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O princípio da proporcionalidade como balizador na adequação típica dos atos libidinosos diversos da conjunção carnal entre o crime de estupro e de importunação sexual

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Academic year: 2021

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JÚLIA SCHERER FORTUNATO

O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE COMO BALIZADOR NA ADEQUAÇÃO TÍPICA DOS ATOS LIBIDINOSOS DIVERSOS DA CONJUNÇÃO

CARNAL ENTRE O CRIME DE ESTUPRO E DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL

Tubarão 2019

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JÚLIA SCHERER FORTUNATO

O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE COMO BALIZADOR NA ADEQUAÇÃO TÍPICA DOS ATOS LIBIDINOSOS DIVERSOS DA CONJUNÇÃO

CARNAL ENTRE O CRIME DE ESTUPRO E DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Linha de pesquisa: justiça e sociedade

Orientador: Denise Silva de Amorim Faria, MSc.

Tubarão 2019

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AGRADECIMENTOS

Antes de tudo, gostaria de agradecer aos meus pais, que nunca mediram esforços para que eu pudesse realizar os meus sonhos, por sempre acreditarem no meu potencial, e por me incentivarem a nunca desistir. Para ambos, todo meu amor e gratidão.

Ademais, à minha orientadora, professora Denise Amorim Faria, por aceitar me auxiliar neste desafio de escrever sobre um tema tão polêmico e por ter disponibilizado todo o apoio necessário.

Agradeço a todos os professores que ao longo dessa jornada contribuíram partilhando parte do seu conhecimento.

Agradeço aos meus amigos de faculdade, os quais espero levar para a vida, por compartilharem memoráveis momentos e por tornarem estes cinco anos ainda melhores.

Agradeço aos integrantes dos meus estágios, primeiramente ao Juizado Especial Criminal e Violência Doméstica e Familiar contra mulher, que me possibilitou a capacidade de analisar e vivenciar o tema deste trabalho, bem como à equipe do escritório LRO Advogados e Associados por me ensinar a matéria jurídica e demonstrar como exercer a profissão de modo ímpar.

Por fim, demonstro minha gratidão a todos que, direta ou indiretamente, me auxiliaram e guiaram nesta conclusão acadêmica, que espero ser primeira de muitas.

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“Ciência penal não é só a interpretação hierática da lei, mas, antes de tudo e acima de tudo, a revelação de seu espírito e a compreensão de seu escopo, para ajustá-lo a fatos humanos, a almas humanas, a episódios do espetáculo dramático da vida.” Nelson Haungria.

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RESUMO

O presente trabalho monográfico tem como objetivo examinar a aplicação do princípio da proporcionalidade como balizador na classificação penal dos atos libidinosos diversos da conjunção carnal entre o crime de estupro e de importunação sexual. Para tanto, serão explanadas as principais alterações promovidas pela Lei n. 12.015 de 2009 e Lei n. 13.718 de 2018, as noções conceituais dos crimes sexuais em apreço e a análise dos tipos penais descritos no artigo 213 e no artigo 215-A ambos do Código Penal. Analisar-se-á também o conflito decorrente da sucessão de lei penal no tempo, em especial, os efeitos da superveniência de novatio legis e os princípios atinentes ao direito intertemporal. Subsequentemente, será abordado os aspectos mais relevantes sobre o princípio da proporcionalidade, bem como, analisar-se-ão decisões proferidas pelas Cortes de Justiça sob o enfoque da aplicação do postulado em comento no momento da tipificação penal dos atos libidinosos menos invasivos entre o crime de estupro e de importunação sexual. A metodologia utilizada nesta monografia, quanto à abordagem, foi o qualitativo; quanto ao nível de pesquisa, o exploratório e, quanto ao procedimento, utilizaram-se os métodos bibliográfico e documental. Destarte, foi possível concluir que o preceito secundário do tipo penal de estupro fere diretamente o princípio da proporcionalidade, em especial, na vertente da proibição de excesso. Pode-se verificar também que o novel tipo penal de importunação sexual desencadeou uma celeuma jurisprudencial, tendo em vista que atos libidinosos análogos foram subsumidos a tipos penais com penas dissonantes, evidenciando, assim, tamanha insegurança jurídica no ordenamento jurídico penal brasileiro.

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ABSTRACT

This monographic work will examine the application of the principle of proportionality as a guide in the criminal classification of libidinous acts different than the carnal conjunction between the crime of rape and sexual harassment. Therefore, will be explain the changes promoted by Law no. 12.015 of 2009 and Law no. 13.718 of 2018, the conceptual notions of sexual crimes under consideration and the analysis of the criminal types described in the Article 213 and Article 215-A both from the Penal Code. The conflict arising from the succession of criminal law over time will be also analyzed, in particular the effects of the supervenience of novatio legis and the principles related to intertemporal law. Subsequently, will be explained the most relevant aspects of the principle of proportionality, and it will be analyzed some decisions prolated by the Courts of Justice with the focus on the application of the postulate in comment. The method used in this monograph, regarding the approach, was the qualitative one; as for the level of research, the exploratory and, as for the procedure, the bibliographic and documentary methods were used. Thus, it was possible to conclude that the secondary precept of the criminal type of rape directly violates the principle of proportionality, in particular, regarding the prohibition of excess, it can also be seen that the new criminal type of sexual harassment has brought to light a jurisprudential jealousy, considering that similar libidinous acts were subsumed to criminal types with dissonant penalties evidencing such legal uncertainty in the Brazilian criminal law.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

1.1 DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMA ... 9

1.2 HIPÓTESE ... 11 1.3 JUSTIFICATIVA ... 12 1.4 OBJETIVOS ... 12 1.4.1 Geral ... 12 1.4.2 Específicos ... 13 1.5 DELINEAMENTO METODOLÓGICO ... 13

1.6 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS ... 14

2 DISPOSIÇÕES ACERCA DO CRIME DE ESTUPRO E DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL ... 15

2.1 DO CRIME DE ESTUPRO ... 15

2.1.1 Crime de estupro após a Lei 12.015/2009 ... 15

2.1.2 Análise do tipo penal de estupro ... 17

2.1.2.1 Sujeito ativo e passivo ... 18

2.1.2.2 Consumação e tentativa ... 19

2.1.2.3 Formas qualificadas ... 19

2.1.2.4 Elementos normativos - conjunção carnal e atos libidinosos ... 20

2.1.3 Considerações acerca do Estupro de Vulnerável e a presunção de violência ... 21

2.1.4 Estupro e a Lei dos Crimes Hediondos ... 24

2.2 DO CRIME DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL ... 24

2.2.1 Fato propulsor à criação da nova figura penal ... 25

2.2.2 Análise do tipo penal ... 25

2.2.3 Revogação da Contravenção Penal de Importunação Ofensiva ao Pudor ... 27

2.2.4 Distinção entre o crime de estupro e importunação sexual ... 28

3 A LEI PENAL NO TEMPO ... 29

3.1 PRINCÍPIOS APLICÁVEIS ... 29

3.1.1 Princípio da Estrita Legalidade ou Reserva Penal ... 29

3.1.2 Anterioridade da lei ... 30

3.1.3 Irretroatividade ... 31

3.1.4 Princípio Taxatividade ... 32

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3.3 SUPERVENIÊNCIA DE NOVATIO LEGIS ... 33

3.3.1 Superveniência de novatio legis in mellius ... 34

3.3.2 Superveniência de novatio legis in pejus ... 37

4 O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE COMO PRINCÍPIO NORTEADOR NA ELEIÇÃO DA CLASSIFICAÇÃO PENAL ... 39

4.1 ORIGEM HISTÓRICA ... 39

4.2 CONCEITO ... 40

4.2.1 Proibição de Excesso ... 41

4.2.2 Proibição de Proteção Insuficiente ... 42

4.3 O FUNDAMENTO JURÍDICO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE ... 44

4.4 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE NA ESFERA PENAL ... 45

4.5 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL – OS EFEITOS DA SUPERVENIÊNCIA DE NOVATIO LEGIS ... 46

4.5.1 A possibilidade de desclassificação do tipo penal de estupro (art. 213, do CP) para o crime de importunação sexual, na visão do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça Catarinense ... 46

