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THE TAX LIABILITY IN ARTICLE 135, III CASES OF THE BRAZILIAN NATIONAL TAX COdE. TRIBUTÁRIA do ARTIGO 135, III, do CÓdIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL

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Sumário: 1. Notas introdutórias - 2. O reconhecimento da pessoa jurídica como sujeito de direitos: 2.1. Da autonomia patrimonial da pessoa jurídica; 2.2. Da desconsideração da personalidade jurídica: 2.2.1. Histórico; 2.2.2. Pressupostos para a desconsideração da personalidade jurídica no Código Civil; 2.2.3. Propósito do instituto - 3. Responsabilidade tributária das pessoas do Artigo 135, III, do CTN - 4. Do cotejo entre os institutos estudados e da inadequação do uso da desconsideração da personalidade jurídica nas hipóteses de responsabilização do Artigo 135, III, do CTN: 4.1. Análise do estado atual da jurisprudência - 5. Conclusões - 6. Referências

Resumo: O presente artigo procura, em linhas gerais, perquirir da necessidade do manejo do incidente de desconsideração da personalidade jurídica previsto nos Artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil para a responsabilização das pessoas insertas no Artigo 135, III, do Código Tributário Nacional nas execuções fiscais.

Para tanto, contextualiza a discussão acima com as premissas consideradas para a construção do instituto da desconsideração da personalidade jurídica junto à jurisprudência britânica, desde seu caso mais emblemático, cotejando-as com o instituto da responsabilização tributária trazida pelo Código Tributário Nacional, de forma a identificar semelhanças que permitam o uso do incidente de desconsideração para os casos do Artigo 135 da Lei Tributária.

Palavras-chaves: pessoa jurídica; autonomia;

desconsideração; execução fiscal; incidente;

responsabilidade.

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RAFAELDE OLIVEIRA RODRIGUES

Procurador do Estado de São Paulo. Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas biênios 2010-2013.

Conselheiro do Conselho Estadual de Defesa do Contribuinte – CODECON. Especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Especialista em Direito Tributário pela Escola Superior da PGE/SP. Mestrando em Direito Processual e Constitucional Tributário pela PUC/SP.

rafaeldeolivrodrigues@gmail.com

Abstract: The article intends to verify the necessity of using the disregard of legal entity procedure, brought by the Brazilian Civil Procedure Code, to seek the liability of those people whom are present in Article 135, III, of the Brazilian National Tax Code.

Therefore, it contextualizes the premise used by the British jurisprudence to build the disregard of legal entity theory, then on its most iconic case, linking it to the tax liability presented by Brazilian Nacional Tax Code, in order to seek whether they match one another so that demanding, or not, in the use of the disregard procedure to those cases within Article 135 of the Tax Code.

Keywords:legal entity; autonomy; disregard; tax collective procedure; liability.

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1. NOTAS INTRODUTÓRIAS

Antes que se possa tecer considerações mais detidas sobre o problema de fundo, qual seja, a adequação do incidente criado pelo legislador processual civil para viabilizar a desconsideração da personalidade jurídica para os casos de responsabilização de diretores, representantes ou gerentes de pessoas jurídicas na forma havida pelo Artigo 135, III, do Código Tributário Nacional, importante lembrar que, em relação a este, há intensa discussão sobre sua adequação constitucional.

Não são poucas as vozes daqueles que afirmam que o sistema de recuperação judicial do crédito tributário apresenta inconsistências e que, por isso, merece reparos, seja pela jurisprudência, seja de lege ferenda.

No entanto, importante analisar o problema apresentado sem levar em consideração esse turbulento contexto, sob pena de se chegar a conclusões que possam a ultrapassar os limites do direito posto, provocando mais instabilidade ao direito aplicável à espécie, em vez de trazer efetivas soluções.

Por isso, este texto tem o condão de analisar o tema proposto de maneira técnica, de forma a tentar identificar os pressupostos necessários para a desconsideração da personalidade jurídica, bem como seus efeitos reconhecidos tanto pela doutrina, jurisprudência e legislação em vigor. Com isso, cotejando esse estudo com as condições normativas para a aplicação da causa de responsabilização do Artigo 135, III, do Código Tributário Nacional, será possível identificar a aplicabilidade ou não do incidente para a responsabilização tributária noticiada.

2. O RECONHECIMENTO DA PESSOA JURÍDICA COMO SUJEITO DE DIREITOS

A despeito de o ordenamento reconhecer capacidade jurídica a pessoas físicas, ou seja, possibilitando que estas sejam sujeito de direito em relações jurídicas negociais, por vezes estas, isoladamente consideradas, não têm condições de realizar, por si, determinada atividade econômica, dada a envergadura.

Daí a necessidade de união de propósitos entre pessoas naturais para que, com a congregação de experiência, esforço e capital, tenham condições de fazer frente a determinada empreitada.

Essa necessidade de empreender em escala maior do que a capacidade pessoal de cada pessoa física é ato imanente do ser humano, que, por natureza, é ser social.

É da natureza humana associar-se na busca de melhores condições para sua manutenção. Dos mais longínquos e primitivos atos de associação, voltados para a própria segurança do grupo, até os mais sofisticados agrupamentos formados para levar a cabo atividades econômicas de caráter global, o propósito foi e será sempre o mesmo: o homem, ser social, busca no grupo a força necessária para realizar seus desafios.

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O reconhecimento da pessoa jurídica pelo direito, como ser criado com o nítido propósito de se desvincular dos seus membros e realizar, por si, determinada atividade, denota, segundo Venosa, uma vinculação psíquica entre os membros para, deliberadamente, se desproverem da capacidade de, eles mesmos, assumirem a figura do sujeito de direitos, em prol de um “ser” em separado.1

Saliente-se que essa desvinculação, de matiz psíquico, é elemento central para se reconhecer a pessoa jurídica como importante instituto para a sofisticação do direito negocial e, pois, da economia.

