• Nenhum resultado encontrado

Isonomia e concurso público: uma abordagem de gênero

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2020

Share "Isonomia e concurso público: uma abordagem de gênero"

Copied!
117
0
0

Texto

(1)

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQUISA

MESTRADO PROFISSIONAL EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

PEDRO FRAGA

ISONOMIA E CONCURSO PÚBLICO: UMA ABORDAGEM DE GÊNERO

Orientador Acadêmico PROFA. DANIELA CAMPELLO

RIO DE JANEIRO – BRASIL 2017

(2)

PEDRO FRAGA

ISONOMIA E CONCURSO PÚBLICO: UMA ABORDAGEM DE GÊNERO

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Administração Pública da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Administração Pública.

Linha de pesquisa: Governança e Administração Pública. Orientadora: Profa. Daniela Campello

RIO DE JANEIRO – BRASIL 2017

(3)

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique Simonsen/FGV

Fraga, Pedro Henrique Bouzada

Isonomia e concurso público: uma abordagem de gênero/ Pedro Fraga. - 2017. 117 f.

Dissertação (mestrado) - Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa.

Orientadora: Daniela Campello. Inclui bibliografia.

1. Serviço público – Brasil – Concursos. 2. Igualdade. 3. Isonomia salarial. 4. Discriminação de sexo contra as mulheres. I. Ribeiro, Daniela Campello da Costa. II. Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas. Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa. III.Título.

(4)
(5)

Às mulheres da minha vida, especialmente minha mãe e minha avó, Marias que, com garra e determinação, sustentaram seus lares e educaram seus filhos.

(6)

AGRADECIMENTOS

Inicialmente, agradeço à Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas pelo alto nível de qualidade dos conteúdos ministrados ao longo do programa e pela oferta do curso de mestrado no formato de Turma Intensiva, sem o qual não teria sido possível a árdua tarefa de conciliar a vida profissional e acadêmica.

À Professora Daniela Campello, pela atenção, paciência, auxílio, orientações e ensinamentos, essenciais para a devida maturação do processo de investigação e a superação dos percalços experimentados no desenrolar da pesquisa.

À equipe de Coordenação do MAP, por toda a cordialidade, presteza e colaboração nas demandas que se fizeram necessárias.

Aos amigos Elder Abreu e José Abreu, sem os quais não seria possível minha participação no curso.

À equipe do Núcleo de Concursos da FGV Projetos, pelos constantes aprendizados compartilhados ao longo dos anos e por terem me indicado o programa, que me fez mudar a visão da Administração Pública e meu papel como ser social.

Agradeço também àqueles que contribuíram para este trabalho de alguma forma; ao professor Hélio Irigaray, à colega de turma Luciene Nunes, à Karine Gonçalves, ao Lucian Vieira, Leiziany Rubim, Maíra Chaves e demais colegas de trabalho.

Por fim, mas não por isso menos importante, à família e amigos pelo apoio e compreensão pelo distanciamento por conta dos estudos, em especial à minha mãe, companheira de todos os dias e a quem devo grande parte dessa conquista.

(7)

“A vantagem competitiva de uma sociedade não resulta apenas da eficiência com que se ensina multiplicação e tabela periódica, mas também do modo como se estimula a imaginação e a criatividade.”

(Albert Einstein) “Maria, Maria

É um dom, uma certa magia Uma força que nos alerta Uma mulher que merece Viver e amar

Como outra qualquer Do planeta

Maria, Maria

É o som, é a cor, é o suor É a dose mais forte e lenta De uma gente que ri

Quando deve chorar

E não vive, apenas aguenta”

(8)

RESUMO

O presente trabalho se propõe a investigar o campo da incidência de barreiras de gênero nos processos de seleção para acesso ao serviço público, supostamente arquitetados para conferir a igualdade entre os concorrentes. O estudo empírico teve caráter quali-quantitativo, envolvendo pesquisa documental e a exploração de bases de dados de concursos realizados entre 2012 e 2017. A análise envolveu diversas carreiras de nível superior, com a análise da relação diferencial dos sexos masculino e feminino na candidatura, desempenho nas provas, aprovação e classificação nos concursos públicos e variáveis de interesse, tais como, estado civil, existência ou não de filhos, idade, cor/raça, entre outros. A hipótese testada envolveu primordialmente a ideia de que o modelo de seleção hodiernamente adotado no país privilegia a capacidade de memorização e reprodução do conhecimento pelos candidatos, demandando tempo de estudo direcionado para o certame. Logo, o papel tradicionalmente atribuído à mulher quanto ao maior grau de responsabilidade pela família e o lar acarretariam em prejuízos na preparação para as provas. Os resultados encontrados sugerem que a natureza da seleção resulta em desvantagens competitivas e barreiras de acesso para as mulheres, sobretudo, quando existentes as condições de cor/raça, matrimônio e, principalmente, existência de filhos. Em ambientes concorrenciais mais acirrados e com provas mais complexas (posições superiores da hierarquia das organizações), as barreiras se mostram proporcionalmente maiores, indicando a ocorrência do chamado glassceiling.

(9)

ABSTRACT

The present study considers to research the incidence field of genders’ barriers in the exams and processes for access to the public service, supposedly planned to confer the equality between the competitors. The empirical study had quali-amount character, involving documental research and the exploration of databases of competitions accomplished in the temporal clipping of 2012 to 2017. The analysis envolved diverse careers of bachelor degree, with the analysis of the differential relation of the genders masculine and feminine in the candidacy, performance in the tests, approval and classification in the public exams and variable interests such as been in a civil union, existence or not of children, age, color/race, among others. The tested hypothesis primordially involved the idea of that the current model of exams adopted in the country, privileges the capacity of memorization and reproduction of the knowledge for the candidates, demanding time of study directed for the contest. Therefore, the traditional role attributed to the woman as the biggest degree of responsibility for the family and the home would cause damages in the tests preparation. The results suggest that the nature of the exams ensues in drawback competitive and access barriers of women, above all when exists conditions of color/race, marriage and, mainly, existence of children. It concludes that in incited competitive environments and with more complexity exams (superior positions of the organizations’ hierarchy), the barriers are revealed proportionally bigger, indicating the occurrence of the so-called glassceiling.

(10)

LISTA DE FIGURAS

Nº. Título Página

1 Concurso como ciclo de política pública 34

2 Mapa de concursos por UF 54

(11)

LISTA DE GRÁFICOS

Nº. Título Página

1 Número de concursos por esfera de atuação do órgão 53

2 Distribuição de candidatos por coorte etária 58

3 Distribuição por cor/raça dos candidatos (% do total) 61 4 Distribuição de candidatos por sexo, segundo o intervalo de acertos nas provas

objetivas (% do grupo) 66

5 Desempenho médio (acertos) por sexo e estado civil 66

6 Desempenho médio (acertos) do sexo masculino por coorte etária 67 7 Desempenho médio (acertos) do sexo feminino por coorte etária 67

8 Desempenho médio (acertos) por sexo e estado civil 68

9 Desempenho médio (acertos) por sexo e número de filhos declarado 69 10 Desempenho médio (acertos) por sexo, existência de filhos e coorte etária 70 11 Desempenho médio (acertos) das mulheres, segundo a coorte etária, cor/raça e

a existência de filhos 72

12 Desempenho médio (acertos) dos homens, segundo a coorte etária, cor/raça e

a existência de filhos 72

13 Percentual geral de aprovação nas provas objetivas por sexo 74 14 IPG por estado civil, cor/raça e existência de filhos (inscritos e aprovados) 75 15 IPG por estado civil, cor/raça e existência de filhos (classificados) 76

16 IPG por carreira (inscritos x classificados) 78

17 Distribuição de classificadas por cor/raça, estado civil e número de filhos

declarado (sexo feminino) 80

(12)

