Sistema Financeiro Internacional:
de Bre3on Woods ao Não-
Sistema
Prof. Dr. Diego Araujo Azzi 2017.2 Aula 5
Bre3on Woods II
Contestação e crise. Fim do padrão ouro-dólar.
Eurodólares e petrodólares
• Bre7on Woods: cooperação “controlada” do pós-
Guerra
– Compromisso governamental em defesa do pleno emprego
– Perda de espaço para políKcas de redução dos gastos públicos (ajuste fiscal)
– PolíKcas deflacionárias que haviam corrigido balanços de pagamentos no padrão ouro não eram mais
poliBcamente aceitáveis
– Economia funcionando sob fortes pressões de
“demanda planejada” pelo welfare state
• Bre7on Woods: cooperação “controlada” do pós-
Guerra
– governos faziam intervenções abrangentes na economia e no sistema financeiro
– havia limites às taxas de juros
– havia restrições aos aBvos permiBdos aos bancos invesKr – governos regulavam o setor financeiro, canalizando o
crédito para setores estratégicos
– obrigatoriedade de licenças de importação dificultava as transações de capital através das contas correntes
• Bre7on Woods: “A era do meio-termo” (J.
Frieden):
– EUA removiam barreiras comerciais mas aceitavam protecionismo de Europa e Japão
– Europeus negociavam uma união políKca e econômica (CEE) que respeitava as diferenças nacionais
– Havia proteção aos setores frágeis e estratégicos mesmo num contexto liberalizante
• Bre7on Woods: “A era do meio-termo”:
– Trabalho e capital negociavam para manter lucros e salários altos. Direitos por paz no local de trabalho
– Socialistas, conservadores, liberais e democratas-cristãos trabalhavam todos na construção do welfare state
• para garanKr o apoio de suas sociedades à liberalização de Bre7on Woods os europeus precisaram dar espaço à organização sindical, promover medidas de bem estar social e aumentos salariais
• o estado de bem estar social ajudou a neutralizar oposições potenciais à liberalização (e a combater o socialismo soviéKco)
– Europa: renda per capta dobrou em 16 anos (1948-1964) – Japão: produção do país aumentou oito vezes em 25 anos.
• Bre7on Woods: ciclos de expansão econômica duraram duas vezes mais do que na época do padrão ouro
• ciclos de crise e recessão duraram a metade do tempo do padrão ouro
• desemprego ficou em média de 3% (contra 5% padrão ouro e 8% entre-guerras)
• 1/3 a 2/3 da força de trabalho era filiada a sindicatos (poder de barganha). ParKdos de esquerda chegavam ao poder com mais frequência do que antes
• Bre7on Woods provava que as economias capitalistas ocidentais
podiam combinar políKcas sociais generosas, capitalismo de mercado e integração econômica global (contra liberais, fascistas e comunistas)
• Essa ordem internacional testemunhou o crescimento econômico
• Liberalização comercial (GATT) – boom
– em 1952 as tarifas de importação na Europa e América do Norte já correspondiam a metade do valor cobrado antes da II Guerra – o comércio mundial se ampliou como nunca. Nos 25 anos após a
guerra o comércio dobrou a cada 10 anos
– diversos países experimentaram booms exportadores. Europa:
• 1950 – USD 19 bilhões em exportações
• 1973 – USD 255 bilhões em exportações
– GATT deixou de lado os temas polêmicos, como agricultura e serviços, e permiKu exceções aos países em desenvolvimento
• A crise da libra esterlina (1947) e o realinhamento das moedas europeias
– Bre7on Woods impõe cronograma de restauração da conversibilidade – 1946: EUA fazem emprésKmos de USD 3,75 bi à GB impondo a
condicionalidade de que a GB autorizasse a conversibilidade da libra em dólares e outras moedas em um ano.