4.5.1.1 Recurso Especial n. 1745333/RS ... 47

4.5.1.2 Apelação Criminal n. 0001385-10.2012.8.24.016/SC ... 49

4.5.2 A polêmica acerca da configuração do crime previsto no art. 215-a do Código Penal nos casos onde há vulnerabilidade da vítima ... 50

4.5.2.1 O Entendimento do Supremo Tribunal Federal ... 50

4.5.2.2 O entendimento do Superior Tribunal de Justiça: ... 52

4.5.2.3 O entendimento do Tribunal de Justiça Catarinense: ... 54

4.5.3 Considerações sobre os resultados obtidos em análise jurisprudencial ... 57

4.6 A NECESSÁRIA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E A GRADUAÇÃO DOS ATOS LIBIDINOSOS QUANDO DA CLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE ESTUPRO E IMPORTUNAÇÃO SEXUAL ... 58

4.7 OS DELITOS SEXUAIS À LUZ DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE NO DIREITO COMPARADO ... 60

5 CONCLUSÃO ... 62

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1 INTRODUÇÃO

Este estudo versa sobre a aplicação do princípio da proporcionalidade como balizador na adequação típica dos atos libidinosos diversos da conjunção carnal entre o crime de estupro e de importunação sexual em razão da amplitude conceitual e da vasta possibilidade de condutas caracterizadoras do crime de estupro.

1.1 DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMA

A Lei 12.015/2009 trouxe alterações substanciais no ordenamento penal no que concerne à tutela da dignidade sexual. Com relação ao tema objeto de estudo do presente projeto de pesquisa, mister salientar que houve a reunião do crime de estupro com o de atentado violento ao pudor, com isso, todo e qualquer ato libidinoso cometido mediante violência física ou psíquica, transformou-se em estupro, previsto no art. 213 do Código Penal.

Com a alteração legislativa, o estupro transfez-se em um crime de múltipla ação, haja vista que a estrutura do tipo penal incriminador abrange diversas modalidades de condutas que possam ser caracterizadas como ato libidinoso, considerando qualquer uma apta a perfectibilizá-lo, tornando, desse modo, a classificação muito ampla.

A reforma acabou conferindo uma expansão desmedida ao crime de estupro, abrindo assim um vácuo interpretativo e possibilitando entendimentos divergentes a respeito de sua prática.

A fim de se alcançar uma maior compreensão do tema posto em mesa, faz-se necessário elucidar a distinção entre conjunção carnal e outros atos libidinosos. Nesse passo, Capez (2019, p. 76) define a primeira, como cúpula vagínica, ou seja, a efetiva penetração do membro viril no órgão genital feminino. Já com relação aos outros atos libidinosos, a doutrina é assente no sentido de que estes são difíceis de constatar, tendo em vista que compreendem diversas formas de realização de atos com cunho sexual que não a conjunção carnal.

Assim, para Jesus, ato libidinoso é definido sob o seguinte aspecto:

É o ato lascivo, voluptuoso, dirigido para a satisfação do instinto sexual. Objetivamente considerado, o ato libidinoso deve ser ofensivo ao pudor coletivo, contrastando com o sentimento de moral médio, sob o ponto de vista sexual. Além disso, subjetivamente, deve ter por finalidade a satisfação de um impulso de luxúria, de lascívia (2012, p. 131).

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Ressalta-se que o termo em análise possui um conceito lato, na medida em que compreende qualquer atitude com cunho sexual que tenha por escopo a satisfação da libido. (CAPEZ, 2019, p. 76)

Outrossim, vislumbra-se que o delito de estupro, ao abranger a prática de qualquer ato libidinoso, acaba por revestir de igual gravidade atos menos invasivos, equiparando-os aos cometidos em máxima potencialidade lesiva. Delmanto (2016, p.1.123) critica a ausência de graduação entre os mais variados atos libidinosos, colocando todos os comportamentos sexuais sob a esfera de proteção de um único tipo penal.

Em suma, pode-se observar que a reforma operada no artigo 213 do Código Penal pela Lei 12.015/2009, conferiu ao crime de estupro uma expansão demasiada ao unificá-lo ao crime de atentado violento ao pudor, antes previsto no artigo 214 do mesmo diploma legal.

Decorrente deste fato, constatou-se um vácuo legislativo, o qual possibilita entendimentos divergentes a respeito do que venham a ser atos libidinosos caracterizadores do crime de estupro.

Cumulativamente, pode-se averiguar que determinadas condutas, ainda que não justifiquem tamanha reprovabilidade, passaram a ser equiparadas ao crime de estupro a fim de evitar a impunidade, uma vez que a outra alternativa seria a desclassificação para contravenção penal de importunação ao pudor, punida apenas com pena de multa.

Neste diapasão, instaurou-se intenso debate acerca do rigor da legislação penal brasileira e da dificuldade de realizar a subsunção do fato à norma de modo adequado. Frente a este contexto, observou-se a necessidade do ajustamento do tema, através da inserção de uma conduta intermediária no ordenamento penal. (OLIVEIRA JUNIOR; SECANHO, 2018)

Recentemente, houve a edição da Lei n. 13.178/18, a qual instituiu o crime de importunação sexual, no artigo 215-A, do Código Penal, com a seguinte redação: “Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”. (BRASIL, 2018)

Ante a inserção de uma figura penal intermediária, o aplicador do direito começa a aplicar o novel crime, para situações não tão invasivas, em que determinada conduta contra a dignidade sexual seja infimamente desproporcional ao crime de estupro, sob o viés do princípio da proporcionalidade.

Contudo, esta solução não está longe de críticas, pois, indiscutivelmente, se dá grande poder ao intérprete e aplicador da lei, se distanciando da almejada segurança jurídica.

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Neste contexto, surge a problemática, que motiva o presente estudo, sobre a aplicação do princípio da proporcionalidade como balizador na classificação penal dos atos libidinosos diversos da conjunção carnal entre o crime de estupro e de importunação sexual. 1.2 HIPÓTESE

A divergência de opiniões acerca da adequação típica dos atos libidinosos diversos da conjunção é o fato propulsor da presente pesquisa. Preliminarmente à formulação da hipótese de resposta ao problema, faz-se necessário expor os fundamentos que ensejam os posicionamentos diversos.

A priori, convém destacar que diversas condutas libidinosas são enquadradas no tipo penal descrito no art. 213, do Código Penal, fazendo com que atos não tão invasivos sejam punidos de forma exacerbada, de modo equiparado à conjunção carnal.

Inobstante ao que estabelece o art. 213 do Código Penal, oposta fração de doutrinadores consentem que seria inconstitucional esta apenação rigorosa, sendo de suma importância que condutas menos invasivas fossem punidas de forma mais branda e proporcional, sendo o crime de estupro aplicado apenas em casos de extrema gravidade.

Neste sentido, Cesare Beccaria, por meio da obra “Dos Delitos e das Penas”, trata sobre a necessidade da proporção entre o crime praticado e a pena a ele cominada. Extrai-se da obra:

Não somente é interesse de todos que não se cometam delitos, como também que estes sejam mais raros proporcionalmente ao mal que causam à sociedade. Portanto, mais fortes devem ser os obstáculos que afastam os homens dos crimes, quando são contrários ao bem público e na medida dos impulsos que os levam a delinquir. Deve haver, pois, proporção entre os delitos e as penas. (BECCARIA, 2013, p. 123) O presente projeto de pesquisa filia-se à corrente que defende a necessidade de que os delitos sejam punidos com uma sanção justa, proporcional à gravidade da ação, e ao mesmo tempo congruente com as penalidades previstas para os demais crimes existentes na legislação penal (GOMES, 2003, p. 179 a).

Destarte, adequar-se-á ao tipo penal de estupro, somente aquele que pratica o ato libidinoso em máxima potencialidade ofensiva. Ao passo que, quanto aos atos revestidos de menor gravidade, a Lei n. 13.718/18 emerge um tipo penal intermediário, intitulado como importunação sexual, sendo o tipo penal cabível à vista do princípio da proporcionalidade. Contudo, não se pode abster da necessidade de uma nova lei, que especifique os atos libidinosos e sancione-os de acordo com a lesividade ao bem jurídico.