Assim, o escopo central do reconhecimento da pessoa jurídica como sujeito de direitos é o deliberado deslocamento da condição de sujeito de direitos da pessoa física (ou grupo de pessoas físicas) para esse ente diferente que, conquanto tenha relação umbilical com seus criadores, é dotado de autonomia e dispõe de plena capacidade de figurar como sujeito de direitos em uma relação jurídica.

2.1. Da autonomia patrimonial da pessoa jurídica

Das considerações acima é possível extrair premissa de que a pessoa jurídica apenas atinge seus objetivos se houver lindes que dividam o patrimônio de criadores e criatura, ou seja, das pessoas naturais e da pessoa jurídica que dão nascimento.

Importante destacar que essa proposição dá azo ao Princípio da Autonomia Patrimonial da pessoa jurídica.

De se notar que esse princípio é desdobramento lógico do princípio mais geral da autonomia da pessoa jurídica. Este, com repercussão inclusive no direito posto, está normatizado no Título II, Livro I – da parte geral do Código Civil, que reconhece e sistematiza as mais diversas formas de pessoa jurídica no direito brasileiro.

No entanto, não há norma legal que trate especificamente da autonomia patrimonial da pessoa jurídica. Do sistema positivo só se infere o aludido princípio por meio da interpretação a contrario sensu do Artigo 50 do Código Civil, na medida em que apenas em hipóteses extraordinárias se viabiliza o atingimento do patrimônio das pessoas naturais que compõem o corpo criador da pessoa jurídica. A regra, pois, é seu não atingimento.

A par, podemos também extrair interpretação que agasalha a autonomia patrimonial da pessoa jurídica da leitura conjunta dos Artigos 789 e 790, II, do Código de Processo Civil.2

1 VENOSA, Silvio de Salvo, Direito Civil – parte geral, Atlas, 2008, p. 208

2 Art. 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.

Art. 790. São sujeitos à execução os bens: (...) II - do sócio, nos termos da lei;

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Tais normas viabilizam a persecução patrimonial em face do sócio apenas nos casos autorizados na legislação. Caso inexista mencionada permissão, segue-se a regra geral, com a responsabilidade patrimonial do devedor. Assim, se é a pessoa jurídica a responsável pelo cumprimento da obrigação, serão seus bens, pois, presentes e futuros que responderão pela plena satisfação do compromisso assumido.

Desses apontamentos depreende-se que a extensão e o foco do princípio da autonomia patrimonial, como desdobramento do princípio geral da autonomia da pessoa jurídica, devem ser voltados especificamente à proteção do patrimônio dos sócios e associados que dão azo à pessoa coletiva.

O valor jurídico que se resguarda com o aludido princípio é, pois, a “segurança”, na medida em que se permite o exercício de atividades (empresariais ou não) que poderiam importar em risco de perdas patrimoniais ao empreendedor, diminuindo consideravelmente tais riscos. Há, portanto, segurança para empreender sem colocar em risco o patrimônio pessoal, não investido na atividade coletiva.

É a partir dos limites desse princípio que se estabelecem as bases jurídicas que admitirão institutos como a desconsideração da personalidade jurídica e a responsabilização dos sócios com poderes de representação, nos termos do Artigo 135, III, do Código Tributário Nacional.

Nessa ordem de considerações, esse é o ponto de partida para aferir se há compatibilidade entre os dois institutos excepcionais à regra da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, a fim de empregar o rito dos Artigos 133 a 135 do Código de Processo Civil para a formalização, em execuções fiscais, da responsabilidade daqueles indicados pelo Artigo 135, III, do CTN.

2.2. Da desconsideração da personalidade jurídica 2.2.1. Histórico

A despeito da previsão desse instituto, atualmente, no ordenamento posto brasileiro, sua origem remonta à jurisprudência dos países de common law, especificamente o Reino Unido.

Assim, imperioso buscar como foi concebida a possibilidade de se afastar a regra da separação entre pessoas naturais e pessoas jurídicas para atribuir responsabilidade patrimonial àqueles que a compõem.

Nessa ordem de ideias, ainda que não seja o primeiro, o mais emblemático caso levado a julgamento perante o Poder Judiciário britânico foi o caso A. Salomon v. A.

Salomon and Company Limited.

O precedente foi julgado pela House of Lords em 1897, época que além da competência legislativa, o colegiado também tinha, para determinados casos, competência jurisdicional.

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Na assentada, os Lords Halsbury, Watson, Herchell, Macnaghten e Morris acolheram o recurso de Aron Salomon para manter a higidez da personalidade jurídica da sua empresa no que toca a sua responsabilidade para com os seus credores.

Em breve resumo, o recurso havia sido interposto a partir de decisão da Corte de Apelação que, mantendo a decisão de primeira instância (proferida por Vaughan Williams J.), havia reconhecido que Aron Salomon criou a empresa recorrida por meio de um contrato com sua esposa e seus seis filhos com o fito de continuar seus negócios em nome da companhia e, assim, com limitação de sua responsabilidade, o que contrariava o Companies Act de 1862.

Do voto do Lord Macnaghten se extrai que Aron Salomon era um reconhecido vendedor de botas e sapatos em couro e exercia sua atividade em nome próprio.

Nesse sentido, exerceu a empresa dessa maneira por mais de 30 anos mas, por razões pessoais decidiu atribuir parte da atividade aos filhos, por meio da constituição da pessoa jurídica.

Para tanto, pequena parte do valor da venda foi embolsado, sendo o restante recebido por meio de debêntures da própria companhia.