– Ingleses se veem obrigados a aceitar, restabelecendo a conversibilidade em julho de 1947 (a USD 4,03)
– Problema imediato: externalidades em rede (não-cooperação): outros países preferiram manter suas moedas não conversíveis (discriminação cambial - problema pré-Bre7on Woods)
– Assim, GB não conseguia mais ampliar sua penetração nos mercados europeus (via aumento das exportações) para conseguir gerar um
superávit que financiasse a conversibilidade da libra
• A crise da libra esterlina (1947/49) e o realinhamento das moedas europeias
– Problema adicional: entre 1939-45 as colônias do Império britânico Knha acumulado saldos a receber em libras, em troca de matérias primas e alimentos requeridos pelo esforço de guerra
– Os saldos passavam de 3,5 bilhões de libras em 1945, e as reservas do país (em ouro e moedas estrangeiras) era de apenas 500 milhões
– Conversibilidade dura apenas algumas semanas em 1947. Reservas GB despencaram nesse breve período
• A crise da libra esterlina (1947/1949) e o realinhamento das moedas europeias
– O episódio britânico demonstrou a incapacidade de um país restaurar a conversibilidade sem a cooperação dos outros
– Decisão vista como irresponsável e consequência da fraqueza da GB para suportar a pressão dos EUA
– Conversibilidade vista pelos EUA como a melhor forma de romper o sistema de preferências imperiais da
libra, ampliar a internacionalização do dólar e as exportações americanas
• A crise da libra esterlina (1947/1949) e o realinhamento das moedas europeias
– GB e mais 23 desvalorizações sucessivas das moedas europeias em 1949 para equilibrar os balanços de
pagamentos
– Não Kveram desvalorização apenas o dólar, o franco suíço e o iene
– As desvalorizações (realinhamento) das moedas europeias Kveram o efeito desejado, equilibrando o superávit dos
EUA para baixo em 50%
– Porém em 1950, o superávit dos EUA ainda permanecia em 3 bi/ano.
• A União Europeia de Pagamentos
– criação em 1950; exKnção em 1958. Abordagem regional do problema
– objeKvo de contornar a inconversibilidade das moedas e expandir o comércio intrazona
– complementar as ações do FMI no enfrentamento aos problemas europeus na esfera do comércio e nas contas externas
– estabelecimento de um Código de Liberalização que
impunha a eliminação das restrições à conversibilidade entre as moedas europeias para fins de transações em contas correntes (em 1954)
• Conta corrente
• Conversibilidade: problemas e progressos
– 1954 – liberalização da conversibilidade da conta corrente entre as moedas europeias (UEP)
– 1958 – liberalização passa a incluir o dólar e outras moedas chave do sistema
– 1961 – FMI anuncia o pleno cumprimento do ArKgo VIII de Bre7on Woods sobre conversibilidade
monetária
UEP foi uma resposta a:
– Irrealismo do cronograma de conversibilidade de Bre7on Woods
– Inadequação das quotas de auxílio do FMI previstas nos ArKgos do Acordo de Bre7on Woods
– Irrealismo do cronograma do GATT e necessidade de liberalizar o comércio europeu de forma
discriminatória
– Escassez de dólares como o problema central do período pós-guerra, mesmo com o Plano Marshall
UEP foi uma resposta a:
– O sistema monetário internacional saído de Bre7on Woods era um sistema assimétrico no qual os
Estados Unidos e o dólar desempenhavam papéis excepcionais
– Enfraquecimento do papel do FMI e do Acordo de Bre7on Woods
– Coordenação europeia das desvalorizações + ações de austeridade fiscal produziram o efeito desejado
• 1958 – retomada da conversibilidade entre as
moedas (livre para comércio em mercados de
cambio abertos)
• As taxas de cambio Knham estabilidade suficiente
para esKmular o comércio e os invesKmentos mas
também Bnham flexibilidade suficiente para os
países gerenciarem suas próprias necessidades
domésKcas
• Barreiras às movimentações financeiras
especulaKvas (em busca dos juros mais altos)
premiavam o invesBmento produBvo
• Em face da relutância dos governos em alterar a
taxa de câmbio ou comprimir a demanda
domésKca, a alternaKva eram os controles de
fluxos de capital
• Mas com o restabelecimento da conversibilidade
nas contas correntes ficou mais dijcil aplicar
controles nas contas de capital
• Mudanças da época:
– crescimento das companhias transnacionais – desenvolvimento do mercado de euromoedas
• Bre7on Woods: controles de capital
– A eficácia dos controles foi maior nos anos 40 e 50
– A parKr de 1959, com a liberação da conversibilidade das contas correntes
