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A REPERCUSSÃO DA TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

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Academic year: 2018

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ADRIANA FELIX DOS SANTOS

A REPERCUSSÃO DA TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA NO

DIREITO PENAL BRASILEIRO

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação da Professora Fernanda Cláudia Araújo da Silva.

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TERMO DE APROVAÇÃO

A REPERCUSSÃO DA TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA NO

DIREITO PENAL BRASILEIRO

Por

ADRIANA FELIX DOS SANTOS

Este estudo Monográfico foi apresentado no dia 20 de junho de 2008, à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Direito, tendo sido aprovado pela Banca Examinadora composta por:

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________ Profa. Fernanda Cláudia Araújo da Silva

Orientadora - UFC

________________________________________________ Metoniza Nogueira V. C. de Albuquerque

Examinadora - UFC

________________________________________________ Francisca Iara de França Rodrigues

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Para minha mãe, que não mais habita entre nós.

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AGRADECIMENTOS

Sempre e por tudo, a Deus.

Ao meu esposo Rafael Brito dos Santos, e a meus filhos, Rafael e Rubens, que souberam compreender as muitas horas que, à força da paixão pelos estudos, furtei ao nosso convívio familiar. O estímulo que me ofereceram possibilitou este momento.

Ao meu pai, pelo valoroso incentivo e apoio que ofereceu para a realização de minhas atividades acadêmicas.

À Profa. Fernanda Cláudia, que muito me honrou com a orientação deste trabalho.

À Dra. Metoniza, pela orientação permanente e por me haver apresentado, de maneira paciente e motivadora, uma nova forma de pensar a pesquisa em Direito.

À minha amiga, Iara, ser humano admirável, por sua compreensão, apoio e incentivo.

À Universidade Federal do Ceará, por ser um lugar de referência para o aprofundamento do conhecimento.

À Biblioteca da Faculdade de Direito da UFC, por seu auxílio na localização do material bibliográfico.

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“Nos meus cargos e escritos nunca fui um apaniguado, nem tomei como divisa de minha vida o princípio de quem me dá pão tem sempre razão.

Pelo contrário, para mim o justo é sempre justo e o injusto, injusto, mesmo que isso afete o meu soberano, os meus superiores, ou seja quem for.”

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ϲ

RESUMO

O trabalho teve como objetivo investigar a possibilidade de o sistema penal brasileiro assimilar a teoria da imputação objetiva, pois vem sendo admitida nos últimos tempos por alguns penalistas nacionais, como elemento integrante da tipicidade penal. Promove uma releitura de institutos penais por meio da aplicação da teoria da imputação objetiva. Aborda temas e questões de grande polêmica na atualidade, buscando soluções dentro da teoria da imputação objetiva, numa tentativa de aproximação da concretização do princípio da justiça. Assim, será responsabilizado somente quem deu, verdadeiramente, causa a produção de um resultado danoso, diminuindo gradativamente as injustiças cometidas na aplicação da norma penal.

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ABSTRACT

The study aimed to investigate the possibility of the Brazilian penal system treats The objective Imputation Theory, as has been permitted in recent times by few Brazilian doctriners, as part of the typical characteristics criminal. Promotes reflections of institutes criminal by the application of the theory of imputation objective. It addresses topics and issues of great controversy in actuality, seeking solutions within The objective Imputation Theory, in an attempt to align the implementation of the principle of justice. It will therefore be liable only those who gave, really, cause the production of a harmful result, gradually reducing the injustices committed in the application of the criminal law.

Keywords: Type criminal. The objective Imputation Theory. Risk allowed. Risk prohibited.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 10

1 A TEORIA DO CRIME... 12

1.1 Dos requisitos essenciais do crime... 13

1.2 Sujeitos e objetos do crime: conceitos essenciais ao estudo do delito... 18

1.2.1Sujeito ativo... 18

1.2.2 Sujeito passivo... 19

1.2.3 Objetos do crime... 20

1.2.3.1 Objeto jurídico... 20

1.2.3.2 Objeto material... 20

1.3 Do fato típico... 21

1.3.1 Da conduta... 22

1.3.1.1 Do dolo... 28

1.3.1.2 Da culpa... 32

1.3.2 Do resultado... 38

1.3.3 Do nexo de causalidade... 40

1.3.4 Da tipicidade... 49

1.4 Da antijuridicidade... 51

2 A TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA... 53

2.1 Conceito... 53

2.2 Princípios teóricos... 56

2.2.1 Princípio da confiança... 56

2.2.2 Princípio da proibição de regresso... 57

2.3 Bases doutrinárias da teoria da imputação objetiva... 58

2.3.1 Risco permitido e risco proibido... 58

2.3.2 Criação do risco proibido e relevante... 60

2.3.3 Diminuição do risco... 61

2.3.4 Incremento do risco... 63

2.3.5 Objeto jurídico já exposto à provável afetação... 63

2.3.6 Cursos causais hipotéticos (aceleração de causalidade de substituição)... 63

2.3.7 Condutas alternativas conformadas ao Direito... 64

2.3.8 Âmbito de proteção da norma penal incriminadora... 67

2.3.9 Ações a próprio risco... 68

2.3.10 Riscos trasladados ao âmbito de responsabilidade alheio... 73

2.3.11Resultados tardios (lesões conseqüentes ou resultados sobrecondicionados)... 74

2.4 Questões de relevo dentro da teoria da imputação objetiva... 76

2.4.1 Constituição pessoal patológica da vítima... 76

2.4.2 A questão do dolo geral... 78

2.4.3 A questão da autoria incerta... 80

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ϵ

2.4.5 Conhecimentos especiais... 81

3 A APLICABILIDADE DA TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA: PONTOS IMPORTANTES... 82

3.1 Limites da teoria do nexo causal... 82

3.2 Alguns pontos práticos e doutrinários que desafiam a teoria do nexo causal e sua resolução frente à teoria da imputação objetiva... 90

3.2.1 Crime impossível... 91

3.2.2 Tentativa... 92

3.2.3 Violência desportiva... 93

3.2.4 Ofendículos... 96

3.2.5 Aborto anencefálico... 96

3.2.6 Crimes ambientais... 99

3.2.7 Alguns casos concretos à luz da teoria da imputação objetiva... 101

3.3 A imputação objetiva e a necessidade de normatização de seus pressupostos... 103

CONCLUSÃO... 106

REFERÊNCIAS... 110

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INTRODUÇÃO

Elabora-se, por meio desta monografia, através de uma pesquisa doutrinária e jurisprudencial, um trabalho de cunho prático e conceitual, com o desiderato de explicar, com um certo grau de aprofundamento, a teoria da imputação objetiva. Entretanto, tal explicação não é um fim em si mesma, tendo por escopo indicar sua origem e finalidade na resolução de problemas não-solucionados pelo causalismo e finalismo.

O primeiro capítulo traz a análise da Teoria da Geral do Crime. Tal análise é de grande importância para que, no segundo capítulo, seja possível o estudo das bases fundamentadoras da Teoria da Imputação Objetiva, posto que, cada uma das mencionadas teorias, tem uma influência específica em vários institutos inseridos no estudo do crime.

A teoria da imputação objetiva significa, num conceito preliminar, atribuição (imputação) de uma conduta ou de um resultado normativo (jurídico) a quem realizou um comportamento criador de um risco juridicamente proibido. Tem guarida nas idéias de que o resultado normativo só pode ser imputado a quem realizou uma conduta geradora de um perigo juridicamente proibido e de que o evento deve corresponder àquele que a norma incriminadora procura proibir. Trabalha com os conceitos de risco permitido (excludente da tipicidade) e risco proibido (a partir do qual a conduta adquire relevância penal). Como métodos auxiliares, serve-se dos princípios da confiança, da proibição de regressus, do consentimento e participação do ofendido e dos conhecimentos especiais do autor a respeito de condições e circunstâncias pessoais da vítima ou da situação de fato.