Em razão da transação, Aron Salomon fora pessoalmente processado por credores para se reconhecesse a nulidade do contrato de sociedade, que tinha apenas o fito de limitar a responsabilidade pelo exercício da atividade empresarial, lesando o direito de credores, já que ele próprio se tornaria credor preferencial em relação aos demais, em razão das debêntures que possuía.

Depreende-se dos votos apresentados no julgamento desse caso que a premissa para o reconhecimento da desconsideração da pessoa jurídica, atribuindo-se a responsabilidade patrimonial pessoal aos sócios é a existência de fraude, que contrariaria o intento da legislação de regência, qual seja, o Companies Act.

Importante considerar os argumentos então lançados no sentido de que o mau uso da sociedade não importaria na declaração de sua destruição. A propósito, por mais de um voto, se verifica a preocupação dos julgadores com a higidez do registro da pessoa jurídica no órgão competente.

A questão se restringiria puramente à responsabilidade patrimonial, que se fazia presente no caso, com a salvaguarda dos direitos dos credores que não tinham o lastro das debêntures como tinha o Sr. Aron Salomon.

A partir desse precedente, a jurisprudência britânica apresenta farta discussão, demostrando a complexidade que o tema apresenta.

Importante citar precedente mais recente da Suprema Corte Britânica (que assumiu a competência jurisdicional da House of Lords com a reforma constitucional de 2005) no caso Prest v. Petrodel (2013).

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Destaque-se, nesse precedente, o substancial voto do Lord Sumption que, ao se debruçar sobre o tema, reconhece que a expressão “desconsideração da personalidade jurídica” apresenta vários sentidos. Assim, perpassa pela jurisprudência da Suprema Corte britânica e tribunais de grau inferior para verificar as diferentes formas pelas quais a expressão é interpretada (de modo geral, os casos trazidos se subsumem ao que no ordenamento brasileiro a doutrina convencionou chamar de “teorias maior e menor da desconsideração, adiante explicitadas”).

Na linha de argumentação adotada no caso Prest v. Petrodel, o que viabiliza a desconsideração é a premissa de que a relação entre a pessoa jurídica e as pessoas naturais que a compõem não é dotada de honestidade, como deveria. Para tanto cita Lazarus Estates Ltd. V. Beasley (1956) e Woolfson v. Strathclyde Regional Concil (1978).

Mais, o caso traz precedentes em que a premissa básica para a deflagração do instituto é o mau uso da pessoa jurídica (Ben Hashem v Al Shayif (2009).

Ao fim, Lord Sumption conclui em seu voto condutor que a desconsideração da personalidade é usada como forma de coibir o uso da pessoa jurídica com o propósito específico de se evadir de obrigações legais ou de responsabilidade.

Saliente-se trecho de seu voto em que esse aspecto pode ser observado:

“Há um plexo de situações nas quais a lei atribui atos e propriedades próprios da companhia àqueles que a controlam, sem deixar de observar a separação legal da pessoa jurídica. Um controlador pode ser pessoalmente responsável, geralmente adicionalmente à companhia” 3 (tradução livre)

No entanto, cumpre destacar trecho do voto em que o Lord Sumption entende que a responsabilização legal não se confunde com a desconsideração da personalidade jurídica:

“Mas quando nós falamos de desconsideração da personalidade jurídica, não estamos (ou não deveríamos estar) falando daquelas situações, mas somente daqueles casos que são verdadeiras exceções ao que fora estabelecido em Salomon v A. Salomon and Co Ltd. (1897) AC 11, isto é, onde a pessoa que detém ou controla uma companhia é configurada em certas circunstancias a ser identificada com esta na lei em virtude da detenção ou controle”.4 (tradução livre)

3 There is a range of situations in which the law attributes the acts or property of a company to those who control it, without disregarding its separate legal personality. The controller may be personally liable, generally in addition to the company, for something that he has done as its agent or as a joint actor.

4 But when we speak of piercing the corporate veil, we are not (or should not be) speaking of any of these situations, but only of those cases which are true exceptions to the rule in Salomon v A Salomon and Co Ltd [1897] AC 22, i.e. where a person who owns and controls a company is said in certain circumstances to be identified with it in law by virtue of that ownership and control.

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Veja-se que a orientação pretoriana ganha o grau de sofisticação que a problemática merece.

A partir desse importante precedente, a doutrina passou, em diversos países, a considerar o tema sempre sob a perspectiva da existência do mau uso ou da fraude que pudesse atingir direito de terceiros.

Apresenta-se como relevante exemplo, Rolf Serick, professor da Universidade de Tubigen, que, com base na orientação da jurisprudência britânica e americana, expandiu a teoria aos países da Europa continental, por intermédio da publicação de seu Rechtsform und RealitätJuristischer, traduzido para o espanhol por Puig Brutau ("Apariencia y realidad en las sociedades mercantiles. El abuso de derecho por medio de la personalidad jurídica")

Não se pretende esgotar todo o conteúdo da literatura estrangeira sobre o tema, mas trazer as bases sobre as quais o professor Rubens Requião introduziu a teoria à doutrina brasileira, em meados nos anos 70.

A partir disso, o legislador pátrio julgou a questão passível de ser normatizada pelo direito brasileiro.

Assim, o primeiro diploma a tratar do tema foi a Lei Nº 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor, em seu Artigo 28. Na sequência, o tema foi novamente retratado na Lei Nº 8.884/94, então Lei Antitruste. É o conteúdo do Artigo 18. A par, em 1998, o tema foi novamente considerado pela Lei Nº 9.605, em seu Artigo 4º.

