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A MULHER E SEUS AMORES

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Academic year: 2021

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A MULHER E SEUS AMORES

Libna Pires Gomes Paula Land Curi Paulo Roberto Mattos da Silva

Resumo:

A partir da experiência clínica com gestantes na maternidade do Hospital Universitário Antônio Pedro- HUAP, através do Programa SPAC podemos refletir sobre a mulher e o amor. Esperávamos encontrar, nas enfermarias, mulheres grávidas cujas demandas para a psicologia estivessem intimamente relacionadas às gestações de alto risco, por trazerem para o cenário do nascimento de um filho a possibilidade de sua morte. Contudo, a clínica com essas mulheres nos levou ao encontro com algo que está para além da gestação, que nos coloca diante de um enigma: o que quer uma mulher? São mulheres, grávidas, correndo por vezes risco de morte, que trazem para seus atendimentos suas tumultuadas relações amorosas, quer com suas mães, quer com seus companheiros. Normalmente, o que se apresenta são histórias de amor, nas suas mais diversas facetas. Mulheres que por amor à mãe, não conseguem se deslocar do lugar de filha; Mulheres que por amor aos seus homens, se submetem às mais diversas formas de violência; Mulheres que se submetem num ‘círculo vicioso’ às mães e aos homens. Enfim, mulheres que poderíamos dizer que ‘amam demais’. Apostando que nesse circuito algo atravessa a vida dessas mulheres mães e as relações que as mesmas estabelecerão com seus filhos, fez necessário refletir sobre a mulher e o amor, temas que atravessam o projeto Os confins da psicanálise em tela. A presença na maternidade, aparentemente feliz, revela a presença de temas que atravessam o campo do real: a mulher, o corpo, a morte e o amor. Por isso, a articulação entre o Programa SPAC e o Projeto Confins se fazem necessárias, visto que possibilita trocas e reflexões de temas que não cessam de não se inscrever na clínica cotidiana.

Palavras-chave: Mulher, Amor, Maternidade.

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Introdução

O Programa Extensionista Serviço de Psicologia da Área Cirúrgica (SPAC) vem sendo desenvolvido de forma ininterrupta, desde 1986. Oferece atendimento psicológico aos pacientes internados, especialmente, nas enfermarias cirúrgicas do Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP), além de realizar interconsultas.

Qualquer especialidade, quer clínica quer cirúrgica, pode solicitar atendimento psi para os seus pacientes e familiares.

O SPAC desenvolve um trabalho que articula os pilares da formação acadêmica, a saber, ensino, pesquisa e extensão. Ou seja, em concomitância, são desenvolvidos o Programa de Monitoria “Psicologia e Psicanálise em Território Médico”, o grupo de Pesquisa “CONFINS: lugar de trabalho clínico e de pesquisa em psicanálise e psicopatologia fundamental” e o Projeto Extensionista 'Os Confins da Psicanálise em Tela: a Mulher, o Corpo, o Amor e a Morte'. Além disso, recebe alunos vinculados a Coordenação de Psicologia da UFF, que estão cursando Estágios Supervisionados Específicos I, II, III e IV, com a ênfase na integração dos conteúdos aprendidos pelo aluno em sua formação – Ênfase curricular em Processos Clínicos e Atenção à Saúde.

Em 2014, o SPAC começou a desenvolver atividades rotineiras na maternidade do HUAP. Essa é uma maternidade de referência de alta complexidade, de alto risco materno e fetal, que recebe várias usuárias de Niterói, assim como da Região Metropolitana II. É um espaço que se diferencia de outras maternidades, pois, fica dentro de um hospital universitário de alta complexidade.

Além disso, por conta do risco de morte sempre presente, pela gravidade dos casos, não é incomum o procedimento da cesariana.

Como consequência direta dessa aproximação, os estagiários do Serviço passaram não só a acompanhar as mulheres internadas, mas também a auxiliar a equipe de saúde com suas demandas. A escuta clínica passou a ser ferramenta de trabalho, para se lidar com as implicações psicológicas não só das intercorrências médicas, mas também desse momento tão peculiar na vida de uma mulher que é a gestação.

