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REPRESENTAÇÃO SOCIAL DO ANALFABETO POR ALFABETIZADORES DE ADULTOS

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Academic year: 2018

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Ya ra G a rc ia Pa o le tti C unha

REPRESENTA Ç Ã O SO C IA L DO A NA LFA BETO PO R

A LFA BETIZA DO RES DE A DULTO S

MESTRADO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

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Ya ra G a rc ia Pa o le tti C unha

REPRESENTA Ç Ã O SO C IA L DO A NA LFA BETO PO R

A LFA BETIZA DO RES DE A DULTO S

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo , como exigência parcial à obtenção do título de Mestre em Psicologia da Educação, sob a orientação da Professora Doutora Vera Maria Nigro de Souza Placco

PUC / SP Sã o Pa ulo - 2005

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Banca Examinadora

_____________________

_____________________

_____________________

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A minha mã e Ma ria e se us muito s sa b e re s, a lia da de c isiva na s c o nq uista s do me u

c a minha r

A me us irmã o s, Flá vio e Ira c i, g ue rre iro s sile nc io so s,

ve nc e do re s de c a da dia

Ao Wa lte r, c o mp a nhe iro de vida , p e lo e xe mp lo de

de te rmina ç ã o , p e lo a p o io e inc e ntivo

A minha s filha s, Ele o no ra e

Isa b e lla , p o r me a lime nta re m de a fe to

(5)

A G RA DEC IM ENTO S

À querida orientadora , Professora Doutora Vera Maria Nigro de Souza Placco, pela dedicação e respeito, pela disponibilidade generosa de seus saberes, pela coerência como educadora,

À banca examinadora, Professora Doutora Clarilza Prado de Sousa e Professora Doutora Marialva Rossi Tavares, pelas oportunas sugestões e valiosas colaborações a este trabalho,

Aos professores e colegas do Programa de Psicologia da Educação, pelos ensinamentos, colaborações, e pelo crescimento que me propiciaram neste convívio,

Às secretárias do Programa, Helena e Irene, pelo apoio estrutural e pela disponibilidade,

Ao Professor José Bertuol pela possibilidade de acesso ao Conselho Comunitário de Educação, Cultura e Ação Social de Cotia, e aos seus monitores, pela participação genuína e transparente como sujeitos desta pesquisa,

À PUCSP, pela oportunidade de participar do quadro de pós-graduandos

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RESUMO

Tomando por sujeitos professores alfabetizadores de jovens e adultos de uma mesma ONG no município de Cotia, a presente pesquisa enfoca as representações que estes constroem a respeito do analfabeto, com quem se relacionam em situação de ensino-aprendizagem. Estes sujeitos passam, enquanto formadores, por processo formativo estruturado.

Em sua primeira parte, o trabalho apresenta um encadeamento histórico da educação de adultos no Brasil até o presente momento, onde a concepção de analfabeto se constrói remotamente associada a um sentimento de “vergonha nacional” (período Colonial , Primeira e Segunda Repúblicas), passando para uma concepção mais politizada até a idéia de “oprimido com vocação de Ser Mais” ( movimentos de educação de base/ Paulo Freire), em seguida ligando-se a uma concepção de alfabetismo esvaziado de senso crítico (MOBRAL), estando hoje caracterizado sob a ótica do analfabetismo funcional. É ressaltada a valorização do aspecto quantitativo dos programas de erradicação do analfabetismo.

Na segunda parte, apresenta a linha teórico-metodológica adotada, a teoria das representações sociais, que através da abordagem psicossociológica, demonstra como as teorias científicas vão sendo apropriadas nas relações intersubjetivas que compõe a rede social, produzindo outro tipo de teorias, as chamadas “de senso comum”, com fins de comunicação e de elaboração de comportamentos.

Com vistas a desvelar as concepções de analfabeto dos alfabetizadores de adultos atuantes em um mesmo espaço institucional, é utilizado o procedimento de análise de conteúdo, com categorias pós definidas, mediante a aplicação de questionários e evocação de palavras a partir do termo indutor “adulto analfabeto”.

A análise dos dados mostrou uma concepção de analfabeto composta pelos elementos centrais: “aquele que ignora, apresenta incapacidades, e não consegue ler o mundo” e pelos elementos periféricos: “ pela exclusão, falta de oportunidade e de iniciativa, possuindo bagagem e experiência”, apontando uma ancoragem em concepções de mundo e educação, em sua maioria, divergentes daquelas em que se fundamenta a formação desses educadores.

PALAVRAS-CHAVE: analfabeto, representações sociais, alfabetizadores de jovens e adultos, exclusão, formação

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ABSTRACT

This research has as main subject teachers who alphabetize youngsters and adults involved in a NGO located at the Cotia District and it is focused on representations that these teachers build regarding the illiterate, with whom they relate on a teaching-learning context. These teachers, to become instructors, complete a structured training program.

The first part of this dissertation presents a historical development of adult education in Brazil, up to today. The understanding of the illiterate is remotely associated to a feeling of “national shame” (encompassing the periods of Colony, First and Second Republics), continuing to a more political conception up to the notion of “oppressed with a vocation to Be More” (movement for basic education / Paulo Freire), next being linked to a conception of literacy that is empty of critic sense (MOBRAL), reaching what is today viewed as the functional illiteracy. It is highlighted the value given to the quantitative aspects of the programs to eliminate illiteracy.

The second part analyses the adopted theoretical and methodological approaches. They include the theory of social representations which, through a psychosociological approach, demonstrates how scientific theories are being incorporated in the intersubjectives relations comprised of social network. These in turn produce other types of theories, known as “of common sense”, used for communication and behavior construction.

Aiming at opening and reviewing the concepts of the illiterate by the teachers alphabetizers of adults who are working at the same institutional premises, procedures to analyze contents were used, with pre established categories,

together with the application of questionnaires and the use of words stemmed by the keyword “illiterate adult”.

Data analysis demonstrated that an illiterate concept made up by central elements such as: “the one who ignores, presents handicaps, and cannot read the world” and by peripheral elements such as: “by exclusion, lack of opportunity and initiative, possessing attributes and experience”, indicated a background of conceptions of world and education, to a great extent, divergent from those which are the basis for the training of these educators.

KEY-WORDS: illiterate, social representation, alphabetizers of youngsters and adults, exclusion, training.

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SUMÁRIO

Lista de Gráficos...8

Lista de Tabelas... 9

INTRODUÇÃO...10

JUSTIFICATIVA...11

1. CAMINHOS PERCORRIDOS...16

1.1 Caminhando pela História...16

1.2 No caminho da prática à pesquisa...26

2. O PROBLEMA...33

3. APORTE TEÓRICO...36

4. METODOLOGIA...43

4.1 Instrumentos de coleta de dados...44

4.2 Contextualização...47

4.2.1 A instituição...47

4.2.2 Caracterização da amostra...51

4.3 Análise dos dados...56

CONSIDERAÇÕES FINAIS...80

BIBLIOGRAFIA...85

ANEXOS...93

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Caracterização da amostra por Idade ...51

Gráfico 2 – Caracterização da amostra por Sexo...51

Gráfico 3 – Caracterização da amostra por Escolaridade...52

Gráfico 4 – Caracterização da amostra por Tempo com Monitor...52

Gráfico 5 – Caracterização da amostra por Experiência como Educador...53

Gráfico 6 – Caracterização da amostra por Outras Atividades Profissionais...53

Gráfico 7 – Caracterização da amostra por Residência...54

Gráfico 8 – Caracterização da amostra por Religião...54

Gráfico 9 – Caracterização da amostra por Experiência como Agente Comunitário...55

Gráfico 10 – Caracterização da amostra por Militância Política...55

(10)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Categorias molares e moleculares das Questões 1 e 2 ...57

Tabela 2 - Categorias molares e moleculares das Questões 3 e 4...61

Tabela 3 - Categorias molares e moleculares da Questão 5...64

Tabela 4– Categorias molares e moleculares dos Exemplos 1 e 2 ...67

Tabela 5- Categorias molares e moleculares das Palavras Evocadas...70

Tabela 6- Caracterização da amostra – Anexos ...96

Tabela 7– Categorização da Questão 1 – Anexos ...99

Tabela 8- Categorização da Questão 2 – Anexos...101

Tabela 9- Categorização da Questão 3 - Anexos...103

Tabela 10– Categorização da Questões 4 – Anexos...105

Tabela 11 – Categorização da Questão 5 – Anexos...107

Tabela 12- Categorização do Exemplo 1...109

Tabela 13 - Categorização do Exemplo 2...111

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INTRODUÇÃO

A erradicação do analfabetismo no Brasil configura-se hoje como necessidade prioritária pelo setor público, diante dos veementes dados estatísticos que apontam a numerosa população não alfabetizada do país, bem como a freqüente situação desta população nas faixas de exclusão social. Também vem chamando a atenção do setor privado, para o qual a qualificação da mão-de-obra - excludente da pessoa analfabeta - é um dos alicerces de sobrevivência, e no qual se observa o pouco, mas crescente, número de empresas exercendo a contemporânea e urgente responsabilidade social das organizações1, com olhos voltados ao analfabetismo.

