

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escle-rose em placas e os pré- ou post-hemiplégicos. Muitos trémulos, cuja causa era ignorada, al-gumas vezes atribuidos a intoxicações, que desaparecem sem tratamento medicamentoso apropriado, são hoje considerados como trému-los históricos.

Entraremos agora no estudo das perturba-ções de sensibilidade nas histéricas. Como as perturbações de motilidade, especialmente as paralisias e contracteras, e ainda mais do que elas, as perturbações de sensibilidade são ca-racterísticas da histeria. Tam caca-racterísticas que enfileiravam entre os antigos estigmas his-téricos e hoje ainda quási todos os médicos, para fazerem um diagnóstico de histeria não se dispensam de fazer a exploração da sensibili-dade da doente. Á sugestão, produzida nestes exames, atribuem as perturbações aqueles que só fenómenos de sugestão vêem na histeria. Assim Babinski diz que "uma histérica virgem de todo o exame médico não apresenta, para um observador prevenido, que se cerca de to-das as precauções e usando de certos artifícios, nenhuma perturbação sensitiva ou sensorial„. Sem tentar por agora o estudo destas per-turbações sob o ponto de vista da sua génese, que será feito noutro capítulo deste livro, va-mos descrever as diferentes pertobações de sensibilidade que se observam nas histéricas. Entre elas, avultam, como de maior impor-tância :

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As anestesias. São, em geral, incompletas ou pelo menos nunca tão profundas como as anes-tesias orgânicas. É certo que muitas vezes se poderá produzir a uma histérica picadas, quei-maduras, contusões, sem que ela acuse a mí-nima sensação. Na histérica de que já atrás falei e que era portadora de uma falsa úlcera de estômago, quando fiz a exploração da sua sensibilidade, acusava uma tam profunda anes-tesia que, de uma vez, a pressão exercida so-bre a agulha fê-la enterrar na pele até sair sangue pelo orifício da picada, sem que a doente acusasse a mínima dôr. Há casos que se citam em que histéricas permitem que se façam intervenções cirúrgicas mutiladoras sem narcose clorofórmica ou etérea ou outra qual-quer forma de anestesia artificial.

Casos desta última ordem são considerados como excepcionais. Nos casos vulgares, a sensi-bilidade pode ser despertada por uma excitação forte, por exemplo, uma corrente farádica in-tensa aplicada numa região sensível (Babinski).

Um outro carácter curioso das anestesias histéricas é a pouca ou nenhuma perturbação que trazem às doentes. Assim as histéricas es-crevem, cosem, bordam, entregam-se a certos lavores feminis que, bom ó dizê-lo, exigem cer-tos requintes de sensibilidade, e todos esses tra-balhos são de uma execução impecável. Nada disto sucede com as anestesias de origem orgâ-nica em que os movimentos são desordenados,

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execu-tarem trabalhos muito mais grosseiros do que aqueles de que atrás falamos.

A anestesia histérica apresenta ainda uma outra qualidade que lhe é peculiar: a sua ex-trema variabilidade de situação e de intensi-dade— carácter bem distintivo das anestesias orgânicas constantes na sua localização, corres-pondente a, um território nervoso bem determi-nado O, e cuja intensidade varia de um modo gradual, quando a lesão originária evolui para a normalidade. Nas anestesias cutâneas nota-se muitas vezes uma dissociação: a sensibilidade à dôr, a sensibilidade tactil e a sensibilidade térmica, não desaparecem ao mesmo tempo, persistindo qualquer delas, enquanto a outra ou as outras fazem falta.

Quanto à sensibilidade gustativa pode no-tar-se a agueusia total ou parcial (mais geral-mente com a forma unilateral). Pode também observar-se uma agueusia dissociada sendo per-cebidos só certos sabores, ou uma perversão da sensação gustativa.

O olfacto pode também estar abolido; esta anosmia é também ou parcial — geralmente unilateral — ou total.

A audição pode também estar perturbada.

(') Tem-se pretendido assinalar uma topografia às anestesias histéricas; assim descreve-se uma hemi-anestesia completa ou in-completa, muito vulgar; anestesias segmentares descritas por Char-cot; e as manchas, ilhotas ou zonas anestésicas—que não corres-pondem a território algum nervoso e que nenhum carácter teem de fixidez.

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A surdez histérica que então se nota pode ser unilateral ou bilateral. Neste último caso o dia-gnóstico com a surdez orgânica ligada a uma lesão do labirinto é por vezes difícil. Como ele-mento de diagnóstico podemos utilizar a verti-gem voltaica que fica normal na surdez histé-rica e que é perturbada ou mesmo abolida na surdez labiríntica (Babinski).

Quanto à surdez histérica unilateral, temos como elementos de diagnóstico com a surdez orgânica, a mesma prova da vertigem voltaica e a prova de Rinne que consiste em observar se as vibrações de um diapasão são percebidas durante mais tempo por via aérea, colocando-o deante do orifício do conduto auditivo externo ou por via craniana, colocando o diapasão em contacto com a parede do crânio.

Nos casos de surdez incompleta de origem central ou de surdez histérica ou ainda no es-tado normal, as vibrações serão percebidas du-rante mais tempo no primeiro caso; o contrário sucede nos casos de surdez devida a lesões do ouvido médio, do tímpano ou do conduto au-ditivo.

As perturbações da visão são também muito vulgares nas histéricas, a ponto de algumas delas, como a redução do campo visual e a dis-cromatopsia, constituírem para alguns autores um sinal característico da névrose.

As perturbações visuais mais frequentes são: a redução do campo visual, a astenopia de acomodação e a discromatopsia.

Referências

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