Em comum, as citadas disposições apresentam duas características: (i) pertencem a específicos microssistemas jurídicos (defesa do consumidor, da ordem econômica e concorrência e do meio ambiente); e (ii) apresentam a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica quando esta for um óbice para o ressarcimento de danos (ainda que esse impedimento advenha de decretação de falência ou insolvência civil).

É o que a doutrina e a jurisprudência relacionadas ao tema chamam de “teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica”.

Saliente-se tratar de teoria menor por não perquirir os elementos necessários e consagrados pela construção teórica da desconsideração da personalidade jurídica, em especial o abuso do manejo desta personalidade para lograr fins não admitidos em direito.

Por fim, em 2002, a matéria foi contemplada no Código Civil, em seu Artigo 50,5 que consagra a “teoria maior da desconsideração”, a qual será tratada com mais vagar no capitulo que segue.

5 Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

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2.2.2. Pressupostos para a desconsideração da personalidade jurídica no Código Civil Da leitura do Artigo 50 do diploma civil, é possível depreender que se faz necessária a presença de ao menos uma das duas exigências previstas, quais sejam, o desvio de finalidade ou a confusão patrimonial.

O primeiro requisito se apresenta com nítido caráter subjetivo, na medida em que exige aferição da intenção dos sócios em se utilizar da pessoa jurídica com propósito diverso daquele que formalmente justificou a sua constituição.

É sobre o desvio de finalidade que se concentra a discussão no precedente Salomon v. A. Salomon Co. Ltd.. O cerne do feito era saber se a intenção de Aron Salomon ao constituir a sociedade era, ao invés da continuação do exercício da empresa na forma do Companies Act, furtar-se ao pagamento dos credores.

Esse requisito, então, demanda verificação dos elementos de fato que levem à constatação do animus daqueles que constituíram a pessoa jurídica. Com isso, impõe- se o cotejo daquilo que abstratamente se previa na formação da pessoa jurídica com aquilo que de fato se apresenta. A dissonância entre esses dados leva ao reconhecimento do desvio de finalidade.

De outro lado, o requisito restante, qual seja, a confusão patrimonial possui caráter objetivo.

Nesse ponto, a confusão havida entre o patrimônio da pessoa natural e o da pessoa jurídica é dado que se depreende concretamente, independentemente na intenção do agente.

Assim, como exemplo, o pagamento de contas de ordem pessoal dos sócios com o patrimônio da pessoa jurídica, ou ao contrário, o pagamento de despesas da pessoa jurídica por meio direto dos sócios descaracteriza o elemento patrimonial da autonomia da pessoa jurídica em relação aos seus sócios.

Desse contexto, perde-se o sentido da separação patrimonial, impondo-se, por conseguinte, o reconhecimento da responsabilidade patrimonial dos sócios em relação aos débitos constituídos por meio de pessoa jurídica.

Impõe-se, não é demais reafirmar, que a exigência do Código Civil se coaduna com a origem da teoria, na medida em que apresenta explicitamente os requisitos necessários para o afastamento da separação entre patrimônios de pessoas naturais e pessoas jurídicas.

Diante, pois, da excepcionalidade da desconsideração da personalidade jurídica, que, repise-se, relativiza o princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, o Código Civil bem estabelece os motivos que demonstram a sua necessidade, na forma da jurisprudência que lhe constituiu.

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Em suma, é o que a doutrina e jurisprudência nacionais convencionaram chamar de “teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica”, por, repise-se, levar em conta os elementos necessários e consagrados pela construção teórica que tratou, desde o início, da desconsideração da personalidade jurídica.

2.2.3. Propósito do instituto

Nos capítulos anteriores, nos quais foram tratados o histórico do instituto e a sua repercussão no Código Civil, procurou-se estabelecer, em linhas gerais, seu desenho inicial e a compatibilidade do direito nacional com essa origem estrangeira.

Pelo que foi apresentado, tem-se que o instituto se justifica para alcançar o patrimônio daqueles que, ao arrepio do direito, dão azo a pessoa jurídica.

Logo, tomando-se como exemplo o voto do Lord Sumption no caso Prest v.

Petrodel, julgado pela Suprema Corte britânica, não há confundir o instituto com as medidas legalmente previstas de atribuição de responsabilidade aos sócios.

A desconsideração não é, pois, técnica de atribuição de responsabilidade, mas um instituto que busca afetar o patrimônio do sócio que, abusando do direito, tenta criar espécie de câmara blindada para afastar seu patrimônio de dívida que, de fato, deveria ser suportada por ele.

Assim, o matiz do instituto é puramente patrimonial. Portanto, despicienda a aferição da natureza da obrigação, pois este instituto se apresenta de forma muito mais superficial, já que se presta apenas para, desconsiderando-se a pessoa jurídica, atingir bens do sócio.

3. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DAS PESSOAS DO ARTIGO 135, III, DO CTN

Feitas as considerações sobre o conteúdo e limites da desconsideração de personalidade jurídica e sua distinção em relação a outros institutos tais como a criação de vínculos autônomos de responsabilização (na esteira daquilo deliberado em Prest v. Petrodel), faz-se necessário lançar luz sobre a responsabilidade tributária no Código Tributário Nacional, de forma a tentar identificar a existência de alguma similitude entre os institutos.

Para tanto, ter-se-á como norte uma das referências da atualidade em relação ao tema, que é a obra do professor Renato Lopes Becho, que analisou detidamente a obrigação tributária especificamente no que toca a sua sujeição passiva.

Nesse ponto, Lopes Becho assinala que foi Rubens Gomes de Souza quem elaborou o Anteprojeto de Código Tributário Nacional que serviu de base para análise da Comissão Especial do Código Tributário Nacional.

