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"Nós estamos falando! E vocês, estão nos escutando?" Currículos praticados com bebês: professoras com a palavra

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

MARLENE OLIVEIRA DOS SANTOS

“NÓS ESTAMOS FALANDO! E VOCÊS, ESTÃO NOS ESCUTANDO?”

CURRÍCULOS PRATICADOS COM BEBÊS: PROFESSORAS COM A

PALAVRA

Salvador

2017

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MARLENE OLIVEIRA DOS SANTOS

“NÓS ESTAMOS FALANDO! E VOCÊS, ESTÃO NOS ESCUTANDO?”

CURRÍCULOS PRATICADOS COM BEBÊS: PROFESSORAS COM A

PALAVRA

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, como requisito para obtenção do grau de Doutora em Educação.

Orientadora: Profª Drª. Maria Roseli G. Brito de Sá.

Linha de pesquisa: CURRÍCULO E (IN)FORMAÇÃO.

Salvador

2017

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TERMO DE APROVAÇÃO

“NÓS ESTAMOS FALANDO! E VOCÊS, ESTÃO NOS ESCUTANDO?”

CURRÍCULOS PRATICADOS COM BEBÊS: PROFESSORAS COM A

PALAVRA

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, como requisito para obtenção do grau de Doutora em Educação.

Aprovada em 25 de setembro de 2017.

BANCA EXAMINADORA

Profª Mariete Félix Rosa

Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) Faculdade Mato Grosso do Sul

Profª Sílvia Helena Vieira Cruz

Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) Universidade Federal do Ceará

Profª Tacyana Karla Gomes Ramos

Doutora em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Universidade Federal de Sergipe

Profª Vanessa Sievers de Almeida

Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) Universidade Federal da Bahia

Profª Maria Roseli Gomes Brito de Sá (orientadora)

Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) Universidade Federal da Bahia

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Às professoras que exercem a docência com bebês. A meu esposo, Josué. A minha filha, Júlia.

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5 MINHA GRATIDÃO

A Deus, criador e minha inspiração. A Josué, meu esposo.

A Júlia, minha filha. A Analice, minha mãe. A João, meu pai.

A Gabriela, minha enteada. A Marisa, minha irmã. A Luiz Carlos, meu irmão. A Tiago, meu irmão. A Lilian, minha cunhada. A Ênio, meu cunhado.

A Anna Catarina, Felipe, Lara e Luíza, meus sobrinhos. A família Galdino, uma das minhas referências.

A Roberlinda, minha diarista.

A Elisângela, colaboradora desta pesquisa. A Daniela, minha amiga-comadre.

A Amarildo, meu amigo-compadre. A Adriana, minha amiga-comadre. A Ângela, minha amiga.

A Bárbara, colaboradora desta pesquisa. A Drª Ania, minha psicanalista.

A Luciana, professora e técnica da Rádio Faced. A Patrícia, professora de bebê integrante da pesquisa. A Kátia, professora de bebê integrante da pesquisa. A Daniela, professora de bebê integrante da pesquisa. A Brites, professora de bebê integrante da pesquisa. A Soraia, professora de bebê integrante da pesquisa. A Íris, professora de bebê integrante da pesquisa.

A Argemiro (in memoriam), amigo e cinegrafista/fotógrafo de nossas Tertúlias Narrativas.

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A Sílvia, professora da Banca Examinadora. A Tacyana, professora da Banca Examinadora. A Mariete, professora da Banca Examinadora. A Vanessa, professora da Banca Examinadora.

A Lícia, professora da Banca Examinadora (Qualificação). A Maria Izabel, amiga e parceira de trabalho.

Aos Centros Municipais de Educação Infantil, parceiros fundamentais desta pesquisa. À Secretaria Municipal de Educação de Salvador, parceira neste trabalho.

Ao EPIS/GEPEICI/Grupo Ética, Política e Formação, grupos de pesquisa que frequento.

Ao MIEIB/FBEI, meu espaço de militância em defesa dos direitos das crianças. À Universidade Federal da Bahia-Faculdade de Educação, meu local de trabalho e de construção de uma educação democrática, pública e de qualidade para todos. Sou grata a todos/as pelas palavras, afago, escuta, cuidado, apoio, colo, incentivo, generosidade, amor, afeto, aprendizagens e partilha de projetos comuns em prol de uma sociedade democrática e de uma educação de qualidade, pública, gratuita, laica e inclusiva para todas as crianças brasileiras.

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A história de um dia engloba a do mundo e a da sociedade. Lefebvre (1991, p. 8)

A maior riqueza do homem é a sua incompletude. Nesse ponto sou abastado. Palavras que me aceitam como sou - eu não

aceito. Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas, que puxa válvulas, que olha o relógio, que compra pão às 6 horas da tarde, que vai lá fora, que aponta lápis, que vê a uva etc. etc. Perdoai Mas eu preciso ser Outros. Eu penso renovar o homem usando borboletas. Manoel de Barros (2010, p. 374)

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SANTOS, Marlene Oliveira dos. “Nós estamos falando! E vocês, estão nos escutando?” Currículos praticados com bebês: professoras com a palavra. 310 f. il. 2017. Tese de Doutorado em educação – Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2017.

RESUMO

A pesquisa aqui apresentada em nível de doutoramento versa sobre currículos praticados com bebês em escolas públicas de Educação Infantil do município de Salvador-Bahia. Para atingir seu escopo, delineou-se como objetivo geral engendrar reflexões, por meio das narrativas de professoras, sobre currículos praticados com bebês no cotidiano de escolas de Educação Infantil (Berçário) da Rede Municipal de Ensino de Salvador e suas interfaces com as políticas públicas educacionais e a docência com bebês. Fez-se essa análise a partir da escuta das narrativas de seis professoras que exercem a docência em três Centros Municipais de Educação Infantil que atendem bebês. Aos encontros para a escuta das narrativas das docentes nomeou-se de Tertúlias Narrativas e aos instrumentos metodológicos de instrumentos, tais como: de registro (caderno de anotações, relatos escritos feitos pelas professoras, gravadores de áudio (celular e gravador de voz), máquina fotográfica e máquina de filmar); de mediação (cesto de tesouros) e de síntese (cesto de palavras). A tessitura teórico-metodológica sustentou-se em concepções, ideias e argumentos de autores filiados em diferentes campos de conhecimento (Pedagogia, Psicologia, Filosofia, Sociologia, História e Antropologia), dentre eles, as professoras integrantes da pesquisa. As reflexões e conclusões sobre os currículos praticados com bebês intercruzaram-se com diálogos sobre currículo, cotidiano, vida cotidiana e narrativa, docência, planejamento, observação, documentação pedagógica, interpretação e especificidades da ação pedagógica com os bebês. Do que foi interpretado, concluiu-se que os currículos praticados com bebês concluiu-se concretizam no cotidiano da escola mediante a ação humana, as relações entre os sujeitos (professoras, bebês, Auxiliar de Desenvolvimento Infantil (ADI) e outros profissionais que trabalham na escola) e as condições materiais e não materiais ofertadas pelo estado para o exercício da docência com os bebês. O que é vivido no cotidiano de cada Centro Municipal de Educação pelas professoras, bebês e ADI é ressonância da qualidade e do alcance das políticas públicas destinadas à Educação Infantil, em nível local e nacional. Concluiu-se também que os currículos praticados com bebês são trançados com diferentes referências teórico-metodológicas e que a ação pedagógica, intencionalmente planejada, dá sinais de mudanças quanto à compreensão das capacidades e potências do bebê, aos procedimentos metodológicos de

educaçãocuidado experienciados no cotidiano com os bebês, ao reconhecimento de

que os bebês influenciam no exercício da docência e ensinam as professoras a tornarem-se professoras de bebês.

Palavras-chave: Currículos praticados. Praticantes do currículo. Professoras. Bebês.

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9 SANTOS, Marlene Oliveira dos. “We are talking! And you, are you listening?” Subjects practiced with babies: teachers with a Word. 310 s. il. 2017. Thesis of PhD in education - Education college, Federal University of Bahia, Salvador, 2017.

