• Nenhum resultado encontrado

AS ERVAS MEDICINAIS NA UMBANDA NOS CULTOS DE PRETO VELHO

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2020

Share "AS ERVAS MEDICINAIS NA UMBANDA NOS CULTOS DE PRETO VELHO"

Copied!
11
0
0

Texto

(1)

MARCELO MÁXIMO PURIFICAÇÃO**, ELISÂNGELA MAURA

CATARINO***, IVONETE BARRETO DE AMORIM****

* Recebido em: 02.10.2019. Aprovado em: 15.12.2019.

∗∗ Pós-doutor em Educação pela Universidade de Coimbra – UC/PT. Doutor em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC Goiás. Mestre em Educação Comunitária pela EST/UFRGS. Graduado em Pedagogia (ICSH/UFG), Matemática (UEG) e Filosofia (FBB). E-mail: maximo@unifimes.edu.br.

∗∗∗ Doutora em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC Goiás. Mestre em Educação Comunitária pela EST/UFRGS. Licenciada em Letras pela (UEG) e Filosofia (ICSH). E-mail: maura@unifimes.edu.br.

∗∗∗ Pós-doutora em Educação e Contemporaneidade (PPGEduC/UNEB). Doutora em Família na Socie-dade Contemporânea (PPGFSC/UCSAL). Mestre em Educação e ContemporaneiSocie-dade (PPGEduC/ UNEB). Especialista em Educação Infantil e em Avaliação pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Graduada em Pedagogia pela Faculdade de Educação da Bahia. E-mail: ivoneteeducado-ra623@gmail.com

AS ERVAS MEDICINAIS

NA UMBANDA NOS CULTOS

DE PRETO VELHO*

DOI 10.18224/frag.v29i4.7741

ARTIGOS

DOSSIÊ

Resumo: este estudo tem por objetivo traçar um paralelo entre religião e saúde, tendo como âncora a religião de Umbanda e as ervas medicinais perpassando pelas giras de Pretos Velhos. Um trabalho de cunho bibliográfico, pautado na metodologia da história oral, fundamen-tado em teóricos como: Bourdieu (2007); Durkheim (2000); Jesus (2012), Dias e Bairrão (2011), Rezende (2017), Negrão (1983-1986); Otto (2005) entre outros. O contexto social marcado pela diversidade direciona múltiplos olhares para as religiões e os fenômenos religio-sos. Cada dia, torna-se mais comum a busca por respostas aos problemas de ordem diversas (financeiros, saúde, trabalho etc.), por isso, é justificável a necessidade de estudos e discussões dessa natureza. À guisa de conclusão é possível dizer que as ervas medicinais fazem parte do cotidiano do umbandista e que levam para além dos muros dos terreiros a força dos Orixás. No entanto, é importante ressaltar que os rituais de práticas terapêuticas desenvolvidos na Umbanda com a maestria dos Orixás, caminha em sintonia com a medicina tradicional. Palavras-chave: Umbanda. Religiosidade. Práticas terapêuticas. Preto Velho. Cura.

(2)

A

Umbanda, considerada uma religião genuinamente brasileira, já nasce carregando o estigma social do preconceito. Está inserida no contexto das religiões afro-brasileiras, considerada, no universo religioso, como uma religião recente. No entanto, ela é um fenômeno religioso que sintetiza muito bem a população do Brasil. Vista por alguns como “coisa de negro” nos dias atuais ainda é alvo de termos pejorativos que denotam um grande desconhecimento por uma boa parcela da população do Brasil, sobre o seu papel social enquanto religião.

Romper o preconceito é um ato necessário; todavia, é importante salientar para aqueles que ainda não sabem, que a base da Umbanda é a caridade, a verdade e o amor. E com essa bandeira, a Umbanda vem ganhando admiradores em todos os estados do Brasil e internacionalmente. Com isso, muitas pessoas em suas buscas, passam pela Umbanda, o que não significa dizer que são umbandistas.

