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Repositório Institucional da UFPA: Modernidade e sociabilidade: do "comércio" ao shopping (Belém-PA, 1990-)

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MODERNIDADE E SOCIABILIDADE:

DO “COMÉRCIO” AO SHOPPING (BELÉM

-PA, 1990 - )

Marcelo Santos Sodré

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MODERNIDADE E SOCIABILIDADE:

DO “COMÉRCIO” AO SHOPPING (BELÉM-PA, 1990 - )

Marcelo Santos Sodré

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, área de concentração em Sociologia, da Universidade Federal do Pará, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, para obtenção de grau de mestre em Ciências Sociais (Sociologia)

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MODERNIDADE E SOCIABILIDADE:

DO “COMÉRCIO” AO SHOPPING (BELÉM-PA, 1990 - )

Marcelo Santos Sodré

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, área de concentração em Sociologia, da Universidade Federal do Pará, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, para obtenção de grau de mestre em Ciências Sociais (Sociologia).

Este exemplar corresponde à redação da Dissertação a ser defendida a Comissão Julgadora no dia 10 de fevereiro de 2006

Banca:

___________________________________________________ Prof. Dr. Manoel Alexandre Ferreira da Cunha (orientador)

___________________________________________________ Prof. Dr. Luiz Otávio Pires (Examinador externo)

___________________________________________________ Profa. Dra. Eleanor Gomes da Silva Palhano (Examinador da casa)

___________________________________________________ Prof. Dra.Vilma Leitão (Suplente)

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MODERNIDADE E SOCIABILIDADE:

DO “COMÉRCIO” AO SHOPPING (BELÉM-PA, 1990 - )

Marcelo Santos Sodré Resumo

Esta dissertação é fruto de uma pesquisa que realizamos entre os anos de 2004 e 2005, em Belém (PA), que nos levou a compreender e explicar como a Modernidade desenvolvia-se no shopping Iguatemi Belém, através de uma de suas principais instituições: o mercado

capitalista, o qual por meio da socialização (panoptismo), “ditava” os comportamentos dos

freqüentadores, gerando uma espécie de prática relacional (sociabilidade) que, “ancorada” ao

fenômeno da busca por prestígio e status social do tipo posicional, dinamizou um mecanismo

de diferenciação social que se iniciou no “comércio” (Rua João Alfredo) e “desembocou” no

shopping Iguatemi Belém, onde os valores decorrentes do processo de socialização aqui estudados passaram a reproduzir e a acentuar o próprio processo de distinção social entre as

“classes alta e média alta” e a “classe baixa”.

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MODERNITY And SOCIABILITY:

OF THE "COMMERCE" TO SHOPPING (BELÉM-PA, 1990 - )

Marcelo Santos Sodré Abstract

This work is fruit of a research that we carry through between the years of 2004 and 2005, in Belém (Pará), that in it took them to understand and to explain as Modernity was developed in shopping Iguatemi Belém, through one of its main institutions: market capitalist, which by means of the socialization (panoptismo), "dictated" the behaviors of the visitants, generating species of practical relationary (sociability) that, "anchored" to the phenomenon of the search for prestige and social status of the positional type, a mechanism of social differentiation it provided that were initiated in the "commerce" (Street João Alfredo) and "it discharged" in shopping Iguatemi Belém, where the decurrent values of the socialization process studied here started to reproduce and to accent the proper process of social distinction between the "classrooms high and average high" and the "classroom low".

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ÍNDICE

Pág.

Agradecimentos ... 007

Relação das Abreviaturas ... 008

I Introdução ... 009

II Capítulo 1 Modernidade e Sociabilidade em Belém: da Rua João Alfredo à Av. Brás de Aguiar ... 023

III Capítulo 2 Modernidade e Socialização em Belém: da Av. Brás de Aguiar ao Shopping Iguatemi ... 065

IV Capítulo 3 Socialização e Sociabilidade: o shopping Iguatemi Belém como “caixa de ressonância” da sociedade ... 084

V Considerações finais... 121

Referências ... 128

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AGRADECIMENTOS

Queremos agradecer àqueles que nos ajudaram na organização do material de pesquisa como, os entrevistados, a Seção de Marketing do Shopping Iguatemi-Belém/PA, pela autorização para a realização da pesquisa empírica, assim como, pela ajuda que me prestou sobre a obtenção de alguns dados estatísticos que compuseram o projeto de pesquisa e a Dissertação.

Fundamentalmente queremos agradecer a Quatro pessoas: KÁTIA MENDONÇA, NAZARÉ SODRÉ, LEILA SODRÉ e ALEXANDRE CUNHA; À Kátia por ter influído desde o Trabalho de Conclusão de Curso em Ciências Sociais, na escolha do tema investigado no Mestrado, já que este é um aprofundamento analítico daquele. À Nazaré por se constituir a

“madrinha” financeira desta pesquisa. À Leila, minha prima, por ter feito a revisão gramatical de alto nível. Ao Prof. Dr. Alexandre, que aceitou contribuir com orientações prestigiosas no andamento da pesquisa, desde sua gênese na confirmação do tema a ser explorado cientificamente através do projeto até a defesa da dissertação.

Desejamos também externar os nossos agradecimentos aos funcionários da pós-graduação da Ufpa e aos professores do conjunto de Sociologia e Antropologia e aos meus colegas do Departamento de Sociologia e Antropologia da UFPa.

Agradeço aos meus pais, Aluízio Sodré e Eliziomar Sodré, à meu irmão, Michel

Sodré, e à minha família de modo geral porque sempre me apoiaram, “moral” e

financeiramente para a realização da pesquisa.

Reverencio à Girlene e à Marcelly (esposa e filha), a primeira por me incentivar durante as pesquisas e o Mestrado, estando sempre do meu lado de forma carinhosa, e a

segunda por me distrair com sua “alegria” e “gracinhas” nos momentos de cansaço mental.

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RELAÇÃO DAS ABREVIATURAS

R.J.A. - Rua João Alfredo

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INTRODUÇÃO

Quando o Shopping Iguatemi Belém1 foi inaugurado no dia 27 de outubro de 1993 atraiu um público significativo de freqüentadores, e desde então, conforme dados da seção de Marketing, cerca de 1.200.00 pessoas visitam o shopping mensalmente. Os shopping Centers

são centros de compras planejados, que reúnem lojas de diferentes ramos comerciais, supermercados, serviços e opções de lazer; portanto, são espaço de consumo.

As “literaturas de mercado” especializadas em shopping centers focalizam o seu conteúdo com o objetivo de atrais mais consumidores, apresentando os seus atrativos, onde o

slogan da “segurança” se destaca, porque segundo esta literatura, o freqüentador “desfrutará” de diversão, lazer e “cultura” com segurança. Porém, notamos que no interior dos shoppings as relações sociais não se restringem ao consumo. Um exemplo de Boff (2004) indica outros aspectos pelos quais os shoppings podem ser estudados do ponto de vista sociológico.

Leonardo Boff (2004:44-45) sem especificar data, chama atenção para um fato que foi noticiado nos jornais: a visita que alguns sem-terra fizeram ao Shopping Rio Sul, no Rio de Janeiro. No tempo em que os sem-terra estavam maravilhados com aquele mundo moderno,

“bonito”, os funcionários do shopping estavam aterrorizados com a visita de pessoas descalças, com roupas mal-cheirosas e rasgadas, com a miséria estampada no rosto e no corpo, etc. Enquanto um sem-terra experimentava um calçado em uma loja, outras lojas tinham suas portas fechadas. Segundo Boff (2004) os donos das lojas e os freqüentadores do

shopping também tiveram uma experiência de transcendência a ponto de algumas pessoas

questionarem “como é possível que esses venham para cá?”, outras ao fecharam as lojas afirmaram “Vão nos assaltar, vão nos roubar”. E eles, nada disso. Só queriam visitar. Segundo

Boff (2004), os sem-terra seria uma espécie de “Ets” que vieram de outros planetas, de outros continentes, e entraram nesse “país” fechado do moderno consumo. “Eles não cabem aqui”

(grifo do autor)

Boff (2004) ressalta um tipo de relação social que não pode ser interpretada do ponto de vista do ou apenas do consumo. A presença dos sem-terra refletiu na mudança de hábitos

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que os donos das lojas e os freqüentadores não estavam acostumados a experienciar no

shopping. É neste contexto que o shopping é “bom para pensar” (LEVI-STRAUSS, 1975).