LISTA DE QUADROS

Nº. Título Página

1 Histórico do concurso público na legislação brasileira 31 2 Relação de carreiras e respectiva predominância de sexo, segundo dados do

IBGE (2012) 49

(13)

LISTA DE TABELAS

Nº. Título Página

1 Distribuição de candidatos por esfera de atuação e faixa salarial média 53 2 Distribuição de candidatos por sexo e coorte etária (quantidade, % do total e do

grupo) 57

3

Quantitativo (força de trabalho) dos Servidores Públicos Federais Civis Ativos do Poder Executivo, por órgão da administração (cargos de nível superior), segundo o percentual de ocupação feminina

59 4 Distribuição por sexo, segundo cor/raça dos candidatos (% do total) 61 5 Distribuição de candidatos por estado civil, número de filhos declarado e sexo

(quantidade e % do grupo) 62

6 Distribuição de candidatos por região de residência (% do total) 63 7 Carreiras de predominância de sexo divergente com relação ao Apêndice 1 63

8 Média de acertos nas provas objetivas, por sexo 65

9 Distribuição de candidatos por sexo, segundo o intervalo de acertos nas provas 65 10 Desempenho médio (acertos) por sexo e coorte etária 67 11 Distribuição por sexo e situação nas provas objetivas (quantidade e % do grupo) 73 12 IPG e distribuição por sexo, estado civil, cor/raça e existência de filhos (inscritos

e aprovados) 75

13 Evolução do IPG (inscritos x classificados), por carreira 77 14 Distribuição de classificados por faixa salarial, sexo e número de filhos declarado

(quantidade e % do total) 81

15 Distribuição de inscritos e classificados em cargos de elevado status social, por

sexo e existência de filhos (quantidade e % do grupo) 82 16 Distribuição e percentual de candidatos classificados por sexo e carreira 83

(14)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 15

2. CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA ... 18

2.1 Objetivos do trabalho ... 18

2.1.1 Objetivo geral ... 18

2.1.2 Objetivos específicos ... 18

2.2 Delimitação do estudo ... 18

2.3 Justificativa / Relevância do problema ... 21

3. MARCO TEÓRICO ... 23

3.1 O serviço público brasileiro ... 23

3.2 Recrutamento, seleção e gestão por competências no serviço público ... 25

3.2.1 Breve histórico do concurso e sua configuração como política pública de recrutamento de pessoal ... 30

3.3 A mulher no cenário brasileiro ... 36

3.4 Mulher e o acesso ao ensino superior e ao mercado de trabalho ... 43

4. ESTRATÉGIA DE INVESTIGAÇÃO ... 48

4.1 Tipo e natureza da pesquisa ... 48

4.2 Universo ... 51

4.2.1 Concursos e carreiras incluídos nas análises ... 53

4.3 Tratamento dos dados ... 55

5. RESULTADOS DA PESQUISA E DISCUSSÃO ... 57

5.1 Perfil dos candidatos ... 57

5.2 Sexo e desempenho nas provas ... 64

5.3 Sexo e aprovação/classificação ... 73

5.4 Sexo e glassceiling no concurso público ... 81

6. COMENTÁRIOS E CONCLUSÕES ... 85 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 89 APÊNDICE 1 ... 97 APÊNDICE 2 ... 111 APÊNDICE 3 ... 115 APÊNDICE 4 ... 117

(15)

15

1. INTRODUÇÃO

A despeito de estigmatizado como o sexo frágil, o gênero feminino demonstra força crescente no cenário econômico e social nacional e mundial. A título de exemplo, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística no Censo Demográfico de 2010 demonstram que elas são maioria na população em números absolutos e também em maior grau de nível de ensino (IBGE, 2011).

Embora nasçam em menor número que os homens, o maior número de óbitos masculinos reflete uma razão de sexo de 133,4 mortes de homens para cada grupo de 100 óbitos do sexo feminino, conforme o citado Censo. Esses diferenciais de mortalidade existentes entre os sexos resultam, por conseguinte, em um maior número de mulheres na população (de acordo com os mesmos dados, elas são 51,4%).

Com presença superior dentre aqueles com nível médio, nível superior e pós-graduação (53,2%, 57,8% e 53,3%, respectivamente), a relação lógica “instrução-maior remuneração”, quando permeada pelas condições de gênero e sexo, não se materializa na prática. Comparando-se as pesquisas censitárias oficiais de 2000 e 2010, as mulheres tiveram o maior aumento real do rendimento médio de todas as fontes, avançando 12,0%; a atividade no trabalho também subiu mais do que a dos homens no período, passando de 79,7% para 75,7% entre os homens e de 50,1% para 54,6% entre as mulheres. Contudo, o modelo patriarcal no qual é baseada a sociedade brasileira ainda resulta em uma desigualdade latente no país: elas ganham aproximadamente 28% da remuneração dos homens (PNUD, 2016).

A academia denuncia há tempos que as iniquidades sociais devem ser combatidas em prol do desenvolvimento humano e econômico. No que toca à igualdade de gênero em específico, uma série de políticas públicas e edição de diplomas legais vêm sendo implementados na busca desse objetivo. A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 defende que todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades sem distinção de qualquer espécie, inclusive de sexo.

Diversos organismos internacionais desde então levantam a bandeira do combate à desigualdade entre os sexos. Atos simbólicos neste sentido foram adotados, como a Declaração e Plataforma de Ação de Pequim, fruto da Quarta Conferência Mundial sobre as Mulheres, ocorrida em 1995 na mesma cidade. O

(16)

16 documento firma um acordo entre as nações participantes com o objetivo de alcançar a igualdade de gênero e eliminar a discriminação contra mulheres e meninas em todo o mundo.

Os Estados presentes reconheceram o patamar desigual nas estruturas e políticas econômicas, em todas as atividades produtivas e no acesso aos recursos, bem como no exercício do poder e na tomada de decisões em todos os níveis entre mulheres e homens (UNITED NATIONS, 1995).

Advoga-se que as desvantagens na educação verificadas em muitos países se traduzem no prejuízo de desenvolvimento de competências e, por conseguinte, em limitadas oportunidades no mercado de trabalho.

A persecução de um “Planeta 50-50” se baseia na ideia de que a equalização e a completa participação da mulher na força de trabalho é essencial para o desenvolvimento humano, na medida em que as condições atuais não permitem explorar o potencial feminino no seio social. Reporta-se que o empoderamento de meninas e mulheres adiciona pontos percentuais para a maioria dos índices de crescimento das nações, os quais, em alguns países, duplicam os dígitos verificados. A igualdade entre homens e mulheres inclusive foi alçada em 2000 como um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio estabelecidos pela Organização das Nações Unidas e adotados pelos seus 191 Estados membros. A ação conta com metas contundentes como: pôr fim em todas as formas de discriminação contra mulheres e meninas; reconhecer e valorizar o trabalho doméstico mediante a provisão de serviços públicos adequados; promover a responsabilidade compartilhada pelo lar e pela família; garantir a efetiva participação e iguais oportunidades de liderança das mulheres nos níveis de tomada de decisão da política e economia, inclusive por meio da adoção de medidas legislativas e políticas públicas que caminhem em direção à igualdade de gênero e empoderamento das mulheres.

Apesar de todos os esforços, a análise dos variados estudos sobre a participação feminina no mercado de trabalho privado lança luz sobre o fato de que o equilíbrio com o público masculino ainda está longe de ser alcançado, notadamente no tocante ao recrutamento, à ocupação de cargos de direção e à remuneração igualitária pelos serviços prestados. Fatores como filhos, grau de responsabilidade com o lar e estado civil são determinantes no cenário empresarial quando se analisam as relações de sexo/gênero e o papel tradicionalmente imputado à mulher no seio familiar (PAZELLO e FERNANDES, 2005).

