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Entre ruídos: encontros sonoros de uma pesquisa em Educação

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Academic year: 2021

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Marina Lopes e Gomes

Entre ruídos: encontros sonoros de uma pesquisa em Educação

Dissertação submetida ao Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Cata-rina para a obtenção do título de mestre em Educação.

Orientador: Prof. Dr. Leandro Belinaso Guimarães

Florianópolis 2019

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Marina Lopes e Gomes

Entre ruídos: encontros sonoros de uma pesquisa em Educação

O presente trabalho em nível de mestrado foi avaliado e aprovado por banca examinadora composta pelos seguintes membros:

Prof.(a) Ana Maria Hoepers Preve, Dr(a). Universidade do Estado de Santa Catarina

Prof.(a) Shaula Sampaio, Dr(a). Universidade Federal Fluminense

Prof.(a) Giovana Scareli, Dr(a). Universidade Federal de São João del-Rei

Prof.(a) Marta Catunda, Dr(a). Universidade de Sorocaba

Certiicamos que esta é a versão original e inal do trabalho de conclusão que foi julgado ade-quado para obtenção do título de mestre em Educação.

____________________________ Prof. Dr.(a) Soraya Franzoni Conde

Coordenadora do Programa

____________________________ Prof. Dr. Leandro Belinaso Guimarães

Orientador

Florianópolis, 08 de agosto de 2019.

Assinado de forma digital por Leandro Belinaso Guimaraes:13084947856 Dados: 2019.08.28 12:03:57 -03'00'

Soraya Franzoni

Conde:2693380

0814

Assinado de forma digital por Soraya Franzoni Conde:26933800814 Dados: 2019.08.30 12:27:50 -03'00'

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AGRADECIMENTOS

É difícil começar um agradecimento, signiica que estou chegando ao im desta jornada, mas também é um momento de honrar os encontros que permitiram a pesquisa acontecer duran-te esduran-tes dois anos de mestrado.

Primeiro gostaria de agradecer à minha família, aos meus pais, Lila e Jerry, que sempre me incentivaram a continuar nos estudos, e patrocinaram grande parte da minha formação. Gra-tidão por acreditarem em mim. À minha irmã, Julia, companheira de todas as horas, graGra-tidão por todo apoio, pela parceria, pelo amor incondicional. Às minhas avós, Wanda e Dirce, que me ensinam tanto sobre o viver.

Às amigas empoderadas que me deram colo e força, paciência e foco, quando precisei: Julia Cabezon, Marina Lima, Maria Cocca, Thaís Roque, Bárbara Aquino.

Aos amigos que acompanham minha jornada desde o início do meu encantamento pela arte: André Pardini, Tharniê Matos, Estevão Mattos, Gabriel Young, Danilo Rocco, gratidão pelos ensinamentos.

Ao meu companheiro, Gabriel Ribeiro, pela parceria na vida e na arte, nosso encontro ecoa pelos cantos destas páginas.

Ao Programa de Pós-Graduação em Educação e à todos os envolvidos, gratidão pelo trabalho, pela dedicação, pelos ensinamentos. Aos professores e professoras da linha de Educa-ção e ComunicaEduca-ção, as marcas dos nossos encontros também se fazem presente nestas páginas.

Aos amigos da turma de mestrado, Jaque, Flor, Mariana, Renata, Rafael, Camila e Gi-sele, sofremos juntos, rimos juntos, a vida e a pesquisa só se faz assim: juntinho.

Ao Coletivo Tecendo por todo apoio, pelos debates, pela construção conjunta de ideias, por me inspirarem a continuar na academia, pelos afetos cultivados, pelas amizades construí-das. Especialmente ao Davi de Codes, por ter me ajudado durante o processo seletivo do mes-trado, gratidão pela escuta atenciosa, e por me apoiar a continuar a jornada acadêmica.

