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Religiosidade e o enfrentamento religioso em idosos sob cuidados paliativos

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Academic year: 2017

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UNIVERSIDADE

CATÓLICA DE

BRASÍLIA

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO

STRICTO SENSU EM GERONTOLOGIA

Mestrado

RELIGIOSIDADE E O ENFRENTAMENTO RELIGIOSO EM

IDOSOS SOB CUIDADOS PALIATIVOS

Autora:

Kely de Azevedo Barbosa

Orientadora:

Marta Helena de Freitas

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KELY DE AZEVEDO BARBOSA

RELIGIOSIDADE E O ENFRENTAMENTO RELIGIOSO EM IDOSOS SOB CUIDADOS PALIATIVOS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação “Stricto Sensu” em Gerontologia da Universidade Católica de Brasília, como requisisto para obtenção do Título de Mestre em Gerontologia.

Orientadora: Prof ª. Dr ª. Marta Helena de Freitas.

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TERMO DE APROVAÇÃO

Dissertação de autoria da aluna Kely de Azevedo Barbosa, intitulada - RELIGIOSIDADE

E O ENFRENTAMENTO RELIGIOSO EM IDOSOS SOB CUIDADOS PALIATIVOS,

requisito parcial para obtenção do grau de Mestre do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Gerontologia, defendida e aprovada em 30 de junho de 2008, pela banca examinadora constituída por:

Professora Doutora Marta Helena de Freitas

Orientadora

Professora Doutora Ligia Auxiliadora de Oliveira Py

Membro Externo

Professora Doutora Alessandra da Rocha Arrais

Membro Interno

Professora Doutora Lucy Gomes Vianna

Membro Interno

Brasília 2008

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais, França e Zélia, grandes exemplos. Obrigada pelos preciosos ensinamentos, severos e acalentadores, que fundamentaram grande parte da construção que vejo em mim. Devo-lhes muito. Dedico-lhes todo o meu amor.

Às minhas irmãs, Mariza e Luciana, pelas belas discussões, pelo incentivo, por me ajudarem em tudo, nos momentos que mais precisei, por compreenderem o momento tão difícil por que passei, dando-me constantemente lições de ânimo. Sou grata por tê-las ao meu lado. Dedico-lhes também todo o meu amor.

A Ildeu, Maria Lícia, Lili e Cris, minha segunda família, pela sua lição diária de generosidade e doação. Acolheram-me como a uma filha, e Acolheram-me proporcionam moAcolheram-mentos de muita alegria. São muito especiais pra mim. Obrigada.

Aos meus filhos, Yasmin e Arthur, pela tolerância que tiveram e pelas demonstrações de carinho que me nutriram durante os momentos mais difíceis. Compreenderam e aceitaram minha ausência, apoiando-me todo o tempo. A eles dedico toda a minha vida. Amo demais!

Ao Elson José, por realizar seu processo de crescimento juntamente com o meu, todo o meu carinho!

Obrigada pelas experiências.

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AGRADECIMENTOS

Este foi um momento ímpar em minha vida. Processo de auto-descoberta com valor psicoterapêutico. Percebi em todo o percurso resistências, defesas, tabus e preconceitos que tiveram que ser lapidados para culminar neste trabalho. Às pessoas que me ajudaram, tenho muito a agradecer pois, direta ou indiretamente, contribuíram para a concretização desse sonho:

Aos mestres que a todo tempo me inspiraram a escrever este trabalho, muito obrigada!

À minha orientadora, Prof ª. Dr ª. Marta Helena de Freitas, grande profissional, agradeço-lhe pela dedicação e tolerância dispensadas a mim em todo tempo. Por ter me guiado pelos caminhos desconhecidos do tema da morte e da religiosidade com tanta serenidade e paciência, tornou-se muito especial, e terá sempre minha admiração.

O meu agradecimento à Prof ª. Dr ª. Ligia Auxiliadora de Oliveira Py, à Prof ª. Dr ª. Alessandra da Rocha Arrais, à Prof ª. Dr ª. Lucy Gomes Vianna, que gentilmente aceitaram participar da comissão examinadora. Obrigada pelas contribuições.

À Monique, psicóloga pelo seu precioso auxílio. Sem a sua intronização no universo dos colaboradores, este trabalho não seria possível. Parabéns pelo amor aos pacientes.

À Márcia Regina, a minha gratidão pelas várias vigílias noturnas, e pela vivência do nascimento conjunto. Obrigada pela determinação, essencial na concretização desse trabalho.

Ao meu amigo Dr. Dênis Marinho Brandão, por ter sido o primeiro a me dar força no mestrado.

À querida Corintha Maciel, minha psicoterapeuta, pela sua escuta incansável e partilha de complexos na busca pela individuação. Nossa relação é eterna, obrigada.

Aos meus clientes do consultório, que conscientes ou inconscientes, vivenciaram comigo o ciclo do nascimento e morte. Obrigada pelas trocas e pela companhia.

À Kelma, minha secretária, pelos conhecimentos de informática e pelo socorro prestado nos momentos de maior tumulto. Sua organização foi indispensável. Você é ótima! À querida Eliene, que, sensivelmente, preocupou-se em me ajudar em diversos momentos.

Aos colegas do mestrado, obrigada pela partilha de vivências. Realmente foi um período de trocas, enriquecedor em minha vida.

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“Não, não, a Morte não é algo que nos espera no fim. É companheira silenciosa que fala com voz branda, sem querer nos aterrorizar, dizendo sempre a verdade e nos convidando à sabedoria de viver”.

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LISTA DE QUADROS

Quadro 01: Identificação dos idosos...47

Quadro 02A: A experiência da hospitalização: comparação entre a hospitalização anterior e a atual...66

Quadro 02B: A experiência de hospitalização: sentimentos vivenciados...70

Quadro 03: Modalidades de medo da morte...75

Quadro 04: Modalidades de crença religiosa...81

Quadro 05: Relação com Deus...84

Quadro 06: Modalidades de enfrentamento religioso...89

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LISTA DE SIGLAS

ER: Enfrentamento religioso. LC: Lócus de controle.

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO...13

CAPÍTULO I – A RELIGIOSIDADE NA VIDA DO IDOSO 1.0 Religião, religiosidade e espiritualidade: esclarecimentos conceituais...15

1.1 Psicologia e religião – histórico e contextualização...16

1.2 Senso religioso e saúde na vida do idoso ...18

CAPÍTULO II – O ENFRENTAMENTO RELIGIOSO EM IDOSOS SOB CUIDADOS PALIATIVOS 2.0 A noção de Coping - enfrentamento ...21

2.1. Religious coping - Enfrentamento religioso ...23

2.2. O câncer e seu impacto no idoso sob cuidados paliativos...26

2.3 O processo de morrer e a finitude...28

2.4 Enfrentamento religioso em idosos sob cuidados paliativos...32

CAPÍTULO III – O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO Questões norteadoras e objetivos do estudo...36

3.1 Objetivo Geral...37

3.1.1 Objetivos Específicos...37

3.2 Fundamentos filosóficos da postura fenomenológica...37

3.3 Colaboradores...40

3.4 Local da pesquisa...41

3.5 Instrumentos e procedimentos de investigação em campo...41

3.5.1Entrevistas-piloto ....41

3.5.2Entrevistas semi-estruturadas...42

3.6 Processo de sistematização e de análise...43

3.7 Dificuldades encontradas...44

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4.0 Identificação dos idosos - contextualização da vida...46

4.1 Contextualização da vida, síntese dos depoimentos e impressões pessoais da pesquisadora...48

4.1.1Sr. Felipe...48

4.1.2Sr. Joaquim...51

4.1.3Sr. Paulo...53

4.1.4D. Mariana...56

4.1.5D. Ana...58

4.1.6 D. Renata...61

4.2 Eixos temáticos e núcleos de sentido...63

4.2.1 A percepção dos idosos na hospitalização...65

4.2.2 Ambiente físico hospitalar e a percepção do paciente sob cuidados paliativos...65

4.2.3 A experiência de hospitalização e os sentimentos vivenciados...72

4.2.4 O medo da morte em pacientes sob cuidados paliativos...74

4.2.5 A crença religiosa em pacientes internados com doença grave e incurável ...79

4.2.6 Relação do paciente idoso com o transcendente.........83

4.2.7 Enfrentamento religioso em idosos hospitalizados...88

4.2.8 Estágios de finitude vivenciados pelo paciente sob cuidados paliativos...93

CAPÍTULO V – O ENFRENTAMENTO RELIGIOSO EM SITUAÇÕES LIMITE 5.0 Enfrentamento religioso como recurso em situações limite...98