Não há dúvida de que a teoria da imputação objetiva está operando uma autêntica revolução na teoria da tipicidade, fruto de uma linha metodológica oposta ao finalismo, que é a teoria da ação adotada pelo Código Penal Brasileiro em vigor.

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ϭϭ

Considerando que essa tendência está começando a repercutir na doutrina penal, o objetivo desse trabalho não é trazer à colação novas idéias relacionadas a essa teoria, mas simplesmente expor seus fundamentos de tal modo que sejam ententíveis os principais aportes dessa teoria à atual teoria jurídica do delito.

Isto é, em síntese, no que consiste esta pesquisa, cujo tema fora escolhido, principalmente, pela grande polêmica que o mesmo representa e pelas controvérsias que ainda ostenta.

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ϭϮ

1 A TEORIA DO CRIME

A teoria do crime constitui matéria indispensável à compreensão e à justa aplicação do Direito Penal em qualquer país civilizado do mundo. Por meio da teoria geral do delito são definidas as características comuns a todos os delitos previstos na legislação de um país. São através das análises objetiva e subjetiva de um fato que se pode caracterizá-lo como uma infração penal, passível de sanção. Sobre tal estudo, deve-se ter como foco as palavras dos doutrinadores Eugênio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli (2004, p.366), que, ao ponderarem sobre a teoria do crime, afirmaram ser a mesma:

[...] a parte da ciência do direito penal que se ocupa em explicar o que é o delito em geral, quer dizer, quais são as características que devem ter qualquer delito. Esta explicação não é um mero discorrer sobre o delito com interesse puramente especulativo, senão que atende à função essencialmente prática, consistente na facilitação da averiguação da presença ou ausência do delito em cada caso concreto.

Assim, prescinde de demasiadas argumentações a importância do estudo da teoria do crime para a correta aplicação de nossas normas penais, haja vista, principalmente, o princípio da intervenção mínima e o princípio da fragmentariedade, os quais norteiam a elaboração de nosso direito penal.

É que o direito penal é um ramo de exceção, que deve ser buscado apenas quando os outros ramos do direito se mostrarem limitados para coibir certas condutas antijurídicas. Por isso, o direito penal fundamenta-se no princípio da intervenção mínima, porque sua aplicação ocorre quando as demais espécies de direito mostrarem-se ineficientes para coibir abusos e lesividades a bens considerados de maior importância. Apenas neste momento, surge o direito penal como opção última de proteger tais interesses.

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ϭϯ

comparação concreta destas mesmas normas com a amplitude das demais vigentes em nosso ordenamento.

O estudo da teoria do crime limita e caracteriza estas condutas ofensivas aos bens e interesses de maior importância, os quais devem ser protegidos pelo direito penal. E ao limitar e descriminar estas condutas, tal estudo presta serviço a outro princípio de igual importância na esfera do direito penal, o princípio da legalidade, que garante a não aplicação de pena a condutas não descritas como crime em nosso Direito.

Tal princípio é de singular importância em nosso ordenamento, visto que, de outra forma, o princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento basilar da Constituição Federal de 1988, estaria irremediavelmente afetado, assim como também a segurança jurídica que sustenta todo o ordenamento normativo posto.

Deste modo, conclui-se que a aplicação destes três princípios garante a descrição penal das condutas consideradas graves, em relação à ofensa de bens jurídicos tidos como os mais importantes em nosso ordenamento. E a teoria do crime, como caracterizadora destas condutas, serve para aplicar as normas que as definem ao caso concreto, procedendo à vinculação correta de um fato à descrição penal do delito. Eis aí comprovada a sua importância.

Entretanto, é de bom alvitre salientar, que o estudo da teoria do crime desenvolvido neste trabalho é de base introdutória para a análise do real tema a ser aqui discutido, a saber, a teoria da imputação objetiva. Contudo, para que se proceda a uma correta e lógica discussão do tema proposto, faz-se necessário o conhecimento de alguns conceitos e teorias estudadas no âmbito da teoria do crime, onde, como iremos demonstrar, insere-se a teoria da imputação objetiva. Nestes termos, passemos à análise dos requisitos do crime e de alguns conceitos e teorias essenciais ao prosseguimento lógico deste trabalho.

1.1 Dos requisitos essenciais do crime

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vago ao fato criminoso.

Com isso, na elaboração do estatuto penal de 1940 e na reforma de 1890, o legislador transferiu a missão de conceituar genericamente o fato-crime para a doutrina, evitando a repetição da fórmula equivocada do Código de 1890.

Os conceitos doutrinários apresentados a partir do início do Século XX podem ser separados em formais, substanciais e analíticos, segundo o critério adotado pelo seu formulador.

Feita esta observação, é possível se iniciar o estudo dos mencionados requisitos, os quais estruturam o conceito de crime, vendo este por um viés analítico. É importante especificar o conceito com o qual iremos trabalhar, pois existem vários no que concerne à definição de crime, sendo que, dentre eles, os de maior relevo são o conceito material, o conceito formal, e ainda, para autores como E. Magalhães Noronha (2000, p.97), o conceito analítico de crime.

O primeiro deles diz ser o crime uma violação aos bens de maior importância protegidos pela norma penal. Nele, não há uma especificação de requisitos e nem de elementos estruturantes da idéia de crime, mas apenas, como afirma Damásio Evangelista de Jesus (2002b, p.151), é colocado “em destaque o seu conteúdo teleológico, a razão determinante de constituir uma conduta humana infração penal e sujeita a uma sanção”. Ou seja, é dado ênfase à tutela dos bens protegidos penalmente. Como exemplo temos o conceito de crime elaborado por E. Magalhães Noronha (2000, p.97), citado anteriormente.

Já o segundo, qual seja, o conceito formal de crime, nas palavras de Rogério Greco (2005, p.156), consubstancia-se em aduzir que delito “seria toda conduta que atentasse, que colidisse frontalmente contra a lei penal editada pelo Estado”. Apesar de grande importância, tal conceito não analisa a estrutura do delito, o que vem a ocorrer apenas dentro do conceito analítico de crime, ou conceito dogmático, o qual, segundo E. Magalhães Noronha (2000), caracteriza-se por definir a infração penal como um fato típico, antijurídico e culpável.

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Para Damásio E. de Jesus (2002b), bem como para René Ariel Dotti (2005) e Julio Fabbrini Mirabete (2002), crime é fato típico e antijurídico (visão bipartida). Para Rogério Greco (2005) e para Cezar Roberto Bitencourt (2004), crime é fato típico, antijurídico e culpável (visão tripartida).

Esta discussão é de grande relevo no estudo do conceito de crime, e merece algumas ponderações. Para aqueles que defendem a visão tripartida do delito, aduzindo ser ele um fato típico, antijurídico e culpável, a fundamentação da permanência da culpabilidade no conceito de crime encontra-se em considerar que o fato da mesma ser pressuposto para a aplicação da pena, não tem o condão de retirá-la do mencionado conceito, pois, de igual modo, são também pressupostos para a aplicação da pena o fato típico e a antijuridicidade (GRECO, 2005).

Além deste ponto, mas sobre esta mesma questão, os defensores da visão tripartida ainda discutem outro argumento dos adeptos da visão bipartida. É que estes afirmam que a culpabilidade é tão somente pressuposto para a aplicação da pena, também, porque deste modo aquela é tratada pelo Código Penal. Isto, dizem os adeptos da teoria bipartida, é claramente vislumbrado com a simples leitura dos artigos que tratam das excludentes de culpabilidade. É que em todos eles encontraremos, como conseqüência da ausência de culpabilidade, a isenção de pena, permanecendo inalterada a existência do crime. Como refutação a este argumento, os defensores da visão tripartida afirmam que tal tratamento não é dispensado apenas às excludentes da culpabilidade, mas também a outras causas impeditivas da punibilidade. Sobre a questão, veja-se o que afirma Rogério Greco (2005, p.162):

Deve ser ressaltado que o Código Penal também utiliza a expressão isento

de pena, ou alguma outra com ela parecida, para afastar outras

características do crime, ou mesmo apontar causas que impedem a punibilidade do injusto culpável, conforme podemos verificar pela redação do § 1º do art.20 do Código Penal, que cuida do chamado erro de tipo permissivo, ou mesmo do art.181, que ao prever as escusas absolutórias disse ser isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos no Título II (Dos crimes contra o Patrimônio) do Código Penal, em prejuízo: I – do cônjuge, na constância da sociedade conjugal; II – de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou natural. Nesta última hipótese, o Código não está lidando com causas que eliminam a culpabilidade, uma vez que o fato é praticado pelas pessoas por ele elencadas é típico, ilícito e culpável. Somente por questões de política criminal é que a lei entendeu por bem em não puni-los.