Freud, entre outras preocupações, tomou o feminino enquanto uma questão fundamental para a psicanálise. Tentou desvelar o que é a mulher, o que quer uma

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mulher, os enigmas da feminilidade. A partir da relação da menina com sua mãe, do que chamou o pré-edípico, mostrou-nos que a maternidade e a feminilidade contêm em seu bojo o que chamamos aqui de amores.

1. Os primeiros contatos

Ao primeiro encontro com a gestante e logo somos tomados por um pensamento: ‘O que será que ela tem a dizer?’ Mas, como não poderia ser diferente... Dado o lugar prioritário que o corpo biológico tem em um hospital, fala-se e ouve-se muito sobre a condição orgânica. Descrições sobre estados físicos são sempre feitas, mesmo em um cenário cujo objeto principal não é a doença.

A visita de um psicólogo ao leito, a princípio, não quer dizer muita coisa.

Vestido com um jaleco – vestimenta obrigatória para circulação nas enfermarias – pode-se pressupor que ele demarque sua própria assepsia, se protegendo do sujeito que está diante dele.

O jaleco é um equipamento de proteção individual na prevenção das infeções, uma indumentária que faz parte da rotina dos profissionais de saúde, mas também é uma forma de demarcar os lugares daqueles que o vestem.

Passamos então ao segundo contato. Agora não mais com o paciente e sim com o médico e/ou enfermeiro. Novamente, o que vemos é que o único diálogo possível é aquele baseado em descrições dos quadros orgânicos que ali se apresentam. Essa, nada mais é, que a marca e a rotina hospitalar. Afinal, o objeto da medicina nunca foi o doente, mas sim a doença.

Na rotina hospitalar, perguntas sobre mal estares físicos, a alimentação, regularidade das evacuações e urina são sucedidas por respostas bastante curtas sobre alguns sintomas. Contudo, perguntamo-nos o que podemos fazer ali. Nossa

“conversa” não está balizada em aspectos biológicos, pois, atendemos sujeitos.

Além disso, chamamos atenção para o fato de não trabalharmos para a chamada Ordem Médica e sim para o sujeito-mulher- grávido e adoecido.

Lembramos com Goffman (1961) que o hospital é uma instituição total e, como tal, tem suas divisões básicas entre a equipe e os internos, os quais passam a ter a vida administrada e regulada por um saber sustentado pela equipe. No caso, o saber médico.

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O trabalho do estagiário no hospital, neste caso com uma gestante ou puérpera, deve promover a possibilidade do sujeito e ocupar novas posições. Ou seja, ser subjetivado. Mas, para isso, é necessário que o estagiário possa esquivar- se do próprio olhar e falas estereotipadas, para que as questões de sujeito possam se apresentar.

Contudo, há de se dizer que algo do sujeito estagiário por vezes comparece.

Imaginava-se que, numa maternidade de alto risco, os atendimentos se dariam em torno das gestações, dos bebês, da “coisa mais linda que é tornar-se mãe”. Mas, o que escutávamos eram as mulheres dizendo coisas bem distintas daquelas que achávamos que encontraríamos. Nada relacionado a algum tipo preocupação com sintomas ou agravo no quadro clínico, muito menos algo sobre seus bebês.

2. Nos encontros subsequentes...

Insistíamos nas visitas aos leitos, insistíamos que queríamos escutar o quê elas tinham a nos dizer. E, quando conseguimos abrir espaço para que pudessem falar sobre o que as acometia, para além do que se apresentava em seus corpos (biológico), os sujeitos revelavam conteúdos que não imaginávamos.

Em meio aquele cenário de vida e morte, os amores e as suas dores eram os temas que apareciam. Em especial, o amor e a dor tão presente na relação com suas mães e seus companheiros.