ABSTRACT

The research presented here in PhD level is about subjects practiced with babies at public schools in the Municipal Network of teaching in Salvador/Bahia. To achieve the aim, it was established as a general objective to project reflections using teacher’s narratives about subjects practiced with babies in their everyday lives at schools of Child Education (nursery) in the Municipal Network of teaching in Salvador and its interfaces with public educational politics and babies teaching. This analysis was made from the listening of narratives of six teachers that perform their work at three Municipal Centers of Child Education that attend babies. The meetings to listen to the narratives by the teachers were named “Tertúlias Narrativas” and also to the methodological instruments such as: register (notebooks, teachers’ written stories, audio recorder (mobile phone and voice recorder), camera for photos and videos); mediation (basket of scissors) and synthesis (basket of words). The theoretical-methodological structure is sustained in conceptions, ideas and arguments of authors in different areas of knowledge (Pedagogy, Psychology, Philosophy, History and Anthropology) and among them, the teachers that participated in the research. The reflections and conclusions about the subjects practiced with babies cross each other with dialogues about the subjects, daily, daily life and narrative, teaching, planning, observation, pedagogical documentation, interpretation and specificities of the pedagogical action with the babies. From what was understood, it was concluded that the subjects practiced with babies were accomplished in the school daily by human action, relationship between the participants (teachers, babies, auxiliaries of child development and other professional who work in the school) and the material and non-material conditions offered by the state to practice the teaching of babies. What are experienced daily at each Municipal Center of Education by the teachers, babies and auxiliaries of child development are the resonance of quality and the reaching of public politics directed to Child Education, in a local and national level. It can also be concluded that the practiced subjects with babies are attached with different theoretical-methodological references and that the pedagogical action, intentionally planned, they give signs of changing related to the comprehension of capacities and potential of the babies, methodological procedures of caring education experienced daily with the babies, recognition that babies interfere in the teaching exercise and teach the teachers to become baby teachers.

Keywords: Subjects practiced. Participants of the subject. Teachers. Babies. Teaching. Narratives.

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SANTOS, Marlene Oliveira dos. “Stiamo parlando! E tu stai ascoltando?” Curricolo praticati con bambini: insegnanti con la parola. 310 p. il. 2017. Tesi di Dottorado in educazione – Facoltà di Educazione, Università Federale di Bahia, Salvador, 2017.

RIASSUNTO

La ricerca qui presentata, per la tesi di dottorato, si riferisce ai curriculum realizzati con i bambini degli Asili Nido Pubblici nella città di Salvador di Bahia. Per raggiungere il suo scopo, si è definito come obbiettivo principale riflettere, attraverso le narrazioni degli insegnanti, sulla effettivazione quotidiana del curriculum nei Nidi d’Infanzia Pubblici di Salvador e le sue interfacce con le politiche pubbliche sull’educazione e l' attività docente con i bambini dai tre mesi ai tre anni. Questa analisi è stata realizzata ascoltando le storie di sei insegnanti che lavorano in tre Nidi d’Infanzia Comunali. Gli incontri per l’ascolto delle storie degli insegnanti sono stati nominati di “Tertúlias Narrativas” e sono stati usati diversi strumenti metodologici, quali: registro (quaderno di annotazioni, relazioni scritte dagli insegnanti, registri audio (cellulare e registratori di voce), fotografie e filmati; mediazione (cesto dei tesori) e sintesi (cesto delle parole). La tessitura teorico-metodologica si è sostenuta su concetti, idee e argomenti di autori di differenti aree del sapere (Pedagogia, Psicologia, Filosofia, Sociologia, Storia e Antropologia), tra i quali, le insegnanti che hanno integrato la ricerca. Le riflessioni e le conclusioni sul curriculum, praticato con i bambini, si sono intersicati con i dialoghi su questo, la vita quotidiana, le narrazioni, la pratica docente, la pianificazione, l’osservazione, la documentazione pedagogica, l’interpretazione e la specificità dell’ azione pedagogica con i bambini. Da ciò che è stato interpretato, si è concluso che il curriculum praticato con i bambini si concretizza nel quotidiano del Nido d’Infanzia mediante l’azione umana, le relazioni dei soggetti coinvolti (insegnanti, bambini, ausiliare di sviluppo infantile (ADI) e altri funzionari che lavorano nella scuola) e le condizioni materiali e non, offerte dallo Stato per l'insegnamento ai bambini piccoli dei Nidi d’ Infanzia. Ciò che si vive nel quotidiano di ogni Nido d’ Infanzia Comunale, da insegnanti, bambini e ADI è la risonanza della qualità e della realizzazione delle politiche pubbliche rivolte all’ educazione dei bambini dai tre mesi ai tre anni, a livello locale e nazionale. Si è inoltre concluso che i curriculum praticati con i bambini sono intrecciati con i diversi riferimenti teorici-metodologici e l'azione pedagogica, intenzionalmente pianificata, rivela segnali di cambiamento sulla comprensione delle capacità e potenzialità del bambino, sulle procedure metodologiche di educazione- cura sperimentati nel quotidiano con i piccoli, e il riconoscimento che i bambini influenzino l’esercizio docente e formano gli insegnanti perchè diventino veri specialisti nell’ educazione destinata ai bambini più piccoli.

Parole chiave: Curricolo praticati. Praticanti del curricolo. Insegnanti. Bambini piccoli. Insegnamento. Narrazioni.

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11 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

AC Atividade Complementar

ADI Auxiliar de Desenvolvimento Infantil

ANEI Avaliação Nacional da Educação Infantil

BNCC Base Nacional Comum Curricular

CMEI Centro Municipal de Educação Infantil

CNE Conselho Nacional de Educação

CONAE Conferência Nacional de Educação

DCNEB Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica

FACED Faculdade de Educação

GEPEICI Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Infantil, Crianças

e Infâncias

GRE Gerência Regional de Educação

LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC Ministério da Educação

REDA Regime Especial de Direito Administrativo

REME Rede Municipal de Ensino

SMED Secretaria Municipal de Educação

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12 SUMÁRIO

1 PRIMEIRAS PALAVRAS... 15

1.1 ENTRE O MAR, O AR, A OLIVEIRA E OS SANTOS... 30

2 “ACHADOUROS” DA PESQUISA: PALAVRAS DE UM CAMINHO NARRATIVO... 34

2.1 “ACHADOUROS” DA ESCUTA: AS PROFESSORAS... 48

2.2 REVELANDO “ACHADOUROS”: PROCEDIMENTOS E INSTRUMENTOS DA PESQUISA... 52

2.3 AS TERTÚLIAS NARRATIVAS EM SI... 62

2.3.1 O acolhimento do grupo e o encontro com o Outro... 64

2.3.2 Memórias de currículos praticados com bebês... 68

2.3.3 “Ontem eu fiz essa atividade”... 72

2.3.4 “Eu gostei de ter feito isso”... 77

2.3.5 “Eu trouxe o planejamento”... 80

2.3.6 Planejamentos e rotinas da ação pedagógica com os bebês.... 86

2.3.7 Mais histórias de currículos praticados com bebês... 89

2.3.8 Uma despedida provisória... 94

2.3.9 Encontro das narradoras-ouvintes com suas narrativas... 100

2.3.10 “As nossas vozes estão lá também”... 101

2.4 TERTÚLIA NARRATIVA: UM POTENTE DISPOSITIVO DE FORMAÇÃO CONTINUADA... 104

3 CURRÍCULOS: O FEITO E A SER FEITO... 109

3.1 CURRÍCULO PRESCRITO... 110

3.2 CURRÍCULO COM IDENTIDADE NARRATIVA... 128

3.3 CURRÍCULO PRODUZIDO NO COTIDIANO E NA VIDA COTIDIANA DA ESCOLA... 133

4 PRATICANTES DE CURRÍCULOS: OS BEBÊS, AS PROFESSORAS E AS AUXILIARES DE DESENVOLVIMENTO INFANTIL... 143

4.1 OS BEBÊS ESTÃO NA ESCOLA: E AGORA?... 143

4.1.1 Bebês e professoras: das relações, surpresas, encantamentos aos ensinamentos diários... 151

4.1.1.1 “Os bebês participam de tudo na escola”... 155

4.2 PROFESSORAS E BEBÊS: UMA DOCÊNCIA INTERPRETATIVA-RELACIONAL... 158

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4.2.1 O encontro das professoras com os bebês... 167

