Conto de Natal
Já um ano havia passado desde o último Natal. Timóteo estava em pulgas para que chegasse o deste ano. Menino com cara doce, uma tenra idade de 10 aninhos, pobre, usava roupas ou melhor, uns farrapos que haviam sido colocados em contentores de roupa e recuperados pelos seus pais.
Todos os anos, o Natal era diferente para Timóteo, mas igual aos demais para a sua família que nem tinha a possibilidade de dar àquele pequeno rapaz uma roupa nova, ou um carrinho, ou até mesmo um livro. Mas Timóteo adorava o Natal. Para ele não havia uma maior alegria do que a de reunir a família à volta da mesa, para se comer um frango assado. “Desejava um bacalhau como os meus amigos comem”- pensava ele enquanto estava à mesa, mas a felicidade que o envolvia durante aquela noite era tão imensa, o amor do menino à família era tão verdadeiro que aquele desejo passava a ser um simples contraponto no meio de uma enriquecedora alegria que mesmo que Timóteo não a admitisse, se conseguia ver nos seus olhos que brilhavam como o sol em dia de Verão.
Havia chegado o primeiro de dezembro e como já era costume era hora de montar o pinheirinho de Natal. Árvore que já passara da geração do seu querido avô para seu pai e que, mais tarde Timóteo queria herdar. Tinha um aspeto poeirento, cheirava a velho, como se fosse um objeto deixado ao abandono durante anos, sem que nunca ninguém lhe tocasse. Mas o contrário era difícil. Timóteo tinha-se mudado para um velho moinho deixado ao seu pai, pelo seu visa-avô. Aquando da sua chegada, ao único sítio onde a sua família poderia viver, estava tudo numa desarrumação. Dava-se um passo e…
estavam no Sarah no meio de uma tempestade de ventos, mas em vez de areia para os olhos, era o pó que ali se depositara durante tanto tempo que se levantava e só pousava passados alguns minutos.
- Papá, é hoje! É hoje, papá! Temos que montar o nosso pinheirinho de Natal. – disse o rapaz, correndo na direção de seu pai.
-Sim, Timóteo, já lá vamos. – respondeu o pai com um tom de pouca vontade.
De alguma forma esta altura fazia-o lembrar na difícil situação em que se
encontravam. Não é que ele não se lembrasse no resto do ano, mas era a altura do Natal e era mais um ano em que teria de oferecer um par de peúgas a Timóteo.
Mas aquele homem, pai babado, rendia-se à alegria do filho e fora montar a árvore de Natal. Uma vivência incrível. No meio de canções, sorrisos e abraços a família montava o pinheiro de uma forma tão especial, que nem um menino com todo o dinheiro e sem necessidades o conseguia fazer.
Tinham então terminado. Timóteo olhara aquele pinheiro artificial de uma forma tão doce, tão sentida, parecia tratar-se de uma objeto que lhe dizia tanto, um objeto tão especial que nunca se poderia ver livre dele.
Os dias iam passando, um atrás do outro e aquele pobre rapaz ficava cada vez mais ansioso com a chegada do Natal.
Chegara a última semana antes da ceia de dia vinte e quatro. Já nevava lá fora. Timóteo vivia aquele tempo com uma felicidade tremenda. Ele rebolava, ele sentava-se, ele fazia bolas de neve, bonecos de neve, anjos, tudo o que uma criança de 10 anos faz com a euforia da neve. Mas de repente, uma multidão avassaladora de crianças passou a correr na direção de uma loja.
- O que se passa?- perguntou Timóteo espantado- Esperem por mim! Digam- me o que se passa.
Mas nenhuma das crianças respondeu a Timóteo, elas nem para ele olharam, era como se fosse um simples objeto velho e sem sentimento que ali estava.
Mas ele decidiu ir atrás deles para saber do que se tratava realmente.
Era o lançamento de um novo boneco de ação. Depois de avistar aquela euforia por um simples boneco, deu uma volta e foi para a loja ao lado. Era a loja do velho alfaiate que já há mais de um ano que não tinha clientes.
Boquiaberto, muito solene, o rapaz olhou para a roupa mais barata que lá havia. Para ele a mais bonita da loja, por sinal. Foi inevitável. Uma lágrima fugira de dentro de si e escorreu pelo seu rosto. O alfaiate ao ver aquele menino, ficou comovido e foi ter com ele.