Foi exatamente isso que nos levou a querer tecer algumas considerações, a partir dos ensinamentos de Freud, sobre a mulher e o amor, visto que sabíamos, de antemão, que o pai da psicanálise, nos anos 20-30, tentou elucidar o que quer uma mulher – seu enigma.

Freud nos mostrou que tornar-se mulher e tornar-se mãe são coisas bem distintas. Que são processos que se originam no que ele chamou de fase pré- edípica, que se coloca para as meninas.

Ao percebeu que a mãe é objeto de amor para ambos os sexos e que o Édipo da menina é precedido por essa fase de intensa ligação com a mãe, protótipo das relações objetais posteriores, Freud conseguirá mostrar o quanto é complicado se falar sobre a mulher.

Mostra-nos também que a relação de uma menina com sua mãe comporta sentimentos ambivalentes e distintos, que mais retratam um história de amor sem

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fim. Isso porque o Complexo de Édipo nas meninas não se desfaz pela angústia de castração.

Contempla-se então que, ao fim da primeira fase de ligação com a mãe, a menina afasta-se dela e a recrimina pelo fato de não lhe ter dado um pênis apropriado. Isso faz com que ela se volte ao pai, entrando assim no CE. Contudo, essa passagem não é simples, visto que ela precisará manter a sua mãe como polo identificatório.

Por que trazemos aqui tais considerações? Bem, a clínica nos revelou que esperar um bebê produz voltas e passeios reflexivos, permeados de narrativas que retomam a sua própria posição de filha em relação a sua mãe. Como não existe uma mãe que não tenha um dia sido filha, o que se apresentou, nesses atendimentos, foram às relações amorosas e turbulentas das mulheres com suas mães e companheiros, que, como bem sinalizou Freud, são repetições de suas más relações com suas mães.

O encontro com essas gestantes mostraram-nos que ter um filho, tornar-se mãe, não são tarefas simples. Estão para além do processo biológico da gravidez. A gestação convoca o sujeito a um intenso trabalho psíquico, sem o qual não poderá aceder a uma nova posição.

Conclusão

O Hospital Universitário Antônio Pedro está no nível terciário e quaternário de hierarquia do Sistema Único de Saúde, atendendo a casos de alta complexidade.

Dessa forma, sua maternidade recebe mulheres com gravidezes de risco, quer materno quer fetal alto risco materno e fetal, e o Serviço de Psicologia da Área Cirúrgica, desde 2014, tem se aproximado deste setor com o objetivo de prestar suporte psicológico às mulheres que nele estão internadas.

Esperávamos encontrar mulheres grávidas com demandas psicológicas relacionadas às gestações ‘complicadas’, por trazerem para o cenário do nascimento de um filho a possibilidade de sua morte. Contudo, os atendimentos clínicos a essas mulheres nos levaram ao encontro com algo que está para além da gravidez. As histórias contadas revelavam íntima relação com as questões amorosas, em suas mais diversas facetas. Por isso, faz-se necessária uma reflexão

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sobre o lugar que tem o amor na trajetória da constituição psíquica de um sujeito mulher, a relação que esse tem na maternidade.

Por fim, vale ressaltar que, articulado ao trabalho na maternidade, está o projeto extensionista Os confins da Psicanálise em Tela. Este pretende, através da arte cinematográfica, tangenciar as questões que se articulam e se presentificam nos atendimentos realizados com essas mulheres. Ou seja, alguns filmes, cujas temáticas foram a mulher e o amor, foram assistidos e debatidos, a fim de propiciar reflexões importantes sobre e da clínica, que são de difícil apreensão.

Referências

GOFFMAN, Erwing. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo: Editora Perspectiva. 1961.

FREUD, Sigmund. (1925). Algumas consequências psíquicas da distinção anatômica entre os sexos. In: Obras completas de Sigmund Freud: Edição standard brasileira. Rio de Janeiro: Imago, 1976.

______________. (1931). Sexualidade feminina. In: Obras completas de Sigmund Freud: Edição standard brasileira. Rio de Janeiro: Imago, 1976.

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