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MESTRADO EM LINGÜÍSTICA APLICADA E ESTUDOS DA LINGUAGEM São Paulo 2007

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC – SP

Regiane Ibanhez Gimenes Berni

A construção da prática do professor de educação infantil:

um trabalho crítico-colaborativo

MESTRADO EM LINGÜÍSTICA APLICADA E

ESTUDOS DA LINGUAGEM

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC – SP

Regiane Ibanhez Gimenes Berni

A construção da prática do professor de educação infantil:

um trabalho crítico-colaborativo

MESTRADO EM LINGÜÍSTICA APLICADA E

ESTUDOS DA LINGUAGEM

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem, sob a orientação da Professora Doutora Mara Sophia Zanotto.

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Banca Examinadora

_______________________

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Dedicatória

Pela força sustentadora

A Deus, que na figura de Jesus Cristo de Nazaré guia cada um dos meus passos.

Pelo apoio

Ao meu marido Luís Carlos, à Martina e Antonio, meus pais, pois vocês são minha referência em todos os momentos.

Pela motivação

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Agradecimentos

Muito obrigada...

À Professora Doutora Mara Sophia Zanotto, minha orientadora, pois acreditou em mim, dando-me a oportunidade de fazer parte deste programa e assim compartilharmos conhecimentos e transformações.

À professora que participou da pesquisa, especialmente durante a coleta de dados e sessões reflexivas. Sem sua colaboração este trabalho não seria o mesmo.

À professora Doutora Mona Mohamad Hawi. Seu singelo bilhete me fez acreditar que era possível chegar até aqui.

Às professoras do LAEL e COGEAE que de alguma maneira me acompanharam, trazendo desafios a cada discussão e a dedicação de quem realmente acredita na educação. Em especial à Professora Doutora Maria Cecília Camargo Magalhães e à Professora Doutora Maria Otilia Guimarães Ninin, que em muitos momentos contribuíram além do que lhes era devido.

Aos funcionários do LAEL, em especial à Maria Lúcia e Márcia, pelos encaminhamentos e ajudas providenciais.

À Prefeitura Municipal de Mauá e à Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Mauá, pois colaboraram imensamente com a aprovação da licença parcial de estudo e licença prêmio nos momentos que eu mais precisei.

Aos colegas da Escola Municipal José Rezende da Silva, pelo apoio e incentivo dados.

Aos meus amigos, pela compreensão e carinho de irmãos que vocês têm comigo.

À CAPES, pelo apoio financeiro, que representou valorização e, assim, maior incentivo.

À professora Thânia Martinez, seu carinho e atenção foram motivadores.

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Resumo

Esta pesquisa objetivou investigar a prática pedagógica de uma professora de Educação Infantil em busca de criar possibilidades de transformação desta prática. A coerência entre a teoria e a prática, com base na reflexão crítica (Smyth, 1992), foi norteadora do trabalho.

O Projeto Político-Pedagógico foi instrumento inicial neste contexto, pois trouxe a abordagem teórica da instituição na qual se originou a pesquisa e deu suporte para a reflexão necessária ao processo de transformação da prática pedagógica (Magalhães, 2004 e Liberali, 2004).

Como parte importante do arcabouço teórico desta pesquisa, foi utilizada a operacionalização da reflexão crítica em quatro ações não hierárquicas (descrever, informar, confrontar e reconstruir) organizadas por Smyth (1992) com base nas contribuições de Freire (1970). Também foi considerada a importância do papel do outro e da linguagem na aprendizagem, amplamente discutidos nos estudos de Vygotsky (1930-1933, 1934) no quadro da teoria sócio-histórico-cultural; a partir daí, o conceito de mediação tornou-se central para examinar as interações envolvidas entre os participantes desse trabalho.

Estudos sobre a pergunta feitos com base em autores como Coracini (2002), Méndez (2002) e Mackay (2001) foram utilizados para se estabelecerem as categorias de análise e contribuirem nas discussões.

Iniciada no primeiro semestre de 2005 na rede pública de Educação Infantil da cidade de Mauá, São Paulo, esta pesquisa está inserida no quadro da pesquisa crítica de colaboração, pois conta com a contribuição dos envolvidos num processo de co-responsabilidade na condução do trabalho, como tratam Magalhães (1996) e Cole & Knowles (1993).

Participa da pesquisa, além da pesquisadora, uma professora como sujeito focal. Os dados foram coletados a partir de diários/registros, gravações em áudio e vídeo de aulas e reuniões de sessão reflexiva. A análise dos dados aprofundou-se a partir da base teórica considerada na busca de respostas às perguntas de pesquisa.

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Abstract

This research aimed to investigate the pedagogical practice of a pre-school teacher to criate possibilities of transformation of her practice. The consistency between the theory and the practice, based on critical reflection (Smyth, 1992), guided this work paper.

The Political Pedagogical Projectoccurred as an initial instrument in this context once it has the theoretic approach of the institution where the research started and it also gave support to reflection which is necessary to the pedagogical teaching transformation process (Magalhães, 2004 and Liberali, 2004).

As an important part of the theoretical framework of this research, it was used the operationalization of the critical reflection in four nonhierarchical actions (describing, informing, confronting and rebuilding) organized by Smyth (1992) through the use of the contributions from Freire (1970). It was also considered the importance of the role of ‘the other’ and the language in the learning process, widely discussed in the studies of Vygotsky (1930-1933, 1934), in the scenario of the socio-historic-cultural theory and since then, the concept of mediation became overriding to examine the interactions involved.

Studies about ‘the question’ based on authors like Coracini (2002), Méndez (2002) and Mackay (2001) were used to establish the categories of analysis and contribute in the corresponding discussions.

This research started in the first semester of 2005 in a public district pre-school in the city of Mauá, state of São Paulo, and operates in the scenario of critical research of collaboration once it counts on the contribution of the people involved in a process of joint responsibility to carry out the paper, as said by Magalhães (1996) and Cole & Knowles (1993).

Besides the researcher, another teacher took part in the process as a focal participant. The data was collected from diary studies, audio and video footage of the classes and meetings of reflexive session. The data analysis deepened according to the theoretical basis, taking into account the search for answers to the questions of the research.

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ÍNDICE

Introdução ………….………...………….…01

Capítulo 1:Teoria Sócio-histórico-cultural (TSHC) ………....……...08

1. 1. O sócio, o histórico e o cultural………...…09

1. 2. Método da práxis………...…... 15

1. 3. O conceito de mediação e suas implicações pedagógicas... 17

1. 4. A Zona Proximal de Desenvolvimento (ZPD)..……..……... 20

1. 5. Contrapondo a TSHC e o ensino como transmissão…………... 27

Capítulo 2: Implicações da teoria sócio-histórico-cultural para a prática...31

2. 1. Projeto Político-Pedagógico ...……….. 32

2. 2. Colaboração e Reflexão Crítica………..……….36

2. 2. 1. A colaboração e a ação do coordenador pedagógico……… 36

2. 2. 2. A reflexão crítica – para além da prática……….. 38

2. 3. As perguntas no fazer pedagógico...43

2. 3. 1. Retrospectiva de alguns estudos sobre “a pergunta”...43

2. 3. 2. Algumas tipologias de perguntas... ...52

Capítulo 3: Metodologia de pesquisa ………... 56

3. 1. A metodologia da pesquisa.…...56

3. 2. O contexto da pesquisa...……...…….……….….… 57

3. 3. Primeiros passos ...58

3. 3. 1. A construção coletiva do Projeto Político Pedagógico…….. 59

3. 3. 2. As oficinas de reflexão ………...….….... 61

3. 4. Os participantes da pesquisa...63

3. 4. 1. A pesquisadora...63

3. 4. 2. A professora participante...64

3. 5. Instrumentos geradores dos dados ………... 64

3. 6. A coleta de dados...66

3. 6. 1. Filmagens e gravações em áudio...66

3. 6. 2. A sessão reflexiva sobre sessão reflexiva: aprendendo no processo...66

3. 6. 3. Procedimentos de análise...68

3. 7. Categorias de análise...71

3. 7. 1. Categorias de análise: tipos de perguntas na interação professora-aluno...71

3. 7. 2. Categorias de análise: tipos de perguntas na interação coordenadora-professora...74

Capítulo 4: A análise e a discussão dos resultados ...………... 80

4. 1. Como se caracteriza a mediação nas ações da professora?...81

4. 1. 1. Sob a luz das teorias 1 ...82

4. 2. Como se caracteriza a mediação nas ações da coordenadora?...101

4. 2. 1. Sob a luz das teorias 2 ...101

Contribuições e considerações finais……..………...……...124

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Introdução

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, Muda-se o ser, muda-se a confiança; Todo o mundo é composto de mudança, Tomando sempre novas qualidades. (Luís de Camões)

Esta pesquisa teve como objetivo geral a investigação da prática pedagógica de uma professora de Educação Infantil, em busca de criar possibilidades de transformação de sua prática. O que se pretendeu foi trilhar caminhos para se alcançarem novas qualidades, como dito na epígrafe acima, pela certeza da possibilidade de mudança que se constrói pelas ações de uns com os outros, através do tempo.