Na contramão desse sistema, a Umbanda busca fortalecimento nas expressões culturais, que marcam a trajetória do povo brasileiro, seus costumes valores e crenças.Nesse sentido, compreender o fenômeno religioso, perpassa pela conscientização da dimensão da diversidade cultural e religiosa que permeia o contexto brasileiro desde o seu construto. “Observando pelo viés da história e da cultura, percebe-se que o pensar religioso se manifesta diferentemente no tempo e no espaço, sendo fortemente influenciado pelos contextos sociais” (PURIFICAÇÃO; CATARINO, 2019, p. 333).

Diante do exposto, a problemática do presente estudo está em compreender como é feita a relação entre religiosidade e saúde na Umbanda, vista por alguns como um verdadeiro mo-saico devido à diferenciação de suas práticas de uma região para outra do país. A hipótese que levantamos a partir da problematização é que a Umbanda tem o DNA do Brasil e que também é marcada pela diversidade social, cultural e regional, daí a diferença em seus ritos. Para além disso, também é importante destacar que a pluralidade está relacionada à abertura indistinta de rituais, o que possibilitaa seus participantes “deixarem um pouco de si e levarem contigo um pouco que a religião, hoje secular tem a oferecer” (JESUS, 2012, p. 14). E para tal finalidade percebemos a religião como [...]

um sistema solidário de crenças e de práticas relativas a coisas sagradas, isto é, separadas, proibidas, crenças e práticas que reúnem numa mesma comunidade moral, chamada igreja, todos aqueles que a elas aderem (DURKHEIM, 2000a, p. 32).

No que tange a relação religião e saúde, pode-se afirmar que as tecnologias e globaliza-ção trouxeram grandes aparatos para a medicina tradicional e para as ciências de modo geral. No entanto, a busca pelas religiões está atrelada àsquestões como melhoria da qualidade de vida, busca da felicidade, sabedoria, autoestima, um clamor angustiado por proteção, paz, aproximação com a féetc. respostas que muitas vezes não se encontram na medicina. Nesse contexto, a Umbanda aparece como uma religião aberta a todos,nela,“os rituais de ‘prática de cura’, mais do que indicar o estado de doença ou saúde de uma pessoa, visam aproximar ‘ o frequentador, a frequentadora’ da religião, da credibilidade na presença, no poder dos Orixás” (JESUS, 2012, p. 11).

(3)

Figura 1: Cachimbo do vovô

Fonte: https://www.raizesespirituais.com Acesso em: 27 set. 2019

O procedimento de cura na Umbanda neste trabalho, foi discutido a partir das práticas dos Preto-Velhos, que utilizam a natureza como fonte primária para suas ações. Iniciamos a reflexão com um ponto, que fala das ervas e da fumaça do cachimbo do Preto Velho, e consequentemente da cura dos problemas internos, sendo que parte da letra diz assim: “Que fumaça cheirosa, vovô, sai do seu cachimbo ... não sei se é arruda, vovô ou manjericão; só sei que essa fumaça, vovô, faz bem ao meu coração” (A.d.).

É na busca dessa situação de bem-estar que muitas pessoas procuram a Umbanda. E como diz uma das colaboradoras da pesquisa,

a terra nos dá tudo que precisamos inclusive as plantas que utilizamos nas rezas, ben-zeções e nos banhos que passamos para os filhos. Cada erva tem um potencial de cura e serve como remédio para alguma coisa. Aprendemos isso com nossos antepassados (DEPOIMENTO ORAL)

O cultivo das plantas para fins medicinais na região sudoeste de Goiás, acaba sendo um misto da herança das culturas africanas e indígenas, o que torna a região rica no manuseio fitoterápico.

Ao final desse estudo, foi possível levantar as seguintes evidências: (i) que no imaginário coletivo, todos nós acreditamos no potencial de cura das ervas, tanto que recorremos a elas quando estamos enfermos; (ii) as pessoas que vão buscar força, paz, alento e saúde nas giras de Preto-Velhos, vão movidas pela fé no Sagrado e a grande maioria utiliza as práticas terapêuticas sem abrir mão dos remédios e da assistência médica, o que ocorre, muitas vezes, por orientação dos próprios médiuns. TIRE O CIPÓ DO CAMINHO, DEIXE VOVÔ ATRAVESSAR: UMBANDA DE PRETO VELHO

Tire o cipó do caminho criança, deixe vovô atravessar. É Preto Velho que vem de Aruanda, vem trabalhar(A.d.).

