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Representações sociais da maternidade elaboradas por mulheres gestantes, lactantes e que vivenciaram a gestação em privação de liberdade no sistema prisional

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Academic year: 2021

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MESTRADO ACADÊMICO

ANDERSON BRITO DE MEDEIROS

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA MATERNIDADE ELABORADAS POR MULHERES GESTANTES, LACTANTES E QUE VIVENCIARAM A GESTAÇÃO

EM PRIVAÇÃO DE LIBERDADE NO SISTEMA PRISIONAL

NATAL – RN 2019

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REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA MATERNIDADE ELABORADAS POR MULHERES GESTANTES, LACTANTES E QUE VIVENCIARAM A GESTAÇÃO

EM PRIVAÇÃO DE LIBERDADE NO SISTEMA PRISIONAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Enfermagem, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para obtenção do Grau de Mestre em Enfermagem.

Orientador: Prof. Dr. Francisco Arnoldo Nunes de Miranda.

Área de concentração: Enfermagem na atenção à saúde.

Linha de pesquisa: Enfermagem na vigilância à saúde.

NATAL – RN 2019

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REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA MATERNIDADE ELABORADAS POR MULHERES GESTANTES, LACTANTES E QUE VIVENCIARAM A GESTAÇÃO

EM PRIVAÇÃO DE LIBERDADE NO SISTEMA PRISIONAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Enfermagem, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para o Grau de Mestre em Enfermagem.

Área de Concentração: Enfermagem na atenção à saúde.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________ Dr. Francisco Arnoldo Nunes de Miranda

Universidade Federal do Rio Grande do Norte Orientador – Presidente da Banca

______________________________________________________ Dra. Jovanka Bittencourt Leite de Carvalho

Universidade Federal do Rio Grande do Norte Membro Interno

______________________________________________________ Dr. Dulcian Medeiros de Azevedo

Universidade do Estado do Rio Grande do Norte Membro externo à Instituição

______________________________________________________ Dr. Jaime Alonso Caravaca-Morera

Universidad de Costa Rica Membro Externo à Instituição

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Central Zila Mamede

Medeiros, Anderson Brito de.

Representações sociais da maternidade elaboradas por mulheres gestantes, lactantes e que vivenciaram a gestação em privação de liberdade no sistema prisional / Anderson Brito de Medeiros. - 2019.

108 f.: il.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências da Saúde, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Natal, RN, 2019.

Orientador: Prof. Dr. Francisco Arnoldo Nunes de Miranda.

1. Enfermagem - Dissertação. 2. Gravidez - Dissertação. 3. Lactação - Dissertação. 4. Prisões - Dissertação. 5. Prisioneiros - Dissertação. 6. Psicologia social - Dissertação. I. Miranda, Francisco Arnoldo Nunes de. II. Título.

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Às mulheres gestantes e lactantes do sistema prisional feminino, as quais foram postas à vulnerabilidade e se encontram nos intramuros dos presídios. Essas mulheres vivenciam a maternidade aprisionadas e excluídas dos direitos básicos ao ser humano, como saúde, educação e social, o que vem a potencializar penas.

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Ao final de mais uma caminhada, olho para trás e vejo o quanto tenho a agradecer aqueles que conspiraram em meu benefício, para que eu pudesse chegar neste momento e colher os frutos do meu esforço. Foram dois anos de muitos aprendizados e conhecimentos adquiridos.

A Deus, por todo meu percurso de vitória durante minha vida. Pelas conquistas permitidas e graças alcançadas.

As minhas mães (Deusa e Terezinha), por sempre escutarem meus anseios, angústias, felicidades e alegrias, mesmo, às vezes, sem compreender, mas com ouvidos e corações abertos.

A minha filha Tawany e aos meus irmãos, André e Maxwell, por vocês existirem e serem motivos para minha luta. Foi por vocês que cheguei até aqui, é por vocês que seguirei em frente.

Aos meus familiares, por acreditarem em mim, pelo apoio, pela admiração e pelo carinho. Na simplicidade de cada um de vocês, inspiro-me, diariamente.

À família Menezes, em especial ao Márcio, por todo apoio, conselhos e direcionamentos nessa caminhada. Vocês foram fundamentais.

Aos meus amigos, a paciência em me escutar, dividir momentos e serem, sobretudo, irmãos.

Ao meu orientador, Prof. Dr. Arnoldo, por ter me aceitado e contribuído, essencialmente, nessa jornada, “vamos que vamos”.

Aos membros do “Calabouço do Saber”, Grupo de Pesquisa Ações Promocionais de Atenção a Grupos Humanos em Saúde Mental e Coletiva, pela acolhida, especialmente, a Glauber, pelo apoio, pela contribuição e pelos ensinamentos.

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apoio e carinho nesse caminho.

Aos “filhos de Chalmers” - minha turma de Mestrado em Enfermagem 2018.1 – PGEnf/UFRN, pela amizade que construímos e pelos laços fortalecidos durante esse tempo, bem como as discussões, encontros, desencontros, dúvidas, anseios e alegrias vivenciadas.

Ao programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFRN, em especial aos doutores professores, pelos ensinamentos durante o curso de mestrado; a Olga e aos bolsistas de apoio técnico, pela colaboração e contribuição durante o percurso do curso.

Aos professores Dr. Jaime, Dr. Dulcian e Dra. Jovanka, pela participação e contribuição na banca de qualificação e de defesa, bem como na qualidade da dissertação.

À Maternidade Escola Januário Cicco (SR), ao Hospital Universitário Onofre Lopes (5º andar e coordenação) e à Maternidade Professor Leide Morais, por todas as grandes amizades construídas e experiências adquiridas. Vocês foram essenciais para meu crescimento profissional e pessoal.

Às instituições prisionais femininas do Estado do Rio Grande do Norte, pela oportunidade da realização da pesquisa; aos profissionais (agentes penitenciários, diretores e profissionais da saúde), pelo apoio e pela criação de vínculos nesse universo delicado.

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É fácil esquecer que mulheres são mulheres sob a desculpa de que todos os criminosos devem ser tratados de maneira idêntica. Mas a igualdade é desigual quando se esquecem as diferenças. É pelas gestantes, os bebês nascidos no chão das cadeias e as lésbicas que não podem receber visitas de suas esposas e filhos que temos que lembrar que alguns desses presos, sim, menstruam (QUEIROZ, 2015, s/p).

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prisional, bem como a lactação, são processos delicados, complexos e posto à margem, atentando contra a melhor a experiência da maternidade. A vivência do processo gestacional, no ambiente carcerário possibilita interações que reelaboram os sentidos e o mundo simbólico dessas mulheres. Objetivo: Analisar as representações sociais da maternidade de mulheres gestantes, lactantes e que vivenciaram a gestação em privação de liberdade no sistema prisional. Método: Trata-se de estudo qualitativo, ancorado nos pressupostos do Paradigma Teórico das Representações Socais, na vertente estrutural, realizado com 42 mulheres gestantes, lactantes e que vivenciaram a gestação em privação de liberdade no sistema prisional do Estado do Rio Grande do Norte, entre maio e setembro de 2019. Para coleta de dados, utilizou-se de instrumento de pesquisa composto por questionário sociodemográfico, de entrevista semi-dirigida com a utilização da técnica de evocação livre de palavras, associada ao modelo de substituição e descontextualização (zona muda), com o termo indutor “ser mãe na prisão” e desenho-estória com tema. Os dados foram analisados através de processamento prototípico (quadro de quatro casas) para cada matriz, para as quais foram calculadas, automaticamente, frequências intermediárias (±8,37 matriz 1 e ±8,10 matriz 2) e ordens médias de evocações (matriz 1: ±3,08; matriz 2: ±3,01), de acordo com os requisitos. Compuseram, assim, os núcleos centrais, as periferias e as zonas de contrastes. Realizou-se, ainda, o teste de composição e co-ocorrência das palavras (análise de similitude). O processamento analítico se deu no software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRAMUTEQ), versão 7 alpha 2. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte: 08005219.7.0000.5537. Resultados: As participantes eram, em maioria, jovens entre 18 e 39 anos de idade (90,5%; n=38) e se encontravam solteiras (50,0%; n=21). 61,9% (n26) relataram duas ou mais gestações, e 47,6% (n=20) referiram um ou mais abortamentos. Na análise prototípica, verificou-se que o termo indutor resultou em 420 evocações e 133 palavras distintas. Após categorização e lematização, o número de palavras diferentes evocadas pelas mulheres foram 84 entre as matrizes 1 e 2. Excluindo-se as evocações com frequência inferior a três, resultou-se em aproveitamento de 31,15%. Na matriz 1, a possível representação do ser mãe na prisão, se cristalizou, principal e semanticamente, pelos termos: separação (f=27; OME: 2.9), tristeza (f=18; OME: 2.3), horrível (f=16; OME: 2.1), dor (f=12; OME: 2.8). Na zona de substituição e de descontextualização (matriz 2), as representações foram objetivadas pelos termos separação (f=18; OME: 3), tristeza (f=13; OME: 2.5), medo (f=11; OME: 2.2), horrível (f=10; OME: 1.5). Desta forma, a única diferença lexical entre os dois núcleos foi a mudança da palavra dor por medo na matriz 2, mantendo a cristalização entre os dois quadros no que se refere ao núcleo central. Na análise de similitude, o núcleo central, composto pelo termo “separação”, teve forte co-ocorrência com as palavras: “sofrimento (11), distante (4), abandonada (3), horrível (9), adoção (4) e tristeza (8)”.