Algumas escolhas foram determinadas em busca de se chegar ao objetivo, como: a focalização da coerência entre a teoria e a prática; a reflexão crítica (Smyth, 1992) como norteadora do trabalho nos momentos de discussão; a seleção dos tipos de perguntas feitas durante o exercício de reflexão; o cuidado com as questões políticas que influenciavam as ações docentes; a observação das características da mediação nas ações da professora com os alunos e da coordenadora com a professora; a colaboração enquanto metodologia de trabalho, entre a coordenadora e a professora.

Todos esses elementos foram necessários para que a pesquisa pudesse valorizar a formação da professora envolvida, de tal forma a considerar a importância de seu campo de trabalho, ou seja, a Educação Infantil. Atualmente é possível observar essa etapa escolar como uma grande conquista, pelos avanços obtidos através das mudanças nas legislações como será dito a seguir. Em consonância com as palavras de Camões, as mudanças ocorridas refletiram em qualidade, já que a concepção de criança como um adulto em miniatura, que deveria ser preparado na “pré-escola”, foi superada por uma concepção que vê a criança como um ser com peculiaridades.

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Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI).

A Constituição Federal de 1988 tem a preocupação de garantir o atendimento na Educação Infantil, bem como determina seu financiamento. Por isso, em 1990 foi sancionada a Lei 8.069, chamada de Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Essa lei contribuiu enormemente, pois detalhou, em mais de 260 artigos, deveres e direitos a serem respeitados e considerados em várias instâncias: sociais, culturais e governamentais. Os artigos 15 e 16, por exemplo, destacam o direito à liberdade, à dignidade e ao processo de desenvolvimento, pontuando “o brincar” nesse processo.

Também no ECA, o capítulo IV é exclusivo para tratar dos direitos à educação, cultura, esporte e lazer (art. 53-59), no qual observamos a preocupação com o atendimento à Educação Infantil como dever do Estado.

A LDB inova em trazer a creche e a pré-escola para compor o sistema de ensino, e nessa proposta a Educação Infantil passou a ser a primeira etapa da Educação Básica (art. 89).

Outra contribuição fundamental foi a determinação de que os professores deveriam ser habilitados em nível superior para atuar na Educação Básica, o que deveria ocorrer até o final da Década da Educação1 que se iniciou um ano após a publicação da lei. Sendo assim, a partir deste ano de 2007, somente graduados deverão ser admitidos para o trabalho na Educação Infantil.

Outro ponto a se destacar foi a consideração do pleno desenvolvimento e o preparo para o exercício da cidadania como princípios e fins da educação nacional (art. 2º).

Ainda ficou garantida, como dever do Estado, a gratuidade no atendimento na Educação Infantil (art. 4º, IV), ficando a oferta desse atendimento sob responsabilidade dos municípios (art. 11, V).

A LDB ainda destina a Seção II exclusivamente para tratar da Educação Infantil nos artigos 29, 30 e 31. Neles destaca-se a finalidade do desenvolvimento integral da criança, bem como uma avaliação de acompanhamento e registro desse desenvolvimento.

1 A Década da Educação refere-se ao período de 1997 até 2006, como período de transição para que a

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A partir do artigo 9º, no qual se determina o estabelecimento de competências e diretrizes para a Educação Infantil, a fim de nortear currículos e seus conteúdos mínimos, é que em 1998 o Ministério da Educação e do Desporto (MEC) propôs o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI).

Esse documento, organizado em três volumes, traz reflexões e fundamenta concepções atreladas à Educação Infantil, bem como estabelece objetivos gerais, além de tratar sobre a formação pessoal e social, abordando a identidade e a autonomia da criança. O RCNEI ainda contém documentos referentes ao que é chamado de conhecimento do Mundo, tratando das diferentes linguagens: “Movimento, Música, Artes Visuais, Linguagem Oral e Escrita, Natureza e Sociedade e Matemática”.

De caráter instrumental e didático, o Referencial é um guia de orientação e foi feito para uma contribuição ao ato de planejar, desenvolver e avaliar as práticas educativas. O objetivo é que se respeite a pluralidade e diversidade étnica, religiosa, de gênero, social e cultural das crianças brasileiras. Há uma preocupação com a criação de propostas educativas que possam ser favoráveis às diferentes demandas de crianças e de seus familiares em todo o território brasileiro.

Apesar das leis e de seus inegáveis avanços, esta pesquisa foi motivada inicialmente por observações do trabalho dos professores de Educação Infantil com os quais eu trabalhava enquanto coordenadora. Parecia haver um consenso do pensar essa forma de ver a criança e seu desenvolvimento. No entanto, na prática pedagógica surgiam muitas arbitrariedades relacionadas a este “novo” (historicamente falando) paradigma de educação.

O discurso normalmente destoava das ações. Havia uma apropriação de um discurso considerado bem visto e atual, mas a prática não o refletia integralmente. É nesse ponto que parecia estar o problema, pois a qualidade do trabalho pedagógico suscitava algumas dúvidas.

A esse respeito, Cunha (2005) pondera que as mudanças surgem das tensões entre o novo e o velho e, a partir de suas colocações, podemos concluir que conflitos são inerentes a todo processo de inovações.

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por tanto tempo permearam a educação. A citação abaixo exemplifica seu posicionamento:

(...) Na tradição positivista, a primazia do contexto de justificação sobre o contexto de descoberta forçou a investigação e a intervenção prática a ajustarem-se aos padrões que validam a priori o conhecimento científico ou as suas aplicações tecnológicas. No campo das ciências em geral, e da educação em particular, esta estratégia conduz à leitura deformada da realidade.

Gitlin (2005:15), focando as influências das políticas cotidianas, faz as seguintes afirmações:

(...) as políticas cotidianas modelam como nós vemos as pessoas, nossos relacionamentos com aqueles que são diferentes de nós mesmos, e as conclusões que tiramos sobre estes relacionamentos.

(...) as políticas cotidianas não somente influenciam os que recebem as perspectivas dominantes encontradas em muitas abordagens do conhecimento, mas também os produtores ou arquitetos deste conhecimento. (minha tradução)2

Como as políticas cotidianas são, em geral, não conscientes, no campo educacional, nem sempre entendemos, ou temos consciência, de quais visões de educando e aprendizagens estão implícitas em nossas ações educativas, bem como os princípios, propósitos e finalidades dessas ações.

Compreender-se como sujeito histórico de sua cultura, como produto e produtor da mesma é condição básica para enxergar a importância de cada educador investir em sua formação contínua. Este contexto social de reprodução de valores em prol de interesses hegemônicos nos revela a importância do fazer pedagógico não servir a uma reprodução passiva, já que a escola sempre estará reproduzindo algo (é inerente a seu papel), mas uma reprodução que também possa ser transformadora, a partir de objetivos claros de servir a uma educação legitimamente crítica.

Precisamos ter educadores críticos e para isso uma nova cultura de formação deve começar a ser inerente ao cotidiano pedagógico. Neste processo, o Projeto

2

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Político-Pedagógico deve se constituir efetivamente como instrumento de construção de sentidos, já que tal projeto representa a organização pedagógica da unidade escolar através dos objetivos, metas, caracterizações de seus usuários, calendário, fundamentação teórica, projetos de trabalho para cada turma e outros itens que possam ser úteis à base de planejamento da unidade escolar. Importantíssimo ressaltar que este documento deve ser revisado anualmente pelo grupo de trabalho, com o intuito de ser apropriado como produção daquele grupo.