O terceiro setor – organizações de caráter privado atuando na esfera pública – vem se ocupando cada vez mais da alfabetização de jovens e adultos.Tomam-na como ponto de partida de suas atividades, ou como necessidade decorrente da implementação de suas ações, em áreas como: saúde, formação profissional, emprego, preservação ambiental, inclusão e bem-estar social.

Considerada como atividade educacional compensatória - uma vez que vem tentar corrigir o desvio ocorrido na idade escolar, que obstaculizou de alguma forma a alfabetização desses, agora, jovens e adultos – a alfabetização de adultos

1Podemos visualizar como as empresas estão incorporando a idéia de responsabilidade social, pelo conceito

explicitado em artigo recentemente publicado em site do Conselho Regional de Administração do Rio de Janeiro:

Entende-se por responsabilidade social das empresas o exercício pleno da forma superior do capitalismo: respeito ao consumidor, ao trabalhador, ao fornecedor, ao distribuidor, ao investidor, à comunidade, ao meio ambiente, aos encargos fiscais e aos programas sociais.

VIEIRA, Wallace da S.- Balanço Social: uma resposta válida de participação comprometida com a sociedadede pertencimento, in http://www.cra-rj.org.br/bcases/art011.htm, 08/04/04.

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tem suas especificidades. Por destinar-se a um aprendiz cuja vida freqüentemente orbita em torno de responsabilidades familiares e atividades de sustento, pode configurar-se numa rara – única, por vezes - oportunidade de formação.

Como diz GARCIA (1999, p.11), a importância da formação, na sociedade atual, está intimamente ligada à democratização do acesso das pessoas à cultura, à informação e ao trabalho. E é nessa perspectiva que a alfabetização de adultos, tanto como processo, como por seus resultados, pode e deve ser instrumento emancipatório da pessoa que se encontra impedida a esse acesso.

BEZERRA (1992, p.27) constatou, em seu trabalho com alunos que chegavam analfabetos, que estes, principalmente pelo confronto a um sem número de preconceitos, eram condicionados a um caminho de negação de si e de sua história, passando a investir na construção de um outro perfil, mais aceito nos meios sociais aos quais intentavam pertencer. A autora entende a reconstrução cultural como desejável, mas não pelo veio da negação, e sim pelo resgate da cultura de origem, pela experiência da autoria, da criação, e da ampliação de possibilidades de expressão/comunicação.

Nesse sentido, o alfabetizador tem papel fundamental, pois é mediador nessa disposição à mudança do aprendiz, e também co-construtor da identidade deste - no caminho de abandonar o “casulo” do dado identitário “analfabeto”- levando-se em conta os múltiplos embricamentos sociais vividos em levando-seu processo de alfabetização. Lembrando CIAMPA (1987, p.127), cada indivíduo encarna as relações sociais, configurando uma identidade pessoal. Uma história de vida.

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Um projeto de vida. Uma vida-que-nem-sempre-é-vivida, no emaranhado das relações sociais.

Para além dos resultados mensuráveis, como adquirir habilidades para decifrar e compor textos escritos, operar códigos numéricos, é necessário fazer da ação de alfabetização uma possibilidade de inscrição social mais significativa do alfabetizando. É importante que a sala de alfabetização lhe seja um lócus de ressignificações pertinentes.

E, fundamentalmente, na relação intersubjetiva alfabetizador-alfabetizando, estarão sendo ativados aspectos cognitivos, afetivos, estéticos, valorativos e ético-políticos para essas ressignificações, com ou sem as devidas ciência e preparação desse formador, enquanto condutor de tal empreitada.

Nesse sentido, torna-se indispensável a atenção ao alfabetizador e seu processo de formação. Este processo deve – e freqüentemente não o faz – compreender tanto os conteúdos que se tenham por necessários ao desempenho da função de alfabetizador, quanto metodologias que evidenciem e sejam adequadas ao “como” ele aprende. Deve também ater-se às condições que ele tem, no espaço institucional em que atua, para integrar o que aprende a suas práticas cotidianas.

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JUSTIFICATIVA

Em sua pesquisa sobre o estado da arte em relação à Educação de Jovens e Adultos de 1986 a 1998, Sérgio Haddad faz um levantamento das dissertações de mestrado e teses de doutorado e livre-docência produzidas nesse período, tendo apontado entre suas conclusões: (HADDAD, 2002, p. 16)

- A ampla maioria dos estudos refere-se a práticas de alfabetização e escolarização de jovens e adultos, promovidas por organismos civis o pelo setor público, no ensino supletivo ou regular noturno, nos níveis fundamental ou médio. Somados os trabalhos que agrupamos nos temas Concepções e Práticas Pedagógicas, Aluno e Professor, teremos mais da metade (aproximadamente 55%) dos estudos analisados. (...)

- Esse adensamento quantitativo, porém, ainda não produziu resultados consistentes com relação à formulação de proposta para o desenvolvimento curricular ou de metodologias de ensino adequadas e eficazes.

- Embora ainda prevaleça um olhar homogeneizador dos educandos, vistos genericamente como ”alunos” ou “trabalhadores” , começam a aparecer estudos que tratam da construção de identidades singulares (geracionais, de gênero, étnicas, culturais) ou que abordam a dimensão da subjetividade dos educandos.

Por esta ótica, pode-se notar que a formulação de propostas curriculares e de metodologias de ensino adequadas e eficazes para a educação de jovens e adultos ainda carece de pesquisas que abordem a dimensão da subjetividade dos educandos2, que se fará presente neste trabalho, pelo contexto teórico-metodológico que lhe dá suporte.

2 É importante ressalvar que entendo por educando, não só o adulto ou jovem alfabetizando, como também o

alfabetizador em seu processo de formação.

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Na atividade do alfabetizador de jovens e adultos, a despeito de demandar investimento formativo específico e continuado, encontramos, hoje, uma realidade distante dessa proposta, como pode-se observar na amostragem significativa encontrada nos Coletivos de Autoformação do SAPÉ3, descrita por LEITÃO (2003, p.5):

O grupo do Rio reunia muitos educadores leigos ligados à alfabetização de jovens e adultos das mais diferentes associações da sociedade civil: vinculadas às igrejas católica e protestante; escolas particulares; associações de moradores; centros comunitários; projetos com trabalhadores da construção civil, etc. Experiências de frágil ou nenhuma institucionalidade, algumas se caracterizando por um trabalho voluntário, movidas apenas pelo intuito de participar e contribuir.

Esses alfabetizadores, em sua maioria, tinham aprendido o ofício fazendo e traziam muitas dúvidas e questões sobre sua atuação. Por não terem tido preparo mais específico, em alguns momentos, essa condição se refletia em sua auto-estima e na dificuldade de entendimento de alguns termos e linguagens próprias do campo da educação. No entanto, no levantamento de questões referentes à formação do educador, percebemos o quanto elas tinham de comum, independentemente de os educadores terem ou não formação inicial ou específica. Era convergente a sensação de despreparo para a prática alfabetizadora com adultos, mesmo entre aqueles educadores que tinham o curso normal ou curso universitário. De um lado, tínhamos o fato da formação inicial ser insuficiente na preparação do professor para o trabalho com jovens e adultos, e de outro, nos perguntávamos como investir na formação do enorme contingente de educadores leigos no país.