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1.3 JUSTIFICATIVA

No que concerne ao tema eleito como objeto de estudo, constata-se a sua importância, pois a definição de atos libidinosos diversos da conjunção carnal e a respectiva adequação típica entre o crime de estupro e importunação sexual, se trata de questão controversa na esfera do Direito Penal.

Neste contexto, vislumbra-se que os tipos penais vigentes no Estatuto Repressivo não são extremamente rígidos e absolutos, sendo passíveis de interpretações diversas, ensejando certa insegurança jurídica.

Com o advento da Lei n. 13.718 de 2018 e a inserção de um tipo penal intermediário nos casos de crime contra a dignidade sexual, artigo 215-A do Código Penal, a doutrina e a jurisprudência passaram a apresentar vertentes de raciocínio dissonantes com relação a sua aplicabilidade em situações atentatórios à dignidade sexual, revestidas de menor gravidade.

Neste diapasão, após a identificação desta divergência, cumulado com o interesse particular despertado em mim, justifica-se a escolha deste tema para a realização do presente trabalho monográfico.

A análise da temática é de suma importância, visto que interpretações dissonantes acarretam em insegurança jurídica penal, ferindo diversos princípios constitucionais e garantias penais.

Desse modo, verifica-se a necessidade do estudo em questão, especialmente no tocante às consequências jurídicas que podem causar aos indiciados ou até mesmo aos condenados pelo tipo penal de estupro que não o cometeram em máxima potencialidade lesiva. 1.4 OBJETIVOS

1.4.1 Geral

Analisar a aplicação do princípio da proporcionalidade como balizador na classificação penal dos atos libidinosos diversos da conjunção carnal entre crime de estupro e de importunação sexual.

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1.4.2 Específicos

Identificar as disposições relevantes assentadas na doutrina e jurisprudência relativas aos crimes de estupro e importunação sexual, bem como descrever as divergências existentes em relação às possíveis configurações penais dos atos libidinosos diversos da conjunção carnal.

Verificar os efeitos jurídicos oriundos da superveniência da Lei n. 13.718 de 2018. Estudar a aplicação do princípio da proporcionalidade no ordenamento penal brasileiro, mormente, com relação aos delitos sexuais.

Analisar as decisões proferidas pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal frente à desclassificação de condutas anteriormente definidas como estupro, mas menos ofensivas, para o crime de importunação sexual sob o fundamento do princípio proporcionalidade.

Estabelecer, ao final, uma melhor colocação do tema, tomando apontamentos sobre as informações obtidas ao longo do delineamento da pesquisa, bem como propondo uma solução para o problema identificado.

1.5 DELINEAMENTO METODOLÓGICO

O presente projeto classifica-se quanto ao nível de pesquisa como exploratório, tendo em vista que possui o escopo observar a aplicação do princípio da proporcionalidade em relação aos atos libidinosos diversos da conjunção carnal no momento da adequação típica entre o crime de estupro ou de importunação sexual. Desta feita, a pesquisa objetiva proporcionar uma visão geral acerca do fato, com vistas à elaboração de problemas mais precisos. (LEONEL; MARCOMIN, 2015)

Desta forma, a fim de corroborar com a definição de pesquisa exploratória convém destacar o entendimento de Leonel e Marcomim (2015, p. 12):

São consideradas as pesquisas que visam a aproximar o pesquisador de um problema pouco conhecido ou sobre o qual se tenha pouca familiaridade. Desse modo, esta pesquisa volta-se à busca de maior familiaridade com o que se queira pesquisar (problema de pesquisa). Normalmente trata de questões sobre as quais se queira uma compreensão básica, inclusive para se ter melhor condição e domínio para compreender melhor o problema e suas hipóteses de resposta.

Tocante à abordagem, a pesquisa será realizada de modo qualitativo, selecionando entendimentos e posicionamentos que dizem respeito ao assunto abordado, analisando suas

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narrativas, discursos e palavras, informações que serão utilizadas para o seu desenvolvimento (TRIVIÑOS, 1987 apud LEONEL; MARCOMIM, 2015, p. 29).

Concernente ao procedimento aplicado para a coleta de dados, utilizar-se-á a forma bibliográfica através de doutrinas, concomitantemente à forma documental, sustentando as teses firmadas na pesquisa conforme a legislação e a jurisprudência.

No que tange à pesquisa bibliográfica, Boccato (2006, p. 266) explica que este tipo de procedimento visa explicar o problema com base nos materiais já publicados sobre o tema, conforme extrai-se:

A pesquisa bibliográfica busca a resolução de um problema (hipótese) por meio de referenciais teóricos publicados, analisando e discutindo as várias contribuições científicas. Esse tipo de pesquisa trará subsídios para o conhecimento sobre o que foi pesquisado, como e sob que enfoque e/ou perspectivas foi tratado o assunto apresentado na literatura científica. Para tanto, é de suma importância que o pesquisador realize um planejamento sistemático do processo de pesquisa, compreendendo desde a definição temática, passando pela construção lógica do trabalho até a decisão da sua forma de comunicação e divulgação.

Quanto à classificação documental, esta deriva do fato de que no decorrer do presente trabalho serão selecionados alguns julgados para compor a pesquisa, escolhidos conforme o grau de relevância, a fim de evidenciar o posicionamento dominante.

1.6 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS O desenvolvimento desta monografia foi estruturado em mais três capítulos. O segundo capítulo apresenta uma contextualização dos delitos de estupro e importunação sexual, conceituando-os e classificando-os conforme o entendimento consagrado pela doutrina majoritária.

O terceiro capítulo, se ocupa em analisar a questão de sucessão de lei penal no tempo em virtude da superveniência de novatio legis, Lei n. 13.718 de 2018, e seus efeitos no ordenamento penal.

O quarto capítulo aborda o princípio da proporcionalidade, e evidencia a afronta à vertente de proibição de excesso existente no preceito secundário do tipo penal de estupro. Além disso, demonstra-se os resultados da pesquisa jurisprudencial realizada com o escopo de identificar o atual entendimento do Tribunal de Justiça Catarinense, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal acerca da tipificação dos atos libidinosos diversos da conjunção carnal e a (in)observância ao postulado em foco.

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2 DISPOSIÇÕES ACERCA DO CRIME DE ESTUPRO E DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL

Para que se possa desenvolver o tema principal deste trabalho monográfico, inicialmente serão apontados os aspectos mais relevantes acerca dos crimes de estupro e de importunação sexual, tipos penais bem complexos e que suscitam variadas indagações. 2.1 DO CRIME DE ESTUPRO

Neste momento, realizar-se-á a análise do tipo penal de estupro, insculpido no artigo 213 do Código Penal, delineando as principais modificações legislativas, os contornos conceituais definidos pela doutrina majoritária, bem como a estrutura do tipo penal incriminador, e as principais contradições subsistentes sobre o tema.

2.1.1 Crime de estupro após a Lei 12.015/2009

A vigência da Lei n. 12.015/2009, acarretou diversas reformas no Título VI, da parte especial do Decreto Lei n. 2.848/1940, alterando, inclusive, sua denominação “dos crimes contra o costume”, passando a ser intitulado como “dos crimes contra a dignidade sexual”. (NUCCI, 201)

Vislumbra-se que a nova denominação mostrou-se oportuna, haja vista que afastou o paradigma da sexualidade sob o prisma da moral pública, resguardando a indenidade sexual, o pleno e sadio desenvolvimento da sexualidade do indivíduo. (ESTEFAM, 2018, p. 627 b)

Nesta toada, Guilherme de Souza Nucci et al (2014) dispõe que “a alteração de nomenclatura indica, desde logo, que a preocupação do legislador não se limita ao sentimento de repulsa social a esse tipo de conduta, como acontecia nas décadas anteriores, mas sim à efetiva lesão ao bem jurídico em questão”.

