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Biologia Dos Fungos

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Academic year: 2021

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Biologia dos Fungos

Cristina Beatriz Edgar Cambaza

Universidade Eduardo Mondlane 2015

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Autor: Cristina Beatriz e Edgar Cambaza

Copyright: © 2015 Cristina Beatriz e Edgar Cambaza Contacto: +258 82 4494050 (Edgar Cambaza)

edycambaza@yahoo.com.br

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou transmitida por quaisquer formas ou meios, electrónicos ou mecânicos, incluindo fotocópias, gravações ou qualquer outro tipo de arquivamento de informações, sem autorização por escrito dos autores.

Capa: Baseada na foto de Srinivasan (2006).

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Lista de Abreviaturas

ADN – ácido desoxirribonucleico ADP – difosfato de adenosina AIA – ácido indolacético

AMP – monofosfato de adenosina ARN – ácido ribonucleico

ATP – trifosfato de adenosina

AVC – conjunto de vesículas apicais CSA – aptidão saprofítica competitiva DDT – diclorodifeniltricloroetano ED – Entner-Doudorf (via metabólica)

EMP – Embden-Myerhof-Parnas (via metabólica) EMS – Etilmetanossulfonato

GTP – trifosfato de guanosina

HMP – via (metabólica) dos fosfatos de pentoses MBV – corpos microvesiculares

MEA – ágar com extracto de malte OA – ágar com farinha de aveia PDA – agar com dextrose de batata NTG – N-metil-N-nitrosoguanidina SCP – proteína de célula única TCA – ácidos tricarboxílicos

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Micologia, no meu curso de Biologia Vegetal e Aplicada na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Não foi um contacto, digamos, agradável. Como todas as disciplinas clássicas dos cursos de Biologia, a mesma pecava por um excesso de taxonomia. Só muito mais tarde, já no final do meu curso, reconheci o mundo fantástico que constitui o Reino Fungi, ao trabalhar com estes organismos num projecto de biotecnologia aplicada à indústria farmacêutica.

As páginas que se seguem, resultam de aproximadamente 15 anos de preparação, não constituem de modo algum uma abordagem completa a este Reino dada a sua dimensão e heterogeneidade, mas serve de base para despertar a curiosidade do leitor e fomentar nele o interesse de saber mais.

Não me podendo considerar uma Micologista, não padeço do fascínio pela taxonomia que normalmente invade os mais famosos Micologistas de todos os tempos. Por essa razão, optei por cativar o leitor com uma abordagem mais abrangente. Quando falamos em fungos pensamos logo em cogumelos em lata ou em micoses dos pés, mas os fungos afectam a vida humana de muitas e variadas formas. Por essa razão temos de conhecer a sua biologia de modo a pudermos controlar ou explorar as suas capacidades a nosso favor da melhor forma. O estudo dos fungos cresceu de forma exponencial nos últimos 100 anos. No entanto, eles ainda são ignorados em muitas áreas do conhecimento.

É fascinante saber que existem 3.100 espécies de bactérias descritas, aproximadamente 5.000 vírus, 950.000 insectos, 250.000 plantas e cerca de 70.000 espécies descritas de fungos, mas estima-se que o número real de espécies de fungos seja de um a um milhão e meio no Mundo inteiro. Apesar de estarem entre os maiores grupos de organismos do planeta, muitos cursos de Biologia ainda teimam em não os reconhecerem nos seus planos de estudos.

Muitos ecologistas nem sequer pensam nestes organismos ao fazerem as suas investigações ou observações. No entanto os fungos desempenham papéis vitais nos diferentes ecossistemas, são um componente fundamental da cadeia alimentar, quer como decompositores (já que são heterotróficos), executam a reciclagem da matéria orgânica necessária para os produtores, quer como simbiontes parasitas ou mutualistas (estima-se que aproximadamente 90% de todas as plantas na natureza tenham micorrizas, por outro lado, estima-se que um

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sexto das espécies conhecidas de fungos estejam presentes na natureza como líquenes). Alguns fungos são cultivados por termites para servirem de alimento e diga-se que esta terá sido a mais antiga forma de agricultura do mundo.

Em geral os fungos estabelecem muitas e variadas formas de interacções com outros organismos, vivos ou mortos. No caso das plantas, os fungos podem ser parasitas terríficos de cultivares importantes, resultando na perda anual de biliões dolares. No caso do ser humano, causam doenças ou mesmo a morte, quer por invasão do organismo, quer pela produção de toxinas (micotoxinas) ou pela ingestão de cogumelos venenosos.

Por outro lado, o seu papel nefasto não se resume ao anteriormente descrito. Os fungos são decompositores por excelência, causando a degradação de muitos produtos manufacturados, com excepção de alguns pesticidas.

O ser humano desde há milénios que tem vindo a explorar as capacidades fisiológicas dos fungos (bebidas alcoólicas, pão, queijos, remédios, hormonas, esteroides, aminoácidos etc.) em processos biotecnológicos. É interessante notar que na antiguidade os cogumelos alucinogénios participavam em rituais religiosos de alguns grupos de seres humanos, sendo considerados como uma forma de comunicar com entidades divinas (etnomicologia).

Os fungos são uma excelente ferramenta para o estudo dos sistemas eucarióticos, foram utilizados em genética para estabelecer a teoria “ um gene uma enzima” em Neurospora crassa pelos vencedores do prémio Nobel da medicina em 1958, Beadle e Tatum, por outro lado os Ascomycetes e a análise de tétradas ajudaram a alguns aspectos fundamentais da genética dos Eucariotas. O primeira eucariota a ter o seu genoma sequenciado foi a levedura Saccharomyces cerevisiae.

A micologia estuda vários aspectos da biologia, ecologia, genética, patologia, evolução, genética molecular, biotecnologia e, claro, sistemática e taxonomia dos fungos. Nas páginas que se seguem estes aspectos serão abordados, sendo a parte da taxonomia menos profunda do que geralmente é, dada a constante modificação da mesma devido às novas técnicas moleculares utilizadas na classificação dos organismos em geral, no entanto, é sempre necessário saber de que organismo se trata antes de se trabalhar com ele.

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Tentei colocar nestas páginas os aspectos que achei relevantes da biologia dos fungos, incluindo a sua fisiologia, as formas de crescimento, genética, ecologia e alguns aspectos da biotecnologia, que permitam aos estudantes não graduados uma visão ampla de um grupo tão diverso e fascinante de organismos. Quero agradecer ao dr. Edgar Cambaza na preparação deste Manual, bem como na edição das imagens.

Cristina Beatriz Autora

Foi com muita alegria que abracei a Biologia dos Fungos assim que iniciei a docência. Já me tinha apaixonado pela disciplina quando navegara pela magia das palavras da doutora Cristina. Não há como não gostar! Os fungos são uma componente indispensável da natureza que perfaz um reino cujo conhecimento faz muita diferença na bagagem de qualquer biólogo. É tão importante conhecer os fungos quanto as plantas, os animais, as bactérias e os protistas.

Não é fascinante pensar num grupo de organismos que aumenta a produtividade das plantas, decompõe grande parte da matéria orgânica morta, realiza a fermentação na produção do pão e vinho, dá sabor e beleza aos queijos mais apreciados e produz os melhores medicamentos para infecções? Não é fantástico que só este grupo degrade o plástico, um dos poluentes mais difíceis de se eliminar? Não é formidável saber-se que fungos como Saccharomyces cereviseae caminham sobre a vanguarda da Biotecnologia? Porque não falar dos deliciosos cogumelos que adicionamos à pizza?

Não se negue que seja lamentável que o mesmo grupo de organismos cause 70% das doenças das plantas, várias doenças dos animais, incluindo o ser humano, deteriore alimentos, madeira, tinta e até vidro e combustível de avião. Além disso, há fungos que produzem venenos, drogas psicotrópicas e poderosas micotoxinas, algumas das quais carcinogénicas. Assim, os fungos são alvo de atenção de inúmeros biólogos, médicos, engenheiros agrónomos e florestais, civis e mecânicos, veterinários e muitos outros grupos profissionais.