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ao asseverar que a culpabilidade é apenas um pressuposto para a aplicação da pena, e não um requisito essencial do crime. Sobre a argumentação dos defensores da teoria tripartida, acerca de também o fato típico e a antijuridicidade serem pressupostos para a aplicação da pena, afirma René Ariel Dotti (2005, p.337):

Apesar das longas observações apontadas pelo ilustre e sensível crítico – entre elas a de que também a ação típica e a antijuridicidade (rectius:

ilicitude) são pressupostos da pena – não têm elas o condão de rejeitar a

mais simples das proposições que tenho sustentado: o crime, visto como

ação tipicamente ilícita é um fenômeno distinto e separável da pena cuja

imposição depende dos pressupostos da imputabilidade, consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa, i.e., da culpabilidade.

Ou seja, com essa argumentação, o autor deixa claro que, apesar das críticas ao conceito bipartido de crime, não se consegue refutar o fato de que para a aplicação da pena devem ser observados os pressupostos da imputabilidade, da consciência da ilicitude e da exigibilidade de conduta diversa, que são elementos da culpabilidade.

Portanto, o fato típico e a antijuridicidade não são observados quando da aplicação da pena. E isto ocorre não porque estes não precisem existir para a aplicação da pena, mas, simplesmente, porque eles fazem parte de uma análise anterior, que foi a análise da existência do crime. Tendo esta sido feita, e comprovada a existência do delito, passa-se à análise da culpabilidade, que verificará a reprovabilidade da conduta criminosa em face do agente, para a posterior aplicação da pena. Neste estágio, a existência ou não de crime é discussão superada, tratando-se agora apenas da análise da culpabilidade do agente para a possível aplicação da pena.

Quanto ao fato de o Código Penal não reservar apenas às excludentes da culpabilidade as expressões que denotam a exclusão da pena, isto não tem o condão de eliminar o fato de que todas as excludentes da culpabilidade são assim tratadas, enquanto que às excludentes da antijuridicidade são reservadas expressões que denotam a total inexistência do crime.

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fora as excludentes da antijuridicidade, ou da tipicidade, relativas ao fato típico e antijurídico. Isto demonstra a total separação entre as mesmas. Sobre tal questão, observe-se o que pondera Damásio Evangelista de Jesus (2002b, p.455):

Quando o CP trata de causa excludente da antijuridicidade, emprega

expressões como ‘não há crime’ (art.23, caput), ‘não se pune o aborto’

(art.138, caput), ‘não constituem injúria ou difamação punível’ (art.142,

caput), ‘não constitui crime’ (art.150, § 3º) etc. Quando, porém, cuida de

causa excludente da culpabilidade, emprega expressões diferentes: ‘é isento

de pena’ (arts. 26, caput, e 28, § 1º), ‘só é punível o autor da coação ou da

ordem’ (art.22, pelo que se entende que ‘não é punível o autor do fato’). Qual a razão da diferença? Maggiore, lembrado por José Frederico Marques, ensinava que desde que exista causa de exclusão da ilicitude não há crime, pois um fato não pode ser ao mesmo tempo lícito e antijurídico; quando, porém, incide uma causa de exclusão da culpabilidade o crime existe, embora não seja efetivo, não em si mesmo, mas em relação ao agente

declarado não culpável. Assim, Maggiore admite a existência de crime não

punível. É que, segundo ele, para que exista crime a parte objecti, bastam

dois requisitos: fato típico e antijuridicidade. A culpabilidade liga o agente à punibilidade, e.e., a pena é ligada ao agente pelo juízo de culpabilidade. O crime existe por si mesmo, mas, para que o crime seja ligado ao agente, é necessária a culpabilidade. Observava José Frederico Marques que o CP brasileiro de 1940 aceitou a orientação de Maggiore. Para a existência do crime, segundo a lei penal brasileira, é suficiente que o sujeito haja praticado um fato típico e antijurídico. Objetivamente, para a existência do crime, é prescindível a culpabilidade. O crime existe por si mesmo com os requisitos ‘fato típico’ e ‘ilicitude’. Mas o crime só será ligado ao agente se este for

culpável. É por isso que o CP, no art.23, emprega a expressão ‘não há crime’ (as causas de exclusão da antijuridicidade excluem o crime); nos arts.26,

caput, e 28, § 1º, emprega a expressão ‘é isento de pena’ (corresponde a

‘não é culpável’). Se a expressão ‘é isento de pena’ significa ‘não é culpável’, subtende-se que o Código considera o crime mesmo quando não existe a

culpabilidade em face do erro de proibição (art.21, caput, 2ª parte).

Ou seja, a culpabilidade é pressuposto que recai sobre o agente, e não sobre o fato criminoso em si. A culpabilidade é apenas um juízo de reprovabilidade da conduta em função da pessoa do agente, com o fim de se averiguar a possibilidade de aplicação de pena, observando o grau e a espécie da mesma.

A manutenção da culpabilidade como requisito essencial do crime apenas se justificava dentro de uma análise causal do delito, onde o dolo e a culpa eram estudados dentro do conceito de culpabilidade.

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do fato típico. Nestes termos, filiamo-nos à corrente que aduz ser o crime fato típico e antijurídico, sendo estes seus elementos essenciais.

Contudo, reafirmamos nossa predileção pela visão bipartida de crime, posto que consideramos o estudo da tipicidade, bem como da conduta, ativa ou omissiva, dentro do conceito de fato típico, e não dissociados em elementos soltos, mas, em giro diverso, unidos no citado conceito, que também alberga o estudo do resultado e do nexo causal.

Portanto, seguindo a análise do conceito analítico de crime, dentro da visão bipartida, aquele se caracteriza por ser um fato típico e antijurídico. Tais elementos são tidos como essenciais à existência do crime. Por essencial entende-se aquilo que é imprescindível, ou seja, aquilo que não pode faltar. Portanto, sendo o fato típico e a antijuridicidade requisitos essenciais do crime, ausente um deles, não existe fato delituoso. Neste diapasão, prosseguindo ao estudo da teoria do crime, resta-nos analisar cada um destes requisitos e seus elementos estruturantes, o que será feito no tópico que se seguirá.

1.2 Sujeitos e objetos do crime: conceitos essenciais ao estudo do delito

Antes de procedermos a uma análise do fato típico e de seus elementos, bem como do conceito de antijuridicidade, alguns termos que passarão a ser utilizados neste trabalho devem ser conceituados. São eles: sujeito ativo, sujeito passivo, objeto material e objeto jurídico do crime.

1.2.1 Sujeito ativo

João José Leal (1991, p.147) conceitua que por ser o crime uma ação humana, somente o ser vivo, nascido de mulher, pode ser autor de crime, embora em tempos remotos tenham sido condenados, como autores de crimes, animais, cadáveres e até estátuas. Para ele, a conduta (ação ou omissão) é produto exclusivo do homem. A capacidade de ação, de culpabilidade, exige a presença de uma vontade, entendida como faculdade psíquica da pessoa individual, que somente o ser humano pode ter.