Da inovação legislativa emergiram novas figuras típicas ao ordenamento jurídico penal brasileiro, de modo a ampliar a tutela do bem jurídico da liberdade sexual e consagrar, assim, o princípio da dignidade da pessoa humana.

Por iguais razões, a referida lei alterou substancialmente o tipo penal de estupro que passou a ser a fusão do crime de atentado violento ao pudor, antes previsto no artigo 214 do Código Penal, com o crime estupro, disposto no artigo 213 do mesmo diploma legal. Anteriormente, à vigência da lei, os mencionados crimes eram definidos da seguinte forma:

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Estupro

Artigo 213. Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça.

Atentado violento ao pudor

Artigo 214. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal. (BRASIL, 1940)

Em decorrência desta redação, pairava sobre a doutrina e a jurisprudência controvérsia acerca da adequação típica da prática de conjunção carnal forçada e outro ato libidinoso no mesmo contexto fático.

Duas correntes versavam sobre este impasse, uma defendia que a situação em debate configurava concurso material, artigo 69 do Código Penal, sendo assim, o agente deveria responder isoladamente por cada infração (conjunção carnal forçada e ato libidinoso diverso da conjunção carnal), somando as penas finais.

Em contrapartida, a outra corrente dispunha que os atos praticados sob as mesmas condições de tempo, lugar e modo de execução indicariam crime continuado, implicando em condenação única, sendo a pena acrescida de um sexto a dois terços, conforme preceitua o artigo 71, do Código Penal. Nesse sentido, Greco e Rassi citados por Delmanto (2016, p. 1.123) anotam que “o estupro mediante conjunção carnal absorve o ato libidinoso em progressão àquela.”

De outro norte, Delmanto (2016, p. 1.123) apresenta uma corrente mista, em que “dependendo das circunstâncias, poderá haver crime único (ex. quando os atos libidinosos forem praticados como prelúdio da cópula), ou concurso de crimes (quando, houver coito anal e vagínico, ou ato libidinoso fora da própria progressão da conjunção carnal).”

Atualmente, sob a óptica da Lei n. 12.015, não existem mais tipos penais independentes, que possam causar a punição em abstrato autônoma, eis que agora trata-se de crime único, cuja conduta pode ser executada de diversas formas.

Ademais, junção do crime de atentado violento ao pudor ao crime de estupro, acarretou na abrangência do artigo 213 do Código Penal, uma vez que a conduta típica do artigo em análise passou a compreender não somente a prática de conjunção carnal, como também de qualquer outro ato libidinoso, in verbis:

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

Deflui-se, portanto, que a hipótese de incidência do crime de estupro tornou-se muito vasta, tendo em vista a diversidade de condutas que podem caracterizar o delito em comento.

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Neste norte, oportuno mencionar a lição de Capez:

O dispositivo abarcou diversas situações que não se enquadrariam na acepção originária do crime de estupro. [...]Deste modo ações que antes configuravam crime de atentado violento ao pudor (CP, art. 214), atualmente revogado pela Lei n. 12.015/2009, agora integram o delito de estupro, sem importar em abolitio criminis. [...] Conclui-se, portanto, que o estupro passou a abranger a prática de qualquer ato libidinoso, conjunção carnal ou não, ampliando sua tutela legal. (2019, p. 75).

Vislumbra-se que a aglutinação do crime de estupro e atentado violento ao pudor no mesmo dispositivo legal deu azo à incongruências, ao revestir atos libidinosos de menor potencial lesivo de mesmo grau de reprovabilidade que a conjunção carnal, instituindo a mesma pena em abstrato para ambas as condutas. Observa-se, portanto, tamanha discrepância entre a conduta do agente e a sanção imposta, por desconsiderar o grau de ofensividade ao bem jurídico tutelado.

Destarte, frente às garantias penais, é imperioso que os delitos sejam reprimidos com uma sanção correspondente à ofensividade ao bem jurídico tutelado, consagrando, assim, o princípio da proporcionalidade.

2.1.2 Análise do tipo penal de estupro

A acepção originária do termo estupro deriva do latim stuprum, que significa vergonha ou desonra.

Nesse sentido Hungria apud Marcão (2014, p. 44) aponta que:

No direito romano, chamava-se stuprum, em sentido lato, qualquer congresso carnal ilícito (compreendendo até mesmo o adultério e a pederastia) e, em sentido estrito, o simples concúbito com mulher virgem ou não casada, mas honesta.

Infere-se do artigo 213, do Código Penal Brasileiro, que a conduta típica do delito de estupro consubstancia-se em: “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.”(BRASIL, 1940)

O núcleo do tipo penal é o verbo constranger, interpretado sob o aspecto de forçar, compelir, coagir alguém a realizar algo - no caso em apreço, ter conjunção carnal, ou praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. (NUCCI, 2019)

Os meios de execução do delito são a violência ou a grave ameaça, previstos no próprio tipo penal. Outrossim, Mirabete e Fabbrini (2012, p. 395), salientam que “é indispensável para a caracterização do estupro que tenha havido constrangimento mediante violência ou grave ameaça”. Destarte, através destes meios executórios, o agente constrange a vítima a ter conjunção carnal ou permite que com ele se pratique outro ato libidinoso.

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Segundo Masson, (2019, p. 9) “a violência (vis absoluta ou vis coporalis) é o emprego de força física sobre a vítima, consistente em lesões corporais ou vias de fato”. Ao passo que, a grave ameaça deve ser compreendida como a violência moral, a promessa de realização de mal grave, contra a vítima, dispensando-se a existência de justiça da ameaça.

Conjunção carnal, conforme define Capez (2019, p. 76) “é a cópula vagínica, ou seja, a penetração efetiva do membro viril na vagina”. Os atos libidinosos por sua vez são os demais atos sexuais destinados à satisfação da lascívia do agente.

2.1.2.1 Sujeito ativo e passivo

Consoante a nova redação do tipo penal de estupro, o qual passou a disciplinar não somente a conjunção carnal, mas também qualquer outro ato libidinoso, o delito em apreço passou a classificar-se como comum, no que tange ao sujeito ativo, pois tornou possível que a mulher pratique a conduta incriminadora.

Importante frisar que se admite coautoria e participação no crime de estupro. Mirabete e Fabbrini (2012, p. 391) discorrem que “é coautor aquele que concorre eficazmente no constrangimento à vítima para a consumação do estupro, ainda que com ela não tenha mantido relações sexuais ou praticado outros atos libidinosos”, para tanto, deverá exercer violência ou grave ameaça contra a vítima.

No que concerne ao sujeito passivo, o dispositivo ao utilizar o termo alguém, possibilita que figure neste polo qualquer pessoa, dispensando-se eventual característica especial da vítima. Entretanto, salienta-se que não são tutelados por este tipo penal os sujeitos considerados vulneráveis, pois nestes casos configura-se o crime descrito no artigo 217-A do Código Penal.

Ainda sobre o polo passivo, Mirabete e Fabbrini dispõem que:

Tutelando a lei a liberdade sexual como bem jurídico que integra a dignidade sexual da pessoa e sendo esta um atributo intrínseco da personalidade humana, estão protegidos pelo dispositivo o homem e a mulher, independentemente de sua orientação ou comportamento sexual. (2012, p. 392)

Da mesma forma é o entendimento de Jesusao lecionar que:

Não se exige qualquer qualidade especial para que seja vítima de estupro, não importando se se trata de pessoa virgem ou não, prostituta ou não, casada, solteira, separada de fato, viúva ou divorciada, velha ou moça, liberada ou recatada. Não há necessidade de que a vítima compreenda o caráter libidinoso do ato praticado. Basta que ofenda o pudor médio e tenha conotação sexual para que se constitua o delito. (2012, p. 126)

(20)

2.1.2.2 Consumação e tentativa

Oportuno mencionar que quando o delito consistir na prática de conjunção carnal a penetração, ainda que parcial, do pênis na vagina é o suficiente para a consumação do delito, sendo prescindível a ejaculação. De toda sorte, o delito também estará consumado com a prática de ato libidinoso diverso da cópula vagínica.