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Os fungos abriram a minha mente porque eles desafiam vários paradigmas das ciências da vida. Por exemplo, alguns são microscópicos, mas a Armillaria é o maior organismo do Mundo. Eles podem crescer na terra como as plantas mas alguns produzem gâmetas flagelados, tal como os animais. Uns são unicelulares mas outros são filamentosos, sem células, desafiando a teoria celular1. Há casos

de indivíduos com núcleos de diferente constituição genética no seu interior. Como olhar para eles sem fascínio?

Este livro é um convite a todos os amantes do saber à exploração de um conhecimento que de alguma forma trará benefícios. Ele abre as portas a reflexões, desafios, à visão da importância económica e ecológica dos fungos e vai a detalhes práticos sobre como isolar, cultivar e identificar os fungos. Nesta viagem, explica-se quem e como são os fungos, como se reproduzem e dispersam, de que se alimentam, como interagem com os outros organismos e quais os benefícios de tais interacções para a natureza e humanidade.

Faço questão de ressaltar que esta obra é produto da extraordinária mente da doutora Cristina Beatriz e, antes de reivindicar qualquer forma de autoria, deixo claro que me vejo como mero co-piloto da tripulação que só ela poderia ter dirigido tão bem. Eu não poderia sentir-me mais honrado. Sem mais a declarar, penso que o livro fala por si. Boa leitura!

Edgar Cambaza Co-autor

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Universidade Eduardo Mondlane, por ter conduzido já há muitos anos um programa que alberga a disciplina de Micologia, que inspirou os autores a elaborarem este livro.

À dra. Mariamo Machado, pelo entusiasmo e empenho no ensino e na melhoria desta disciplina e outras afins no DCB. Ao dr. Jossias Duvane, um verdadeiro génio que muito promete como docente da equipe que leciona a Micologia. Ao dr. Arlindo Chaúque, regente de Biotecnologia Bacteriana e Micológica, que tem trazido mais visão do lado prático das actividades envolvendo fungos.

Aos estudantes da disciplina que tanto apoiaram na elaboração deste manual, especialmente Celso Alafo, Rachid Ibraim, Vânia Monteiro, Arlindo Chidimatebue e Henriques Bimbe, que se dedicaram à elaboração do capítulo sobre o metabolismo.

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Índice

Capítulo 1 Introdução ... 1

1.1 Fase Vegetativa ... 1

1.2 Importância Económica e Ecológica ... 3

1.2.1 Parasitismo ... 3

1.2.2 Saprobiose ... 4

1.2.3 Simbiotrofismo ... 4

1.2.4 Biotecnologia ... 5

Capítulo 2 Estrutura e Ultraestrutura ... 8

2.1 Os fungos micelianos ... 8

2.2 As leveduras ... 11

2.3 As paredes celulares dos fungos ... 12

2.3.1 Constituição ... 12

2.3.2 Arquitetura da parede ... 14

2.4 Os septos ... 15

Capítulo 3 Crescimento ... 17

3.1 O crescimento Apical das Hifas ... 17

3.1.1 Mecanismo do crescimento apical ... 19

3.1.2 Quitina sintetase ... 19

3.1.3 Glucano sintetase ... 21

3.1.4 Ligações cruzadas ... 21

3.1.5 Enzimas líticas ... 22

3.1.6 O modelo “steadystate” de crescimento ... 22

3.1.7 A força motriz do crescimento apical ... 23

3.1.8 Germinação ... 24

3.2 Ramificação das Hifas ... 25

3.3 Cinética do Crescimento ... 27

Capítulo 4 Diferenciação ... 32

4.1 Interconversão Morfológica do Soma ... 32

4.2 Estruturas Vegetativas Especializadas ... 32

4.2.1 Modificações das Hifas ... 32

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5.1.1 Esporóforos simples ... 45 5.1.2 Esporóforos compostos ... 46 5.2 Esporos ... 46 5.3 Reprodução Assexuada ... 49 5.3.1 Esporangiósporos ... 49 5.3.2 Conidiósporos ... 53 5.4 Reprodução Sexuada ... 59 5.4.1 Plasmogamia ... 59 5.4.2 Cariogamia ... 60 5.4.3 Meiose... 60

5.4.4 Processos Envolvidos na Plasmogamia ... 61

5.5 Ciclos de Vida ... 65

Capítulo 6 Grupos Taxonómicos ... 67

6.1 Reino Protista ... 69

6.1.1 “Fungos” Limosos ... 69

6.1.2 Oomycota (“fungos” com parede celulósica) ... 74

6.2 Reino Fungi ... 77 6.2.1 Chytridiomycota ... 77 6.2.2 Zygomycota ... 80 6.2.3 Ascomycota ... 82 6.2.4 Basidiomycota ... 88 6.2.5 Deuteromycota ... 95

Capítulo 7 Sistemas Genéticos ... 98

7.1 Recombinação Sexual ... 98

7.1.1 Sistemas de Compatibilidade ... 99

7.1.2 Partenogénese e Outros Mecanismos de Atalho ... 100

7.1.3 Reprodução Sexuada em Basidiomycota ... 101

7.2 Sistemas Genéticos Alternativos ... 102

7.2.1 Heterocariose ... 102

7.2.2 Parassexualidade ... 105

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8.1 Fontes de Carbono e Energia ... 110

8.2 Outras Exigências Nutricionais ... 113

Capítulo 9 Metabolismo ... 117

9.1 Produção de Energia ... 117

9.2 Vias Anapleróticas ... 119

9.3 Compostos de Translocação e Reserva ... 120

9.4 Metabolismo Secundário ... 121

9.4.1 Exemplos Específicos de Metabólitos Secundários ... 123

9.4.2 Possíveis Funções dos Metabólitos Secundários ... 126

Capítulo 10 Sucessão de Fungos na Matéria Morta ... 128

10.1 Sucessões Determinadas por Factores Nutricionais. ... 129

10.2 Sucessões determinadas por factores ambientais ... 131

Capítulo 11 Interações Biológicas ... 134

11.1 Antagonismo versus Competição ... 134

11.2 Interferência Hífica ... 137

11.3 Micoparasitismo ... 138

11.4 Vírus fúngicos ... 140

11.5 Introdução às Associações Biológicas ... 141

Capítulo 12 Fungos como Parasitas de Plantas ... 143

12.1 Parasitas Biotróficos Obrigatórios ... 143

12.1.1 Infecção ... 144 12.1.2 Haustórios ... 145 12.1.3 Características do Biotrofismo ... 146 12.2 Parasitas Necrotróficos ... 149 12.2.1 Enzimas Extracelulares ... 149 12.2.2 Toxinas ... 150 Capítulo 13 Micorrizas ... 152

13.1 Micorrizas Ectotróficas (“Sheating Mycorrhizas”) ... 153

13.2 Micorrizas Endotróficas (Micorrizas Arbusculares-Vesiculares) 155 13.3 Micorrizas Endotróficas das Orquídeas (um Caso Especial) ... 156

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13.3.2 Relações Fisiológicas com a Planta Autotrófica ... 157

13.4 Outros Tipos de Associações ... 158

13.5 Consequências da Associação ... 158

Capítulo 14 Líquenes ... 161

14.1 Os Ficobiontes ... 161

14.2 Grupos Morfológicos ... 161

14.3 Distribuição do Ficobionte e Micobionte ... 162

14.4 Biologia Ficobionte e Possíveis Benefícios ... 163

14.5 Taxa de Crescimento dos Líquenes ... 163

14.6 Reprodução ... 164

14.7 Fisiologia, Metabolismo do Carbono ou Minerais ... 164

14.7.1 Nitrogénio ... 165

14.7.2 Minerais... 165

14.7.3 Consequências Nefastas da Absorção Eficiente ... 165

14.8 Água, Fotossíntese e Respiração ... 165

14.9 Significado do Fluxo de Água ... 167

Capítulo 15 Zooparasitismo ... 168

15.1 Micoses dos Vertebrados ... 168

15.1.1 Dermatófitos ... 169

15.1.2 Micoses Subcutâneas ou de Inoculação ... 171

15.1.3 Micoses Sistémicas ... 172

15.2 As Micotoxicoses ... 174

15.2.1 Micotoxicoses do Fígado e dos Rins ... 175

15.2.2 Micotoxicoses de outras Partes do Corpo ... 176

15.3 Fungos Entomopatogénicos ... 176

Capítulo 16 Listas... 179

16.1 Principais Obras Consultadas ... 179

16.2 Lista de Tabelas ... 183

16.3 Lista de Figuras ... 184

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17.1 Fichas de Aulas de Microscopia ... 193