(17)

17 Estudo da FGV São Paulo (2014), que coletou dados de 1997 a 2012 em 837 diferentes organizações do país, indicou que entre as principais razões que podem explicar a baixa representação de mulheres nos conselhos de administração e cargos superiores estão a falta de estrutura institucional e de medidas que possibilitem a flexibilização de horários para conciliar a vida profissional e pessoal, especialmente os cuidados com as crianças e o lar. Com isso, muitas se veem no dilema de ser mãe ou abandonar a carreira, tendo em vista que seus maridos geralmente ganham mais. Algumas acabam deixando a maternidade para uma idade mais avançada; outras, sequer se casam.

Na seara da Administração Pública, a seu turno, são poucos os estudos mais aprofundados para conferir um diagnóstico preciso da posição da mulher. Trabalho de Abreu e Meirelles (2012), que se concentrou em cargos de Direção e Assessoramento Superior (DAS), de livre nomeação, revelou que, embora em maior número neste setor, a desigualdade de gênero e as barreiras de ascensão também existem nos cargos de maior escalão da Administração Pública Federal.

Todavia não há, como dito, análises mais aprofundadas sobre os reflexos das características socioeconômicas do sexo feminino no acesso aos níveis iniciais dos cargos públicos por meio de concurso, instituto esse que foi constitucionalmente concebido pela Carta Magna de 1988 para proporcionar possibilidades isonômicas para todos, baseando-se em um sistema meritório de escolha.

Tendo em vista o cenário delineado, surge o problema a ser investigado: tal qual ocorre na seara privada, as condições socioeconômicas relacionadas ao sexo afetam o desempenho das mulheres em provas e testes de conhecimento de concursos públicos, implicando, por consequência, em um acesso desigual das mulheres ao serviço estatal?

Este estudo se divide em seis capítulos e está estruturado da seguinte forma: além desta introdução, o capítulo seguinte trata da contextualização do problema de pesquisa, com a definição dos objetivos gerais e específicos, delimitação e justificativa/relevância do problema; o capítulo três discorre acerca do marco teórico sobre o serviço público brasileiro e o recrutamento mediante concurso público, bem como a figura da mulher no cenário brasileiro, especialmente no ensino superior e no mercado de trabalho; o capítulo quatro informa a estratégia de investigação do estudo, cujos resultados são apresentados no capítulo cinco; por fim, no último capítulo são apresentadas as conclusões do trabalho e sugestões de pesquisa futura.

(18)

18

2. CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA

2.1 Objetivos do trabalho

2.1.1 Objetivo geral

Analisar a relação das condições socioeconômicas inerentes às mulheres com o desempenho verificado nos concursos públicos e, consequentemente, no acesso ao serviço público, buscando averiguar a aplicabilidade de eventuais barreiras de gênero nesta seara.

2.1.2 Objetivos específicos

Para viabilizar a consecução do objetivo final proposto, foram definidos os objetivos intermediários a seguir relacionados:

a) Identificar, em referenciais teóricos, quais as condições socioeconômicas ligadas ao sexo feminino que influenciam em sua participação no mercado de trabalho;

b) Estratificar, a partir da análise de dados socioeconômicos e de desempenho de participantes de concursos públicos nos últimos anos, quais condições das mulheres poderão suportar a resposta ao problema de pesquisa proposto, isto é, quais são os fatores que explicam o diferencial entre o percentual de inscritas do sexo feminino nos concursos em confronto com o percentual de aprovação deste público ao final do certame;

c) Analisar criticamente a influência dos fatores levantados no desempenho das mulheres em concursos e, por consequência, qual o seu reflexo no acesso ao serviço público.

2.2 Delimitação do estudo

O problema de pesquisa em debate exsurge a partir da ideia do concurso público ser concebido como o meio técnico posto à disposição da Administração Pública para obter-se moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam

(19)

19 aos requisitos da lei, fixados de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, consoante determina o art. 37, II, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (MEIRELLES, 2008).

O instituto, pois, foi idealizado para ser livre de subjetividades na avaliação dos concorrentes que impliquem na seleção de determinada pessoa, afastando assim escolhas direcionadas dos gestores públicos por preferências escusas e de caráter pessoal.

É amplamente cediço que há discriminação no setor privado em razão do sexo e gênero. Resta saber se essas barreiras também se encontram presentes no âmbito dos concursos públicos, sejam em maior ou menor grau, tendo em vista se tratar de um ambiente arquitetado para estar isento de diferenças entre os participantes.

Na persecução desta resposta, conforme o objetivo principal do estudo de analisar a relação das condições socioeconômicas inerentes às mulheres com o acesso ao serviço público, a presente pesquisa será centrada em bases de dados de concursos públicos realizados nos últimos cinco anos nas esferas federal, estadual e municipal, bem como em informações coletadas dos participantes de tais certames.

A opção nesta pesquisa foi por considerar somente as condições socioeconômicas dos indivíduos. Com esta delimitação, portanto, não serão analisados atributos tidos como subjetivos (e.g. proatividade, iniciativa, liderança, etc) que comumente são levados em consideração no recrutamento de pessoal na seara privada. Tais características não têm espaço no concurso público, posto que este se submete ao princípio basilar do julgamento objetivo1.

Importante também, neste diapasão, sublinhar a diferença entre sexo e gênero. O documento Gender statistics manual: integrating a gender perspective into statistics, da Divisão de Estatística das Nações Unidas (United Nations Statistics Division - UNSD), define que o termo "sexo" faz alusão às diferenças biológicas entre homens e mulheres, diferenças que são fixas e imutáveis; o termo "gênero", por sua vez, diz respeito às diferenças socialmente construídas em atributos e oportunidades associadas com o sexo feminino ou masculino e as interações e relações sociais entre homens e mulheres (UNITED NATIONS, 2013).

1 “Todo concurso público, em quaisquer de suas fases, submete-se ao princípio do julgamento objetivo (...) toda prova de concurso público deve ser objetiva. Quando se afirma que existem provas objetivas, discursivas, orais, leva-se em consideração a estrutura das questões e não os critérios de seu julgamento ou correção, que devem sempre ser pautados em parâmetros prévios e objetivos.” (MAIA, 2007).

(20)

20 O recorte da pesquisa propõe a verificação das características socioeconômicas que possam objetivamente ser verificadas na população analisada (e.g. existência de filhos, estado civil, idade, cor/raça, entre outros) e seus reflexos diretos na vida social das mulheres, considerando o papel que lhe foi historicamente atribuído no ambiente familiar.

Adota-se aqui a ideia de que a aprovação em concursos públicos depende sobretudo de estudo específico e direcionado para as matérias previstas no conteúdo programático do edital normatizador do certame, de modo que um maior grau formal de instrução e ensino (que no país, como dito alhures, é do público feminino) não necessariamente se constitui em fator preponderante para o bom desempenho nas provas que compõem o processo seletivo.

Assim, buscar-se-á testar na pesquisa a hipótese de que há relação direta entre o papel da mulher no seio familiar e a influência no desempenho nas provas do concurso público: quanto maior a responsabilidade assumida no lar pela mulher, maior será o efeito negativo em sua performance nos testes do certame.

A mulher, no geral, possui maior carga horária de trabalho do que o homem, se considerados os afazeres profissionais e domésticos (PNUD, 2016). Essa cumulação de funções repercute diretamente no tempo disponível para o estudo direcionado ao conteúdo programático do concurso e afeta negativamente o desempenho nas provas. Ainda que o grau de instrução formal da mulher seja superior, este não se mostra suficiente para suplantar o conhecimento acumulado por aqueles que se prepararam para o certame mediante estudo específico.

O comportamento diferencial entre o percentual de inscrições nos concursos de candidatas do sexo feminino em confronto com o percentual de aprovação deste público suportará a explicação desse fenômeno.