Há de se frisar que o cometimento de mais de um ato de cunho sexual no mesmo contexto fático, importa em crime único, todavia, deverá ser ponderado posteriormente pelo magistrado no momento da dosimetria da pena. (ESTEFAM, 2018, p. 640 b)

A tentativa é reconhecida em razão do caráter plurissubsistente do delito. Tal fato ocorrerá quando o agente iniciar a execução do crime mas não alcançar o resultado por circunstâncias alheias à sua vontade. Mirabete e Fabbrini (2012, p. 396) apontam que “é exigível para a caracterização da tentativa que as circunstâncias deixem manifesto o intuito do agente, em especial quando, por palavras inequívocas, o agente demonstre o seu intento de praticar a conjunção carnal ou outro ato libidinoso”.

2.1.2.3 Formas qualificadas

O delito de estupro possui formas qualificadas, nas quais são alterados em abstrato os limites mínimo e máximo da pena privativa de liberdade. Desta forma, qualificar-se-á o crime se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de dezoito ou maior de catorze anos (art. 213, § 1º, do CP), ou ainda se da conduta resulta morte (art. 213, § 2º, do CP).

Ademais, aplicam-se ao crime de estupro as causas de aumento de pena, previstas nos artigos 226 e 234-A, ambos do Código Penal Brasileiro, veja-se:

Art. 226. A pena é aumentada:

I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas;

II - de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela;

III - Revogado

IV - de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado: Estupro coletivo

a) mediante concurso de 2 (dois) ou mais agentes; Estupro corretivo

b) para controlar o comportamento social ou sexual da vítima. (BRASIL, 1940)

(21)

Por sua vez, o artigo 234-A elenca as seguintes situações: aumento de metade se do delito resultar gravidez; aumento de um sexto até a metade se o agente transmite doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador (BRASIL, 1940).

Mister assinalar que é possível a incidência de mais de uma majorante no mesmo caso concreto. Neste caso, caberá ao magistrado decidir aplicar todas as causas de aumento, ou limitar-se à aplicação de apenas umas, contudo, nesse caso, deve optar pela maior, conforme preconiza o artigo 68, parágrafo único do Código Penal. (ESTEFAM, 2018, p. 646 b)

Em derradeiro cumpre mencionar que após o advento da Lei n. 13.718/2018, o crime de estupro e os demais crimes contra a dignidade sexual se procedem mediante a ação penal pública incondicionada, independentemente da idade ou condição do ofendido, conforme nova redação conferida ao art. 225, do Código Penal.

2.1.2.4 Elementos normativos - conjunção carnal e atos libidinosos

É imprescindível realizar considerações acerca das condutas abarcadas pelo tipo penal de estupro após a alteração promovida pela Lei n. 12.015 de 2009, que conforme mencionado exaustivamente, aglutinou as condutas de conjunção carnal e outros atos libidinosos no mesmo tipo penal.

Em decorrência desta fusão, o delito passou a caracterizar-se como crime de ação múltipla ou conteúdo variado, haja vista que contempla várias modalidades de conduta para a configuração do crime.

Preliminarmente, para que se possa ter melhor compreensão acerca do tema debatido no presente trabalho, é de suma importância conceituar os elementos normativos conjunção carnal e atos libidinosos.

Segundo o Código Penal, ato libidinoso é gênero, subdividido em duas espécies: conjunção carnal e os demais atos libidinosos (masturbação, coito anal, sexo oral).

A conjunção carnal é de simples percepção, também denominado de ato libidinoso por excelência. Para Capez (2019, p. 76) é a cópula vagínica, ou seja, a penetração do membro viril na vagina. E configura-se com a introdução total ou parcial do pênis na vagina.

Corroborando o exposto Mirabete e Fabbrini dispõem que:

Conjunção carnal, no sentido da lei, é a cópula vagínica, completa ou incompleta entre homem e mulher. A expressão se refere ao coito normal, que é a penetração do membro viril no órgão sexual da mulher, com ou sem o intuito de procriação. [...] Não configura, pois, a conjunção carnal a cópula vestibular ou vulvar. Não depende o estupro, todavia, do rompimento do hímen [...] Não se exige também que tenha ocorrido a ejaculação. (2012, p. 293)

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Os demais atos libidinosos, são aqueles que visam o prazer sexual, e compreendem outras formas de realização do ato sexual que não a conjunção carnal. É o ato lascivo, voluptuoso, dirigido para a satisfação do instinto sexual. (JESUS, 2012, p. 128)

Segundo Hungria (apud MARCÃO; GENTIL, 2014 p. 96) “o ato libidinoso, [...] deve ser manifestamente obsceno ou lesivo da pudicícia média. Não pode ser confundido com a simples inconveniência, nem ser reconhecido numa atitude ambígua.”

Para Noronha os atos libidinosos são conceituados da seguinte forma:

Ato libidinoso ou ato de libidinagem é, via de regra, o inspirado pela concupiscência e destinado à satisfação do instinto sexual, em suas proteiformes manifestações. [...] Entre os atos libidinosos, podem ser apontadas a fellatio ou irrumatio in ore, o cunnilingus, o pennilingus, o annilingus, o coito anal, inter femora, a masturbação, os toques e apalpadelas do pudendo, dos membros inferiores, a contemplação lasciva, os contatos voluptuosos etc. (1999, p. 90, apud MARCÃO; GENTIL, 2014 p. 96). Com efeito, percebe-se que a nova redação conferida ao dispositivo legal abrangeu de modo demasiado as hipóteses de incidência do artigo 213, do Código Penal, fazendo com que situações revestidas de menor gravidade tipifiquem o delito de estupro, haja vista que o conceito de atos libidinosos para fins de adequação típica é muito vago.

No mesmo sentido é o entendimento de Capez:

Pode-se afirmar que ato libidinoso é aquele destinado a satisfazer a lascívia, o apetite sexual. Cuida-se de conceito bastante abrangente na medida em que compreende qualquer atitude com conteúdo sexual que tenha por finalidade a satisfação da libido. Não se incluem nesse conceito as palavras, os escritos com conteúdos eróticos pois a lei se refere a ato, ou seja, realização física concreta. (2019, p. 76)

Nessa esteira, salienta-se que a ausência de classificação dos atos libidinosos aptos à caracterização do crime estupro confere ao infrator penal tamanha insegurança jurídica, pois fica a mercê da discricionariedade do operador do direito.

MARCÃO (2014, p. 98) analisando o crime em apreço, aduz que somente se justifica a intervenção penal aos atos libidinosos praticados de modo invasivo, dotados ofensividade, de modo que atos instantâneos ou infimamente lesivos não sofram os efeitos da lei penal.

2.1.3 Considerações acerca do Estupro de Vulnerável e a presunção de violência

O capítulo II, do Título VI da Parte especial do Código Penal, versa sobre os crimes sexuais contra vulnerável e fora inserido pela Lei n. 12.015/09. Deste modo, inseriu uma nova figura típica em substituição às hipóteses de presunção de violência constantes no art. 224, do Código Penal, atualmente revogado. E, nos termos do art. 217-A, consolidou-se o entendimento do caráter absoluto da presunção de violência objeto da norma penal revogada (art. 224, CP).

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Prefacialmente, cumpre ressaltar que o estupro de vulnerável tutela os aspectos da dignidade sexual, o desenvolvimento sexual, a liberdade física e psíquica, em matéria sexual daqueles que a lei considera mais propícios ao abuso sexual, denominados como vulneráveis.

No mesmo sentido, acentua Bitencourt (2012) :

Na verdade, mais que proteger a liberdade sexual do menor de quatorze anos ou incapaz (que, sabidamente, não existe nessa hipótese), a criminalização da conduta descrita no art. 217-A procura assegurar a evolução e o desenvolvimento normal de sua personalidade, para que, na fase adulta, possa decidir conscientemente, e sem traumas psicológicos, seu comportamento sexual; para que tenha, em outros termos, serenidade e base psicossocial não desvirtuada por eventual trauma sofrido na adolescência, podendo deliberar livremente sobre sua sexualidade futura, inclusive quanto à sua opção sexual.