Essa descrição retrata grande parte da realidade formativa dos alfabetizadores de adultos, hoje. Permite a suposição de que o caráter emergencial atribuído à

3 Serviço de Apoio à Pesquisa com Educação – ONG que trabalha há 15 anos com formação de educadores de

jovens e adultos.

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erradicação do analfabetismo, justifica, no que concerne às ações voltadas à alfabetização de jovens e adultos, enfrentamentos improvisados ad eternum.

Com a possibilidade de fornecer subsídios para uma reflexão mais abrangente sobre os processos formativos desse segmento da educação, a pesquisa de representações sociais sobre o analfabeto, produzida por alfabetizadores de adultos, pode desvendar aspectos da construção da sua ação enquanto alfabetizador, uma vez que é para e com o adulto analfabeto que sua prática se constrói. Para tal, é importante ter-se em vista que uma das funções das RS é a

elaboração decomportamentos (MOSCOVICI, 1978 p.26).

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1. CAMINHOS PERCORRIDOS

1.1 Caminhando Pela História...

A educação de adultos teve início no Brasil com os Jesuítas, primeiramente dirigida à população indígena, numa intenção explícita de promover a sua aculturação dentro dos padrões ocidentais cristãos. Os Jesuítas continuaram sendo os principais educadores de adultos, nos anos que sucederam o descobrimento, quando Portugal mantinha uma política colonizadora que se fundava na catequese e instrução dos nativos.

No período do Império (1822-1889) e mesmo no começo do período Republicano (1889 a 1914), a educação de adultos ainda era parte difusa de um sistema educativo bastante incipiente. Era notória a influência dos modelos estrangeiros - a partir de uma certa “vergonha” de alguns membros da elite sócio-cultural brasileira pelo quadro de ignorância que configurava grande parte da população do país. Surge também, no período republicano, o interesse na abrangência de maior contingente da população pela educação, para que aumentasse o número de eleitores.

Segundo Paiva (1983), o censo de 1890 informou que a população analfabeta do país era de 82,63%, e o de 1900 apontou essa situação em aproximadamente 75% da população, excluindo-se os menores de cinco anos, causando novamente uma onda de vergonha na intelectualidade brasileira. Amiúde comparava-se a situação do Brasil com os Estados Unidos e, na América Latina, com Argentina e Uruguai.

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Assim que a República foi proclamada (1889), criou-se uma Secretaria de Negócios da Instrução Pública, Correios e Telégrafos, que foi fundida com o Ministério da Justiça, em 1891, demonstrando claramente que havia uma incerteza entre centralizar ou descentralizar o ensino no Brasil.

Até os meados da década de 20, foi muito forte no Brasil um movimento em favor da difusão quantitativa do ensino, mas, em dimensão geral, com poucas referências específicas à educação de adultos.

A partir desse período, instala-se um movimento de tecnização do ensino, com a inclusão dos conhecimentos da psicologia; fala-se em ciências da educação e em profissionais do ensino, os quais se propõem a praticar uma educação politicamente neutra.

No início da Segunda República (1930 a 1934), ainda se fazia notar a influência dos técnicos da educação. O analfabetismo é novamente enfocado como problema crucial da nação, e, com desígnios de erradicar essa vergonha do país, em fevereiro de 1932, funda-se a Cruzada Nacional de Educação, cujos principais colaboradores e integrantes pertenciam às Forças Armadas, e aos setores conservadores representantes da indústria e do comércio.

Em 1933, é fundada também a Bandeira Paulista de Alfabetização, com as mesmas finalidades.

A educação rural é prestigiada pelo governo, que a vê como forma de conter a migração. Nas cidades, é implementada a educação técnico-profissional, para fazer frente às demandas de qualificação dos trabalhadores. Fundam-se também

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associações para o desenvolvimento da educação rural, como a Sociedade dos Amigos de Alberto Torres, que organiza clubes agrícolas escolares e vai patrocinar, em 1935, o 1º Congresso Nacional de Ensino Regional, em Salvador.

Com o golpe de Estado, em 1937, essa preocupação foi mantida, surgindo novas associações, entre elas a Sociedade Brasileira de Educação Rural que além de propagar a educação rural, difundia o folclore regional e as artes rurais.

Nesse período, a ”neutralidade” dos técnicos da educação passou a ser posta em cheque, e a posição política dos educadores sinalizava seu prestígio. Os técnicos que apoiaram o novo regime foram os designados para por em prática sua política nacional de educação.

Ainda aqui, a educação de adultos se diluía dentro de programas educativos gerais.

Avaliando-se a experiência do Distrito Federal (1932-1935)4- na qual ficou evidenciado o aspecto politizador da educação, levando seus encabeçadores ao afastamento - e como resultado das discussões que foram geradas frente aos dados do censo de 1940 (que apontavam o analfabetismo de 55% da população com mais de 18 anos), desencadeou-se a diferenciação dos programas de educação de adultos, no fim do Estado Novo.

4 Implantação da Escoa Técnica Secundária, no Rio de Janeiro, encabeçada por Anísio Teixeira, educador

baiano, na tentativa de unificar os sistemas educacionais que funcionavam da seguinte forma: educação para o povo (educação para o trabalho) e educação para a elite (educação para a cultura). A projeção inicial que esta reforma no ensino deu a Anísio Teixeira, levou-o a ser eleito presidente da Associação Brasileira de Educação e também o expôs a críticas mais acirradas de representantes católicos, integralistas e do próprio governo federal. Diante da pressão antagônica que se formou, Anísio intentou estabelecer uma base político-partidária, que não teve força para manter sua linha educacional. Demitiu-se em dezembro de 1935.(CUNHA, 1999).

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Concomitante com o final da Segunda Guerra e a vitória dos “ideais democráticos”, bem como com a abertura política interna, com Getúlio Vargas retomando o processo eleitoral, a educação de massa aparece como instrumento de construção de uma sociedade democrática.

O campo da educação de adultos ganha independência e importância no final dos anos 40 e início dos anos 50.

Em sua obra, DI ROCCO (1979, p.42) destaca o ano de 1947 como demarcador de dois tipos de tratamento dispensados à educação de adultos: o que atendia a interesses regionais, e o que atendia a aspectos políticos e econômicos de amplitude nacional.

“Até 1947, as iniciativas para erradicar o analfabetismo responderam a interesses regionais, quer sob o patrocínio de entidades governamentais, quer mantidas por entidades particulares. O governo federal encabeçou o primeiro grande movimento em prol da educação de adultos, em 1947, quando questões políticas e econômicas permitiram o aparecimento da primeira campanha de erradicação do analfabetismo, através da portaria do Ministério da Educação nº 57, de 30/1/47, a qual criava no Departamento Nacional de Educação, o Serviço de Educação de Adultos.” (p. )

Foi lançada, em 1947, a entusiástica Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos - CEAA, a qual, sob a direção do professor Lourenço Filho, teve alcance pelo território nacional adentro, com a criação de escolas supletivas, mobilizando o professorado e o voluntariado. Essa Campanha durou até 1959, quando se iniciou sua incorporação ao Movimento Nacional contra o Analfabetismo, oficializado em 1962 e extinto em 1963.

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Mesmo com a continuidade da CEAA, em maio de 1952 foi regulamentada a Campanha Nacional de Educação Rural – CNER, com o objetivo de levar a educação de base ao meio rural.

De 1955 a 1959, “o sistema deu margem a que aspectos do dinamismo residente no interior das camadas populares viessem à tona” (BEZERRA, 1980, p.21).

Em 1958, foi criada a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo - CNEA, através da qual os educadores eram mobilizados em direção a novas soluções para o analfabetismo, uma vez que já se avaliava como ineficazes algumas campanhas anteriores, e propunha-se a realização de estudos experimentais para fundamentar a atuação pedagógica. A CNEA tinha dois focos: a educação popular de crianças e adultos, e a contribuição potencial ao desenvolvimento econômico-social. Foi extinta em 1963.