Buscar-se-á também testar essa hipótese em ambientes de candidaturas a cargos cujas profissões são consideradas nichos do sexo feminino ou masculino e também em comparação a outras áreas de atuação, onde haja distribuição igualitária entre homens e mulheres; assim, objetiva-se verificar o comportamento da variável das candidaturas ao certame como hipótese para resposta ao problema de pesquisa. Assumindo ainda a ideia de que quanto mais alto o escalão do cargo colocado em disputa, maior será a complexidade das provas e o grau de concorrência do concurso, outra hipótese a ser testada será a de que o acesso das mulheres a tal grupo de cargos é afetado de maneira ainda mais relevante, tendo em vista que a

(21)

21 exigência de conhecimento acumulado para aprovação em certames com tais características, mediante estudo direcionado, é proporcionalmente maior.

2.3 Justificativa / Relevância do problema

A participação feminina no mercado de trabalho privado tem sido amplamente estudada na literatura nacional e mundial. Diversos autores das áreas administrativa e econômica têm se interessado sobre o tema, analisando-o sobre os mais variados enfoques e abordagens, de modo que pode ser dito de que não se trata de um assunto desconhecido ou cujas variáveis sejam um enigma. O tratamento empírico do tema também tem sido amplo, explorando os motivos pelos quais as mulheres buscam o trabalho e como se desenvolvem em suas carreiras.

Na seara pública, como alhures mencionado, os estudos ainda carecem de maior profundidade. Recente pesquisa do Grupo de Pesquisas em Direito e Gênero da FGV (2014) demonstrou que no campo político o avanço da participação feminina também caminha a passos lentos. Se fosse mantido o mesmo ritmo observado nas Câmaras Municipais entre 1992 e 2012, a igualdade será atingida apenas em 2160. No Legislativo Federal, se considerado o ritmo de 1999 a 2015, a paridade seria atingida em 2083 no Senado, e, se considerados o de 1986 a 2014, em 2254 pela Câmara.

Raros também são os estudos que analisam a atuação feminina quando se trata de cargos de provimento efetivo por meio de concurso público. A verificação do Anuário RAIS - Relação Anual de Informações Sociais do Ministério do Trabalho e Emprego (2014) permite concluir que a predominância é masculina em praticamente todos os setores, com exceção da faixa de remuneração mais baixa do setor de serviços e justamente do setor da Administração Pública.

Quanto à primeira exceção, trata-se de indicador fortemente influenciado pela categoria de serviços domésticos, reforçando a figura feminina de responsável pelo lar. No que toca à área pública, cerne da pesquisa em epígrafe, a estratificação do Anuário relativo ao número de ocupantes dos cargos por sexo revela que o número de mulheres é consideravelmente maior em áreas básicas do serviço público, notadamente educação e saúde. Porém, à medida em que as faixas salariais aumentam, a presença da mulher é menor, reforçando o padrão também verificado na área privada de que há dificuldade desse público em galgar os postos de maior escalão hierárquico.

(22)

22 Acredita-se que este panorama seja explicado pela hipótese assumida nesta pesquisa, alhures detalhada, de que quanto mais alto o escalão do cargo colocado em disputa, mais penoso será o acesso das mulheres. Espera-se que neste ambiente o diferencial entre a taxa percentual de candidaturas e o número de mulheres aprovadas seja substancialmente afetado, dada a complexidade do certame.

A presente investigação se torna relevante tendo em vista uma concepção de que é necessário que as mulheres exerçam plenamente sua condição de sujeitos e de agentes, contribuindo não só para seu próprio desenvolvimento, mas para o da sociedade como um todo (SEN, 2000). Consoante essa ideia de desenvolvimento, o Estado, como agente legítimo de promoção da igualdade de gênero e da liberdade para todos – o que significa também do sexo feminino – por meio de políticas públicas e sociais, inclusive de ações afirmativas, torna-se uma arena de referência. Pois, se nem em seu âmbito esta igualdade se efetiva, como a promover em toda a sociedade? A Organização das Nações Unidas defende que as mulheres são mais suscetíveis de ter afetado o desenvolvimento humano em face das iniquidades sociais. Embora muitos outros grupos também tenham desvantagens, as privações sistêmicas impostas à mulher em relação ao homem merecem ser destacadas porque elas constituem metade da população mundial. Assim, considera-se esta a maior barreira atual para o progresso global no desenvolvimento humano (PNUD, 2016).

Em tempos onde o governo brasileiro tem buscado implementar políticas afirmativas para a inclusão social de públicos com histórico de segregação social (vide Decreto Federal nº. 3.298/1999 e Lei Federal nº. 12.990/2014, que implementam reservas de vagas em concursos públicos para pessoas com deficiência e negras, respectivamente), a discussão dos obstáculos colocados ao sexo feminino nesta mesma seara também se mostra imprescindível.

A igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres são dimensões fundamentais para o desenvolvimento humano. Existem diferenças de gênero tanto em capacidades quanto em oportunidades e o progresso da busca pela paridade ainda se mostra lento para efetivar o potencial total dessa metade da humanidade (PNUD, 2016). Recentemente, em setembro de 2015, em reunião histórica ocorrida em Nova Iorque, 80 líderes mundiais se comprometeram em encerrar a discriminação contra mulheres até 2030 e anunciaram concretas medidas para possibilitar rápidas mudanças, demonstrando a relevância do tema no cenário mundial.

(23)

23

3. MARCO TEÓRICO

3.1 O serviço público brasileiro

Di Pietro (2012, p. 50) nos traz a correlação do vocábulo administração com a seara pública, usando as seguintes palavras:

Basicamente, são dois os sentidos em que se utiliza mais comumente a expressão Administração Pública: (...)

a) em sentido amplo, a Administração Pública, subjetivamente considerada, compreende tanto os órgãos governamentais, supremos, constitucionais (Governo), aos quais incumbe traçar os planos de ação, dirigir, comandar, como também os órgãos administrativos, subordinados, dependentes (Administração Pública em sentido estrito), aos quais incumbe executar os planos governamentais; ainda em sentido amplo, porém objetivamente considerada, a Administração Pública compreende a função política, que traça as diretrizes governamentais e a função administrativa, que as executa; b) em sentido estrito, a Administração Pública compreende, sob o aspecto subjetivo, apenas os órgãos administrativos e, sob o aspecto objetivo, apenas a função administrativa, excluídos, no primeiro caso, os órgãos governamentais e, no segundo, a função política.

Medauar (2012, p. 52), por sua vez, pontua que “sob o ângulo organizacional, Administração Pública representa o conjunto de órgãos e entes estatais que produzem serviços, bens e utilidades para a população, coadjuvando as instituições políticas de cúpula no exercício das funções de governo”. Para ela, predomina a visão de uma estrutura ou aparelhamento articulado, destinado à realização de tais atividades.

Prossegue com uma importante consideração a respeito da aproximação dos termos administração e governo. Destaca afirmações em contrário, onde para alguns “Administração” significaria apenas realizar tarefas cotidianas e simples, enquanto que “governo” tem a ver com a tomada de decisões fundamentais à vida da coletividade, com vistas até ao seu futuro. A autora afirma que mostra-se difícil a fixação de fronteiras entre governo e Administração, pois atualmente, aumentou a importância da atividade administrativa na dinâmica do Estado, e uma das consequências disso é a participação de servidores em funções típicas de governo.

A evolução histórica e política brasileira, analisada conforme o instrumental teórico dominante em cada época descrita, constitui o elemento utilizado para distinguir os paradigmas que formam o campo da Administração Pública no Brasil, desde seus primórdios como ciência jurídica a partir de 1900 (KEINERT, 1992).