As professoras da banca: Drª Ana Preve, nossos encontros foram essenciais para per-mitir respiros em meio a loucura das escolhas metodológicas ao longo da pesquisa. Com leveza e seriedade aprendi a olhar os modos de pesquisa em educação de outras formas. Drª Giovana Scareli, passear pelos sertões contigo, me ensinou a estar ainda mais atenta as sensibilidades que nos rodeiam, nossos passeios pela ilha também foram maravilhosos. Drª Shaula Sampaio, apesar dos breves encontros no Pará e de alguns e-mails trocados, te encontrar neste processo

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de pesquisa revirou profundamente as percepções que tinha sobre o que estava escrevendo e o que realmente estava me incomodando. Drª Marta Catunda, o que dizer dos nossos encontros? Embora nunca presenciais, apenas poucos e-mails, posso te dizer com irmeza que meu encon-tro com a sua escrita foi o que levou esta pesquisa a tomar o rumo sonoro e sensível que tomou. Como ecos que não cessam. Por tudo isso, e por muito mais que não cabe aqui, gratidão. Vocês são mulheres maravilhosas, representam pesquisadoras e educadoras, e nos inspiram a seguir caminhos em lugares onde não podíamos nos imaginar antes.

Ao CNPq, órgão que permitiu, através de inanciamento, esse mergulho intenso, de corpo inteiro, ao processo de pesquisa. Gratidão pela oportunidade de ser bolsista e assim viver uma dedicação exclusiva ao mestrado.

À UFSC, instituição que, além de permitir minha formação acadêmica, me colocou em contato com inúmeros conhecimentos e formas de pensar. Esse lugar múltiplo, cada vez mais diverso, onde a pesquisa, o conhecimento, os saberes contaminam a todos que ali passam. Lu-gar de liberdade, de formação, de encontros, de potências, que também possuí falhas, mas que hoje se encontra ameaçado, ofendido, violentado pela macropolítica vigente. Não entendem a importância deste espaço, não sabem o que realmente acontece nele, não compreendem o quão potente e importante é uma UNIVERSIDADE para o país e seu povo. Por causa disso, não apenas te agradeço, mas também peço desculpas em nome de uma parcela da sociedade que te agride. Saiba que nós, estudantes, professores, funcionários, também nos sentimos violentados, mas isso não nos impedirá de lutar pela sua existência, pelo contrário, gritaremos a teu favor até o último suspiro. Gratidão à instituição pelas oportunidades e caminhos abertos.

Ao meu orientador, Leandro Belinaso, já sinto saudades dos nossos encontros, das tro-cas rotineiras, das risadas, dos afetos. Lembro de quando retomei a vontade de continuar o curso de Biologia, depois de quase ter desistido de vez. Estava frustrada, desanimada, apenas desejava terminar o que havia começado. Foi quando te conheci e então tudo mudou. Não só terminei o curso, como iz isso feliz, motivada. Já te agradeci algumas várias vezes, mas talvez a dimensão da mudança que aconteceu graças ao nosso encontro não seja mensurável ainda para mim. Quando penso nisso, me emociono. Por isso a saudade... De manter esse movimento, as leituras, a pesquisa, as trocas, as escritas, as conversas... De alterar constantemente nossa percepção sobre a vida (biologia e ains) e o mundo... Coisas (entre muitas outras) que aprendi a cultivar e adorar contigo.

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“Já começou, não comece. A noite escura entristece, Corpo cansado padece. O que será que estremece?” (Marina Gomes e Gabriel Ribeiro, 2016)