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cedo pelas mulheres, ao projetar a desvinculação. Considerações finais: Evidenciou-se que as representações sociais das participantes do estudo, apresentam sentimentos e significados generalizados do “ser mãe na prisão”, que refletem, diretamente no sofrimento vivenciado pela díade materna com a separação, os quais fragilizam e potencializam o aprisionamento feminino, significando para essas mulheres, essencialmente, sofrimento pela dicotomia do vínculo com o filho.

Descritores: Enfermagem. Gravidez. Lactação. Prisões. Prisioneiros. Psicologia Social.

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system, as well as lactation, are delicate, complex and marginalized processes, undermining the best experience of motherhood. The experience of the gestational period in the prison environment enables interactions that rework the senses and symbolic world of these women. Objective: To analyze the social representations of the maternity of pregnant and lactating women who experienced pregnancy deprived of liberty in the prison system. Method: This is a qualitative study, anchored in the assumptions of the Theoretical Paradigm of Social Representations in the structural strand, realized with 42 pregnant and lactating women who experienced pregnancy deprived of liberty in the prison system of the state of Rio Grande do Norte, between May and September 2019. For data collection, we used a research instrument consisting of a sociodemographic questionnaire, a semi-directed interview using the free word evocation technique, associated with the substitution and decontextualization model (mute zone), with the inducing term “being a mother in prison” and themed storytelling. Data were analyzed by prototypic processing (four-box table) for each matrix, for which intermediate frequencies (± 8.37 matrix 1 and ± 8.10 matrix 2) and mean evocation orders (matrix 1: ±3,08; matrix 2: ±3,01) were automatically calculated according to the requirements. Thus, they composed the central nuclei, the peripheries and the contrast zones. The words composition and co-occurrence test (similarity analysis) were also performed. The analytical processing was carried out using the software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRAMUTEQ), version 7 alpha 2. A research was approved by the Research Ethics Committee of the Federal University do Rio Grande do Norte: 08005219.7.0000.5537. Results: the participants were mostly young people between 18 and 39 years old (90.5%; n = 38) and were single (50.0%; n = 21), 61.9% (n = 26) reported two or more pregnancies, and 47.6% (n = 20) reported one or more abortions. In the prototypic analysis, it was found that the term inductor resulted in 420 evocations and 133 distinct words. After categorization and lemmatization, the number of different words evoked by women were 84 between matrices 1 and 2. Excluding the evocations with frequency less than three, resulted in 31.15% use. In matrix 1, the possible representation of being a mother in prison crystallized, principally and semantically, by the terms: separation (f = 27; OME: 2.9), sadness (f = 18; OME: 2.3), horrible (f = 16). ; OME: 2.1), pain (f = 12; OME: 2.8). In the substitution and decontextualization zone (matrix 2), the representations were objectified by the terms separation (f = 18; OME: 3), sadness (f = 13; OME: 2.5), fear (f = 11; OME: 2.2), horrible (f = 10; OME: 1.5). Thus, the only lexical difference between the two nuclei was the change of the word pain for fear in matrix 2, maintaining the crystallization between the two frames with respect to the central nucleus. In the similarity analysis, the central nucleus, composed by the term “separation”, had a strong co-occurrence with the words: “suffering (11), distant (4), abandoned (3), horrible (9), adoption (4) and sadness (8)”. In this sense, the complete analysis presented the suffering of the rupture of the mother-child maternal dyad as

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participants present generalized feelings and meanings of “being a mother in prison”, which reflect directly on the suffering experienced by the maternal dyad with separation, which weaken and potentiate women's imprisonment. , meaning for these women, essentially, suffering for the dichotomy of the bond with the child.

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Figura 1 - Desenho: separação da díade materna . ... 63

Figura 2 - Desenho: saída do filho do presídio com seis meses . ... 63

Figura 3 - Desenho: sofrimento pelo filho. ... 64

Figura 4 - Desenho: sofrimento da mãe ... 65

Figura 5 - Desenho: arrependimento da mãe. ... 66

Figura 6 - Desenho: Mãe-filho aprisionados ... 66

Figura 7 - Desenho: Saudades. ... 67

Figura 8 - Desenho: Gestante no presídio. ... 68

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Tabela 1 - Caracterização de variáveis sociodemográficas e obstétricas. Natal/RN, 2019. ... 60

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Quadro 1 - Síntese dos estudos da revisão de literatura e as variáveis de interesse.

Natal, RN, 2019. ... 28

Quadro 2 - Lematização das respostas dadas pelas mulheres gestantes, lactantes e que vivenciaram a gestação em privação de liberdade, no sistema prisional, na abordagem estrutural. ... 53

Quadro 3 - Categorização das respostas dadas pelas mulheres gestantes, lactantes e que vivenciaram a gestação em privação de liberdade, no sistema prisional, na abordagem estrutural ... 54

Quadro 4 - Quadro de quatro casas ... 57

Quadro 5 – Quadro de quatro casas da análise prototípica (matriz 1). ... 62

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APASMC Ações promocionais de atenção à grupos humanos em saúde mental e saúde coletiva

CAAE Certificado de Apresentação para Apreciação Ética CDP Centro de Detenção Provisória

CEP Comitê de Ética e Pesquisa CFB Constituição Federal Brasileira CNJ Conselho Nacional de Justiça CNS Conselho Nacional de Saúde

CPEAMN Complexo Penal Estadual Agrícola Mário Negócio CPJC-FEM Complexo Penal João Chaves Feminino

DECS Descritores em Ciências da Saúde EXCEL software Microsoft Office Excel

INFOPEN Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias

IRAMUTEQ Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires

LEP Lei de Execução Penal

LILACS Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde MEDLINE National Library of Medicine

MESH Medical Subject Headings OME Ordem Média de Evocação

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Privadas de Liberdade no Sistema Prisional

PNSSP Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário PTRS Paradigma Teórico das Representações Sociais RN Rio Grande do Norte

SEJUC Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania SPSS Statistical Package for the Social Sciences

TALP Técnica de Associação Verbal ou Livre de Palavras TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TNC Teoria do Núcleo Central

UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte

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Antes de iniciar o percurso neste estudo, faz-se necessário imergir na vivência no sistema prisional feminino do Estado do Rio Grande do Norte, mesmo que ainda incipiente, ao se pensar a magnitude do contexto. Escrever este prólogo é retornar às idas e vindas aos presídios durante a coleta de dados e atividades voluntárias desenvolvidas no cenário de cada instituição prisional feminina, com peculiaridades e singularidades, além de rostos, cores, comportamentos, sentimentos e um estado n’álma fragilizado pela condição humana.

Um ponto de partida importante para entender esta dissertação é saber que as participantes deste estudo são mulheres que foram e continuam vulnerabilizadas, quase sempre, a partir da conjuntura da qual foram inseridas/circunscritas.

Ao conhecer o presídio, sentimentos e emoções se sobrepõem ao imaginário de algo não dominado, assim, com alto grau de ansiedade e, sobretudo, com medo de conhecer o “desconhecido”, para quem vive no extra muro. Todavia, logo o espaço foi conquistado. Em sequência, tomaram-se conhecimentos das repartições do presídio, inclusive, das celas e dos lugares de coletividade (sala de aula, biblioteca e pátio), além de visitar a cozinha. A título de informação, as mulheres que trabalham na cozinha e/ou limpeza do presídio, são mulheres presidiárias que, pelo bom comportamento durante o cumprimento da pena, ficam trabalhando para o estado, com a finalidade de reduzir os dias na prisão. Interessante destacar que este trabalho é o desejo de todas por dois motivos: “diminuir os dias no cárcere e ocupar a mente”. Ainda durante a visita, depara-se com muitas mulheres segurando nas grades e chamando os nomes de alguns agentes penitenciárias, solicitando remédio, informações e questionando-as de problemas que para um recém-ingresso nesse universo, seria inimagináveis.