(24)

24 O modelo inicial pelo qual a Administração Pública como ciência desponta no cenário brasileiro, explica a autora, se baseia fundamentalmente na regulamentação dos procedimentos de forma pormenorizada nas leis e estatutos, o que em pouco tempo se revelou insuficiente para a solução dos problemas complexos vivenciados na seara administrativa e política. Todavia, de outra forma não poderia deixar de ser tendo em vista a herança legalista de Portugal, mesma situação de outros países latino-americanos de colonização ibero-portuguesa.

A despeito da decadência do modelo, percebe-se hodiernamente a sua grande influência na Administração Pública Brasileira. Todavia, a rigidez do sistema baseado em leis rapidamente demandou sua revisão, incluindo princípios de Administração que pudessem ser aplicados no campo público. É o que explica Nascimento (1967) ao relatar os insucessos das tentativas reformistas brasileiras através da delineação do modelo estratégico no qual estas se basearam, analisando os conflitos existentes em face da configuração e estruturação do poder público no país. Por exemplo, o foco da ação em elementos sobretudo formais, como a reorganização de estruturas e a revisão da legislação, muitas das vezes não surtiu efeitos relevantes.

Nesse momento temos importantes marcos como a criação do Departamento Administrativo do Serviço Público - DASP, com importância vital para a profissionalização da Administração Pública (principalmente com a introdução do instituto do concurso público e do treinamento aos servidores), e da Fundação Getulio Vargas, que demonstra a preocupação da academia com o tema.

Esse modelo perdura até a década de 80 em um ambiente nacional e mundial voltado para o desenvolvimento, o que levava à necessidade de criar condições administrativas para tal (FISCHER, 1984). Buscava-se, portanto, a preponderância do tecnicismo na gestão pública. A instabilidade econômica e social, porém, viria a integrar de forma mais profunda o aspecto político das decisões a serem tomadas na arena governamental, criando as bases para o paradigma emergente a partir da década de 90 (KEINERT, 1992).

Osborne e Gaebler (1996) discorrem que a demanda por sistemas dotados de flexibilidade e adaptabilidade era crescente e necessária para evitar o engessamento e a ineficiência da máquina. Igualmente, a sociedade, notadamente os grupos minoritários que a compõem, passavam a exigir uma forma personalizada no atendimento, o que somente uma nova pensar na gestão governamental poderia vir a responder positivamente.

(25)

25 Essa nova forma de pensar descrita pelos autores viria a consolidar o que hoje conhecemos como a Nova Administração Pública (New Public Management), um modelo para fazer frente à nova realidade de constantes mudanças e riqueza de informações, concedendo ferramentas ágeis aos gestores para a tomada de decisões. Descentralização da autoridade, foco na qualidade, aproximação dos clientes, flexibilidade, inovação e empreendedorismo passaram a integrar constantemente o vocabulário da seara governamental.

Esse pensamento inovador, portanto, reclama que o corpo de servidores esteja em sintonia com as novas competências exigidas para o desempenho do múnus público. Para isso, as figuras da capacitação (dos servidores que já estão na Administração) e do concurso público (para o recrutamento dos novos agentes) ganham papel central de importância.

3.2 Recrutamento, seleção e gestão por competências no serviço público

A administração correta dos recursos humanos de uma organização corresponde à sua própria gestão, considerando que é por meio de seus funcionários/servidores que são colocadas em prática as decisões tomadas.

Nesse contexto, apresenta-se de suma importância o conceito de recrutamento e seleção de indivíduos. Milkovich e Boudreau (2000, p. 117), definem recrutamento exprimindo as respostas a que esse processo deve buscar, in verbis:

O recrutamento determina a composição dos recursos humanos em uma organização. Quantas pessoas devemos empregar? Quais habilidades, capacidades e experiências devem possuir? Quando e como as pessoas devem ser recrutadas, transferidas ou demitidas? Estamos selecionando os indivíduos corretos para cada caso?

Oliveira e Medeiros (2011), afirmam que o recrutamento é o primeiro passo de um processo de seleção, o que atrai os candidatos interessados que se enquadrem nas exigências iniciais para o preenchimento daquela vaga. Para eles, portanto, o sucesso de uma seleção depende de um bom recrutamento e de fatores que influenciam diretamente o mercado de trabalho.

O recrutamento de pessoas no meio público, todavia, comporta importantes distinções com relação à esfera privada. É que, como será explorado mais

(26)

26 detalhadamente adiante, o meio de admissão – concurso público – é previsto em nossa Lei Maior, não podendo fugir desta regra de acesso o administrador, quando da escolha dos ocupantes do cargo.

Porém, os mesmos autores Oliveira e Medeiros (2011, p. 62) aduzem que

o fato de os procedimentos de admissão no setor público serem previstos em lei não emperra o seu caráter estratégico e gerencial, tratando-se, portanto, de um conjunto de características peculiares ao setor, que exige medidas criativas e diferenciais, que atendam às suas necessidades.

Essa necessidade de adequação dos procedimentos para admissão de pessoas na seara pública é defendida por Marini (2005), que ao se referir às mudanças na Gestão de Pessoas do setor público que devem acompanhar a complexidade das exigências sociais atuais, diz que o servidor não é mais visto como um recurso produtivo que é selecionado para fazer tarefas determinadas, adestrado para o cumprimento burocrático, remunerado e avaliado por sua produtividade e obediência.

Todavia, somente mais recentemente se vê o cotidiano administrativo preocupado com o futuro e adotando ações proativas, com visão estratégica. Muito comumente, ainda, boa parte dos servidores se depara com questões rotineiras e imprevistos que por vezes demanda a interrupção dos planos estratégicos já estabelecidos em razão de pressões de curto prazo, no mais das vezes para satisfazer medidas de cunho político. A reflexão e o planejamento das ações em andamento e também das futuras permitem um melhor entendimento do todo, fazendo com que o cotidiano seja mais eficaz (MOTTA, 2004).

Para isso, o planejamento estratégico figura como uma eficiente ferramenta, uma vez que nele se estabelece a definição de missão; estabelecimento dos objetivos de longo prazo; análise de ambiente interno e externo; e formulação, implementação e controle da estratégia (WOLF E FLOYD, 2013).

Defende-se, portanto, a ideia de gestão estratégica de pessoas para o serviço público. Bresser-Pereira (1997, p. 21) declarou que “uma estratégia essencial ao se reformar o aparelho do Estado é reforçar o núcleo estratégico e ocupá-lo com servidores públicos altamente competentes, bem-treinados e bem-pagos”.

Demonstra-se, nessa esteira de entendimento, a importância de se pensar no concurso público como efetiva política pública, a fim de combater a atual deficiência na profissionalização da gestão de pessoas na administração pública revelada por

(27)

27 estudo do Tribunal de Contas da União.

Há significativas deficiências nos sistemas de governança e gestão de pessoas da maioria das organizações avaliadas, o que certamente está comprometendo a capacidade delas de gerar resultados e benefícios para a sociedade, além de expô-las a diversos riscos relevantes, tais como: descumprimento de leis; corrupção; gastos com ações ou servidores que não agregam valor para a organização; falta de pessoal qualificado em áreas críticas; excesso de pessoal em outras áreas; desmotivação e falta de comprometimento com o trabalho (BRASIL, 2013, p. 23)

A gestão por competências deve ser utilizada como um importante mecanismo e instrumento para se alcançar a gestão estratégica de pessoas, tendo em vista seu potencial em integrar uma série de importantes atividades de gestão de recursos humanos (OCDE, 2010).

Amaral (2006), sugere que a moderna gestão de pessoas se assenta em um tripé estratégico: gestão por competências, democratização das relações de trabalho para gerar ambientes adequados à inovação e qualificação intensiva das equipes de trabalho, incluindo o uso de tecnologia da informação.