(4)

Figura 2: Preto Velho.

Fonte: www.universoreligioso.com.br Acesso em: 27 set. 2019

Nos últimos anos muitos são os estudos na área das Ciências Humanas que vêm sendo realizados no intuito de desnudar o processo identitário de entidades que historicamente foram ganhando aspectos diferenciados na memória coletiva e no imaginário religioso do povo bra-sileiro, criando o que Bourdieu (1983) chama de produções simbólicas, definidas a partir das relações objetivas.

Entre as entidades estudadas estão os Pretos-Velhos que, segundo Rezende (2017, p. 176), “(…) são espíritos de escravos africanos (por origem ou ancestralidade), falecidos com idade avan-çada e em diferentes momentos do passado, que retornam e se comunicam/expressam através de médiuns”. Na linha dessas ideias, Dias e Bairrão (2011), complementam que “sua manifestação, constitui a mais notória expressão de modo de apreensão e interação com o sagrado tipicamente africano (bento) que persistiu à diáspora e estabeleceu-se com força em solo brasileiro” (DIAS; BAIRRÃO, 2011, p. 148).

Entre os traços e marcas que identificam os Pretos-Velhos, podemos citar que são “grandes conhecedores de ervas, normalmente fazem uso de arruda, guiné e outras nas instruções de chás e banhos passados aos consulentes de que fazem uso durante as conversas e trabalhos que realizam” (REZENDE, 2017, p. 177).

Nas concepções de Dias e Bairrão (2011, p. 146) “os Pretos-Velhos [são uma] categoria espi-ritual profundamente arraigada no seio da religiosidade na cultura popular considerados elementos importantes e figura-chave na religião de Umbanda”.

“Tire o cipó do caminho; deixa vovô atravessar” é um mantra, geralmente cantado no início das giras, momento marcado por fortes vibrações atribuídas à chegada dos Pretos-Velhos. Simbo-licamente falando “o cipó” representa as dificuldades que às vezes atrapalham os médiuns na hora da concentração.

(5)

Uma vez em terra, por meio dos médiuns incorporados os Pretos-Velhos apresentam os mes-mos trejeitos. “Quando eles descem o neófito se curva, retorcendo-se como um velho esmagado pelo peso dos anos (…). Falam com uma voz rouca, mas suave, cheia de afeição, o que transmite uma sensação de segurança e familiaridade àqueles que vem consultá-los” (ORTIZ, 1991, p. 73, apud REZENDE, 2017, p. 177).

As ervas muitas das vezes já se fazem presentes no início da gira, no momento da defu-mação – quando se queima o incenso, constituído por um aglomerado de folhas que – com seus axés e seus ofós –, purificam o ambiente energizando-o, com as forças dos Orixás/entidades –. O cachimbo do Preto-Velho, também tem a função de defumação. A fumaça direcionada ao/a consulente é uma forma de limpeza e energização.

No terreiro, em que foi feita a observação, uma das partícipes comenta que as entidades então presentes, chamadas de “Vô Lázaro” e “Pai Joaquim de Aruanda”, utilizaram no cachimbo arruda, manjericão e guiné. Essas ervas “atuam como catalizadoras para as mais variadas patologias existentes no campo físico e espiritual, ótimas para limpeza e para cura” (JESUS, 2012, p. 98). “Outros Pretos-velhos da casa utilizam ervas diversas para rezar os filhos, quando as ervas tocam o nosso corpo, ele se inunda de uma paz profunda, que esquecemos dos problemas que nos afetam no dia a dia”, afirma a jovem senhora umbandista. Tal situação é descrita e cantada na canção: “do vovô eu quero a bênção, da vovó a proteção, a fumaça de seu cachimbo, vovô, faz tão bem ao meu coração” (A.d.).

Isto dito, concluímos essa seção apresentando que os Pretos-velhos tal como incorporados nas giras de Umbanda, são representações de um povo, cujas lembranças sacralizam e mitificam memórias, afirmações culturais e identitárias, do povo negro, construtores do Brasil. Hoje, mais do nunca, vozes que ecoam pelo fim do preconceito e pelas garantias de direitos dos grupos mino-ritários da sociedade brasileira.