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RESUMO

Esta pesquisa de mestrado dá continuidade a investigações, iniciadas na graduação, a respeito dos infográicos que abordam a temática das mudanças climáticas. O estudo atual segue se ins-pirando em movimentos transgressores destes artefatos, e faz isso ao trazer os sons, os ruídos para compor, criar, instaurar no mundo artefatos nomeados como “sonigráicos”. Primeiro, a pesquisa demarca o conceito e a importância dos infográicos, para depois problematizá-los. Ao se incomodar com a imobilidade informacional destes artefatos e com o silenciamento de uma educação sensível provocado pelo excesso de elementos visuais e cognitivos, a pesquisa se joga numa outra busca. Para tanto, a investigação se vale de aportes provenientes do campo multifacetado dos Estudos Culturais, da noção de paisagem sonora, da cartograia e da experi-mentação artística. Nestas páginas são tecidos os encontros da pesquisa, da escrita, da música, da escuta e da produção artística com o viver. A pesquisa escorre em processualidade e procura evidenciá-la constantemente, em uma tentativa de trilhar rastros, pistas dos caminhos seguidos. A partir de um lugar de incômodo, a pesquisa se esforça para criar algo novo que leve o con-ceito de infográico até o seu limite, e assim o transformar. Nos contando o percurso de criação dos “sonigráicos”, escrito e (re)criado no diário, e evidenciando os encontros e intercessões que tornaram a pesquisa possível. Pelo caminho são questionados os modos de pesquisar em educação, saíndo em busca de possibilidades de perfurar, issurar, virar do avesso, aquilo que temos como dado, como pronto. Partindo dos infográicos, explora, para além deles, uma pro-cessualidade no pesquisar em educação. O resultado foi o despertar de uma nova sensibilidade através dos sentidos em um corpo que se fez sempre presente.

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ABSTRACT

This Master’s thesis continues the research initiated during the undergraduate studies, regarding the infographics that approach the theme of the climate change. The current study continues to be inspired by transgressive movements of these artifacts, and does so by bringing sounds and noises to compose, create, and establish artifacts named “sonigráico” in the world. First, the research demarcates the concept and importance of infographics and then problematizes them. By being bothered with the informational immobility of these artifacts and with the silencing of a sensitive education caused by the excess of visual and cognitive elements, the research im-merses in another search. To do so, the research draws on contributions from the multifaceted ield of Cultural Studies, the notion of soundscape, cartography and artistic experimentation. In these pages the encounter of research, writing, music, listening and artistic production is wo-ven with living. The research lows in processuality and seeks to constantly evidence it, in an attempt to treade trails, which are clues of the paths followed. From a place of discomfort, the research strives to create something new that takes the concept of infographic to its limit, and thus transforms it. Telling us about the path of creation of the “sonigráico”, written and (re)cre-ated in the diary, and highlights the encounters and intercessions that made research possible. Along the way the author questions the ways of researching in education, and seeks possibili-ties of drilling, cracking, turning inside out, what we have as given, as ready. Starting from the infographics, she explores, beyond them, a processuality in education research. The result was the awakening of a new sensitivity through the senses in a body that has become ever present. Keywords: Cartography. Soundscape. Infographic. Cultural Studies.

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SUMÁRIO

TOMO I:

INSPIRAÇÕES MUSICAIS: Discograia no Percurso………...………13

1. APROXIMAÇÃO COM O TEMA………...………....15

1.1 Os infográicos………...……….19

1.2 Uma busca pelo sensível………...22

1.3 As paisagens sonoras………...26

2. MODOS DE INCENDIAR A PESQUISA………...………...31

2.1 Cartograia e diários - o percurso junto aos processos………...36

3. SONIGRÁFICO - A INVENÇÃO DA PALAVRA………...45

4. TECENDO UM FIM INEXISTENTE………...49

4.1 Os sons e o silêncio………...57

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS………...65

TOMO II: DIÁRIO………...……….…...5

...Os Registros das Forma………...……...…..103

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CITADAS NO DIÁRIO……..……...116

TOMO III: SONIGRÁFICOS………...………...…..………...3

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INSPIRAÇÕES MUSICAIS: Discograia no Percurso

[...] somente na música é que o [ser humano] encontra a verdadeira harmonia dos mundos interior e exterior. (SCHAFER, 2001, p. 70)

Estas breves páginas são para apresentar as músicas que embalaram a escrita e a reali-zação desta pesquisa. Algumas estão mais presentes no corpo do texto, pois reverberaram tão intensamente em mim que parecem ter reletido diretamente nas experimentações realizadas. Outras nem aparecerão ao longo da leitura. Contudo, são músicas, melodias, que me atravessa-ram durante a pesquisa percorrida no tempo do mestrado. Podem até não serem citadas direta-mente, mas com certeza habitam os cantos e as invisibilidades deste texto.