O relatório da OCDE “Avaliação da gestão de recursos humanos no governo” para o Brasil (2010) cita que apesar dos consideráveis esforços que o governo brasileiro tem feito no reforço de sua capacidade de recursos humanos, a sua estrutura orientada por regras rígidas e complexas e a falta de espaço para a experimentação apresenta entraves para a gestão baseada em competências no serviço público.

O mesmo documento elenca exemplos de boas práticas adotadas mundo afora na seleção e recrutamento de pessoal para o serviço público.

A Bélgica oferece um exemplo de país com acordos de recrutamento relativamente sofisticados. O recrutamento privilegia critérios de mérito e são baseados nas descrições de cargos e exigências de competências delineadas pelas organizações de recrutamento. Ao longo do tempo, o processo de recrutamento se deslocou dos longos concursos generalistas para um recrutamento baseado em perfis específicos de competência. Atualmente, a seleção está baseada em perfis genéricos de competência em apenas 10% dos casos e perfis específicos de competência em 90%. A amplitude e a qualidade do histórico educacional afeta a avaliação de um candidato. Os inscritos que atendem estes requisitos participam de diferentes testes de habilidades, competências e atitudes. O conteúdo destes testes depende do tipo

(28)

28 de posto e o critério de recrutamento e pode incluir um teste psicológico.

A Irlanda possui processo semelhante ao da Bélgica. Os testes abstratos deram lugar a testes de simulação do trabalho, exercícios estratégicos, avaliações de competência e, em menor medida, a avaliação das realizações profissionais. Ao fim, o processo gera um ranqueamento de candidatos aprovados.

Trata-se de um modelo muito distinto do que se vê no Brasil. Fontainha et al. (2014) tece severas críticas ao que chamou de modelo baseado em uma ideologia concurseira que serve a fins mercadológicos e que se orienta para si mesmo, não para os projetos institucionais das organizações públicas. Com isso, suporta a tese de que o instituto falha no cumprimento de seu escopo, qual seja, selecionar os candidatos mais bem preparados para a prestação dos serviços públicos.

Enumera diversos fatores para referendar este entendimento, tais como: a falta de profundidade de provas de natureza objetiva em avaliar competências e habilidades dos candidatos, a reserva do mercado para um grupo seleto de entidades organizadoras, a inadequação dos conteúdos programáticos das provas e até mesmo a cobrança de taxas de inscrição dos candidatos.

Também contrário ao atual modelo, o jurista Lenio Luiz Streck (2017) brada que

No Brasil, os concursos ganharam vida própria: viraram grandes negócios. Conduzidos pela adamsmithiana mão invisível da concursocracia, passaram a incrementar quiz shows que cobram decorebas e espertarias, retroalimentados por uma indústria de livros-apostilhas-resumos e afins. Um círculo vicioso.

Bresser-Pereira (1997, p. 27) arremata criticando que os concursos públicos são realizados sem nenhuma regularidade e avaliação periódica da necessidade de quadros, fato que leva à admissão de um contingente excessivo de candidatos a um só tempo, seguida de longos períodos sem uma nova seleção, o que inviabiliza a criação de verdadeiras carreiras.

Estudos internacionais também se ocupam da discussão do modelo (Dahlström et al., 2012; Dewey, 1973; Zeng, 1999). Em sua pesquisa, Sundell (2014) encontrou que tal modelo frequentemente leva à cultura excessiva de doutrinação para os testes escritos, carecendo de flexibilidade para enfrentar os novos desafios postos a cargo da Administração e nem sempre privilegia a meritocracia. Por outro lado, a adoção de outras práticas de seleção – mais subjetivas – dá margem ao apadrinhamento e nepotismo, somente tendo lugar em países com baixo nível de corrupção que possuam salvaguardas legais contra tais práticas nefastas.

(29)

29 Considerando este cenário, recomenda a OCDE (2010) que o governo brasileiro introduza um processo de nomeações internas que permita aos servidores públicos concorrerem por certos cargos sem terem de se submeter a um concurso público que testa habilidades acadêmicas básicas.

A organização reputa como possível a combinação de concursos externos para determinados cargos e concursos internos para outros, em processos baseados em mérito com procedimentos de seleção transparentes e objetivos. Tais certames normalmente são supervisionados por uma comissão de nomeações do serviço público de algum tipo e geralmente há uma via de recurso em caso de insatisfação com o processo.

Boa parte dos países desenvolvidos vem migrando dos rígidos concursos acadêmicos para a avaliação por competências e desempenho passado, que são considerados formas mais adequadas de medir o mérito para recrutamento em administrações públicas (OCDE, 2010). Neste caso, as avaliações ocorrem em dois estágios, um avaliando as habilidades acadêmicas e o conhecimento básico e outro com um grupo selecionado de candidatos, avaliando as competências e desempenhos passados, em alguns casos.

A incorporação de mais fases nos concursos públicos, como por exemplo, a realização de cursos de formação, cursos de ambientação, entrevistas, testes psicológicos e exames de saúde para a comprovação de certas habilidades, a exemplo de países membros da OCDE, são propostas válidas e que merecem espaço na experiência brasileira.

Diante do exposto, entende-se que as experiências exitosas no recrutamento no serviço público baseadas em aspectos de mérito devam ser replicadas no Brasil. Para isso, alguns entraves de natureza operacional, cultural e jurídica deverão ser superados. Alguns deles são a seguir relacionados:

 dificuldades em mapear as competências existentes nas organizações;  lacuna entre a elaboração do modelo e a aplicação;

 regras legais rígidas para o recrutamento;

 definição de requisitos de provimentos dos cargos em leis e regulamentos de difícil alteração;

 avaliação das habilidades e competências no recrutamento;

(30)

30

Dada a estrutura legalista do Estado Brasileiro, far-se-á necessário a edição de diplomas legais regulando tais alterações e definindo critérios objetivos para sua implementação, a fim de que o instituto seja aperfeiçoado.

3.2.1 Breve histórico do concurso e sua configuração como política pública de recrutamento de pessoal

No saber de Hely Lopes Meireles (2008), o concurso é o meio técnico posto à disposição da Administração Pública para obter-se moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei, fixados de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego.

Márcio Barbosa Maia e Ronaldo Pinheiro de Queiroz (2007), em obra dedicada aos concursos públicos, definem o instituto como um processo administrativo especial, externo, ampliativo e concorrencial, que visa a selecionar e recrutar pessoas, atendidos os requisitos legais, para assumir cargos ou empregos públicos vagos na estrutura administrativa estatal, mediante realização de provas ou provas e títulos, atendida a ordem de classificação final dos candidatos.

O conceito formulado é melhor esclarecido por Maia e Queiroz (2007, p. 15), que afirmam:

O concurso público, segundo entendimento doutrinário de Celso Antônio Bandeira de Mello, ostenta a natureza de um procedimento administrativo externo, ampliativo e de índole concorrencial. Externo, porque deve ser aberto à coletividade; ampliativo, pois visa ao exercício de um direito constitucionalmente assegurado; concorrencial, porque envolve uma competição entre os administrados com vistas ao credenciamento junto ao Estado do status de agente público.

José dos Santos Carvalho Filho (2007, p. 502), em sua definição, sustenta que:

Concurso público é o procedimento administrativo que tem por fim aferir aptidões pessoais e selecionar os melhores candidatos ao provimento de cargos e funções públicas. Na aferição pessoal, o Estado verifica a capacidade intelectual, física e psíquica de interessados em ocupar funções públicas e no aspecto seletivo são escolhidos aqueles que ultrapassam as barreiras opostas no procedimento, obedecida sempre a ordem de classificação. Cuida-se, na verdade, do mais idôneo meio de recrutamento de servidores públicos.