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Naquela assentada, Rubens Gomes de Souza alocou o tema da responsabilidade tributária dentro do capítulo relacionado às garantias do crédito tributário. Nesse sentido, para a concepção inicial de seu criador, não se via a responsabilidade tributária como hipótese de sujeição passiva da relação obrigacional tributária.

No entanto, o legislador não acolheu a proposta e adotou a classificação mais usual, qual seja, de que a sujeição passiva tributária poderia se compreender pela figura do contribuinte ou o responsável. É a letra do Artigo 121 do CTN.

No que toca ao tema, na forma como valorada pelo direito posto, Lopes Becho tece importantes considerações.

Das que mais se relaciona ao tema de fundo do presente texto, destaque-se a proposta de classificação relacionada à sujeição passiva tributária.

Nessa ordem de considerações, Lopes Becho afirma que a sujeição passiva pode ser direta (na qual figura o contribuinte) ou indireta (em que se distinguem a sujeição passiva por substituição e por responsabilidade). Esta, por fim, se divide em responsabilidade por sucessão, de terceiro e por infração, todas na forma do Código Tributário Nacional bem como nas hipóteses veiculadas na legislação não codificada, ou seja, apesar de previstas em legislação, não estão contempladas no CTN.

Importante destacar que a premissa adotada pelo jurista é o grau de intensidade do vínculo da pessoa atribuída com a relação jurídico material.

Nessa senda, afirma Lopes Becho:

“Para deixar mais claro nosso pensamento, acreditamos que somente poderá ser considerado contribuinte aquela pessoa que tenha realizado o critério material da hipótese de incidência (núcleo do fato gerador). Quanto ao responsável, para nós, ele pode ter relação com o fato gerador da obrigação tributária ou não. O substituto tributário precisa ter vinculação com algum dos critérios da regra matriz constitucional tributária (fato gerador). Por isso se admite a retirada do contribuinte da relação jurídico-tributária, que passará a ser entre o sujeito ativo e o substituto.”6

Eis, pois, o primeiro elemento que caracteriza a responsabilidade tributária, qual seja, a definição, seja pelo CTN seja pela legislação correlata do tributo, do dever de individualizar o responsável, tendo ou não relação direta com o fato gerador.

É, pois, a Lei Tributária (levando-se em conta os dados previstos neste sistema) que veiculará quem pode ser responsável tributário. Com isso, afirma Lopes Becho que

“assim, considerando que, genericamente falando, o responsável tributário recolherá

6 BECHO, Renato Lopes, Responsabilidade tributária de terceiros – CTN, Art.s 134 e 135. Saraiva. 2014

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tributo aos cofres públicos, tratá-lo em termos de direito é matéria propriamente jurídico-tributária.” 7

No que tange ao rol estabelecido pelo Código Tributário Nacional, cada uma das responsabilidades tributárias apresentadas veicula características marcantes. Vejamos.

De início, a responsabilidade por sucessão se apresenta como nítido propósito de garantia, na medida em que permite ao credor, dentro do quadro permitido pela lei, substituir o devedor originário (sucedido) para voltar a pretensão satisfatória àquele apontado na norma permissiva. Exemplos são os Artigos 130 e 131 do CTN. Veja- se, pois, que basta para se atingir o propósito da lei a afetação patrimonial. Não se busca, pois, qualquer relação do sucessor com a realização do fato gerador, mas sim ampliar o rol de garantia do credor para a satisfação de seu crédito.

Nestes termos, reafirme-se os ensinamentos de Lopes Becho, na medida em que

“o que há são regras processuais de cobrança do crédito tributário quando tenha havido o perecimento do sujeito passivo.” 8

Já no que toca a responsabilidade por infrações, os Artigos 136 a 138 legiferam sobre o direito tributário punitivo ou sancionador, ou seja, aquele que, para além do dever de recolher tributos, permite a sanção daqueles que descumprem obrigações denominadas acessórias.

No entanto, não se tratará mais a fundo as modalidades de responsabilidade por sucessão ou por infração, visto não ser o propósito do presente artigo.

A ideia é apenas destacar o mote do legislador para seu estabelecimento. A atenção se volta para a responsabilidade de terceiros. Mais especificamente, aquela que trata o Artigo 135, III, ou seja, a responsabilidade dos diretores, gerentes e representantes de pessoas privadas.

Destaque-se que o tema desperta uma miríade de questões a serem debatidas. Nesse sentido, destaque-se por vez mais a obra de Lopes Becho, que pontua com acuidade todos os problemas advindos da norma prevista no texto acima citado.

No entanto, a atenção se centra na possibilidade (ou necessidade) de aplicação da desconsideração da responsabilidade jurídica (e do procedimento recentemente admitido no Código de Processo Civil) à hipótese retratada.

Então, voltando-se os olhos ao conteúdo da norma tratada no Artigo 135, III, do CTN, denota-se que este apresenta uma característica peculiar que justifica a atribuição de vínculo jurídico ao responsável, qual seja, a prática de atos contrários à lei.

Nesse sentido, Lopes Becho:

7 Ibidem

8 Ibidem, p. 53

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“Quando o legislador estabeleceu, no caput do Artigo 135, que este dispositivo se aplica à responsabilidade “pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados”, podemos visualizar, efetivamente, duas regras matrizes tributárias, uma lícita, outra ilícita.

A primeira, para prosseguirmos no exemplo aventado, gera faturamento para a pessoa jurídica, o que é lítico. Todavia, como o faturamento gerado decorreu da prática de atos com infração de lei, contrato social e estatuto, há a segunda regra matriz. Esta decorre de um ilícito não tributário, mas que gera efeitos fiscais: a imputação da responsabilidade ao terceiro e não mais ao contribuinte.” 9

Assim, o legislador atribui vínculo de direito tributário àquele que, sendo qualquer das pessoas do Artigo 135, III, do CTN, pratica uma ilicitude e, ao fazê-lo, leva a pessoa jurídica a realizar determinada materialidade e, com isso, tornar-se contribuinte de obrigação tributária.