Ao conhecer o interior do presídio, inclusive as próprias celas, quando ia conversar com algumas e, até mesmo, contribuir com orientações profissionais, impressiona visão estranha e intrigante, que remete à quantidade de colchões no chão e alguns em cima da pedra, a qual é apresentada como cama. Essas pedras são, especificamente, para as chefes de cela, as quais conduzem a organização e ordem do local.

Coleta de dados iniciada! O que mais deixou inquietação foi a carência afetiva, pessoal e familiar mostrada durante a conversa (entrevista). Aquelas mulheres ficam

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voltado para fora da cela, pendurado na grade “para receber um arzinho”, disse ela com semblante de resignação.

Durante as entrevistas, as mulheres contavam algumas histórias pela necessidade delas em conversar com alguém. Grandes mulheres, mães, esposas, filhas, as quais relatavam não entender por que caíram na criminalidade. Muitas até atribuíam que a culpa era do marido, sem entrar em mais detalhes.

Interessante enfatizar que quando as agentes penitenciarias iam chamá-las nas celas para entrevista, elas achavam que era o advogado e vinham com medo. Medo no sistema prisional feminino se caracteriza através da cultura do medo, portanto é algo temido, apavorante e relatado pelas presidiárias.

Nos dias que se seguiram às entrevistas, estabeleceu-se percurso mediado pela rotinização do presídio e agentes: inicialmente, a agente, armada, tocava a sirene para que todas as mulheres ficassem em “procedimento” e se dirigia à cela específica para buscar, mediante escolta, a participante, conduzindo-a até a “sala de aula”, onde me encontrava.

Entende-se por procedimento o momento no qual as mulheres, quando dentro das celas, ficam sentadas no chão de costas para o pátio em formato de fila indiana e/ou em pé, perfiladas e encostadas na parede, cabisbaixas, ou seja, com a cabeça inclinada para baixo e mãos para trás.

Descobriu-se que a mulher quando apresentava comportamentos inadequados, desrespeitosos ou atitudes inadequadas pelo sistema carcerário, mediados e exigidos pela guarda, ou entendidas como erradas, a infratora dessa norma comportamental instituída no presídio era levada para o “castigo”. Relembra-se que nas entrevistas, muitas mulheres relatavam medo da famosa “chapa”, quando castigadas, inclusive quando gestantes.

Por conseguinte, diante desses achados, procurou-se saber mais sobre o cotidiano das mães com filhos no sistema prisional. Unanimemente: “É a alegria do presídio!” Estas mulheres ficam em uma cela exclusiva, onde tem o berçário e local mais amplo para convivência dos filhos por trás das grades. Além disso, recebem duas marmitas por estarem grávidas ou amamentando, concomitante, a aparente regalia ou privilégio é prejudicada porque a alimentação revela um gosto de comida estragada, gelada e com cheiro ruim, fazendo com que permaneçam com fome, por

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com água da torneira in natura, uma vez que não há lugar disponível para aquecer ou preparar o leite, o que compromete a segurança alimentar do lactente.

Por esses fragmentos da cotidianidade das mulheres privadas de liberdade, descortina-se minimamente o real cenário de um mundo “desconhecido”, imerso no sistema prisional feminino, o qual, quiçá, deseja-se que o mesmo possa ser “conhecido” e melhorado, respeitando-se a dignidade humana, em cumprimento da lei... Convida-se, agora, para conhecer um pouco desse cenário!

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1 INTRODUÇÃO ... 24 1.1 PROBLEMA DE PESQUISA ... 29 1.2 MOTIVAÇÃO DO ESTUDO ... 31 1.3 JUSTIFICATIVA ... 31 2 REFERENCIAL TEÓRICO ... 34 2.1 HISTORICIDADE DO CÁRCERE PRIVADO ... 34 2.2 MATERNIDADE E APRISIONAMENTO... 36 2.3 PRESENÇA DO PARADIGMA TEÓRICO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS NAS POPULAÇÕES VULNERABILIZADAS ... 40 2.3.1 Paradigma Teórico das Representações Sociais ... 40 2.3.2 Grupos minorizados ... 41 2.4 CUIDADO DE ENFERMAGEM ÀS GESTANTES EM PRIVAÇÃO DE LIBERDADE, A PARTIR DAS TEORIAS DE ENFERMAGEM ... 43 3 OBJETIVO ... 46 4 PERCURSO METODOLÓGICO ... 47 4.1 TIPO DE ESTUDO ... 47 4.2 CENÁRIOS DA PESQUISA ... 47 4.3 IMERSÃO NO CENÁRIO DA PESQUISA ... 48 4.4 PARTICIPANTES DA PESQUISA ... 49 4.5 COLETA DE DADOS ... 50 4.5.1 Questionário sociodemográfico ... 50 4.5.2 Desenho-estória ... 51 4.5.3 Entrevista semidirigida ... 51 4.6 ANÁLISE DOS DADOS ... 53 4.6.1 Quadro de Quatro Casas ... 56 4.6.2 Desenho-estória com tema ... 57 4.6.3 Análise de Similitude ... 57 4.7 ASPECTOS ÉTICOS E LEGAIS DA PESQUISA ... 58 5 RESULTADOS ... 60 5.1 CARACTERIZAÇÃO SOCIODEMOGRÁFICA E OBSTÉTRICA ... 60

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5.2.2 Quadro de quatro casas ... 62 5.2.3 Processamento prototípico - Técnica de Associação Livre de Palavras – Modelo de substituição e de descontextualização – matriz 2 ... 68 5.2.4 Quadro de quatro casas ... 68 5.2.5 Análise de Similitude ... 71 6 DISCUSSÃO ... 73 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 81 REFERÊNCIAS ... 83 APÊNDICES ... 94 ANEXOS ... 101

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1 INTRODUÇÃO

Historicamente, a figura feminina carrega marcas dos estigmas instituídos outrora sem permissibilidade desta, com abjeção do gênero em diversos contextos sociais (DAMASCENO, 2013). O conceito de estigma relacionado às mulheres se compreende como a desaprovação das singularidades, características, ideias, posicionamentos, pensamentos, autonomia e valorização feminina. Soma-se a estes o valor ínfimo atribuído às mulheres no contexto social, no que tange às contribuições destas nos âmbitos político e econômico em uma sociedade, reforçando a deterioração da identidade própria (BARCINSKI, 2013).

Com o surgimento dos movimentos feministas, a partir da década de 1960, iniciaram-se os primeiros estudos sobre mulheres vinculadas ao mundo coletivo, tornando-as seres integrantes do contexto da historicidade que permeiam as populações. Paralelo ao emergente reconhecimento do papel da mulher no contexto político-social, reconhece-se a presença feminina em situações cuja figura masculina sempre se apresentou predominante, como na privação de liberdade por meio do cárcere (CORTINA, 2015; ANGOTTI; SALLA, 2018).

Não obstante, o cenário vivenciado pelas mulheres na sociedade traça delineamento, ainda, questionável e incipiente, tendo em vista a configuração político-social patriarcal que se apresenta como dominante ao papel da mulher, estimulando a desigualdade de gênero, a limitação dos estereótipos e o desfavorecimento da mulher na conjuntura social, corroborando, assim, com as estatísticas demasiadas referentes ao aprisionamento feminino (LINICK, 2018; PINTO; ALVAREZ, 2014).

No Brasil, o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen Mulheres), de 2018, aponta população prisional feminina em 42 mil, com aumento de 656%, entre os anos 2000 e 2016. São 40,6 mulheres aprisionadas para cada 100 mil mulheres. Dados internacionais demonstram que o Brasil ocupa o 4º lugar no mundo em população prisional feminina, aproximando-se de países como os Estados Unidos, em 1º lugar; a China, em 2º; e, em 3º lugar, a Rússia (BRASIL, 2018).