17.2 Protocolos de Aulas Laboratoriais ... 211

17.2.1 Isolamento de Fungos da Superfície Foliar (Método das Lavagens Sucessivas – Indirecto) ... 211

17.2.2 Isolamento de Fungos Presentes no Ar ... 212

17.2.3 Isolamento de Fungos a partir de Alimentos Contaminados 212 17.2.4 Isolamento de Fungos do Solo ... 213

17.2.5 Identificação dos Fungos Isolados ... 214

17.3 Chave para a Identificação dos Fungos ... 217

17.3.1 Chave para as Classes dos Fungos mais Vulgares ... 217

17.3.2 Chave para as Ordens de Classe Zygomycetes ... 217

17.3.3 Chave para os Géneros da Ordem Mucorales ... 218

17.3.4 Chave para a Identificação de Classes de Ascomycota .... 218

17.3.5 Chave para as Classes de Deuteromycota ... 219

17.3.6 Chave para os Coelomycetes ... 219

17.3.7 Chaves para os Géneros mais Vulgares dos Hyphomycetes 219 17.3.8 Géneros Amerósporos ... 223

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Capítulo 1 Introdução

Durante muito tempo, os fungos foram considerados plantas. No entanto, um acumular de características distintivas os tornou merecedores de um reino exclusivo: o reino fungi. Ao contrário das plantas, os fungos são capazes de sintetizar compostos orgânicos a partir de dióxido de carbono, iões inorgânicos e água. Deste modo, os fungos são organismos heterotróficos para o carbono. Distinguem-se dos animais na medida em que não são capazes de ingerir sólidos. Os fungos, tais como as plantas, possuem parede celular mas, ao contrário das segundas, esta nunca é constituída por verdadeira celulose e apresenta, com frequência alguma quitina. Os seus ciclos de vida são únicos. Muitos apresentam dois fenótipos distintos, mas contemporâneos. O holomorfo, ou seja, a totalidade do organismo fúngico, consiste frequentemente de um estado teleomórfico que se reproduz sexualmente pela formação de esporos meióticos, ditos “perfeitos”, e um estado anamórfico que se reproduz assexuadamente pela produção de esporos mitóticos, ditos “imperfeitos”.

Já foram descritas mais de 63.500 espécies de fungos isolados e aproximadamente 13.500 associadas a algas nos líquenes. Os fungos verdadeiros, ou Eumycota, podem ser encontrados em cinco subdivisões - Mastigomycotina, Zygomycota, Ascomycota, Basidiomycota e Deuteromycota.

1.1 Fase Vegetativa

Embora a maioria dos fungos apresente uma organização vegetativa do tipo miceliano (Figura 1.1), sendo correntemente designados bolores, existem três excepções a esta regra:

 Alguns fungos apresentam um tipo de crescimento leveduriforme quando unicelulares. O soma levedureforme caracteriza-se, geralmente, por células globosas, ovoides, elípticas, cilíndricas ou apiculadas. O soma levedureforme pode ser gemíparo (quando a multiplicação vegetativa se dá por gemulação) ou cissíparo (quando a multiplicação se faz por fissão binária. Em determinadas condições ambientais, algumas leveduras do tipo gemíparo podem produzir estruturas filamentosas denominadas conjuntamente de pseudomicélio

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pseudofilamentosa facilmente desagregável). Se a estrutura filamentosa for formada por uma levedura cissípara, então ela é denominada verdadeiro micélio. A distinção entre estes dois tipos de micélio baseia-se na forma dos septos, espessura da parede e nas dimensões relativas das células terminais e subterminais;

 Alguns fungos, pertencentes à classe Chytridiomycota, apresentam formas vegetativas unicelulares, grandes e globosas, ou então cadeias de células primitivamente ramificadas. Em ambos casos podem existir rizoides, que permitem a aderência ao substrato e facilitam a absorção de nutrientes - crescimento quitridiano;

Os “fungos limosos” são extremamente atípicos, já que não possuem parede celular e muitas vezes ingerem alimentos por fagocitose. São semelhantes, em muitos aspectos, aos protozoários, razão pela qual alguns deveriam ser colocados juntamente com animais inferiores.

Figura 1.1 As principais formas de crescimento dos fungos.

Todos os fungos, excepto os casos indicados, apresentam uma organização vegetativa do tipo miceliano, aparentemente mais vantajosa. As principais diferenças entre as fases vegetativas de diferentes fungos não residem

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em aspectos morfológicos, mas sim em características fisiológicas. No entanto, se desviarmos a nossa atenção para as estruturas reprodutivas, deparamos com uma enorme diversidade, quer no tamanho e na forma dos esporos, quer no processo de diferenciação dos mesmos. Estas diferenças não são apenas cosméticas. Elas reflectem as necessidades específicas que cada fungo possui de se dispersar de forma apropriadas no seu habitat.

1.2 Importância Económica e Ecológica

Os fungos são organismos extremamente versáteis e complexos, capazes de se adaptar a vários tipos de vida (parasitismo, saprobiose, simbiose) e habitats, o que lhes confere papel ecológico importante. As vastas capacidades metabólicas têm sido amplamente utilizadas pelo Homem ao longo dos tempos, sendo hoje uma ferramenta imprescindível de um novo ramo da ciência e da indústria, ao qual se dá o nome de biotecnologia.

1.2.1 Parasitismo

Os fungos estão perfeitamente adaptados ao fitoparasitismo: as extremidades das hifas conseguem penetrar a superfície intacta das plantas invadindo, em seguida, os tecidos internos. Se o parasita causa a morte do hospedeiro, é denominado patogénico. Cerca de 70% das mais importantes doenças são causadas por fungos2.

Alguns fungos parasitam outros fungos (micoparasitas), outros parasitam insectos (entomopatogénicos) e outros ainda parasitam nematodes (nematofágicos). Estes tipos de fungos são importantes na medida em que podem actuar como reguladores naturais de populações alguns destes fungos são comercializados como agentes controladores, em programas de controlo biológicos de pragas.

Em contraste com as doenças das plantas, os fungos causam relativamente poucas doenças no Homem e em outros animais de sangue quente. Os dermatófitos crescem nas unhas, na pele, nos pelos e no cabelo, causando doenças tão comuns como o “pé-de-atleta”. Um número restrito de fungos causa micoses internas, que afectam principalmente o fígado e os pulmões. Tais

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doenças, embora raras, podem ser fatais em pessoas diabéticas ou com deficiências imunitárias.

1.2.2 Saprobiose

Os fungos sapróbios são extremamente importantes em quase todos os habitats naturais e artificiais. Possivelmente, não existe nenhuma matéria orgânica natural que não possa ser degradada por um ou outro fungo, e a capacidade de penetração das hifas fúngicas permite-lhes degradar materiais estruturalmente complexos, como a madeira e a cutícula dos insectos.

Os fungos produzem a maioria das enzimas (depolimerases) envolvidas na degradação da celulose e lenhina e, logo, asseguram a reciclagem do carbono e dos nutrientes minerais permitindo um crescimento contínuo. Por outro lado, os fungos produzem, como resultado a sua actividade sapróbia, polímeros extremamente complexos e resistentes, os quais são importantes constituintes do ácido húmico, que constitui uma fracção do húmus do solo. Este tipo de actividade é normalmente denominada biodegradação, sendo essencial para a biosfera.

Em contraste, os fungos também causar a biodeterioração, uma característica indesejável do ponto de vista do Homem, já que resulta em elevados prejuízos materiais: os fungos causam a deterioração de alimentos, apodrecem a madeira, destroem peles naturais e artificiais, crescem nas paredes das casas, em obras de arte, constituem um problema sério para a indústria de lubrificantes, tintas, vernizes, etc.

Muitas vezes a actividade degradativa, per si, é de menor importância comparada com os efeitos secundários dessa mesma actividade: (1) o fungo Amorphotheca resinae cresce no combustível dos aviões e, devido à sua actividade, provoca a corrosão do alumínio das paredes dos tanques dos aviões; (2) alguns fungos responsáveis pela deterioração de determinados alimentos produzem potentes micotoxinas, como as aflatoxinas. Sabe-se que as aflatoxinas são causadoras do cancro do fígado.