Note-se que os propósitos das três modalidades de responsabilização são bem diferentes. Mais, tem-se que responsabilidade por infração e de terceiros se apresentam em grau muito mais intenso do que a responsabilidade por sucessão. Em verdade, verifica-se que as primeiras têm verdadeiramente o condão de criar vínculo jurídico tributário (e com isso, todas as consequências daí advindas) o que não se verifica em relação a última, que se apresenta muito mais como modalidade acessória, de simples garantia.

Talvez aí o acerto do legislador em deslocar a responsabilização (ao menos nas modalidades por infração e de terceiros) para o capítulo relacionado a sujeição passiva tributária ao invés de mantê-las no capítulo relacionado a garantia do crédito tributário. Isso permitiu emprestar às essas hipóteses toda a gama de direitos e deveres conferidos para o sujeito passivo dito principal previstas no CTN.

4. DO COTEJO ENTRE OS INSTITUTOS ESTUDADOS E DA INADEQUAÇÃO DO USO DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NAS HIPÓTESES DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ARTIGO 135, III, DO CTN

Diante dos dois capítulos apresentados, pôde-se identificar os elementos necessários para a caracterização tanto da desconsideração da personalidade jurídica e quanto da responsabilização tributária de terceiro, a fim de permitir, nesta fase, que se proceda o cotejo.

Com a distinção feita, buscou-se identificar as bases normativas de cada um para, com isso, verificar se haveria alguma similitude entre os institutos, de forma a, caso houvesse, se emprestar o procedimento para a desconsideração da personalidade jurídica para atribuir-se o vínculo jurídico à forma do Artigo 135, III, do CTN.

9 Ibidem, p. 91

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Assim, de um lado, como se pôde constatar, a desconsideração da personalidade jurídica é instituto voltado notoriamente para reforço de garantia em favor de terceiros credores da pessoa jurídica. Cuida-se, pois, de instituto com propósito marcantemente patrimonial. De outro, a responsabilização tributária de terceiros, nos termos do Artigo 135, III, do Código Tributário Nacional é modalidade de criação de vínculo jurídico de direito material, provido, pois, de grau de densidade jurídica bem mais intenso do que o primeiro.

Retomemos, pois, o aspecto fático da ratio decidendi do julgamento de Salomon v. A. Solomon Co. Ltd. para concluir que o que se buscava, em verdade, era vincular o patrimônio de Aron Salomon ao pagamento das dívidas constituídas pela sociedade.

Ao lado, relembre-se Prest v. Petrodel e o quanto assentado pelo relator Lord Sumption, em que trata da questão sob a mesma perspectiva analisada neste texto, para ao final concluir que a desconsideração da personalidade jurídica (e seu propósito patrimonial) não deveria ser confundida com as hipóteses às quais a lei atribui responsabilidade, ou seja, quando a lei cria vínculo jurídico obrigacional de direito material.

Nesse contexto do direito comparado, ainda que a matéria esteja positivada no ordenamento brasileiro, sua completa intelecção demanda necessário entendimento a partir de sua origem, fincada nas bases havidas da jurisprudência anglo-saxã.

A providência, pois, se mostra necessária na medida em que o Brasil, que adota um direito de civil law, apresenta tendência de relativização de suas características para admitir como fonte de direito os precedentes dos Tribunais, tal como países de common law.

Nessa medida, o processo interpretativo da norma atualmente posta no ordenamento pátrio não prescinde da análise histórica do instituto, ainda que demande incursão na jurisprudência de países cujo sistema jurídico apresenta diferentes características do Brasil.

De outro lado, em relação à responsabilização tributária no Brasil, tem-se justamente uma legislação que procura criar vínculo obrigacional de direito material.

Tanto assim o é que, como afirmado anteriormente, a responsabilidade de terceiros do Artigo 135 CTN demanda a prática de uma ilegalidade da pessoa natural (não relacionada ao direito tributário e constatada da relação pessoa jurídica e pessoas naturais que a compõem) que dará azo ao nascimento de uma obrigação tributária por parte da pessoa jurídica.

Com isso, não vemos compatibilidade entre os institutos, de forma a não fazer sentido o manejo do procedimento do Artigo 133 a 137 do Código de Processo Civil para a atribuição de responsabilidade tributária com base no Artigo 135, III, do CTN.

(14)

Está-se, pois, aderindo a posição originária de Renato Lopes Becho (análise de seu posicionamento em relação ao tema será apontado posteriormente), que assim lecionou:

“De qualquer modo, para nós, a doutrina da desconsideração da personalidade jurídica não precisou ser transposta para a legislação tributária, pois há uma ferramenta legal mais forte no CTN, largamente utilizada pelas autoridades fiscais para solucionar as questões em que se busca a despersonalização, que é o lançamento tributário ou sua revisão, fundada no Art. 149, inc. VII.” 10

Ora, do pequeno trecho denota-se dois importantes apontamentos, quais sejam, que se a questão é impregnada de fraude não se subsume às hipóteses do Artigo 135, III, CTN.

A par, o segundo importante apontamento conclui que o sistema jurídico já apresenta resposta satisfatória para a demanda na medida em que já prevê que a autoridade administrativa constitua (ou revise) o ato administrativo de constituição do crédito tributário com base no Artigo 149, VII do mesmo diploma.