(31)

31

Merece relevo o fato de que a doutrina pátria eleva o instituto como a forma mais recomendada de se prover os cargos públicos, na medida em que homenageia princípios tidos como indispensáveis para o agir da Administração Pública. Nesta linha de raciocínio, Cretella Júnior (2002, p. 357) sai em defesa dos concursos públicos como instrumento de defesa de um Estado Democrático de Direito:

Embora se diga que o concurso não é isento de falhas insanáveis, afastando as maiores capacidades que, por modéstia ou timidez, não pretendem arriscar a reputação de que gozam perante comissões nem sempre unanimemente idôneas, tendo sido, por isso mesmo, repelido pelas antigas legislações da Inglaterra e da Alemanha, que no entanto, por outros processos levaram às cátedras nomes famosos, como Kant e Ihering, embora também se diga que alguns candidatos, por acaso, podem ser beneficiados por matéria que justamente mais conheçam, não obstante se diga também que os mais brilhantes possam impressionar melhor nas provas públicas, o que ninguém pode negar é que, de todos os modos de seleção, é o único que tem o grande mérito de arredar in limine os absolutamente incapazes, o único que procede de acordo com princípios informativos de índole científica.

Diante dos conceitos trazidos a lume, tem-se o concurso público como o procedimento constitucionalmente estabelecido para o ingresso aos cargos e empregos públicos, ressalvadas as hipóteses de cargos em comissão de livre nomeação e exoneração, por meio do qual os interessados, diante da publicação de um instrumento convocatório (edital) do certame, se candidatam aos cargos colocados em disputa, submetendo-se à aferição de seus conhecimentos e aptidões por meio de provas ou provas e títulos, sendo que aqueles que se mostrarem mais qualificados poderão assumir o desempenho da função pública.

A despeito de previsto no ordenamento jurídico pátrio desde o Império, apenas recentemente o concurso se tornou regra de observância obrigatória para o recrutamento de pessoal na Administração Pública.

Buscando a objetividade, apresenta-se no quadro a seguir os principais diplomas constitucionais que abordaram o instituto e suas disposições mais relevantes, conforme ensina a obra de Maia e Queiroz (2007):

Quadro 1 - Histórico do concurso público na legislação brasileira

Marco legal Principais disposições

Constituição do Império

Cargos públicos exercidos por delegação direta ou indireta do Imperador; escolha discricionária dos ocupantes pelo Chefe de Estado; o Texto Maior, porém, já previa que “todo cidadão pode ser admitido aos Cargos Publicos Civis, Políticos ou Militares, sem outra differença, que não seja a dos seus talentos, e virtudes” (art. 179, XIV).

(32)

32

Decreto Imperial nº 25

O diploma legal, de 12 de agosto de 1833, tido como marco histórico do concurso público no Brasil, condicionava o acesso ao provimento das cadeiras de Lentes nos Cursos Jurídicos de Olinda e São Paulo a uma espécie de seleção imparcial. Constituição da

República de 1891

Art. 73: “os cargos publicos, civis ou militares, são accessiveis a todos os brazileiros, observadas as condições de capacidade especial, que a lei estatuir, sendo, porém, vedadas as accumulações remuneradas”.

Constituição da República de 1934

Concurso público passa a ser instituto constitucionalmente expresso; estabeleceu-se a necessidade de exame de sanidade e concurso de provas ou títulos, porém apenas para a investidura no cargo inicial da respectiva carreira e quando expressamente previsto em lei formal; primeira Constituição a assegurar a estabilidade aos servidores públicos.

Constituições da República de 1937

e 1946

Manteve-se a obrigatoriedade do concurso na primeira investidura nos cargos de carreira e, para os demais cargos, apenas quando houvesse expressa previsão legal.

Constituição de 1967/1969

Ampliação da obrigatoriedade do concurso público para acesso a todos os cargos públicos; obrigatoriedade de realização de provas no certame, vedando-se a possibilidade de admissão apenas com análise de títulos.

Constituição da República de 1988

Universalização do concurso público para cargos e empregos públicos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; adoção do instituto como regra geral de observância compulsória pelos entes estatais.

Fonte: Maia e Queiroz (2007). Elaboração própria.

Kleber Nascimento (1967) menciona que a Constituição de 1937 condicionava o ingresso para todos os cargos de carreira de todo serviço público ao sistema de concursos. Todavia, devido ao caráter globalista da reforma administrativa idealizada na época, que centralizou no DASP a incumbência de realizar de todos os concursos a nível nacional, impediu-se a adoção do modelo em todos os entes federados, uma vez que o órgão não possuía capacidade técnica para gerenciar tantos certames.

Atualmente, o concurso tem base legal conferida pelo art. 37, inciso II, da Constituição de 1988:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

A despeito disso, ainda não teve a devida atenção do legislador para uma regulamentação correspondente à sua importância como verdadeiro instrumento de moralidade e eficiência do Poder Público.

De toda forma, ao exigir a aplicação de provas ou de provas e títulos para o acesso aos cargos e empregos públicos (Art. 37, incisos I e II), a Constituição de 1988 mostra um avanço na forma de seleção dos servidores públicos e, ao mesmo tempo, garante a isonomia entre os poderes e entre os cargos que possuam funções análogas

(33)

33 (BRESSER-PEREIRA, 1997).

Ao menos em tese, os serviços públicos são mais bem desempenhados quando os ocupantes dos cargos que os executam são aqueles mais bem preparados para esta missão, conforme corrobora Maia e Queiroz (2007, p.2), que arrematam:

Veja-se que o desenvolvimento nacional passa necessariamente pela valorização do servidor público e, consequentemente, do instituto do concurso público, que constitui a ferramenta constitucional posta ao alcance de todos os cidadãos para o acesso democrático ao Poder Público.

Segundo Marinela (2010), observa-se este esforço também com a edição da Emenda Constitucional nº. 19/98, denominada de “Reforma Administrativa”, a qual introduziu o modelo de administração gerencial na Administração Pública, em caráter de substituição do modelo burocrático e legalista, passando a se apoiar fundamentalmente no princípio da eficiência.

Prossegue a estudiosa, destacando que essa aproximação com a eficiência desloca o foco da Administração Pública para a obtenção de resultados, mediante o incentivo a práticas gerenciais, e.g., redução de controles de procedimentos (atividades-meio), instrumentos para assegurar que a produtividade dos agentes públicos seja próxima daquela que se observa quanto aos trabalhadores de empresas privadas, entre outros.

Logo, pode-se aferir novamente que estas inovações refletem a tendência de adoção de uma Nova Gestão Pública, sendo uma de suas características mais marcantes a importação de práticas gerenciais comuns ao setor privado para o plano público, incluindo temas ligados à eficiência, qualidade, produtividade, avaliação e controle de resultados, governança, governabilidade, satisfação do consumidor, prevenção e controle de gastos, todos estes antes vistos com maior frequência somente na administração de organizações privadas.

Para fazer jus a este novo pensamento, mister se faz que os gestores pensem no concurso público enquanto verdadeira política pública que deve de fato ocupar constantemente a agenda da Administração Pública, e o qual deve ser planejado com critérios adequados de implementação e avaliação a fim de repercutir em um recrutamento de recursos humanos verdadeiramente capacitados e preparados para o desempenho do múnus público.

A concepção de uma política pública perpassa as fases de formulação, implementação, resultados e impactos, constituindo o policy cycle (UNIVERSIDADE

(34)

34

Implementação

(entrevistas com os gestores das áreas, mapeamento profissiográfico dos cargos, concepção do edital do

concurso e definição das regras da seleção) Avaliação

(avaliação dos servidores recrutados, participação dos técnicos especialistas em cada área, acompanhamento pela Comissão do Concurso e avaliação de desempenho dos candidatos nomeados)

DE CAMPINAS, 1999), muito utilizado enquanto ferramenta metodológica.