5.1 Ambiente físico hospitalar e a percepção do paciente sob cuidados paliativos...99

5.2 A experiência de hospitalização e os sentimentos vivenciados...101

5.3 O medo da morte em pacientes sob cuidados paliativos...104

5.4 A crença religiosa em pacientes portadores de câncer hospitalizados na ala dos cuidados paliativos ... ...107

5.5 Enfrentamento religioso em idosos hospitalizados...108

5.6 Estágios de finitude vivenciados pelo paciente sob cuidados paliativos...113

CONSIDERAÇÕES FINAIS...116

REFERÊNCIAS ...119

APÊNDICE A...128

APÊNDICE B...129

APÊNDICE C...130

(11)

RESUMO

O presente estudo investiga o senso religioso em idosos portadores de câncer, hospitalizados numa ala de cuidados paliativos. Na investigação, adotou-se o conceito de enfrentamento religioso – ER, proposto por Pargament que refere-se ao modo pelo qual as pessoas recorrem às suas crenças religiosas para lidar ou justificar os eventos aversivos. O construto considerado refere-se ao lócus de controle e à modalidade relacionada à atribuição de causalidade. Buscou-se identificar Buscou-seus respectivos estilos de ER: cooperativo, delegante e autodirigido, referindo-Buscou-se à relação do indivíduo com Deus (responsabilidade e nível de atividade no processo de solução de problemas). A pesquisa descreve a presença e o papel das crenças religiosas na vida dos idosos que vivenciam a expectativa da finitude, ressaltando sua utilização como um recurso de enfrentamento. Buscaram-se a identificação das fases no processo do morrer descritas por Kübler-Ross e um diálogo com os três estilos de ER proposto por Pargament. Foram entrevistados seis idosos entre 60 e 72 anos, hospitalizados na ala de cuidados paliativos de um hospital da rede pública de saúde do DF, nos quais, apreenderam-se a percepção que tinham da experiência de hospitalização, os temores relativos à morte, as crenças religiosas, sua relação com Deus, as modalidades e estilos de ER por eles empregadas. A execução, análise e discussão das falas dos idosos nas entrevistas, inspiraram-se na postura fenomenológica de Husserl. Os depoimentos foram organizados em eixos temáticos, destacando-se os respectivos sentidos apreendidos das experiências relatadas. Verificou-se que todos os colaboradores professavam alguma crença religiosa e referiam-se a ela como um meio de ajudá-los a lidar com esse momento de vida. Reconheciam a hospitalização atual como satisfatória, manifestando a vivência dos seus sentimentos. O ER positivo foi encontrado na maior parte dos depoimentos, assim como o uso de estratégias focalizadas no problema e na emoção. Todos os idosos recorreram ao estilo delegante, sendo que o estilo colaborativo também foi percebido na verbalização dos idosos, porém em menor escala, não havendo o emprego do estilo auto-dirigido. Em relação aos estágios do morrer, propostos por Kübler-Ross, a maioria dos idosos demonstraram comportamentos de depressão, e a barganha foi a etapa que mais pareceu relacionar-se com o estilo delegante de ER. Os resultados encontrados neste estudo demonstraram importantes contribuições para as áreas da Psicologia da Saúde e da Religião.

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ABSTRACT

The present study investigates the religious sense on elder cancer patients hospitalized in a palliative care ward. The investigation adopted the concept of religious coping – RC, proposed by Pargament, which refers to the way people resort to their religious beliefs in order to deal with or justify adverse events. The construct considered refers to the locus of control and to the modality related to attribution of causality aiming to identify its respective RC styles: collaborative, self-directive, and deferring, concerning the individual’s relationship to God (responsibility and level of activity in the problem-solving process). The research describes the presence and role of religious beliefs in the life of elderly people who experienced the expectation of finiteness, underscoring its use as a coping resource. The study sought to identify the dying process stages described by Kübler-Ross and a dialogue with the three RC styles proposed by Pargament. Six elders in the 60-72 age bracket were interviewed. They were hospitalized in the palliative care ward of a District Federal’s public healthcare network hospital. The study apprehended the perception they had of the hospitalization experience, their fears concerning death, their religious beliefs, their relationship with God, the RC modalities and styles employed by them. For conducting the interviews and analyzing and discussing the elders’ speeches, was of inspiration Husserl’s phenomenological posture. Statements were organized in thematic axes, underscoring their respective meanings apprehended from the reported experiences. The study verified that all collaborators professed some religious belief, and referred to it as a way to deal with this moment in life. They recognized their current hospitalization as satisfactory, manifesting the experience of their sentiments. Positive RC was found on most statements, as well as the use of strategies focused on the problem and on emotion. All elders resorted to the deferring style, and the collaborative style was also noticed in the elders’ verbal account, though to a lesser extent. The self-directive style was not employed. Regarding the dying stages proposed by Kübler-Ross, most elders reported depressive behaviors, and bargaining was the stage that seemed more related to the deferring RC style. Results found in this study showed important contributions for the Health Psychology and Psychology of Religion fields.

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APRESENTAÇÃO

A religiosidade pode ser vista como fonte de conhecimento que tende a reunir sentido existencial, valorização da vida humana, explicações e suporte na compreensão e superação das próprias dificuldades. A conceituação e distinção dos termos, assim como a compreensão do funcionamento e seu papel, sem incorrer em utilitarismo ou pregação teológica, são algumas das dificuldades enfrentadas na sua investigação. Devido à carência de literatura científica e a necessidade de adaptação de diretrizes metodológicas capazes de lidar com a complexidade e implicações éticas, torna-se imprescindível a construção de conhecimento em torno do tema.

No idoso, as crenças religiosas atuam de forma diferenciada, marcando falas e situações, ligadas a ensinamentos recebidos nos processos internos desde a infância, importantes na sua constituição. Por isso, autores têm atribuído diferentes papéis para a religiosidade na vida. A recorrência ao transcendente pode ser alvo de diversas interpretações, principalmente no contexto de saúde. Idosos sob cuidados paliativos, ao vivenciarem a expectativa da finitude, sofrem mobilizações emocionais e urgências pessoais tão severas que, torna-sea fundamental levar em consideração o modo como encaram suas crenças, ou seja, se a religiosidade exerce função de suporte ou não. Considerando-se o momento delicado, vivido pelos idosos na fase final do câncer, procura-se, neste trabalho, estabelecer uma articulação entre a vivência subjetiva das crenças religiosas e o sofrimento vivido pela expectativa da finitude. O papel da pesquisadora, como psicóloga, é atuar como facilitadora no processo de verbalização, dispondo-se a uma escuta neutra e qualificada, de modo a criar condições necessárias para que os idosos possam sentir-se livres e seguros para se comunicar.

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necessidade de investigar o fenômeno, pelo valor que a religiosidade mostrava ter na vida do idoso. Mais recentemente, Pargament (1997), em busca de situar as experiências específicas do fenômeno religioso, encontrou um modo de refinar e conceituar a questão da religiosidade sem incorrer na teologia. Por conseguinte, suas contribuições foram plenamente aceitas no meio científico. No presente trabalho, optou-se por adotar as contribuições de Pargament (1997) como um condutor na investigação do tema.

Adotou-se, neste estudo, um método apropriado para apreender os sentidos derivados da escuta à voz dos idosos ao se referirem à sua própria vivência do processo da finitude e, no âmbito dessa vivência, o papel da religiosidade. Dessa forma, encontrou-se, na postura fenomenológica, um método que tornou possível a valorização das vivências, com o rigor exigido para a descrição do fenômeno religioso. Essa postura permitiu compreender o mundo vivido dos idosos pela sua ótica específica e particular além de responder às dificuldades técnicas de investigação (GOMES, 1997).

O estudo desenvolveu-se numa estrutura organizada em cinco capítulos. O capítulo I situa quanto à distinção dos termos: religião, religiosidade e espiritualidade, a historicidade da investigação do tema pela Psicologia e a influência do senso religioso na vida do idoso.

O estudo aprofundado acerca do fenômeno religioso e suas relações com as vivências subjetivas é apresentado no capítulo II, que trata da noção de enfrentamento e sua contribuição para a formulação do conceito de Enfrentamento religioso - ER (PARGAMENT, 1997). Abordaram-se também a situação limite em que se encontra o idoso portador de câncer sob cuidados paliativos, o processo de morrer e a finitude. Ainda nesse capítulo, associou-se o enfrentamento religioso aos idosos sob cuidados paliativos, apresentando o que a literatura versa sobre o mecanismo.