AS ERVAS NO RITUAL DE PRETO-VELHO NA UMBANDA

Neste item abordamos as ervas na Umbanda, perpassando pelas giras de Preto-Velho. A gira “é a reunião, ou agrupamento de vários espíritos de uma determinada categoria, que se manifestam através da incorporação nos médiuns” (JÚNIOR, 2014, p. 116), e vêm fazer aquilo que é a fun-damentação básica da Umbanda: a caridade. Nessa ocasião, as entidades incorporadas iniciam o atendimento benzendo o/a consulente e em seguida perguntam o que a filha ou filho veio buscar. As pessoas que ali estão, foram movidas por motivações diversas, as quais muitas vezes perpassam pela busca de saúde, ou seja, cura de suas enfermidades.

Segundo REIMER (2008, p. 66) “no processo de cura pelas ervas e divindades, é funda-mental, dentro da dinâmica cultural, a questão da fé, em nível pessoal e coletivo, sendo envolvida também a relação de poder”. Dessa forma, quando tomados em contextos institucionais e coletivos, os Pretos-Velhos, legitimam diante do/a consulente suas referências africanas e escravas, ressaltando sobretudo a herança ancestral da cura e poderes de feitiçaria. No entanto, saindo do contexto coletivo e vistos pelo nível pessoal, essas referências perdem força e tendem a serem sistematizadas a partir de representações que perpassam pelos vieses familiares e parentais, reforçando qualidades como proteção, acolhimento, aconselhamento e companheirismo, o que colabora para o enfrentamento das mazelas do dia a dia (DIAS; BAIRRÃO, 2011).

(6)

Voltando o olhar para o uso das ervas na Umbanda, encontramos no teórico Portugal (1987) informações que folhas, raízes, cascas e frutos, são elementos que constituem o universo mágico dos rituais em diversos grupos. Historicizando, o autor relaciona essas práticas a outras que fo-ram desenvolvidas na antiguidade, contexto em que a medicina oculta exercida por sacerdotes e sacerdotisas, utilizava-se do ritual mágico dos chás, porções e rezas, para práticas de curas, num período muito anterior à constituição da ciência e da pesquisa como as conhecemos na atualidade

Fazendo o entrecruzamento de práticas de uso das ervas pelo homem, constata-se que até os dias atuais elas são realizadas. A maioria das feiras e mercados das cidades brasileiras têm as barracas das ervas e cultua, mesmo que nos bastidores dos contextos sociais, a busca por reza-dores, benzereza-dores, entidades (entre elas, os Pretos-Velhos) que trabalham com o tripé homem, natureza e fé (Sagrado). Nesse contexto, segundo Otto (2005 apud PURIFICAÇÃO, 2014, p. 106) “em suas manifestações se revela nas pessoas e para a pessoa”, numa linguagem que só pode ser compreendida de fato pelo próprio sujeito que a sente, pois, tal linguagem está imbuída de significações e de qualidades particulares”.

Nas giras de Preto-Velho desenvolvidas na Umbanda, percebe-se uma maleabilidade no ma-nuseio das ervas e, com isso, não somente os filhos feitos da casa ou do barracão manuseiam as ervas, mas todos os filhos/asque tenham passado pelo ritual do amaci. Tal flexibilidade, pode ser vista como uma forma de diminuir as diferenças e aproximar conhecimentos, além de uma oportunidade de discussão que pode acalmar dilemas apimentados como, por exemplo, o do uso de ervas frescas ou secas. Alguns umbandistas defendem a ideia do uso das ervas frescas, acreditando que essas trazem a força energética da natureza e contestam o uso das ervas secas afirmando que essas estão mortas.

Em conversa com uma das colaboradoras da comunidade observada, sobre a problemática das ervas frescas e secas, ela nos deu a seguinte informação:

as ervas secas passaram por um estágio físico de transformação; no entanto, sua essência energética está ali concentrada. Fazer uso dessas ervas, implica submetê-las a um processo de despertar ou melhor dizendo acordá-las, e para isso, utilizamos a força das orações e dos próprios Orixás. Na maioria das vezes algumas dessas ervas estão diretamente vinculadas a um deles [Orixás].