Os discursos dos donos das lojas e dos freqüentadores (“Como é possível que esses venham para cá?” e “Vão nos assaltar, vão nos roubar”) revelam uma forma de marcar território através da distinção social, ou seja, o shopping para os primeiros constituem em um

locus onde é proibida a presença de pessoas que representam “perigo”. “Perigoso” é o

adjetivo que eles identificavam os sem-terra. Há aqui uma forma de distinção entre o que é

considerado “perigo” e o que é concebido como “seguro”.

Alguns estudos sociológicos sobre os shopping centers (cf. FRÚGOLI, 1992; e SANTOS JÚNIOR, 1992) os descrevem como uma miniatura de cidade ou uma cidade artificial que reproduz ruas e praças (públicas), onde o ambiente de tranqüilidade e de conforto dos shoppings é garantido por rígidos sistemas de segurança, que pretendem deixar

os “transtornos” do centro da cidade do lado de fora. No exemplo relatado por Boff (2004), a

presença dos sem-terra no interior do shopping Rio Sul significou, para os freqüentadores e

para os donos das lojas, uma espécie de “invasão” dos “transtornos” no interior do shopping?

No caso do exemplo do Shopping Rio Sul (BOFF, 2004), a prática relacional entre os donos e os funcionário das lojas e os freqüentadores, no que diz respeito à presença dos sem-terra neste shopping, é um fator indicativo para evidenciarmos que o shopping center pode ser considerado como um espaço do consumo o qual está associado à diferenciação social? Esta pode ser observada no interior do shopping Iguatemi Belém? Pois, preliminarmente, observamos nele indicações de diferenciações sociais, tais como: primeiro, não é permitida a

entrada de determinados “tipos” de pessoas no interior do empreendimento (de que tipos?);

segundo, há uma diferenciação entre as “preferências de consumo” dos freqüentadores por uma determinada mercadoria (que “preferências” são estas e estão ancoradas à que tipos de

valores?). Portanto, de que forma a diferenciação social no Iguatemi estar estruturada no contexto local e atual das relações sociais?

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espacial dos freqüentadores pelo interior do Iguatemi Belém possibilita constatar práticas relacionais as quais possam indicar formas de diferenciação social?

Para Bourdieu (1987), os atores sociais estão inseridos espacialmente em determinados campos sociais (como o do shopping), e compreende que a posse de grandezas de certos capitais (cultural, social, econômico, político, etc.) e o habitus de cada ator social condiciona seu posiciomento espacial e, na luta social, identifica-se com sua classe social. Neste sentido, para o ator social tentar ocupar um espaço é fundamental que ele seja sabedor das regras do jogo no interior do campo social (no caso do nosso estudo aqui, regras de

diferenciação social), e ainda que ele necessariamente que esteja disposto a “jogar” (lutar).

Nas sociedades desenvolvidas os recursos mais eficazes de distinção são as posses de capital econômico e de capital cultural. Por conseguinte, os sujeitos ocuparão espaços mais próximos quanto mais similar for a quantidade e a espécie de capitais que detiverem. Em contrapartida, os agentes estarão mais distantes no campo social quanto mais díspar for o volume e o tipo de capitais. Conseqüentemente, pode-se explanar que a riqueza econômica (capital econômico) e a cultura acumulada (capital cultural) geram internalizações de disposições (habitus) que diferenciam os espaços a serem ocupados pelos homens. Quem gera estas internalizações de disposições?

Logo, portadores de um quantum de capital de diversas naturezas, sejam capital cultural, capital político, capital social, capital artístico, etc., estão a contestar ou a aceitar certas diretrizes que redefinem as bases da sociedade. Assim, a partir da perspectiva de Bourdieu (1989:8), os agentes constroem a realidade social na qual estabelecem relações e lutas com a finalidade de impor sua visão. Esta por sua vez é formada por interesses, pontos de vista e referenciais determinados pela posição que cada um ocupa no mesmo mundo que pretende conservar ou transformar.

O habitus (BOURDIEU, 1996) é a interiorização de estruturas objetivas das suas condições de classe ou de grupo sociais que desenvolve estratégias, respostas ou proposições objetivas ou subjetivas para a resolução de problemas postos de reprodução social. Portanto, o

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E, falar de estratégias de reprodução é lembrar apenas que os números de práticas (fenomenalmente muito diferentes) organizam-se objetivamente, mesmo destituída muitas vezes de intencionalidade, contribuindo por sua vez para a reprodução do capital possuído. Ou seja, as práticas através das quais se afirma, dentro de si mesmos, a tendência dos dominantes de perseverar, não está relacionado de forma intrínseca ao fato de uma intenção estratégica ou ações com base à cálculo racional. É por isso que Bourdieu (1989) acredita que estas práticas (de reprodução do capital, seja qual for) têm por princípio o habitus, que tende a reproduzir as condições de sua própria produção, originando nos domínios mais diferentes da prática, as características sistemáticas de um modo de reprodução e as estratégias objetivamente coerentes.

Ressaltamos que para não fazermos uma análise simplista é importante considerar que freqüentar, por exemplo, um determinado estabelecimento, degustar um charuto, beber de um

vinho raro, possuir um “carro do ano”, não significa uma “distinção automática”. Por exemplo, a shopping “pode” ser visto mais como um lugar de ostentação do que um sinal de

distinção. Logo, à luz da perspectiva de Bourdieu (1996), o mesmo comportamento ou o mesmo bem pode parecer distinto para um, vulgar ou pretensioso para outro e ostentatório para um terceiro.

Nesta perspectiva as classes sociais não existem, mas o que existe é um espaço social,

um espaço de diferenças, no qual as classes existem de algum modo em “estado virtual”,

pontilhadas, não como um dado, mas como algo que se trata de fazer (BOURDIEU, 1996). Bourdieu (1996) baseia-se em Thompson para definir o que é classe social. Segundo aquele, é necessário construir o espaço social como estrutura de posições diferenciadas e definidas, especificamente, pelo lugar que ocupam na distribuição de um tipo de capital. Nessa perspectiva, as classes sociais configuram-se como apenas classes lógicas, determinadas, em teoria e no papel, pela delimitação de um conjunto relativamente homogêneo de agentes que ocupam posições semelhantes nos espaços sociais; elas não podem se tornar classes mobilizadas e atuantes, no sentido da tradição marxista, a não ser por meio de um trabalho propriamente político de construção, de fabricação2 cujo êxito pode ser favorecido, mas não determinado, pela pertinência à mesma classe sócio-lógica.

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Thompson (1987) acredita que as classes sociais são uma realidade histórica porque unifica uma série de acontecimentos díspares e aparentemente desconectados, tanto na matéria-prima da experiência como na consciência. Assim, evidenciamos na teoria de Bourdieu a presença de um sujeito social histórico e atuante, pois estar inserido em uma luta constante com outros atores sociais para a ocupação dos espaços nos campos sociais. Num sentido marxista, as classes sociais somente se tornam classes mobilizadas e atuantes quando se desenrola um trabalho político de construção: a classe3 é definida, como destaca Thompson (1987) pelos homens enquanto vivem suas próprias histórias.

Dessa maneira, estudar sobre a distribuição de capitais (no nosso caso cultural),

habitus, campo social e ocupação do espaço social é debater sobre a luta dos atores sociais, então, inserindo o shopping nesta perspectiva, levantamos as seguintes questões norteadoras: As práticas cotidianas estabelecidas pelos freqüentadores no Shopping Iguatemi Belém organiza, à luz das relações sociais, o espaço interior do empreendimento, fazendo com que cada um encontre o seu território dentro do shopping? Esta prática relacional pode ser

entendida como um jogo? Este jogo ou “luta” constitui-se em arranjos sociais de distinção social ou de ostentação no sentido de Turner (1982)?