-Queres um lenço? – perguntou o velho alfaiate.
-Sim, obrigado- disse o rapaz, limpando imediatamente as lágrimas que lhe corriam pelo rosto.
-Queres falar do que se passa? –perguntou o alfaiate com a tentativa de ajudar.
Timóteo assentiu afirmando com a cabeça e o alfaiate levou-o para dentro, deu-lhe um cobertor e fez-lhe um chocolate quente.
- Conta-me lá o que se passou.
- Eu chamo-me Timóteo- começou ele- venho de uma família pobre, os meus pais não têm possibilidades para viver numa casa e tivemos que ir viver para um moinho. – e continuou durante umas horas a falar com o alfaiate, contando tudo, a sua história de vida, inclusive o quanto ele gostava do Natal.
Mas já se fazia tarde e Timóteo voltara para casa.
O alfaiate ficou sem saber o que pensar. Aquele menino era uma prova que nem a maior das riquezas vence aquilo em que se acredita.
Chegara finalmente o dia vinte e quatro de dezembro. Os raios de sol matinais começavam a entrar pela pequena janela do moinho e Timóteo acordara.
- É hoje, pai! É hoje, mãe! Vamos começar a preparar as coisas para a ceia de logo- disse ele acordando os seus pais e metendo-se no meio deles, no quente da cama.
-Bom dia, filho! – Responderam ainda com um ar sonolento os pais. – Gostamos tanto de ver-te assim, filho! E sim já vamos preparar tudo, deixa-nos preparar primeiro a nós. – Diziam eles rendidos à alegria do filho.
Foi um dia atribulado, cheio de alegria, com alguma tristeza por parte daqueles pais que não paravam de pensar na impossibilidade de dar uma prenda àquele rapaz.
A noite estava à vista. O cheiro ao habitual frango assado da mãe já estava a inquietar Timóteo. Lá andava ele pelo moinho, ora a jogar às cartas com o pai,
ora a jogar ao berlinde, ora a ler o único livro que lhe havia sido dado na escola.
- O jantar está pronto! – disse a mãe – Venham para a mesa – voltou a chamar.
- Estamos a ir mamã, estamos a ir. – respondeu Timóteo.
O frango estava deveras delicioso. “O melhor que já comi.” Pensou Timóteo.
Era verdade, aquele jantar havia sido o que a mãe preparara com mais carinho.
Já que não podia dar uma prenda a Timóteo, pelo menos podia oferecer-lhe um belo jantar.
A família lá ficou até perto da meia-noite. Ora falavam sobre as preocupações, ora contavam piadas, jogavam às cartas, haviam feito uma competição de berlindes, mas Timóteo estava exausto e era hora de ir para a cama.
No dia seguinte, Timóteo acordou com o pressentimento de que algo havia mudado. Ele vestiu o seu robe, foi à porta e quão foi o seu espanto ao ver um presente da parte de fora.
- Pais, acordem! Olhem o que aqui tenho, venham ver!
O presente tinha um pequeno bilhete: “Sei que gostaste muito desta roupa e não resisti em oferecer-ta. Espero que continues a ser o rapaz que és, porque nem sempre a riqueza nos traz a felicidade e tu és a prova viva disso. Com muito amor e carinho … O teu amigo alfaiate”. Tanto Timóteo como os seus pais não se contiveram e as lágrimas foram inevitáveis. Nunca antes alguém lhe tinha oferecido algum presente.
De repente, Timóteo vestiu-se e saiu a correr e só parara na loja do velho alfaiate.
- Está aí alguém? Amigo, abra-me a porta! – mas ninguém respondeu…
O velho alfaiate havia partido para perto de Deus, mas prometera ajudar aquele rapaz em tudo. O rapaz ficara de rastos ao saber, mas ao mesmo tempo feliz, pois tinha sido aquele velho alfaiate que lhe dera a maior alegria no Natal e estava-lhe eternamente grato.
Os anos foram passando, mas em todos os Natais, Timóteo lembrava-se daquele homem e acendia-lhe sempre uma vela. Já o homem rendia-se a olhar lá de cima para aquele rapaz que jamais esquecera.
Ricardo Silva - 9ºA