Se faz necessário planejar o concurso sob o enfoque da análise de políticas públicas frente ao ciclo de sua elaboração, como um processo dinâmico, tal qual definido por Cavalcanti (2006). Para a autora, o ciclo não tem ponto de partida ou de chegada definidos e envolve não só formuladores e implementadores, mas também os stakeholders – pessoas envolvidas na política ou nela interessadas.

Significa dizer que devem os gestores públicos superar a prática comum de deixar as seleções a exclusivo cargo de entidades organizadoras terceirizadas, as quais não conhecem a real necessidade de pessoal dos órgãos e tampouco os perfis exigidos para o fiel desempenho das atribuições dos cargos vagos. Devem, na realidade, envolver os técnicos das áreas sensíveis do órgão, a fim de levantar suas necessidades, realizar o mapeamento profissiográfico de cada cargo e desenhar um processo de seleção que seja capaz de absorver as habilidades daqueles que se candidataram aos postos colocados em disputa.

Considerando as etapas do policy cicle descritas por Secchi (2013), apresenta-se um resumo das sugestões para o aprimoramento do instituto, em suas faapresenta-ses interna (planejamento) e externa (execução):

Figura 1 – CONCURSO COMO CICLO DE POLÍTICA PÚBLICA

Fonte: Elaboração própria.

Fonte: Elaboração própria.

Identificação do problema

(levantamento de necessidades, satisfação da população quanto aos

serviços públicos e carência de pessoal nos quadros da

Administração)

Delimitação do problema

(levantamento do número de vagas e de quais cargos serão disponibilizados no concurso)

Formulação de alternativas / Tomada de decisões

(adequação aos requisitos legais, constituição da Comissão de Acompanhamento do concurso, definição da entidade organizadora)

(35)

35 Fato é que é merecido debruçar-se sobre o assunto. Os participantes contumazes de concursos públicos, antes quase que invisíveis no país, hoje formam uma comunidade que conta com milhões de adeptos, criando uma verdadeira indústria de cursos preparatórios, que movimentam crescentes cifras ano após ano. Segundo dados divulgados pela Associação Nacional de Proteção e Apoio ao Concurso (Anpac) em 2010, estima-se que 12 milhões de pessoas se candidatem por ano em concursos públicos no país. Ademais, é inafastável a relevância do tema tendo em vista que a prestação de serviços públicos de qualidade depende diretamente de um recrutamento bem-sucedido.

Linda Deleon (2005) busca responder como as demandas dos cidadãos por eficiência e eficácia podem ser contrabalançadas com as exigências para propiciar um ambiente democrático. A autora discorre sobre os diferentes arranjos organizacionais que a Administração Pública pode apresentar e como tais formas podem vir a prover diferentes bens e serviços à sociedade.

Defende-se neste trabalho a ideia de que o concurso público deve servir como instrumento para democratizar a gestão pública, servindo como fonte para uma burocracia representativa, que serve como salvaguarda para representar os interesses dos cidadãos quando o sistema político não o faz adequadamente. Deleon advoga que (2005, p. 113):

A representative bureaucracy is one in which the workforce reflects the composition of the citizenry with respect to such qualities as class, gender, race, and ethnicity. A representative bureaucracy "symbolizes as well as promotes equal opportunity and equality" (…); it is often preferred by clients (…). More importantly, it should result in policy that serves the public interest.

Contudo, outros autores arguem que não basta a mera representação e atuação de determinados indivíduos como “curadores” dos interesses dos grupos diversos que integram a sociedade. A título de exemplo, autores apontam que é necessário aumentar a participação das mulheres na vida social e política para que elas vejam tenham efetivamente a implementação de políticas que convirjam com seus interesses (Guy, 1992 apud Deleon, 2005).

Arremata Deleon (2005) que o senso de responsabilidade e solidariedade dos gestores públicos somente é aguçado, bem como a agenda pública somente é de fato repensada, quando se efetiva e materializa a presença de grupos politicamente sub-representados no aparato administrativo e legislativo da nação.

(36)

36 público, única porta de entrada estabelecida pela lei para o serviço público brasileiro em caráter efetivo, possibilitar condições igualitárias de participação de todos os interessados em nele concorrer.

De acordo com o artigo 5º, caput, da CRFB/88, "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". Trata-se da igualdade formal estabelecida, a qual, contudo, deve ser permeada pela igualdade material, conforme ensinamentos de Daniela Ikawa apud Ricardo Lewandowski (2012, p.5)

O princípio formal de igualdade, aplicado com exclusividade, acarreta injustiças (...) ao desconsiderar diferenças em identidade. (...)

Apenas o princípio da igualdade material, prescrito como critério distributivo, percebe tanto aquela igualdade inicial, quanto essa diferença em identidade e contexto. Para respeitar a igualdade inicial em dignidade e a diferença, não basta, portanto, um princípio de igualdade formal.

Logo, questiona-se: é justo o sistema de seleção baseado em programas de estudo extensos e que demandam excessivo tempo de dedicação longe da família e do lar, mediante a aplicação de provas de conhecimento em que a capacidade crítica e analítica no mais das vezes é desprezada? Em provas onde a maioria das questões se baseiam na mera memorização e reprodução de definições legais ou técnicas, os candidatos selecionados possuem as competências necessárias para o cargo? Não se estaria, em termos gerais, direcionando os certames para um grupo seleto de pessoas que podem se dar ao luxo de direcionar suas vidas em prol do regime de estudos exigido para as provas?

Acredita-se que as mulheres brasileiras seja um desses grupos relegados na seara dos concursos. O perfil desse grupo será explorado nas próximas seções deste trabalho.

3.3 A mulher no cenário brasileiro

O papel da mulher na sociedade paulatinamente vem sofrendo grandes mudanças, embora a visão de inferioridade do sexo feminino ainda permaneça latente em nosso cotidiano. Segundo Rocha-Coutinho (1994), esse cenário existe desde as primeiras constatações em ciências biológicas que nos mostraram de forma determinista a diferença entre homens e mulheres, até o estabelecimento de um longo período relatado nas ciências sociais que, de um modo geral, tendiam a dar força à concepção masculina que encarava o poder exercido pelas mulheres com ilegítimo

Imagem

Gráfico 1 – Número de concursos por esfera de atuação do órgão
Figura 2 - Mapa de concursos por UF
Gráfico 2 – Distribuição de candidatos por coorte etária
Tabela 3 - Quantitativo (força de trabalho) dos Servidores Públicos Federais Civis Ativos do  Poder Executivo, por órgão da administração (cargos de nível superior),
+7

Referências

Documentos relacionados

Com o objetivo de compreender como se efetivou a participação das educadoras - Maria Zuíla e Silva Moraes; Minerva Diaz de Sá Barreto - na criação dos diversos

Mas ele é ( verbo ser, no Presente do Indicativo ) apenas um gato e não tinha tido ( verbo ter, no Pretérito Mais-Que-Perfeito Simples do Indicativo ) tempo de aprender (

Colhi e elaborei autonomamente a história clínica de uma das doentes internadas no serviço, o que constituiu uma atividade de importância ímpar na minha formação, uma vez

Todavia, nos substratos de ambos os solos sem adição de matéria orgânica (Figura 4 A e 5 A), constatou-se a presença do herbicida na maior profundidade da coluna

A Psicologia, por sua vez, seguiu sua trajetória também modificando sua visão de homem e fugindo do paradigma da ciência clássica. Ampliou sua atuação para além da

c) Após o surgimento dos Cursos Superiores de Tecnologia da área de Gerenciamento e Administração, os cursos de Bacharel em Administração são,

Considerando que a criminalização do aborto voluntário no primeiro trimestre da gravidez é uma grave intervenção em diversos direitos fundamentais da mulher e que essa

Como objetivos específicos pretendeu-se iden- tificar os taxa existentes nesta gruta, determinar a riqueza de es- pécies de sua comunidade; verificar a influência de fatores