Não podemos falar em jogo sem mencionar o conteúdo que o dinamiza as “regras do

jogo”. É necessário ressaltar ainda como essas regras são apreendidas pelos agentes sociais na interação social. As “regras do jogo” são constituídas por sentimentos (de pertencimento à um

grupo social) e conhecimentos que são transmitidos a partir de um processo no qual os agentes sociais assimilam um conjunto de habitus e costumes característicos de um determinado grupo social em um campo social específico influindo no comportamento do(s) indivíduo(s). Este processo de assimilação é denominado de socialização (Cf. OLIVEIRA,

1992). Portanto, a socialização ao gerar “valores” os quais substanciam as “regras do jogo”,

condicionam o comportamento dos indivíduos.

O shopping é um centro econômico e concordando com o argumento de Jessé Souza (2001) de que o mercado, uma das principais instituições impessoais do capitalismo moderno, juntamente com o Estado Racional, é um poderoso criador de estímulos para a conduta individual, onde em cada uma dessas esferas existem idéias e valores específicos as quais

3É por isso que adotamos o termo “classe social” para identificar a que camada da sociedade os indivíduos

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influenciam ou guiam o comportamento dos agentes sociais em determinada direção em cada caso.

Jessé (2001) argumenta que os navios os quais chegaram ao Brasil a partir de 1808, não trouxeram apenas mercadorias exóticas ou a família real de Portugal, mas também todo um aparato de vinte mil funcionários e o equivalente a dois terços do meio circulante português, introduzindo no país as duas instituições mais importantes da sociedade moderna: o Estado Racional e o Mercado capitalista. A família real proporcionou inúmeros melhoramentos de infraestrutura propiciando o funcionamento do comércio e da indústria no Brasil, como a criação de instituições de crédito e fomento à produção.

Destas transformações, Jessé (2001) destaca, exemplarmente, que a abertura do porto não significou apenas uma simples expansão do mercado, mas funcionou como principal elemento dissolvente de relações tradicionais, mais ainda, o comércio foi acompanhado da introdução de manufaturas e até da maquinofatura. Máquinas e mercadorias não são produtos materiais quaisquer, pois são sintoma de relações sociais de outro tipo, já que ao pressupor um mecanismo disciplinador próprio exercido sobre os operários e aprendizes, pressupõem uma nova visão da condição da vida cotidiana até uma nova economia emocional adequada às suas necessidades.

O argumento de que, o mercado e o Estado não correspondem ao mundo da rua que pára na porta da casa, penetrando nesta e inclusive nas almas dos indivíduos ao ponto de

“dizer” o que eles querem e como devem sentir, fundamenta a crítica que Jessé Souza (2001) faz à enganosa concepção dual (entre a Casa e a Rua) de Roberto Da Matta (1991) referente ao pressuposto de que a casa (espaço onde prevalecem as relações regidas pela afetividade,

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Em analogia com lógica da crítica de Jessé Souza (2001) à Da Matta (1991), o

shopping Iguatemi Belém pode ser considerado como uma “síntese da cidade”, ou em outras palavras, uma “caixa de ressonância” da sociedade belemita? É o mercado a instituição

socializadora do comportamento dos freqüentadores no Iguatemi Belém?

Através da socialização, quando um agente social participa de um grupo, aprende normas de comportamentos as quais o direcionam no momento de escolher “pontos de referências” que conotam diferenciação social. Estes “pontos de referências” (Cf. LÉVI -STRAUSS, 1975:97) são símbolos que os agentes sociais utilizam como guia para as práticas relacionais, estão ligados ao mercado?

Os símbolos associam um significante concreto (gesto, fórmula, animal, roupa, etc) a um significado geralmente abstrato e valorizado (bandeira = nação; punho levantado = protesto; etc). Assim, o símbolo (cf. OLIVEIRA, 2002) é algo cujo significado ou valor é atribuído pelas pessoas que o utilizam. Estas atribuem significados a uma cor, um gesto, um hino ou um objeto, e estes se tornam símbolos de algo, como o prestígio, a posição elevada, a riqueza, etc., logo, cada sociedade ou grupo social pode utilizar símbolos diferentes para

exprimir diferenciações sociais. Com vistas à estas proposições, questionamos: “Quais

símbolos são utilizados pelos freqüentadores do Iguatemi Belém como forma de diferenciação social? De que forma são manipulados para expressar esta diferenciação social?”

Nestas perspectivas, a socialização no shopping Iguatemi Belém torna-se um mecanismo no qual organiza espacialmente, por meio de símbolos que conotam diferenciações sociais, as relações sociais através das práticas relacionais? Cada grupo social percebe esta socialização de maneira diferente e de que forma? Ao estabelecer normas de convívio e comportamento social, a socialização pressupõe um sistema de vigilância no sentido que Foucault (1987) estuda os mecanismos disciplinadores das prisões? A analogia

entre o tipo de socialização presente no Iguatemi Belém e a obra de Foucault “Vigiar e Punir”

(1987) é possível? Quais os limites desta analogia?

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de pesquisa: “Considerando que a sociabilidade é um jogo no qual se ‘faz de conta’4 que as

pessoas são todas iguais, ao mesmo tempo em que, se faz de conta que cada um é reverenciado em particular (SIMMEL, 1983), e que o mercado é uma instituição socializadora, o shopping Iguatemi Belém apresenta-se como um mecanismo de diferenciação social no contexto da cidade de Belém? Assim, o shopping Iguatemi Belém é uma instituição

de mercado que gera “novos valores” (socialização) que por sua vez gera “novas” formas de sociabilidades ou é apenas uma tendência repetitiva do mercado que se desenvolvia na Rua João Alfredo e depois na Av. Brás de Aguiar? Por isso, conceber o shopping Iguatemi Belém enquanto instrumento de socialização e sociabilidade é significativo para compreender a

problematização a cerca do tema pesquisado que estar para além do ato de “fazer compras”5

dos freqüentadores?

Com o objetivo de compreender a importância simbólica da sociabilidade e da socialização (temas centrais) no shopping e a realidade (organização, contexto) social que ela pode informar, o recorte espacial central desta pesquisa é o Shopping Iguatemi Belém, porém, a investigação delineou-se em dois outros lugares: na Rua João Alfredo e na Av. Brás de Aguiar.

A seleção desses últimos justifica-se pelo fato que ambos, assim como o shopping Iguatemi Belém, são lugares que aglomeram pessoas das mais diferentes camadas da sociedade num mesmo espaço, e por isso tornam-se suporte6 da sociabilidade e de socialização, no mesmo sentido que Walter Benjamim (1985) estuda as ruas francesas.

Outro fator refere-se ao fato dos relatos dos depoentes indicarem que a Rua João Alfredo e a Av. Brás de Aguiar eram os principais point de encontro antes da inauguração do shopping Iguatemi Belém, podendo ser analisadas como espaços onde as relações sociais são

organizadas segundo “determinadas” regras de convivência social, expressando-se como espaços de socialização (OLIVEIRA, 2002) e de sociabilidade (ELIAS, 1993, 1994, av.).

4“Fazer de conta” não é mentira mais do que o jogo ou a arte são mentira devido ao seu desvio da realidade?. 5“Fazer compras” é um linguagem usada pelos entrevistados para designar o ato de consumir.

6 Entendemos aqui como suporte social“os processos inintencionais sem sujeitos através dos quais grupos e

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Entendemos aqui como point de encontros o “Locus privilegiados da sociabilidade

mobilizadora do processo civilizacional” (ARRUDA, 2001:61). Portanto, o estudo em conjunto dos três locus possibilita melhores condições para a compreensão do fenômeno da sociabilidade e da socialização no contexto atual e local no shopping Iguatemi Belém, pois, do ponto de vista da socialização e da sociabilidade, o comércio tradicional de rua (Rua João Alfredo e a Av. Brás de Aguiar) configura-se em “ilustres antecedentes” dos shoppings

centers, com diferenças bem definidas entre si?

A rua como lugar e suporte da sociabilidade é evidenciada nos textos de Walter Benjamim (1985) A Paris, capital do século XIX e A Paris do Segundo Império em Baudelaire, e nos apoiará como instrumento de interpretação para verificarmos de que modo a

sociabilidade e a socialização se inicia na rua e “desemboca” posteriormente no shopping (no

nosso caso o Iguatemi Belém). Portanto, o recorte temporal de análise histórica corresponde ao período entre a década de 1960 até à inauguração do shopping Iguatemi Belém em 1993. O estudo deste período contribuiu para compreender o contexto atual da sociabilidade e do tipo de socialização presente no Iguatemi Belém.