O capítulo III é dedicado à descrição e à explicação da investigação em campo. Nele procurou-se situar melhor o leitor em relação à natureza específica do problema a ser investigado, aos objetivos e hipóteses. Descreve-se as diversas etapas dos procedimentos metodológicos e os respectivos procedimentos de análise.

No capítulo IV enfatizam-se as verbalizações dos colaboradores, sistematizando-os em eixos temáticos e núcleos de sentido. As falas foram ilustradas em quadros temáticos, de acordo com o objetivo da pesquisa.

No capítulo V, discute-se o material encontrado da verbalização dos idosos, com o aporte teórico oferecido pela literatura científica. Por fim, as considerações finais apresentam s conclusões encontradas na pesquisa assim como as sugestões para futuras investigações.

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CAPÍTULO I

A RELIGIOSIDADE NA VIDA DO IDOSO

1. Religião, religiosidade e espiritualidade: esclarecimentos conceituais

Religiosidade e espiritualidade são termos distintos, mas muito confundidos entre si. São termos complexos, freqüentemente definidos de inúmeras maneiras, em conformidade com a cultura, mentalidades e perspectivas (teológica, antropológica ou psicológica) em que se exprimem. Segundo definição do dicionário Logos (CABRAL, 1993 p.692), religiosidade “é a virtude que leva o homem a prestar a Deus a honra, a homenagem e a reverência...”. Tem relação com a atitude do indivíduo perante o sagrado e a busca por apoio e justificativa. Diz respeito a práticas relativas a uma Igreja ou instituição religiosa organizada, com modelos e crenças associadas a uma religião específica. Envolve manifestações de práticas religiosas, vistas por orações, meditações, idas a templos e doação ao próximo, em busca de contato com o transcendente.

Enquanto a religiosidade refere-se a modelos e crenças associados à religião, a espiritualidade vem do latim, espiritus, que significa “sopro” referindo-se ao sopro da vida. Para defini-la, Elkins (1999) refere-se à capacidade de se maravilhar, de ter reverência e gratidão pela vida ou por algum poder considerado superior. A expressão da espiritualidade independe de uma religião institucionalizada, pois sua ligação é direcionada à força superior que o indivíduo pretende homenagear. Para Frankl (1999), a espiritualidade serve como base emocional ou motivacional para a busca por significados e propósitos para a vida.

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limites da linguagem e indefinição dos termos empregados. Os temas religião, religiosidade e espiritualidade tendem a causar problemáticas conceituais por se focalizarem suas relações na experiência humana e no transcendente. Percebe-se que em diversos momentos nos estudos, os termos se fundem, generalizando sua distinção. Visando ao estudo do tema, Pargament, (1990) busca o refinamento dos termos, sua conceituação e utilização, tornando-os consistentes, científicos, e com o rigor necessário exigido nas várias áreas acadêmicas. No presente trabalho, optou-se por investigar os aspectos relativos à religiosidade do indivíduo, abordando sua crença, e apoio no trato com doenças e eventos ocorridos em trajetória hospitalar.

Psicologia e religião – histórico e contextualização

Numa sociedade secularizada e sob a égide positivista, a legitimidade do senso religioso envolve algumas perspectivas ditas científicas que, para algumas áreas acadêmicas, assim como para algumas correntes psicológicas, são discutíveis. Insistem em negar o senso religioso como sendo um sentimento pessoal e íntimo inerente ao homem. Segundo Paiva (1989/90 p.32), “é uma das dimensões mais co-extensivas ao homem”, e por isso, matéria específica da Psicologia. Tema muito presente nos estudos pioneiros em Psicologia, passou a ser marginalizado ou silenciado durante décadas consecutivas (FREITAS, 2004).

Durante o século XX, os temas religiosidade e espiritualidade foram negligenciados por estudiosos de Psicologia, que encaravam as dificuldades de conceituação dos termos e limites no controle de variáveis, algumas das razões pelas quais os estudos fossem silenciados. Ao correlacionar os estudos entre Psicologia e religião, W. Wundt (1832-1920) propõe, pelo método comparativo, determinar a natureza e o funcionamento desses processos associados (BENKÖ, 1981). William James (1842-1910) com a obra Varieties of Religious Experiences, torna-se o principal estudioso da psicologia religiosa, pois diferencia dois tipos de experiência religiosa, a saudável e a doentia, ressaltando o caráter emotivo da religião (FREITAS, 2004).

De 1900 a 1916, George Albert Coe alcança importantes estudos, com mérito pelo seu método de pesquisa empírico, que consiste em listas de perguntas semelhantes às atualmente utilizadas nos métodos projetivos. James Bisset Pratt (1875-1944), um dos pioneiros da pesquisa em religião, depois de William James, estudando o fenômeno religioso dentro e fora do seu ambiente cultural (idiomas, roupas, hábitos), defronta-se com a firmeza da crença em algum tipo de ser sobre-humano, a quem se deve adorar e cultuar (FREITAS, 2004).

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Entretanto, alguns fatores acarretaram o seu declínio: a dificuldade de delimitação das áreas da Psicologia e Teologia, a dificuldade em conceituar a Psicologia como ciência, o advento do positivismo e Iluminismo, a subjetividade do fenômeno religioso e, finalmente, a influência de algumas áreas da psicologia, como, por exemplo, a psicanálise (VALLE, 1998).

Com papel decisivo para a psicologia científica, a psicanálise, por meio de Freud, influencia no declínio dos estudos da religião e seus aspectos. Acredita no aspecto ilusório da religião, tornando-se um forte crítico da mesma. Uma das tarefas da psicanálise, a partir daí, seria defender a liberação humana (BENKÖ, 1981). Freitas (2004) cita várias conseqüências decorrentes desse posicionamento psicanalítico: o desinteresse de muitos estudiosos pelo tema, produções mais refinadas ocasionadas por pesquisas avançadas, além da utilização do mesmo ramo de pesquisa para produções posteriores, por meio de dissidentes de Freud (Jung, C., Adler, A., Fromm, E.).

Segundo Freitas (2004), as contribuições e as discordâncias entre Freud e seus seguidores deixaram características particulares em cada produção: Fromm adverte sobre o perigo da “inautenticidade do discurso religioso”, pois a possessão e o materialismo cultural podem conduzir ao fanatismo; Adler identifica a religião como positiva e valiosa para a vida em todos os estágios; e Jung entende que religião é uma atitude da mente, particular e alterada, por uma experiência emocional quando submetida ao contato com o numinoso.

Em resposta a essa crise, um outro movimento se inicia em meados de 1960, com vários estudos pautados em referenciais teóricos, em busca da criação do paradigma da mensuração (construção e aplicação de escalas de medida para vários aspectos uni ou multidimensionais em grupos específicos). Dessa forma, alcançaram-se a confirmação e a confiabilidade científica exigidas no meio acadêmico.

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1.2 Senso religioso e saúde na vida do idoso

À medida que o ciclo vital humano se alonga, define-se o início da velhice. Segundo caracterização da Organização Mundial da Saúde, idosos são “pessoas com mais de 60 anos nos países em desenvolvimento, e mais de 65, nos países desenvolvidos”. Em 1940, os idosos correspondiam a 4% do total da população brasileira, sendo que, em 2000, essa proporção chegava a 9% do total de habitantes (CAMARANO, 2002). Estima-se que, em 2025, o Brasil tenha a sexta maior população de idosos do mundo, ou seja, cerca de 32 milhões de pessoas acima de 60 anos (RAMOS, 2002). Diante dessa expressiva mudança demográfica, os pesquisadores buscam melhor lidar com o complexo fenômeno da velhice e do processo de envelhecimento, aliados às realidades e às potencialidades dessa fase (FALEIROS; LOUREIRO, 2006). Eventos como viuvez, espiritualidade, autonomia, sexualidade, aposentadoria, saúde mental, auto-estima e socialização despertam cada vez mais o interesse dos pesquisadores, assim como também os possíveis fenômenos que os expliquem.

Ao longo do processo de envelhecimento, o senso religioso tem-se mostrado fonte de referência, integrando razão e sensibilidade ao humano. Com valor substancial na vida do idoso brasileiro, tende a abstrair o conceito de Sagrado, podendo chegar a atingir uma importante força pessoal, que estimule o indivíduo a apreciar o que não consegue controlar. Para ARGYLE (1990), no cotidiano do idoso é comum perceber a relação entre o bem-estar subjetivo e as práticas religiosas (promessas, preces, peregrinações ou outras ações rituais). À luz da Psicologia, a religião tem o papel de oferecer respostas às exigências da velhice, de facilitar a aceitação das perdas ligadas ao processo de envelhecimento e de oferecer ferramentas psicológicas no intuito de equilibrar o indivíduo (GOLDSTEIN; SOMMERHALDER, 2002). A natureza da experiência religiosa consiste em alertar o idoso para o alívio de possíveis impactos negativos, causados pelas vivências da própria idade, fornecendo compreensão da própria realidade, de si mesmo e do ciclo de vida como único e inevitável.