O panorama dos estados brasileiros evidencia que o Estado de São Paulo reúne a maior população carcerária feminina do país, sendo esse quantitativo de 15.104 mulheres. O Estado do Rio Grande do Norte (RN) concentra 776 mulheres em privação de liberdade, sendo o terceiro na Região Nordeste e 13º no Brasil, com os maiores números populacionais femininos em cárcere (BRASIL, 2018).

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Análise dos marcos fundamentais das políticas sociais de saúde direcionadas para população prisional abordaram, através da Lei de Execução Penal (LEP), do Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário (PNSSP) e da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP), os avanços da saúde da mulher no contexto carcerário (LERMEN et al., 2015). No mesmo sentido, a pesquisa de Almeida et al. (2015) corrobora com o entendimento do aumento do investimento científico direcionado às mulheres privadas de liberdade pela academia e por órgãos responsáveis, haja vista o crescimento concomitante das vulnerabilidades sociais e de saúde pública.

Na perspectiva da mulher gestante e lactante, em privação de liberdade, os direitos são questionáveis quanto à aplicabilidade, uma vez que é infactível o que se encontra na constituição, bem como nas políticas públicas de saúde. De todas as unidades prisionais femininas no Brasil, somente 55 detêm dormitórios para gestantes. O RN apresenta apenas um dormitório, mesmo com quantidade de 16 gestantes e uma lactante, no período do levantamento (BRASIL, 2018).

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no mês de setembro de 2018, os dados contabilizados eram de 302 grávidas e 175 lactantes no país, número que se modifica continuamente o painel do cadastro nacional de presas grávidas e lactantes, no sistema prisional brasileiro, apresenta variação de acordo com o estado, e números maiores na Região Sudeste (CNJ, 2018).

O retrato atual feminino em privação de liberdade é de mulheres jovens, negras, com ensino fundamental incompleto, solteiras e com envolvimento/crime de tráfico de drogas, motivo pelo qual reflete na dimensão de gênero à submissão do feminino ao masculino, com atribuição passiva e influenciada pelo parceiro na conjuntura de relacionamento (RODRIGES, 2008; RODRIGUES et al., 2012; FRAGA; SILVA, 2017; BRASIL, 2018).

Associado ao relacionamento afetivo, a possibilidade de gestação neste ambiente necessita de olhar ampliado sobre a saúde da mulher. O fenômeno da gestação vai além do fato de gerar um filho, configura-se como sistema multifatorial que envolve vínculos familiares, mudanças fisiológicas e empoderamento feminino, de forma a propiciar mistura de sentimentos com características pessoais. O período gestacional, durante o aprisionamento, bem como a lactação, são processos delicados, vulnerabilizados e complexos, atentando à maternidade como experiência inigualável. Entretanto, para mulher, a maternidade perpassa pelo período gestacional

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com maior vinculação da díade mãe-filho, durante a lactação que transcende toda a vida. A ruptura da díade tem data e hora marcada no cenário brasileiro – indo de encontro com a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional – PNAISP (BRASIL, 2014; BRAGA; ANGOTTI, 2015).

Os riscos na gestação das mulheres prisioneiras são distintos e variáveis, vinculados, em maioria, a complicações mais severas com desfechos indesejáveis. A maternidade se torna vulnerada e com riscos iminentes, tanto nos aspectos físicos quanto no biopsicossocial. O suporte psicológico das gestantes no cárcere ultrapassa a lentificação do desenvolvimento social e pessoal, promovendo desordem emocional e, por conseguinte, comportamental, propiciando danos à saúde materna, assim como à saúde da criança (BRAGA; ANGOTTI, 2015; PIRES; SCHERER, 2009).

Diante dessa conjuntura social e, a partir do entendimento sobre os estudos direcionados às mulheres gestantes e lactantes, no cenário prisional, os quais tencionam o incremento da pesquisa em questão, justapondo a inquietação para o desenvolvimento da temática com elucidação do Paradigma Teórico das Representações Sociais (PTRS) das vivências destas, no ambiente carcerário, faz-se necessário compreender e externar a experiência da maternidade no cárcere, através da subjetividade de cada sujeito na individualidade, atribuindo valores aos conceitos institucionalizados pela sociedade, com desmistificação dos pressupostos para melhoramento na atuação dos profissionais da saúde.

A partir da conjuntura científica apresentada nas buscas realizadas para o fortalecimento do objeto de estudo, fez-se necessária revisão de literatura em bases de dados, no intuito de reunir pesquisas existentes. Diante disso, utilizaram-se os seguintes termos no Medical Subject Headings (MESH), na língua inglesa, cruzados: “Prisons” AND “Pregnancy” AND “Breastfeeding” OR “Pregnancy” OR “Breastfeeding” nas Bases de Dados PubMed Central (PMC) e National Library of Medicine (MEDLINE/PubMed), bem como nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), na língua portuguesa: “Prisões”, “Gravidez”, “Aleitamento Materno”, com as mesmas combinações, contemplando as bases LILACS (Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde) e SciELO.ORG. Após filtragem (acesso aberto e/ou textos disponíveis) e análise dos resultados da busca (leitura flutuante dos títulos e resumos), encontraram-se 37 estudos sobre a temática. Contudo, posterior à leitura,

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em profundidade, restaram cinco artigos relacionados ao objeto de estudo em questão.

O Quadro 1 apresenta, sucintamente, os estudos encontrados, os quais compõem a revisão de literatura do objeto de pesquisa. Neste sentido, encontraram-se: estudos nacionais e internacionais, dos quais um único estudo foi publicado em periódico específico da área. Quanto ao delineamento do estudo: dois estudos qualitativos, sendo um descritivo e um reflexivo, um estudo de revisão de escopo, uma revisão sistemática e um estudo descritivo transversal.

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Quadro 1 - Síntese dos estudos da revisão de literatura e as variáveis de interesse. Natal, RN, 2019.

Autores/Anos Países Periódicos Títulos Objetivos Delineamento

dos estudos FOCHI et al.

(2017)

Brasil Rev Eletr Enf Vivências de gestantes em situação de prisão

Conhecer as vivências de gestantes em situação prisional.

Estudo qualitativo e

descritivo CALHIARI et al.

(2015)

Brasil Psicol Argum De algozes a vítimas: dos direitos cegos e nulos à

mulher gestante em situação de cárcere.

Problematizar os ambientes carcerários como instituições totais

e de disciplinamento dos corpos, independente do gênero a que se

destina. Reflexão teórica HOUT; MHLANGA-GUNDA (2018) Inglaterra International Health and Human Rights

Saúde contemporânea das prisionaieras, experiências, atendimento médico exclusivo na prisão, necessidades e resultados dos

cuidados de saúde: África Saariana: uma revisão de escopo da literatura.

Mapear o que se sabe, atualmente, sobre as experiências

de saúde de mulheres presas e necessidades de cuidados de saúde na prisão. Revisão de escopo MURRAY; CERQUEIRA; KAHN (2013)

Brasil Aggression and Violent

Behavior

Crime e violência no Brasil: revisão sistemática das tendências temporais,

taxas de prevalência e fatores de risco

Analisar sistematicamente estudos baseados na comunidade sobre a

prevalência de agressores no Brasil, Revisão sistemática MIRANDA, MERÇON-DE-VARGAS; VIANA (2004)

Brasil Rev Saúde Pública

Saúde sexual e reprodutiva em penitenciária

feminina, Espírito Santo, Brasil

Identificar o perfil

sociodemográfico e as condições de saúde das mulheres

encarceradas em penitenciária feminina. Estudo descritivo, transversal MIRANDA et al. (2016)

Brasil Enferm Cent O Min

Maternidade atrás das grades: particularidades do binômio mãe e

filho

Conhecer as particularidades acerca da relação mãe-filho, no

ambiente carcerário, na perspectiva de mulheres em

privação de liberdade e de funcionários do sistema prisional.

Estudo qualitativo,

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A revisão de literatura procedida demonstrou que diversos estudos foram analisados, no intuito de fortalecer o conhecimento acerca da problemática, para melhores desfechos científicos na presente pesquisa. A indispensabilidade de estudo de Representações Sociais se potencializa, a partir da incipiência de pesquisas qualitativas, na busca de significados, entendimentos e contextualizações do cenário. Diante disso, a categorização da revisão de literatura realizada elucida os desenhos de pesquisa dos demais estudos encontrados, bem como limitações destes, no que tange ao paradigma teórico. Os estudos de abordagem qualitativa buscaram externar as vivências dessas mulheres no contexto carcerário, proveniente da situação gestacional, em razão das especificidades do período gestativo. No entanto, apenas uma pesquisa apresentou o PTRS no percurso metodológico, ao demonstrar as particularidades da díade mãe e filho (MIRANDA et al., 2016).