Figura 3: Ervas na Umbanda

Disponível em: https://estudaremcasa.com.br/curso/ervas-ritualisticas/. Acesso em: 27 set. 2019.

(7)

As ervas na Umbanda são classificadas em três categorias, a saber:

ERVAS QUENTES ERVAS MORNAS ERVAS FRIAS

Figura 4: Categorias de Ervas na Umbanda

Fonte: Disponível em https://estudaremcasa.com.br/curso/ervas-ritualisticas/. Acesso em: 28 set. 2019

Chamamos de Ervas Quentes aquelas que são consideradas fortes e que têm alta concentra-ção energética, às vezes vistas como agressivas, por isso, sugere-se moderaconcentra-ção em sua utilizaconcentra-ção. Na comunidade umbandista, costuma-se dizer que essas ervas trazem as seguintes ações em sua utilização: “Descarregar, punir, redimir, resfriar, retificar, retrair, esterilizar, tragar, cristalizar (no sentido de paralisar), assumir (responsabilizar)” Exemplo de ervas quentes: fumo, bagaço de cana, casca de jurema preta, guiné, arruda, casca de alho, angico, dandá, beladona, aroeira, pimento, losna e outras.

As Ervas Mornas, são equilibradoras, não são agressivas, têm entre outras finalidades a função de reconstruir o campo energético, astral, magnético e a própria áurea. Essas também são utiliza-das para combater efeitos utiliza-das ervas quentes. Na Umbanda, utilizam-se os seguintes verbos como atuantes nas ervas mornas: pacificar, abrandar, amparar, compreender, clarear, conceder, congregar, homogeneizar, irradiar, perdoar, solucionar, restituir, vitalizar, vivificar, beneficiar. Exemplo de ervas mornas: folha de manga, alecrin, sávia, alfazema, cipó cabloco, calêndula, macaca, samambaia, hortelã, pitanga, manjericão, camomila, erva doce entre outras.

Ervas Frias, são usadas em causas e campos magnéticos específicos. São classificadas em atratoras (Ex: rosas vermelhas, rosa laranja, malva, almora, canela e etc.), energéticas (Ex: girasol, folha de café, guaraná, jurubeba e etc.) e calmantes (capim cidreira, maracujá, abacaxi, melissa, valeriana, pêssego, e etc.). As ações exercidas pelas ervas frias na Umbanda, podem ser represen-tadas pelos verbos: prover, acrescentar, construir, cristalizar (no sentido de fundamentar), começar, determinar, levantar, amadurecer.

Para as pessoas que desejam preparar um trabalho com ervas, Ormande (2019), faz a seguinte sugestão: Ajoelhar-se e com as palmas das mãos voltadas para o alto e rezar a seguinte oração: Senhor meu Deus, meu Pai Criador, Amada Mãe Terra, Amados mestres inspiradores do astral superior; Grande foco divino que a tudo anima, peço que me envolva nas vossas vibrações de luz, de amor e caridade e faça de mim uma extensão do vosso amor e de vossa força curadora, para meu benefício e de meus semelhantes. Assim seja e assim será (ORMANDE, 2019, p. 23). Percebe-se durante os rituais Umbandistas, um grande respeito à natureza, e às entidades. As orações a Deus (Oxalá), aos Santos, aos Orixás e aos Guias, são partes precípuas nesses rituais.

(8)

AS ERVAS QUE CURAM

Ao longo deste trabalho nos pusemos a falar sobre o uso das ervas em rituais de cura da Umbanda. Sabemos, que o uso de ervas no combate a doenças é tão antigo quanto a própria his-tória da humanidade. Na atualidade, é grande o número de pessoas que optaram pelo tratamento fitoterápico. Frente a isso, organizamos uma tabela, com algumas ervas e seus fins medicinais, para que o/a nosso/a leitor/a possa aprofundar um pouco mais seus conhecimentos sobre a relação (erva/ cura), sem a necessidade de buscar no universo religioso.