4.2.2 As professoras: da solidão à busca do Outro na profissão... 173

4.2.3 O exercício da docência com bebês: dos materiais necessários... 182

4.2.4 Professoras de bebês: da invisibilidade à busca do reconhecimento... 188

4.2.5 As professoras: da insuficiência da formação inicial à busca da formação continuada... 191

4.3 AS AUXILIARES DE DESENVOLVIMENTO INFANTIL NO CONTEXTO DA DOCÊNCIA E DE CURRÍCULOS PRATICADOS COM BEBÊS... 194

4.3.1 Origem da função Auxiliar de Desenvolvimento Infantil... 198

5 A MICROPEDAGOGIA EM CURRÍCULOS PRATICADOS COM BEBÊS... 209

5.1 UM DIA DE CURRÍCULOS PRATICADOS COM OS BEBÊS... 210

5.2 EXPERIÊNCIAS SIGNIFICATIVAS PARA PROFESSORAS E PARA BEBÊS NOS CURRÍCULOS PRATICADOS... 225

5.3 NARRATIVAS SOBRE OS LIVROS, AS HISTÓRIAS E OS BEBÊS... 228

5.3.1 Sobre os usos do acervo de livros de literatura infantil... 229

5.3.2 Sobre onde, como e quem conta as histórias para os bebês... 237

5.3.3 Sobre as histórias das histórias contadas para os bebês... 243

5.4 O PLANEJAMENTO DA AÇÃO PEDAGÓGICA EM CURRÍCULOS PRATICADOS COM BEBÊS... 247

5.4.1 Em que as professoras se inspiram para elaborar o planejamento? ... 251

5.4.2 Como as professoras elaboram o planejamento? ... 254

5.4.3 Por que o planejamento é feito desse modo pelas professoras e não de outro? ... 262

5.5 OBSERVAR, INTERPRETAR, DOCUMENTAR E NARRAR EM CURRÍCULOS PRATICADOS COM BEBÊS... 273

6 UM PONTO FINAL... 281

REFERÊNCIAS... 292

APÊNDICE A - Carta às professoras... 303

APÊNDICE B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - “Dou minha palavra”... 304

APÊNDICE C - Ofício encaminhado pela pesquisadora e orientadora à Secretaria Municipal de Educação de Salvador... 305

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14 APÊNDICE D - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido -

“Confirmo minha palavra”... 307

APÊNDICE E - Pistas do Caça-tesouro... 308

ANEXO A - Ofício encaminhado pela Secretaria Municipal de

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15 1 PRIMEIRAS PALAVRAS

Não tenho bens de acontecimentos. O que não sei fazer desconto nas palavras. Entesouro frases. Por exemplo: - Imagens são palavras que nos faltaram. - Poesia é a ocupação da palavra pela imagem. - Poesia é a ocupação da Imagem pelo Ser.

Ai frase de pensar! Pensar é uma pedreira. Estou sendo. Me acho em petição de lata (frase encontrada no lixo). Concluindo: há pessoas que se compõem de atos, ruídos, retratos. Outras palavras. Poetas e tontos se compõem com palavras. Manoel de Barros1 (2010, p. 263)

Tenho a pretensão de me compor e de compor esta tese com palavras. Acho que estou mais propensa para ser tonta do que para ser poeta, não porque queira, mas porque penso que ser poeta é um estado humano que vem de nascença. Eu não nasci poeta. É assim que sinto. Os tontos vivem lampejos de ser poeta. O estado de tontice passa, é temporário, já o estado de poetice permanece. Os tontos, em seus lampejos de poetices, também conseguem ver, escutar e sentir as pessoas, as coisas e o mundo de um jeito diferente, conseguem dizer coisas que vêm de dentro, de um lugar pouco conhecido quando a lucidez está em evidência.

Quando os lampejos de poetices nos acontecem, o nosso olhar fica mais embaçado, aguçando outros sentidos, sentimentos e emoções; passamos a andar sem pressa, contemplar mais, saborear cada descoberta, sentir mais, rir mais, dizer mais sem a preocupação do que os outros vão achar. Simplesmente dizer.

O andar cambaleante de quem está em estado de tontice faz o tonto tirar os pés do chão, estar lá e cá, aqui e acolá para aprender e apreender outra perspectiva, para ocupar as diferentes margens do caminho, para sair delas também e buscar outras vias ou cair em sono profundo como a Bela Adormecida. É tão intenso o que o estado de tontice provoca que quando o tonto acorda do sono profundo nem sempre lembra o que fez, o que disse, por onde andou e o que sentiu, mas o que fez, o que disse e o

1 Fragmento do poema “Retrato quase apagado em que se pode ver perfeitamente nada” do livro O guardador de águas (1989), republicado na obra Poesia Completa - Manoel de Barros (2010).

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que sentiu já não estão mais só nele, estão também com quem assumiu o papel de ouvinte/leitor enquanto o estado de tontice acontecia.

Em um processo de criação e produção de conhecimento, penso que o estado de tontice é fundamental para se sair do óbvio, do lugar comum e flertar com o inesperado. Fui tomada por lampejos de tontices enquanto me movimentei (por inteira) para assentar as palavras nas folhas em branco da tese, enquanto li, reli, escrevi e reescrevi essa história sobre os currículos praticados com bebês.

“Nós estamos falando! E vocês, estão nos escutando?” Ao colocar na primeira linha do título desta tese uma frase exclamativa-interrogativa sem a presença explícita do sujeito já anuncio, de certa forma, uma provocação de grupo de profissionais que produzem e praticam o currículo com os bebês no cotidiano, mas que pouco são escutados, de verdade, nos processos decisórios de formulação das políticas públicas e de elaboração de diretrizes educacionais para a Educação Infantil. Esses profissionais são os professores2 que exercem a docência na primeira etapa da

Educação Básica, especialmente, aqueles que trabalham com os bebês.

A escuta do que professores da Educação Infantil têm a dizer é uma das condições importantes para quem pretende compreender o currículo a partir do cotidiano escolar. Aqueles que vivem e fazem o currículo na escola são possuidores de informações e saberes preciosos. Todavia, esses saberes quando anunciados por quem está “na prática” parecem perder valor e relevância político-pedagógica tanto no cenário local como no nacional. É como se a fala do professor, especialmente o que trabalha com bebês, pronunciada em diferentes instâncias não provocasse interesse no ouvinte. É preciso “[...] assegurar que a voz do professor seja ouvida, ouvida em voz alta e ouvida articuladamente”, diz Goodson (1992, p. 67) em seu texto “Dar voz ao professor: histórias de vida dos professores e o seu desenvolvimento profissional”.

Por outro lado, quando o que é dito pelos professores é anunciado por terceiros, como aqueles que adentram a escola para realizar estudos e pesquisas, o eco da fala desses profissionais da educação parece penetrar espaços mais longínquos com a socialização dos resultados de investigações científicas realizadas com os professores. É uma espécie de terceirização da fala do professor legitimada, às vezes,

2 Na escrita da tese adotei a expressão “professores” para me dirigir aos professores da Educação Infantil e dos demais segmentos da Educação Básica e o termo “professoras” para falar sobre as docentes integrantes da pesquisa.

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por ele próprio que autoriza, verbalmente ou por escrito, que as suas narrativas sejam narradas por outrem sob a forma de artigos, ensaios, relatórios, palestras etc. Nas palavras de Certeau (2013), esses professores seriam locatários e não proprietários de seu próprio saberfazer.

O que essa situação me permitiu refletir? Noto que o valor e o eco da fala de um professor na sociedade estão relacionados à sua valorização, reconhecimento e prestígio social. Quanto mais “renomado” é o professor, mais relevância tem o que ele diz. O professor da Educação Infantil, principalmente aquele que trabalha com bebês, ainda não tem o mesmo reconhecimento dos professores dos demais segmentos da Educação Básica e do Ensino Superior, a sua fala ainda não é escutada, de fato, quando pronunciada por esses profissionais.