Assim, é essencial o compromisso do aplicador do direito com a manutenção da higidez e coerência do ordenamento. Servimo-nos dos apontamentos de Tércio Sampaio Ferraz sobre a dogmática do direito para afirmar que se faz necessária a correta identificação da norma incidente, procurando-se aferir toda sua extensão e força por meio do processo interpretativo para o fim de lograr-se eficientemente ao ato derradeiro desse processo, qual seja, a decisão.11

Saliente-se que essa decisão (ato individual e concreto) tem um compromisso ontológico com o ordenamento que confere lastro.

Com isso, cumpre ao aplicador verificar se o sistema dispõe de norma aplicável ao seu caso e deve procurar extrair dela a sua máxima efetividade. Nessa medida, dentro dos limites do processo interpretativo, cumpre ao aplicador emprestar ao texto a sua máxima extensão, combinando-o, se o caso, com o conteúdo de outros diplomas. Assim se alcança a coerência e, sobretudo, a efetividade do ordenamento, como mais importante instrumento de ordenação social.

Não se pode, por estrita observância à princípios éticos, deixar de considerar que Renato Lopes Becho, em obra mais recente, muda seu entendimento sobre a aplicação do incidente para os casos anteriormente tratados. Assim aponta o jurista:

“Mas pode restar dúvida se a responsabilização tributária de terceiros é uma hipótese de desconsideração da personalidade jurídica. De nossa parte, do ponto de vista acadêmico, já nos posicionamos pela negativa, é dizer, que não se confundem. Todavia, evoluímos no nosso entendimento,

10 Ibidem, p. 124

11 FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio, Introdução ao estudo do direito. Atlas. 2008.

(15)

considerando que os efeitos da responsabilidade tributária – nos moldes como tem sido aplicada atualmente – e da desconsideração da personalidade jurídica são os mesmos” 12

Pese a densidade e a sofisticação da obra apresentada, manifestamos contrariedade à sua nova conclusão. De se notar, de início, que Becho não iguala os institutos, mas sim seus efeitos. Essa distinção conceitual é importante e se coaduna com os argumentos lançados neste artigo.

No que toca a sua conclusão, entretanto, apresentamos discordância com o maior respeito que o jurista merece, haja vista que a se considerar as características e profundidade de cada um dos institutos, os efeitos previstos na legislação para um e para outro são diferentes.

Nessa ordem de considerações, a responsabilização tributária demanda individualização de vínculo jurídico material, levada a cabo por meio do documento legal que espelha a dívida e seus elementos, qual seja, a certidão de dívida ativa. A inscrição em dívida ativa, nessa medida, abre uma série de prerrogativas e ônus para credor e devedor.

Saliente-se, nesse ponto, que apesar da exigência acima apontada (necessidade de inscrição em dívida ativa para todos os responsáveis tributários), não ser reconhecida pela jurisprudência mais atualizada, deve ser levada a efeito como forma de estrita observância do procedimento legal de recuperação do crédito estatal.

Exemplo das diferentes consequências pela adoção do regime de inscrição em dívida ativa para todos dos responsáveis isso é a permissão dada pela Lei Nº 9.492/97 para que, pelo seu Artigo 1º, § único, que permita o protesto da certidão de dívida ativa.

Mais, não são raras as leis de entes tributantes que preveem a inscrição de devedores inseridos no rol de dívida ativa em cadastros de inadimplentes. Isso sem falar daquele que, sendo indicado como sujeito passivo da obrigação tributária e que não apresente garantia do crédito ou qualquer das causas de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, não terá direito a certidão negativa de débitos ou positiva com efeito de negativa (Artigos 205 e 206 do Código Tributário Nacional).

De se considerar, por outro lado, que a desconsideração de personalidade jurídica, por não ter o condão de criar obrigação tributária (direito material) na medida em que não se atribui responsabilidade nessa seara mas, apenas vínculo de ordem patrimonial, não permite o manejo desses instrumentos pelas Fazendas Públicas.

Nessa ordem de considerações, não concordamos com a afirmação de que ambos os institutos são providos dos mesmos efeitos.

12 BECHO, Renato Lopes, Execução fiscal – Análise crítica, Noeses, 2018

(16)

Outro apontamento que reputamos importante para não aplicar o incidente dos Artigos 133 a 135 do CPC aos casos tratados é o fato de que se cuida de instrumento voltado a atender uma excepcionalidade (a regra permanece como a autonomia da pessoa jurídica e sendo sua desconsideração apenas exceção).

Como regra excepcional, deve ser aplicada estritamente para as hipóteses autorizadas pela legislação de regência. Caso contrário, passaremos a desnaturar indevidamente o rito executivo, cujo propósito é, dentro dos limites do ordenamento, permitir a expropriação de bens e satisfação da obrigação.

4.1. Análise do estado atual da jurisprudência

Assim, dentro das premissas consideradas anteriormente, em que se destacou a diferença entre a desconsideração de personalidade jurídica e responsabilização e, ainda, tendo em vista o conteúdo do Artigo 135, III, do CTN que espelha hipótese dessa última, no caso de matiz tributário, o Superior Tribunal de Justiça, encampando a tese, não enquadra a hipótese do retrocitado artigo como desconsideração da personalidade jurídica.

Pelo que se identifica, então, da orientação pretoriana, o Artigo 135, III, do CTN não trata de desconsideração, mas sim de redirecionamento em razão de preceito normativo próprio do Código Tributário Nacional. Ilustra essa orientação o precedente da lavra do ministro Francisco Falcão, de seguinte teor:

“REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL. SUCESSÃO DE EMPRESAS. GRUPO ECONÔMICO DE FATO. CONFUSÃO PATRIMONIAL. INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA.

DESNECESSIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022, DO CPC/2015.

INEXISTÊNCIA.