(19)

A respeito da função da religiosidade como mediador na vida do idoso, Pargament (1996) apud Paiva, (1998) aponta sua importante ligação com a orientação pessoal. Especificamente na cultura ocidental, a eficácia da religiosidade baseia-se no controle, no individualismo e na realização, “ajuda as pessoas a adquirirem controle de suas vidas, ao passo que a religião ajuda as pessoas a lidarem com os limites do seu controle” (PARGAMENT 1996, p. 232, apud PAIVA, 1998). Quando confrontada com o insuperável, percebe-se que essa cultura tem menos a oferecer, pois limita-se à ligação com antepassados, mistério, sofrimento, esperança, finitude, denotando entrega, propósito divino e redenção (PAIVA, 1998), de modo a fazer alusão a elementos relacionais da religiosidade, como paradigma da entrega e do controle.

Em relação à associação religiosidade e saúde, vários pesquisadores (BEARON; KOENIG, 1990; PARGAMENT, 1997; KOENIG; PARGAMENT; NILSEN, 1998; PAIVA, 1998; CLARK, 1999; PARGAMENT, 2001; SIEGEL, 2002; POWELL, 2003; BURKER, 2004) encontraram benefícios e validação nas investigações. Segundo esses estudos, ao analisar os resultados da manifestação da religiosidade, percebeu-se a contenção de comportamentos aversivos ou auto-destrutivos, além do conforto para abalos emocionais vivenciados. Levin e Schiller (1987), investigando essas teorias, constataram que a religiosidade provém de uma real busca pela:

1. promoção de comportamentos e estilos de vida associados à saúde. Ao proibir ou desenconrajar o uso do álcool e fumo, a religião colabora para a diminuição do risco de doenças e o aumento do bem-estar desses indivíduos;

2. provimento de suporte social. Ao estimular a socialização por meio das comunidades religiosas, proporciona-se maior profundidade nos relacionamentos interpessoais, nos quais a própria religião fomenta sentimentos de irmandade, amor fraterno e auxílio mútuo. O pertencimento a um grupo pode diminuir o sentimento de vazio e solidão;

3. satisfação na busca pelo sentido da vida – ao promover uma função no mundo, pode modificar a percepção de situações estressantes ou eventos traumáticos, encorajando os indivíduos a terem esperança de que, no fim, tudo estará bem.

(20)

(satisfação com a vida, felicidade, afeto positivo e moral mais elevado) e, segundo Almeida (2005), a menores taxas de depressão, pensamentos e comportamentos suicidas, uso/abuso de álcool e drogas.

Autores como Antoniazzi; Dell’Aglio; Bandeira (1998) e Paiva (1998) ressaltam a importância de se trabalhar a religiosidade como atributo de superação das dificuldades. Faria (2004), investigando o enfrentamento e o bem-estar subjetivo em pessoas portadoras de HIV+ (Human Immunodeficiency Vírus), analisou e adaptou para a língua portuguesa a Escala Breve de Enfrentamento Religioso. Recentemente, Freitas (2006a) coordenou uma pesquisa sobre religiosidade e atitude diante da morte em idosos brasileiros, no âmbito do qual foi adaptada e validada uma Escala de mensuração do enfrentamento religioso em idosos (TAVARES, 2006).

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CAPÍTULO II

O ENFRENTAMENTO RELIGIOSO EM IDOSOS SOB CUIDADOS PALIATIVOS

2.0 A noção de Coping - Enfrentamento

Lazarus e Folkman (1984, p. 282) definem stress como uma síndrome de adaptação comum. “É a reação de defesa do organismo frente a diversos estímulos nocivos". Caracteriza-se por alarme, resistência e exaustão, Caracteriza-sendo que a profundidade da reação depende das características da demanda, do processo de mobilização interna e da qualidade da resposta emocional. Seu emprego no funcionamento humano se modifica, dependendo da avaliação cognitiva, e da maneira com que as pessoas manejam esse stress. Partindo desse conceito, Lazarus e Folkman (1984) manejam o stress empregando o modelo de enfrentamento denominado Coping.

O conceito de Coping é traduzido da língua inglesa “to cope with”, e tem o sentido de “lidar com sucesso de algo”. No Brasil, segundo Freitas (2003), a tradução literal seria “lidamento”. Entretanto, essa expressão inexiste no Português do Brasil, sendo então adotada a tradução mais próxima fornecida pela Psicologia da Saúde, enfrentamento. Existe também uma problemática com relação à adoção desse termo, pois pode dar uma idéia de luta travada ou defesa, dentre outros sentidos (FREITAS, 2003). Lazarus e Folkman (1984, p.282) definem enfrentamento como “processo de administração das demandas (internas e externas) que são avaliadas como sobrecargas ou excedentes aos recursos pessoais”.

Segundo Lazarus e Folkman (1984): (a) o enfrentamento é um processo ou uma interação que se dá entre o indivíduo e o ambiente; (b) sua função é administrar a situação estressora, ao invés de controlá-la ou dominá-la; (c) os processos de enfrentamento pressupõem a noção de avaliação, ou seja, como o fenômeno é percebido, interpretado e cognitivamente representado na mente do indivíduo; (d) e constitui-se uma mobilização de recursos pelos quais os indivíduos irão empreender esforços cognitivos e comportamentais para administrar (reduzir, minimizar ou tolerar) as demandas internas ou externas que surgem da sua interação com o ambiente.

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Folkman (1984) observam que primeiramente o indivíduo avalia se a situação é ameaçadora ou seja, se pode causar dano, ameaça ou prejuízo, denominando-se nesse caso, avaliação primária. Na avaliação secundária, o indivíduo analisa sua capacidade e os recursos disponíveis para condução da situação na tentativa de se libertar. As estratégias de enfrentamento das situações aversivas podem aparecer em diferentes situações e até simultaneamente.

Mediadoras de avaliações cognitivas, as respostas sofrem distinções quanto às estratégias. Quando focalizada no problema, a estratégia refere-se a esforços direcionados às respostas construtivas, modificadoras de situações causadoras de stress. Administra um balanço interno, promove soluções alternativas e, por fim, uma ação sobre o problema. É um processo de análise objetiva, com uma estratégia de ação prática, e pode ser direcionada interna ou externamente, dependendo da avaliação cognitiva. A estratégia focalizada na emoção é definida como um esforço dirigido à regulação da resposta emocional em situações aversivas. Sua função é reduzir a sensação desagradável do estado de stress, modificando o estado emocional. Às tarefas que descrevem a função do enfrentamento, ou seja, respostas ou estratégias diante do evento aversivo cabem reduzir prejuízos no meio social e aumentar a probabilidade de recuperação; tolerar e ajustar os eventos negativos; manter uma auto-imagem positiva; manter o equilíbrio emocional e continuar satisfazendo-se nos relacionamentos interpessoais (LAZARUS; FOLKMAN, 1984). É importante ressaltar que a forma como o enfrentamento se processa é relativo à cultura do indivíduo, e podem mudar ao longo do tempo, de acordo com a percepção e as exigências do contexto em que ocorrem.

Para Pargament (1997), enfrentamento é um processo queenvolve situações e contextos multidimensionais e multilaterais. As interpretações dessas situações são subjetivas e permitem possibilidades e escolhas diversas, orientadas conforme o próprio sistema interno. Daí o crescente interesse nas demandas ocasionadas pelo stress e a mensuração do enfrentamento. O autor enfatiza que, em momentos de experiência crítica, o modo como o indivíduo analisa a adversidade pela qual está passando caracteriza uma demanda de esforço. Essa revisão juntamente com métodos específicos constituem o foco do enfrentamento: orientar e promover significados e recursos de forma que possa lidar com eventos estressantes.

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pesquisa, procura-se associar a manifestação do fenômeno religioso (PARGAMENT, 1997) ao conceito de lócus de controle e atribuição de causalidade (TAMAYO, 1989), investigando-os como fonte de estratégias a serem utilizadas pelos idosos.