Parece que não estamos diante apenas de questões de formação. Muito já se pesquisou sobre a formação de professores, muitos caminhos já foram apontados e ainda há arbitrariedades no reflexo desse vasto conhecimento advindo da pesquisa nas práticas escolares. Como discute Magalhães (2004), é mesmo muito complexo o quadro que está por trás desta inconsistência da práxis, bem como é complexo o contexto de trabalho do professor. Na seguinte citação a autora explicita bem a questão:

... Todavia os questionamentos das significações e dos papéis tradicionalmente atribuídos a esse profissional, e da ênfase dada em sua formação, bem como a introdução de novas teorias que se propunham a discutir as escolas como agentes de transformação de uma sociedade desigual e injusta e o professor como um educador reflexivo e pesquisador de sua própria ação não atingiram, de fato, seus objetivos. No Brasil, essa questão é particularmente observada quanto às escolas da rede oficial de ensino.

As razões para isso apontam para um quadro complexo que inclui questões de responsabilização na relação entre construir e aplicar conhecimentos... (Magalhães, 2004: 59-60)

Será necessário desvendar a cada educador os próprios valores que embasam práticas tão diferentemente justificadas, em prol das mesmas teorias e concepções. Durante o trabalho de construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico do ano de 2005 na unidade escolar que eu coordenava, por exemplo, não tivemos nenhuma discordância em relação à abordagem. Foi unânime esse olhar contemporâneo sobre a Educação Infantil, bem como a determinação da linha teórica sócio-histórico-cultural

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como a mais coerente nesse contexto. Apesar do documento sintetizar as representações que o grupo tem sobre os prescritos que fundamentam a Educação Infantil brasileira atualmente (LDB, ECA, RCNEI), ainda assim se reproduzia o discurso em meio a uma prática contraditória.

Por isso, de maneira mais específica, o objetivo desta pesquisa está voltado à criação de possibilidades de uma práxis coerente com a fundamentação teórica a partir de uma ótica sócio-histórico-cultural. Para tanto, será necessário entender como o trabalho de coordenadora pedagógica, no contexto da Educação Infantil, pode propiciar a tomada de consciência da professora participante, de tal forma a termos essa visão refletida nas práticas cotidianas das vivências escolares. Como decorrência, há uma preocupação em se valorizar o trabalho colaborativo, que não é a idéia limitada de ajuda, pois a colaboração pressupõe negociação de sentidos e muitas vezes há conflitos, já que é necessário compartilhar representações e posicionamentos de poder, como tratam Magalhães (2004) e Liberali (2004).

Foram consideradas nesse trabalho as contribuições teóricas de pesquisas que discutem, de alguma forma, a formação de professores como, por exemplo, Almeida (2004), Cunha (2005), Kincheloe (1993), Liberali (2004, 2002, 1998, 1996), Magalhães (2006, 2004, 2002, 1998, 1996, 1994), Magalhães & Celani (2005), Magalhães, Liberali & Lessa (2006), Ninin (2002), Pérez Gómez (1992), Pollard (2002), Schön (1992), Smyth (1992). Nesse campo de contribuições também foram considerados os conhecimentos sobre a questão da história da vida de cada um, do relacionamento afetivo envolvido, das oportunidades de reflexão crítica e seus benefícios para a formação.

Sendo assim, a questão geral que se apresenta é:

Como as interações professora-coordenadora oferecem possibilidades de transformação das práticas da professora?

Para responder a essa pergunta, se fez necessário delimitar questões mais específicas a partir da observação da prática pedagógica e das sessões reflexivas:

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Na busca dos objetivos citados, a organização deste trabalho foi feita em cinco partes. No Capítulo I encontra-se parte do arcabouço teórico que fundamenta esta pesquisa, no qual apresentamos a teoria sócio-histórico-cultural, destacando o método da práxis, a mediação e a zona proximal de desenvolvimento como conceitos que contribuem quando se busca coerência com tal proposta teórica. Ainda nesse capítulo é feita uma breve discussão contrapondo a teoria citada e a teoria que sustenta o ensino como transmissão, isso porque foram observadas nos dados ações que tendiam entre esses dois paradigmas.

No capítulo II, optamos por concentrar as demais contribuições teóricas que nos ajudaram, na busca pela coerência teórico-prática, no fazer pedagógico. Por isso discutimos sobre o Projeto Político-Pedagógico, a colaboração e a ação do coordenador pedagógico, a reflexão crítica e questões relacionadas a “perguntas”.

A metodologia de pesquisa foi desenvolvida no Capítulo III, trazendo o contexto da pesquisa, seus participantes, bem como os instrumentos geradores dos dados e os procedimentos e descrição da análise.

A discussão dos resultados da análise foi feita no Capítulo IV, a partir das próprias perguntas de pesquisa, que subdividiram o capítulo em duas partes. Em cada uma delas apresentamos uma discussão pautada na fundamentação teórica apresentada nos dois primeiros capítulos e depois uma organização das categorias de perguntas encontradas nos dados, como uma forma de organizar as categorias de análise encontradas, para melhor compreensão do leitor.

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CAPÍTULO 1

Teoria Sócio-histórico-cultural (TSHC)

Precisamos nos esforçar para aperfeiçoar o nosso pensar, de modo a substituir as nossas percepções inadequadas e confusas (que, de acordo com Espinosa, se devem à “imaginação ou opinião”) por noções mais adequadas da realidade... O avanço do conhecimento consiste na constante substituição de nossas percepções confusas e inadequadas por idéias adequadas, até que, no limite, tudo o que pensarmos provirá de uma idéia adequada da essência de Deus. (Scruton, 2000)

A epígrafe, que parece traduzir o objetivo de todo trabalho de pesquisa, ou seja, um esforço pelo aperfeiçoamento foi aqui citada, pois é no capítulo teórico que damos um passo fundamental ao nosso aperfeiçoamento ao buscarmos em outros pesquisadores a ajuda para nossa organização, para apoiarmos nosso trabalho e resolvermos algumas de nossas “confusões”. Parece fundamental o reconhecimento da necessidade que temos do “outro” para avançarmos.

Assim, este capítulo objetiva trazer parte da fundamentação teórica desta pesquisa, que foi organizada em cinco seções. Na primeira é discutida a teoria sócio-histórico-cultural (TSHC), inicialmente focalizada por embasar o olhar da pesquisadora, ou seja, os princípios e as ações através dos vários conceitos relacionados a essa teoria, no tocante ao aprendizado e desenvolvimento humanos.

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Holzman (1993), Daniels (2003), Duarte (2001), Rego (1995), Magalhães (1996) e Schneuwly (1994).

Na seção 5, contando com a colaboração de Milhollan & Florisha (1978) principalmente, há uma comparação entre a teoria apresentada (TSHC) e o ensino como transmissão encontrado em teorias ditas tradicionais como o behaviorismo, pois nos dados são observados conflitos entre essas teorias nas ações da professora. Sendo assim, serão importantes para localizarmos historicamente as influências que ainda pairam sobre as ações pedagógicas.

1. 1. O social, o histórico e o cultural

Como três facetas de um mesmo diamante, esta teoria nos desafia a ter uma abordagem sustentada nas seguintes dimensões:

Social: é fundamental para marcar a questão das relações humanas;

Histórica: faz-nos pensar em como chegamos até aqui, os diversos momentos e épocas que marcaram a humanidade. Relaciona-se às influências do tempo sobre o ser humano;

Cultural: importante para vermos e valorizarmos toda a produção humana em diferentes contextos. Aqui consideramos as influências humanas sobre a temporalidade.

Wertsch et al. (1995:11, apud Daniels, 2003: 105) sintetizam da seguinte forma essa questão:

O objetivo de uma abordagem sociocultural é explicar as relações entre a ação humana, de um lado, e as situações culturais, institucionais e históricas em que essa ocorre, de outro.

Wertsch (1998: 3) ainda esclarece que: “ A tarefa da análise sócio-cultural é entender como a função mental está relacionada com os contextos cultural, institucional e histórico”3.

3 The task of sociocultural analysis is to understand how mental functioning is related to cultural,

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A TSHC, segundo Rego (1995: 93), desenhou-se pela teoria de Vygotsky, por ele ter teorizado uma psicologia a partir do materialismo histórico-dialético de Marx. Isto significa que será na apropriação da experiência histórica e cultural que se dará o processo de desenvolvimento do homem porque “... organismo e meio exercem influência recíproca; portanto, o biológico e o social não estão dissociados. Nesta perspectiva, a premissa é de que o homem constitui-se como tal através de suas interações sociais; portanto, é visto como alguém que transforma e é transformado nas relações produzidas em uma determinada cultura”.