1.2.3 Simbiotrofismo

Praticamente todas as plantas superiores apresentam relações de simbiose com fungos, ao nível das raízes – micorrizas. Esta associação é normalmente benéfica para ambos e, por vezes, o hospedeiro não pode prosperar sem os benefícios oriundos do simbionte. As micorrizas melhora a absorção mineral pelas

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plantas, que possuem geralmente um sistema de protecção para impedir que o fungo cause danos nas raízes. Pensa-se que a planta fornece ao fungo açúcares e aminoácidos. Em determinadas associações, a presença do fungo é essencial para a sobrevivência da planta (orquídeas).

Os líquenes constituem outra forma de associação simbiótica, que envolve fungos e algas. Uma outra forma de associação menos conhecida, mas de modo algum menos espetacular, estabelece-se entre alguns fungos e diferentes tipos de insectos.

1.2.4 Biotecnologia

Os fungos podem ser utilizados directamente na alimentação (cogumelos) ou indirectamente na produção da cerveja, de vinhos, do pão (Saccharomyces cerevisiae), etc. Muitos queijos, como Brie, Stilton, Gorgozola, Roquefort e Camembert (Figura 1.2), são produzidos com a ajuda de diferentes fungos que crescem na sua superfície, conferindo-os o odor, sabor e a consistência que lhes são característicos.

Figura 1.2 Queijos Roquefort (à esquerda) e Camembert (à direita). A coloração escura sobre a superfície de Camembert é resulta da presença do fungo Penicillium roqueforti. Fonte: Grupo Virtuous (2014).

Existe actualmente um crescente interesse na produção de proteínas de célula única (SCP) a partir de fungos, tanto como fonte de alimento para o Homem como para os animais (rações). Nos dias de hoje, nos países industrializados, é adicionada à farinha do pão 1% de levedura liofilizada (Saccharomyces cerevisiae) de modo a suplementar proteicamente este alimento. No entanto, existe um constante obstáculo por parte da opinião pública ao

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consumo de alimentos microbianos. De qualquer forma, vários fungos são inutilizados actualmente no processo SCP, com vista à sua comercialização: Fusarium graminearum, Paecilomyces sp., Candida utilis, Saccharomyces cerevisiae, etc. Uma das grandes vantagens deste processo é a produção de grandes quantidades de proteínas em pouco tempo e com um mínimo de encargos financeiros, já que os meios de cultura podem consistir de detritos ou subprodutos industriais tais como parafina líquida, líquidos enxofrados, metanol, etanol, etc.

Além do seu papel na produção de alimentos, os fungos são utilizados em muitos processos industriais importantes. Por exemplo, o fungo Aspergillus niger é utilizado na produção de ácido cítrico o qual é, por sua vez, utilizado na produção de refrigerantes, compotas, gelatinas, vinhos, etc. Actualmente, produz-se no Mundo 300.000 toneladas de ácido cítrico por ano. Os fungos estão também envolvidos na produção de outros ácidos orgânicos: ácido itacónico, glucónico, fumárico, málico, oxálico, etc.

Outros produtos de origem fúngica de extrema importância, e que mudaram o curso da medicina moderna, são os antibióticos, dos quais podemos destacar: as penicilinas, produzidas comercialmente pelo fungo Penicillium chrysogenum, que actuam ao nível da parede das bactérias. As cefalosporinas, produzidas pelo Cephalosporium sp., que actuam ao nível da síntese da parede das bactérias Gram+, e a griseofulvina, produzida pelo Penicillium griseofulvum.

Outro grupo de metabólitos secundários produzidos comercialmente por fungos é o das giberelinas.

Não só os metabólitos são explorados comercialmente pelo Homem. As enzimas produzidas pelos fungos revestem-se de interesse comercial. Aproximadamente 95% das enzimas de origem fúngica são produzidas pelo Aspergillus niger. A -amilase, a amiloglicosidase, as pectinases e as protéases destacam-se como as mais importantes enzimas de origem fúngica actualmente comercializadas. A primeira é utilizada, por exemplo, na conversão do amido em maltose e maltotriose, na indústria da panificação. A amiloglicosidase é utilizada, juntamente com a anterior, na obtenção da glicose e maltose, durante a produção de melaços. As pectinases são muito utilizadas na clarificação de sumos de frutas e vinhos. Uma protéase específica, produzida pelo Mucor meihei, é utilizada como um substituto da renina na produção de queijos.

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A grande vantagem da utilização de enzimas reside na sua especificidade e a grande desvantagem no seu preço. A este respeito, um avanço recente da ciência, a imobilização de biocatalizadores com vista à sua recuperação a partir do meio de reacção, veio permitir uma redução considerável nos custos de produção abrindo um campo infinito à utilização de enzimas microbianas.

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Capítulo 2 Estrutura e Ultraestrutura

2.1 Os fungos micelianos

A hifa é essencialmente um tubo que consiste de uma parede celular rígida que delimita uma massa protoplasmática móvel. Pode apresentar um comprimento indeterminado, mas normalmente possui um diâmetro relativamente constante, que varia de 1 a 30 m. A porção terminal da hifa, o ápice, é denominada zona de extensão. Nesta região, a actividade metabólica é muto elevada, já que é a este nível que o crescimento da parede é mais intenso (Figura 2.1).

Figura 2.1 Ultraestrutura da hifa. Legenda: AVC – aglomeração de vesículas aplicais; G – corpúsculo de Golgi; ER – retículo endoplasmático; N – núcleo; W – parede; P – hialoplasma; R – ribossomas; V – vacúolo; MT – microtúbulos; M – mitocôndria; S – septo; Wo – corpúsculo de Woronin; SP – obturador do septo; Chlam – clamidósporo; Gl – glicogénio; Aut – autólise; MW – parede melanizada; L – lípido. Adaptado de Deacon (2006).

Os fungos “superiores” apresentam paredes transversais (septos) ao longo das hifas. Estes septos estão ausentes nas hifas dos fungos “inferiores”, excepto quando surgem de forma a isolar zonas envelhecidas ou as estruturas reprodutoras. De qualquer forma, a distinção entre hifas septadas e não-septadas (Figura 2.2) não tem muito significado em termos funcionais porque os septos são normalmente perfurados e permitem a passagem de citoplasma e mesmo de núcleos. Deste modo, na realidade, as hifas não são constituídas por

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células mas sim por compartimentos, e o conceito de um núcleo governar um volume fixo de citoplasma3 não se aplica à maioria dos fungos.

Figura 2.2 Hifa septada (A) e asseptada (B). Fonte: Campbell, Plescia, and Fillmore (2013).

A membrana citoplasmática geralmente encontra-se aderida firmemente à parede da hifa, sendo difícil a sua plasmólise. Nalguns pontos, no entanto, a membrana parece proliferar, formando estruturas denominadas lamossomas ou plasmalemossomas (Figura 2.1). Pensava-se que estas estruturas poderia ter uma função secretória ou apenas consistir em excessos da membrana. Hoje, sabe-se que são artefactos do processo de preservação.

O compartimento apical contém vários núcleos, ao passo que os compartimentos subapicais apresentam um ou dois. Estes núcleos apresentam a mesma constituição que os núcleos de outros organismos eucariotas, da mesma forma que os principais organitos celulares não diferem daqueles dos outros eucariotas – mitocôndrias, retículo endoplasmático, vacúolos, ribossomas, vesículas secretórias, etc.

O hialoplasma4 do compartimento apical é normalmente denso, e os vacúolos pequenos, quando presentes. Na extremidade apical há poucos organitos mas muitas vesículas apicais (AVC). Acredita-se que tais vesículas desempenhem um papel importante no crescimento das hifas.

3 Frequentemente associado à teoria celular.

4 “Hialoplasma” é um termo conveniente usado neste livro no lugar de

“citoplasma”. O problema é que o citoplasma advém da palavra grega kytos, que significa “célula”. Os fungos micelianos não possuem células como unidades

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Os vacúolos começam a surgir nos compartimentos subapicais. A princípio são pequenos, tornando-se progressivamente maiores e parecendo coalescer à medida que se anda para trás ao longo da hifa (Figura 2.1), até que ocupam praticamente todo o compartimento, restringindo o citoplasma e o núcleo a uma pequena zona periférica.