Portanto, os procedimentos metodológicos consistiram em duas fases intrínsecas uma a outra: pesquisa teórica e empírica. Além de realizar a pesquisa teórica nas bibliotecas de três universidades de Belém (UFPA, UNAMA e UEPA), pesquisamos no acervo particular do Orientador desta Pesquisa, o Doutor em Antropologia Alexandre Cunha, que conta em seu projeto financiado pelo CNPq (Codificação, acondicionamento e análise da vida social em fontes impressas das décadas de 70, 80 e 90 do século XX na Amazônia) com um banco de dados constituindo atualmente de 872 exemplares de revistas; 842 exemplares de jornais; 1.992 exemplares de outros documentos e mais de dois mil livros.

A pesquisa empírica abrangeu contatos preliminares selecionando uma amostra significativa para um melhor aproveitamento da técnica de pesquisa a ser (e que foi) utilizada para a coleta de dados. Portanto, durante o desenvolvimento da pesquisa adotamos vários procedimento conforme as interpretações dos dados, porém, predominaram as técnicas de

pesquisa “história de vida” (direcionada para a investigação da Rua João Alfredo e da Av.

Brás de Aguiar) e “pesquisa participativa” (esta utilizada no shopping Iguatemi Belém), nas

quais analisamos os discursos dos entrevistados, pois através destes, se expressam os

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No primeiro ano de pesquisa, objetivamos elaborar o projeto que foi submetido a Qualificação do Mestrado. Assim, o levantamento teórico destacou-se sobre o levantamento empírico devido a oportunidade na qual os programas das disciplinas oferecidas pelo curso do Mestrado serviram como suporte teórico para a análise dos dados empíricos.

Assim, no primeiro semestre investigamos como e de que ângulo o tema da diferenciação social poderia ser estudada. Logo, correspondeu ao confronto dos dados preliminares com o suporte teórico levantado nos fizeram adotar e descartar, ou deixar em segundo plano, alguns conceitos que nos pareciam centrais em alguns momentos da pesquisa. Partimos a interpretar as relações sociais que nos propomos a estudar do ponto de vista da

“cultura no narcisismo” em Lasch (1983), da “cultura de massa” em Adorno (1985), da “solidão” em Riesman (1995), do “individualismo” em Dumont (2000) e da “sociedade do espetáculo” em Debord (1997). Terminamos o primeiro semestre do curso de Mestrado com a sensação de que as interpretações ainda não configurava-se suficientemente consistente para compreender como se manifestam as relações sociais no shopping Iguatemi Belém.

Num segundo semestre, no qual ainda objetivamos compreender a questão da

diferenciação social, aprofundamos a pesquisa em direção ao tema da “identidade” quando ao

estudar vários autores, tais como Castells (1999), Bourdieu (1983, 1989, 1996), Mendes (2002), Sodré (1999), entre outros, evidenciamos a questão da “prática identitária” como

relações sociais não-fixas, sugerindo em analisar a “estratificação social” como aspecto

central da pesquisa, ao ponto de investigar dois outros lugares (centros comerciais) anteriores ao shopping Iguatemi, a Rua João Alfredo e a Avenida Brás de Aguiar, como suporte de análise contextualizada das relações sociais atuais no Iguatemi.

Consideramos este momento como uma “reviravolta” na pesquisa, pois centralizar esta no tema da “estratificação social” fez com que entrássemos em contato com outras categorias

(“fala do crime”, “ideologia da criminalidade”, etc), o que tornaria esta dissertação e a própria

pesquisa demasiadamente ampla. Decidimos, portanto, priorizar os autores que enfocam os estudos na esfera do discurso, como Caldeira (2000) e Cunha (2003) e não aproveitar os

temas e autores relatados nos parágrafos anteriores, nos concentrando no “novo” rumo

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da “estratificação social” aos considerarmos dois principais aspectos dos três locais de

pesquisa: o lazer e o point de encontro.

No entanto, no último ano de pesquisa, o tema da “estratificação social” revelou-se superficial por não conseguir explicar o processo que envolve a questão dinâmica da distinção

social que permeia a própria “estratificação social” e as relações sociais. E compreendemos que a “estratificação social” é uma categoria secundária como as outras (“fala do crime”, “ideologia da criminalidade”, etc.), assim como o aspecto do lazer. Este fato além de

propiciar uma segunda “reviravolta” conceptual na forma de interpretação dos dados empíricos, o problema central da pesquisa foi “redimensionado” para o estudo da socialização

e da sociabilidade, apresentando a necessidade de compreender a diferenciação social através das categorias status social, simbolismo de status da roupa, busca por privilégios, etc.

Autores como Hurlock (1979), Lakatos (1979), Debesse (1965), contribuíram no que diz respeito às questões do status social, do simbolismo de status da roupa7. Caldeira8 (2000), Cunha9 (1977, 1978, 1989, 1999, 2003) Bourdieu10 (1987, 1989, 1996, 1998), Elias11 (2001), Benjamim (1985), entre outros, foram substanciais para analisarmos o tema da diferenciação social a partir da análise do discurso enquanto prática relacional, ou seja, como sociabilidade. A pesquisa demonstrou a possibilidade de compreendermos o conceito de socialização a partir

de uma analogia com a obra de Foucault (1987) “Vigia e Punir”, e a através do mercado

enquanto mecanismo disciplinador.

Evidenciamos que para melhor compreender as relações sociais investigadas recorremos ao conceito de sociabilidade e de socialização os quais possibilitaram interpretar com maior credibilidade as práticas relacionais entre os agentes sociais (Bourdieu) pesquisados, oportunidade no qual foi necessário restringir ainda mais a pesquisa nos centralizando na noção de point de encontro enquanto aspecto central, segundarizando o do

lazer. Através desses levantamentos teóricos e empíricos a pesquisa em campo foi efetuada da seguinte forma.

7 A seleção destas categorias será justificadas no decorrer dos capítulos, para não deixar esta introdução

demasiadamente extendida.

8Perspectiva da “fala do crime”.

9Perspectiva da “ideologia da criminaliade”.

10 Perspectiva da sociabilidade enquanto um jogo onde as práticas relacionais podem ser observadas

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a) Entre os dias 01 e 20 de dezembro de 2004, entrevistamos uma amostra de 12 indivíduos com idade entre 60 a 80 anos os quais, a partir do uso de suas memórias, puderam relatar a vida social nos três recortes espaciais desta pesquisa, nos possibilitando uma análise mais significativa de como se desenvolvia a sociabilidade e a socialização entre os personagens que lá estavam. Os doze entrevistados foram selecionados de um grupo de 20 pessoas abordadas preliminarmente e atenderam a todos os três critérios estabelecidos: 1) Residentes em Belém desde 1944, deveriam ser freqüentadores da Rua João Alfredo desde 1960, da Av. Brás de Aguiar desde 1989, e do Shopping Iguatemi Belém desde a sua inauguração em 1993; 2) As lembranças sobre a vivência nesses lugares deveriam apresentar riquezas nos dados (detalhes) - como uma precisa comparação entre os recortes espaciais, destacando as mudanças que ocorreram no comércio de rua (Rua João Alfredo e na Av. Brás de Aguiar) e propiciaram o surgimento do Shopping Iguatemi Belém, conforme o recorte temporal adotado nesta pesquisa - com o intuito de propiciar uma melhor interpretações dos relatos; 3) Os entrevistados deveriam estar dispostos a contribuir mais de uma vez caso necessário. Identificamos este grupo de entrevistados pela sigla G.E.1., porém foi feita a seguinte subdivisão: G.E.1.A, designando um grupo de seis entrevistados que eles mesmo se situaram como pertencentes à “classe alta” ou “média alta”; e o G.E.1.B, seis depoentes pertencentes à “classe média baixa” ou “baixa”.