Parece haver uma variedade de termos usados para a mesma abordagem teórica de Vygotsky. Wertsch, na citação acima, usa o termo “sócio-cultural” enquanto Rego (1995) diversifica em sua obra o uso de termos como perspectiva “histórico-cultural”, “sócio-histórica” e abordagem “sócio-interacionista”. Em Daniels (2003) encontramos referência a uma “abordagem cultural-histórica” ao falar do legado vygotskyano; contudo, nesta pesquisa houve a opção pelo termo “sócio-histórico-cultural”, como denominada por Magalhães (1996).

Esta opção justifica-se pela compreensão de que cada um dos termos do conceito tem sua especificidade e ao serem destacados fortalecem a idéia de que há nesta teoria a preocupação com o contexto de vida em que estamos, ou seja, com o momento vivido, não só com o momento em si, mas como chegamos até ele, considerando tudo o que aconteceu anteriormente e que de alguma forma levou a uma dada constituição política, econômica e cultural. A teoria sócio-histórico-cultural aponta para a importância de uma compreensão profunda do mundo em que estamos, como ele se constituiu, onde as relações humanas e a produção cultural são fundamentais, porque é nessas relações, dentro de um determinado contexto, que o ser humano se constrói.

Algumas considerações são agora apresentadas para esclarecer o contexto de produção intelectual de Vygotsky e as influências que marcaram a construção de uma inovadora concepção para sua época que, de acordo com Rego (1995), trouxe uma maneira diferente de entender a origem e a evolução do psiquismo humano e as relações do homem em sociedade.

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vida curta (1896 – 1934) em virtude da tuberculose e por isso suas produções concentraram-se entre a 2ª e 3ª década do século XX. Porém, elas só foram conhecidas no Ocidente, passando a fazer parte da corrente principal da psicologia, a partir da década de 70, porque o stalinismo suprimiu sua psicologia revolucionária.

Como suas obras chegaram aos Estados Unidos durante a guerra fria, as traduções foram “limpas” das questões marxistas e por isso ele foi ser equivocadamente interpretado como cognitivista. O contexto histórico cognitivizou suas obras. Duarte (2001) faz muitas observações a esse respeito, ao criticar as apropriações indevidas, neoliberais, feitas sobre as obras vygotskyanas. Vygotsky não foi cognitivista, nem somente interacionista ou construcionista – ele foi um marxista dialético.

De acordo com Newman & Holzman (1993: 23): “De modo significativo, Vygotsky foi um metodólogo marxista”. Nesse contexto é importante trazer a figura de Marx e entendê-lo como um materialista, o que significa entendê-lo como “... alguém que toma o mundo material, ou a matéria, como básicos e as idéias, ou a mente, como derivadas”.

Decorrente disso, a preocupação tanto de Vygotsky como de Marx era considerar como ponto de partida da ciência e da história “... a vida-que-se-vive e não as interpretações ou abstrações extrapoladas da vida” (Newman & Holzman, 1993: 24). Nas palavras de Marx e Engels era necessário considerar o homem “em seu processo de desenvolvimento real, em condições determinadas, empiricamente visíveis”, (1973: 47-48, apud Newman & Holzman, 1993:24).

É no conjunto de suas obras, segundo Rego (1995), que Vygotsky conseguiu contribuir com diversos campos da ciência, trazendo influências à psicologia e pedagogia, bem como à antropologia, lingüística, história, filosofia e sociologia. Nas palavras da autora:

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De acordo com a contribuição de Newman & Holzman (1993) e de Rego (1995), toda produção teórica vygotskyana esteve voltada às preocupações e objetivos que podem ser resumidos da seguinte forma:

• Vygotsky dedicou sua vida ao objetivo de reformular a psicologia de acordo com a metodologia marxista, revolucionária por estar engajada com a transformação de uma sociedade com a revisão de conflitos e contradições intelectuais, políticos, econômicos e culturais do novo Estado Socialista.

• Os desafios emergentes para Vygotsky eram o analfabetismo, as diferenças culturais entre as centenas de grupos étnicos que formavam a nova nação e a

ausência de serviços para os incapazes de participar plenamente da nova sociedade.

Para Newman & Holzman (1993) Vygotsky é considerado o principal teórico marxista entre os psicólogos soviéticos pós-revolucionários. Os autores apresentam a identidade da psicologia vygotskyana como dependente do grau em que ela, enquanto ciência, poderia contribuir para a transformação do objeto investigado, no intuito de domar a realidade e não simplesmente espelhá-la.

Optar pela TSHC na atualidade no campo educacional, então, é optar por uma forma de pensarmos, dentro do Projeto Político-Pedagógico de cada realidade escolar, quais são nossos desafios e objetivos rumo à transformação que queremos promover e que seja coerente com todo o quadro exposto. Não há como ser condizente com o sócio-histórico-cultural e não assumir um compromisso com uma escola que esteja intimamente vinculada com o que há fora dela, ou seja, não pensar numa educação que vise algo mais do que o trato com conteúdos.

Trazer a discussão da TSHC nesta pesquisa objetiva esclarecer ao leitor sobre a abordagem que se pretende seguir e com ela uma opção permeada, de maneira marcante, pela questão política, fundamental para os atores da educação, como será tratada a seguir.

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chegar atendem a diferentes interesses de cada época, que, acima de tudo, estão atendendo a interesses políticos.

Autores já citados como Pérez Gómez (1992) e Gitlin (2005), outros como Freire (1970), Freire e Faundez (1985), Kincheloe (1993), Liberali (1996) tratam das questões políticas. Não se trata aqui de política partidária, mas, sim, dos valores e interesses que acompanham as ações humanas, principalmente dos grupos hegemônicos, ou seja, daqueles que de alguma forma detêm o poder.

As contribuições de Freire (1970) trouxeram novas percepções ao cenário político-educacional, por apontar como se organizam as relações de poder na sociedade opressora e como podemos buscar a superação dessa organização através da conquista da liberdade. Para tanto é preciso reconhecer-se como opressor ou oprimido. Porém, o que se espera não é uma escolha extremista de se estar em uma ou em outra posição. Não se deve assumir o lugar de opressor ao deixar de ser oprimido ou vice-versa. A lógica não é ocupar o lugar do outro, mas eliminar tais posições, superando os mitos que sustentam as injustiças, valorizando a palavra de todos, dando espaço para que todos tenham voz e vez num processo de transformação radical.

Freire (1970) apontou a necessidade de se alcançar a consciência crítica dessa opressão na práxis, de maneira processual. Sendo assim, a ação e reflexão dos seres humanos sobre o mundo, para transformá-lo, é a práxis sugerida para a superação deste quadro opressor no qual todos estamos imersos.

O fato é que o próprio oprimido é que se constituiu em sujeito, em peça chave deste processo. “Os oprimidos hão de ser o exemplo para si mesmos, na luta por sua redenção” (Freire 1970:45), já que os opressores não poderiam trabalhar contra si mesmos numa educação libertadora.

Na educação, ainda referindo-me a Freire, ocorrem esquemas verticais nos quais as relações entre professor e aluno são marcadas fundamentalmente pela narração e dissertação, o que faz do conteúdo fragmentos desconectados da realidade na qual a palavra é alienante e não transformadora. Decorar, memorizar e repetir são os desafios aos educandos, enquanto o saber exigiria invenção, reinvenção, busca, ou seja, um pensar autêntico.

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oportunidades para desvelar a realidade, e da práxis o instrumento de ação, o que implica ação e reflexão de todos sobre o mundo, objetivando sua transformação, valorizando, assim, o ato cognoscente.

A autoridade é então exercida a favor da liberdade, pela quebra da oposição educador-educando através da visão de que ambos participam do processo de aprendizagem, mediatizados pelo mundo.

É com base nesses conhecimentos que esta pesquisa pode contribuir, já que busca instigar os participantes a entrar em contato com tais reflexões. A partir disso podemos pensar que mesmo sendo a escola um espaço onde são reproduzidos valores e concepções, quando compreendemos o que nela ocorre é possível optar pela manutenção ou transformação dessas reproduções e assim da realidade na qual estamos inseridos.