Destaco as expressões “de verdade” e “de fato” porque acredito que escutar verdadeiramente tem um sentido mais amplo do que acolher o que o professor disse, é refletir sobre o que foi escutado no bojo das políticas públicas, objetivando o planejamento e a execução de ações concretas para a melhoria das condições de trabalho, para potencialização de processos formativos, para a resolução de problemas e para valorização de ações pedagógicas e da carreira desse profissional. E quem está interessado nas experiências e narrativas de professores que trabalham com bebês? Por que as narrativas dos professores que trabalham com criança ainda produzem pouco eco na sociedade brasileira?

Se o professor não tem a formação específica para trabalhar com os bebês, é porque o tempo dessa formação e o ingresso dos bebês na escola não acontecem concomitantemente. De um modo geral, primeiro, os bebês são matriculados e passam a frequentar uma escola de Educação Infantil (Berçário)3, e, somente depois,

quando acontece, o estado propõe algum tipo de ação formativa para esses docentes que trabalham com bebês. Exigir do professor que ele tenha uma formação específica para a ação pedagógica com bebês, sem que o estado garanta as condições

3 Na escrita do texto adotei, intencionalmente, o uso do termo Educação Infantil (Berçário), ao invés de Berçário. O uso da expressão Educação Infantil (Berçário) é para firmar que os bebês que frequentam as escolas para crianças integram a Educação Infantil e que o profissional responsável pela ação pedagógica é o professor. A afirmação da unidade e da identidade da Educação Infantil como primeira etapa da Educação Básica torna-se fundamental nos dias atuais, pois a cisão entre creche (zero a três anos) e pré-escola (quatro a seis anos de idade) vem sendo cada vez mais ameaçada com projetos de lei e ações que aproximam a creche das políticas da infância e a pré-escola da escolarização precoce das crianças. Além disso, porque ainda ouço também discursos que situam a creche como outra etapa da educação, fora da Educação Infantil. Quando me refiro aos bebês no texto, estou falando de crianças de até 18 meses de idade. Essa referência consta nos Indicadores da Qualidade na Educação Infantil, elaborado pelo Ministério da Educação (BRASIL, 2009a).

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necessárias, é atribuir ao docente uma responsabilidade individual pela sua formação, eximindo o estado de assumir o seu papel constitucional que é de assegurar uma educação de qualidade para todos. Esse é um dos princípios das políticas neoliberais e neoconservadoras que vêm se aprofundando no Brasil com as ações do governo atual. No caso desta pesquisa, as professoras querem se atualizar e construir conhecimentos sobre os bebês e seus processos de desenvolvimento, e sobre a educação de bebês para exercer a docência com crianças de até 18 meses de idade com qualidade, como mostram suas narrativas.

No Brasil, do ponto de vista legal, o professor da Educação Infantil passou a ser considerado como professor da Educação Básica, em 1996, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) n° 9394/96, que inseriu a Educação Infantil como primeira etapa deste nível de ensino. Essa modificação da LDBEN foi, sem dúvida, uma conquista político-epistemológica de movimentos sociais, pesquisadores e entidades sindicais que lutaram (e continuam lutando), incansavelmente, pela garantia do direito à educação para todas as crianças brasileiras e pela organização da Educação Infantil como um campo de atuação profissional e de produção de conhecimento.

O fato de o professor da Educação Infantil ter sido incluído, há 21 anos, na legislação educacional, como professor da Educação Básica, não quer dizer que esse profissional seja assim reconhecido nas relações de trabalho estabelecidas no cotidiano de instituições de ensino, públicas e privadas, de pequeno e de grande porte, localizadas nas capitais e nos demais municípios brasileiros.

O cotidiano tem mostrado que ser professor da Educação Infantil ainda não é sinônimo de ser professor da Educação Básica. E isto se deve ao fato de que o professor da Educação Infantil, dentre os professores da Educação Básica, é o profissional que tem parcas condições de trabalho para o exercício da docência, que é menos reconhecido e valorizado pelos seus próprios pares, pelos empregadores e pela sociedade, que possui relações de trabalho mais precarizadas, com os menores salários, com maior jornada de trabalho semanal com as crianças em sala, que mais sofre assédio moral, principalmente nas escolas em que as relações profissionais são substituídas por relações caseiras, autoritárias e arbitrárias. De acordo com Hypolito (2012, p. 219), “é um processo de precarização intenso que afeta a carreira, adia concursos, fragmenta a categoria, impõe rebaixamentos salariais e cria um exército de reserva pronto para assumir as funções docentes”.

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E Hypolito (2012, p. 219) diz mais:

Na Educação Infantil, por meio de instituições conveniadas, pode-se encontrar inúmeras situações graves desse tipo de precarização do trabalho docente e dessas formas de privatização. Como esta é uma área educacional com baixa cobertura pública, tende a ser ampliado o serviço, e tudo indica que é uma área mais vulnerável ao crescimento dessas formas de privatização.

Todos esses elementos, construídos historicamente e ainda presentes na sociedade atual, colocaram o professor, ou melhor, a professora da Educação Infantil (porque os homens nesse segmento ainda são muito poucos) no lugar de um profissional menos importante e com pouco prestígio social na sociedade. A docência na Educação Infantil ainda carrega as marcas deixadas por uma concepção de magistério associada à condição feminina, à assistência, ao cuidado e à socialização da criança (KRAMER, 2005).

Esse binômio - ser mulher e trabalhar com criança -, construído socialmente, está tão enraizado no modo de a sociedade conceber a docência na Educação Infantil que, hoje, mesmo com o avanço da legislação educacional vigente e com a definição de diretrizes e orientações para esse segmento, ainda se questiona a Educação Infantil como primeira etapa da Educação Básica, como campo de atuação profissional e como campo de conhecimento.

A docência é muito complexa e essa complexidade encontra-se tanto na Educação Infantil como nos demais segmentos da Educação Básica. A docência é uma ação educativa intencional, marcada por princípios políticos, éticos e estéticos, que se concretizam na relação entre sujeitos, que buscam construir, de forma articulada e contextualizada, conhecimentos de diferentes campos.

A docência, dentre outros elementos, envolve escutar, aprender, ensinar, planejar, estudar, refletir sobre a prática, interpretar, documentar, avaliar, produzir conhecimentos e acompanhar o desenvolvimento e a aprendizagem das crianças/estudantes, seja na condição de professor de bebês na Educação Infantil, seja na de professor de adolescentes e jovens no Ensino Médio.

Ser professor e exercer a docência na Educação Infantil não é mais “fácil” e não dá “menos” trabalho, como muitos pensam. A construção desse olhar “equivocado” para com o trabalho do professor de bebês, mesmo sendo histórico, pode ser ressignificado, pois o professor da Educação Infantil é professor da Educação Básica.

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A proposta aqui nesta pesquisa foi dar a palavra à professora da Educação Infantil (Berçário) para compreender os currículos praticados com bebês. Nessa perspectiva, concordo com o que dizem Alves, Berino e Soares (2012, p. 50): “quando se pretende discutir como os currículos acontecem, o melhor é considerar todos os seus “praticantes” (CERTEAU, 1994), para além da análise de imagem fixada da “grande política”, a política dita “oficial”.” O professor é um dos praticantes e fabricantes do currículo e sua voz deve ser escutada, pois [...] “é na vida das escolas que são tecidos seus conteúdos mais substantivos, porque praticadospensados nos processos pedagógicos cotidianos.” (ALVES; BERINO; SOARES, 2012, p. 50). (grifo dos autores).