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reconhecendo sua existência, principalmente após a promulgação da Lei de Crimes Ambientais. Nestes termos, veja-se o que argumenta Damásio E. de Jesus (2002b, p.168):

De ver-se que a Const. Federal de 1988, em seus arts. 173, § 5º, e 225, § 3º, determina que a legislação ordinária estabeleça a punição da pessoa jurídica nos atos cometidos contra a economia popular, a ordem econômica e financeira e o meio ambiente. Embora haja controvérsia quanto ao conteúdo do texto, de reconhecer que deixa margem à admissão da responsabilidade penal da pessoa jurídica. E a Lei de Proteção Ambiental (Lei n. 9.605, de 12-2-1998), em seus arts.3º e 21 a 24, prevê essa responsabilidade. Logo, hoje, em vez de criticar, devemos reconhecer que a legislação penal brasileira admite a responsabilidade criminal de pessoa jurídica e procurar melhorar a nova sistemática. Em suma, alterando a posição anterior, hoje reconhecemos invencível a tendência de incriminar-se a pessoa jurídica como mais uma forma de reprimir a criminalidade.

Nos mesmos termos posiciona-se Fernando Capez (2002, p.136):

[...] a pessoa jurídica pode ser sujeito ativo de crime. O princípio societas

delinquere non potest não é absoluto. De fato, há crimes que só podem ser

praticados por pessoas físicas, como o latrocínio, a extorsão mediante seqüestro, o homicídio, o estupro, o furto etc. Existem outros, porém, que são cometidos quase sempre por meio de um ente coletivo, o qual, deste modo, acaba atuando como um escudo protetor da impunidade. São as fraudes e agressões cometidas contra o sistema financeiro e o meio ambiente. Nestes casos, com o sucessivo incremento das organizações criminosas, as quais atuam, quase sempre, sob a aparência da licitude, servindo-se de empresas ‘de fachada’ para realizarem determinados crimes de gravíssimas repercussões na economia e na natureza. Os seus membros, usando dos mais variados artifícios, escondem-se debaixo da associação para restarem impunes, fora do alcance da malha criminal. 1.2.2 Sujeito passivo

Como ensina E. Magalhães Noronha (2000, p.115), sujeito passivo:

É o titular do bem jurídico lesado ou ameaçado. É o homem. Protege-o a lei, mesmo antes de seu nascimento, iniciada que seja apenas a gestação, punindo o crime de abortamento. Não obstante a inexistência, aí, da criatura humana, a lei se antecipa, protegendo a vida no sentido biológico. Bastante

expressivo é haver o Código classificado tal crime como contra a vida e, no

título dos delitos, contra a pessoa.

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ϮϬ

Por fim, quanto às espécies de sujeitos passivos, veja-se o que nos ensina Julio Fabbrini Mirabete (2002, p.125):

Há duas espécies de sujeito passivo. Fala-se em sujeito passivo constante ou formal, ou seja, o Estado que, sendo titular do mandamento proibitivo, é lesado pela conduta do sujeito ativo. Sujeito passivo eventual ou material é o titular do interesse penalmente protegido, podendo ser o homem (art.121), a pessoa jurídica (art.171, § 2º, V) o Estado (crime contra a Administração Pública) e uma coletividade destituída de personalidade jurídica (arts. 209, 210 etc.).

1.2.3 Objetos do crime

1.2.3.1 Objeto jurídico

Objeto jurídico do crime é o bem ou interesse que a norma penal tutela. E bem, nas palavras de E. Magalhães Noronha (2000, p.115), consiste naquilo que “satisfaz a uma necessidade do homem, seja de natureza material ou imaterial: vida, honra etc”. Quanto ao conceito de interesse, o citado doutrinador aduz que o mesmo “é a relação psicológica em torno desse bem, é sua estimativa, sua valorização”. (NORONHA, 2000, p.115).

1.2.3.2 Objeto material

Seguindo a orientação de Julio Fabbrini Mirabete (2002, p.127), objeto material do crime:

[...] é a pessoa ou a coisa sobre a qual recai a conduta criminosa, ou seja, aquilo que a ação delituosa atinge. Está ele direita ou indiretamente indicado na figura penal. Assim, ‘alguém’ (o ser humano) é objeto material do crime de homicídio (art.121), a ‘coisa alheia móvel’ o é dos delitos de furto (art.155) e roubo (art.157), o ‘documento’ o é do crime previsto no art.298 etc.

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crime, qual seria, o homem.

Por fim, vale salientar que existe a possibilidade de se encontrar crimes sem objeto material. Sobre a questão, assevera E. Magalhães Noronha (2000, p.116), com quem concordamos:

Embora controvertida a questão, somos dos que opinam que nem todo crime tem objeto material. Pode ele existir sem ele. Dá-se isto nos delitos de mera atividade (n.59). Assim, no crime de ‘ato obsceno’ (art.233), que se satisfaz com o comportamento impudico do sujeito ativo e com a possibilidade de ser visto.

De posse destes conceitos de essencial importância, segue-se no estudo da teoria do crime, passando-se à análise do primeiro requisito deste: o fato típico.

1.3 Do fato típico

O fato típico, juntamente com a antijuridicidade, é um requisito essencial ao conceito de crime. Nestes termos são os ensinamentos de Damásio E. de Jesus (2002b, p.157):

Como conseqüência do conceito formal do crime, para que seja considerado delituoso um comportamento e aplicada a sanção ao seu sujeito, é preciso que constitua um fato típico e antijurídico. São, pois, requisitos do crime:

1º) o fato típico; e 2º) a antijuridicidade.

São denominados requisitos porque faltando um deles não há a figura delituosa. São indispensáveis.

Nestes termos, é de se concluir que não há crime sem que seja considerada a conduta um fato típico e antijurídico.

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ϮϮ

E, por dedução lógica, podemos concluir que é por este motivo que não se encontra dentro dos tipos penais, explicitamente, mandamento proibitivo de qualquer conduta, mas apenas a descrição do fato delituoso. É que é isto que torna uma conduta criminosa, sua descrição legal como crime. Deste modo, o agente, quando comete uma infração penal, não infringe a lei, mas sim molda sua conduta na descrição que aquela contém. O que o sujeito infringe não é o preceito legal, mas o mandamento proibitivo contido de maneira implícita na lei penal (JESUS, 2002b).

Esta é a técnica legislativa adotada pelo nosso ordenamento na criação de normas penais incriminadoras, a qual é exigida pelo princípio da legalidade estrita constitucionalmente garantido, que determina a necessidade da exata descrição legal de uma conduta, para que esta venha a ser considerada criminosa. O fato que se molda a esta descrição legal é fato típico.

Mas o estudo do fato típico não se exaure na sua conceituação. Como o mesmo caracteriza-se por ser o fato concreto descrito na norma penal incriminadora como delito, aquele deve conter em si todos os elementos necessários ao enquadramento no tipo penal. E tais elementos são a conduta, o resultado, o nexo de causalidade e a tipicidade. Alguns autores já colocam a imputação objetiva como quinto elemento formador do fato típico; entretanto, não analisaremos esta questão neste capítulo, posto que a imputação objetiva é tema de análise específica em capítulo posterior.

Assim, o fato típico é formado pelos seguintes elementos: conduta, resultado, nexo de causalidade e tipicidade, os quais são imprescindíveis para a existência do mesmo, como pondera Julio Fabbrini Mirabete (2002, p.101): “Caso o fato concreto não apresente um desses elementos, não é fato típico e, portanto, não é crime”. Tal afirmação será melhor estudada em tópico posterior, visto que a mesma não concorda inteiramente com uma análise mais profunda da teoria do crime.

Nestes termos, passemos ao estudo específico de cada elemento formador do fato típico.

1.3.1 Da conduta

(23)

Ϯϯ

p.227): “(...) é a ação ou omissão humana consciente e dirigida a determinada finalidade”. Diante de tal conceito, podemos observar que a conduta é termo amplo, onde se encontra tanto a ação, quanto a omissão penalmente relevante.