Focando a educação, a reflexão crítica pressupõe assim que o sujeito se enxergue como um ator sócio-histórico que deve ter uma ação política para compreender e pôr em questão as estruturas internas e externas das instituições educacionais rumo a uma proposta de emancipação, de vivência e exercício de cidadania responsável.

É de fundamental importância a compreensão de que somos frutos do contexto sócio-histórico-cultural do qual fazemos parte. Por isso, não poderemos ser autênticos até que aprendamos a pensar criticamente, desvelando interesses e valores imersos neste contexto e em nossa formação e constituição como sujeitos.

A seguinte citação enriquece a questão:

Quando tentamos entender os vários pontos de vista e suas limitações, eu penso que é útil reconhecer que as suposições/posições básicas e unidades de análise que guiam qualquer questão nas ciências humanas estão atreladas a interesses políticos,

culturais e institucionais.(Wertsch, 1998: 7)4

Ao optar então pela teoria sócio-histórico-cultural como base para esta pesquisa, já tendo esclarecido as questões políticas implícitas, será agora explorada a questão do método, pois se constitui parte integrante da discussão da TSHC.

4 When trying to understand various viewpoints and their limitations, I think it useful to recognize that the

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1. 2. Método da práxis

Vygotsky vê o conhecimento como fruto da reorganização das apropriações que fazemos pela interação com o meio social e dá uma dimensão revolucionária à educação. Contrapondo-se ao behaviorismo, ao pragmatismo e mesmo ao interacionismo, pois, entre outras razões, essas abordagens não consideravam as construções sócio-históricas, dando espaço para formações individualistas e alienadas, Vygotsky, segundo Newman & Holzman (1993), trouxe os conceitos de instrumento-e-resultado e instrumento para instrumento-e-resultado. Estes conceitos facilitam a compreensão da organização social, de como aí se estabelece o trabalho, a quem ele serve, como será tratado a seguir.

O método tem um valor central no trabalho de Vygotsky e deve ser visto de forma que os resultados do método e o método em si são inseparáveis. Como afirma o autor:

A procura de um método torna-se um dos problemas mais importantes de todo empreendimento para a compreensão das formas caracteristicamente humanas de atividade psicológica. Neste caso, o método é, ao mesmo tempo, pré-requisito e produto, o instrumento e o resultado do estudo. (Vygotsky, 1930-1933/1998: 86)

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satisfação de necessidades imediatas e individualistas, não comprometidas com a transformação social, com o coletivo.

Sendo assim, o método é para ser praticado e não aplicado, é um instrumento-e-resultado ou o método da práxis. Isto representou um paradoxo para o pragmatismo que era a metodologia dominante no século XX, em que o método é separado do conteúdo experimental e dos resultados, é entendido como algo a ser aplicado, um meio funcional para um fim, já que se prevê a eficiência. Por isso, é um instrumento para se atingir um resultado.

O pragmatismo pode ser positivamente desejável quando usado para reorganizar conhecimentos que possam ser recuperados ou quando se objetiva um automatismo em alguma situação específica, mas na abordagem proposta, ou seja, na teoria sócio-histórico-cultural, seria preciso passar primeiro pela compreensão dos processos. O problema é que o pragmatismo sempre foi utilizado a partir de uma visão de mundo e de ser humano de forma fragmentada, servindo a uma hegemonia e à alienação.

Ainda segundo Newman & Holzman (1993: 53-54): “O método do instrumento-e-resultado tem um propósito no sentido marxista (...)” e por isso Vygotsky rejeita a noção metodológica causal e/ou funcional de instrumento para um propósito ou resultado em favor da noção dialética do instrumento-e-resultado no estudo da psicologia humana. É assim que sua posição é tida como nova e revolucionária.

Neste ponto, é de expressiva importância pensar sobre as características dos instrumentos pedagógicos que utilizamos. Através delas podemos ter sinalizações do quanto estamos nos aproximando ou distanciando de uma proposta apoiada nos pressupostos da TSHC.

Vygotsky é considerado um metodólogo, pois ao conceituar aprendizagem e consciência, já discute como o processo se dá e aponta caminhos para a realização de uma educação a serviço de valores sociais diferentes daqueles dominantes em sua época e que se fazem presentes ao longo da história humana.

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sociais numa prática escolar que ainda é pragmática, quer resultados estanques e supervaloriza os dados quantitativos.

É exatamente nesse sentido que esta pesquisa tem sua preocupação central. Por isso, busca contribuir com ações que possam partir das questões arbitrárias da práxis para estabelecer discussões, revisão de pontos de vista e de concepções teórico-metodológicas. O intuito é possibilitar transformações da prática pedagógica.

Como parte desse desafio, alguns conceitos vygotskyanos serão apresentados, pois se mostram adequados ao momento, já que contribuem com a análise de ações que podem estar mais ou menos voltadas aos princípios da TSHC. Tais conceitos, tratados nas próximas seções, são ao mesmo tempo uma base para analisarmos o que observamos da prática pedagógica e se constituem em possibilidades de ação para a reorganização dessa mesma prática. O primeiro desses conceitos é a mediação, discutido a seguir.

1. 3. O conceito de mediação e suas implicações pedagógicas

O conceito de mediação, de base vygotskyana, será discutido nesta pesquisa por ser considerado central no trabalho com a educação, seja em relação à formação do aluno, seja na do professor, pois está diretamente relacionado a questões de aprendizagem e desenvolvimento. Segue uma explicação que traz um esclarecimento a respeito:

Há um interesse crescente pelo que se tornou conhecido como “teoria sociocultural” e por seu parente próximo, a “teoria da atividade”. Ambas as tradições são historicamente vinculadas a L. S. Vygotsky e tentam explicar a aprendizagem e o desenvolvimento como processos mediados. (Daniels, 2003:9)5

Estando o presente estudo apoiado na base teórica da TSHC, o conceito de mediação vem colaborar com este estudo, pois, segundo Daniels (2003:24), trata-se de um conceito-chave, já que “... abre o caminho para o desenvolvimento de uma explanação não-determinista, em que os mediadores servem como meios pelos quais o indivíduo age sobre fatores sociais, culturais e históricos e sofre a ação deles”.

5 Não é objetivo desta pesquisa abordar a teoria da atividade, levando-se em conta a amplitude e

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Segundo Rego (1995) e Daniels (2003), podemos dizer que a mediação é o processo que caracteriza a relação do homem com o mundo e com outros homens, ou as possibilidades de relações sujeito-objeto, mediadas por artefatos ou instrumentos culturalmente disponíveis. A figura 1 traz a representação do conceito apresentada por Daniels (2003: 25).

Figura 1 Representação triangular básica da mediação

Artefato

Sujeito S Objeto O

A mediação é vista como central, pois é neste processo que as Funções Psicológicas Superiores (FPS) - tipicamente humanas - se desenvolvem.

As FPS relacionam-se com ações intencionais – planejamento, memória voluntária, imaginação, enquanto as FPE (funções psicológicas elementares) dizem respeito ao que é biológico, nato, instintivo, reflexo. Vygotsky (1930-33/1998: 53) assim esclarece:

As funções elementares têm como característica fundamental o fato de serem total e diretamente determinadas pela estimulação ambiental. No caso das funções superiores, a característica essencial é a estimulação autogerada, isto é, a criação e o uso de estímulos artificiais que se tornam a causa imediata do comportamento.

Vygotsky (1930-1933) explica que toda forma de comportamento, mesmo que seja elementar, estabelece uma relação direta com a situação-problema defrontada pelo organismo, ou seja, toda forma de comportamento estabelece a relação estímulo-resposta. Contudo, na mediação há um elo intermediário nessa relação e esse elo se constitui com o uso de um estímulo auxiliar de segunda ordem, chamado de signo.

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Com o uso de signos cria-se uma nova relação entre o estímulo e a resposta, ou entre o sujeito e o objeto. Dessa maneira, formas indiretas de reação ao ambiente são incorporadas na relação do homem com seu meio.

O autor ainda salienta que o signo possui uma característica importante de ser considerada, que é a “ação reversa”, pois ele age diretamente sobre o indivíduo, conferindo à ação psicológica formas qualitativamente novas e superiores que permitem ao homem o controle de seu comportamento. Assim, a partir do uso de signos, uma estrutura específica do comportamento, diferente daquela proporcionada pelo desenvolvimento biológico, se torna possível e com isso surgem novas formas de processos psicológicos com origem cultural.