Na segunda parte do título desta tese - Currículos praticados com bebês: professoras com a palavra - fica explícito o meu objeto de estudo e quem é o sujeito do qual estou falando. Falo do currículo vivido e experienciado no cotidiano da escola de Educação Infantil pelos bebês e suas professoras. Ao falar de currículo praticado com bebês compreendo que estou tratando também do currículo na Educação Infantil tecido tanto no campo das políticas de Estado como no campo das micropolíticas que se traduzem no cotidiano de cada instituição de Educação Infantil com seus sujeitos. (ALVES; BERINO; SOARES, 2012). Ao fazer a opção, político-pedagógica e epistemológica, de investigar os currículos praticados com bebês, reconheço a complexidade do tema e assumo um posicionamento, como pesquisadora, de escutar, de forma ética, comprometida e sensível, a palavra das professoras que exercem a docência com esses seres humanos bem pequenos. As narrativas dessas profissionais sobre os currículos praticados com bebês têm sua relevância tanto nas discussões acadêmicas da área como na formulação de políticas públicas para a Educação Infantil no Brasil.

A escolha desse objeto de estudo, currículos praticados com bebês, no nível do Doutorado, vem também da minha itinerância pessoal e profissional. No âmbito pessoal, há alguns anos, me dei conta de que não tive o direito de frequentar nem a creche, nem a pré-escola. No município onde nasci inexistiam escolas de Educação Infantil e as crianças ingressavam na escola aos 7 anos de idade. Isso parecia muito natural para aquele momento histórico. Praticamente, não se falava em Educação Infantil e só tempos depois é que fui compreender que essa etapa da Educação Básica era uma espécie de artigo de luxo, acessado, especialmente, por crianças moradoras das grandes cidades e pertencentes a um determinado grupo social, a elite brasileira,

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pois as crianças da classe popular raramente tinham o direito de frequentar a creche e/ou a pré-escola.

No âmbito profissional, como professorapesquisadora militante, estou implicada com a formação (inicial e continuada) de professores, com pesquisas, projetos e ações no campo da infância e da Educação Infantil em nível local, estadual e nacional, bem como com a militância em movimentos sociais específicos de Educação Infantil.

A minha experiência como docente do ensino superior, no curso de Licenciatura em Pedagogia, com diferentes grupos de estudantes, tem me levado a confirmar a necessidade da ampliação de estudos e pesquisas sobre a Educação Infantil em suas diversas dimensões, principalmente sobre a educação de bebês. São muitas inquietações, perguntas e relatos feitos pelos estudantes que vão desde: o que é o currículo? Como se organiza o currículo da Educação Infantil? Como se organiza um currículo para bebês? Quem participa da elaboração do currículo da Educação Infantil? Existem conteúdos no currículo da Educação Infantil? Quais são os conteúdos do currículo para bebês? Qual é o lugar do bebê no currículo da Educação Infantil? Por que o que a gente estuda na universidade sobre currículo da Educação Infantil é uma coisa e na prática é outra? Essas e tantas outras questões revelam o desejo de saber, a dúvida, o desconhecimento dos estudantes, mas também apontam pistas que podem ser consideradas na construção dos objetos de estudo no campo da Educação Infantil e de seu currículo.

Como militante em defesa da Educação Infantil, a minha itinerância vem desde a época de estudante da graduação, mas o meu engajamento com o Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (MIEIB) e com o Fórum Baiano de Educação Infantil (FBEI) começou no início dos anos 2000. A minha participação nesses espaços

políticoformativos tem sido fonte de estudo, de formação, de descobertas, de

aprendizagens, de afirmação de posicionamentos e de indagações, como os que apresento nesta tese.

Outra ação que também me fez decidir pelo objeto currículos praticados com bebês foi quando, em 2012, integrei a equipe de pesquisadores da Consulta sobre Discriminação na Educação da Primeira Infância realizada em três países (Brasil, Colômbia e Peru), uma iniciativa da Campanha LatinoAmericana pelo Direito à Educação (CLADE). No Brasil, essa consulta foi realizada na Bahia e no Ceará. Assumi a pesquisa no estado da Bahia com uma equipe de cinco estudantes. Nessa consulta tive a oportunidade de usar dinâmicas para a escuta de crianças de 5 anos

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de idade, que frequentavam a pré-escola em instituições públicas de Educação Infantil. Em um dos grupos analisados, pude observar que as crianças, sujeitos

praticantes do currículo, produzem, reinventam esse currículo para ocupar o lugar de

ser criança e viver a infância nesse cotidiano, às vezes, massacrante e pouco interessante para quem aprende e se desenvolve com seus múltiplos sentidos e capacidades. Se as crianças da pré-escola driblavam o currículo prescrito para tecer outros currículos no cotidiano da escola por meio de suas ações e relações, como seria com os bebês com suas professoras?

Outra experiência importante para a escolha deste objeto de estudo foi a minha participação, em 2012, na Pesquisa Nacional “Caracterização das práticas educativas com crianças de zero a seis anos moradoras nos territórios rurais brasileiros”, um projeto de cooperação entre o Ministério da Educação e a Universidade Federal do Rio Grande de Sul. Nessa pesquisa, tive a oportunidade de observar e dialogar com crianças, docentes e gestores da Educação Infantil do campo e da zona urbana para conhecer as práticas educativas, a partir do ponto de vista desses sujeitos. Os estudos sobre os aspectos teórico-metodológicos e éticos da pesquisa foram importantes para a ampliação de meus referenciais como pesquisadora na área da Educação Infantil e para a compreensão de que o currículo da Educação Infantil é um campo de disputas político-pedagógicas e de que as professoras têm muito a contribuir com a formulação dos desenhos curriculares e com as políticas públicas para a educação.

De 2012 a 2015, coordenei, em parceria com a professora Maria Izabel Souza Ribeiro, o Projeto Assessoramento e acompanhamento pedagógico aos municípios

contemplados pelo Proinfância no estado da Bahia, um projeto de cooperação entre

o Ministério da Educação (MEC) e a Universidade Federal da Bahia. O principal objetivo desse projeto, que teve como unidade executora a Faculdade de Educação da UFBA, foi assessorar técnica e pedagogicamente 237 municípios baianos que aderiram ao Programa Nacional de Reestruturação e Aparelhagem da Rede Escolar Pública de Educação Infantil (Proinfância), criado pelo Ministério da Educação, por meio da Resolução nº 6, de 24 de abril de 2007. As principais ações desse Projeto foram: estudo sobre a Educação Infantil em municípios baianos contemplados pelo Proinfância; Visitas técnicas e encontros de orientação/formação para o acompanhamento do desenvolvimento do Proinfância na Bahia; Divulgação dos resultados das ações do Projeto (publicação do livro “Educação Infantil: os desafios estão postos! E o que estamos fazendo?”). No âmbito do referido Projeto realizei com

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a equipe uma pesquisa de Avaliação Diagnóstica Caracterização da Educação Infantil

no estado da Bahia. Esse estudo foi desenvolvido no período de julho a outubro de

2013 em duas etapas. A primeira etapa foi quantitativa e envolveu 237 municípios baianos. A segunda etapa foi qualitativa e abarcou 10 municípios com unidades do Proinfância em funcionamento. Resultados dessa pesquisa foram publicados no livro citado anteriormente. É importante destacar que o tema currículo da Educação Infantil foi central nesse estudo científico e que este evidenciou aspectos que também abordei aqui nesta tese de doutorado.

Outra ação que também teve influência na tessitura do objeto de estudo foi a minha imersão nas atividades do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Infantil, Crianças e Infâncias (GEPEICI)/EPIS: leituras a partir da Pedagogia, da Psicologia e da Filosofia. O GEPEICI, criado em julho de 2013, realiza estudos e pesquisas, numa perspectiva crítico-colaborativa, sobre a Educação Infantil, crianças e infâncias, com ênfase nos seguintes eixos: infâncias e culturas da infância; currículo, proposta pedagógica, múltiplas linguagens da criança e prática educativa; linguagem oral e escrita na Educação Infantil; educação de bebês e crianças pequenas em escolas de Educação Infantil; docência, formação e atuação dos profissionais da educação infantil; legislação e políticas públicas para Educação Infantil. Nos últimos anos, o GEPEICI elegeu o tema da educação dos bebês para o desenvolvimento de estudos e pesquisas. Esta tese de Doutorado insere-se nesse contexto.