– Perdeu-se o mecanismo dos controles de câmbio – Ficou mais fácil canalizar capital através das contas
correntes
– Controles na conta de capital permaneceram mas já eram insuficientes para garanKr estabilidade ao sistema
• Década de 1950: invesKmentos diretos no exterior sob a forma de invesBmentos de empresas mulBnacionais norte-americanas
superam pela primeira vez o invesKmento via emprésKmos bancários
• Estabelecimento de fábricas em países desenvolvidos (Europa e Japão) – “salto tarifário”
• 1973: 80% do lucro de 5/10 maiores empresas dos EUA vinha de invesKmentos no exterior
• Setores principais: automoKvo, computação, farmacêuKco, metalúrgico, químico, maquinário
• Emergência de um mercado propriamente europeu (CEE) – 2º maior do mundo
• Conversibilidade: problemas e progressos
– Anos 1960: liberdade dos fluxos de capitais de curto prazo passa a ser vista como uma forma de obter
recursos para ajuste do balanço de pagamentos, reduzindo a necessidade de reservas
– Porém, os maiores relaxamentos nos controles de capital exigiam mais financiamento para contrabalançar saídas especulaBvas de capital
– Governos complementam suas reservas com divisas internacionais, principalmente o dólar
– No seu próprio balanço de pagamentos, os EUA podiam ter déficits do tamanho do montante de dólares que
governo e bancos centrais estrangeiros desejassem adquirir
• Conversibilidade: problemas e progressos
– A taxa de juros dos EUA é que passa a regular a oferta de dólares, tornando o sistema dependente do dólar para atender as necessidade de liquidez
– A dependência quanto à autoridade monetária
americana comprometeu a simetria dos Acordos de Bre7on Woods
O Dilema de Triffin
– excessivo acúmulo de dólares fora dos EUA (dólar forte) vai abalar a confiança na capacidade de
conversão em ouro (dólar fraco) – obrigação dos EUA – já em 1960 pela primeira vez o estoque de dólares
no exterior supera o montante de ouro das reservas americanas
– aumenta a percepção do risco dos países credores entrarem numa corrida para sacar seus dólares em ouro
• Direitos Especiais de Saque (DES)
– Criado em 1967 na reunião do FMI no Rio de Janeiro – ObjeKvo era criar uma divisa supranacional que
pudesse ser acumulada nas reservas internacionais de um país, reduzindo assim a pressão de demanda sobre o dólar, segundo o dilema Triffin
– Nos 60, a decisão do G10 de maior uso e controle dos DES por parte das maiores economias no FMI gera
revolta no Terceiro Mundo
– Solução foi a criação do piso de quotas para todos
• Mercado de euromoedas
– eurodólares são dólares depositados fora dos EUA, historicamente primeiro na Europa, mas não somente – anos 1950, bancos de Londres começam a aceitar
depósitos em dólar de terceiros, atraindo URSS, fundos americanos e outros (OPEP)
– correnKstas com contas em eurodólares, quando
temessem pela estabilidade do dólar, podiam converter seu dinheiro em euromarcos alemães
– esses depósitos em bancos europeus dão origem a novos aBvos financeiros (moeda fiduciária), o que aumenta
ainda mais a quanKdade de dólares fora dos EUA
• O déficit dos EUA
– problema surgiu pela primeira vez em 1959/1960
– FED subiu os juros para aumentar a demanda por dólares
– gerando recessão nos EUA (primeira vez que os EUA sacrificaram a políKca domésKca em favor de objeKvos internacionais)
– Os gastos militares com a Guerra do Vietnã ao longo da década de 1960, com a Guerra Fria e os gastos domésBcos com a
Guerra à Pobreza (“The Great Society” pres. Johnson) agravaram muito a situação
• O déficit dos EUA
– Em 1971, os EUA importavam duas vez mais produtos manufaturados e invesBam duas vezes mais no exterior do que em 1967
– Excesso de liquidez de dólares no mercado
internacional faz os invesKdores estrangeiros passaram a ter mais confiança no ouro do que no dólar
– Passaram a usar dólares para comprar ouro
– de 1961 a 1968 invesKdores e governos trocaram
dólares por ouro tomando 40% das reservas de ouro dos EUA
• A crise do dólar
– Fim dos anos 1960: EUA dispunham de apenas 20% do montante de dólares no exterior em ouro
– Criação Gold Pool: EUA consegue compromisso a contragosto das principais economias em reduzir a conversão de seus dólares em ouro
– França, governada por Charles de Gaule, adota
postura críKca ao “privilégio exorbitante” do EUA em ter o dólar como moeda mundial
• A crise do dólar
– Gota d’água para a França quando o Min. das