De 1959 a 1964, foi a fase eufórica do desenvolvimentismo, abrangendo o governo JK (1956-1961), Jânio Quadros (janeiro a agosto de 1961), e João Goulart (agosto de 1961- 1964). Deu-se o engajamento de setores das camadas médias no movimento popular, entre eles, a Igreja, as Universidades, e Partidos Políticos com atuação pseudopopular.

No início da década de 60, criou-se o MEB – Movimento de Educação de Base, com a participação de membros da Igreja, e os MCPs – Movimentos de Cultura Popular, que faziam parte de um projeto oriundo de grupos de profissionais liberais, com respaldo do governo (federal, estadual ou municipal).

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Entre 1962 e o início de 1964, tiveram lugar os Centros Populares de Cultura, em estreita relação com a UNE (União Nacional dos Estudantes), tendo como base de atuação o teatro de rua, e autônomos em seu funcionamento e em sua organização. As apresentações tinham a característica de responder imediatamente aos acontecimentos; eram portanto, um “teatro-jornal”, montado nos sindicatos, praças públicas ou universidades. Fundaram uma rede nacional de distribuição de arte e cultura, não se restringindo só ao teatro, mas ao cinema, literatura de cordel, exposições gráficas e fotográficas. Apenas no fim de 63, os CPCs da UNE voltaram-se também à alfabetização5.

Em 1962, Paulo Freire sistematizou seu método para educação de adultos, partindo de uma visão cristã de mundo acoplada ao pensamento isebiano6, tido, pelo próprio Freire, como “o resultado da identificação com o despertar da

consciência nacional” – FREIRE (1967, p.99). Seu método foi desenvolvido e

aplicado nos MCPs – Movimentos de Cultura Popular, originariamente em Recife (criado em maio de 1960), e, posteriormente, em Natal (1961).

Em Natal, foi lançada a Campanha “De pé no chão também se aprende a ler” e foram montados os Acampamentos (conjunto de 5 pavilhões com aproximadamente 240m2 cada, sendo 4 salas de aula e 1 pavilhão para

5 Cabe dizer que, como eram autônomos, alguns, como o CPC de Belo Horizonte, iniciaram

suas atividades de alfabetização antes desse ano, desenvolvendo inclusive seu próprio material didático.

6 Desenvolvido no Iseb - Instituto Superior de Estudos Brasileiros. Criado em 1955 por Café

Filho e implementado por Juscelino Kubitschek, o Iseb projetou-se como centro formulador de uma ideologia desenvolvimentista no país. Também sobressaiu enquanto matriz de uma concepção de cultura como elemento impulsionador de transformações socioeconômicas e de

fixação de identidades nacionais. – MORAES, Denis, Nelson Werneck Sodré, o Iseb e a

crise de 1964 – in Arquivo- Gramsci e o Brasil – http://www.gramsci.org/arquiv118.htm - 08/04/04

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recreação, 1 aviário e 1 horta por pavilhão, construídos em terrenos baldios, com cobertura de palha de coqueiro e piso de barro). A prefeitura, comprometida com os comitês dos bairros que elegeram o Prefeito, fazia uma gestão participativa, criando, em 1962, um Centro de Formação de Professores, para fazer frente às necessidades dos Acampamentos e à coordenação técnico-pedagógica da Campanha.

No governo militar iniciado em 1964 foi mantido apenas o MEB - por seu vínculo com a CNBB, mas com metodologia revisada. Foi apoiada a Cruzada ABC – de Ação Básica Cristã (fundada em 62), em parceria com a USAID, na qual a alfabetização era proposta como uma atividade instrucional, cuidando-se de evitar o caráter ético-político, atribuído à alfabetização pelo método Paulo Freire, e recuperando-se a visão do analfabetismo como “uma vergonha nacional”. A Cruzada do ABC teve oposição do Banco Central, por falta de probidade administrativa, e acabou sendo extinta.

Em 1967, foi criado o MOBRAL - Movimento Brasileiro de Alfabetização, fruto do trabalho realizado por um grupo interministerial, com o objetivo de “conduzir a pessoa humana a adquirir técnicas de leitura, escrita e cálculo como meio de integrá-la a sua comunidade, permitindo melhores condições de vida”.

A linha de atuação do MOBRAL foi aos poucos atendendo ao objetivo político de implantar uma campanha de massa, com controle doutrinário identificado com os valores do governo autoritário instalado no país.Teve uma possibilidade de organização autônoma em relação ao Ministério da Educação, com expressivo volume de recursos, e no bojo de sua execução, travou-se uma luta entre o enfoque cultural e o economicista da educação - pois, nos meios técnicos,

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já se instalara uma postura não-economicista – culminando, não obstante, com o distanciamento da preocupação pedagógica com o programa. Retorna a idéia de analfabetismo como “vergonha nacional”, expressada nas palavras do presidente militar Médici.

Como resultado, encontrou-se no MOBRAL uma linha metodológica e materiais

didáticos que reproduziram muitos procedimentos consagrados nas

experiências de inícios dos anos 60, mas esvaziando-os de todo sentido crítico e problematizador. (RIBEIRO, 2001, p.26).

Seguiam, paralelamente ao MOBRAL, pequenas experiências desenvolvendo ainda a proposta de Paulo Freire, por grupos vinculados a movimentos populares que se organizavam contra a ditadura. Essas experiências se ampliaram na década de 80, com o início da abertura política.

O MOBRAL foi extinto em 1985 e substituído pela Fundação EDUCAR, com a retomada civil do governo federal.

Em outubro de 1988, a nova Constituição trouxe em seu texto o reconhecimento do voto do analfabeto, o que pode ser entendido mais como uma acomodação à realidade sócio-educacional do país, do que propriamente uma certificação de cidadania à pessoa analfabeta.

Com Fernando Collor, eleito presidente em 1989, a atenção e energia do país foram voltadas para a estabilização da economia e para a modernização do estado, traduzidas pela abertura de mercado, privatizações e

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desregulamentações. Em nome desse enxugamento da máquina administrativa, já em 1990, foi extinta a fundação EDUCAR.

Definiam-se assim os contornos neoliberalistas que, mesmo diante das diferenças entre os atores sociais que encabeçaram a presidência, foram mantidos no governo Fernando Henrique Cardoso (1994 a 2002). Evidencia-se a descentralização como importante diretriz, principalmente nas áreas de saúde e educação.

Nesse período, apesar da educação ter sido sempre apontada como medida prioritária de desenvolvimento, os resultados do investimento público nessa área foram irrisórios7 em relação às expectativas, alimentadas até pelo fato de termos, então, um presidente professor. As ações em direção à alfabetização de adultos também foram descentralizadas e mais acentuadas nas iniciativas da sociedade civil organizada, como os movimentos populares, e as ONGs em geral.

Em 1997 foi criado o programa Alfabetização Solidária, pelo Conselho da Comunidade Solidária, contando com recursos do MEC, estaduais e municipais, e com doações. Mantém-se ativo até o presente, tendo por objetivo reduzir os altos índices de analfabetismo e ampliar a oferta pública de Educação de Jovens e Adultos no Brasil.

As Nações Unidas designaram a década 2003-2012 como a Década da Alfabetização, ampliando o conceito de alfabetismo para “a possibilidade de comunicação, de acesso à informação, de participação e de aprendizagem ao longo da vida”.

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O Censo de 2000 , realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), levantou no país 16.294.889 pessoas com 15 anos ou mais que não sabem ler nem escrever no Brasil. Segundo o mesmo IBGE, o analfabetismo registrou uma redução de 20,7%, em 1990, para 13,6%, em 2001. Um bom resultado, mas muito distante do que há por ser atingido.

O Brasil fica em segundo lugar no ranking da América do Sul, atrás apenas da Bolívia, com 16,3% de pessoas não alfabetizadas. Guiana (1,9%), Argentina (3,4%) e Uruguai (2,5%) apresentam as menores taxas de analfabetismo. Peru (11,2%), Equador (9,7%) e Venezuela (8,3%) são os países com os maiores índices, depois da Bolívia e do Brasil.