Em associação com cada septo, existem um ou mais corpúsculos de Woronin, matrizes proteicas electrodensas rodeadas por membranas lipídicas, que se pensa actuarem na obstrução dos septos de modo a isolarem os compartimentos das hifas à medida que envelhecem ou sofrem de diferenciação. Nas zonas mais velhas das hifas, o citoplasma e mesmo a parede podem sofrer autólise ou, alternativamente, podem ser destruídos por enzimas líticas produzidas por outros microrganismos. Em associação com este processo, alguns compartimentos podem acumular quantidades consideráveis de lípidos e glicogénio, e desenvolver uma parede secundária extremamente espessa e geralmente pigmentada. Estas estruturas, denominadas clamidósporos, são extremamente resistentes a condições adversas e actuam como estruturas de dormência5 (Figura 2.3).

Figura 2.3 Clamidósporos de Fusarium sp.. Fonte: Bueno (2006).

Os clamidósporos persistem, como esporos de dormência, no local onde são produzidos, em vez de se dispersarem para novos ambientes, esperando que as condições se tornem adequadas ao crescimento vegetativo. Deste modo, a

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dispersão é meramente temporal. Os clamisdósporos são formados por um grande número de fungos do solo.

2.2 As leveduras

As leveduras não constituem um grupo taxonómico natural, mas apresentam algumas estruturas básicas que podem ser descritas. Tome-se como exemplo a Saccharomyces cerevisiae. Esta levedura apresenta um único núcleo, um vacúolo grande e central, os organitos citoplasmáticos normais e uma mitocôndria ramificada (Figura 2.4).

A célula reproduz-se por gemulação. A gêmula separa-se da célula-mãe por meio de um septo, o que conduz ao aparecimento de cicatrizes na célula-mãe e na gêmula. O processo pode ser unipolar (as gêmulas formam-se num dos polos da célula-mãe), bipolar (formam-se nos dois polos da célula) ou multipolar (em qualquer ponto).

Figura 2.4 Morfologia externa (à esquerda) e interna (à direita) da levedura. Fonte: Souza (2011).

Durante o ciclo celular da levedura, a membrana nuclear permanece intacta e o núcleo sofre constrição, indo uma das partes para a célula-filha (Figura 2.5).

Os ribossomas mitocondriais das leveduras e dos fungos filamentosos são do tipo 70s, ou seja, semelhantes aos das bactérias. Por isso, a síntese de proteínas mitocondriais dos fungos é afectada pelo antibiótico bacteriano clorafenicol.

As células de algumas espécies de leveduras apresentam um revestimento extracelular viscoso e aderente. A maioria destas cápsulas mucilaginosas é constituída por polissacarídeos. As células velhas possuem parede espessas, o que as torna extremamente resistentes às condições

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desfavoráveis. Em muitas espécies, as paredes apresentam-se impregnadas de pigmentos que lhes conferem a sua cor típica (amarela, rosa, laranja, negra, etc.).

Figura 2.5 Ciclo de vida de uma levedura. Fonte: Nash (2013).

A sua capacidade armazenamento de grandes quantidades de carbohidratos, lípidos, proteína e vitaminas torna-os ideais como suplementos alimentares, tanto na dieta humana como em rações para animais.

2.3 As paredes celulares dos fungos

2.3.1 Constituição

A parede celular dos fungos desempenha funções importantes, tornando essencial a compreensão da sua estrutura. A parede determina a forma das células como tal e o tipo de crescimento que o fungo apresenta – miceliano ou leveduriforme. O tipo de estruturas diferenciadas que um fungo pode produzir é uma consequência directa dos componentes da parede e da forma como estes são reunidos durante o crescimento ou a diferenciação.

A parede actua como uma interfase entre o fungo e o meio que o rodeia, protege a célula da lise e de metabólitos de outros organismos, é um local de

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ligação de determinadas enzimas e pode apresentar propriedades antigénicas, às quais governam as interacções entre os fungos e outros organismos.

Uma análise grosseira da composição das paredes celulares revela uma predominância de polissacarídeos e a presença de quantidades significativas de proteínas e lípidos. Os polissacarídeos diferem tanto quantitativa como qualitativamente nos diferentes grupos taxonómicos (Tabela 2.1). A composição da parede não pode ser vista como fixa. Mesmo dentro da mesma espécie ela varia, tanto quantitativamente como qualitativamente, durante as diferentes fases do ciclo de vida do organismo.

Tabela 2.1. Grupos taxonómicos dos fungos e a composição química das paredes celulares. Adaptado de Deacon (2006).

Grupo taxonómico Composição

Acrasiomycetes Celulose-glicogénio Oomycetes Celulose-glucano Hyphochytridiomycetes Celulose-quitina Zygomycetes Quitina-quitosana Chytridiomycetes, Ascomycotina, Basidiomycotina, Deuteromycotina Quitina-glucano Hemiascoycetes: Saccharomycetaceae e Criptococcaceae Manano-glucano Basidiomycotina: Sporobolomycetaceae Manano-quitina

Trichomycetes

Poligalactosamina-galactano

Em geral, as paredes celulares de todos os fungos contêm uma mistura de componentes fibrilares e amorfos (ou de matriz) (Tabela 2.2).

Tabela 2.2 Principais constituintes da parede celular dos fungos.

Grupo Substância Descrição

Aminopolissacarídeos Quitina Polímero linear de N-acetil-D-glucosamina com ligações -1,4 Quitosana Forma desacetilada da quitina Polissacarídeos (não

aminados)

Glucosanas Polímeros da glicose com ligações -1,3, -1,6 e -1,3 Manosanas Polímeros de manose (ocorrem

em leveduras)

Celulose Ocorre em Oomycota

Proteínas Complexos

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Os componentes fibrilares, como quitina e celulose, consistem de moléculas lineares capazes de se agregar firmemente. A celulose, encontrada nas paredes celulares de determinados fungos, apresenta-se fracamente cristalizada, pelo que não deve ser pura mas sim um polímero complexo de cadeia ramificada, com uma mistura de ligações -1,3 e -1,4. A componente amorfa é constituída pelas manosanas e glucosanas (hemiceluloses), proteínas e polímeros de galactose-amina.

2.3.2 Arquitetura da parede

Não é conhecida a arquitetura de todas as paredes celulares das diferentes classes de fungos. Para o nosso estudo vamos tomar como exemplo a parede da Neurospora crassa (Figura 2.6). Ela consiste de quatro regiões que se fundem gradualmente umas com as outras, mas que por conveniência são mostradas como camadas separadas.

A arquitetura mostrada na figura corresponde a uma parede celular “madura” com uma espessura aproximada de 125 nm. Na zona apical, a parede é mais fina (± 50 nm) e de constituição mais simples: uma camada interna constituída por quitina embebida numa matriz proteica (camada fibrilar) e uma camada externa constituída principalmente por glucanos (camada amorfa).

Figura 2.6 A arquitetura da parede numa região “madura” (subapical) da hifa de Neurospora

crassa. a – camada de glucanos amorfos (80 – 90 nm); b – retículo de glicoproteínas embebidas em proteínas; c – camada de proteínas mais ou menos discreta; d – microfibrilas de quitina embebidas em proteína; e – membrana plasmática. Fonte: Deacon (2006).

Podemos concluir que existe deposição de material de parede para trás da zona apical, com vista a formar novas camadas. Este novo material vai contribuir para a rigidez e “força” da parede, à medida que esta “amadurece”. De facto, nas zonas velhas do micélio e em muitos esporos, podem ocorrer outros materiais ainda da parede, verificando-se um aumento significativo da percentagem dos

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lípidos (especialmente nas paredes dos esporos) e a deposição de pigmentos como as melaninas. Pensa-se que o papel dos lípidos é o de ajudar a prevenir a dissecação dos esporos e contribuir as propriedades da parede.