Muitos autores, no decorrer da história do Direito Penal, insurgiram-se contra esta conceituação ampla de conduta, aduzindo que ação e omissão são eventos contrastantes, visto que o primeiro caracteriza-se por ser um movimento corpóreo, um ato positivo, enquanto que o segundo define-se como uma ausência de movimento, como um ato negativo. Entretanto, tais argumentos não servem para embasar a retirada da omissão do estudo da conduta, principalmente após a equiparação entre ação e omissão contida no nosso Código Penal (art.13). Sobre este assunto, merecem aplausos as bem escolhidas palavras do doutrinador Paulo José da Costa Jr. (2000, p.42), que sobre as objeções levantadas para contestar a coexistência da ação e da omissão dentro do conceito de conduta, assim assevera:

Não procedem as objeções argüidas. Sempre que se reúnem elementos diversos debaixo de um mesmo gênero comum, uns negam os outros. O fato de se negarem, ou de existirem entre eles sulcos distintivos, nítidos e profundos, não impedem sejam abarcados num conceito mais amplo, desde que neles se vislumbrem traços comuns. Nas características idênticas assenta-se a unidade que os reúne numa categoria superior, como os vertebrados e invertebrados poderão ser compreendidos no gênero animais. Desde logo poder-se-á entrever um denominador comum entre ação e omissão. Ambas constituem um modo de ser do homem, um seu comportamento na realidade espacial e temporal. Não só. Tanto na ação, quanto na omissão, no plano da qualificação normativa, destaca-se outra nota comum: a antijuridicidade. Ademais, os elementos contidos no tipo poderão ser realizados de forma comissiva ou de maneira omissiva. É a norma, portanto, quem proporciona contorno unitário a ambas as espécies do gênero conduta. Finalmente: quer na conduta positiva (ação), quer na negativa (omissão), existem duas integrantes essenciais. Uma interior (psíquica, moral), outra exterior (física, material).

Feita esta observação, e passando à análise objetiva do conceito de conduta, vemos que este traz em si os seguintes elementos: ato de vontade humana, excetuando-se os casos em que se admite que a pessoa jurídica possa delinqüir, associado a um fim específico, e realização voluntária desta vontade através de um fazer, ou de um não fazer penalmente relevante.

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Ϯϰ

íntima relação com o fator objetivo da mesma, qual seria, o ato positivo ou negativo que ela representa. Sobre o tema, veja-se novamente o que afirma o ilustre doutrinador Paulo José da Costa Jr. (2000, p.43):

Antes de se proceder à análise do coeficiente subjetivo da conduta, parece oportuno ressaltar a íntima conexão que ele apresenta com seu correspondente material. Conduta não é apenas um fato físico, como também não se resume num fato psíquico. Todo comportamento é simultaneamente físico e psíquico. Ambas as componentes (física e psíquica) integram-se e completam-se, de maneira íntima. Entre elas, não medeia simples relação sucessória. Não há desconexão ou divórcio. Uma só unidade, com dúplice aspecto. O aspecto psicológico reflete-se na face externa da conduta. Dela não se cinde, pois o caráter psíquico é o aspecto subjetivo do comportamento, uma qualidade da ação e não um fato que a antecede.

Seguindo-se no estudo da conduta, já se pôde perceber que a mesma alberga em si tanto a ação quando a omissão, que são caracterizadas como espécies daquela. Sendo assim, mister se faz conceituar tais espécies. Nestes termos, apropriando-nos das lições de René Ariel Dotti (2005, p.304), temos que:

A ação é formada por um comportamento externo, objetivamente identificável, e de um componente psicológico, i.e., a vontade dirigida a um fim. Compreende a representação ou antecipação mental do resultado a ser alcançado, a escolha dos meios e a consideração dos efeitos concomitantes ou necessários e o movimento corporal dirigido ao fim proposto (Fragoso,

Lições, § 123). O resultado (evento) não é um elemento integrante da ação,

embora a ela esteja ligado pela relação de causalidade nos crimes materiais.

A omissão é a abstenção da atividade juridicamente exigida. Constitui uma

atitude psicológica e física de não atendimento da ação esperada, que devia

e podia ser praticada. O conceito, portanto, é puramente normativo.

Da omissão punível se distingue a mera conivência. Ela se traduz pela atitude negativa de alguém que presencia a execução de um delito ou sabe que ele irá ser praticado e não adota nenhuma iniciativa para impedir o evento ou chamar a autoridade pública para evitá-lo porque, no fundo, tal acontecimento satisfaz ou pode satisfazer o seu interesse ou a mera

vontade. Essa modalidade de testemunho ou apoio clandestino não

configura a participação punível quando inexiste a obrigação jurídica de intervir, como ocorre em relação ao policial, por exemplo.

(25)

Ϯϱ

podendo ser esta abstenção consubstanciada em uma conduta ativa diversa, ou em uma simples inércia corporal. Já para a teoria naturalística da omissão, na qual não nos filiamos, aquela só poderia ser observada através da constatação que o sujeito praticou conduta diversa da esperada, não se aceitando a omissão através de uma simples inércia.

Tendo por base os citados conceitos de ação e omissão, podemos observar que, apesar de distintas e até contrastantes tais definições, as mesmas se aproximam pelo caráter psicológico, que aparece incólume nas duas conceituações. Corroborando com este entendimento, seguem-se as palavras de Paulo José da Costa Jr. (2000, p.43), que sobre a questão assim se posiciona:

Enquanto o coeficiente físico da ação diversifica-se do da omissão, o coeficiente psicológico é o mesmo. Numa e noutra espécies de conduta há um aspecto psíquico constante: a vontade. Vontade e não intenção. Vontade como carga de energia psíquica, que impele o agente. Vontade como impulso causal do comportamento humano. Não intenção, que é a bússola da vontade, seu elemento finalístico, que a norteia para o objeto eleito. A vontade, portanto, limita-se à conduta. A intenção volta-se ao evento, que é o escopo.

Ainda dentro desta questão do fator psicológico como parâmetro de observação da conduta, podemos analisar algumas teorias que surgiram para estudar a mesma. São elas:

a) Teoria causal da ação: Para esta teoria, a conduta consiste em um fazer, ou um não-fazer voluntário, destituído de valoração, ou seja, o elemento psicológico que aqui já fora tantas vezes mencionado, dentro desta teoria, torna-se um indiferente, relegado ao estudo da culpabilidade do agente. Para esta teoria, a conduta é apenas um evento causal, um evento externo, e que apenas assim deve ser vislumbrado e estudado. Tal tese não encontra defensores atualmente, posto que se encontra dissociada da teoria do crime hoje aceita, que disciplina o estudo do fator psicológico motivador do delito dentro da conduta. Sobre as críticas levantadas à teoria em apreço, segue-se aquelas elaboradas pelo doutrinador Paulo José da Costa Jr. (2000, p.46), que assim argumenta:

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Ϯϲ

conduta, reduzindo-a a fragmentos exangues, esquecendo-se da conexão íntima que existe entre os dois aspectos da conduta (físico e psicológico), que os torna incindíveis.

b) Teoria social da ação: Para esta teoria, a conduta é a prática de um ato, ou de um não-ato (omissão), que ocasione um resultado socialmente relevante. Nela, ainda não se persegue o fator psicológico impulsionador da conduta, mas apenas a vontade perfunctória de querer algo. Deste modo, esta vontade, analisada de forma mais profunda, dentro dos questionamentos acerca do que realmente o agente quis, e não apenas um simples querer algo, não é discutido dentro desta teoria, sendo tal questionamento direcionado para a culpabilidade. Assim, tal teoria merece reparos, porque, dentre outros argumentos, confere primordial importância ao desvalor do resultado, quando o que deveria ser posto em análise seria o desvalor da conduta. Sobre esta crítica, imprescindível faz-se retornar aos ensinamentos de Damásio E. de Jesus (2002b, p.233), que sobre o tema esclarece:

Essa teoria, como a causal propriamente dita, dá muita importância ao desvalor do resultado, quando o que importa é o desvalor da conduta. Se a ação é a causação de um resultado socialmente relevante, então não há diferença entre uma conduta de homicídio doloso e um comportamento de homicídio culposo, já que o resultado é idêntico nos dois casos. A diferença será feita não na ação ou no fato típico, mas no terreno da culpabilidade.