O compilado de estudos perpassou pela abordagem quantitativa, ao enfatizar as doenças transmissíveis, os desfechos neonatais e maternos, as prevalências de doenças crônicas, a fragilidade do acesso à saúde reprodutiva dentro da penitenciária, aos cuidados gestacionais e puerperais, assim como a fragilidade da efetivação dos direitos enquanto cidadã. Em referência aos tipos de estudos, encontraram-se revisão sistemática de literatura, estudo seccional, longitudinal, prospectivo, bem como os de métodos mistos.

1.1 PROBLEMA DE PESQUISA

O encarceramento feminino, concomitante à maternidade, remete à mulher o desenvolvimento de adoecimento mental e físico, em consequência do isolamento propiciado pelo contexto prisional (MILITÃO; KRUNO, 2014). O estudo de Fochi et al. (2017) mostra a sensibilidade na fala das presidiárias que vivenciaram a maternidade no contexto carcerário, oriundas das perdas afetuosas e dos rompimentos sentimentais.

Para muitos sujeitos sociais, a conclusão da gestação acontece após o parto, tenha sido ele natural ou cirúrgico. Em contrapartida, a maternidade transpõe o período gestacional, uma vez que compreende toda uma vida. Segundo Leal et al. (2016), o encarceramento se manifesta como fator que dificulta ou obstaculiza a promoção à saúde de mulheres e crianças desde a concepção destas, igualmente ao comprometimento do bem-estar biopsicossocial. Assim, nascer na prisão envolve

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diversas perspectivas, como carência de ambiência adequada, transferência para maternidade de apoio em viatura policial, incluindo maltrato ou violência durante a internação na maternidade pelos profissionais da saúde (LEAL et al., 2016).

A completude da maternidade se apresenta no momento da amamentação como primordial para díade mãe-filho, uma vez que o processo do aleitamento materno se caracteriza como vínculo essencial nesse contexto. Ademais, Mariano e Silva (2018) apresentam em estudo a significação do amamentar na prisão, situação delicada e sensível, tendo em vista os benefícios existentes do aleitamento materno e a austeridade em execução. Sob esse entendimento, a Constituição Federal Brasileira (CFB) determina que as mulheres/mães/presidiárias devam permanecer ao lado dos (as) filhos (as) por tempo esse necessário à amamentação (mínimo de seis meses), conforme preconiza o Ministério da Saúde do Brasil (SOARES; CASTRO, 2012).

Estudo de Dalmácio, Cruz e Cavalcante (2014) demonstrou as vantagens apresentadas na permanência do vínculo mãe-filho durante o período de amamentação, como a redução do adoecimento da criança, a imunização fisiológica, bem como o aspecto psicológico do filho na manutenção desse vínculo, além de contribuir na saúde materna em relação à diminuição das hemorragias pós parto e o aparecimento de cânceres (HUANG; ATLAS; PARVEZ, 2012).

Durante a construção de abordagem teórica, Cúnico, Brasil e Barcinski (2015) descreveram o comportamento parental de mães que vivenciaram o cárcere com os filhos, em Portugal, a partir da centralidade e dedicação total atribuída às crianças, perante características maternas, resultando em melhoramento do vínculo e, consequentemente, da permanência dessa mulher no cárcere.

No cenário americano, a política que prevalece é a separação da díade mãe-filho, logo após as primeiras 48 horas do parto, descontruindo a importância do vínculo existente entre a díade e desenvolvendo contrastes negativos para os envolvidos, o vínculo e a separação construídos, simultaneamente. Destaca-se, ainda, a separação da mãe e filho como desencadeante de problemas mentais, ainda, na primeira fase da vida, mais adiante, no desenvolvimento de neurose e psicopatia (MATÃO; MIRANDA; MALAQUIAS, 2016).

Por fim, mesmo que alguns estudos, como o de Matão, Miranda, Malaquias e Souza (2016), apontem as inconformidades do sistema carcerário com a ambiência e as incongruências do cenário prisional, os entraves do desenvolvimento

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biopsicossocial da criança, é notório e sensato o que as evidências científicas apontam sobre a contextualização da permanência do vínculo mãe e filho como precursor de melhores desfechos para ambos (SANTOS; BISPO, 2018).

Nessa contextualização, com finalidade de ir ao encontro das respostas provenientes do problema de pesquisa, intentou-se responder à pergunta: quais as representações sociais da maternidade de mulheres gestantes, lactantes e que vivenciaram a gestação em privação de liberdade?

1.2 MOTIVAÇÃO DO ESTUDO

Ao partir da vivência enquanto profissional enfermeiro, atuante na assistência direta de enfermagem, em maternidade de referência do sistema prisional feminino da capital do estado, lugar em que adentram mulheres gestantes e/ou puérperas privadas de liberdade, por alguma transgressão cometida, com necessidades de cuidados materno-infantil, a inquietação para pesquisa surgiu ao tornar-se notórias as relações fragilizadas existentes entre os profissionais e as mulheres gestantes prisioneiras.

Nesse entendimento, aponta-se a carência de estudos retratando esse contexto a partir do protagonismo das mulheres. Destarte, justifica-se, inicialmente, a indispensabilidade de estudo de representações sociais das mulheres prisioneiras que vivenciam o período gestacional e/ou lactação dentro do presídio, no intuito de melhor entendimento da subjetividade desse mundo.

O encarceramento feminino é tema de relevância biopsicossocial e científica para o desenvolvimento da prática/ciência em enfermagem e, consequentemente, para mulheres prisioneiras grávidas ou em período de amamentação, em virtude do aumento significativo do aprisionamento feminino, no cenário carcerário nacional, refletindo diretamente no processo saúde-doença das protagonistas. A partir desse cenário, manifestou-se a inquietação para desenvolver o estudo, na busca pelo desenvolvimento de cuidados mais específicos e ótica direcionada para mulheres nessa situação.

1.3 JUSTIFICATIVA

No mesmo sentido da motivação para o desenvolvimento do estudo, é inegável a verificação do déficit de conhecimento e, consequentemente, da lacuna dos

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cuidados maternos na contextualização do cárcere, devido à diminuição de estudos direcionados às insuficiências dos presídios com o manejo da maternidade. Portanto, evidencia-se a precisão de se estabelecer elo de empatia e vinculação com essas mulheres, no período gestacional e de amamentação, tornando-se imprescindível o período do processo adaptativo para desencadear melhor cuidado (PIMENTEL et al., 2015).

A maternidade, no contexto do cárcere, transcende as condições de vida enquanto ser humano, ressignifica o papel materno com aspereza, mesmo com as singularidades da gestação (DIUANA; CORRÊA; VENTURA, 2017). Neste sentido, o presente estudo se justifica de um lado, na perspectiva da maternidade, no contexto de vulnerabilidade que é posto no espaço prisional brasileiro, de mulheres gestantes, lactantes ou que vivenciam a maternidade sem cuidado. Do outro, no reconhecimento das necessidades de mudanças no cenário, além de contribuir, intrinsecamente, com a cientificidade, através da disseminação do conhecimento para profissionais de saúde que assistem essas mulheres no cárcere. E, ainda, colaborar com reformulação e/ou construção de políticas de saúde que venham a subsidiar essa assistência no cuidado integral à saúde (FOCHI et al., 2017).

Nessa contextualização, encontram-se lacunas a serem preenchidas, com assistência integral às mulheres privadas de liberdade, mais especificamente para as que vivenciam a maternidade no cárcere. A Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional aborda a assistência completa para presidiárias, desde atenção psicossocial, religiosa, laboral, jurídica, educacional, até o cuidado à saúde. Contudo, a praticabilidade, ainda, é incipiente no cenário brasileiro (GALVÃO; DARVIM, 2013; BRASIL, 2014).

Assim, os significados atribuídos pela mulher/gestante/mãe ao contexto carcerário decorrem dessa conjuntura supracitada, denotando o espaço existente no sistema prisional. Portanto, urge investimento científico, no contexto carcerário feminino, a partir da maternidade, no olhar da subjetividade das significações do PTRS, no intuito de melhores entendimentos e mudanças do cenário.