O atual governo federal, em 8 de setembro de 2003, lançou oficialmente o Programa Brasil Alfabetizado. A meta estabelecida pelo MEC era de alfabetizar, no prazo de seis meses, 2 milhões de jovens e adultos de 2003 a 2006, já tendo sido firmados convênios com entidades que, por R$15,00 mensais por aluno (em detrimento de cálculos anteriores que apontavam o custo de R$350,00 mensais por aluno) 8. Essa meta foi alterada com a reestruturação do Ministério da Educação pelo novo ministro Tarso Genro, para 1,6 milhões, bem como o prazo para os cursos passou de seis para oito meses.9 Também o repasse dos recursos passou a priorizar os Estados e Municípios, em detrimento das ONGs.

Mesmo assim, é importante atentar para o fato de ainda estar-se levando em conta prioritariamente o número de pessoas a serem atendidas pelos programas de alfabetização. E para além da quantidade, urge refletir sobre que qualidade, na educação de jovens e adultos, se quer investir e se investe hoje, no Brasil.

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1.2 No Caminho da Prática à Pesquisa...

Por meio das atividades que desenvolvo, desde 1995, junto à população desempregada, como psicóloga e gerente técnica da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho - SERT, do Governo do Estado de São Paulo, mais acentuadamente na Região Metropolitana Oeste da Grande São Paulo, tenho tido contato estreito com os programas governamentais de empregabilidade (em âmbito federal, estadual e municipal, uma vez que se realizam através de parcerias, nessas três esferas), como mediadora ou executora.

A população desempregada é, hoje, composta por jovens que pleiteiam seu primeiro emprego, por trabalhadores demitidos em função da economia recessiva que levou ao fechamento ou re-engenharia de grande número de empresas, ou pela evolução tecnológica, que no bojo de suas vantagens, torna os trabalhadores despreparados e desnecessários, quando atividades são executadas com mais eficácia pelas máquinas. É ainda engrossada por migrantes, que, em função também dos avanços tecnológicos, substituem a atividade rural por sub-atividades de sustento nas regiões metropolitanas. Compõe-na finalmente, pessoas que não correspondem às exigências globalizadas por perfis multi-instrumentalizados (ser generalista, falar outra língua, conhecer informática, etc.) e por níveis de escolaridade cada vez mais altos.

Está concentrada significativamente na região metropolitana de São Paulo, onde encontramos hoje, por volta de dois milhões de desempregados ou sub-empregados.10

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Numa linha de descentralização e partilhamento, o então Ministério do Trabalho – MTb (hoje, Ministério do Trabalho e Emprego- MTE), desde 1995, já contava com a parceria das Secretarias Estaduais de Trabalho e com a Sociedade Civil Organizada (Confederações Sindicais, Patronais, Sistema S – SENAI, SENAC, SENAT, SENAR, e ONGs), na tentativa de estruturar a educação profissional articulada a uma política de trabalho e renda no País11.

Nessa linha, que se estendeu até o término do governo passado (e parece ainda estar mantida neste atual governo), a educação profissional passou a se ampliar como foco de ação e investimento, por parte dos setores ligados ao trabalho e emprego, com certa estagnação de investimento pelos setores da educação em geral . Houve uma aplicação significativa do FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador - oriundo em grande parte do PIS-PASEP recolhido de todo trabalhador formal - nos Programas Nacional, Estaduais e Municipais de Qualificação, mobilizando diversas agências executoras, nos estados e municípios.

Quatro projetos de base identificavam o que o MTb chamou de avanço conceitual e metodológico:

- formação de formadores, em parceria com sindicatos, empresários e universidades

- modelos alternativos de educação profissional, procurando ampliar e dinamizar a visão de educação profissional

11 “Sistema público de emprego e educação profissional: implementação de uma política integrada” – Brasília:

MTb, SEFOR, 1996

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- rede de centros públicos de educação profissional, ampliando a clientela e se articulando mais estreitamente às demandas ocupacionais emergentes

- sistema de certificação ocupacional, recomendado pela OIT –

Organização Internacional do Trabalho, com base na experiência de outros países, e nas demandas, agora sem fronteiras, dos mercados globalizados.

Configuravam-se cada vez mais os contornos educativos das atividades atinentes à população desempregada, público a quem se destina hoje , prioritariamente, os serviços das Pastas “do Trabalho e Emprego”, em âmbito federal, estadual ou municipal .

Na esfera estadual, a SERT de São Paulo, paralelamente definia sua missão institucional como a inclusão pelo trabalho, e propunha ainda outros programas que alcançassem as populações sócio-economicamente excluídas:

- Frentes de Trabalho – bolsas de emprego emergenciais, com freqüência obrigatória a cursos de qualificação profissional;

- PAE - Programa de Auto-Emprego, fomentando a formação de cooperativas ou associações de produção ou serviços;

- Banco do Povo - microcrédito com acompanhamento técnico, para

viabilização de microempreendimentos;

- PADEF - Programa de Atendimento à Pessoa Portadora de Deficiência, para sua inclusão no mercado de trabalho;

- Ajuste – Preparação, por meio de seminários e vivências, para fazer frente ao mercado de trabalho, a empregados de empresas em processo de

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fechamento, utilizando formadores emergenciais (funcionários da empresa e membros dos sindicatos ligados à categoria);

- Time de Emprego – Grupos de apoio para candidatos a emprego sem experiência ou com mais de um ano sem conseguir ser empregado.

Neste percurso, participando da execução de todos esses programas, como psicóloga, gerente técnica ou compondo as Comissões Municipais de Emprego, pude observar acentuadamente a cadeia desemprego-analfabetismo. Mesmo com o claro propósito de assumir o caráter educacional das ações geradoras de emprego e renda, e de reverter, pelo trabalho, o processo de exclusão, os programas mencionados atendem precariamente os participantes não-alfabetizados. Estes, apesar de terem acesso aos programas, acabam sendo excluídos, principalmente do seus segmentos formativos, ao não estarem aptos a ler uma apostila, uma instrução, registrar pela escrita suas percepções e aprendizagens, executar exercícios, e ainda pela baixa auto-estima que acompanha freqüentemente a condição analfabeta.

Especificamente na atividade de intermediação de mão-de-obra, desenvolvida em PATs - Postos de Atendimento ao Trabalhador - o analfabetismo aparece como condição alijadora do trabalhador desempregado, uma vez que o aumento da oferta de mão-de-obra, frente à redução proporcional de postos de trabalho, praticamente exclui do mercado de trabalho a pessoa analfabeta, para o exercício de qualquer função.

Em Cotia, município cujo PAT dirijo atualmente, há, como rotina, uma relação recíproca com os núcleos de alfabetização da região: os candidatos a emprego não alfabetizados são aconselhados a procurarem os núcleos, e os alfabetizandos desempregados são aconselhados a procurarem o PAT.

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Especialmente nesta região, a maioria das ações de alfabetização de adultos foram desenvolvidas pelo terceiro setor, até 2002, quando a Prefeitura também passou a oferecer algumas salas de de alfabetização de jovens e adultos, no município.

Há entidades que, no desenvolvimento de atividades específicas de promoção social , formam classes de alfabetização, ou cedem espaço para que essa atividade se realize em suas dependências.

No segundo setor, encontramos algumas experiências pontuais de empresas, que ao invés de despedirem seus funcionários não alfabetizados, mantêm classes de alfabetização e horários compatibilizados para os mesmos, abrindo também o espaço para a clientela da comunidade circunvizinha.

Essa oferta de salas de alfabetização parece dar conta da demanda, em número de vagas oferecidas à população analfabeta do município, porém não garante a utilização desses recursos, pois a possibilidade de freqüentar uma sala de alfabetização fica restringida pelas múltiplas incumbências familiares (cuidar dos filhos ou pessoas dependentes, conciliar trabalho, atividades domésticas e estudo), indisponibilidade de horário (alguns não podem deixar suas atividades rentáveis para cumprir os horários das aulas) ou de recursos para transporte .

Na convivência com o trabalhador desempregado não alfabetizado, na escuta de suas dificuldades , certas inquietações foram, para mim, se configurando.