2.1. Religious coping - Enfrentamento religioso

Uma das funções da espiritualidade/religiosidade leva as pessoas a enfrentar com profundidade as perdas e desafios inerentes ao processo de envelhecimento, focando seu potencial criativo ou educativo em áreas problemáticas, independente de quais sejam (BIANCHI, 1991). No ser humano em geral, ao se deparar com momentos de urgências pessoais ou situacionais, é comum o emprego da religiosidade como recurso. Pargament (1997) explica que a dimensão religiosa é acessível e disponível no momento em que os limites pessoais são ultrapassados, por isso sua dimensão de busca por significados diante da dor e do sofrimento é vista como um recurso situacional.

A forma de manifestação da religiosidade depende do modo como o indivíduo encara o problema e solicita seu auxílio. Pargament (1990, apud Paiva, 2003), em seu estudo sobre o fenômeno religioso, advoga que parte do poder singular da religiosidade pode residir na capacidade de responder a tão numerosas necessidades de maneiras tão diversas. Para ele, em várias situações, o fenômeno religioso pode propiciar a compreensão do ser humano, ao passo que seus recursos, o manejo de situações.

Baseado na estrutura conceitual de Lazarus e Folkman (1984), Pargament (1997) emprega o conceito de enfrentamento religioso - (ER) para referir-se ao processo pelo qual as pessoas, por meio da sua espiritualidade, crença ou comportamentos religiosos tentam entender e/ou lidar com importantes exigências pessoais ou situacionais em suas vidas. A noção de ER tem como pressupostos: 1) a existência de uma experiência estressante; b) a avaliação que a pessoa faz da situação: ameaça, dano ou desafio; c) os recursos disponíveis para lidar com ela; d) a responsabilidade ao lidar com determinada experiência. Em seu pressuposto, o autor entende que, diante de um evento excedente, a religiosidade auxilia na avaliação e na regulação da resposta.

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religião como provedora de uma estrutura de referência, ela os ajuda a entender, prever e controlar as situações, mantendo a auto-estima. Em terceiro, o estudo da religiosidade e do enfrentamento possui implicações práticas, pois ambos se fazem presentes em momentos difíceis, e possuem elementos significativos em muitas fases da resolução de problemas. A religião pode afetar a maneira como alguém percebe o sentido de suas dificuldades.

Pargament e Park (1995) se opõem à teoria de Freud, que preconiza: a religião é puramente uma defesa, fuga ou esquiva, protegendo o indivíduo da confrontação com a realidade. Os autores acreditam que, mais do que reduzir tensões e distorcer a realidade, a religião fornece alívio, conforto e consolo. Promove a relação com o Sagrado, significado para a finitude, saúde física e interação social. Relatam também que a religião possui diversos propósitos concomitantes, o que não a torna uma estratégia de esquiva ou defensiva, como o refere Freud em seus estudos (FREUD, 1997), mas parte de um processo de solução de problemas. Na teoria do enfrentamento religioso, o indivíduo é visto como um agente proativo que faz escolhas diante das possibilidades.

Pargament, Koenig e Perez (2000), em busca do aprofundamento dos estudos, utilizaram cinco funções-chave relacionadas à religiosidade para definir os métodos e seus respectivos estilos ou modalidades de enfrentamento religioso: significado, controle, conforto/espiritualidade, familiaridade/espiritualidade e transformação da vida. A religiosidade tem função de dar significado quando oferece um sentido à vida do ser humano. Tem função de controle, quando oferece caminhos a fim de conter determinadas intempéries. A função conforto ocorre quando promove consolo ou bem-estar do indivíduo. A função de familiaridade é tida como um mecanismo de solidariedade social, sendo que a transformação da vida se dá quando o indivíduo avalia e desiste de antigos valores, passando a adotar novas fontes de significação da vida.

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responsabilidade pelo que acontece é atribuída a fatores externos, nos quais o sucesso depende de fatores fora de si próprio (TAMAYO, 1989).

Além de representar um fenômeno cognitivo-perceptivo-motivacional, o LOC representa uma modalidade de existência que pode ser determinada tanto por um mediador interno, em si mesmo, quanto por um externo, realizado por pessoas, sorte, acaso, destino, ou divino (TAMAYO, 1989). Segundo Tamayo (1989), o sujeito pode definir e estruturar seu destino por meio do LOC. Nesta pesquisa, ao investigar o auxílio que a religiosidade provém na superação das adversidades, o foco estará no construto lócus de controle externo, ou seja, como o indivíduo atribui responsabilidade aos fatores externos que o cercam, nesse caso, o transcendente.

Ao investigar o papel da religião na vida do ser humano, Pargament et al. (1988) argumentam que ela pode assumir funções diferentes nos diversos estilos de solução de problemas, e por isso, investiga-as no que se refere aos padrões de reações de enfrentamento, relativos a uma variedade de situações. Cinco foram as modalidades de enfrentamento religioso encontradas: cooperativo ou colaborativo; delegante ou passivo; auto-dirigido; entrega religiosa ativa e súplica por uma intercessão direta. Dessas modalidades de ER, apreendeu-se àquelas que relacionam-se à função controle, e correlacionam-se ao lócus de controle. Para tanto, variam em duas dimensões relativas à relação do indivíduo com Deus: o lugar da responsabilidade e o nível de atividade no processo de solução de problemas.

A primeira modalidade, segundo Pargament (1988), é denominado auto-dirigido (s elf-directing). Nessa, a responsabilidade pela solução dos problemas é atribuída totalmente ao indivíduo, que segue suas próprias intenções, atribuindo seus ganhos e vitórias a si mesmo. O indivíduo assume uma postura ativa na resolução dos problemas. Deus é visto como aquele que concede liberdade à pessoa para conduzir sua própria vida. Outra modalidade é a delegante (deferring), em que a responsabilidade pela solução dos problemas é delegada a Deus. Nesse caso, a pessoa adquire uma postura passiva e espera que as soluções venham por meio dos esforços d’Ele. A terceira é chamada modalidade colaborativa (collaborative), pela qual a responsabilidade é atribuída tanto ao indivíduo como a Deus, ambos percebidos como participantes ativos, pois trabalham juntos na solução dos problemas.

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2002), que se manifestam na vida de pacientes idosos acometidos por doenças crônico-degenerativas em sua fase final. Nesse contexto, a investigação de soluções cognitivas, emocionais ou comportamentais, torna-se interessante para a promoção de equilíbrio físico e emocional.

2.2 O câncer e seu impacto no idoso sob cuidados paliativos

O envelhecimento é um processo universal, progressivo, declinante e intrínseco, caracterizado por alterações biológicas (BURLÁ, 2002). Em meio a esses eventos, o idoso está sujeito à queda de reservas e à diminuição da sua capacidade de defesa, sujeitando-se ao aparecimento de doenças crônicas oportunistas (FREITAS; MIRANDA; NERY, 2002). Doenças crônicas podem se manifestar em todas as faixas etárias, porém o envelhecimento é importante fator de risco para tal ocorrência. Dentre as doenças crônicas da terceira idade, as mais freqüêntes são enfermidades do coração, câncer, doenças cerebrovasculares, diabetes mellitus e pneumonia (LESSA, 2001).

Câncer é o nome genérico de um conjunto de mais de 200 doenças distintas, com multiplicidade de causas, formas de tratamento e prognósticos. Ocorre quando mutações nos genes de uma única célula a tornam capaz de se proliferar rapidamente, a ponto de formar uma massa tumoral. Várias transformações têm que ocorrer na mesma célula para que ela adquira o caráter de malignidade (LOPES; CAMARGO, 2000; YAMAGUCHI, 2002). O câncer está presente como a segunda maior causa de mortalidade na vida do idoso. Sua incidência nos homens brasileiros ocorre, próstata, pulmão, estômago, cólon e reto. Nas mulheres, a prevalência é maior na mama, pele, cólon do útero, pulmão, reto, estômago, medula óssea (leucemia), boca e esôfago. Essas doenças crônicas podem possuir um curso evolutivo e incapacitante, e não passíveis de cura, mas podem ser controladas especialmente quando detectadas em seu estágio inicial (BURLÁ, 2002 p.733).

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autora, para esses pacientes, Deus se mostra como o único recurso. Por meio do transcendente adquirem a crença na cura.