Por isso, sinta-se à vontade! “Dê um play”! Durante a leitura tentarei oferecer, de diver-sas formas, pelo menos um relance do que foi vivido. Contudo, lembre-se: não existem obri-gações, apenas sugestões. Não precisa escutar música durante o processo de leitura (nem todos conseguem ler em ambientes ruidosos/sonoros e isso, de forma alguma, é um problema). A ideia foi, quando resolvi escrever estas inspirações, que - se você quiser - escute a lista sugerida no período o qual se dispor a ler a pesquisa. Pode ser a qualquer momento, em um intervalo de almoço entre estudos, no domingo pela manhã quando o ambiente parece portar uma lentidão embriagante, no carro ou no ônibus indo para “sabe se lá onde”, na faxina que exige corpo - nessa situação a música parece ser um combustível necessário.

Escute, não escute, ouça como quiser, se quiser, de ponta cabeça, em pé, de lado, em diagonal.

No frio, no calor, no azedo, no doce. No cansaço, na disposição, no domingo, na cama. Em sol menor, em lá maior, com voz, sem voz. No cotidiano.1

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“Quando se escuta uma palavra, o sentido parece habitar para além do som, mas quan-do se escuta a música, [...], o som se confunde com o sentiquan-do e o sentiquan-do se torna o som.” (p. 200) Escutar, para Kohan (2018), é um gesto generoso, de atentar, de criar, de compreender, é permitir encontros. É no encontro da música com a escuta, por exemplo, que ela se faz existir, não há música sem escuta, sem encontro. Por isso devemos nos manter unidos, pensando nos coletivismos do cotidiano, pois não nos fazemos sem os outros, mesmo que esse seja um movi-mento difícil de se realizar na sociedade contemporânea, na qual a ideia do coletivo se encontra apagada pela cultura dominante que exalta o indivíduo e separa sua subjetividade de um pensa-mento, de um viver, coletivo.

Este pensamento é muito potente ao nos aproximarmos do campo da educação: deslocar a atenção dos egos construídos por tantos dispositivos que permeiam nossas vidas e praticar uma amizade, na qual incluem-se valores estéticos e políticos, partilhando linguagens, gestua-lidades, sons, e uma percepção comum de viver e habitar o mundo. Expressando democratica-mente a criação conjunta de ideias, permitindo em nossas aulas o improviso, aquilo que “não se previu antes”, e aprender a seguir com eles. Pensar a aprendizagem como um ato artístico, que precisa do “perder-se” e do estar junto para acontecer.

Ana Preve (2013) airma que é ao longo do processo que o “perder-se” acontece. É o movimento de ir e vir, de ver e sentir. É caminhar em um movimento de libertação da tradicio-nal transmissão de informações. Explorar novos territórios e novas experimentações permite o “perder-se”. Pensando neste conceito, os infográicos com suas inúmeras informações anun-ciam “verdades” e acabam impossibilitando certas movimentações e questionamentos. Preve (2013) fala da diiculdade de enxergarmos além daquilo que nos é apresentado, porém os es-paços que habitamos são mais do que apenas a visão nos permite. Os infográicos não fogem desta regra, são lotados de informações - geralmente advindas da ciência - o que nos impede de ir além do “falso ineditismo” apresentado. A autora, assim como Kohan (2018), ainda fala que o movimento de “perder-se” depende do desmanche de um território, de uma desterritorializa-ção, das possibilidades de se mover por entre os espaços. Pensar em “perder-se” nos espaços limitados, pela perspectiva da educação, também nos faz ter esperanças que aconteça um certo abandono das referências ixas das informações, desconectando-se de certa forma dos conteú-dos e das avaliações que exigem de nós apenas a cognição, silenciando muitas vezes a sensação ou a experiência. Quem sabe seja possível produzir um novo conhecimento livre do que já foi pensado, um conhecimento que permite interferências, atravessamentos e silêncios do mundo,