Bruner (1993: VIII), na introdução da obra Pensamento e Linguagem de Vygotsky, exemplifica a questão afirmando:

(...) em Pensamento e Linguagem Vygotsky elabora em que sentido ele acredita que dominando a natureza dominamos a nós mesmos. Pois é a interiorização da ação manisfesta que faz o pensamento, e particularmente, é a interiorização do diálogo exterior que leva o poderoso instrumento da linguagem a exercer influência sobre o fluxo do pensamento. O homem, por assim dizer, é modelado pelos instrumentos e ferramentas que usa...

Os instrumentos, que também estão representados na palavra “artefato” da figura 1, também se constituem em elementos da mediação. Contudo, Vygotsky (1930-33/1998: 72-73) faz questão de diferenciá-lo de signo, pontuando que o instrumento ajuda o homem a agir sobre o objeto da atividade, modificando-o; assim, a atividade humana externa pode controlar e dominar a natureza. Já o signo é um meio da atividade interna que irá ajudar o homem em seu autocontrole. Contudo, há uma ligação entre o controle da natureza e o do comportamento, pois ao alterar a natureza o homem altera a si próprio. Vygotsky diz que:

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superior, ou comportamento superior com referência à combinação entre o

instrumento e o signo na atividade psicológica.(1930-33/1998: 73)

Newman & Holzman (1993: 53) enriquecem a discussão ao afirmarem que “pelo argumento de Vygotsky, os instrumentos, quer práticos, quer simbólicos, são inicialmente “externos”: usados exteriormente sobre a natureza ou na comunicação com os outros. Mas os instrumentos afetam seus usuários: a linguagem, usada primeiramente como um instrumento comunicativo, acaba por moldar as mentes daqueles que se adaptaram a seu uso”.

Daniels (2003: 26) pontua duas questões decorrentes da ênfase da autoconstrução proposta na teoria vygotskyana que se dá por e com o uso de signos e instrumentos (ferramentas):

1. O indivíduo é visto como um agente ativo do desenvolvimento;

2. O contexto tem importância fundamental, pois o desenvolvimento irá ocorrer através das ferramentas disponíveis em um tempo e espaço determinados.

É aqui que está a fundamental responsabilidade dos educadores no ambiente escolar: o desenvolvimento dos alunos através da aprendizagem, que vai se dar pela mediação, na qual a linguagem é instrumento privilegiado.

Observando e investigando os conhecimentos que os alunos trazem à escola, o professor deve intervir para reorganizar tal conhecimento, elevando-os a outro patamar.

Este assunto parece-me de extrema importância para os propósitos a que essa pesquisa se destina, pois ao trabalhar a formação do professor com base na teoria sócio-histórico-cultural e com o apoio da teoria da reflexão crítica (Smyth, 1992), usamos a prática, a vida vivida do profissional como objeto de análise, como instrumento-e-resultado de sua reorganização.

1. 4. ZPD (zona proximal de desenvolvimento)

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de desenvolvimento e a capacidade de aprendizado” (Vygotsky, 1930-33/1998: 111). O autor afirmou que através dessa relação era possível resolver ou formular problemas próprios da análise psicológica do ensino.

Para tanto ele criou uma nova concepção, partindo da determinação de dois níveis de desenvolvimento, a saber:

• o nível de desenvolvimento real – que se refere ao “nível de desenvolvimento das funções mentais da criança que se estabeleceram como resultado de certos ciclos de desenvolvimentos já completados”. Está relacionado com o que as crianças podem fazer por si mesmas, pela solução independente de problemas, caracterizando aqui o desenvolvimento mental retrospectivamente;

• o nível de desenvolvimento potencial – é relativo ao que a criança consegue fazer com a ajuda dos outros, através da solução de problemas sob orientação de alguém mais capaz. Assim relaciona-se com os processos mentais em formação, que estão em maturação e desenvolvimento.

O conceito de ZPD é a distância entre esses dois níveis de desenvolvimento, definindo as funções que ainda não amadureceram, pois estão em processo de desenvolvimento. Com isso caracteriza-se o desenvolvimento mental prospectivamente.

De outra forma, a ZPD é um espaço de trabalho no qual uma pessoa atua para a aprendizagem e, conseqüentemente, o desenvolvimento do outro. Para tanto é necessário reconhecer o que uma pessoa pode realizar sem ajuda (ZDR – zona de desenvolvimento real) e o que necessita do outro para realizar. O objetivo, então, é que a realização de algo feito na ZPD possa, em breve, ser feito na ZDR, buscando a autonomia de atuação dos sujeitos envolvidos.

A ZPD é considerada um instrumento-e-resultado, pois leva ao desenvolvimento e nela o conhecimento é co-construído, ou seja, a fala de um é uma das estratégias para a construção/crescimento do outro. Nas relações interpsicológicas vai se criando uma base para a construção intrapsicológica. Como o próprio autor explica:

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as funções superiores se originam como relações efetivas entre indivíduos humanos. (Vygotsky, 1930-33/1998: 75)

A este respeito, Magalhães (1996: 3-4) afirma:

Em uma abordagem sócio-histórico-cultural, a aprendizagem de qualquer conhecimento novo parte do OUTRO, de padrões interacionais interpessoais. Assim, a aprendizagem é entendida, independentemente da idade, como social e contextualmente situada, como um processo de reconstrução interna de atividades externas, em que a relação social tem o papel primário em determinar o funcionamento intrapsicológico ou intramental... A instrução efetiva, isto é, a que resulta em aprendizagem, pressupõe que o professor tenha avaliado os dois níveis de desenvolvimento de seus alunos, isto é, as atividades em que agem independentemente e as em que necessitam da participação do outro para agir e que é onde deve situar a instrução.

Ao discutir sobre a ZPD, Vygotsky (1930-1933) faz uma constatação importante sobre o aprendizado humano, pois afirma que esse aprendizado: “... pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual as crianças penetram na vida intelectual daqueles que as cercam”. A esse respeito, Rego (1995) fala da importância do aprendizado dentro de um determinado grupo cultural por meio da interação, para com isso se alcançar o pleno desenvolvimento.

A imitação é destacada por Vygotsky (1930-33) como importante no trabalho na ZPD, pois as pessoas só conseguem imitar o que está no seu nível de desenvolvimento, indo além dos limites de sua própria capacidade. Rego (1995: 73) afirma que por meio da ajuda de outras pessoas... “a criança realiza tarefas e soluciona problemas através do diálogo, da colaboração, da imitação, da experiência compartilhada e das pistas que lhe são fornecidas”.

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Ele constatou em sua pesquisa que há uma variação enorme da capacidade de crianças com iguais níveis de desenvolvimento mental quando estão aprendendo sob a orientação de um professor. Com isso pontua que considerar o que a criança pode fazer com a ajuda dos outros seria mais produtivo para avaliar o desenvolvimento mental.

A partir dessas constatações, o autor trabalha com a hipótese de que há uma unidade entre aprendizado e desenvolvimento, mas isso não representa uma identidade, ou seja, aprendizado e desenvolvimento estão intimamente relacionados, mas não ocorrem ao mesmo tempo, no mesmo ritmo. É do processo de aprendizagem que resulta, em um tempo mais lento e posterior, o processo de desenvolvimento, numa relação dinâmica e complexa. É assim, nesse descompasso entre um e outro processo, que resulta a ZPD, trazendo a fundamental figura do “outro” no desenvolvimento global do ser humano.

Ao observarmos o trabalho feito, ou não, na ZPD, temos um termômetro da ação pedagógica, já que revela concepções de ensino-aprendizagem do professor. Parece haver uma relação de complementaridade entre os conceitos de “mediação” e ZPD, pois o professor será mediador, numa visão vygotskyana, ao trabalhar neste espaço mediacional que é ZPD.

Schneuwly (1994) traz uma contribuição considerável na discussão da ZPD. O autor trava uma crítica ao grande uso do conceito, pela maneira como têm sido raras as discussões sobre o aspecto do desenvolvimento, o que leva ao empobrecimento do conceito em si, já que esse aspecto sempre foi central para Vygotsky. O desenvolvimento das crianças era definido por Vygotsky como seu objeto de estudo.