Esta subdivisão nos apresentou, por exemplo, a partir de ângulos diferentes, o que representava a Rua João Alfredo para cada uma das camadas sociais entrevistadas e subdivididas do ponto de vista da socialização e da sociabilidade. Justifica-se a importância metodológica desta divisão.

b) Um segundo grupo de entrevistados (G.E.2) composto de cinco depoentes selecionados de um universo de 10, foi abordado com o objetivo de enriquecer os detalhes a respeito da sociabilidade e da socialização na Av. Brás de Aguiar. A seleção da amostra considerou os mesmo critério utilizados para o G.E.1. As entrevistas foram realizadas entre os dias 09 e 12 de abril de 2004, por toda a extensão da Avenida.

c) Com os mesmos critérios anteriores, foi selecionado no shopping Iguatemi Belém um terceiro grupo de depoentes (G.E.3), que, por meio de seus relatos, interpretamos de que forma o shopping é apreendido por eles, levando em consideração aspecto arquitetônico, de segurança, de conforto, etc.. A pesquisa delineou-se entre os dias 05 e 08 de junho de 2005 e foram abordados quatro adolescentes com idade entre 15 e 19 anos.

11 Estuda a sociabilidade enquanto mecanismo de distinção social ancora à busca por prestígio ou status social

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d) Ainda no Shopping Iguatemi Belém, dois outros grupos (G.E.4 e G.E.5) de entrevistados foram selecionado com o intuito de analisar com mais propriedade o tema da socialização e da sociabilidade. O primeiro é composto de 5 indivíduos selecionado de uma amostra de 10; e foram abordados entre os dias 18 e 19 de agosto de 2005, na entrada da praça de alimentação no terceiro piso do shopping. O G.E.5 formou-se com 6 entrevistados (três na praça de alimentação do terceiro piso e três na praça de alimentação da loja âncora Y.Yamada) entre os dias 08 e 10 de setembro de 2005.

Ressaltamos que um último grupo de entrevistados é formado por indivíduos os quais foram abordados eventualmente, destacando-se alguns gerentes de loja, funcionários do shopping e das lojas, freqüentadores, etc.

Procedemos da seguinte forma: em primeiro lugar estudamos a sociabilidade que ocorre na rua, mas especificamente na João Alfredo, principal rua do Centro Comercial de Belém, e em seguida na Av. Brás de Aguiar, uma via transitável por veículos “abastecida” por

lojas de departamento por toda extensão, lembrando as disposições das lojas e dos cafés parisienses (BENJAMIM, 1985).

Sobre a sociabilidade nesses dois lugares, entrevistamos uma amostra de depoentes (G.E.1 e G.E.2) que nos descreveu, através do uso da memória, as relações sociais num determinado recorte temporal. Em seguida, estudamos empiricamente a sociabilidade e a socialização no Shopping Iguatemi Belém, e, juntamente com o apanhado teórico, podemos demonstrar que a sociabilidade adquiriu, neste início de século XXI, uma nova “roupagem”

em comparação àquela do comércio de rua.

Expostos o problema de pesquisa e os procedimentos metodológicos e de técnicas de pesquisa, organizamos os capítulos desta dissertação da seguinte forma:

No capítulo Inicial, estudaremos como se apresentam as categorias de análise centrais desta pesquisa a partir da contextualização local do problema estudado referente ao advento em Belém das instituições modernas, com enfoque restrito ao mercado. Estudaremos quais

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capítulo é saber analiticamente de que tipo é a socialização e de que forma ela orienta as práticas relacionais entre as camadas sociais de Belém, analisando quais valores orientam o agir das pessoas no que diz respeito à sociabilidade. a qual orienta o comportamento dos freqüentadores a ação dos de que forma esses arranjos fez a sociabilidade “migrar” entre os “comércios” de rua - a Rua João Alfredo e a Av. Brás de Aguiar - enquanto ilustres precedentes do shopping Iguatemi Belém.

No capítulo segundo, estudaremos como se constituiu o S.I.B dentro do contexto de mercado, da “fala do crime” e da “estratificação social” (e urbana), com o objetivo de

compreendermos como uma espécie de socialização (o panóptico) orienta a sociabilidade. Aqui, desenvolvemos a pesquisa de duas formas: pesquisa em fontes escritas (livros, panfletos, revistas, etc.), virtuais (Internet, CD-Rom, etc.), e entrevistas com pessoas que atendam os seguintes critérios: de ambos os sexos, com idade entre 18 e 80 anos, independente de cor e de classe social, que já tenha ido a R.J.A., à A.B.A. e ao S.I.B. e continue indo em pelo menos em um desses locus; porém, a seleção dos entrevistados se dará por sondagem antecipada seguido de convite àqueles que podem ajudar nesta pesquisa.

No terceiro capítulo, analisaremos a influência da arquitetura do S.I.B. no comportamento dos agentes sociais como forma de expressão e consolidação de uma ou várias socializações moldada pelo mercado. Analisaremos o comportamento das pessoas no interior do S.I.B., o conceito de panoptismo de Foucault (o qual poderá nos ajudar a compreender o caráter das relações sociais no âmbito da estratificação social). O objetivo é

compreender de que forma o S.I.B pode ou não ser considerado como uma “caixa de ressonância da sociedade belemita”.

Para esta análise, entrevistaremos dois grupos de agentes sociais diferenciados por critérios, assim como outros agentes sociais envolvidos com o shopping Iguatemi:

funcionários e gerentes das lojas satélites, “Agentes de Segurança”, ex-funcionária, etc. Fizemos ainda pesquisa estatística com amostra de 300 pessoas com o intuito de visualizar a estratificação no interior do shopping.

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CAPITULO 01

Modernidade e Sociabilidade em Belém: da Rua João Alfredo à Av. Brás de Aguiar

Neste capítulo investigaremos de que forma Belém enquadrou-se no mundo Moderno e qual tipo de socialização a Modernidade inaugurou nesta cidade. Capital do Estado do Pará, Belém, nos dias atuais com aproximadamente 1.279.861 habitantes (Censo de 2000, IBGE), localiza-se na baía de Guajará, junto ao rio Pará e perto da foz do rio Guamá, a cerca de 120km do oceano Atlântico; está localizada a aproximadamente 160 quilômetros da linha do Equador. Mais da metade de sua área de 718 Km2 é formada por ilhas.

Com o objetivo de defender a região amazônica contra invasores estrangeiros, Belém foi fundada em 12 de janeiro de 1616 pelo explorador português Francisco Caldeira Castello Branco. Em 1755, fundou-se a Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão. Além de posto de defesa da Amazônia, Belém começava a firmar-se como centro comercial e de abastecimento, bem como ponto de partida de expedições para o interior em busca das famosas drogas do sertão, atividade econômica que junto com a agricultura predominou do século XVII ao XIX (CUNHA, 1999:80).

Belém tornou-se um importante marco estratégico para a coroa portuguesa. Em 1822, após a independência do Brasil, que não foi aceita pela Província do Pará, surgiu em conseqüência (13 anos depois) o conflito conhecido como a Cabanagem. Os setores populares da cidade de Belém tomaram o poder; mas, o movimento dos cabanos foi dizimado pelo governo imperial num conflito que, segundo Cunha (1999:65) conflagrou toda a Amazônia entre os anos de 1835/40, resultando na morte de 30.000 pessoas. As origens da Cabanagem estão ligadas à Independência do Brasil de 1822, que objetivava, segundo Di

Paolo (1986:163), a “expulsão dos portugueses do poder político e do monopólio econômico; a implantação do regime democrático [...] liberdade dos escravos”.