O nomen iures estupro de vulnerável fora tipificado no artigo 217-A do Código Penal, consistente na prática da seguinte conduta:

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. § 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência. (BRASIL, 1940)

O crime em apreço constitui a realização de qualquer ato libidinoso, ou seja, contato sexual que vise a satisfação da lascívia, consensual ou não, com pessoas em situação de vulnerabilidade. (JESUS, 2012)

A estrutura do tipo penal incriminador contempla duas condutas distintas: ter conjunção carnal e praticar outro ato libidinoso com pessoa vulnerável. A conjunção carnal conforme já mencionado, resta configurada pela introdução do pênis na vagina, enquanto ato libidinoso abrange a prática dos demais atos sexuais, diversos da conjunção carnal, que possuam a finalidade de satisfazer a lascívia do agente. (NUCCI, 2019, p. 21)

Entende-se por vulnerável o menor de 14 anos – art. 217-A, caput, do CP – bem como aqueles que devido à enfermidade ou deficiência mental não possuam discernimento mínimo sobre questões sexuais, ou os que se encontram incapacitados de oferecer resistência por qualquer outra causa, intitulados vulneráveis por equiparação – artigo 217-A, 1º, do Código Penal.

No que tange à vulnerabilidade do menor de catorze anos, observa-se que o legislador adotou um critério rígido e objetivo, presumindo de modo absoluto a vulnerabilidade em razão da idade. (NUCCI, 2014)

O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento sobre a presunção absoluta de violência no bojo da Súmula n. 593, in verbis: “O crime de estupro de vulnerável

(24)

se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante o eventual consentimento da vítima para a prática do ato, experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente”.

Na mesma vertente de raciocínio é o entendimento de Greco, Delmanto e Mirabete. Data vênia, o critério objetivo adotado pelo legislador merece críticas. Isso porque, conforme assevera Nucci (2014), a presunção absoluta fere diretamente os Princípios Constitucionais da ofensividade, da presunção de inocência e da intervenção mínima do direito penal. Nessa esteira, o termo vulnerabilidade deve ser empregado de modo restritivo, de acordo com as particularidades do caso in concreto, ponderando a (in)capacidade física e mental da vítima, sua fragilidade e capacidade para consentir a prática do ato sexual.

No mesmo sentindo, Estefam defende a necessidade da relativização da presunção de inocência:

Ocorre, todavia, que a exegese das normas penais não pode se dar, jamais, alijada de uma visão constitucional e, notadamente, da correta delimitação do valor protegido (objetividade jurídica) pela disposição. É por essa razão que entendemos, a despeito da peremptoriedade do Texto Legal, que nem todo contato sexual com menor de 14 anos ingressará na tipicidade (material) da norma. É a mens legis que se sobrepõe à mens

legislatoris. (2018, p. 663 b)

Isso porque, segundo o referido autor não se observa violação ao bem jurídico tutelado, qual seja, a dignidade sexual, nas situações em que embora a vítima possua mais de doze e menos de quatorze anos de idade, pratique ato libidinoso com o livre consentimento. Todavia, consoante a intepretação literal do dispositivo legal o agente estará cometendo crime hediondo, revestido de rigidez exacerbada. (ESTEFAM, 2018, p. 662 b)

Na mesma vertente de raciocínio, preleciona Jesus:

Ausente o elemento qualificador do tipo (ofensa à dignidade sexual), penso que inexiste crime. Não há lesão ao bem jurídico quando uma adolescente de 13 anos de idade, voluntariamente, passa a morar com o autor e mantém com ele relações sexuais. Vítima vulnerável é a que apresenta uma diminuição física, psíquica ou sensorial, estacionada ou progressiva, configurando causa de dificuldade de aprendizagem, de relacionamento ou de integração laborativa, determinando um processo de desvantagem social ou de marginalização, segundo lei italiana de 5 de fevereiro de 1992. (2012, p.157)

Ante o exposto, infere-se que a mera comprovação de idade é insuficiente para a configuração do delito de estupro de vulnerável, contudo, o critério etário não deve ser absoluto, pois nem sempre estará em consonância com a realidade dos fatos. (ESTEFAM, 2018, p. 662 b)

Frente a este impasse, Nucci (2014) propõe como meio de solução a possibilidade de relativização do termo vulnerabilidade quando versar sobre adolescentes de doze a quatorze anos, e manter o condão absoluto aos menores de doze anos.

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2.1.4 Estupro e a Lei dos Crimes Hediondos

A Lei 12.015/09 erigiu os crimes de estupro e estupro de vulnerável à condição de crime hediondo, inserindo-os no rol taxativo do art. 1º, da Lei n. 8.072/90, in verbis:

Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no

Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou

tentados: V- estupro

VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1o, 2o, 3o e 4o); (BRASIL, 1990)

Segundo Monteiro (2002, p. 15) constitui crime hediondo “toda vez que uma conduta delituosa estiver revestida de excepcional gravidade, seja na execução, [...] seja quanto à natureza do bem jurídico ofendido, ou ainda por eventual condição especial condição da vítima”.

Cumpre destacar que os crimes hediondos são reprimidos com maior gravidade, sendo assim, são insuscetíveis de anistia, graça, indulto e fiança; a pena privativa de liberdade será cumprida em regime inicialmente fechado, autorizando-se a progressão após o cumprimento de dois quintos da pena – em caso de réu primário - ou três quintos da pena em se tratando, de réu reincidente; o prazo da prisão temporária será 30 dias, prorrogável por igual se houver extrema e comprovada necessidade, dentre outras consequências previstas na Lei n. 8.072/90 (MASSON, 2014, p. 845)

Ante o exposto, conclui-se que a Lei de Crimes Hediondos confere um tratamento ríspido às formas de estupro, em razão da relevância jurídica do ato bem como da necessidade de proteção da liberdade sexual.

2.2 DO CRIME DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL

Em setembro de 2018 foi publicada a Lei n. 13.718/2018, a qual promoveu alterações no ordenamento jurídico penal brasileiro, especificamente em relação aos crimes contra a dignidade sexual, seu processamento, e também na Lei das Contravenções Penais.

A referida Lei inseriu o novel crime, intitulado como importunação sexual, e para tanto, no presente material, far-se-á a análise acerca dos aspectos da nova legislação que merecem cautela diferenciada, em especial em face ao seu potencial em gerar maiores controvérsias jurídicas.

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2.2.1 Fato propulsor à criação da nova figura penal

A Lei n. 13.718/18 emergiu uma nova figura típica no ordenamento jurídico penal brasileiro, denominada importunação sexual, consistente em “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”. (BRASIL, 1940)

O fato propulsor à criação do novel crime, ocorreu na cidade de São Paulo, quando no interior de um ônibus, um indivíduo ao masturbar-se, ejaculou em uma passageira. O cidadão fora autuado em flagrante pela prática do delito de estupro, porém, foi-lhe concedido liberdade provisória em audiência de custódia – inclusive com pedido do represente do Ministério Público, sob o fundamento de que o fato não se amoldava à conduta descrita no art. 213, do Código Penal, mas sim, à contravenção penal capitulada no art. 61, do Decreto-Lei n. 3.688/41. A ausência de tipo penal que motivasse a segregação do agente, causou conotação pública, repercutindo sob o prisma jurídico, social e em mídias. A impunidade evidenciou o vácuo legislativo, pois ora constatava-se um excesso punitivo com a imputação do crime de estupro, o qual possui natureza hedionda, ora havia insuficiência, frente à contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor, crime de menor potencial ofensivo. (MASSON, 2019, p.7). Diante desta dicotomia jurídica, o tipo penal de importunação sexual fora criado com o escopo de solucionar este impasse por meio de uma figura intermediária, que não possuísse a gravidade do estupro, nem fosse tão branda quanto uma contravenção penal. 2.2.2 Análise do tipo penal

O bem jurídico tutelado pelo delito de importunação sexual segundo Masson (2019, p. 39) “é a dignidade sexual, relativa ao direito do ser humano de não ser incomodado por outra pessoa no campo da sua liberdade sexual”. Portanto novel tipo penal destina-se a tutelar os indivíduos contra o incomodo, a perturbação, o molestamento de natureza sexual.