Diante disso, não se pode com propriedade falar em conduta dolosa de

homicídio. Só a análise do fato diante da culpabilidade é que permitirá o emprego de tal expressão. Por esses motivos, essa teoria foi repudiada pela doutrina penal.

c) Teoria finalista da ação: Para esta teoria, a conduta é um fazer, ou um não-fazer, voluntário e dirigido a uma determinada finalidade. Nesta, o fator psicológico é explorado, garantido maior ênfase ao desvalor da ação. De acordo com esta teoria, utilizando-se das palavras do doutrinador Paulo José da Costa Jr. (2000, p.47):

... a ação não é apenas ‘causal’, mas um acontecer ‘finalista’. O homem, mercê de seu conhecimento, pode prever as conseqüências de sua

atividade, orientando-a para obtenção de seu desideratum. Atua

finalisticamente, norteando seu comportamento em direção a seu objetivo. A causalidade é ‘cega’. A finalidade é ‘vidente’. O homem canaliza a corrente causal no rumo, para atingir a meta optata. Por isso, a ação finalística se

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Ϯϳ

Esta é a teoria defendida pela maioria dos doutrinadores, visto que se molda perfeitamente à estrutura atual da teoria do crime, que confere à conduta o estudo do fator psicológico impulsionador da mesma, garantindo-a uma fundamentação finalística de existência.

Para findarmos este estudo perfunctório acerca da conduta, passemos a análise de situações onde não é possível declará-la presente, posto que não existe a característica da vontade nos atos praticados pelos sujeitos, o que impossibilita a existência de conduta, visto que a esta, como analisado, convergem tanto os fatores objetivos quanto os fatores psicológicos.

Assim sendo, não cabe falar em conduta diante de atos involuntários, posto que evidentemente, nos mesmos não se encontra a característica da finalidade, consubstanciada na vontade de produzir determinado resultado. Deste modo, não se pode atribuir a um ato reflexo a caracterização de conduta, nem tão pouco aos atos praticados em decorrência de sonambulismo, sob hipnose, sugestão, ou em estado de inconsciência.

Quanto ao movimento reflexo, cabe aqui mencionar uma observação feita pelo doutrinador Rogério Greco (2005, p.170) que diz:

Deve ser ressaltado, contudo, que se o movimento reflexo era previsível, a exemplo daquele que, querendo consertar um chuveiro elétrico, mesmo percebendo a existência de um fio desencapado, tenta fazê-lo sem desligar a chave de força, se vier a receber, como era previsível, uma descarga elétrica, e, em virtude de seu movimento reflexo, vier a causar lesões em outras pessoas, os resultados advindos desse movimento reflexo deverão ser imputados ao agente, geralmente, a título de culpa, haja vista ter

deixado de observar o seu necessário dever objetivo de cuidado.

Com relação aos atos instintivos, e aos atos repetitivos, a estes não é creditada ausência de conduta, visto que não são atos puramente fisiológicos, mas, em giro diverso, trazem em si, respectivamente, uma vontade primitiva, e uma desatenção evitável, o que é suficiente para caracterizá-los como conduta.

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Ϯϴ

fato típico, onde a conduta é elemento de formação.

Estes são os principais pontos a serem observados no estudo da conduta. Contudo, quando analisamos este elemento do fato típico, até porque o estudamos dentro da teoria finalista, devemos observar a motivação, a finalidade dos atos praticados, ou a ausência de algum cuidado exigido que ensejou um resultado indesejado e não permitido. É nesta análise que encontramos a figura do dolo e a figura da culpa, respectivamente, elemento subjetivo e elemento normativo do crime. Passemos agora a um pequeno estudo destes elementos, com vistas a promover a completude da análise da conduta dentro de nossa legislação penal.

1.3.1.1 Do dolo

Dolo, nas palavras de Cezar Roberto Bitencourt (2004, p.256): “é a consciência

e a vontade de realização da conduta descrita em um tipo penal, ou, na expressão

de Welzel, ‘dolo, em sentido técnico penal, é somente a vontade de ação orientada à realização do tipo de um delito’.”(grifo do autor)

Por este conceito simplista, o qual é compartilhado pela ampla doutrina penalista, podemos observar que tal elemento subjetivo do injusto tem seu conceito definido por duas expressões: vontade e consciência.

A consciência necessária para a caracterização de uma conduta como dolosa exige o conhecimento das circunstâncias fáticas que compõe a figura delituosa, sem a necessidade de conhecimento da definição típica do crime e a consciência do resultado dela advindo. Além disso, é imprescindível que haja o conhecimento da relação de causalidade objetiva entre a conduta e o resultado. Este é o chamado momento intelectual ou cognitivo do dolo, pois aqui basta que se analise o conhecimento prévio do agente frente à conduta praticada.

Posteriormente, para a caracterização do dolo, é necessário averiguar se há na conduta do agente vontade de praticar os atos criminosos e produzir o resultado danoso. Trata-se do momento volitivo do dolo, o qual, juntamente com o momento cognitivo, garante a caracterização de uma conduta como dolosa.

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Ϯϵ

afirmando a necessidade do conhecimento da descrição típica do crime, entretanto, deve passar pela consciência do agente todos os fatores que compõe tal definição, sob pena de não ser ao mesmo creditada qualquer conduta criminosa, posto que estaríamos diante de uma responsabilização objetiva, situação rechaçada por nossa legislação penal.

Tratando agora das teorias que fundamentam o conceito de dolo, podemos destacar três delas. A primeira é a teoria da vontade, que diz, segundo as palavras de Rogério Greco (2005, p.207), que: “dolo seria tão-somente a vontade livre e consciente de querer praticar a infração penal, isto é, de querer levar a efeito a conduta prevista no tipo penal incriminador”.

Apenas por esta humilde descrição, podemos afirmar que esta é a teoria adotada por nossa lei penal, visto que a mesma molda-se completamente ao conceito de dolo anteriormente explicado, o qual exige, como elementos caracterizadores da conduta dolosa, a verificação da existência da consciência e da vontade do agente, as quais são a base da teoria da supra mencionada.

Apesar da teoria da vontade ser a aceita por nosso ordenamento, também deve ser citada a teoria do assentimento, que se caracteriza por requerer apenas, segundo os ensinamentos de Damásio E. de Jesus (2002b, p.288): “a previsão ou representação do resultado como certo, provável ou possível, não exigindo que o sujeito queira produzi-lo. É suficiente o seu assentimento”.

Por fim, é de bom alvitre mencionar, ainda, a existência da teoria da representação, a qual exige apenas, para a caracterização do dolo, a previsão de um resultado, sendo indiferente à mesma, inclusive, o fato de ter havido ou não assentimento do agente à ocorrência de dito resultado.

Apesar de termos demonstrado, por coerência lógica, que a teoria da vontade é a adotada em nosso ordenamento (art.18, I, primeira parte, do Código Penal), ela não é a única, existindo também espaço para a aplicação da teoria do assentimento (art.18, I, segunda parte, do Código Penal), utilizada dentro da estrutura do dolo eventual, espécie de dolo a seguir analisada.

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ϯϬ

apenas um resultado, o qual dirige sua conduta. Sobre a questão, veja-se as palavras complementares de Rogério Greco (2005, p.209), que diz:

No dolo direto, conforme exposto acima, o agente quer praticar a conduta descrita no tipo. Quer preencher os elementos objetivos descritos em determinado tipo penal. É o dolo por excelência, pois que, quando falamos em dolo, o primeiro que nos vem à mente é justamente o dolo direto.

E dentro deste mencionado conceito de dolo, ainda é possível vislumbrar uma subdivisão, a qual consiste na diferenciação entre o dolo direto de primeiro grau e o dolo direto de segundo grau. No primeiro, o agente querendo certo e determinado resultado, utiliza meios que o provoquem de maneira a não gerar eventos colaterais. Já o segundo, consiste no dolo direto em que o agente pratica a conduta com meios que, mesmo dirigidos a um resultado específico, provocam eventos colaterais previsíveis e, de igual forma, também certos.