Quadro 1: Ervas e seus fins medicinais

ERVAS FINS MEDICIONAIS

Agrião Diurético, antiinflamatório, pode ser usado para tratar aftas, gengivites, acne e eczemas, ajuda melhorar a digestão e tratar a tosse Alfazema Suas folhas são usadas em remédios contra conjuntivite e as flores funcionam contra tosse, bronquite, queimaduras e enxaqueca. Alcaçuz É usado contra problemas pulmonares, como tosses, por ser antisséptico e antiinflamatório. Para completar, pesquisas sugerem sua aplicação nos casos de

reações alérgicas, bronquite e artrite.

Alecrin Há indícios de que seus princípios ativos combateriam enxaquecas, para lapsos de memória e baixa de imunidade, diminui dores reumáticas e articulares. alho Pesquisas recentes sugerem um pontencial anticancerígeno, desde que consumido sempre cru. Arnica Também é usada para tratar problemas de pele como acne e furunculose. Ajuda a aliviar dores reumáticas, gota e tendinites. Babosa Tem sido usada no combate à caspa, aos piolhos e às lêndeas. Há testes sobre seus efeitos no tratamento de inflamações e queimaduras. Boldo-do-chile Age como antiinflamatório inibindo a síntese de prostaglandinas, substâncias envolvidas no processo de uma inflamação. Calêndula É usada para tratar fungos, acne e escaras, ajuda a prevenir assaduras em crianças e pode aliviar queimaduras leves, inclusive as de sol.

Canela Contra gases e má digestão.

Carqueja Reduz as taxas de açúcar no sangue e tem propriedades anti-úlcera e antiinflamatórias, o que ajuda no tratamento de artrites. Dente-de-leão A espécie age como diurético e laxante suave, além de abrir o apetite.

Fonte: Adaptado Saúde Abril/2019

O quadro acima apresenta doze (12) ervas e seu poder curativo. Para muitos a relação cura por ervas e sagrado é um fato importante e que se complementa. Para outros, essa relação pode ser vista por óticas diferentes. Para os espiritualizados, as ervas possuem axé (força), que faz com que atuem energeticamente sobre o corpo físico e espiritual dessas pessoas. Seja qual for o seu posi-cionamento, é indiscutível a capacidade mágico-terapêutica das ervas. E se soubermos associar os campos medicinal e simbólico à intervenção espiritual, teremos um ganho muito grande.

(9)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar de muito se falar dos aspectos medicinais das plantas, na prática pouco se conhece sobre eles. As religiões de matrizes africanas, entre elas a Umbanda, objeto deste estudo, são refe-rências no uso e no preparo das ervas para os rituais. Procuramos, a partir da ótica ritualística da Umbanda, apresentar de maneira prática e pautada nas experiências de umbandistas da comunidade quilombola do Cedro em Mineiros – Goiás, a relação religião e saúde.

Quando focamos a religiosidade na religião de Umbanda e a ela, conectamos o fator saúde, nos deparamos com a constante busca pela cura dos males físicos, espirituais e dos problemas do dia a dia, por parte dos consulentes; também constatamos a incontestabilidade dos seus resultados. Muitas são as pessoas que saem dos terreiros de Umbanda agradecidas pela recuperação da saúde e pelas soluções de seus problemas.

No entanto, é importante salientar que o manuseio das ervas não pode ser feito de forma aleatória. As práticas de curas são desenvolvidas por entidades incorporadas nos médiuns, contexto esse, em que aparece um elemento central desse nosso estudo, os Pretos-Velhos. Pode-se dizer que os Pretos-Velhos são personagens marcados pela complexidade do construto social, amados por alguns e contestados por outros. Com suas ações e suas práticas nos terreiros, os Pretos-Velhos vêm colaborando com estudiosos de várias áreas do conhecimento, que veem as religiões como fatos sociais ou – porque não dizer? - processo social amplo, que povoam o imaginário das pessoas e da sociedade (coletivo).

Em suas práticas, os Pretos-Velhos utilizam rituais de cura, por meio das rezas, benzeções, passes, banhos de limpeza espiritual e outros. E, em quase todos esses ritos, fazem uso das ervas. Em perfeita simbiose com a natureza, os Pretos-Velhos, curam e quebram demandas, que tornam a vida dos filhos (consulentes) menos densa de problemas.