Estar hoje como docente da Universidade Federal da Bahia, na cadeira de Educação Infantil, no Curso de Licenciatura em Pedagogia, é um privilégio, mas é também uma grande responsabilidade, pois a Educação Infantil, tanto em nível da graduação como da pós-graduação, ainda carece de mais visibilidade e de investigações científicas. Esta pesquisa faz parte do caminho que já iniciamos na Faculdade de Educação da UFBA para dar outro status epistemológico à Educação Infantil e à formação dos professores que vão exercer a docência com crianças de zero a seis4 anos de idade.

Os estudos sobre a Educação Infantil em suas diferentes dimensões e as experiências do meu itinerário formativo e profissional me moveram para a realização

4 Nesta tese, considerei a faixa etária da Educação Infantil como sendo de 0 a 6 anos de idade, pois a Resolução n° 01/2010 do Conselho Nacional de Educação (CNE)/Câmara de Educação Básica (CEB) define que as crianças que completam 6 anos de idade, após a data de corte etário para ingresso no 1º ano do Ensino Fundamental (31 de março do ano a ser cursado), devem ser matriculadas na Educação Infantil (pré-escola).

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desta pesquisa sobre os currículos praticados com bebês. Os problemas formulados para o desenvolvimento desta investigação foram: que currículos são praticados pelas professoras e bebês no cotidiano de escolas de Educação Infantil (Berçário)? O que professoras da Educação Infantil (Berçário) nos contam sobre os currículos praticados com os bebês?

O objetivo geral da pesquisa foi engendrar reflexões, por meio das narrativas de professoras, sobre currículos praticados com bebês no cotidiano de escolas de Educação Infantil (Berçário) da Rede Municipal de Ensino de Salvador e suas interfaces com as políticas públicas educacionais e a docência com bebês. Este escopo principal está articulado com quatro objetivos específicos:

1. Compreender como as professoras organizam, experienciam e documentam a ação pedagógica com os bebês.

2. Caracterizar como as professoras compreendem os bebês no contexto dos currículos praticados em escolas de Educação Infantil (Berçário).

3. Levantar elementos para reflexão sobre como e porque a ação pedagógica com os bebês é planejada e praticada no cotidiano de escolas de Educação Infantil (Berçário).

4. Identificar o que inspira e nutre a ação pedagógica das professoras no exercício da docência com bebês.

O delineamento e a compreensão dos objetivos supracitados se circunscreveram na defesa da tese de que os currículos praticados com bebês se tornam currículo mediante a ação humana, as relações empreendidas entre os sujeitos que estão na escola e as condições materiais e não materiais ofertadas pelo estado para o exercício da docência com os bebês.

Parti do princípio de que o currículo sem a ação entre humanos na escola (presencial ou à distância) não é currículo, como descrevi no exemplo abaixo: construa uma escola, monte-a com o que há de mais moderno de mobiliário, de equipamentos e de materiais, instale o que há de mais atual de tecnologia, imprima um documento chamado currículo escolar elaborado por seres humanos e deixe lá em algum lugar da escola, mas não matricule crianças e não contrate professores e outros profissionais da educação para trabalhar. Monte um laboratório com máquinas potentes, desenvolva plataformas online com capacidades gigantes de interatividade e armazenamento de informações, contrate serviços de internet de última geração, imprima um documento chamado currículo escolar elaborado por seres humanos e

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deixe lá em algum lugar desse local, mas não matricule estudantes, não contrate professores e outros profissionais da educação para trabalhar. Entregue essas construções chamadas de escola ao tempo e acompanhe para ver que currículo será concretizado nessa escola. Nesse cenário, nenhum currículo se concretizará, seu destino é permanecer nas letras, palavras e textos adormecidos nas páginas de papel. As concepções, os princípios, as matrizes curriculares, os objetivos, os conteúdos e as metodologias escritos no documento chamado de currículo escolar serão cobertos pela poeira e o papel, possivelmente, se transformará em alimento para traças. O currículo sem a ação do ser humano entre humanos não tem vida, nada mais é do que uma pretensão de quem o escreveu. No âmbito da educação, essa ação humana que acontece na escola para tornar o currículo currículo se traduz no exercício da docência. Docência exercida por um ser humano (professor) e que acontece na relação entre seres humanos (estudantes e professores).

Aqui nesse estudo compreendo o currículo como trançamentos de conhecimentos, saberes, experiências, relações, subjetividades, espaços-tempos e materiais experienciados no cotidiano da escola por professores e bebês, numa interlocução com as famílias, com os diferentes profissionais da escola e com outras instituições da sociedade. E currículo praticado como conhecimentos, saberes, experiências, subjetividades, espaços-tempos e materiais que já foram trançados pelos professores e bebês por meio de suas ações e relações no cotidiano da escola de Educação Infantil. Praticado no sentido de sujeitos praticantes do currículo. Praticado no sentido de feito, vivido, experienciado e narrado pelos professores.

A expressão “currículo praticado” no título do projeto de qualificação e nas Tertúlias Narrativas foi usada no singular porque entendo que cada escola de Educação Infantil produz o seu currículo. Na versão final da tese, essa compreensão foi reiterada pelas narrativas das seis professoras que trabalham com bebês em três Centros Municipais de Educação Infantil de Salvador. Estas mostram a multiplicidade de referências, de conhecimentos e de resoluções de problemas que acontecem na ação pedagógica com os bebês, levando-me a incorporar na tese a expressão “currículos praticados” no plural.

O que vi foram currículos praticados com bebês no plural. Cada escola de Educação Infantil tem um currículo constituído de micro currículos produzidos em cada grupo de bebês. Pluralizar o termo currículo é reconhecer “a multiplicidade de soluções que aparecem nos cotidianos das redes educativas que formamos e que nos

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formam” (ALVES, 2012, p. 35). Penso que não somente as soluções, mas reconhecer a abundância de conhecimentos construídos pelas diferentes gerações que estão na escola e os diversos modus operandi do ato pedagógico com os bebês.

O enredamento teórico sobre currículos praticados com bebês, cotidiano, vida cotidiana, narrativa, docência, ação pedagógica com os bebês foi tecido numa perspectiva multirreferencial, com a contribuição de autores filiados a diferentes campos de conhecimento (Pedagogia, Psicologia, Filosofia, Sociologia, História e Antropologia), dentre eles, as professoras integrantes da pesquisa. As reflexões e conclusões sobre os currículos praticados com bebês intercruzaram-se com diálogos sobre currículo, cotidiano, vida cotidiana, narrativa (Certeau, (2013), Alves (2012), Apple (2006), Goodson (1995, 2007), Lefebvre (1991), Ricoeur (2009), Benjamin (2012), Barbosa (2009; 2010), Macedo (2012), Penin (2011), Heller (2004)); docência (professoras, bebês e ADI) (Rosemberg (2015), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Pedrosa (2009), Gonzalez-Mena e Eyer (2014), Barbosa e Richter (2014), Falk (2011), Edwards; Gandini; Forman (1999), Rinaldi (2016), Oliveira (2005; 2010), Cerisara (2002), Tardif (2002), Tardif e Lessard (2005), Martins Filho (2013), Martins Filho e Delgado (2016), Heidegger (1998), Campos (2011), Rosemberg (2011), Gatti (2010), Côco (2010), Druck (2015); planejamento, observação, documentação pedagógica, interpretação e especificidades da ação pedagógica com os bebês (Tardos (2016; 2016a), Rinaldi (2016), Martins (1998), Freire (1997; 1998), Barbosa (2006), Falk (2016), Tardos e Szanto-Feder (2011), Leite (2014), Vigotsky (2014), Castoriadis (1999), Vasconcellos (2000), Libâneo (2004), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Dahlberg (2016), Fabrés (2011), Gonzalez-Mena e Eyer (2014)).