2.4 Os septos

Os septos são encontrados nas hifas de quase todos os fungos filamentosos estando, no entanto, ausentes na maioria dos Oomycota e Zygomycota. Os septos podem actuar como suportes estruturais das hifas. Em relação a este aspecto, é notável que as hifas septadas suportam muito melhor a dessecação que as asseptadas. Estas estruturas são a primeira linha de defesa contra danos na hifa: os septos ficam obstruídos pelos corpos de Woronin à medida que as hifas envelhecem, ou quando estas sofrem qualquer tipo de dano. Os septos também desempenham uma função importante ao contribuírem para a diferenciação, já que os mesmos podem isolar compartimentos adjacentes para que diferentes eventos bioquímicos e fisiológicos ocorram separadamente (os fungos “inferiores” formam septos completos que isolam as regiões da colónia que estão a sofrer diferenciação).

Podemos distinguir diferentes tipos de septos (Figura 2.7), mas existem dois que mais frequentes: o septo simples, encontrado na maioria dos Ascomycota e Deuteromycota, e o septo dolipórico, mais complexo e encontrado na maioria dos Basidiomycota.

O septo simples apresenta um único poro central de grandes dimensões (0,05 a 0,5 m). O septo dolipórico apresenta um pequeno poro, de 100 a 150 nm de diâmetro, limitado por dois rebordos de material de parede amorfo. De cada lado deste poro central existem duas membranas perfuradas, em forma de parêntesis, denominadas parentossomas, que parecem ser modificações especiais do retículo endoplasmático. Este tipo de septo permite que o citoplasma circule nos compartimentos mas restringe o movimento dos núcleos. Por esta razão, os membros de Basidiomycota tendem a ter um arranjo nuclear mais regular em relação à maioria dos restantes fungos.

Os septos fornecem-nos um interessante exemplo de crescimento localizado da parede: desenvolvem-se rapidamente, em poucos minutos, de forma centrípeta a partir da parede celular, o que envolve uma modificação local da mesma, obviamente. A organização deste crescimento localizado da parede,

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longe da região principal de crescimento (o ápice), é pouco entendida mas as evidências apontam para um processo altamente regulado. Por exemplo, em vários fungos a formação dos septos coincide com locais de divisão nuclear.

Figura 2.7 Tipos de septos. Imagem de Barron (2008).

Em Aspergillus nidulans, o processo de formação dos septos tem uma sequência notável. Os compartimentos apicais, neste fungo, contêm vários núcleos e crescem até atingirem o dobro do seu comprimento inicial. Em seguida, os núcleos dividem-se e forma-se um septo na região mediana do compartimento apical. Por fim, desenvolve-se uma série de septos no novo compartimento subapical, que resultam na formação de vários compartimentos pequenos, cada um com um ou dois núcleos.

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Capítulo 3 Crescimento

3.1 O crescimento Apical das Hifas

Já é do nosso conhecimento que as hifas apenas crescem ao nível dos ápices. As paredes podem-se espessar consideravelmente para trás desta zona, mas raramente sofrem distensão. Este tipo de crescimento, extremamente polarizado, contrasta com o crescimento intercalar observado noutros organismos filamentosos, nos quais qualquer célula do filamento pode aumentar de tamanho e sofrer divisão.

Este tipo de crescimento dos fungos, dito apical, só encontra paralelo num pequeno grupo de algas, nos pelos radiculares e tubos de polinização das plantas superiores. Ele é uma característica especializada dos fungos, de certa forma, com acentuada relevância ecológica.

A zona apical das hifas é uma região onde a parede celular é aparentemente menos espessa e mas plástica. É nesta zona que se dá o alongamento da hifa (zona de extensão). Para trás desta região, a parede torna-se espessa e rígida em virtude da deposição de constituintes da parede recentemente sintetizados e do aumento acentuado das ligações entre os diferentes polímeros.

A actividade metabólica no compartimento apical da hifa é, comparativamente, mais intensa do que no resto do filamento. Na zona apical detecta-se uma acumulação de pequenas vesículas, com a exclusão de todos outros organitos, os quais se acumulam, em grande número, na zona subapical. Nos micélios com compartimentos multinucleados é evidente a concentração de núcleos na zona subapical, estando estes envolvidos na síntese de novos componentes.

Apesar da intensa actividade metabólica da zona apical, existem hifas que crescem com taxas tão elevadas que não podem ser explicadas, e mantidas, apenas pela síntese de componentes celulares ao nível da zona apical. O que quer dizer que estes ápices têm de receber materiais de compartimentos celulares mais atrás. Na verdade, tem-se observado um movimento de citoplasma em direcção à zona apical, proveniente das zonas mais anteriores. Esta corrente citoplasmática unidirecional ocorre juntamente com a corrente bidirecional, ou

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ciclose, que é mais lenta. Deste modo, todo o micélio contribui, de certa forma, para o crescimento apical das hifas.

Durante o seu crescimento, as hifas vão sofrendo ramificações. As hifas que surgem por ramificações de outras têm o mesmo tipo de crescimento apical e podem, por sua vez, sofrer ramificação (figura 3.1).

Figura 3.1 Estágios de desenvolvimento de uma colónia fúngica a partir de um esporo em germinação. Fonte: Lepp (2012).

Os ramos que vão surgindo vão divergindo uns dos outros, o que faz com que o micélio avance no substrato de forma centrífuga e radial. A ramificação das hifas aumenta a densidade do micélio para trás da margem circular de crescimento. À medida que a colónia vai progredindo, na região central, normalmente exausta de nutrientes, surgem novos ramos que ao contrário de divergir sofrem anastomose, criando desta forma uma malha apertadas de hifas. A presença de muitas pontes de anastomose dá origem a uma rede micelar complexa que possibilita uma corrente citoplasmática constante e eficiente (figura 3.2). Esta corrente permite o transporte de materiais para as zonas de crescimento, ou para compartimentos individuais, nas zonas velhas da colónia, com vista à formação de clamidósporos ou outras estruturas diferenciadas. A anastomose permite, também, a troca de núcleos entre diferentes indivíduos de uma mesma espécie.

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Figura 3.2 Imagens de um vídeo mostrando o processo de anastomose de duas hifas compatíveis de Rhizoctonia solani. O tempo (t) é representado em minutos depois do início da gravação. A hifa de cima parou de crescer no tempo t0 mas começou a produzir uma ramificação

(indicada pelo sinal “>”) no tempo t6 em resposta do ápice que se aproxima. As extremidades das

hifas encontram-se no tempo t14. A dissolução das paredes das extremidades e a fusão completa das

hifas terminou no tempo t32. Fonte: McCabe, Gallagher, and Deacon (1999).

3.1.1 Mecanismo do crescimento apical

As microfotografias mostram sempre uma grande abundância de vesículas ao nível dos ápices das hifas em crescimento, sugerindo que as vesículas estão intimamente envolvidas no mecanismo de crescimento. Pensa-se que estas vesículas se formam nos complexos de Golgi da região subapical migrando, em seguida para o hialoplasma da zona apical, com o qual se fundem libertando, assim, os seus conteúdos ao nível da parede.

O conteúdo da maioria das vesículas não foi caracterizado, mas o grande corpo de evidências existente permite construir uma imagem do crescimento da parede ao nível do ápice (Figura 3.3). Alguns dos possíveis conteúdos são discutidos em seguida.

3.1.2 Quitina sintetase

A enzima quitina sintetase catalisa a síntese das cadeias de quitina. Sabe-se que estas cadeias são formadas in situ ao nível do ápice. Elas não são transportadas em vesículas até ao ápice. Quando se testam homogenatos de hifas in vitro quanto à actividade enzimática, a quitina sintetase é encontrada sob duas formas: (i) numa forma inactiva nos quitossomas e por vezes nas membranas; e (ii) numa forma activa intimamente associada às membranas.

Já vimos (no Capítulo 2) que os quitossomas assemelham-se a algumas das microvesículas presentes nos ápices das hifas. No entanto, a “concha” que

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quitossomas poderão ser empacotados em membranas de forma a serem transportados até ao ápice, talvez nos corpos microvesiculares (MVB). A forma inactiva da quitina sintetase, quando inserida na membrana, tem de ser activada por uma protéase que provavelmente atinge o ápice noutras vesículas. O substrato atinge a parte da enzima que se localiza a face interna da membrana celular via citosol de forma que, à medida que as cadeias de quitina são sintetizadas, vão sendo expelidas ao nível da face externa da membrana, que está em contacto com a parede.