Ellis (2000) explica que, apesar de considerar os tratamentos e as drogas cada vez mais avançados e eficientes, em alguns pacientes a doença se torna inevitavelmente refratária ao tratamento. Nestes casos, a hospitalização, antes tida como um fator positivo na recuperação da saúde, transforma a expectativa em fatores de risco e agravo ao restabelecimento, pois pode provocar infecções, isolamento social, iatrogenias, perda de independência e autonomia (MAIA et al, 2006). Esse momento é delicado, pois o paciente já não mais se beneficia com tratamento anti tumoral. A comunicação de esgotamento dos tratamentos é questionada pelo temor de agravar a saúde daquele que toma conhecimento dela. Kovács (2004) discorda dessa postura, reforçando a importância de comunicar ao paciente seu estado de saúde, o que não significa afirmar que não há mais nada a fazer, num sinal de desinvestimento. A autora entende que esse nível de compreensão permite ao paciente lidar com situações inacabadas, rever prioridades de vida e seus sentidos.

Pacientes que não possuem mais perspectiva de tratamentos curativos, quando possível são encaminhados para alas ou hospitais de cuidados paliativos. Surgida na Grã-Bretanha, em 1967, por meio de Cicely Saunders, a Medicina Paliativa é uma especialidade médica. Os cuidados paliativos são definidos pela Organização Mundial da Saúde como o cuidado ativo total dos pacientes cuja doença não responde mais ao tratamento curativo, pois se encontram com doença em fase avançada, ativa, com prognóstico limitado. O controle da dor e de outros sintomas, como o cuidado dos problemas de ordem psicológica, social e espiritual são fundamentais. O objetivo dos cuidados paliativos é conseguir a melhor qualidade de vida possível para os pacientes e suas famílias (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1991). O objetivo principal é “o controle adequado dos sintomas” (BURLÁ, 2002 p. 733). No Brasil, o primeiro relato de unidade de tratamento paliativo se deu em 1983, no Hospital das Clínicas de Porto Alegre; e hoje existem, no país, pouco mais de trinta unidades dedicadas a esse serviço (MELO, 2004 p. 297). A função dos cuidados paliativos é aliviar o sofrimento e humanizar o tratamento dispensado aos pacientes sob acompanhamento (PESSINI; BERTACHINI, 2004). Por meio da medicina paliativa, as técnicas tendem a aumentar o conforto, sem interferir com a sobrevida (BURLÁ, 2002).

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da sobrevida, sem que se torne um simples adiamento da morte. As unidades de cuidados paliativos verificam-se como áreas assistenciais, que proporcionam uma atenção integral ao paciente. Atende tanto às necessidades do paciente como da família. As necessidades físicas do idoso advém das graves limitações corporais, mas sobretudo da dor. A dor no câncer é vista pelos idosos como terrível e incontrolável. Para Pimenta, Koizuml e Teixeira (1997), a dor é vista como inútil e desumanizante, acarretando grande stress e sofrimento aos doentes e aos que os rodeiam.

Por força dos efeitos negativos da doença e do ambiente hospitalar sobre o paciente, nos cuidados paliativos, prima-se pela qualidade no atendimento. Ao invés de encontrar somente um médico destinado aos cuidados do paciente, encontra-se uma equipe multidisciplinar de profissionais voltados à assistência do paciente. Formada por enfermeiros, assistentes sociais, médicos, psicólogos, capelães (religiosos), fisioterapeutas, nutricionistas, e voluntários, a equipe volta-se para a necessidade de humanização dos serviços que praticam. Para tanto, trabalham em conjunto, objetivando o alívio das angústias e do sofrimento, tanto do paciente como da família.

2.3 O processo de morrer e a finitude

A intensidade dolorosa física e emocional com que os idosos vivenciam o câncer articulado ao envelhecimento promove a expectativa da finitude. Tido como ameaçador ao fluxo natural da vida, o câncer é visto como um processo de perdas, como algo que furta o direito à sobrevivência do ser humano, sentenciando-lhe a morte. Essa consciência é acompanhada de angústias e temores na hospitalização. Num câncer em estágio final, o processo de morrer pode ser confortador ou angustiante, dependendo do modo como o idoso o vivencia, entretanto, independente da reação, é considerado um tabu no ocidente.

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Segundo Kastenbaum e Aisenberg (1983), a principal resposta humana frente à morte é o medo, por ser caracterizada como um estímulo nocivo e aversivo. Choron (1964) apud Kastenbaum e Aisenberg (1983), distinguem três tipos de medos da morte: o que se relaciona ao que vem depois da morte; o que se relaciona ao evento do morrer; e o do deixar de existir, que podem aparecer separados ou combinados. Segundo Freitas (1991), este é um modelo supersimplificado da morte, útil no sentido de descrever reações conscientes do homem. Limitado, trata a morte como um estímulo e a reação humana frente a esse estímulo, como uma resposta.

Nesse nível de supersimplificação, as reações humanas à morte são diversas espécies de medo, advindas de diversas origens, provocadas por comportamentos individuais. Com diferentes funções na sociedade, podem ser classificados em: medo da morte (enquanto extinção) e medos relacionados à morte (fatos que precedem, acompanham e se sucedem ao processo de morrer) que são suscitados pela percepção da morte dos outros, e no imaginar a própria morte (KASTENBAUM; AISENBERG, 1983).

Para Kastenbaum e Aisenberg (1983), da própria morte surgem: o temor indesejável do sofrer, de mostrar-se fraco, o de tornar-se dependente; o medo do castigo e o da rejeição do transcendente (quando acreditam). E, em relação à morte dos outros, podem ser experimentados o medo de sofrer e se desmanchar frente ao sofrimento do outro; o da retaliação, o de sofrer as perdas; o do abandono e o da vulnerabilidade. A perspectiva de morte também pode gerar um temor no ser humano frente à ruptura da existência física e espiritual. Segundo Vieira (2004, p. 218), “a morte é cercada de incertezas, tristezas e ausência de perspectivas”.

A idéia de que a morte é um fracasso do corpo é também generalizada para o processo de envelhecimento, como se estivesse intimamente ligada a ele, bastando nomeá-la para provocar uma tensão emocional incompatível com a regularidade da vida cotidiana (KASTENBAUM; AISENBERG, 1983).

Muitas vezes, a morte vem emparelhada com palavras comuns como doentes, idosos, hospital. Ao tratar pacientes com diagnóstico de câncer, os profissionais devem tomar cuidado para não vincularem de alguma forma à morte, mesmo sabendo da forte característica de finitude desses idosos internados. Percebe-se uma forte e exclusiva preocupação com a saúde física e seu estado funcional, como se essa fosse a única motivação para a vida.

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de metas, o medo do sofrimento físico, do desconhecido, do que pode acontecer com a família, e a inveja diante das pessoas saudáveis. Segundo a autora, o que os idosos mais buscam é a compreensão do processo e da morte. Para Py e Trein (2002), o modo como percebem a morte e vivenciam sua expectativa é regulado por padrões socioculturais que definem o sentido subjetivo dessa experiência.

As angústias vivenciadas diante da terminalidade podem ser minimizadas pelo diálogo com profissionais qualificados ou voluntários treinados para a escuta do relato de vida desses pacientes. Kübler-Ross (1981) disponibilizava-se a escutar e a compreender, com postura inspirada na fenomenologia, as histórias relatadas por pacientes, que muitas vezes não tinham apoio, sequer familiar. Tentava extrair deles o que lhes incomodava, na busca por consolo e respostas para angústias reprimidas. Segundo a autora, após as entrevistas, tanto pacientes como acompanhantes, mostravam diferenças em suas atitudes. Compreendiam e aceitavam melhor o tratamento, percebiam-se mais confiantes na equipe de saúde, bem como no trabalho desempenhado. Assim, a autora encontrou um modo de proporcionar alívio emocional e conforto para os questionamentos advindos do processo de morte, em pessoas que vivenciavam o estágio final de doença.

Kübler-Ross (1981), a partir da experiência de escuta aos seus pacientes, da observação de comportamentos comuns diante da doença e da perspectiva do fim da vida, descreveu alguns estágios no processo do morrer, caracterizados por atitudes de negação, isolamento, revolta, barganha, depressão e aceitação, negativas e ou positivas em relação a si mesmo e às perdas advindas do momento. São elas:

• Negação: À luz da psicanálise é um mecanismo de defesa pelo qual o paciente nega temporariamente a existência da doença e a perspectiva da morte, reagindo com atitudes denegatórias à dor psíquica diante da morte. “Os pacientes podem até considerar a possibilidade da própria morte, mas precisam deixar de lado tal pensamento e lutar pela vida”. (KUBLER-ROSS, 1981 p.50). Nessa fase, o paciente necessita de tempo para elaborar a notícia e lidar com uma doença terminal. A intensidade e a duração desse mecanismo de defesa dependem de como a pessoa é capaz de lidar com a dor.