Insculpido no art. 215-A, do Código Penal, o crime de importunação sexual apresenta a seguinte redação, in verbis:

Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro: Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave. (BRASIL, 1940)

O tipo penal é constituído pelo verbo nuclear ter interpretado sob o aspecto de realizar, cometer, um ato libidinoso. É cediço que ato libidinoso é todo aquele destinado à

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satisfação da lascívia, revestido de conotação sexual, destacando-se para fins deste delito a masturbação, os toques íntimos e o contato corporal erótico. (MASSON, 2019, p.40)

Mister se faz assinalar que o ato libidinoso deve ser praticado contra uma pessoa determinada e sem sua anuência. Conclui-se, portanto, que deve figurar como vítima uma pessoa específica, não abrangendo a coletividade. (NUCCI, 2019)

Trata-se de crime de forma livre, pois o tipo penal não delimitou quais atos estariam inseridos no termo “atos libidinosos”, desta forma, passou a tutelar todos os atos cuja finalidade seja a satisfação da lascívia.

Sobre os elementos constitutivos do tipo penal insta consignar a lição de Capez (2019, p. 109):

A ação nuclear está consubstancia pelo verbo “praticar”(executar, realizar), sem a sua anuência (concordância, consentimento, permissão), ato libidinoso (outras formas de realização do ato sexual, que não a conjunção carnal. Por exemplo, passar a mao nas partes íntimas, a masturbação direcionada ao sujeito ativo), com o objetivo de satisfazer a lascívia (desejo sexual) do próprio sujeito ativo ou de terceiro).

Neste diapasão, ressalta-se que crime se classifica como comum, tanto em relação ao sujeito ativo quanto ao sujeito passivo. Desta feita, poderá figurar nos polos passivo/ativo qualquer pessoa, independentemente do sexo ou orientação sexual. (NUCCI, 2019, p. 46)

O elemento subjetivo é o dolo, exigindo-se a finalidade específica de objetivar satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro. Inadmite-se a forma culposa.

A importunação sexual é um crime formal, ou seja, a intenção do agente é presumida de seu próprio ato, que independe do resultado. Consumar-se-á o delito no momento em que o agente pratica o ato lascivo. (MASSON, 2019, p. 41)

Salienta-se que o artigo 215-A, do Código Penal contempla uma norma expressamente subsidiária, tendo em vista que caracterizar-se-á somente se a conduta não constituir um crime mais grave. (MASSON, 2019, p. 42)

Acerca da subsidiariedade, Honig apud Toledo (1994 p. 51) leciona que ocorrerá quando diferentes normas protegem o mesmo bem jurídico em diferentes fases, etapas ou graus de agressão. Para tanto, o legislador pune a conduta da fase anterior, na condição de que o agente não incorra na punição da fase posterior de maneira mais grave.

Destarte, o delito de importunação sexual só será reconhecido caso a conduta não configure o delito de estupro, revestido de maior gravidade e punido de forma mais acentuada.

Em derradeiro, oportuno mencionar que o novel crime possibilitou o ajuizamento de revisões criminais, bem como proporcionou a aplicação de penalidade arrazoada, de acordo

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com a gravidade da conduta lesiva, sopesando a ofensividade e relevância do bem jurídico tutelado.

2.2.3 Revogação da Contravenção Penal de Importunação Ofensiva ao Pudor

Em decorrência da inserção da nova figura penal, a contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor (art. 61, LCP), restou revogada.

Neste ponto, a doutrina assente que não houve abolitio criminis, mas continuidade normativo-típica, uma vez que o conteúdo da norma revogada fora inserido no novo tipo penal - art. 215-A, do Código Penal. (JESUS, 2012, p. 118)

Sobre o princípio da continuidade normativo-típica, leciona Greco:

Pode ocorrer que determinado tipo penal incriminador seja expressamente revogado, mas seus elementos venham a migrar para outro tipo penal já existente, ou mesmo criado por nova lei. Nesses casos, embora aparentemente tenha havido uma abolição da figura típica, temos aquilo que se denomina de

continuidade normativo-típica. Não ocorrerá, portanto, a abolicio criminis,

mas, sim, a permanência da conduta anteriormente incriminada, só que constando de outro tipo penal. (2017, p. 164)

No mesmo sentido lecionam Gomes e Molina:

Não se pode nunca confundir a mera revogação formal de uma lei penal com a abolitio crimins. A revogação da lei anterior é necessária para o processo da abolitio criminis, porém, não suficiente. Além da revogação formal impõe-se verificar se o conteúdo normativo revogado não foi (ao mesmo tempo) preservado em (ou deslocado para) outro dispositivo legal. […] Logo, nessa hipótese, não se deu a abolitio criminis, porque houve uma continuidade normativo-típica (o tipo penal não desapareceu, apenas mudou de lugar). Para a abolitio criminis, como se vê, não basta a revogação da lei anterior, impõe-se impõe-sempre verificar impõe-se preimpõe-sente (ou não) a continuidade normativo-típica. (2009, p. 100)

Ressalta-se ainda que o novo dispositivo não será aplicado às situações fáticas pretéritas à sua edição e que se amoldavam ao tipo penal previsto na Lei das Contravenções Penais, haja vista que a nova lei é mais severa, sendo vedada em caráter absoluto a sua retroativade.

No mesmo sentido Toledo (1994, p. 31) enaltece que a “lei penal mais grave, lex. gravior, não se aplica aos fatos ocorridos antes de sua vigência, seja quando se insere uma nova figura penal ou quando se limita a agravar as consequências jurídico-penais do fato, havendo a vedação à retroatividade das normas mais severas de direito penal material”.

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2.2.4 Distinção entre o crime de estupro e importunação sexual

O estupro, tipificado no artigo 213 do Código Penal Brasileiro, é considerado crime hediondo, revestido de maior gravidade e sujeito à pena mínima de seis a dez anos, devendo, portanto, ser aplicado somente em casos mais invasivos e cometidos mediante o emprego de violência ou grave ameaça. (NUCCI, 2019, p. 34)

Em contrapartida, a importunação sexual é um tipo penal intermediário, classificado como crime de médio potencial ofensivo, e pune àquele que pratica ato libidinoso contra o ofendido sem a anuência deste. (MASSON, 2019, p. 40)

Em razão da subsidiariedade expressa no tipo penal, a importunação sexual somente será reconhecida se a conduta não caracterizar um delito mais grave, qual seja, o estupro.

Destarte, o crime de importunação sexual, estará caracterizado somente se o ato libidinoso diverso da conjunção carnal for cometido sem o emprego de violência ou grave ameaça, pois esta situação amolda-se ao tipo penal de estupro.

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3 A LEI PENAL NO TEMPO

A questão central do presente capítulo versa sobre os aspectos que permeiam a aplicação da lei penal no tempo. Neste panorama, tem-se como escopo compreender a (im)possibilidade da aplicação do artigo 215-A do Código Penal aos atos libidinosos diversos da conjunção carnal praticados anteriormente à vigência da Lei n. 13.718/18.

Com o intuito de elucidar o debate, serão comentados os princípios relacionados à problemática de sucessão de normas legais, e ainda enfocadas as seguintes hipóteses de conflitos de leis penais: novatio legis in pejus e novatio legis in mellius.

3.1 PRINCÍPIOS APLICÁVEIS

Os princípios visam orientar o legislador ordinário, bem como o aplicador do direito penal, no intuito de limitar o poder punitivo estatal mediante a imposição de garantias aos cidadãos. (MASSON, 2014, p. 26)

Imperioso destacar a doutrina Mello:

Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compeensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe ocnfee a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo. (220, p. 807 apud MASSON, 2014, p. 26).