Figura 3.3 Diagramas mostrando a organização do crescimento da parede (em cima) e os possíveis componentes da parede celular (em baixo). G – complexo de Golgi; M – microtúbulos; V – vacúolos.

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Torna-se claro que devem existir mecanismos para regular a actividade da enzima durante o crescimento da parede. Esta regulação poderia ser conseguida parcialmente pelo controlo do transporte das protéases que activam a enzima, parcialmente pelo controlo da taxa de entrega do substrato e pela acção dos inibidores enzimáticos. Sabe-se que o citosol contém um inibidor da quitina sintetase.

3.1.3 Glucano sintetase

Esta enzima catalisa a síntese dos -1,3. Tal como a quitina sintetase pensa-se que esta enzima atinja o ápice em vesículas sendo depois integrada na membrana dessa região. O substrato UDP-glicose atinge a enzima via citosol. A actividade da glucano sintetase é regulada de forma diferente da suposta para a quitina sintetase. A enzima é composta por duas subunidades, uma das quais (na face externa da membrana) possui o sítio catalítico e a outra (na face interna) é uma proteína onde se liga a guanosina trifosfato (GTP-binding protein). Pensa-se que a enzima seja activada quando o GTP atinge a face citoplasmática da membrana. Então, as cadeias de glucanos são sintetizadas e expelidas para a parede. A nível da parede, estas cadeias de glucanos parecem sofrer em seguida mais modificações, sendo-lhes adicionadas ligações -1,6 para produzir os glucanos ramificados dos fungos. O número destas ligações aumenta acentuadamente para trás do ápice, mas não foi encontrada qualquer enzima que execute este processo. Como tal, ele pode ocorrer espontaneamente.

3.1.4 Ligações cruzadas

Vários tipos de ligações cruzadas surgem entre os principais polímeros constituintes da parede após estes terem sido inseridos na parede, e o estabelecimento destas ligações parece ocorrer progressivamente para trás do ápice da hifa. Por exemplo, nos ápices recém-formados é possível isolar glucanos puros. No entanto, nas regiões mais para trás, os glucanos sofrem aparentemente complexação com a quitina. Para além do aparecimento destas ligações intermoleculares, as cadeias individuais de quitina associam-se umas às outras por meio de ligações de hidrogénio, formando assim as microfibrilas. Os glucanos também se associam entre si. Todas estas ligações adicionais que se estabelecem para trás do ápice em crescimento poderão servir para converter a

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parede inicialmente plástica numa parede progressivamente mais rígida e estruturada.

3.1.5 Enzimas líticas

Existem opiniões divergentes no que respeita à necessidade da participação das enzimas líticas no processo de crescimento apical. Por um lado, foi sugerido que a parede existente ao nível do ápice teria de sofrer um certo grau de degradação de forma a permitir a inserção de novos componentes. Deste modo, o crescimento apical envolveria um certo grau de lise da parede bem como certo grau de síntese. Estes dois processos devem estar em equilíbrio, de modo a assegurar que a parede não se torne demasiadamente fraca nem forte ao nível do ápice.

Consistente com esta ideia está o facto de se ter detectado a presença da quitinase, celulase e -1,3-glucanase em fracções da parede das hifas, apesar de estas enzimas poderem estar presentes ao nível da parede na sua forma latente. Além disso, as enzimas líticas dos componentes da parede estão necessariamente envolvidas na ramificação das hifas, quando novos ápices são criados a partir de uma parede madura preexistente. O facto de, ocasionalmente, os ápices das hifas incharem e rebentarem quando imersos em água tem sido utilizado como mais uma evidência a favor da hipótese da existência de actividade de enzimas líticas ao nível do ápice. O facto de as hifas conseguirem suportar pressões de turgidez consideráveis tem sido utilizado como evidência a favor da ideia de que a parede do ápice deverá ser bastante rígida e, como, tal, terá de ser continuamente degradada durante o crescimento.

Por outro lado, trabalhos recentes mostraram que os ápices das hifas possuem um citoesqueleto bem desenvolvido que poderá fornecer suporte estrutural de modo que a parede ao nível do ápice poderá ser verdadeiramente plástica não necessitando da intervenção das enzimas líticas. Se as enzimas líticas estão realmente envolvidas no processo de crescimento da parede, então elas terão de ser transportadas em vesículas.

3.1.6 O modelo “steadystate” de crescimento

Weesels (1990) propôs o modelo “steadystate” de crescimento da parede em que é desnecessário o envolvimento de enzimas líticas. De acordo com este modelo, a parede recém-formada ao nível do ápice é viscoelástica (fluída) de

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modo que esta flui para fora e para trás à medida que novos componentes da parede são adicionados ao nível do ápice (Figura 3.4). Então, a parede rigidifica progressivamente em virtude da formação de novas ligações entre os componentes da parede, nas regiões para trás do ápice.

Figura 3.4 Diagrama representando o modelo steady-state do crescimento apical da hifa.

Mas, como é que uma hifa com parede essencialmente fluída consegue resistir à pressão de turgidez? A resposta pode ser: a malha de microfibrilas de actina providencia suporte estrutural. Jackson e Heath (1990) investigaram este ponto com o fungo Saprolegnia ferax (Oomycota). Eles mostrara que o tratamento das hifas com citocalasina E causava ruptura da “malha” de microfibrilas de actina e conduzia inicialmente a um aumento na taxa de extensão apical. Em seguida, os ápices inchavam e rebentavam. A região mais fraca do ápice, mais susceptível de sofrer ruptura, não era a extremidade do ápice onde a “malha” de microfibrilas de actina é mais densa mas sim as regiões laterais onde a actina é menos densa e a parede possivelmente ainda não rigidificou o suficiente para compensar a fraqueza do citoesqueleto.

3.1.7 A força motriz do crescimento apical

Tem havido muita especulação sobre a possibilidade de campos eléctricos ou iónicos estarem envolvidos no crescimento apical, porque os ápices das hifas em crescimento, tal como de muitas outras células com crescimento apical (pelos radiculares, tubos de polinização, etc.), geram campos eléctricos à sua volta. Outros estudos sugerem que tais campos estão intimamente envolvidos na absorção dos nutrientes e não no crescimento propriamente dito. Em vez disso,

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os componentes do citoesqueleto tornaram-se os candidatos mais fortes à força motriz do crescimento apical. Isto é compatível com muitos estudos efectuados em células animais onde protuberância tais como os pseudópodes parecem ser formados pela polimerização da actina.

Ainda pouco se sabe sobre o citoesqueleto e as suas funções nas hifas fúngicas, mas estudos com Saprolegnia (Oomycota) mostraram que os ápices conseguem crescer mesmo quando as hifas possuem uma turgidez insignificante porque, provavelmente, a força matriz da extensão apical consiste na polimerização da actina. Estes resultados parecem pôr de parte a hipótese da pressão de turgidez ser a força motriz responsável pelo alongamento das hifas. Existe uma grande abundância de actina nos ápices hifais e tanto a extensão apical como a corrente citoplasmática podem ser paradas pelo tratamento do fungo com citocalasinas que se ligam à actina.

O papel dos microtúbulos no crescimento apical é mais problemático. O crescimento apical pode ser cessado pela acção de fungicidas do grupo dos benzimidazois e pela grisofulvina, que interferem com a actividade dos microtúbulos. Coincidente com a paragem do crescimento dá-se uma diminuição progressiva no número de vesículas ao nível do ápice. Sendo assim, os microtúbulos devem estar de alguma forma envolvidos no crescimento apical: podem constituir uma armação através da qual as vesículas são direcionadas ao ápice, ou podem activamente transportar as vesículas.

As evidências actuais sugerem que o citoesqueleto, pela interacção com as proteínas motoras (por exemplo, miosina) e o cálcio, possui um papel central no crescimento apical. O ápice poderá ser empurrado para frente pela polimerização da actina (com uma parede viscoelástica que não oferecerá resistência a essa pressão), o protoplasma mover-se-á em direcção ao ápice pela acção da interacção das proteínas motoras com os componentes do citoesqueleto e as vesículas também poderão ser transportadas ao ápice pelos componentes do citoesqueleto.