A primeira se refere ao real desconforto e falta de recurso inerente à condição de não-letrado, num sistema social em que parte significativa da comunicação entre

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as pessoas se dá pela linguagem escrita, sobretudo levando-se em conta as distâncias que as separam, bem como a socialização das informações, as possibilidades de expressão, os contratos, os registros.

Outra, em que constato a identificação de “analfabeto” como uma forma retroalimentar de sujeição e de escamoteamento de relações de poder: é muito freqüente que a pessoa não alfabetizada se demonstre envergonhada por não ser capaz de ler ou escrever, e ainda mais, incorpore perversa culpabilização pelas incapacidades que apresenta; deste modo, alimenta e reproduz seu estado de exclusão, ou seja, de possibilidade diminuída de participação e construção do seu próprio contexto social.

Uma terceira é verificar que, do ponto de vista institucional, nas ações de alfabetização de jovens e adultos, ainda é freqüente postergar-se a preocupação com a qualidade do processo de alfabetização, em relação à quantidade de alunos atendida.

Foi a partir dessas inquietações que decidi desenvolver minha pesquisa, e para sua viabilização, fui definindo alguns recortes.

O primeiro deles foi escolher a produção de representações sociais sobre o analfabeto, como ponto de partida a caminho da compreensão da prática de alfabetizar adultos, hoje.

O segundo, foi escolher como sujeitos, alfabetizadores não emergenciais, ou seja, aqueles que, mesmo voluntários, recebem alguma formação estruturada e continuada para a atividade de alfabetização de adultos. Entendendo formação

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como um processo contínuo, acredito ser ela responsável pelo diferencial na qualidade da ação alfabetizadora, em sua ampla possibilidade de instrumentalizar, resgatar cidadania e dignidade da pessoa analfabeta.

Um terceiro recorte se fez na escolha do grupo de alfabetizadores a ser pesquisado: escolhi o grupo de formadores do Conselho Comunitário de Educação, Cultura e Ação Social de Cotia, que passa por uma formação referenciada nas concepções de Paulo Freire e Emília Ferrero, cujo valor agregado pela pertença ao Conselho sustenta-se na apropriação de um projeto pedagógico pautado na prática dialógica e na reflexão sistemática.

Neste contexto, através do estudo das representações sociais produzidas por integrantes desse grupo, é possível entrever o que se pode chamar de “jogo de forças”, na construção das representações:

De um lado temos os conteúdos que circulam em nossa sociedade e, de outro, temos as forças decorrentes do próprio processo de interação social e as pressões para definir uma dada situação de forma a confirmar e manter identidades coletivas. O contexto, neste sentido é essencialmente “intertextual”. Ou seja, é a justaposição de dois textos: o texto sócio-histórico que remete às construções sociais que alimentam nossa subjetividade; e o texto- discurso, versões funcionais constituintes de nossas relações

sociais. (SPINK, 2002)

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2. O PROBLEMA

A caracterização do analfabeto passou por mudanças ao longo das últimas décadas, refletindo as mudanças sociais que ocorreram nesse período. A UNESCO12, que, em 1958, definia como alfabetizada “uma pessoa capaz de ler e escrever um enunciado simples, relacionado com sua vida diária”, em 1978, já indicava como apropriada a utilização dos conceitos de analfabetismo funcional e alfabetismo funcional, na sua esfera de atuação.

Segundo o INAF13, “é considerada alfabetizada funcional a pessoa capaz de utilizar a leitura e a escrita para fazer frente às demandas de seu contexto social e usar essas habilidades para continuar aprendendo e se desenvolvendo ao longo da vida.”

Para o IBGE, a categoria de analfabeto funcional é atribuída às pessoas com menos de quatro anos de escolaridade, isto é, que não cursaram além do equivalente à quarta série do ensino fundamental.

O INAF considera, na estruturação de seus dados, as categorias: “analfabeto absoluto” – não sabe ler e escrever; “pessoas em situação de analfabetismo

12 United Nations Educatinal Scientific and Cultural Organizatin – agência especializada da ONU (Organização

das Nações Unidas), com o objetivo de contribuir para a paz e a cultura universais, e em defesa da herança natural, histórica e cultural dos povos. Tem por atividades essenciais ajudar, apoiar e complementar esforços nacionais para eliminar o analfabetismo, ampliar a oferta de educação gratuita e encorajar o intercâmbio livre de idéias e conhecimentos entre os povos e nações.

13 Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional – Pesquisa anual produzida pelo Instituto Paulo Montenegro,

pela Ação Educativa e pelo IBOPE – Opinião, que apresenta um levantamento nacional sobre o alfabetismo de jovens e adultos no Brasil. Utiliza amostra nacional de 2000 pessoas, de 15 a 64 anos, definida pelo IBOPE. Tem por objetivo “ gerar informações que ajudem a dimensionar e compreender o problema (do analfabertismo), fomentem o debate público sobre ele e orientem a formulação de políticas educacionais e propostas

pedagógicas.” In 3 Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional – um diagnóstico para a inclusão social pela educação – Instituto Paulo Montenegro, Ação Educativa, IBOPE, emitido em 8 de setembro de 2003

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matemático” - que não dominam a codificação numérica, estando incapazes de ler o preço de um anúncio ou anotar um número de telefone; “ pessoas em situação de alfabetismo de “ nível 1”, “nível 2” ou “nível 3” – definidos por grau de complexidade das habilidades de leitura, escrita ; e “pessoas em situação de alfabetismo matemático de “nível 1”, “nível 2” ou “nível 3” – definidos por grau de complexidade no domínio das codificações numéricas , operações matemáticas e seu uso em contextos específicos: preços, horários, telefones, instrumentos de medida, etc.

No manual “Educação de Jovens e Adultos – proposta curricular para o 1º segmento do ensino fundamental” desenvolvido pela ONG “Ação Educativa” em parceria com o MEC (RIBEIRO, 2001, p.35), utilizado na formação dos alfabetizadores do Conselho Comunitário de Educação, Cultura e Ação Social - sujeitos desta pesquisa - encontramos referência ao público potencial dos programas de educação de jovens e adultos, como sendo “pessoas maiores de catorze anos que não completaram quatro anos de escolaridade”, bem como as “pessoas que dominam tão precariamente a leitura e a escrita, que ficam impedidas de utilizar eficazmente essas habilidades para continuar aprendendo, para acessar informações essenciais a uma inserção eficiente e autônoma em muitas das dimensões que caracterizam as sociedades contemporâneas”.

Além das caracterizações sobre o adulto analfabeto que têm sido explicitadas nas documentações dos programas desenvolvidos no Brasil, voltados à alfabetização de jovens e adultos, o termo “analfabeto” é também carregado de valores, estigmas e significações produzidas no amálgama social de que estes sujeitos fazem parte. Todos esses elementos poderão estar, de forma processada, presentes nas concepções dos sujeitos pesquisados, sobre o tema “analfabeto”.

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Escolhendo o referencial teórico-metodológico a Teoria das Representações Sociais, por permitir um desvelamento das produções do saber cotidiano compartilhado socialmente, que dá sentido às ações dos sujeitos, constituídos e constituintes do seu meio social, defini o problema central desta pesquisa da seguinte forma:

Quais as representações sociais de alfabetizadores de adultos, atuantes em um

mesmo espaço institucional, sobre o analfabeto?

O estudo dessas representações, de sua objetivação e ancoragem, poderá, num segundo momento, permitir a identificação de elementos constitutivos que podem estar presentes ou não nos conteúdos do processo de formação desses alfabetizadores.

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3. APORTE TEÓRICO

O campo de estudos sobre representações sociais fez-se inaugurado a partir da obra de Serge Moscovici, em 1961, La psychanalyse, son image et son public (MOSCOVICI, 1976), na qual ele apresenta sua pesquisa sobre como a psicanálise foi sendo socializada e apropriada pela população parisiense, transformando-se em saber do senso comum, com usos e funções sociais diferenciados. Neste trabalho, o autor introduziu o termo “representação social”, cunhado a partir das “representações coletivas”, descritas pelo sociólogo Durkheim14.