A partir da observação feita e das conversas realizadas com pessoas que comungam dos ideais umbandistas em Mineiros, região Sudoeste do Goiás, consta-se que todos que ali estão, estão por amor. Isso fica explícito na fala de um dos filhos quando diz: “não fui eu que escolhi a Umbanda, foi a Umbanda que me escolheu e, a partir dessa escolha, tudo mudou, tudo passou a ter sentido na minha vida” complementa o nosso colaborador. Outra depoente, das mais antigas do grupo diz: “não há mal que a natureza não possa remediar, com a interseção dos guias, caboclos e Orixás, colhemos da natureza o remédio certo para cada enfermidade, para cada pessoa”. Os resultados são positivos, a cada semana o número de consulentes aumenta e alguns, quevieram apenas se consultar, pedem para ficar. Os outros voltam para suas religiões, carregando o carinho e o respeito pelas entidades, pelos Orixás o que é, sem sombra de dúvida, uma grande conquista.

É importante registrar, que a escolha em se observar a Umbanda da Comunidade Quilombola do Cedro, se deu pelos seguintes aspectos: (i) a fidelidade ao culto aos Pretos-Velhos e aos Caboclos; (ii) por ser uma comunidade (inter) nacionalmente conhecida pelo manuseio das ervas e (iii) por ser a comunidade a qual eu (primeiro autor) escolhi como comunidade religiosa, na qual busco sabedoria e conhecimentos para trabalhar com dignidade e respeito aos Pretos-Velhos.

MEDICAL HERBS IN UMBANDA IN OLD BLACK CULTURES

Abstract: this study aims to draw a parallel between religion and health, having as anchor the religion of Umbanda and the medicinal herbs running through the turns of Pretos Velhos. A bibliographical work, based on the methodology of oral history, based on theorists such as: Bourdieu (2007); Durkheim

(10)

(2000); Jesus (2012), Dias and Bairrão (2011), Rezende (2017), Negrão (1983-1986); Otto (2005) among others. The social context marked by diversity directs multiple perspectives on religions and religious phenomena. Every day, the search for answers to various problems (financial, health, work, etc.) becomes more common, so the need for studies and discussions of this nature is justifiable. By way of conclusion it can be said that medicinal herbs are part of the daily life of the Umbanda, and that they extend beyond the walls of the terreiros the strength of the Orishas. However, it is important to emphasize that the rituals of therapeutic practices developed in Umbanda with the mastery of Orixás, goes in line with traditional medicine.

Keywords: Umbanda. Religiosity. Therapeutic practices.Old black. Cure. Notas

1 As características dessa entidade serão explicitadas oportunamente.

2 Depoimento oral de uma das médiuns da casa de Umbanda da Comunidade Quilombola do Cedro em Mineiros – Goiás.

3 São as rezas para Òsányìn com a intenção de despertar o asé contido nas folhas.

4 Amaci – uma espécie de banho destinado à lavagem exclusiva da cabeça dos médiuns. […]. Banhar o orí com o amaci seria então uma forma de fortalecer o vínculo humano-orixá através de um grupo de plantas que partilham específicos devires (CARLESSI, 2017, p. 859).

5 UMBANDA EAD. Disponível em: https://umbandaead.blog.br/2017/12/21/32-ervas-para-banhos-e-de-fumacoes-na-forca-de-oxala/. Acesso em: 28 set. 2019.

6 ORMANDE, Alexandre. Colégio Tenda de Umbanda Caboclo Pena Branca da Mata Virgem – Apostila Ervas Sagradas, 2019. p. 9. Disponível em: http://www.tendadeumbanda2caboclos.com.br/wa_files/746t 5c213v2q4a0p4a6h2t10162c772f.pdf. Acesso em: 28 set. 2019.

7 UMBANDA EAD.

8 ORMANDE, Alexandre, 2019. p. 10. 9 UMBANDA EAD

Referências

BARBOSA JUNIOR, A. Novo dicionário de Umbanda. Universo dos Livros Editora, 2014. p. 116. BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 2007.

BOURDIEU, P. Gostos de classe e estilos de vida (MONTERO, P.; AUZMENDI, A., Trad.). In:ORTIZ, R. (org.). Pierre Bourdieu: sociologia (p. 82-121). São Paulo: Ática, 1983.