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relacionam, por serem eles os que continuam a viver. Essa raiva advém da interrupção dos sonhos, das atividades, das construções, que são deixados para trás por uma doença ou pela expectativa da morte.

• Barganha: Ao perceber que não adianta negar o estado físico, tampouco se isolar, e que a raiva não resolveu nada, o indivíduo recorre à barganha: tentativa de troca de favores realizada normalmente com Deus. Por ser difícil ter algo a oferecer a Deus, além da própria vida, e que o poder de retirá-la parece estar nas mãos d’Ele, a barganha assume característica de súplica, com uma “tentativa de adiamento da morte” (KÜBLER-ROSS, 1981 p.92). É comum, nessa fase, o paciente mostrar-se dócil, sereno e reflexivo, na tentativa de agradar a Deus.

• Depressão: Caracteriza-se por sentimentos de desânimo, desinteresse, apatia, tristeza, choro. “Nesse estágio, o paciente vê que seu corpo realmente não reagiu aos tratamentos, tomando consciência de sua debilidade física". Surge um forte sentimento de perda e a perspectiva clara da morte (KÜBLER-ROSS, 1981 p.95). As perdas se mostram evidentes e sem reestruturações. O papel daqueles que se relacionam com o paciente, nesse momento, se resume em estar junto, permitindo que as preocupações emocionais se abram, cumprindo o papel de ouvinte das ansiedades e tristezas.

• Aceitação: Nessa fase, o indivíduo não mais reage com desespero e nem nega sua realidade. Experimenta um estado de repouso e serenidade. Todas as defesas já foram anteriormente utilizadas: a raiva, a revolta e o sentimento de perda já foram externalizados. O paciente encontra-se fraco e cansado, querendo dormir com mais freqüência e intervalos curtos, com um sono de descanso. O interesse pelas coisas e pessoas diminui, desejando que o deixem sozinho, ou pelo menos não o perturbem com notícias e problemas. Nesse estágio, a dor esvaece, a luta cessa e, debilitado, perde as forças. É o processo de entrega final.

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Por se mostrar, a morte, um dos maiores agentes estressores da vida humana, possuir um caráter de sofrimento e comprometer mais ainda quando se trata de pacientes hospitalizados portadores de doenças crônicas, o fenômeno religioso se apresenta como um importante mecanismo acessível e útil (PARGAMENT, 1997). Fonte de recursos, promove auxílio e suporte em situações de stress, como no caso da doença, hospitalização e morte. Como constatou Kübler-Ross (1981), diante da morte eminente os pacientes costumam adotar recursos que os auxiliem. Siegel (2002) depara-se com as crenças religiosas e seus possíveis benefícios frente aos desconfortos vivenciados na expectativa da morte: enfrentamento, conforto emocional, alívio do medo e das incertezas.

2.4 Enfrentamento religioso em idosos sob cuidados paliativos

O câncer, como doença progressiva e na maior parte das vezes, incurável, pode associar seus efeitos deletérios à cronicidade dos sintomas, ameaçando as pessoas idosas, que geralmente vivenciam as pressões angustiantes, emergentes do envelhecimento. Um dos problemas mais delicados de se lidar com o agravamento da doença é a presença da dor, que segundo, Burlá e Py (2004), é causadora de grande angústia, pois está associada a um estímulo doloroso e conseqüente ruptura na qualidade de vida. Apesar de subjetiva, liga-se a fenômenos complexos, de difícil acesso. Intitulada de dor total, envolve tanto a dor física quanto a dor de origem psicológica, baseada no contexto de vida do indivíduo. A dor do câncer associa-se às debilidades físicas e aos sentimentos negativos (incompreensão, desamparo, isolamento e abandono) e, além de insuportável, promove desespero e desistência da vida. É uma dor total e intensa que ameaça o ser como um todo, desestabilizando-o (KOVÁCS, 2004). Para Pimenta, Koizuml e Teixeira (1997), a necessidade de utilização de recursos de enfrentamento é evidente, pois o paciente precisa sentir-se seguro e estável, já que a enfermidade causa um intenso desgaste e diversos desajustes pessoais.

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intensa, recusa alimentar e flutuação dos sinais vitais sem causa aparente. É importante salientar que a saúde do paciente é instável diante desses sinais.

Silva (1979), apud Diogo; Cachioni; Néri (2004), afirma a respeito da experiência de hospitalização que, independente do motivo, causa impressões negativas no paciente. Diogo; Cachioni; Neri (2004) acreditam que o hospital seja um forte agente estressor, pois o associam à insegurança, à instabilidade do quadro clínico e ao temor do prognóstico. O tratamento que recebe por parte da equipe médica, às vezes não qualificado, compromete a relação saudável entre hospital e paciente. Também o temor da morte reforça a impressão negativa do ambiente.

O enfrentamento tem-se mostrado uma saída para lidar com os eventos aversivos na terminalidade. Segundo Lazarus e Folkman, (1984), pode promover recursos cognitivos e emocionais de enfrentamento. Trentine et al. (2005) em pesquisa calcada na teoria de enfrentamento como recurso motivacional, observa que idosos em condições crônicas de saúde tendem a utilizar estratégias de enfrentamento numa tentativa de minimizar problemas. Segundo Trentini os idosos utilizaram estratégias focalizadas na emoção representadas pela manifestação da fé, do trabalho, e busca de amparo na família, lidando assim, com o envelhecimento e a doença em pesquisa com o câncer em estágio final. Já o enfrentamento focalizado no problema, manifestou-se pela busca de recursos médicos e cuidados com o corpo. Os achados da pesquisa revelaram que os participantes utilizaram múltiplas estratégias de enfrentamento para enfrentar a mesma situação estressante e que essas se apresentam inter-relacionadas e, da mesma forma que o humor humano, podem se caracterizar como incertas. “Ao mesmo tempo em que enfrentam pela fé, trabalho e busca de ajuda, podem enfrentar pela rejeição (TRENTINE et al., 2005, p.14)”.

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Reed (1987), ao observar idosos hospitalizados sob cuidados paliativos, constatou um elevado índice de espiritualidade, maior que em idosos saudáveis ou portadores de doenças curáveis. A autora entende a espiritualidade como um indicador humano para a capacidade de transcendência, fonte de recursos na terminalidade. Em seu estudo, observa que a espiritualidade atua diretamente no temor da morte, ao promover a diminuição do medo, da solidão e do desconforto, sentimentos comuns em pacientes que se encontram nesse contexto.

A religiosidade também é empregada para motivar esperança de cura e caminhos para a organização da vida durante a reabilitação. Zago (2007), realizando estudo com pacientes brasileiros portadores de câncer, de ambos os sexos, com idade entre 51 e 72 anos, verificou que as crenças religiosas articulam o enfrentamento do estigma da doença. Em pesquisa realizada com cinco capelães que atendiam idosos portadores de câncer vivendo sob cuidados paliativos, Teixeira e Lafrève (2003) chamam atenção para três pontos importantes em relação à experiência religiosa dos pacientes: o primeiro é que a fé religiosa ajuda-os a encarar a própria doença; o segundo, é que a fé religiosa adquire contexto conservador na vida dos idosos com câncer; e o terceiro, é que o discurso coletivo assinala que os idosos são mais reconciliadores com a vida e mais bem preparados para as adversidades.

Diversos são os estudos que têm comprovado a relação positiva entre religiosidade e doença, tanto no âmbito físico quanto psíquico. Em pesquisa realizada com pacientes infectados pelo vírus do HIV, Siegel (2002) observa benefícios associados às práticas religiosas e espirituais em suas vidas: a) conforto sentimental e emocional; b) controle da vida; c) sustentação social; d) relação com o transcendente; e) aceitação da doença; f) auxílio na preservação da saúde; g) alívio de medos e incertezas diante da morte; h) e no caso dos pacientes portadores do vírus do HIV, facilita a auto-aceitação, diminuindo a autopunição e a culpa. Tais benefícios sugerem mecanismos potenciais pelos quais o ER afeta o ser humano, ajustando-o psicologicamente.

Koenig, Pargament e Nielsen (1998), em pesquisa realizada no contexto hospitalar, buscaram investigar o emprego ou não do enfrentamento religioso, associando-o à saúde clínica dos pacientes. Geralmente, aqueles que se encontram hospitalizados expressaram atitudes de ER, variando entre positivas ou negativas, dependendo da forma como encaravam a doença e a religião. Também a tradição religiosa pode promover uma discrepância na forma de ajustar e moldar as avaliações dos eventos feitas pelos indivíduos.