Atendendo ao mister que Durkheim delegou à Psicologia Social, de estudar “de que modo as representações se atraem e se excluem, se fundem umas com as outras ou se distinguem”, Moscovici vai se afastando da perspectiva sociologista extrema, construindo um espaço teórico-conceitual psicossociológico próprio, no qual as Representações Sociais são “tanto um conjunto de fenômenos, quanto o conceito que os engloba, e a teoria construída para explicá-los”. SÁ (1993, p.19).

Encontramos, em artigo de SPINK (1996), considerações sobre a constituição desse campo de estudos, desde a emergência da teoria das representações sociais no contexto da Psicologia Social, seu estatuto teórico, bem como o debate epistemológico na interface com a Filosofia da Ciência. Ela ressalta que existe atualmente uma crítica ao representacionismo, fundamentada na forma de conceber conhecimento que produz ou é produzido pelas antinomias entre sujeito e objeto, e entre o externo e o interno.

14DURKHEIM, E., apud MOSCOVICI, Serge.A Representação Social da Psicanálise,, p.25,São Paulo, Editora

Zahar, 1978

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No mesmo artigo, Spink refere-se à recusa de Moscovici em apresentar a noção nuclear de sua teoria, uma vez que, para ele, a definição (de representação social) deveria ser decorrência da acumulação de dados empíricos (p.174). Ela nos exemplifica, apontando quatro definições:

1. princípios geradores de tomadas de posições associadas às inserções específicas no conjunto das relações sociais e organizadores dos processos simbólicos que intervém em nossas relações sociais. WILLEM DOISE, 1986.

2. as representações sociais concernem do pensamento do cotidiano e o estoque de idéias que dá coerência às nossas crenças religiosas, idéias políticas e às conexões que criamos tão espontaneamente quanto respiramos. SERGE MOSCOVICI, 1988.

3. Uma forma de conhecimento socialmente elaborado e compartilhado, que tem objetivos práticos e contribui para a construção de uma realidade comum a um grupo social. DENISE JODELET, 1989.

4. formas de conhecimento peculiares à realidade social, que emergem na vida cotidiana no decorrer da comunicação interpessoal e tem por objetivo a compreensão e controle do ambiente físico-social. ANNAMARIA SILVANA DE ROSA, 1993.

cujo denominador comum, extraído por WAGNER (1996, p.175), é que esse tipo de conhecimento é um conjunto de crenças, imagens, metáforas e símbolos compartilhados coletivamente por um grupo, uma comunidade, sociedade ou cultura..”.

Sem pretender a formulação de um conceito definitivo de RS, mas atentando a esses aspectos comuns encontrados nas diversas definições apresentadas por

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seus teóricos, pode-se dizer que a representação social é uma modalidade de conhecimento de senso comum, que tem por função a elaboração de comportamentos e a comunicação entre as pessoas, produzida de forma compartilhada .

JODELET (2001, p.17), destaca a função “orientadora” das representações sociais quando afirma que

elas nos guiam no modo de nomear e definir conjuntamente os diferentes aspectos da realidade diária, no modo de interpretar esses aspectos, tomar decisões e, eventualmente, posicionar-se frente a eles de forma defensiva.

Para Moscovici, as representações sociais são dinâmicas, de natureza móvel e circulante, sendo um modo específico de conhecer e de comunicar aquilo que se conhece. (ANADON e MACHADO,2001, p.12)

BANCHS (2000) reportando-se ao processo de interação social e de intercâmbio verbal, como espaços de construção de representações, de produção de sentidos, compartilha da

concepção da realidade social como um processo contínuo de construção e não

como realidade construída que se nos impõe, ao estilo durkheimiano, (p.3)

e afirma que

conteúdo (das representações) e contexto são indissociáveis, pois produzem

influência bilateralmente (p.11),

na mesma linha em que REY (2003, p.126), ressalta o caráter de produto/produtor da realidade social das RS:

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Esses momentos de inteligibilidade que com freqüência são considerados como “verdades” inquestionáveis, no nível do sentido comum, são, em grande parte, responsáveis pela organização do tecido social de uma determinada época histórica, assim como pela institucionalização de certos espaços de comunicação. Nesse complexo processo da subjetividade social, pelo qual o mundo adquire sentido para os sujeitos que o vivem, as RS se integram em complexos processos, que têm aparecido por meio de diferentes categorias na literatura, como discurso, imaginário social, etc., todas as quais apontam para os processos humanos definidores da realidade social. De fato, todos esses conceitos, de uma forma ou outra, são dirigidos pela idéia de que a realidade social expressa uma ontologia diferente da realidade dessubjetivada.

As representações sociais se formam a partir de dois processos fundamentais: objetivação e ancoragem.

A objetivação consiste em dar a um esquema conceitual uma contrapartida concreta, uma imagem, uma forma específica ao conhecimento. É, segundo Jodelet , ir materializando a palavra15. No processo da objetivação, há duas operações essenciais: naturalizar, ou transportar os elementos objetivos para o meio cognitivo, e classificar, introduzindo uma ordem que se adapte à ordem pré existente, a fim de atenuar o choque do novo conceito.(MOSCOVICI, 1978, p.113). Segundo SÁ (1996, p.47), “a objetivação consiste em uma “operação imaginante e estruturante”, pela qual se dá forma – ou figura- específica ao conhecimento acerca do objeto.”

15 JODELET, D., apud SÁ, Celso P., IN SPINK, M.J.,

O Conhecimento no Cotidiano: as representações sociais na perspectiva da Psicologia Social, São Paulo: Ed. Brasiliense, 1993, p.39

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A ancoragem é o enraizamento, através da atribuição de valores, do novo conceito. De acordo com Jodelet, é a integração cognitiva do objeto

representado a um sistema de pensamento social pré-existente16. Para

Moscovici , ancorar é classificar e denominar (SÁ, 1996, p.46), e no processo de ancoragem, não existe neutralidade.

Os teóricos do Grupo Midi (Abric, Flament, Rouquette, Vergès, Moliner, Guimelli) desenvolveram a teoria do núcleo central, conceito do qual Abric é precursor , situando-o da seguinte forma:

Uma representação social é um sistema sócio-cognitivo que apresenta uma organização específica: ela se organiza em torno de e por um núcleo central – constituído de um número bem limitado de elementos – que lhe dá sua significação (função geradora) e determina as relações entre seus elementos constitutivos (função

organizadora). (ABRIC, 2003, P.59)

O núcleo central é um subconjunto das representações, e se constitui no elemento mais estável das mesmas, sendo, dessa forma, resistente a mudanças. No funcionamento das representações, ainda Flament demonstra o papel decisivo dos elementos periféricos - não-pertencentes ao núcleo central - que são atualizadores e contextualizadores da representação, e mais flexíveis e móveis que os elementos do núcleo central.( SÁ,1996 ) .É através do sistema periférico que a representação social pode se ancorar na realidade mais atual, nas características do contexto imediato em que se produz.

Abric aponta também a existência de uma “zona muda”, na expressão da representação social, que é constituída por elementos contra-normativos, ou

16 JODELET, D. apud SÁ, Celso P. .

Núcleo Central das Representações Sociais- Petrópolis, R.J.: Vozes, 1996, p.46

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seja, “não verbalizados pelo sujeito, nos métodos clássicos de coleta de dados”, pela crença de que “possam levar a uma má imagem dele próprio.”(ABRIC, 2003, p.61). Propõe a criação de instrumentos de coleta de dados que permitam que esses elementos não sejam mascarados nem escondidos, através da redução da pressão normativa.

Por seu potencial desvelador e explicativo, é crescente o interesse pela teoria das Representações Sociais como instrumento teórico e metodológico para o desenvolvimento do trabalho de pesquisadores das mais diversas áreas .

Na esfera da Educação, essas pesquisas têm proliferado, principalmente a partir do final da década de 80, mais acentuadamente nos anos 90 e nesse raiar do século 21. Na medida em que trazem à luz da investigação o contexto sócio-político que envolve os professores, os alunos, os pais, a constituição ideológica que efetivamente direciona suas ações e demandas, permitem o subsídio ao desenvolvimento de práticas educativas mais pertinentes à correção das desigualdades sociais que se reproduzem e até se acentuam no âmbito escolar.