Acredita-se, também, que os resultados desta pesquisa se tornem relevantes para reflexão profunda sobre o cárcere privado das mulheres gestantes e lactantes, assim como a importância no processo do trabalho de enfermagem, contribuindo, da mesma forma, para melhoria da qualidade da assistência prestada,

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não somente em nível local, mas nacional, além da segurança do profissional na execução do cuidado integral.

Ao considerar o processo do encarceramento feminino vivenciado na presença do fenômeno da maternidade, torna-se imprescindível o pressuposto teórico das Representações Sociais, com olhar na pluralidade do estudo, no que diz respeito aos significados encapsulados pelas normatizações instituídas no sistema prisional. Do mesmo modo, a ênfase na individualidade de cada ser diante da interação social, destacam-se as significações da maternidade dentro do ambiente prisional, oriundas dos pensamentos femininos, a partir da retórica oportunizada pelas representações sociais (WACHELKE; CAMARGO, 2007).

Dessa forma, aponta-se para o pressuposto de que os significados atribuídos à maternidade pelas mulheres gestantes, lactantes e que vivenciaram a gestação, no contexto carcerário, são elaborados a partir da fragilidade do sistema prisional, com a falta de assistência que as levam a desfechos indesejáveis, como as perdas familiares, a exclusão social, as vulnerabilidades, o adoecimento, sobretudo, a partir da dicotomia entre mãe e filho.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 HISTORICIDADE DO CÁRCERE PRIVADO

O contexto da historicidade do cárcere é sombrio e marcado por estigmas sociais, desde as mais antigas configurações da sociedade. O retrato vivo dessa contextualização foi na Roma antiga, em que o caráter punitivo era despido de leis, cumprimentos, obrigações e penas, até se definir, em julgamento, o caminho do aprisionado. Várias instituições e atores sociais fizeram parte dessa conjuntura carcerária, sendo a igreja católica e os líderes oligárquicos os designadores do castigo (RITA, 2006; OLIVEIRA, 2015).

Vários acontecimentos históricos ficaram cicatrizados na população, movimentos oriundos das instituições de poderes, com intuito de aprisionar os grupos vulnerabilizados, como mendigos, prostitutas, delinquentes, assim como outros atores sociais incompatíveis com o preconizado pelos poderosos, que detinham as decisões sobre o povo, com caráter, principalmente, de correção e punição (RITA, 2006).

Foucault (2017) demonstra o percurso histórico do aprisionamento, alicerçado no sofrimento dos detentos. Em meados do século XIX, a sociedade conseguiu visualizar mudanças nas punições, período evolutivo, marcante e massacrante, das cicatrizes, das amputações, dos corpos supliciados a sofrimentos mais tênues, sutilmente, diminuído, até mesmo com a extinção das fogueiras castigais para cumprimento de punição.

O pagamento do ato cometido a outrem não se detinha apenas ao cumprimento da pena, mas a punições desumanas, direcionadas, essencialmente, ao suplício do corpo. Era exposição pública de espetáculo de castigo, através de pena corporal, com barbárie e crueldade. Coleiras e bolas de ferro para caminhar nas ruas ao som de vozes com pronunciamentos de ódio, injúrias, zombarias. Os corpos se encontravam mergulhados dentro das relações de poder e, assim, eram obrigados a serem partes das cerimônias, consequentemente, supliciados (FOUCAULT, 2017).

Conseguinte a esse cenário, o suplício dos condenados começa a deixar de existir, a partir do momento que entenderam que os atos cometidos elevam a violência e não muda seres humanos. O processo evolutivo do cárcere, assim como das punições, foi traçando novos caminhos, ao longo das décadas. Penalidades severas,

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intensas, mas com intuito de perpetuar a correção e reeducação, primordialmente (FOUCAULT, 2017).

As mudanças nos regimes de pena não se deram por questões éticas, mas econômicas. Mutilar/matar homens, sobretudo jovens, prejudicava a força de trabalho necessária para movimentar as fábricas emergentes, a qual poderia ser usada, de forma menos onerosa, sob o viés da ressocialização. Esta deveria substituir o sofrimento, a fim de melhorar o sistema prisional. Deste modo, o único investimento direcionado ao corpo detinha caráter puramente econômico, uma vez que o corpo se tornava útil, a partir da força de trabalho. Todavia, ao mesmo tempo que produtivo, mantinha-se corpo submisso (FOUCAULT, 2017).

Só posso esperar que não esteja longe o tempo em que as forças, o pelourinho, o patíbulo, o chicote, a roda, serão considerados, na história dos suplícios, como as marcas da barbárie dos séculos e dos países e como as provas da fraca influência da razão e da religião sobre o espírito humano (FOUCAULT, 2017, p. 15).

Desse modo, as influências do modelo de encarceramento do século XVIII e XIX perduraram por muitas décadas na sociedade contemporânea, em uma perspectiva de temor. O Brasil, ainda no período colonial, demarcava o aprisionamento feminino, agregado aos estigmas sociais da época, conceitos presos aos grupos minoritários e menos favorecidos, socialmente. Retrato vivo da contemporaneidade, os presídios eram ambientes estigmatizados como masculino, o que responde à falta de espaços para mulheres em configuração (ANGOTTI, 2018).

A punição, outrora em público, ganhou novo cenário dentro do próprio presídio para o gênero feminino, uma vez que ao vivenciarem o cárcere, dividindo espaço com os homens, as mulheres cumpriam castigo duplo: o aprisionamento, juntamente com os abusos, as violências sexuais e doenças trazidas e repassadas pelos homens, no papel de superioridade destes. No final desse período, os penitenciaristas e profissionais envolvidos com o cenário carcerário começaram a debater o contexto da feminilidade, em buscas de melhores condições. Esses protagonistas pensavam na importância da humanização no meio carcerário, com vistas à reintegração social dos carcereiros, mesmo em um estado incipiente de olhar holístico. No Brasil, a inauguração dos primeiros presídios femininos ocorreu em meados do século passado, período em que o mundo vivenciara a segunda Guerra Mundial e respectivos resquícios (ANGOTTI, 2018).

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2.2 MATERNIDADE E APRISIONAMENTO

Resende (2017) e Correia (1998) remetem-se à maternidade como fenômeno complexo, construção cultural, contextual, histórica e social, vivência entrelaçada no envolvimento do cuidado e sentimentos afetivos, historicamente ligados à necessidade das reconfigurações familiares, e não a um acontecimento biológico.

Para Cortina (2015) e Anjos (2016), aprisionamento feminino é a forma de penalidade que está intrinsecamente ligada à violência contra a mulher, mais ainda quando a maternidade se encontra envolvida. Entende-se como a dicotomia dos laços familiares, separação da díade mãe-filho, causa dano irreparável à identidade da mulher. No entendimento de Braga (2015) e Silva (2011), o aprisionamento feminino, mencionado pelas autoras como cárcere feminino, é a exclusão da sociedade e o abandono familiar da mulher entre muros.

O cenário da gravidez nos presídios transpõe o fenômeno do gerir um filho, configura-se como sistema multifatorial que propicia mistura de sentimentos, anseios, angústia, além das características pessoais de cada mulher. A fase da maternidade é marcada por particularidades e mudanças do ser feminino, a mais das vezes sendo o momento de conhecer o novo, da impulsividade, do imediatismo, da individualização, assim como das transformações fisiológicas e/ou hormonais, o que caracteriza o surgimento da gestação como fator inovador, tendo em vista a sequência de acontecimentos nessa fase da vida (FERREIRA et al., 2012; ALMEIDA et al., 2015).

Ao considerar o componente biológico da mulher, no período gestacional e pós-gestação, o cárcere, enquanto lócus da maternagem, apresenta-se com fatores complexos no desenvolvimento da maternidade, englobando resultados, frequentemente, como irreversíveis e marcantes na díade mãe e filho. Dentre estes, é possível citar: violência contra a mulher gestante dentro do próprio estabelecimento prisional (omissão de assistência e cuidado), que desencadeia condições como hipertensão e diabetes gestacional; infecções, hemorragias; parto prematuro; e baixo peso as nascer (CUNICO; BRASIL; BARCINSKI, 2015; ANDRADE; GONÇALVES, 2018).