Do ponto de vista do teórico-metodológico, a pesquisa em si, o método, os procedimentos e instrumentos alinharam-se, principalmente, às reflexões feitas por Ricoeur (2009), Benjamin (2012), Certeau (2013) e Bruner (2003) sobre narrativa. Para esses autores, o ato de narrar é o que nos torna humanos e nos possibilita deixar como herança, para os que virão depois de nós, lições e conhecimentos que possibilitem a construção de uma humanidade mais humana, ética, solidária e amorosa com a vida de cada ser vivo. Narrar significa contar histórias e todo sujeito tem uma vida cheia de histórias, tecidas nas experiências vividas no cotidiano em diferentes espaços e tempos, para narrar. Portanto, escutar as narrativas das professoras no âmbito da pesquisa significou reconhecê-las, primeiro, como sujeitos que têm histórias para contar e, segundo, como profissionais da educação que

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exercem a docência com um grupo de crianças, os bebês, em um estado que pouco tem feito para garantir as condições de trabalho e de desenvolvimento dos bebês com qualidade no cotidiano da escola de Educação Infantil. São histórias constituídas de saberes, afetos, resistências, angústias e esperança sobre a vida, a humanidade e a educação dos bebês.

A pesquisa teve um caminho narrativo composto de Tertúlias Narrativas e diferentes procedimentos e instrumentos. As Tertúlias Narrativas constituíram-se em “achadouros” de palavras, em lugar de encontro entre professoras e entre a pesquisadora e professoras, no qual as docentes relataram suas histórias sobre os currículos praticados com os bebês, escutaram as narrativas de outras professoras, tiveram seus gestos, expressões, palavras e silêncios acolhidos e tensionados, ampliando suas experiências como narradoras-ouvintes. Para escutar as seis professoras que exerciam a docência com bebês, em 2016, nos três Centros Municipais de Educação Infantil de Salvador, adotei três tipos de instrumentos no contexto das Tertúlias Narrativas: os instrumentos de registro (caderno de anotações, relatos escritos feitos pelas professoras, gravadores de áudio (celular e gravador de voz), máquina fotográfica e filmadora), o instrumento de mediação (cesto de tesouros) e o instrumento de síntese (cesto de palavras). Cada um desses instrumentos foi descrito no Capítulo 2 com as incursões teóricas feitas nesta investigação.

O estudo desenvolvido possui características da abordagem qualitativa, do tipo descritiva, e o método de investigação foi sendo tecido no caminho narrativo com as narrativas das professoras. A nomeação do tipo de pesquisa e do método de investigação encontram-se mais na estrutura lógica daquilo que fiz, descrevi, refleti e concluí sobre o que escutei das narrativas das professoras que trabalham com bebês e na minha imersão na literatura estudada, algumas aqui citadas e tantas outras que ficaram no patamar da inspiração, do que na nomeação em si do tipo de pesquisa e de método. O caminho narrativo desta pesquisa com seus procedimentos e instrumentos expandiu-se, transformando-a também em um espaço formativo, como relataram as professoras em suas narrativas.

Inspirada nos estudos sobre currículo e cotidiano das professoras Nilda Alves (2012) e Inês Barbosa de Oliveira (2012), escrevi alguns termos juntos (saberfazer, viverfazer,aprenderensinar, professorapesquisadora, políticoformativo, outromundo...) por entender que eles são indissociáveis e dão mais sentido ao conteúdo da pesquisa.

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A tese, além dos elementos pré e pós-textuais, foi estruturada em seis capítulos. Cada capítulo foi escrito de modo que as narrativas das professoras fossem enredadas na minha narrativa, preservando as singularidades e a riqueza de sentidos de cada uma delas, mas também fazendo reflexões e diálogos com autores filiados em diferentes campos de conhecimento, dentre eles: a Pedagogia, a Filosofia, a Sociologia, a Antropologia, a História e a Psicologia.

Este capítulo nomeado de “Primeiras palavras” apresenta ao leitor uma visão panorâmica da tese. Nele está situado e justificado o objeto de estudo, apresentado o problema, os objetivos gerais e específicos, assim como as influências teórico-metodológicas trazidas na tese e alguns indícios das conclusões da pesquisa. Nesse capítulo encontra-se também o texto “Entre o Mar, o Ar, a Oliveira e os Santos”, no qual ponho-me diante de mim na feitura da tese para brincar de ser poeta. No segundo capítulo ““Achadouros” da pesquisa: palavras de um caminho narrativo” descrevo o caminho teórico-metodológico, apresentando os procedimentos e os instrumentos, as professoras integrantes da pesquisa, as Tertúlias Narrativas em si, e finalizo com a discussão sobre as Tertúlias Narrativas como um potente dispositivo para a formação continuada. Nesse texto transitei pelas ideias e concepções de Amorim (2004), Geertz (2012), Castoriadis (1999), Benjamin (2012), Ricoeur (2009), Bruner (2003), Goldschmied; Jackson, (2006).

No terceiro capítulo “Currículos: o feito e a ser feito”, matizado por um olhar crítico e em conexão com as políticas públicas para a educação, apresento uma definição sobre o que nomeei na tese de “currículos praticados” e discuto concepções de currículo - o currículo prescrito, o currículo com identidade narrativa e o currículo produzido no cotidiano e na vida cotidiana da escola - numa interlocução com as narrativas das professoras e com autores, como Certeau, (2013), Alves (2012), Apple (2006), Goodson (1995; 2007), Lefebvre (1991), Ricoeur (2009), Benjamin (2012), Barbosa (2009; 2010), Macedo (2012), Penin (2011), Sá (2015), Heller (2004).

O quarto capítulo “Praticantes de currículos: os bebês, as professoras e as Auxiliares de Desenvolvimento Infantil” foi dedicado aos bebês, às professoras, à docência por elas exercida com crianças de até 18 meses de idade, e às ADI5. Nesse

capítulo falei da chegada dos bebês à escola, dos encontros entre os bebês e as

5 Na escrita da tese adotei a expressão “o/s ADI” para me dirigir aos Auxiliares de Desenvolvimento Infantil em geral e o termo “a/s ADI” para falar sobre as ADI que trabalham nos CMEIs representados pelas professoras nesta pesquisa.

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professoras no exercício da docência, afirmando que é uma docência interpretativa-relacional, bem como das ADI como parceiras das professoras e profissionais reconhecidas como importantes na ação pedagógica com os bebês, mas ainda inviabilizadas no contexto da Educação Infantil. Tratei ainda das tensões e desafios que matizam a identidade e a função docente das professoras e das ADI. Para tanto, recorri ao pensamento de alguns estudiosos: Rosemberg (2015), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Pedrosa (2009), Gonzalez-Mena e Eyer (2014), Barbosa e Richter (2014), Falk (2011), Edwards; Gandini; Forman (1999), Rinaldi (2016), Oliveira (2005; 2010), Cerisara (2002), Tardif (2002), Tardif e Lessard (2005), Martins Filho (2013), Martins Filho e Delgado (2016), Heidegger (1998), Campos (2011), Rosemberg (2011), Gatti (2010), Côco (2010), Druck (2015).

No quinto capítulo “A micropedagogia em currículos praticados com bebês” amplio e aprofundo as discussões sobre a temática em questão, tornando públicos detalhes de currículos praticados com os bebês captados das narrativas das professoras. Esse capítulo foi organizado em cinco subcapítulos: um dia de currículos praticados com bebês; experiências significativas para professoras e para bebês nos currículos praticados; narrativas sobre os livros, as histórias e os bebês; o planejamento da ação pedagógica em currículos praticados com bebês; e observar, interpretar, documentar e narrar em currículos praticados com bebês. Cada texto foi escrito em diálogo com as docentes e com os autores referentes aos respectivos temas, como Tardos (2016; 2016a), Rinaldi (2016). Martins (1998), Freire (1997; 1998), Barbosa (2006), Falk (2016), Tardos e Szanto-Feder (2011), Leite (2014), Vigotsky (2014), Castoriadis (1999), Vasconcellos (2000), Libâneo (2004), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Dahlberg (2016), Fabrés (2011), Gonzalez-Mena e Eyer (2014).

O sexto e último capítulo “Um ponto final” foi o texto em que busquei guardar nas palavras conhecimentos tecidos a partir da escuta das vozes das professoras, ecoadas de suas potentes e corajosas narrativas, para colocar um ponto final no texto da tese. Esse ponto final não significa o encerramento das reflexões sobre os currículos praticados com bebês; ao contrário, é um sinal gráfico posto depois da última palavra do texto dissertativo que abre outros caminhos, projetos e “inventuras” no campo da Educação Infantil e da educação de bebês na Bahia e no Brasil.