DIAS, R. N.; BAIRRÃO, J. F. M. H. Aquém e além do cativeiro dos conceitos:

perspectivas do preto-velho nos estudos afro-brasileiros. Memorandum, v. 20, p. 45-176, 2011. Dis-ponível em: http://www.fafich.ufmg.br/memorandum/a20/diasbairrao01. Acesso em:15 jan. 2020. DURKHEIM, É. As formas elementares da vida religiosa: o sistema totêmico na Austrália.Trad. Paulo Neves. São Paulo: Martins Fontes, 2000a.

JESUS, E. A. de.Religião e Saúde: um estudo sobre a Umbanda em São Bernardo do Campo. 2012,119f. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) - Faculdade de Humanidades e Direito, Programa de Pós Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2012.

NEGRÃO, L. N. Entre a cruz e a encruzilhada: formação do campo umbandista em São Paulo. São Paulo: Edusp. 1996.

(11)

ORMANDE, A. Colégio Tenda de Umbanda Caboclo Pena Branca da Mata Virgem – Apostila Ervas Sagradas, 2019. p. 9. Disponível em: http://www.tendadeumbanda2caboclos.com.br/wa_files/746t5 c213v2q4a0p4a6h2t10162c772f.pdf. Acesso em: 28 set. 2019.

ORTIZ, R. A morte branca do feiticeiro negro: umbanda e sociedade brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1991.

OTTO, R. O Sagrado. Lisboa: Edições 70, 2005.

PORTUGAl, F. Yorubá a língua dos orixás. 4. ed. Rio de Janeiro: Pallas, 1992.

PURIFICAÇÃO, M. M. Violência no espaço escolar e a necessidade da cultura de paz: um estudo a partir da realidade do 9º ano de uma escola estadual em Luziânia. 2014. 200 f. Tese (Doutorado em Ciências Humanas) - Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Goiânia, 2014.

PURIFICAÇÃO, M. M.; CATARINO, E. M. A diversidade religiosa ao som dos atabaques: Umbanda uma religião genuinamente brasileira. Revista de Ciencia das Religioes, da Universidade Lusófona de Humanidades e tecnológias, 2019.

REIMER, I. R. Milagres das mãos: curas e exorcismos de Jesus em seu contexto histórico-cultural. São Leopoldo: Oikos; Goiânia: Ed. da UCG, 2008.

REZENDE, L. L. Força africana, força divina: a memória da escravidão recriada na figura umban-dista dos pretos-velhos.Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de São João del-Rei, Progra-ma de Pós-graduação em História, São João del-Rei, 2017.

Imagem

Figura 1: Cachimbo do vovô
Figura 2: Preto Velho.
Figura 3: Ervas na Umbanda
Figura 4: Categorias de Ervas na Umbanda

Referências

Documentos relacionados

CAPÍTULO XIII DIREITO PROCESSUAL PENAL .... Alegação de Constrangimento

Além desta nova sede, o Sergipe Parque Tecnológico atuará com um anexo, denominado Anexo I, que tem como foco principal a viabilização de negócios integrados

As equações de predição dos pesos de carcaça fria e carcaça quente e do peso corporal vazio a partir do peso vivo foram ajustadas para as quatro raças, das categorias de ganho (I, II

elevador e a testemunha. No segundo, utilizaram-se sementes redondas, achatadas 20 médias e achatadas 22 longas, coletadas após passar pelo classificador, pela mesa de gravidade e

A presente Condição Especial garante, nos termos e limites para o efeito fixados nas Condições Particulares, o pagamento de despesas efetuadas, adiante indicadas, com os atos

Ainda sobre o Eixo 2 – Boas Práticas Ambientais - Questão 5 – Para vocês de que forma suas experiências e/ou vivências anteriores no Curso Superior Tecnológico em Gestão

Propomos uma oficina que visa abordá-los tomando as Sequências de Ensino Investigativas (SEIs) como metodologia. Temos em vista a perspectiva da Alfabetização

Com a redução verificada no mês de outubro, agora a Cesta Básica Nacional apresenta uma alta de 2,36 % em Santa Cruz do Sul no ano de 2004 e, comparando-se com o custo vigente em 31