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Vale salientar que, aqui nesta pesquisa, os considero como um novo conhecimento, ainal são as mídias que nos rodeiam cotidianamente que estão produzindo constantemente novos modos de ensinar e de aprender novos saberes, inluenciando diretamente nos processos educacionais. Acredito que a infograia também possui dimensões artísticas, criando uma inter-secção entre arte, mídia e ciência. A arte é feita com os meios de seu tempo, o que atualmente podemos ver com as artes midiáticas (fotograia, cinema, vídeos) que “representam a expressão mais avançada da criação artística atual e aquela que melhor exprime sensibilidades e saberes.” (MACHADO, 2007, p. 10) Para o autor, a arte não é um conceito deinido, é um processo em constante mutação, assim como tantos outros. No mundo das mídias, os conceitos e as práticas artísticas são afetadas consideravelmente, transformando esses processos em uma discussão bem complexa para a atual sociedade midiática em que estamos inseridos.

No início do século XIX o texto escrito predominava nas mídias impressas. Módolo (2007) airma que as revistas se aproximavam, inclusive, da formatação dos livros e um dos motivos principais era a limitação nas técnicas de impressão e das tecnologias da época. Neste contexto, como pouco se consumia esse tipo de informação, as revistas europeias começaram a publicar textos mais leves e acessíveis com a presença de algumas ilustrações, e o Brasil também seguiu essa tendência. Já no começo do século XX a sociedade como um todo estava sofrendo uma grande transformação cientíico-tecnológica e o jornalismo não icou de fora. Foi nesse período que as fotograias e as ilustrações começaram a ganhar mais espaço nas publi-cações jornalísticas. Com as inovações de impressão e a maior acessibilidade às novas tecno-logias, os infográicos foram ganhando mais e mais espaço, se estabelecendo como uma nova linguagem midiática.

Isso equivale a dizer que a linguagem jornalística utilizada na mídia impressa, particularmente nas revistas, está se tornando mais imagética a cada dia. Além disso, atualmente, essa linguagem, que dá preferência à imagem, parece encaixar--se mais adequadamente ao estilo de vida da população: o infográico é lido em poucos minutos, já que é predominantemente visual, e apresenta-se de uma forma fácil de compreender a uma grande parcela da população. (MÓDOLO, 2007, p. 4)

Portanto, os infográicos, assim como as ilustrações e as fotograias, ganham cada vez mais espaço na mídia, já que muitas vezes é ali que o leitor foca sua atenção, “pois já se sabe que as pessoas compreendem melhor os fatos quando mostrados visualmente.” (p. 11) Além disso, a autora fala da mudança nos modos de leitura que essas transformações causaram no público, isto é, deixamos de lado a leitura linear para podermos ler a página como um todo.

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Assim, o leitor pode começar a ler da onde desejar. Isso não exclui pontos de entrada no texto, contudo eles não serão mais, essencialmente, como os tradicionais: canto superior esquerdo da página, da esquerda para a direita, de cima para baixo.