A partir de 1850 até o início dos anos 50 do século XX, Belém teve sua terceira atividade econômica, a qual caracterizava-se pela “subordinação do capital comercial ao industrial na fase do ciclo gomífero, da extração da castanha, madeira e essências vegetais”

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modernização - influenciando também nas formas como os Intendentes do Estado do Pará geriam suas políticas para Belém (cf. CUNHA, 1999:101) - e em processo de urbanização. Sarges (1990: 98-99, 104 a 114) verificou que transformações foram estas:

Foram projetados além do porto de Belém, o mercado municipal, hospitais, o Grêmio Literário, The Amazon Telegraph Company, Arquivo e Biblioteca pública, o Teatro da Paz, 43 fábricas (de chapéu à perfumaria), 5 bancos, 4 companhias de seguro, iluminação a gás [...] pavimentação de ruas usinas de incineração de lixo, limpeza urbana, tudo isso controlado por um Código de Posturas baseado em idéias liberais, política seneadora preventiva, controle de doenças e epidemias [...] tendo para este fim em vista o que de mais adiantado havia na Europa

Portanto, a partir de 1900, Belém constituiu-se em um receptáculo de mercadorias destinadas à exportação (borracha, cacau, fibras, pimenta-do-reino, couro, castanha-do-pará, sementes oleaginosas, madeiras, etc.) e como centro importador para a Amazônia, mas especificamente, para o interior da região, consolidando o intercâmbio mercadológico entre a Metrópole da Amazônia (Belém) que se consolidava e as outras cidades da região, incluindo-se Manaus. E com o passar do tempo, a cidade de Belém incluindo-se expandiu e surgiram vários bairros. A cidade adotou, desde o auge da borracha - 1870-1920 - uma tendência à franca continentalização, sempre obedecendo às imposições do relevo. Consolida-se a periferia de Belém (cf. SARGES, 2002:52), configuradas nos bairros de Batista Campos, Nazaré, São Brás, Marco, Souza, Cremação, Reduto, Umarizal e Matinha, etc..

Belém destacou-se ainda por ter luz elétrica, bondes elétricos, rede de esgotos, calçamento, abertura de novas ruas, etc.; então constituiu-se de um rico patrimônio arquitetônico (casarões, igrejas, palacetes) em estilo neoclássico – hoje, herança da era da borracha e das fases anteriores – dentre os quais destacam-se: a Igreja da Sé13, o Forte do Presépio14 (hoje também conhecido como Forte do Castelo), Casa das Onze Janelas, os Palácios Lauro Sodré e Antônio Lemos, o Mercado do Ver-o-Peso, Teatro da Paz, Palacete Pinho, as casas do Centro Comercial.

Em 1920 a população do Pará alcançava a marca de 983.507 habitantes, em comparação aos 275.252 de 1872; e Belém, no mesmo período, aumentou de 61.997

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habitantes para 236.40215. Desta forma, segundo Sarges (Ibidem), Belém configurou-se em uma capital muita agitada, bem mais européia do que brasileira, com forte influência francesa, especialmente no aspecto intelectual:

[...] as famílias ricas da terra tinham por hábito enviar seus filhos para as escolas da França. Os navios europeus, principalmente franceses, não traziam apenas os figurinos, o mobiliário, as roupas, mas também notícias sobre as peças e livros mais em voga, as escolas filosóficas predominantes, o comportamento, o lazer, as estéticas e até as doenças, tudo enfim que fosse consumível por uma sociedade altamente urbanizada e sedenta de modelos de prestígio

Dentre os intelectuais estava Antônio Lemos, que, segundo Cunha (1990:102), tinha Paris como modelo de modernidade e de vida urbana (arquitetura, vestimenta, noções de higiene, etc.), e visou transformar Belém, a partir de 1904, num centro de trabalho e atividade

nos moldes da capital francesa. Cunha (Ibidem) ainda destaca que através de Belém, “não penetravam na Amazônia só os objetos, mas principalmente idéias e mentalidade”. Neste sentido, sob o prisma da modernidade do mundo de ombrear-se em padrões de igualdade, duas indústrias do Pará (a fábrica Palmeira e a fábrica Bitar) obtiveram menção honrosa na Exposição Internacional de Paris. A respeito de Belém, Cunha (Ibidem) anuncia: “A sociedade nos trópicos não só se urbanizava, como se industrializava a nível de padrões

internacionais”.

No auge econômico e social “da Belém da Belle-Époque” (cf. SARGES, 2002), a temática da modernidade assume papel decisivo pelo fato de podermos observar nas obras de Sarges (2002) e Cunha (1990) que as duas instituições mais importantes do capitalismo moderno - o Estado e o Mercado - propiciavam transformação nos habitus da população belenense da época, remodelando, por sua vez, as práticas relacionais entre as camadas sociais.

Apesar de não estar explícito no livro de Sarges (2002) que a instituição do Mercado e do Estado funcionam também como mecanismo de socialização, a autora (2002) apresenta uma concepção das transformações das relações sociais (por meio das mudanças de pensamento e de comportamento social da população belemita) não destoante da análise de Jésse Souza (2001) sobre os efeitos das instituições citadas às práticas relacionaisno

15 Fonte IBGE in SARGE, Nazaré. Riquezas produzindo a Belle Epoque, UFPE, Recife, 1990 (Dissertação de

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quotidiano dos indivíduos. A autora (2002:13) faz uma análise coerente sobre como o mercado e o Estado influenciaram no comportamento das pessoas a ponto de reconfigurar as relações sociais conforme as necessidades das duas esferas o capitalismo moderno:

A modernidade entendida como expansão da riqueza, ampliando as possibilidades, caracteriza-se pelo avanço da tecnologia (Revolução Industrial), construção de ferrovias, expansão do mercado internacional, pela urbanização e crescimento das cidades (em área, população e densidade), pela mudança de comportamento público e privado e pelo bafejo da democracia, transformando as ruas em lugares onde as pessoas circulavam e exibiam seu poder de riqueza

Sarges (2002) reconhece que o desenvolvimento do mercado implica em “novas”

necessidades as quais a todo instante reconfigurará as relações sociais conforme os interesses do mercado e/ou do Estado. Para a autora (2002) e para a análise que realizamos aqui, a temática da modernidade16 e suas instituições de socialização é importante na medida em que também notamos que ela promove “a propagação de uma nova moral e a montagem de uma nova estrutura urbana, cenário de controle das classes pobres” (idem), onde a vitalidade “urbana manifestada através do vestuário, da construção de prédios luxuosos [...] na criação

de uma nova estética, representou, na verdade, uma reelaboração da expressão do poder de

uma nova classe” (idem). Assim, o espaço urbano assume papel estratégico na transformação

de tudo em mercadoria, e ainda segundo Sarges (2002:22), esta é uma mentalidade capitalista relacionada com um consumo ordenado pela troca de mercadorias, inclusive a nível simbólico - como a idéia de “ser moderno” e/ou “andar na moda”.

Demostrando implicitamente o “poder” de socialização do mercado ou do Estado,

Sarges (2002:28) também adotou a reflexão de Marshall Berman (1988:13) sobre o que

consiste o “ser moderno”: “Ser moderno é viver uma vida de paradoxo e contradição. É

sentir-se fortalecido pelas imensas organizações burocráticas que detém o poder de controlar e freqüentemente destruir comunidades, valores, vidas [...]”. Desta forma, Sarges (2002:28)

ressalta que, a partir do momento em que a sociedade moderna passou a ser analisada, as transformações dos hábitos e do modo de vida dos indivíduos foram os primeiros parâmetros de investigação.

16Temáticas como “ordem” e “progresso”, “razão”, “emancipação universal”, “sistemas únicos de leitura da

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Por isso, adotamos a autora se ateve à “moda” como viés de interpretação e explicação das relações sociais que se desenvolveram no Centro Comercial de Belém na “virada” do

século XIX para o XX. Sarges (2002:29) refere-se sobre a moda como um fenômeno “típico

da sociedade urbano-industrial, estimuladora do consumo e do símbolo do desperdício [...] a moda servirá à estrutura social e subjugará a sociedade, tanto faz ser de Belém como do Rio

de Janeiro, a um modelo internacional do ‘bem vestir’”.

Com base nesta perspectiva, optamos pela temática da moda na análise e investigação das práticas relaciona que se desenvolveram na Rua João Alfredo, na Av. Brás de Aguiar e no Shopping Iguatemi Belém por dois fatos: o primeiro por estar presente em todos os discursos dos entrevistados por esta pesquisa; e, em segundo lugar pelo fato que as mudanças na moda, como bem definiu Bresciani (1984/85), estão intimamente vinculada às mudanças na maneira de pensar, ser e sentir de uma sociedade, servindo de demonstração individual da indumentária sobre o corpo (a moda). Ainda mais porque a moda está também intimamente ligada a estrutura social, segundo, como destaca Souza (1987), os diferentes níveis problemáticos que ela representa.