Como mostra o estudo de SOUSA (2002), num levantamento das produções acadêmicas em Educação no Programa de Psicologia da Educação da PUCSP, e pesquisas avaliativas da Fundação Carlos Chagas, de 1983 a 2001, foram identificadas 37 pesquisas que se fundamentaram na teoria das Representações Sociais em contextos educacionais, para desvelar e analisar a constituição ideológica das Representações Sociais, suas construções a partir de experiências traumáticas ou em situações de exclusão, como subsídio para diagnóstico de sistemas e programas educacionais, com enfoque nas Representações Sociais produzidas e propagadas pela mídia, e ainda para pesquisar as possibilidades de construção e reconstrução de Representações Sociais.

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Dentre as muitas pesquisas em Educação que se utilizam desse referencial teórico-metodológico, podemos destacar a de RANGEL (1998), que, focalizando a formação reflexiva de professores, estuda RS dos mesmos sobre o “bom professor“ e o “bom aluno”; a de DUARTE (1998), entendendo a escola como espaço simbólico das RS, a partir de pesquisa realizada numa escola pública de Belém do Pará ; a de PAREDES (2001), que versa sobre as RS de professores universitários a respeito de sua atividade profissional ; a de GARCIA, R.(2002), analisando RS de professores sobre o projeto pedagógico; a de VARLOTTA (2002), que levanta o papel da escola na constituição das RS de alunos do ensino médio sobre ciência; a de SILVA, L.C.(2002), que oferece subsídios à ação preventiva do professor quanto ao uso/abuso de drogas, a partir do desvelamento das RS sobre drogas de jovens escolarizados; e a de PLACCO (2002), que nos apresenta pesquisa desenvolvida acerca das RS de jovens sobre a violência , com fins de subsidiar o trabalho de prevenção nas escolas.

Avaliando a produção de pesquisas em Educação, GILLY (1989, p.71-78 ) aponta que a representação social orienta a atenção sobre o papel de conjuntos

organizados de significações sociais no processo educativo. Entende as

representações sociais como resultado de situações contraditórias, de pressões, de uma situação complexa, e enumera diversos caminhos em que o estudo das mesmas pode contribuir para a compreensão das ações e interações na esfera educacional, bem como reitera cuidados para que não se olhe a representação social como panacéia universal, nem sejam cometidos equívocos em sua pesquisa.

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4. METODOLOGIA

A pesquisa das Representações Sociais coloca a necessidade de uma metodologia que dê conta tanto do delineamento de seu processo de construção e de sua estrutura, quanto evidencie seus conteúdos .

Neste trabalho processou-se a aplicação de um questionário com cinco questões abertas, duas situações-problema, e declaração de três palavras evocadas pelo termo indutor “analfabeto”. (anexo 1b)

A opção pelo questionário, enquanto técnica de associação de idéias, é corroborada na observação de SPINK (2002, p. 138), em sua proposta de um método de análise das representações sociais:

... os estudos que buscam entender as representações na perspectiva dos grupos, buscando aí tanto a diversidade quanto o que há de comum e compartilhado, têm utilizado formas de coleta de dados mais estruturadas, especialmente os questionários (auto-aplicativos ou utilizados como roteiro de entrevista) com perguntas abertas. A estrutura da representação social é, neste caso, fruto da somatória da análise de associação de idéias de várias perguntas.

Foram pesquisados vinte e oito sujeitos, reunidos por ocasião da supervisão pedagógica do Conselho Comunitário, com aplicação simultânea dos questionários.

Os questionários foram aplicados a todos os sujeitos simultaneamente, por um mesmo aplicador, mediante as instruções constantes no Anexo 1a.

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4.1 Instrumentos de coleta de dados

Cada questão ou item dos questionários aplicados tem um padrão e uma finalidade específica.

Os espaços deixados entre as questões são indicadores da “área” destinada à resposta solicitada, havendo um grau de liberdade, por conta das diferenças no tamanho das letras e do modo de escrita dos sujeitos.

A questão “Para você, analfabeto é...” tem a finalidade de captar a concepção de analfabeto do sujeito respondente, de forma direta, dando possibilidade de expressão aos seus elementos cognitivos, perceptuais, afetivos e valorativos.

As questões “Para outro professor , analfabeto é... ” e “Para outro professor, alfabetizado é... ”, visam atingir a “zona muda” a que se refere ABRIC (2003), uma vez que diminui a pressão normativa exercida sobre o sujeito, através da técnica de descontextualização normativa, que consiste em transferir o alvo da pesquisa a um grupo pesquisado próximo do sujeito, mas percebido como não partilhando dos mesmos valores (p.78).

A questão “Ser professor de adultos analfabetos é...”, tem a função de complementar as concepções de analfabeto, com os sentidos atribuídos à atividade de professor de adultos analfabetos pelos sujeitos pesquisados, podendo iluminar o processo de ancoragem da RS.

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As duas situações-problema incluídas no questionário, Exemplo 1 e Exemplo 2, se configuram como um cenário “ambíguo”, descrevendo um objeto desfocado, impreciso e geral, (ABRIC, 2003, p.72) possível de ser associado a vários objetos.Têm um potencial discriminativo, na medida em que levam o sujeito a escolher quais são os elementos que ele necessita para reconhecer um objeto de

representação e diferenciá-lo de outros objetos próximos (p.71). Oferecem

elementos como “assinar o nome”, “ser aprovado em entrevista”, “não conseguir ler o contrato”, “copiar palavras”, “resolver problema”, permitindo um refinamento do conceito de “analfabeto”.

Por aludirem , na sua instrução, à concepção de alfabetização do sujeito17, podem também induzi-lo à escolha de diferentes modalidades de foco na sua concepção de alfabetização , podendo, então, desvelar elementos do núcleo central e periférico da representação, e também da sua ancoragem.

As três palavras que vêm à mente quando o sujeito pensa em “analfabeto” (termo indutor), baseiam-se a Técnica de Evocação ou Associação Livre, que, segundo ABRIC (1996, p.115), por seu caráter espontâneo e projetivo permitem o acesso ao universo semântico do objeto pesquisado, bem como o levantamento de elementos implícitos ou latentes mais facilmente mascarados nas manifestações discursivas.

Quando da aplicação do questionário, foi apresentado também um inventário para caracterização dos sujeitos, pelo qual foram coletados dados sobre sua

17 A instrução, frente ao Exemplo 1 e Exemplo 2 , é: “Comentar, do ponto de vista da sua concepção de

alfabetização:”

(47)

idade, sexo, formação, residência, tempo de experiência como alfabetizador, outras experiências profissionais, religião e militância política .(Anexo 1c)

Nesse questionário para contextualização dos sujeitos, as questões que inventariam idade e sexo têm a finalidade de possibilitar correlações entre as respostas dos sujeitos com faixa etária e gênero.

Os dados de escolaridade têm a finalidade de levantar tanto o nível vertical de escolaridade (que, pelas condições de seleção do Conselho, só podem ser Médio ou Superior), como o tipo de formação. Podem indicar , como no caso de Magistério ou Pedagogia, o interesse pela atividade docente já na escolha da formação do sujeito.

A pesquisa do “Tempo como Monitor” visa situar a experiência do sujeito com a atividade, sua possibilidade de apropriação dos conteúdos formativos, bem como a consolidação do sentimento de pertença ao Conselho.

As questões “Experiência como educador” e “Experiência em outra atividade profissional” poderão levantar tanto dados de transporte de saberes da docência adquiridos em outra prática, como de outros saberes, para a prática da docência.

A “Experiência como agente comunitário” pode suscitar interesses e aptidões para atividades comunitárias e com pessoas, bem como posição ideológica, e ético-política dos sujeitos pesquisados.

A “Militância política” poderá informar sobre posições ideológicas, éticas e aspectos ligados à politização do sujeito.

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Tabela 5 – Categorias
Tabela 6 – Caracterização da Amostra
Tabela 7 - Categorização - Questão 1
Tabela 8 -Categorização - Questão 2
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Referências

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