O gênero feminino, na historicidade do cárcere, apresenta-se com menos favorecimento social, reverberando a amenização da mulher na contemporaneidade. Em consequência dessa conjuntura, a maternidade no cárcere continua fragilizada e incipiente para o quão importante é o fenômeno. Embora as leis brasileiras e os

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programas direcionados a esse público se preocupem com melhorias durante o período gestacional e de lactação, como locais reservados para mulheres gestantes, berçários, alimentação adequada e amamentação, ainda se visualiza, de forma contundente, o sofrimento duplo vivenciado pelas prisioneiras: cumprimento da pena como forma de pagamento pelo dano à sociedade e sofrimento biopsicossocial e físico da mulher enquanto gestante e/ou mãe. Não obstante, a aplicabilidade de leis, normas e regimentos, ainda que definidos pelos responsáveis, são descumpridas em quase totalidade (ROCHA et al., 2014; CUNICO; BRASIL; BARCINSKI, 2015).

No tocante, a CFB de 1988, o Estado deve assegurar às mulheres prisioneiras das condições dignas de vida, garantindo-lhes acesso aos direitos humanos, imprescindíveis para vivência das pessoas. Desta forma, o que difere das mulheres que vivem aprisionadas às libertas é o direito de ir e vir, exatamente, pelo motivo da penalidade que se faz necessário (BRASIL, 1988).

A mulher privada de liberdade, enquanto ser social, com direitos e deveres de cidadã, detém o poder da saúde reprodutiva, com garantia da maternidade, com a construção de família, com fortalecimentos de vínculos e visita íntima incontestável, necessidades humanas, a partir do conceito de ambiência e inclusão social, com a mesma veracidade das mulheres extramuros. Direitos garantidos na CFB que são ignorados ou negligenciados (SIMAS et al., 2015).

As Regras de Bangkok se apresentam como tratado internacional dos direitos humanos pertencentes às Organizações das Nações Unidas (ONU). Tais regras garantem olhar holístico para particularidades do aprisionamento feminino em totalidade, desde os entraves da pena até a problemática social, tendo como princípio básico as necessidades das mulheres presas. Para efeito, são estabelecidas regras de ingresso, registro, alocação, higiene pessoal, cuidados à saúde, atendimento médico específico, cuidados com a saúde mental, prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, revistas, instrumentos de contenções, capacitação adequada de funcionários, priorização do contato com o mundo exterior, individualização da pena, flexibilização do regime prisional, foco nas relações sociais e assistência posterior ao encarceramento, cuidados especiais com gestantes e lactantes, estrangeiras, minorias e povos indígenas e deficientes. Outra situação marcante das Regras de Bangkok é o investimento na prevenção do encarceramento feminino – conjuntura crescente e complexa (CNJ, 2016).

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A maternidade enaltece o gênero feminino em completude. O cárcere, associado ao momento materno, não tem permissibilidade de sobrepor o cenário. As leis podem e devem ser cumpridas. Contudo, é sabido que a gestação empodera a mulher, mas também a deixa vulnerabilizada em suas especificidades femininas, reverberando o retrato da mulher gestante aprisionada e, inexoravelmente, sofrida pelas circunstâncias postas (SIMAS et al., 2015; CNJ, 2016).

As marcas do período gestacional superam o fato de gerir um filho. No cárcere, as mulheres gestantes e/ou lactantes ficam expostas aos inúmeros agravos direcionados à gravidez e respectivas peculiaridades, não sendo visualizadas na ótica humanitária e do cuidado (ROSINSKI et al., 2006). A exposição da gestante e, consequentemente, do filho ao cárcere, perdura por toda a vida. Os riscos inerentes ao aprisionamento são distintos e variáveis, vinculados, em maioria, a complicações mais severas e desfechos indesejáveis. O suporte psicológico das prisioneiras grávidas transcende a lentificação do desenvolvimento social e pessoal, promovendo desordem emocional e, consequentemente, comportamental, propiciando danos à saúde materna, como também à saúde da criança. Os fatores de risco na gestação dentro do presídio, isoladamente, trazem perigo na potencialização dos agravos à saúde, o risco eleva a partir da negação da mãe e do cenário em que vive, aumentando as chances de complicações severas e definitivas, afinal o contexto é amedrontador (ROSINSKI et al., 2006; FOCHI et al., 2017).

Na contextualização das complicações da alta complexidade materna nas gestantes prisioneiras, os transtornos mentais, as doenças contagiosas, as infecções sexualmente transmissíveis, as doenças crônicas, as síndromes hemorrágicas e hipertensivas, o parto prematuro, as malformações e o baixo peso são as causas mais frequentes no presídio feminino (AWHONN, 2011; FOCHI et al., 2017). Analisada sob contexto de risco, os transtornos mentais, assim como as doenças infectocontagiosas, são as ocorrências marcantes na gestação intramuros, despertando os serviços para cuidados mais preventivos durante o pré-natal, uma vez que a caracterização do cuidado às mulheres presas, ainda, volta-se para o modelo anterior (FOCHI, 2017).

No que tange aos cuidados gestacionais às mulheres que vivem nos presídios, o pré-natal é o componente essencial para o acompanhamento do processo saúde-doença das gestantes, igualmente a promoção à saúde, determinantes e condicionantes. No entanto, a assistência à saúde nos presídios femininos é ínfima, a qual favorece o adoecimento de gestantes e/ou filhos (as) (FELIX et al., 2017).

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A Lei de Execução Penal (LEP) 7.210/84 de 2011 denota sobre os avanços do aprisionamento feminino no Brasil, no que se referem às mulheres gestantes e/ou mães. Acompanhamento de saúde à díade mãe-filho, berçário, ambiência, melhores condições nutricionais são alguns dos benefícios que as normativas da LEP apresentaram para o cárcere feminino. Passados alguns anos, o cenário continua sem muitas alterações e gozo dos benefícios pelas mulheres, levando-as à inviabilização dos direitos enquanto humanos (BRASIL, 1984; LIMA et al., 2013; FIGUEIRÓ; MELO; MARTINS, 2017).

A estigmatização do cárcere privado perpassa pelos paradigmas sociais, visto que mudanças notáveis na contextualização dos presídios femininos são marcantes na sociedade (STELLA, 2009). A conjuntura da prisão para os (as) filhos (as) de mulheres em cárcere é o malefício mais temeroso para genitora. Crianças privadas da sociedade, enclausuradas intramuros, como pagamento da sentença da mãe. É sabido das cicatrizes no crescimento e desenvolvimento de crianças aprisionadas, bem como dos desfechos futuros ocasionados pela detenção destas, de modo a transfigurar comportamentos, de forma negativa (ARMELIN, 2009).

A dicotomia mandatória da díade mãe-filho reflete definitivamente nas vidas dos atores envolvidos, sob influências negativas. Mãe e filho distanciados antes mesmo dos primeiros passos, das primeiras falas. Contudo, é necessário cumprir as regras. O filho separado da mãe, ainda antes do primeiro ano de vida, não tem garantia de vinculação familiar, nem tampouco de futuro. O estigma social, assim como a estereotipagem preconceituosa estabelecida nessa contextualização, cujas questões de gênero se sobrepõem no cenário, contribuem diretamente na situação. A mulher segue o mesmo ciclo condenável de culpabilidade do homem que impulsiona aprisionamento, levando-a ao abandono dos filhos, da casa, da família (ARMELIN, 2009).

O cárcere feminino está intrinsecamente ligado às questões de gênero, sobretudo de poder. Em grande maioria, o envolvimento da mulher no mundo do crime segue os passos masculinos, na perspectiva de fortificar o relacionamento ou estabelecer o vínculo conjugal. A maternidade surge para enaltecer a voz feminina. Contudo, a mulher-mãe, ao ser caracterizada pela assinatura na criminalidade, perde espaço no cenário familiar e passa a ser unicamente uma presa, quase sempre sem laços familiares (FONSECA, 2017).

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2.3 PRESENÇA DO PARADIGMA TEÓRICO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS NAS POPULAÇÕES VULNERABILIZADAS

2.3.1 Paradigma Teórico das Representações Sociais

As Representações Sociais, conceituada por Moscovici, é o efeito das interações humanas existentes entre duas ou mais pessoas. Na verdade, os grandes nomes da teoria retratam-na como compilado de ações que torna o mundo, as pessoas, vozes com mais conhecimento e apropriação de se definir enquanto ser social, ser identificado, independente do cenário, e deste, a percepção da própria realidade e do contexto inserido. É a familiarização do não familiar ou do distante (MOSCOVICI, 2007). O paradigma teórico enaltece o entendimento do todo em especificidades e não apenas de forma isolada e sem identificação, indo ao encontro das mulheres no aprisionamento que sentem necessidade de falar as angústias, os anseios, as alegrias, os medos, sobretudo, de expor as especificidades enquanto ser feminino.