Sarges (2002) destaca o trabalho de Gilda de Mello e Souza publicado em 1987, intitulado O Espírito das Roupas: A moda no século XIX, como importante trabalho sobre a

moda porque a concebe “como fenômeno cultural, social e estético buscando captar as

sutilezas imbricadas no vestir e as distinções sociais veiculadas pela indumentária e

ornamentação” (idem), também enquanto “fenômeno democrático” (cf. SOUZA, 1987:22) na

medida em que torna possível a participação de todas as camadas no processo que envolve os pressupostos da modernidade e do “ser moderno”, ao mesmo tempo em que esses atributos expressam interesses de diferenciação social das “camadas mais alta”.

Sarges (2002) destaca o período de 1870 à 1912 como o marco inicial da modernidade em Belém. Sarges (2002:29) destaca, por exemplo, que na Belém do final do século XIX, as

“mulheres das classes abastadas tinham um zelo especial pela indumentária, tanto que mandavam buscar seus vestidos em Londres e/ou Paris”. Para suprir esta necessidade do

requinte de damas e cavalheiros (termos de Sarges), alguns estabelecimentos comerciais se

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instalaram em Belém, destacando-se as casas Paris N’Ámérica, o Bom Marché e casas

exclusivamente de modas e chapéus, como a casa Maison Française de Mme Russo, entre outras. Quando o mercado se amplia para outras áreas imputa novas necessidades do consumo à população local, proporcionando mudanças não apenas no pensamento e no comportamento das pessoas, mas influiu na urbanização da cidade à seus modos, ou seja, às necessidades do mercado.

Sarges (2002) identifica os “elementos” que enquadram o Brasil no contexto da

modernidade, tais como industrialização, a divisão técnica do trabalho, a urbanização, a

formação de uma “elite nacional”, indicadores de progresso, elemento sintonizador da “nossa”

sociedade com as modernas sociedades “civilizadas”, a transformação do espaço público e do modo de vida, propagação de uma nova moral, montagem de uma nova estrutura urbana

enquanto cenário de controle das classes pobres, estratificação social, etc. Tais “elementos” se

enquadram no contexto da introdução e consolidação no Brasil das instituições mais importante do capitalismo: o mercado e o Estado.

Não querendo repetir os equívocos que Da Matta (1991) cometeu na sua análise dual entre a rua (indivíduo) e casa (pessoa), é importante analisar as transformações na sociedade belemita e as diferenciações sociais decorrentes das práticas relacionais socializadas pelo mercado, também a partir do conceito de estratificação social, que aqui pauta-se na

“valorização diferencial dos indivíduos entre si e o seu tratamento como superiores e

inferiores em relação a aspectos socialmente relevantes” (grifo do autor). A moda está

associada ao fenômeno da estratificação social porque se enquadra dentre esses aspectos relevantes porque “separa e ordena no ‘espaço das relações sociais’ os que ‘estão na moda’ e os ‘que não estão na moda’” (grifo do autor).

Assim, Sarges (2002:53) demonstra que no final do século XIX e início do século XX Belém se transformava (economicamente, socialmente e politicamente) com base nos elementos da modernidade mencionados no parágrafo anterior:

A transformação pela qual passou Belém, engendrada pela economia gomífera, significou a materialização da modernidade expressa através da construção de obras, urbanização, formação de elites, na construção

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Outro aspecto da modernidade que Sarges (2002:139) observou diz respeito ao seu caráter disciplinador, seja no âmbito do modo de vida e da organização do espaço urbano:

A cidade do século XIX necessitava de ter seu espaço disciplinado e

ordenado, e para exercer essa tarefa o poder público, ‘ávido por transformar a cidade em um centro de atrações’, teve de planejar a

cidade como também criar novos mecanismos de regulamentação (Código de Posturas) da vida social na cidade.

Porém, destaca Sarges (2002), o importante é mostrar que a vida na metrópole da

Amazônia (Belém), em sua realidade concreta, é “marcada” por contradições sociais inerentes

ao sistema capitalista enquanto expressão do paradoxo do progresso, da modernidade, que o

desenvolvimento econômico do capitalismo carrega em seu bojo, pois a riqueza e “luxos sociais” de uma burguesia que consumia, fundamentalmente, “o importado”, contrastava com a miséria, com a prostituição e com uma gama enorme de desgraças sociais. Portanto, Sarges (2002:186) conclui que:

O cenário central da cidade vai ser transformado em “espaço elegante e chique”, por onde deveria desfilar a burguesia exibindo seu poder, luxo e riqueza. O resultado dessa modelação da cidade é a elitização do espaço urbano com a erradicação dos setores populares para as área mais distantes do centro

A modernidade em Belém propiciou a estratificação urbana e social através de seus próprios paradoxos, como dividir o que “é moderno” e o que “é tradicional”. “Moderno” no sentido de “avançado”, “riqueza”, e “tradicional”, ou “não moderno”, no sentido de “atrasado” e “miséria”. A exposição de Sarges (2002) evidencia bem este paradoxo (da

modernidade) em Belém ao analisar a organização do urbano belenense pelo poder público

através das intervenções políticas de Antônio Lemos. As prioridades foram o “Código de Postura”, o “saneamento” (serviço sanitário e saúde pública) e a “estética da cidade”.

Assim, “o conceito de modernidade está intimamente ligado ao de progresso expresso

através do desenvolvimento da vida urbana, da construção de ferrovias, da intensificação das

transações comerciais e da internacionalização de mercados” (SARGES, 2002:138). Expressões da atuação do Mercado capitalista e do Estado Moderno17.

17 Antônio Lemos enquanto representante do Estado (em nível municipal) simboliza a administração que

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Esntão. no final da década de 40 do século XX, Belém (cf. PENTEADO, 1968:180) possuía duas grandes áreas funcionais com nítidos limites entre elas: a comercial e a residencial. A primeira abrangia um centro comercial representado pelos bairros da Cidade Velha e do Comércio (com destaque às Ruas João Alfredo e Santo Antônio), limitando-se à Av. Presidente Vargas (antiga Av. 15 de agosto) e à praça da República (onde localiza-se o Teatro da Paz). Na zona comercial evidenciava-se:

a) o velho centro, com seus “velhos edifícios, becos e vielas, sem arborização de espécie alguma”, onde se encontravam “as principais

lojas e armarinhos de Belém, o comércio de miudezas em geral, e também vários escritórios...”; b) o Ver-O-Peso, tão característico de

Belém, mercado “estabelecido ao ar livre, junto a uma espécie de

pequeno cais, onde atracam embarcações a vela (vigilengas); sua extensão para o norte formava o chamado Mercado da Praia, no qual se

esparramavam “pelo chão”, em um enorme caos, mercadorias dos mais

variados tipos e procedências. Verduras, frutas (bananas), cuias, moringas, paneiro de carvão, paneiros de farinha, chapéus de palha,

panelas e outros utensílios de latão...”; também nos despertaram a

atenção os “tabuleiros pertencentes a vendedores de água de cheiro,

roupas, pães, sapatos, quinquilharias, etc. Enfim, tudo ali é comércio, só

comércio”; c) a zona portuária, ao norte do Mercado da Paia, com seu cais, armazéns e equipamentos muito razoável; d) o novo centro, que

correspondia “praticamente à av. 15 de Agosto, a grande artéria da nova Belém do Pará...”, “avenida larga, moderna;” nela, já existiam “um

pequena série de arranha-céus e se encontravam os melhores hotéis, os escritórios das grandes companhias de navegação, algumas repartições

públicas e vários consulados de repúblicas andinas”; também notamos como já começavam a surgir, ao longo dessa avenida, “bares, cafés e restaurantes e algumas casas comerciais mais requintadas”

(PENTEADO, 1968:181).

Na segunda área funcional, Penteado (1968) identifica três setores: a) um bairro residencial elegante bem arborizado em Nazaré e São Brás, onde observa-se numerosas mansões cercadas por grandes jardins ao longo das avenidas de Nazaré, São Jerônimo (a atual Av. Governador José Malcher) e Independência (hoje, a Av. Magalhães Barata); b) um

bairro residencial modesto constituído pela classe média o qual contorna o bairro do Comércio; e, c) bairros residenciais pobres, os quais se prolongam pela periferia da cidade, caracterizados por casas de madeira cobertas por folhas de palmeiras, elevadas ou não sobre estacas.