Como decorrência da situação exposta, Schneuwly (1994) faz uma critica à redução da questão do desenvolvimento às questões do ensino e da aprendizagem e busca resgatar nas origens a coerência do modelo teórico no uso da ZPD, procurando enfocar o conceito de desenvolvimento.

Schneuwly (1994) determina três aspectos do desenvolvimento que devem ser considerados na teoria vygotskyana:

1. A forma do desenvolvimento - que se define por três leis:

o o desenvolvimento ou novas formas de funcionamento psíquico

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o As diferentes funções do psiquismo se desenvolvem de maneira

desigual e não proporcional;

o Por não ser linear, nem cíclico, o desenvolvimento não

representa o simples aumento de capacidades já existentes, antes ocorre por revolução.

2. O motor do desenvolvimento – constitui-se na luta de contrários entre os aspectos internos e externos do indivíduo, ou seja, as potencialidades já desenvolvidas em confronto com a cultura, com aquilo que é produzido na vida social, nas atividades humanas, que podem ser consideradas como conjunto de sistema de signos ou sistema semiótico.

3. Os instrumentos do desenvolvimento: os signos – as relações humanas são mediadas e transformadas pela utilização dos signos, que proporcionam o desenvolvimento das funções psicológicas superiores.

Em relação a esse mapeamento do conceito vygotskyano de desenvolvimento, Schneuwly (1994) encontra uma contradição teórica, pois ao mesmo tempo que existe um auto-movimento no desenvolvimento, um aspecto interior, que depende do que está interno, tal desenvolvimento só ocorre com as influências do meio externo. É neste ponto que o conceito de ZPD tem seu lugar teórico, pois sua função é colocar sob tensão o sistema interior/exterior, criando na contradição o movimento do desenvolvimento na relação entre ensino e desenvolvimento.

Assim, Schneuwly (1994) denomina a ZPD como um conceito relacional, pois é produto do cruzamento entre ensino e desenvolvimento, mas que nem sempre poderá ter origem em tal cruzamento.

Outros conceitos vygotskyanos complementam e enriquecem a presente discussão: conceito científico, conceito cotidiano e conceito no vácuo.

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generalização, o contexto lingüístico e a memória lógica. O conceito no vácuo não promove aprendizagem, pois não trabalha com o que é significativo.

Sendo assim, a compreensão do desenvolvimento de conceitos enquanto teoria psicológica é uma ferramenta de análise de como o professor trabalha com os conceitos. Se tal ferramenta, enquanto parte da teoria sócio-histórico-cultural, puder ser discutida e compor o Projeto Político-Pedagógico da escola, teremos uma referência a mais no momento de realizar discussões sobre a prática.

Como afirma o próprio Vygotsky:

... um conceito é mais do que a soma de certas conexões associativas formadas pela memória, é mais do que um simples hábito mental: é um ato real e complexo de pensamento que não pode ser ensinado por meio de treinamento, só podendo ser realizado quando o próprio desenvolvimento mental da criança já tiver atingido o nível necessário. Em qualquer idade um conceito expresso por uma palavra representa um ato de generalização. (1934/1993: 71)

Segundo o autor, esse ato de generalização vai se tornando mais elevado à medida que o que o intelecto da criança se desenvolve, por isso é primordial que o professor entenda a improdutividade da transmissão direta de um conceito, pois o que acaba ocorrendo nessa situação é um conceito no vácuo, que não promove a aprendizagem, pois não trabalha a partir de um “contexto lingüístico geral”6. Para Vygotsky:

... um conceito se forma não pela interação das associações, mas mediante uma operação intelectual em que todas as funções mentais elementares participam de uma combinação específica. Essa operação é dirigida pelo uso das palavras como o meio para centrar ativamente a atenção, abstrair determinados traços, sintetizá-los e simbolizá-los por meio de um signo. (1934/1993:70)

6 A expressão foi utilizada por Vygotsky (1934/1993:72) ao se referir ao que um outro autor, Tolstoi,

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Vygotsky (1934/1993) aponta para a importância de se considerarem os conceitos cotidianos que a criança forma sem a ajuda do aprendizado sistemático, aquele que construímos em nossa relação com os outros, mas não de forma hierarquizada (a atenção aqui está voltada ao objeto ao qual o conceito se refere e não ao ato do pensamento), no entanto, não se pode esquecer que a formação de conceitos, sejam cotidianos ou científicos, estão interligados, pois fazem parte de um único processo.

A escola desempenha um papel fundamental no estímulo à formação de conceitos, pois de acordo com Vygotsky:

O aprendizado escolar induz o tipo de percepção generalizante, desempenhando assim um papel decisivo na conscientização da criança dos seus próprios processos mentais. Os conceitos científicos, com o seu sistema hierárquico de inter-relações, parecem constituir o meio no qual a consciência e o domínio se desenvolvem, sendo mais tarde transferidos a outros conceitos e a outras áreas do pensamento. A consciência reflexiva chega à criança através dos portais dos conhecimentos científicos (1934/1993:79).

Por isso a consciência dos conceitos espontâneos é tardia, só depois de utilizá-los por um tempo é que nos tornamos conscientes do ato do pensamento a que ele se refere e, ao contrário, o conceito científico geralmente se inicia com definição verbal e aplicação em situações não espontâneas (como as vividas no contexto escolar).

O papel da escola é crucial ao trabalhar de maneira formal com os conceitos científicos para que eles transformem gradualmente a estrutura do conceito espontâneo, colaborando na reorganização deste num sistema, o que promove a ascensão da criança para níveis mais elevados de desenvolvimento. A aprendizagem, assim, precede o desenvolvimento, como já discutido anteriormente (na página 23 desta dissertação).

Acreditamos que as discussões feitas até aqui sobre a TSHC e alguns conceitos a ela relacionados foram apoio para o trabalho de formação realizado com a professora, tanto durante a coleta dos dados, quanto nas sessões reflexivas e na observação, análise

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e discussão dos dados. A TSHC nos oferece princípios de ação, de visão de mundo e de educação e os conceitos a ela relacionados nos ajudam na organização das ações.

A preocupação em se utilizar um método que já traga em sua prática o resultado é um exemplo disso. Valorizar tanto as características da mediação da professora e da coordenadora quanto o fato de conseguirem ou não estabelecer a ZPD em suas ações também são evidências para uma avaliação formativa, ou seja, voltada para a aprendizagem, o que revela uma organização que busca estar pautada na TSHC. O que se quer é respeitar a influência dos vários contextos em que as pessoas em sua situação real de trabalho estão inseridas e utilizar essa mesma situação como fonte de estudo, aprendizagem e, conseqüentemente, de desenvolvimento.

Durante o trabalho de pesquisa, foram observados valores e princípios de diferentes paradigmas que respaldavam as ações pedagógicas. Por isso, se fez necessário apresentar uma contraposição entre a TSHC e o ensino como transmissão, pois é preciso que ambas as posições estejam claras, para que possamos fazer nossas escolhas de maneira consciente.

1. 5. Contrapondo a TSHC e o ensino como transmissão

Um breve resgate, pelos caminhos da história, agora será apresentado para discutir as influências que a educação recebeu ou ainda recebe, bem como um aprofundamento na base teórica psicológica desta pesquisa. Afinal...

... uma escolha de pedagogia inevitavelmente comunica uma concepção do processo de aprendizagem e do aprendiz. A pedagogia jamais é isenta. Trata-se de um meio que carrega sua própria mensagem. (Bruner, 2001)

Milhollan & Florisha (1978) nos ajudam nessa retrospectiva ao traçarem a origem do behaviorismo que tantas influências já trouxe ao cenário educacional. Será com base nesses autores que se discutirão agora algumas teorias ditas tradicionais.

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1949) por volta de 1898 e influenciou marcantemente a psicologia da aprendizagem e as práticas educacionais. Thorndike defendia a tradição associacionista, na qual a aprendizagem era vista como o processo de selecionar e associar os estímulos e respostas (acontecimentos físicos) e as coisas sentidas ou percebidas (acontecimentos mentais), processo este visto como passivo, mecânico e automático.