Finanças dos EUA, John Connally (Kennedy e Nixon) diz: “o dólar é a nossa moeda, mas o problema é de vocês”
– A parKr de 1964 a França (e também a ALE) iniciam uma políBca agressiva de “repatriar o ouro”,
exigindo ano após ano altas somas de dólares da França por ouro dos EUA
• A crise do dólar
– Agosto de 1971: avalição de que os EUA estavam completamente expostos: “qualquer um pode nos arruinar quando quiser”- John Connally
– Nixon rompe unilateralmente o compromisso de Bre7on Woods em que os EUA se compromeKam a garanKr a conversibildade do dólar em ouro
– Grande surpresa para Europeus e Japoneses
– A decisão econômica mais importante desde o fim da II Guerra Mundial
• Elementos domésBcos da crise do sistema de Bre7on Woods – EUA poderiam adotar políKcas de contração da demanda e
austeridade fiscal
– EUA poderiam aumentar os juros para valorizar o dólar e manter o valor da paridade
– Presidente Nixon, em campanha pela reeleição (em 1972) não aceita tomar nenhuma dessas medidas
– Assim como nas negociações do Acordo de Bre7on Woods, EUA viram na crise do dólar uma nova janela de oportunidade para contra-atacar e aumentar ainda mais a sua hegemonia no
sistema financeiro internacional
– Nos meses seguintes, o dólar desvalorizou 10%
– e o impacto foi ainda maior com a taxa de 10% sobre as importações definida por Nixon para proteger a indústria e os produtores locais
– 1972 – Nixon é reeleito presidente dos EUA
– Em 1973, Nixon desvalorizaria o dólar novamente em 10% afim de ajustar o déficit comercial, impulsionar a
economia domésKca e reduzir o desemprego
• O sucesso de Bre3on Woods: a causa da sua ruína
1) Até os anos 1970, quase não havia fluxo internacionais de curto prazo
– trauma de 1920/30; amplas oportunidades domésBcas; controle de capitais
– pouca transmissão dos efeitos monetários entre os países (baixa integração financeira)
– combinação bem-sucedida de de integração econômica, Estado de bem-estar social e intervenção macroeconômica
• O sucesso de Bre3on Woods: a causa da sua ruína
2) restauração das finanças internacionais e recuperação dos fluxos de curto prazo (década de 1960)
– maior movimentação em resposta às políKcas monetárias nacionais
– crescente importância/concorrênia econômica da Europa e Japão (hoje, Trump x China)
– resultando na forte pressão sobre o dólar
– a integração econômica (liberalização financeira) impôs obstáculos e desafios à eficiência da intervenção
macroeconômica
• O Trilema de Bre3on Woods
– Abertura das contas corrente/de capital (conversibilidade)
– Independência da políKca monetária (intervenção) – Flexibilidade das taxas de câmbio (ajustes do BP) – É preciso escolher qual delas será a prioridade
políKca máxima de um governo
• O Acordo de Bre7on Woods: Opiniões posiBvas
– acordo proporcionou um grau de estabilidade sem precedentes nas taxas de câmbio quando comparado à volaKlidade anterior e posterior
– aliviou os problemas anteriores no balanço de pagamentos
– permiKndo assim uma expansão sem precedentes do comércio e dos invesKmentos
• Bre7on Woods: Alguns problemas
• países centrais pouco uKlizaram os mecanismos de
ajuste
• monitoração do FMI não conseguia mudar políKcas
nacionais - “leão sem dentes” (EUA)
• já em 1947, os recursos do FMI rapidamente se
mostraram muito pequenos frente ao déficit
europeu
• cláusula de escassez de divisas para punir países
com políKcas desestabilizadoras do sistema, nunca
foi aplicada
Bre7on Woods: Alguns problemas
• Graves erros de avaliação dos EUA sobre o custo da reconstrução europeia e japonesa
• sistema só foi sustentado com a ajuda dos grandes recursos aportados via Plano Marshall pelos EUA
• mesmo assim, já em 1949 a paridade fixa das moedas com relação ao dólar não pode ser manKda
• moedas europeias desvalorizadas em 30%
• O pacto social do pós-guerra, em que os trabalhadores
aceitaram redução salarial por invesKmento do lucro e geração de empregos foi atraente só enquanto durou o alto crescimento (5% ou mais)
• Bre7on Woods: Opiniões negaBvas
– a facilidade dos ajustes no BP foi uma consequência – e não uma causa – do crescimento acelerado
– a ideia de que Bre7on Woods harmonizou
estabilidade do câmbio com abertura dos mercados não é totalmente verdadeira
– governos restringiram os movimentos de capitais durante todos o anos do acordo
– assim, os invesKmentos estrangeiros aconteceram apesar, e não por causa, das implicações de Bre3on Woods na mobilidade do capital