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interessando para fins de análise a Rua João Alfredo enquanto point de encontro através do qual a sociabilidade e a socialização, como objetivamos demonstrar aqui, são os temas centrais de análises da diferenciação social entre as camadas sociais belemita, principalmente porque estão interligados uns ao outro.

Segundo depoimentos de alguns entrevistados (G.E.1) a Rua João Alfredo (R.J.A.) era um dos principais point de encontro de Belém nas décadas de 60 e 70, predominante nos

sábados, porém não muito diferente do período antecedente - de 1900 a 1950/60, como destacam Sarges (2002) e Penteado (1968).

Diferentemente do início deste século XXI, segundo os mesmos depoentes (fonte

oral), a “poluição sonora era quase inexistente” e não havia uma quantidade excessiva de

vendedores ambulantes (em torno de 10 ambulantes por toda a extensão das ruas João Alfredo e Santo Antônio), considerando que a população de Belém era a metade em relação aos dias atuais (conforme Censo 2000 do IBGE: 633.374 residentes em 1970 e 1.279.861 no ano de 2000). Destacaram ainda que apesar da “companhia” de mendigos, pedintes, prostitutas e

alguns caso de batedores de carteira, e de um comércio variado em produtos, a Rua era concebida como um lugar de lazer e de encontros. Daí a importância de analisar a R.J.A. enquanto point de encontro para compreendermos melhor o fenômeno da sociabilidade.

Esta sociabilidade se faz presente por meio dos atores sociais que experienciam a rua em sua rede de relações sociais, e através das entrevistas foi possível levantar um primeiro panorama sobre os personagens que freqüentavam a Rua João Alfredo (R.J.A.). A classificação organizada no parágrafo seguinte corresponde a classificação que os entrevistados adotaram em seus depoimentos como forma de identificar por nomenclatura os freqüentadores deste locus.

Utilizam com freqüência a palavra “classe” para designar qual camada social os indivíduos pertencem e fazem a seguinte analogia: usam o termo “classe alta” para identificar os “ricos”, “classe média-alta” para designar o grupo que tem uma proximidade com a “classe alta”, “classe média” aos que não são nem ricos e nem pobres, “classe média-baixa” o grupo com proximidade com a “classe baixa”, e “classe baixa” equivale aos pobres. A explicação do

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identificam com o seu grupo, estão identificando-se com as idéias e valores que regem seus próprios comportamentos e modo de vida. Depois destas considerações à respeito da “classe social”, prosseguiremos com a classificação dos personagens.

As entrevistas18 com o G.E.1 foram realizadas nas residências19 dos depoentes (com idade entre 60 e 80 anos de idade20) afim de permitir melhor observação sobre o tema estudado. Então, a classificação dos personagens que no parágrafo seguinte é descrito corresponde a uma síntese das informações comuns que encontramos nas falas desses informantes no que diz respeitos aos termos utilizados por eles mesmos.

Segundo o G.E.1, a Rua João Alfredo era mais freqüentada enquanto Point de Encontros nos dias de sábados, e os personagens dividiam-se entre as “classes” alta, média e baixa21: a) “os que andam na moda” (pessoas da “classe alta” e “classe média alta”, os quais

caracterizavam-se por “estarem sempre na moda” através do uso de determinadas roupas ou acessórios. São também chamados de “ricos”); b) “os que não andam na moda” (classe média “baixa” e “classe baixa”, caracterizadas por “não andarem na moda”, também chamados de “pobres” ou “os que vivem mais ou menos”); c) “os funcionários” dos diversos

tipos de comércio no local (restaurante, bares, lojas, etc.); d) “os mendigos” (chamados

também de pedintes: são aquelas pessoas que pedem dinheiro, comida, objetos, etc., - e eram

muitos poucos, segundo depoimentos); e) “as prostitutas” (transitavam normalmente pela

Rua João Alfredo, no entanto, o point de programa era a conhecida “Zona do Meretrício” que

corresponde a área22 que abrange às ruas 1.º de Março e Padre Prudêncio, no limite entre as

ruas Aristídes Lobo e General Gurjão, perpassando pela rua Riachuelo); f) “os patetas

(personagens que eventualmente freqüentavam a Rua João Alfredo por serem turistas ou de outros estados, ou do interior, que freqüentemente eram alvo de pequenos golpes econômicos,

18 Entre os dias 01 e 20/12/2004.

19 Nos bairros de Belém: Souza, São Brás, Nazaré, Batista Campos..

20 É importante ressaltar que a idade dos informantes corresponde ao intervalo de 60 e 80 anos de idade por

tornar possível o resgate descritivo (através da memória dos entrevistados) dos personagens os quais freqüentavam a R.J.A. nas décadas de 60 a 90. possibilitando enriquecer de dados a pesquisa através de seus depoimentos, registrados no caderno de campo. É por este mesmo motivo que a amostra de um número de seis entrevistados consideramos significativa.

21Ainda ressaltamos que a palavra “classe”, muito presente nos relatos dos entrevistados, constitui-se como uma

forma de estabelecer, pelo discurso, lugares na sociedade belemita referente à sociabilidade, já que a renda é fator estratificador; por isso, a adotaremos em toda a dissertação enquanto termo identificador dos personagens citados pelos entrevistados.

(34)

como furto de carteira, “conto do vigário”, etc.); g) e alguns “guardas”, responsáveis para

estabelecer a ordem no local.

No decorrer das décadas de 70, 80 e 90 do século passado, a população de Belém aumentou consideravelmente (1970: 633.374; 1980: 933.287; 1991: 1244.689)23, gerando o aumento numérico de freqüentadores no Centro Comercial de Belém (e na Rua João Alfredo),

o aumento da periferia na cidade belemita e o “aumento da criminalidade”24. Esses fatores

agiram diretamente sobre a rua enquanto cenário das relações sociais e da sociabilidade no momento em que possibilitou um maior contato entre as diferentes camadas da sociedade.

Neste sentido a rua é “boa para pensar” (LEVI-STRAUSS, 1975), já que é a rua quem resgata a experiência da diversidade num espaço público (regulado por normas também públicas),

tornado possível o encontro com a desconhecido e as “camadas perigosas”, o reconhecimento

dos semelhantes, a troca entre diferentes, a multiplicidade de usos e olhares.

Observamos aqui que a mudança na economia paraense (Grandes Projetos) propiciou transformações no mercado. Se houve transformações neste último, e partindo da lógica analítica de que o mercado constitui-se em um mecanismo socializador (JÉSSE SOUZA, 2001), as mudanças na cidade, no meio urbano e nas práticas relacionais (sociabilidade) explica-se pelo fato que houve mudanças no processo de socialização. Um exemplo clássico de que transformações no mercado geraram mudanças nas ruas e no modo de vida das pessoas é a Paris do século XIX.

Para pensar a rua enquanto espaço e suporte de sociabilidade é significativo recorrermos a imagem das ruas de Paris de meados do século XIX ressaltada nos textos de Walter Banjamin (ORTIZ, 1983), os quais retomam os personagens, comportamentos e

incidentes vividos e “poetizados” pelo contemporâneo Baudelaire. Os bulevares parisiense

faziam parte de um projeto mais amplo da reforma urbana, constitui-se enquanto ponto de partida para a modernização da cidade tradicional. O prefeito de Paris, G.E. Haussmann, derrubou centenas de edifícios, destruiu bairros inteiros, deslocou milhares de pessoas,

tornado Paris num espaço físico e humano “unificado”. O Governo de Antônio Lemos é o

exemplo belenense!

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TABELA 02 - Tabela dos Preços de Roupas das Lojas do Segundo Andar do Shopping Iguatemi Belém  em 17/08/2005
TABELA  4  -  Número  de  Freqüentadores  que  adentraram  as  Lojas  “Mania”  e  “Côrte”  entre  os  dias  29/09/05 a 15/10/2005 no Shopping Iguatemi Belém
TABELA  5  -  Número  de  Freqüentadores  Presentes  nas  Praças  de  Alimentação  do  Shopping  Iguatemi  Belém  segundo  o  sentimento  de  pertencimento  a  uma  determinada  “classe  social”

Referências

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