Nesta base de compreensão, a aprendizagem é conetiva (daí o termo conexionismo) e o ensino é visto como “... o arranjo de situações que levam a laços apropriados e os tornam recompensadores. O estímulo e a resposta devem ser distinguidos a fim de que sua conexão possa ser realizada” (Milhollan & Florisha, 78: 56). Thorndike criou assim a Lei do Efeito, segundo a qual se explicava o gravar e o eliminar respostas, no processo de aprendizagem, a partir das conseqüências agradáveis ou não.

Contemporâneo de Thorndike, Ivan P. Pavlov (1849 – 1936) também colaborou com o condicionamento clássico, compreendido como parte da doutrina de associação baseada na pesquisa de laboratório.

Segundo este pesquisador, a aprendizagem ocorria pela associação entre um estímulo (S) e uma resposta (R), uma espécie de conexão no sistema nervoso central. Assim era possível condicionar por estímulo a uma resposta esperada e extinguir tal resposta pela variação dos estímulos.

Buscando fazer da psicologia uma ciência, muitos psicólogos, principalmente americanos, queriam focar os estudos no comportamento, para que os dados pudessem ser observáveis e mensuráveis, proporcionando resultados uniformes a qualquer pesquisador. Foi assim que John B. Watson (1878 – 1958) criou o termo behaviorismo defendendo que a psicologia fosse a ciência do comportamento puramente objetiva, rejeitando, assim, o estudo da consciência e os princípios do inatismo.

Watson foi ambientalista. Ao conhecer o condicionamento clássico de Pavlov o adotou como mecanismo para toda a aprendizagem. Para ele, todo o conhecimento é adquirido através do condicionamento.

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previsão. Via o futuro como passível de controle. Em suas próprias palavras: “Ciência está aumentando firmemente nosso poder de influenciar, mudar, modelar – em uma palavra, controlar – o comportamento humano” (Skinner, apud Milhollan & Florisha, 1978: 69).

O behaviorismo foi realmente marcante enquanto teoria psicológica e enquanto base metodológica na educação no século XX, e como mostrarão os dados da pesquisa, seus reflexos ainda persistem em muitas situações. Mesmo quando o professor acredita que já não adota tal teoria para seu trabalho, suas ações o traem, pois elas têm base nesta teoria que pode ser considerada totalmente diferente da sócio-histórico-cultural, pois os ideais de homem e de sociedade e a compreensão sobre a aprendizagem divergem profundamente.

Para o quadro com o resumo a seguir, foram consideradas as contribuições de Milhollan & Florisha (1978) em relação ao behaviorismo e, no tocante à TSHC, foi usado um resumo apresentado por Daniels (2003: 24).

Contrapontos entre o behaviorismo e a TSHC

Quadro 2

Orientação comportamentalista Teoria sócio-histórico-cultural

- O homem é um organismo passível e manipulável pelos estímulos exteriores; - Empirista – é da experiência que se chega à aprendizagem;

- Principal representante na filosofia – Locke;

- Orientação metodológica:

• Homem previsível;

• Não há possibilidade de criação do novo;

• Homem universal – máquina a ser programada das ações simples para as complexas; - Motivação é extrínseca, pressupõe recompensa.

- Salienta a ação mediada num contexto; - Análise baseada em eventos da vida cotidiana;

- Pressupõe que a mente surge na atividade mediada conjunta das pessoas. A mente é, então, em importante sentido,

“co-construída e distribuída”;

- Pressupõe que os indivíduos são agentes ativos em seu próprio desenvolvimento, mas não agem em cenário de sua própria escolha;

- Rejeita ciência explanatória de causa-efeito, estímulo-resposta, em favor de uma ciência que enfatiza a natureza emergente da mente em atividade e reconhece um papel central para a interpretação em sua estrutura explanatória;

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filosofia monista de Spinosa;

- Principal representante – Vygotsky.

Com estes esclarecimentos, a intenção foi mostrar que nem todas as teorias são opostas, mas, sim, diferentes, com propósitos, visões e objetivos diversificados. Compreender isso se torna fundamental para o trabalho com a formação de professores, pois proporciona o conhecimento dessas produções históricas e tudo o que nelas está implícito e assim alcança-se a liberdade da escolha, que deve ser feita coletivamente, por ocasião da produção do Projeto Político-Pedagógico.

Como veremos a seguir, é certo que a produção do PPP fica balizada por documentos de orientação, seja de esferas mais amplas como a federal, ou de esferas mais imediatas, como propostas estaduais ou municipais, ou mesmo de entidades particulares, mas todo documento de orientação, todo referencial ou proposta curricular só se concretizará na ação diária do professor. Na sua prática está a responsabilidade de concretização ou não dos prescritos, sendo assim, o PPP é uma ferramenta fundamental de apropriação de conhecimentos contidos em documentos de referência que possam ser usados, pois será algo produzido em micro contexto e deve traduzir um consenso do grupo de profissionais que ali atuarão.

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CAPÍTULO 2

Implicações da teoria sócio-histórico-cultural para a prática

Na busca por teoria e estudos que pudessem contribuir com os objetivos desta pesquisa, colaborando para que o trabalho pudesse se desenvolver de maneira coerente com a TSHC, optamos por fazer a discussão dos assuntos que serão apresentados a seguir. Assim, este capítulo tem por objetivo apresentar mais uma parte da fundamentação teórica, o que será feito em três seções.

O Projeto Político-Pedagógico é discutido na primeira seção, pois teve uma importância no início da pesquisa e também na trajetória da formação da professora participante, bem como na atuação da coordenadora-pesquisadora. Pela importância de ser compreendido, estruturado e definido a partir da teoria que deve alicerçá-lo, tal projeto pode constituir-se em um instrumento de transformação da prática pedagógica. Autores como Vasconcellos (2006), Almeida (2004), Marçal & Souza (2001), Gandin & Gandin (1999) colaboram nessa discussão.

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ensino-aprendizagem7 ele redimensiona a importância da cooperação. Já a reflexão crítica é discutida por Smyth (1992) como uma forma de operacionalização de ações no processo de formação dos professores.

Finalmente, na terceira e última seção focaliza-se a questão das “perguntas”. Tal escolha foi apontada pela observação dos dados, que trouxeram as perguntas como estratégias de interação entre professora-aluno e coordenadora-professora durante a coleta dos dados. Nessa discussão, estiveram presentes vários autores como Freire e Faundez (1985), Nuttall (1982), Mackay (2001), Coracini (2002), Ricardo (2002), Méndez (2002) e Ninin, Hawi, Damianovic e Mello (2005).

2. 1. Projeto Político-Pedagógico (PPP)

O PPP tem papel privilegiado nesta pesquisa, pois é aqui reconhecido como ponto de partida da organização das atividades pedagógicas da escola e conseqüentemente da formação/educação8 de professores.

A questão é que na construção do PPP temos uma excelente oportunidade de iniciar a cada ano um trabalho de educação de professores pelos estudos e revisões que são necessários para a consciência da base teórica do trabalho, bem como das discussões impreteríveis às escolhas e determinação de metas e ações que guiarão as práticas e projetos de todo o ano letivo.

Autores como Vasconcellos (2006), Almeida (2004), Marçal & Souza (2001), Gandin & Gandin (1999) vêm discutindo questões relativas à produção do PPP. Seja tratando por planejamento participativo ou projeto coletivo é unânime a visão entre eles da importância de se fazer um trabalho compartilhado, pois suas experiências e

7 O termo ensino-aprendizagem é a tradução da palavra russa obouchenie, utilizada por Vygotsky no

sentido de representar “tanto os processos de ensino como os de aprendizagem” (Dolz & Schneuwly, 2004: 45).

Daniels (2003: 20) também faz um esclarecimento a este respeito, dizendo: “O tradutor de Davydov (1995) diz que ensino ou ensino-aprendizagem é mais apropriado como tradução de obuchenie, na medida em que o termo se refere a todas as ações do professor que geram desenvolvimento e crescimento cognitivos. Sutton (1980) também lembra que a palavra não admite uma tradução inglesa direta. O autor argumenta que ela significa tanto ensino como aprendizagem e se refere a ambos os lados do processo de duas vias, sendo portanto apropriada uma visão dialética de um fenômeno composto de opostos que se interpenetram”.

8Cunha (2005: 35), Magalhães & Celani (2005: 135) e Smyth (1992: 270) utilizam o termo educação de

professores. As primeiras autoras o fazem em paralelo com o termo formação de professores. Todos criam a possibilidade de outra forma de se referir a essa questão. O termo educação de professores

Referências

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