Como disse no início deste texto, fui tomada por alguns lampejos de poetices enquanto escrevia a tese. Eu gostei de ser lampejada pela poesia enquanto escrevia sobre os currículos praticados com bebês, porque como diz Manoel de Barros (2010)

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“escrever o que não acontece é tarefa da poesia”. Como não sou poeta de nascença, escrevi mais sobre coisas acontecidas, mas alguns lampejos de poetices ficaram aí esparramados pela tese, como esse a seguir.

1.1 ENTRE O MAR, O AR, A OLIVEIRA E OS SANTOS

Sempre gostei de ficar olhando os nomes que tem dentro dos nomes. Tem tantos nomes dentro dos nomes. É nome que esconde outro nome. É nome que dá nome a outro nome. É nome criado de outros nomes. É nome com dois nomes. É nome com um nome só. É nome esquecido. É nome lembrado. É nome estrangeiro. É nome em português. É nome de quem nasceu sem nome. No fim das contas tudo é nome. É tanto nome que chega a ser igual ou mais que as estrelas no céu quando o sol vai brilhar em outro lugar.

Quando inventei de olhar os nomes, o que tinha dentro do meu nome, encontrei o mar, o ar, a oliveira6 e os santos. Ah! Ficou de fora “lene” que por uma letra não é

“leme”, a direção que eu preciso, de vez em quando, para não me perder tanto nas minhas andanças por dentro e por fora de mim.

Como se não bastasse olhar o que tinha dentro de cada nome, também fiquei tentando adivinhar o que significava cada nome e o que eles tinham a ver comigo, ou melhor, o que eu tinha a ver com eles. Até hoje tenho adivinhação para fazer. Como não vai dar para adivinhar tudo agora, eu vou traduzir o que eu adivinhei assim: O mar que tem dentro de meu nome

É sinal de quê? Me ensina o quê?

Metade de mim é esparramada Metade de mim é limitada Metade de mim é buliçosa

6 A oliveira (nome científico Olea europaea L.) é uma árvore da família das oleáceas. Seu nome provém do

latim oliva, que por sua vez vem do grego λαία (eléa), em última análise a partir de grego micênico e-ra-wa (elaiva) ou óleo. De seus frutos, as azeitonas, os homens no final do período neolítico aprenderam a extrair o azeite. Este óleo era empregado como unguento, combustível ou na alimentação, e por todas estas utilidades, tornou-se uma árvore venerada por diversos povos. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Oliveira

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Metade de mim é quieta Metade de mim é fluidez Metade de mim é rigidez Metade de mim é fortaleza Metade de mim é fraqueza Metade de mim é movimentada Metade de mim é parada

Metade de mim é determinação Metade de mim é frustração Metade de mim é profunda Metade de mim é rasa

Metade de mim é transparente Metade de mim é opaca

São tantas metades que se juntam com outras metades e outras metades, mas Metade de mim é o que eu já adivinhei

Metade de mim é o que ainda não adivinhei e a outra

Metade de mim é a que quer continuar brincando de adivinhar O ar que tem dentro de meu nome

É sinal de quê? Me ensina o quê?

Metade de mim é expiração Metade de mim é inspiração Metade de mim é vitalidade Metade de mim é languidez Metade de mim é invisível Metade de mim é visível Metade de mim é pesada Metade de mim é leve Metade de mim é expansão Metade de mim é restrição Metade de mim é cheia Metade de mim é vazia Metade de mim é vida

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Metade de mim é morte

São tantas metades que se juntam com outras metades e outras metades, mas Metade de mim é o que eu já adivinhei

Metade de mim é o que ainda não adivinhei e a outra

Metade de mim é a que quer continuar brincando de adivinhar A oliveira que tem dentro de meu nome

É sinal de quê? Me ensina o quê?

Metade de mim é amargo Metade de mim é doçura Metade de mim é brava Metade de mim é refinada Metade de mim é única Metade de mim é diversa Metade de mim é acidez Metade de mim é delicadeza Metade de mim é frieza Metade de mim é afeto Metade de mim é tradição Metade de mim é renovação Metade de mim é sensível Metade de mim é insensível Metade de mim é passado Metade de mim é presente

São tantas metades que se juntam com outras metades e outras metades, mas Metade de mim é o que eu já adivinhei

Metade de mim é o que ainda não adivinhei e a outra

Metade de mim é a que quer continuar brincando de adivinhar Os santos que tem dentro de meu nome

É sinal de quê? Me ensina o quê? Metade de mim é fé

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Metade de mim é fé também Metade de mim é sagrado Metade de mim é profano Metade de mim é alegria Metade de mim é tristeza Metade de mim é coragem Metade de mim é medo Metade de mim é encontro Metade de mim é desencontro Metade de mim é luz

Metade de mim é escuridão Metade de mim é esperança Metade de mim é enfado Metade de mim é fiel Metade de mim é infiel Metade de mim é riso Metade de mim é choro Metade de mim é espírito Metade de mim é corpo

São tantas metades que se juntam com outras metades e outras metades, mas Metade de mim é o que eu já adivinhei

Metade de mim é o que ainda não adivinhei e a outra

Metade de mim é a que quer continuar brincando de adivinhar

Na verdade, eu ainda não sei bem se fui eu que encontrei o mar, o ar, as oliveiras e os santos ou se foram eles que me encontraram ou se eu e eles combinamos de nos encontrar por aqui. O fato é que eles estão dentro de meu nome e dentro de mim, fazendo de mim ora mar, ora ar, ora oliveira, ora santos. O fato é que eles, juntos ou separados, não me largam de jeito nenhum, mesmo que eu queria ser só Marlene

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34 2 “ACHADOUROS” DA PESQUISA: PALAVRAS DE UM CAMINHO NARRATIVO

Sou hoje um caçador de achadouros da infância. Vou meio dementado e enxada às costas cavar no meu quintal vestígios dos meninos que fomos.

Manoel de Barros (2003, XIV)

Toda pesquisa começa com o desenho de uma ideia, que, a depender de sua potência, vai se transformando em um projeto (imaginário-escrito). Desenhar uma ideia é permitir-se dar vazão a alguma coisa que pulsa muito forte dentro de você e que como a tez, uma membrana que protege o que está dentro do corpo humano, já não suporta mais a intensidade dessa pulsação e quer expulsá-la. A ideia quer sair, quer se expandir e ocupar outros vãos humanos e do planeta. A ideia quer ir, quer encontrar, quer ser acolhida, quer ser contestada, quer aquietar-se, quer nascer. E quando ela nasce, seja sob a forma escrita, artística, tecnológica ou de outra linguagem, ela é do mundo. Ela nasce para melhorar as pessoas e o planeta. No meu ponto de vista esse é o propósito maior de uma pesquisa, mas nem sempre a ideia gestada, nutrida e anunciada como conhecimento é usada para o progresso da humanidade.

A ideia que estava dentro em mim, nasceu. Na verdade, antes de nascer, foram muitas ideias transeuntes até uma delas pulsar mais forte, tornar-se mais nítida, desejar vir ao mundo, ser noticiada e conhecida. O desenho da ideia do que hoje nomeei como objeto de estudo – currículos praticados com bebês - levou algum tempo para ser iniciado. Foram (e ainda são) tempos de sensações e sentimentos (in)tensos que me fizeram experimentar a (in)certeza, a coragem-medo, o amor-ódio, o acolhimento-repulsa, a alegria-tristeza, o cheio-vazio, o avanço-recuo, a reflexão-ação. Esses pares de opostos vão nos constituindo como humanos. E como humana que sou, fui com eles desenhando a pesquisa e caminhando até chegar à defesa da tese.

Toda pesquisa tem um caminho. Caminho este que, dentre os seus vários significados, pode ser compreendido como “rumo, direção; trajeto, percurso, rota; itinerário; lugar por onde é possível seguir adiante; percurso que se deve seguir para chegar aonde se quer ir; modo ou maneira de fazer algo ou realizar algo, ou de atingir um objetivo” (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 586).

Referências

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