A teorização das Representações Sociais segue pelo menos três caminhos: o antropológico-cultural, mencionado por Jodelet, que visualiza os elementos em diversos aspectos, sociais e organizacionais, com olhar igualitário a grupos, pessoas, classes, mantendo-se a proposição de Moscovici; a abordagem societal de Willen Doise que reverbera a divisão da psicologia social e, sobretudo, na resposta que a teoria traz na contextualização dos indivíduos enquanto ser individual e, ao mesmo tempo, no cenário coletivo, estando integrados psicológica e sociologicamente, centrados nos objetivos da representação social; na configuração de Abric e colaboradores, cuja vertente estrutural se articula à abordagem voltada para estrutura da representação e respectivos significados, necessária ao melhor entendimento de uma representação social, com vistas à interpretação das relações das pessoas, sob perspectiva cognitivo-estrutural, propositura conhecida como Teoria do Núcleo Central (MOSCOVICI, 2007; ABRIC, 2002).

A Teoria do Núcleo Central (TNC) visa entendimento da estruturação de uma representação social composta de crenças, opiniões divergentes ou convergentes e atitudes. Nesse sentido, Abric demonstra as funções elementares na dinâmica de relações, as quais sejam: função do saber, ao permitir melhor compreensão da realidade exposta; função identitária, possibilitando as características marcantes de

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cada grupo social, com definições de identidades na socialização; função de orientação, sob direcionamento do processo de orientação das relações sociais e/ou realidade descrita; função justificadora, dando permissibilidade as ações sociais comportamentais, no que tange aos estigmas instituídos pela sociedade, contribuindo, outrossim, para justificativa dos comportamentos e das atitudes do objeto de estudo em pauta. A TNC dará visibilidades às mulheres prisioneiras, a partir do momento que as vozes destas forem escutadas sem pressuposições definidas ou constituídas pelo pré-conceito, reverberando o que existe de mais peculiar de cada ser aprisionado (PINTO; ALVAREZ, 2014; CORTINA, 2015).

Nesse entendimento, a representação social se encontra em torno do núcleo central, o qual determina significação, consistência e organização, com presença dos elementos periféricos que são concretos, embora, apresentem aspecto móvel e evolutivo, contrapondo-se à resistência de alterações do núcleo central. Salienta-se, ainda, a presença da “zona muda” nas representações sociais, região implícita na verbalização dos sujeitos, em detrimento às normatizações encaradas por determinados grupos sociais que não podem externar situações, devido ao contexto (GUIMELLI; DESCHAMPS, 2000; RODRIGUES, 2012; PINTO; ALVAREZ, 2014; BRASIL, 2014; BRAGA; ANGOTTI, 2015).

2.3.2 Grupos minorizados

Por muito tempo, a sociedade contemporânea tentara encapsular os estereótipos da diversificação da população. Para muitos, existia padronização dos atores sociais. Com o passar dos anos, os direitos foram igualados na constituição e repassados para sociedade, o que não significa a praticabilidade. No entanto, as divergências e os estigmas que assolam o contexto social ainda são marcantes nos dias atuais. Vivenciam-se diferenciações nos mesmos espaços de convivência. As condições de vulnerabilidade social refletem diretamente na exclusão das minorias, como mulheres, negros, pobres, população LGBT (JODELET, 2001).

A sociedade se encontra imbricada em um leque de preconceitos de diferentes aspectos. É a necessidade humana de poder sobre o outro, sobretudo, é a concepção errônea projetada sobre o outro. Gênero, cor de pele e posição financeira são os estigmas mais recheados de preconceitos nas diversas populações (JODELET, 2001; NASCIMENTO et al., 2012).

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Nessa conjuntura, surgem os grupos minoritários ou menos favorecidos socialmente, com necessidades, direitos e deveres iguais aos da população privilegiada. Diante dessas circunstâncias de vida, o PTRS se apresenta como porta voz desses grupos desfavorecidos, ao assumir o papel de explanar com embasamento científico e metodológico as vozes, os desejos, os anseios, as necessidades dos contextos vulnerabilizados, importantes na sociedade como os demais (ARAUJO et al., 2014; LIMA, 2014). Jodelet (1993) afirma que o ser humano precisa saber da condução do mundo que se vive. Nessa configuração, constroem-se as representações dos espaços, contextos, cenários, fenômenos (JODELET, 2001).

Dessa forma, as mulheres sempre estiveram presentes nessa minoria social, mais ainda quando são postas a cenários estigmatizados, como as que vivenciam doenças ou status de vida não condizente com o padrão elencado pelos mais contemplados. As mulheres profissionais do sexo são apedrejadas pelas escolhas, necessidades e/ou desejos. As ideologias de gênero as colocam em níveis sociais ínfimos, sem a permissibilidade destas, apenas pelo entendimento que o trabalho delas não tem rotulagem adequada para o convívio sociocultural (ARAÚJO et al., 2014).

A população vulnerada em situação de estigmatização ou de preconceito transversaliza a sociedade, de forma geral e histórica. Os negros, outrora foram marginalizados, excluídos do convívio social, inicialmente pela cor da pele, uma vez que a pobreza permeava esse campo. Diversas intitulações foram direcionadas à população negra e pobre; de preguiçosos a insolentes, os prejulgamentos ganharam espaço até a contemporaneidade. Para isso, as representações sociais canalizam a percepção das pessoas sobre a população negra e pobre em peculiaridades e, no protagonismo social, tão importante quanto o de todos seres sociais (NERI, 2016; ASSIS, 2017).

No que concerne à homossexualidade, no processo das representações sociais, é factível a presença da teoria para desmistificar tamanha aspereza da sociedade com o tema. Preconceitos estabelecidos pela sociedade ao julgar o estado do outro. A identificação do gênero é escolha intrínseca do ser humano. A sexualidade vai além das normatizações, é o que o corpo pede e escolhe. Partindo desse entendimento, faz-se necessária presença marcante do PTRS para ascender o que os menos favorecidos querem enaltecer, atribuir significado e dar sentido à voz de

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cada ser pensante e dono das próprias escolhas, decisões, vontades e desejos (GONZAGA; PRAÇA; LANNES, 2014; CARMO; RESENDE, 2018).

As representações sociais são entidades quase tangíveis. Elas circulam, se entrecruzam e se cristalizam continuamente, através duma palavra, dum gesto, ou duma reunião, em nosso mundo cotidiano. Elas impregnam a maioria de nossas relações estabelecidas, os objetos que nós produzimos ou consumimos e as comunicações que estabelecemos. Nós sabemos que elas correspondem, dum lado, à substancia simbólica que entra na sua elaboração e, por outro lado, à prática específica que produz essa substância, do mesmo modo como a ciência ou o mito correspondem a uma prática cientifica ou mítica (MOSCOVICI, 2007, p. 10).

Por fim, a presença das representações nas populações vulnerabilizadas precisa ser vista como mecanismos de entender a subjetividade do outro, compreender o posicionamento ideológico de todos no mesmo contexto, dando ênfase à fecundidade do pensamento próprio. Destarte, o PTRS enaltece o estado da arte em totalidade e no caminho metodológico (CORREIA et al., 2017).

2.4 CUIDADO DE ENFERMAGEM ÀS GESTANTES EM PRIVAÇÃO DE LIBERDADE, A PARTIR DAS TEORIAS DE ENFERMAGEM

O fenômeno da mulher gestante ou lactante no aprisionamento encapsula os conceitos primários do ser humano, visto que a conjuntura do ambiente não condiz com as necessidades básicas humanas, nem tampouco com o estado de grávida/mãe. No entanto, na perspectiva do encarceramento feminino, faz-se necessário transformar o cumprimento da pena em melhor vivência dentro do presídio, em virtude de tornar palpável a praticabilidade dos cuidados imprescindíveis para gestação e obter melhores desfechos no período (ROSINSKI et al., 2006; FÉLIX et al., 2017).

A enfermagem, como protagonista do cuidado, detém os princípios necessários para aplicabilidade, manutenção e avaliação da assistência a cada indivíduo em completude, independente do cenário, embora, saibam-se das incongruências presentes nas configurações sociais (SILVA et al., 2018).

O cuidado, em definição propriamente dita, é entendido como o cuidar de si e/ou a conexão existente entre duas ou mais pessoas, com objetivos de amenização, alívio e desordens do organismo, no intuito de melhor equilíbrio para o alcance do

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