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Koenig, Pargament e Nielsen (1998), a possibilidade de uso desse mecanismo ser positivo ou negativo também deve ser estudada. Sendo assim, buscou-se nesta pesquisa, perceber o fenômeno religioso, compreendendo sua relação e possível utilização pelo idoso com câncer, sob cuidados paliativos. A seguir, serão demonstrados o método do trabalho e o processo de sistematização com que se desenvolveu a pesquisa.

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CAPÍTULO III

O PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO

3.0Questões norteadoras e objetivos do estudo

A revisão da literatura apresentada nos Capítulos I e II e a experiência clínica da pesquisadora no atendimento psicológico a idosos deram origem às questões que nortearam os objetivos deste estudo.

A presente pesquisa focalizou-se no papel da religiosidade no processo de enfrentamento de idosos portadores de câncer em estágio final, vivendo sob cuidados paliativos. Conforme visto anteriormente, os principais agentes estressores presentes no contexto hospitalar desses idosos surgem no lidar com a doença, na expectativa de finitude e no temor da morte. Tendo em vista as características culturais e religiosas do povo brasileiro, levantou-se a hipótese sobre a influência positiva que a religiosidade poderia exercer na vida desses indivíduos colaboradores, e se, ao enfrentarem a finitude, estes idosos retratariam atitudes caracterizadas como fases do processo de morrer. Nessa perspectiva, algumas questões podem ser elencadas:

• Como são vividas pelos idosos a experiência de hospitalização, a doença e a expectativa de finitude da vida?

• Seria possível identificar, no depoimento dos idosos sob cuidados paliativos, os estágios do processo de morrer, tais como descritos por Kübler-Ross?

• Como se faz presente, na percepção dos idosos sob cuidados paliativos, a questão da religiosidade?

• Qual o papel da religiosidade neste momento de suas vidas?

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• Quais modalidades de enfrentamento religioso se apresentam mais freqüêntes neste momento e contexto de suas vidas?

• Seria possível estabelecer relações entre os estágios do morrer propostos pela autora Kübler-Ross e as modalidades de enfrentamento religioso proposto por Pargament?

3.1 ObjetivoGeral

Coerentemente com as questões norteadoras apresentadas anteriormente, esta pesquisa teve como objetivo geral investigar a presença da religiosidade na vida dos idosos, particularmente pacientes que se encontram sob cuidados paliativos, e se a empregam como um recurso de enfrentamento no momento de finitude.

3.1.1 Objetivos Específicos

• Investigar se e como os idosos sob cuidados paliativos empregam o enfrentamento religioso.

• Investigar o papel da religiosidade e respectivas modalidades de enfrentamento religioso na vida dos idosos vivendo sob cuidados paliativos.

• Identificar a partir dos seus depoimentos, os estágios do processo de morrer em que se encontram os idosos.

• Investigar possíveis relações entre os estágios do morrer e as modalidades de enfrentamento religioso.

3.2 Fundamentos filosóficos da postura fenomenológica

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da religiosidade na vida do idoso sob cuidados paliativos. Nesse âmbito, a postura fenomenológica foi a mais adequada, pois auxiliou na compreensão do fenômeno religioso. Enquanto filosofia, a fenomenologia compreende um método de investigação da experiência consciente. O êxito do método está no sentido existencial que as experiências adquirem no âmbito do sensível e do vivido, especificamente humano.

Husserl (1859-1938), tido como o pai da fenomenologia, pretendia fundar uma ciência rigorosa, no sentido de compreender como as experiências se revelam por si mesmas (FRAGATA, 1959). Por isso, reforçou seu interesse pelos fenômenos puros e absolutos, descrevendo “fielmente numa atitude penetrante os fenômenos, as coisas, consideradas como meros aparecimentos na consciência” (FRAGATA, 1959 p.81-82).

Como ponto de partida epistemológico, o método fenomenológico luta por uma ciência que reconheça e valorize o vivido, ao invés de afastá-lo em favor de uma elaboração meramente técnica. Este trabalho ancorou-se nos princípios fenomenológicos, inspirando-se num método crítico, rigoroso e sistemático, de investigação direta e descrição de fenômenos, tal como experienciados conscientemente.

Para que esse modelo se realize, exige-se o retorno às coisas mesmas, ou seja, retorno ao mundo anterior ao acontecimento do qual o conhecimento sempre fala (HOLANDA, 2001), à procura da essência do objeto e seus verdadeiros sentidos. Toma-se a descrição de um certo todo, que é a experiência de uma realidade ou mundo vivido por alguém e procura-se entendê-la em si mesma. Interessa o puro fenômeno, tal qual procura-se faz preprocura-sente e procura-se mostra à consciência.

A descrição da natureza do fenômeno pressupõe sempre um começo. Recomeçar, segundo Freitas (2006), implica colocar de lado tudo o que já foi visto, tratando-se de fato da suspensão do juízo prévio. A fenomenologia se atém a descrever e analisar os fenômenos que se apresentam à percepção, elucidando as essências das formas puras do pensamento. É exatamente o humano em sua essência, calcada na existência, que a fenomenologia procura perceber (DARTIGUES, 1973).

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Para alcançar a essência, não se trata de concluir, mas reduzir, purificar o fenômeno de tudo o que se qualifica inessencial, de modo a emergir o que é essencial. A partir de um esforço mental, consegue-se descobrir a essência, o ser fundamental dos fenômenos, tais como percepção, sensação, imagem, consciência, fato psíquico, etc. (DARTIGUES, 1973). O resultado é a definição de um sentido, de uma perspectiva. A pesquisa chega ao fim quando se descobre a intencionalidade do outro, ou a descoberta do sentido do objeto da experiência para a consciência.

A descrição final do objeto da experiência, segundo Gomes (1997), será feita pela consciência da pesquisadora (eu) e intencionalidade do pesquisado (outro). Isso possibilita a experiência de acesso à consciência do outro. É a função da intersubjetividade, uma subjetividade comum a duas ou mais pessoas.

Ao se reconhecer o objeto da percepção, busca-se preencher os requisitos de uma ciência genuinamente rigorosa, transparente, debruçando-se mais profundamente sobre complexos de atos e operações que constituem a consciência num sentido mais amplo, integrando-se à experiência perceptiva como um todo.

Ao reduzir as coisas aos detalhes da apreensão, como fenômeno da consciência propriamente, retira-os de uma visão teórica, transcendente, para tomar conhecimento dela de modo preciso, objetivo e analítico, como simples experiência de consciência, chamada de redução transcendental. Pela redução trancendental toma-se conhecimento dos conteúdos que antecedem a construção ou a elaboração do pensamento. Com a associação da redução transcendental e redução eidética, pretendeu-se chegar a uma metodologia perfeita, de modo a garantir um método investigatório criterioso.

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Nesta pesquisa, a atenção esteve voltada para a compreensão da natureza do fenômeno religioso e, por isso, o relato pessoal dos colaboradores foi fundamental. Durante as entrevistas, a pesquisadora permaneceu ativa e presente, como uma interlocutora que solicita, ao mesmo tempo que acolhe as experiências relatadas (FREITAS, 2006), assim como o mundo vivivo do colaborador. Para tanto, estabeleceu-se com os colaboradores uma relação autêntica e mobilizadora, que permitiu à pesquisadora atuar como a “facilitadora do acesso às experiências”, como descreve Amatuzzi (2001, p.19).

Coerentemente com essa postura, a pesquisadora esteve atenta para dissolver as resistências criadas em torno do tema da morte, mantendo seus julgamentos “a priori” em suspenso. O acesso à experiência fundamental do idoso se deu em função da suspensão dos conteúdos próprios de uma intencionalidade temática. Aproximar-se dos idosos nesse momento de suas vidas demandou da pesquisadora uma reformulação interna dos conceitos, feita pela própria característica mobilizadora do encontro. Refletiu e avaliou a existência enquanto processo dinâmico, o que se mostrou essencial durante toda a trajetória da pesquisa.

O lidar com os idosos é uma forma de acesso à realidade pessoal, investigando a essência das vivências pelo discurso. No caso da pesquisa, não é perceber os fenômenos de maneira isolada, mas reconhecê-lo numa região de fenômenos percebidos, formando um campo de percepção onde se pode distinguir diferentes aspectos de um mesmo foco e outros co-percebidos. Imbuída da postura fenomenológica, a pesquisadora investigou como se dá o conhecimento do mundo pelo idoso, bem como a visão que possui dos objetos específicos, no caso a crença religiosa, a enfermidade, a expectativa da finitude e o morrer, de modo a não tornarem-se invasivos aos sujeitos que passam por tais experiências.

3.3Colaboradores

Referências

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