Com relação ao dolo indireto, este, por conseqüência, é aquele em que não há vinculação a apenas um resultado, posto que o agente satisfaz-se com a ocorrência de um ou outro evento danoso. Tal espécie de dolo subdivide-se em dolo eventual e dolo alternativo.

O dolo alternativo consubstancia-se quando, segundo E. Magalhães Noronha (2000, p.138), “o agente quer um dos eventos que sua ação pode causar: atirar para matar ou ferir”.

Já o dolo eventual evidencia-se quando o sujeito não quer o resultado passível de ocorrer através de sua conduta; entretanto, assume o risco de produzi-lo. É como bem explica Damásio E. de Jesus (2002b, p.291):

Ocorre dolo eventual quando o sujeito assume o risco de produzir o resultado, isto é, admite e aceita o risco de produzi-lo. Ele não quer o resultado, pois se assim fosse haveria dolo direto. Ele antevê o resultado e age. A vontade não se dirige ao resultado (o agente não quer o evento), mas sim à conduta, prevendo que esta pode produzir aquele. Percebe que é

possível causar o resultado e, não obstante, realiza o comportamento. Entre

desistir da conduta e causar o resultado, prefere que este se produza.

(31)

ϯϭ

é exatamente o que dispõe a teoria do assentimento, que requer a previsão do resultado, não exigindo a existência da vontade do agente em produzi-lo, mas apenas sua aceitação.

Quanto à distinção feita por alguns autores entre dolo geral e dolo específico, é importante mencionar que não há mais motivos para a sua utilização, diante da adoção da teoria finalista da ação. O dolo geral era aquele observado quando no tipo não existiam termos indicativos da finalidade da conduta. Já o dolo específico era o vislumbrado quando, da análise do tipo, encontravam-se expressões que direcionavam e delimitavam a finalidade da conduta.

A partir dos mencionados conceitos, torna-se claro o porquê da desnecessidade desta distinção frente à teoria finalista da ação. Isto ocorre porque tal teoria sustenta a existência de finalidade em todos os tipos penais, haja vista que a conduta é definida por uma ação dirigida a um específico fim. Assim, havendo ou não termos indicativos da finalidade dentro do tipo incriminador, a conduta típica é finalística, posto que isto é condição essencial para a verificação de fato delituoso. Portanto, destoa de qualquer sentido a separação entre dolo específico e dolo geral, visto que o critério de distinção, a saber, a finalidade da conduta, existe em ambos os tipos de dolo.

Existe ainda a distinção entre dolo normativo e dolo natural. Por dolo normativo entende-se o conceito de dolo em que há a preocupação com a consciência da antijuridicidade da conduta criminosa. Já o dolo natural, segundo Damásio E. de Jesus (2002b, p.295): “ (...) é a simples vontade de fazer alguma coisa, não contendo a consciência da ilicitude”.

Por admitirmos que a consciência da ilicitude da conduta encontra-se inserida dentro da culpabilidade, que consideramos como pressuposto para a aplicação da pena, não admitimos a existência do dolo normativo, mas apenas do dolo natural, o qual exige para a sua caracterização apenas a vontade e a consciência dos fatos e do resultado deles advindo, levando-se em conta, também, a relação de causalidade.

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ϯϮ

muitas soluções foram propostas, sendo que a que mais encontra adeptos é a que admite a idéia do dolo geral. Segundo tal solução, o agente, apesar de ter ocasionado o resultado danoso através de um ato sem esta intenção, responderá pelo crime, dolosamente, e em sua forma consumada, posto que se admite que o dolo existente nas condutas iniciais abrange também as condutas posteriores. É como bem explica Rogério Greco (2005, p.212):

Dessa forma, se o agente atuou com animus necandi (dolo de matar) ao

efetuar os golpes na vítima, deverá responder por homicídio doloso, mesmo que o resultado morte advenha de um outro modo que não aquele

pretendido pelo agente (aberratio causae), quer dizer, o dolo acompanhará

todos os seus atos até a produção do resultado, respondendo o agente, portanto, por um único homicídio doloso, independentemente da ocorrência do resultado aberrante.

Contudo, diante da teoria da imputação objetiva, da qual iremos tratar com profundidade em capítulo próprio, podemos encontrar nova solução para a questão do erro sucessivo, a qual é abraçada por Damásio E. de Jesus (2002b, p.295-296), que sobre o tema diz:

Existe somente uma tentativa de homicídio (nossa atual posição). Ocorre um desvio essencial do rumo causal, excludente da imputação objetiva do resultado.

...

Qual o risco que o sujeito pretendeu causar, no primeiro exemplo, quando lançou o suposto cadáver nas águas do rio? Quis um risco inerente à ‘ocultação de cadáver’ (CP, art.211). Logo, não realizou conduta criadora de risco de resultado morte. De modo que só subsiste tentativa de homicídio.

Sobre imputação objetiva trataremos com maior profundidade em capítulo posterior.

1.3.1.2 Da culpa

Culpa, nas palavras de Cezar Roberto Bitencourt (2004, p.270):

(...) é a inobservância do dever objetivo de cuidado manifestada numa conduta produtora de um resultado não querido, objetivamente previsível. A

culpa, stricto sensu, tem suas raízes no Direito Romano, mas

especificamente na Lex Aquilia. No entanto, somente bem mais tarde o

injusto da culpa foi recepcionado pelo Direito Penal, por meio da senatus

consultus, depois de ter sido aperfeiçoado no Direito privado.

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ϯϯ

E sobre a tipicidade nos crimes culposos, arremata o mesmo doutrinador (BITENCOURT, 2004, p.271):

A tipicidade do crime culposo decorre da realização de uma conduta não diligente causadora de uma lesão ou de perigo a um bem jurídico-penalmente protegido. Contudo, a falta do cuidado objetivo devido, configurador da imprudência, negligência ou imperícia, é de natureza objetiva. Em outros termos, no plano da tipicidade, trata-se, apenas, de analisar se o agente agiu com o cuidado necessário e normalmente exigível. No entanto, o emprego adequado da diligência necessária deve ser aferido nas condições concretas, existentes no momento do fato, além da necessidade objetiva, naquele instante, de proteger o bem jurídico.

Quanto ao questionamento acerca das condições reais do agente em agir pautado no cuidado necessário, tal tema deve ser discutido dentro da esfera da culpabilidade.

Voltando ao estudo do conceito de culpa, observamos que este necessita da averiguação dos seguintes elementos: conduta voluntária, inobservância do cuidado objetivo, previsibilidade objetiva, falta de previsão concreta, produção de um resultado involuntário, relação causal e tipicidade.

A conduta voluntária, dentro dos delitos culposos, merece uma análise mais detalhada. Isto ocorre porque, diferentemente do que se observa nos crimes dolosos, a conduta não é direcionada para uma finalidade ilícita. Pelo contrário, a conduta nos crimes culposos geralmente tem fim lícito, contudo, por inobservância do cuidado necessário, a mesma gera um resultado danoso não planejado e nem assumido pelo agente.

Este cuidado necessário, mencionado anteriormente, consubstancia o elemento descrito como “inobservância do cuidado objeto”, o qual é por Cezar Roberto Bitencourt (2004, p.273-274) assim conceituado:

Dever objetivo de cuidado consiste em reconhecer o perigo para o bem jurídico tutelado e preocupar-se com as possíveis conseqüências que uma conduta descuidada pode produzir-lhe, deixando de praticá-la, ou, então, executá-la somente depois de adotar as necessárias e suficientes precauções para evitá-lo.

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ϯϰ

de cuidado dirigido ao agente. Portanto, o conhecimento do dever de cuidado é feito a partir da análise do caso concreto.

Depois da descoberta do dever de cuidado, que passa pela observância do princípio da confiança, é feita a análise de tal cuidado de uma maneira objetiva, sob a ótica do homem médio. É deste modo que se analisa se houve ou não ofensa a este dever de cuidado, ou seja, objetivamente.