Na mesma linha colige-se a lição de Espíndola:

A ideia de principio ou sua conceituação seja lá qual for o campo do saber que se tenha em mente, designa a estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por uma idéia mestra, por um pensamento-chave, por uma baliza normativa, donde todas as demais idéias, pensamentos ou normas derivam, se reconduzem e/ou se subordinam. (2006, p. 114)

Neste diapasão, insta salientar os princípios diretamente relacionados com a problemática de sucessão das leis penais.

3.1.1 Princípio da Estrita Legalidade ou Reserva Penal

Oriundo da expressão latina “nullum crimen, nulla poena sine praevia legen” o princípio da legalidade está insculpido no artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição da República Federativa do Brasil, em forma de cláusula pétrea, nos seguintes termos: “Não há

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crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”, como também no artigo 1º do Código Penal Brasileiro. (MASSON, 2014)

Na esfera penal, o princípio da legalidade importa em um meio de proteção contra a tirania e o exercício arbitrário dos detentores do poder, bem como assegura aos indivíduos o gozo de sua a liberdade, sem correr o risco de ser cerceada pelo Estado, salvo nas hipóteses estabelecidas em lei. (CAPEZ, 2017, p. 117)

Na mesma vertente, Toledo (1994, p. 21) assevera que o aludido princípio penal está relacionado à impossibilidade de fatos abstratos serem considerados crime sem previa definição e cominação legal. Logo, tanto a infração delitiva quanto a sanção devem estar previamente instituídas em lei.

Desse modo, o princípio em apreço serve como óbice à intervenção estatal nas liberdades individuais, razão pela qual está alocado na Carta Magna em conjunto com os demais direitos e garantias fundamentais.

Corroborando o exposto, Estefam (2018, p. 149 a) assevera que “a legalidade tem importância ímpar em matéria de segurança jurídica, pois salvaguarda os cidadãos contra punições criminais sem base em lei escrita, de conteúdo determinado e anterior à conduta”.

Nas palavras de Nucci, este princípio assume a seguinte definição:

Princípio da legalidade ou da reserva legal: trata-se do fixador do conteúdo das normas penais incriminadoras, ou seja, os tipos penais, mormente os incriminadores, somente podem ser criados através de lei em sentido estrito, emanada do Poder Legislativo, respeitado o processo previsto na Constituição (...). Encontra-se previsto no art. 5o, XXXIX, da CF, bem como no art. 1º do Código Penal (2017, p. 23)

Partindo de tais premissas, pode-se inferir que tudo o que não for expressamente vedado por lei será considerado lícito. Isto posto, somente haverá a caracterização do crime quando existir perfeita subsunção da conduta praticada à descrição prevista no tipo penal e nas hipóteses taxativamente previstas em lei.

À vista disso, o princípio em foco vincula o magistrado ao silogismo jurídico fato – valor – norma, afastando assim, qualquer possibilidade de interpretação do magistrado no momento da aplicação das leis, resguardando a segurança jurídica e evitando situações de arbitrariedade. (GOMES, p.7)

3.1.2 Anterioridade da lei

O princípio da anterioridade está alocado no artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal, que prevê que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem previa cominação legal”. (CAPEZ, 2017)

(32)

Assim, o princípio da anterioridade exsurge com o objetivo de reforçar o princípio da legalidade, vedando a existência de crime ou aplicação de pena, sem prévia determinação legal.

Neste sentido preconiza Estefam:

Dos aspectos acima indicados, destacamos em primeiro lugar a necessidade de que a lei seja anterior ao ato (lege praevia). Com efeito, de nada adiantaria assegurar que o direito penal se fundamenta na lei, caso esta pudesse ser elaborada ex post facto, isto é, depois do cometimento do fato. A incriminação de comportamentos anteriores à vigência da lei destrói por completo a segurança jurídica que se pretende adquirir com a legalidade. Por tal razão, não há legalidade sem a correlata anterioridade. (2018, p. 150 a)

Destarte, em virtude do princípio da anterioridade a lei penal, a lei somente surtirá efeitos a partir de comportamentos ocorridos na data de vigência, sendo que condutas praticadas anteriormente à vigência da lei não poderão ser atingidas, resguardando, assim, a segurança jurídica.

3.1.3 Irretroatividade

A sucessão de leis penais pressupõe uma sequência de normas penais e rege-se pelo princípio da irretroatividade, insculpido no artigo 2º do Código Penal dispõe que “ninguém será punido fato que a lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória”. (CAPEZ, 2017, p.62)

O aludido princípio também foi consagrado pela Carta Magna, no artigo 5º, inciso XL, segundo o qual, a lei penal só retroagirá para beneficiar o acusado.

Assim, o princípio da irretroatividade da lei penal serve como alicerce da garantia e segurança do ordenamento jurídico, pois sem este, não haveria condição preliminar de ordem e estabilidade nas relações sociais e tampouco de segurança dos direitos individuais. (PRADO, 2002, p. 161)

Por fim, oportuno mencionar que o princípio em apreço se estende a todas as normas de direito material, sejam normas incriminadoras, sejam normas reguladoras da imputabilidade, da dosimetria da pena, das causas de justificação, ou de outros institutos de direito penal. (TOLEDO, 1994, p. 32) Contudo, as normas de caráter processual e as medidas de segurança não se submetem ao princípio da retroatividade.

Deflui-se, portanto, que a regra geral predominante é a irretroatividade da lei penal, salvo quando a nova lei inserir, no caso concreto, algum benefício para o acusado, portanto, é vedado, em caráter absoluto, a retroatividade da norma mais severa.

(33)

3.1.4 Princípio Taxatividade

Em decorrência da necessidade de reserva legal, juntamente com o princípio da legalidade, o princípio da taxatividade dispõe que conduta perpetrada deve se subsumir perfeitamente ao tipo penal incriminador, sob pena de ilegalidade.

Sobre o princípio em análise extrai-se da doutrina:

Outra regra a ser seguida pelo princípio da legalidade é a taxatividade, esta aduz que a conduta proibida é descrita na lei por meio dos tipos. Tipo é o modelo de conduta, e os tipos incriminadores descrevem o modelo de conduta proibida. Além disso, o tipo deve descrever a conduta proibida de forma pormenorizada, sob pena de perder sua função, pois para que o cidadão conheça o espaço de sua liberdade é preciso que consiga compreender o que é ou não proibido. Se a lei não traz a descrição detalhada da conduta proibida, acaba perdendo a função de legalidade, caindo, portanto o cunho garantista do direito penal. Portanto, a taxatividade representa a legalidade orientando como as normas devem ser formuladas, como devem ser enunciadas. (CORREA, 2011)

Extrai-se, portanto, que sem o corolário da taxatividade, o princípio da legalidade não alcançaria seu objetivo, pois a lei deve ser dotada de clareza e certeza, ambas indispensáveis para que se possa mitigar o coeficiente de variabilidade subjetiva no momento da aplicação da norma. (ESTEFAM, 2018, p. 153 a)

Assim, é vedada a construção de tipos penais excessivamente genéricos, ou também denominados como tipos penais vagos, eis que a existência de lei penal vaga e indeterminada enseja tamanha insegurança jurídica e aniquila diversas garantias constitucionais. (ESTEFAM, 2018, p. 153 a)

3.2 CONFLITO DA LEI PENAL NO TEMPO

Primeiramente, mister destacar que a sucessão e aplicação da lei penal no tempo são regidas pelo princípio basilar denominado tempus regit actum, o que significa dizer que os fatos são regulados pela lei que estava em vigor quando ocorreram. (MASSON, 132, 2014)

O aludido princípio encontra-se insculpido no artigo 4º do Código Penal, segundo o qual, o tempo do crime será o da ação ou da omissão, mesmo que seu resultado ocorra em outro momento. (BRASIL, 1940)

Acerca do tema Greco leciona:

O momento da conduta, comissiva ou omissiva, será, portanto, o nosso marco inicial para todo tipo de raciocínio que se queira fazer em sede de extra-atividade da lei penal, bem como nas situações em que não houver sucessão de leis no tempo. A escolha de tal teoria determina, por exemplo, a aplicação, ou não, da lei penal em certas situações, ou a opção pela lei mais benigna dentre aquelas que se sucederam no tempo. (2017, p. 188)

Referências

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