I - Impõe-se o afastamento de alegada violação do Art. 1.022 do CPC/2015, quando a questão apontada como omitida pelo recorrente foi examinada no acórdão recorrido, caracterizando o intuito revisional dos embargos de declaração.

II - Na origem, foi interposto agravo de instrumento contra decisão que, em via de execução fiscal, deferiu a inclusão da ora recorrente no polo passivo do feito executivo, em razão da configuração de sucessão empresarial por aquisição do fundo de comércio da empresa sucedida.

III - Verificado, com base no conteúdo probatório dos autos, a existência de grupo econômico e confusão patrimonial, apresenta-se inviável o reexame de tais elementos no âmbito do recurso especial, atraindo o óbice da Súmula Nº 7/STJ.

IV - A previsão constante no Art. 134, caput, do CPC/2015, sobre o cabimento do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, na execução fundada em título executivo extrajudicial, não implica a incidência do incidente na execução fiscal regida pela Lei Nº 6.830/1980, verificando-se verdadeira incompatibilidade entre o regime geral do Código de Processo

(17)

Civil e a Lei de Execuções, que diversamente da Lei geral, não comporta a apresentação de defesa sem prévia garantia do juízo, nem a automática suspensão do processo, conforme a previsão do Art. 134, §3º, do CPC/2015.

Na execução fiscal "a aplicação do CPC é subsidiária, ou seja, fica reservada para as situações em que as referidas leis são silentes e no que com elas compatível" (REsp Nº 1.431.155/PB, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 27/5/2014).

V - Evidenciadas as situações previstas nos Arts. 124, 133 e 135, todos do CTN, não se apresenta impositiva a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, podendo o julgador determinar diretamente o redirecionamento da execução fiscal para responsabilizar a sociedade na sucessão empresarial. Seria contraditório afastar a instauração do incidente para atingir os sócios-administradores (Art. 135, III, do CTN), mas exigi-la para mirar pessoas jurídicas que constituem grupos econômicos para blindar o patrimônio em comum, sendo que nas duas hipóteses há responsabilidade por atuação irregular, em descumprimento das obrigações tributárias, não havendo que se falar em desconsideração da personalidade jurídica, mas sim de imputação de responsabilidade tributária pessoal e direta pelo ilícito.

VI - Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, improvido.” 13

Destaque-se o item V da ementa. Do seu conteúdo se retira que todos os casos aos quais o CTN atribui a responsabilização tributária de terceiros (Artigos 124, 133 e 135) não se exige a instauração do incidente de desconsideração de personalidade jurídica.

Ademais, tem-se que o Superior Tribunal de Justiça bem considerou que nem todos os casos que o CTN trata como responsabilidade tributária são hipóteses de responsabilização (atente-se à terminologia). A responsabilidade por sucessão, pela sua natureza meramente de garantia patrimonial, como apontamos anteriormente, não está incluída no rol apontado pela relatoria.

Por oportuno, do texto da ementa acima trazida, o Superior Tribunal de Justiça apresenta orientação que se coaduna com a havida pela Suprema Corte Britânica (Prest v. Petrodel), ao reconhecer a distinção entre os institutos da desconsideração da personalidade jurídica e da responsabilização jurídica.

Registre-se, a par, que a questão está sendo tratada com profundidade pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que instaurou Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR14 que, até a edição deste artigo não logrou resultado.

13 REsp 1786311 / PR, DJe 14/05/2019

14 Autos N° 0017610-97.2016.403.0000/SP

(18)

5. CONCLUSÕES

A despeito de, aparentemente, o tema da aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica nas execuções fiscais que buscam a aplicação do Artigo 135, III, do CTN não demandar grande controvérsia, uma análise mais acurada dos institutos em apreço aponta para o sentido contrário.

Assim, a necessária distinção entre desconsideração e responsabilização, em virtude de substancial análise de seus contornos históricos, limites e principalmente efeitos demonstram que elas não apresentam similitudes de forma a permitir a aplicação do incidente reconhecido como pré-requisito para a cognição de uma para o reconhecimento da outra.

Isto assentado, laborar em indiferença em relação aos limites dos institutos, aplicando-se indistintamente ferramentas jurídicas criadas pelo sistema para casos específicos, a despeito da boa intenção, traz substanciais malefícios ao ordenamento na medida em que o fragiliza, já que o descaracteriza e, com isso, traz insegurança em sua implementação.

6. REFERÊNCIAS

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salomon-v-salomon-co-ltd-%5B1897%5D-ac-22/, acessado em 12 de novembro de 2018

ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Malheiros. 2017 BARROSO, Luis Roberto. Interpretação e aplicação do direito. 2009.

COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito comercial – direito de empresa. Saraiva.

2013

DIDIER JR. Fredie. Curso de direito processual civil, volume 1. Juspodium. 2016 BECHO, Renato Lopes. Responsabilidade tributária de terceiros. Saraiva. 2014 ______. Execução fiscal – Análise critica. Noeses. 2018

______. Filosofia do direito tributário. Saraiva. 2009 ______. Lições de direito tributário. Saraiva. 2014

DERZI, Misabel Abreu Machado. Modificações da jurisprudência no direito tributário. Noeses. 2009.

(19)

FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito – Técnica, decisão e dominação. Atlas. 2008

PREST V. PETRODEL. https://www.supremecourt.uk/cases/docs/uksc-2013-0004- judgment.pdf. Acessado em 15 de novembro de 2018

RAMOS, Elival da Silva, Ativismo judicial. Saraiva. 2010

SAMPAIO DÓRIA, Antônio Roberto. Direito constitucional tributário e “due process of law”. Forense. 1986

ZAVASCKI, Teori Albino. Processo de execução – parte geral. RT. 3ª edição, 2004.

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Referências

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