3.1.8 Germinação

Na maioria dos fungos, a germinação dos esporos envolve uma fase inicial em que estes aumentam de volume, em consequência de um processo de hidratação (não envolve qualquer actividade metabólica). Esta fase é seguida por

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um novo aumento de volume devido à actividade metabólica do esporo. Durante esta última fase, ocorre deposição de novos componentes da parede, de uma forma mais ou menos uniforme, na camada mais interna da parede do esporo. Por fim, surge o tubo de germinação, uma jovem hifa numa zona localizada do esporo (Figura 3.5).

Figura 3.5 Fases da germinação de um esporo de Aspergillus niger. Fonte: Deacon (2006).

Durante a fase anterior à formação do tubo de germinação, a maioria dos novos componentes da parede são depositados numa zona que será mais tarde o ápice do tubo de germinação. Resumindo, a germinação dos esporos envolve uma fase inicial de crescimento não-polarizado da parede, seguida de uma fase de crescimento polarizado. Ainda não se sabe ao certo quais os mecanismos que determinam o local aonde se formam os novos ápices, mas sabe-se que estão envolvidos factores de ordem interna e externa (por exemplo, a tensão de oxigénio).

3.2 Ramificação das Hifas

A simples observação de colónias em ágar revela um certo número de pontos relevantes ao processo de ramificação:

 Os fungos mostram dominância apical. A maioria das hifas sofre ramificação apenas a determinada distância para trás dos seus ápices. Deste modo, o sistema de hifas lembra um pinheiro de natal, em que os ramos se tornam progressivamente mais longos e, por sua vez, ramificados, à medida que nos distanciamos do ápice principal da hifa. Não é conhecida a forma como este controlo é exercido, mas não existe evidência da implicação de hormonas;

 Os novos ramos tendem a divergir uns dos outros, preenchendo as lacunas entre as hifas já existentes. Nesta base pode-se assumir que as hifas respondem a gradientes de nutrientes, afastando-se das zonas de escassez que rodeiam as hifas já existentes, ou então que elas

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respondem negativamente a produtos metabólicos produzidos por outras hifas;

 A densidade de uma colónia fúngica, ou seja, o número de ramificações que apresenta, está directamente relacionada com o nível de nutrientes no meio. Deste modo, as colónias estão esparsamente ramificadas em meios pouco ricos e densamente ramificadas e meios ricos. De qualquer forma, a “força” do meio tem um efeito mínimo na taxa de crescimento linear da colónia. Dentro de certos limites, uma colónia atinge o mesmo tamanho, num determinado tempo, quer num meio rico ou pobre em nutrientes. Pode-se então generalizar que os ápices preexistentes na margem da colónia parecem ter uma demanda prioritária de nutrientes. Quaisquer nutrientes desnecessários ao crescimento destes ápices serão utilizados na ramificação.

Os novos “ramos” surgem pelo desenvolvimento de novos ápices à medida que a colónia cresce e sintetiza novo protoplasma. Os novos ápices podem surgir a partir de praticamente qualquer ponto ao longo da hifa, no entanto raramente se desenvolvem perto do ápice a não ser que o mesmo tenha sido danificado. Com frequência, os novos ápices surgem imediatamente atrás dos septos, provavelmente porque os septos interrompem até um certo grau o fluxo do citoplasma de modo que as vesículas poderão acumular-se nessa região.

Seja como for, a produção de um “ramo” requer a produção de um novo ápice a partir da parede celular madura preexistente. Como tal, esta deverá ser precedida por um processo de “amolecimento” da parede. Este processo poderá envolver a “entrega” localizada de enzimas líticas da parede transportadas em vesículas, mas uma outra possibilidade é que as enzimas líticas poderão já estar na parede, à espera de activação.

Estes pontos não são só de interesse puramente académico, já que eles estão directamente relacionadas com o comportamento dos fungos nos seus habitats naturais. Por exemplo, o micoparasita Phythium oliogandrum (Oomycota) consegue penetrar e destruir uma hifa de outro fungo após cinco minutos de contacto entre os dois (Figura 3.6). É quase certo que neste processo de penetração estão envolvidas enzimas e tem sido assumido que estas são produzidas pelo micoparasita.

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Figura 3.6 Esquema representando a interacção entre o micoparasita Pythium oligandrum (P) e o hospedeiro Trichoderma aureoviride (T). Fonte: Laing and Deacon (1991).

No entanto, a produção de enzimas líticas dos componentes da parede pelos micoparasitas é um fenómeno induzido pela presença de componentes da parede dos hospedeiros. Estas enzimas são tipicamente detectadas em filtrados dos meios de cultura de micoparasitas 24 horas após a adição de substratos indutores. É debatível se estas enzimas extracelulares induzíveis poderão ser produzidas (e ter tempo para actuar) pelo micoparasita após cinco minutos de contacto com o hospedeiro. Uma possibilidade alternativa, ainda que não demonstrada, é que o P. oligandrum poderá activar de forma localizada as enzimas líticas presentes nas paredes da hifa do hospedeiro. Seja como for, este exemplo demonstra a rapidez e o controlo preciso e localizado do processo de ramificação e dissolução da parede durante a interacção das hifas.

3.3 Cinética do Crescimento

A Figura 3.7 mostra uma curva de crescimento típica de um organismo unicelular (levedura), em cultura líquida sob condições de temperatura, pH, arejamento e agitação próximas das óptimas. A curva apresentada é típica de culturas batch, nas quais todos os nutrientes são adicionados no início da mesma. Trata-se de um sistema fechado.

Observa-se uma fase inicial denominada lag, seguida por uma fase de crescimento exponencial, uma fase de desaceleração, uma fase estacionária e por fim uma fase de autólise ou morte celular (as mesmas fases são apresentadas por um fungo miceliano com crescimento em superfície). O fim da fase exponencial e o início das fases subsequentes são condicionados por

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diferentes factores, que podem atuar em conjunto ou isoladamente: exaustão de um ou mais nutrientes, insuficiência de oxigénio, alteração do pH (por produção excessiva de ácidos orgânicos), acumulação de metabólitos a níveis tóxicos, etc.

Figura 3.7 Curva de crescimento de um organismo unicelular em cultura batch.

Os fungos filamentosos também apresentam uma fase de crescimento exponencial, quer em cultura líquida quer em meio sólido. No entanto, na maioria dos casos, os fungos filamentosos dificilmente mantêm esse tipo de crescimento em culturas submersas com agitação, em virtude de normalmente formarem pellets (colónias tridimensionais esféricas). As taxas de difusão de nutrientes e oxigénio para o interior do pellet, e a saída dificultada de produtos metabólicos, rapidamente limitam o crescimento à periferia do pellet.

As culturas batch (Figura 3.8) reproduzem as condições dos ambientes naturais em que vários fungos crescem. São utilizadas comummente em processos industriais, em virtude de durante as fases de desaceleração e estacionária serem produzidos e acumulados vários produtos metabólicos de

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interesse comercial (por exemplo, antibióticos, enzimas, ácidos orgânicos, etc.). As culturas batch são também utilizadas no fabrico de cervejas e vinhos, porque o álcool se acumula nas culturas durante as fases de desaceleração e estacionária.

Figura 3.8 Biorreactores batch. Na sua essência, um biorreactor é um recipiente, de dimensão variável, onde são misturados o meio de cultura e o biocatalizador em condições óptimas de reacção. A temperatura e o pH são cuidadosamente regulados. Ar estéril, por vezes com oxigénio, é borbulhado no meio de reacção. Em qualquer altura do processo, podem ser retiradas amostras, para ensaios químicos e biológicos. De modo a evitar possíveis contaminações, procede-se à injecção de vapor de água através de todas as válvulas de admissão, o que as mantém esterilizadas. No fim do período de reacção, que pode variar de horas a dias, o reactor é esvaziado de modo que o produto (ou produtos) possa ser isolado e purificado. Imagem de Allbiom .

A alternativa à cultura batch é a cultura contínua. Em poucas palavras, este tipo de cultura envolve a adição contínua de meio de cultura novo e a remoção de um volume correspondente de meio “antigo”, juntamente com algumas células microbianas. As culturas contínuas são utilizadas tanto para leveduras como para fungos filamentosos, mas no último caso é necessário utilizar uma lâmina

Referências

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