Quanto a esta ofensa, a mesma pode ser realizada através da imprudência, da imperícia, ou da negligência. A imprudência, como assevera Cezar Roberto Bitencourt (2004, p.278): “(...) é a prática de uma conduta arriscada ou perigosa e tem caráter comissivo. É a imprevisão ativa (culpa in faciendo ou in committendo).

Conduta imprudente é aquela que se caracteriza pela intempestividade, precipitação, insensatez ou imoderação”.

Portanto, a imprudência é um fazer culposo, o que a distingue da negligência, que é exatamente um não fazer, uma abstenção de um movimento, de um cuidado que era exigido do agente. É, portanto, a inobservância do cuidado objetivo através de um não ato, de uma omissão.

Quanto à imperícia, esta tanto pode ser realizada através de um ato ou de um não ato, pois o que a define e a diferencia das outras modalidades de culpa é a sua especificidade em relação à situação em que ela pode ser evidenciada. É que, diferentemente da imprudência e da negligência, que podem ser observadas em qualquer situação de inobservância de um cuidado objetivamente exigido, a imperícia apenas ocorre no exercício de uma arte ou profissão.

A imperícia é, justamente, a falta de aptidão para a prática de atos concernentes a uma profissão ou ofício. Isto é o que a diferencia das outras espécies de culpa. Contudo, em todas há a característica da inobservância do cuidado objetivo, requisito essencial para a existência de culpa na conduta do agente.

Quanto à previsibilidade objetiva, esta, nas palavras de Rogério Greco (2005, p.221), caracteriza-se por ser:

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ϯϱ

assim persistir, é sinal de que o fato havia escapado ao âmbito de previsibilidade do agente, porque dele não se exigia nada além da capacidade normal dos homens. Não é imposta ao agente uma previsibilidade extremamente larga que, de acordo com a imaginação do aplicador da lei, poderá ser imposta a todos os casos.

Portanto, a previsibilidade objetiva é a capacidade de prever que da conduta realizada poderá advir um resultado danoso. Ela é essencial para caracterizar uma conduta criminosa, seja ela dolosa ou culposa, visto que o imprevisível não pode ser imputado a um agente, mas, sim, deve ser ligado a uma força maior ou a um caso fortuito, os quais são excludentes da responsabilidade dentro do nosso ordenamento.

Ocorre que, dentro dos crimes culposos, a previsibilidade, inerente à conceituação de crime, existe apenas em perspectiva. Ou seja, em tese, o resultado advindo da conduta culposa era previsível, todavia, tal previsão inocorreu, pois caso ocorresse, em regra, estaríamos diante de um crime doloso. Por isso costuma-se dizer que a culpa é a imprevisão do previsível, como lembra Damásio E. de Jesus (2002b).

E é por este motivo que figura como um elemento da conduta culposa a falta de previsão concreta, posto que a previsão em abstrato, ou seja, a previsibilidade da ocorrência de um resultado danoso é pressuposto inerente à idéia de crime. Entretanto, a previsão concreta é situação que se refere aos crimes dolosos, ante seus requisitos de consciência das conseqüências do fato e vontade dirigida à prática de uma figura delituosa.

Quanto à produção de um resultado involuntário, este é mais um elemento inerente ao crime culposo, posto que neste o resultado nunca é querido pelo agente, que pratica uma conduta dirigida à finalidade diversa. Portanto, o resultado danoso é sempre obtido de maneira involuntária, o que não ocorre nos crimes dolosos, haja vista a vontade do agente de realizar os atos definidores de uma conduta criminosa.

O fato da conduta não ser dirigida à causação de um resultado danoso, faz com que a mesma não consubstancie, em si, em crime, posto que sua finalidade era diversa da prática delituosa. Isto faz com que apenas haja crime culposo diante da ocorrência de um resultado. Sem este, não há a figura do delito culposo.

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ϯϲ

do conceito de crime, em uma perspectiva ampla. Isto ocorre porque, como vimos, a relação de causalidade entre a conduta e o resultado danoso é um elemento de existência do fato típico, requisito essencial do próprio conceito de crime, quer seja doloso, quer seja culposo. Portanto, não poderia deixar de existir, dentro do estudo do crime culposo, a análise da relação de causa e efeito entre a conduta culposa e o resultado danoso ocorrido. Apenas havendo esta relação de causalidade pode-se falar na existência de crime, visto que é a mesma que liga a conduta do agente ao resultado danoso.

Por fim, como último elemento do crime culposo, temos a tipicidade, a qual, como a relação de causalidade, é elemento essencial de formação do fato típico, requisito genérico do conceito de crime. Isto faz com que a tipicidade, que se pode definir, em breves palavras, como a descrição legal de uma conduta em uma norma penal, deva ser apreciada em qualquer conduta que produza um resultado danoso. Essa exigência deve-se ao princípio da legalidade, esculpido em nossa Lei Maior, que determina a não existência de crime sem que uma lei previamente o tenha definido.

Ainda com relação à tipicidade, o crime culposo guarda uma peculiaridade frente ao crime doloso. É que o dolo é elemento subjetivo do tipo, o que faz com que não haja necessidade da menção do mesmo na descrição dos crimes, posto que ele está subjetivamente inserido no tipo. Já a culpa não possui a característica da subjetividade, havendo a necessidade de explicitação no tipo da existência do elemento normativo culpa, dentro daquela conduta. Por isso diz-se que a culpa, em nosso ordenamento, tem um caráter excepcional, posto que só quando é mencionada no tipo penal existe a figura do crime culposo, já o dolo sempre poderá ser perseguido, posto que se consubstancia em regra geral.

Sobre tipicidade e relação causal, nos deteremos com maior profundidade em tópico específico.

Estes são, enfim, os elementos formadores do conceito de culpa, o que faz com que falte a esta análise apenas o estudo das espécies deste elemento normativo, que são a culpa consciente e a culpa inconsciente.

Culpa inconsciente, como ensina Ney Moura Teles (2004, p.192):

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mas ele, não obstante isso, não o prevê e impulsiona, voluntariamente, a conduta, dando causa ao resultado. Com efeito, sua conduta é culposa, mas ele não teve consciência de que o resultado ocorreria, porque não realizou a previsão, não representou o que era, plenamente, previsível. Por isso, agiu, e o fez sem a consciência de que poderia causar o resultado. Foi negligente porque não representou o resultado. Por isso, diz-se ser sua culpa inconsciente.

Da análise do conceito exposto, podemos observar que presente nele estão todos os elementos formadores da culpa, o que faz com que esta espécie seja a regra, ou seja, faz com que a culpa inconsciente seja a culpa comum até aqui analisada, a qual é realizada através da imperícia, da imprudência e da negligência.

Já a outra espécie de culpa, a saber, a culpa consciente, é uma exceção, posto que não contém em si um dos elementos do conceito de culpa, qual seria, a ausência de previsão do resultado danoso. A culpa consciente, como afirma Luiz Regis Prado (2005, p.381), ocorre quando: “(...) o autor prevê o resultado como possível, mas espera que não ocorra. Há efetiva previsão do resultado, sem a aceitação do risco de sua produção (confia que o evento não sobrevirá). Por sem dúvida, há uma consciente violação do cuidado objetivo”.

Diante desta definição, torna-se difícil compreender como podem co-existir, dentro do conceito de culpa, duas espécies tão distintas. E tal distinção evidencia-se no fato de na culpa inconsciente não haver previsão do resultado danoso, enquanto que na culpa consciente tal previsão é observada.

De fato, a regra é que nos crimes culposos não haja previsão do resultado, circunstância exigida apenas dentro dos crimes dolosos. Entretanto, a esta afirmativa existe uma única exceção, a culpa consciente, que se aproxima do dolo por nela existir a previsão do resultado, mas dele se afasta expressivamente por não haver direcionamento da conduta à prática do resultado danoso. Isto ocorre porque a conduta nos crimes culposos é dirigida à criação de eventos lícitos, e também, por conclusão lógica, por não haver vontade de realizar o resultado na conduta do agente. Por isso as situações que se moldam ao conceito de culpa consciente se afastam do conceito de dolo, pois não existe vontade de ocasionar um resultado danoso.

Referências

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