Durante a pesquisa inicial com os infográicos, enquanto explorava as mídias, como a internet e as revistas, percebi que as informações apresentadas neles, geralmente traziam títulos com perguntas comuns e curiosidades. Em um certo momento, depois de desconstruir a ideia ixa que possuía sobre estes artefatos, de que eram uma ótima solução para livros didáticos já que eram eicientes e objetivos, por exemplo, comecei a questionar os tipos de informação que são valorizados e aqueles que são desprezados pelo modelo de ciência disseminada por esses meios informacionais. Foi assim que a forma das informações dispostas nos infográicos à mi-nha frente começaram a me causar um certo incômodo. A imobilidade do conhecimento, a falta de espaços para podermos questionar e nos perder entre os signiicados, o forte antropocentris-mo nas notícias, o privilégio da cognição, a ênfase nos dados matemáticos e nas porcentagens. Apesar de termos atualmente uma gama diversa de meios que disseminam infográicos, minhas primeiras explorações, ainda nos tempos da graduação, foram em revistas, principal-mente a Superinteressante, uma revista de publicações cientíicas da Editora Abril. Em 1987, a editora comprou os direitos de uma revista espanhola chamada Muy Interesante. O objetivo era traduzir as reportagens e repassar ao público brasileiro. Porém, houve complicações na impres-são das revistas e a Editora teve que começar a fazer suas próprias reportagens. Primeiramente, o foco das matérias eram as ciências exatas e biológicas, após muitos anos publicando esse tipo de informação eles começaram a divulgar notícias das áreas de humanas e sociais. “Seu público é jovem, mas a própria revista criou uma nova ideia sobre essa juventude, deinindo-a ‘como uma questão de atitude, de atualização.’” (FERREIRA, 2008, p. 74) Sendo assim ela se deine por uma revista de divulgação técnica/cientíica que visa atingir jovens criativos e inte-ligentes, independentemente dos aspectos socioeconômicos. O conteúdo da revista é a “ciência atualizada”, ou seja, novas descobertas, novos pensamentos, novas teorias e tenta ser precisa e interessante em suas abordagens, “a revista apresenta, entre seus objetivos, a importância de co-municar a seus públicos assuntos pertinentes à Ciência de forma clara e concisa” (FERREIRA, 2008, p. 87).

Nesta jornada pelo mundo da comunicação encontrei o “Manual de Estilo da Editora Abril, como escrever bem para as nossas revistas” (1990), manual prático de redação para os jornalistas, escritores, editores ou para qualquer outra pessoa que possa se interessar pelo

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to. É nele que se encontram alguns princípios básicos da editora, inclusive o que não é permi-tido redigir (palavrões, expressões preconceituosas), o que se deve evitar (eufemismos, gírias, textos longos, palavras longas) e o cuidado na hora de escrever títulos e legendas. Em relação a capas e títulos o manual fala “[...] é a chave. Para funcionar, precisa ter impacto. Sem impacto, não chamará a atenção. Se não chamar a atenção, será inútil. Títulos curtos (até 4 palavras). Um título bem feito ‘vende’ uma reportagem. Ou uma edição.” (p. 22) Se a própria editora diz que a manchete boa é aquela que vende, podemos compreender que as revistas, assim como todas as formas de informação e conhecimento estão jogando o jogo do poder e do saber, como os Estu-dos Culturais nos dizem. Não importa o que o título tem a dizer, mas o quanto ele pode vender. Assim, a economia tem o primado sobre a informação. Essas são práticas de representação que estão fortemente enraizadas nas informações que nos bombardeiam constantemente.

Para produzir uma reportagem na forma da infograia são necessários proissionais de diferentes campos do conhecimento, sendo fundamental um trabalho em equipe que permita a conversação desses campos. No caso dos artefatos que analisei na graduação, as equipes eram compostas comumente por designers, editores, escritores e ilustradores. Apesar de serem áreas próximas, sabemos (por experiência própria) que trabalhos em grupo necessitam de muita con-versa e respeito para conseguirem acontecer, permitindo que todas as individualidades sejam expressadas. Mas a partir do momento em que essa equipe trabalha para uma empresa, no caso a editora, que possui um manual de como escrever “bem” para suas revistas, ocorre uma pa-dronização no que deve ser dito e como deve ser dito. Outros saberes são excluídos, para que a mídia se airme como ela é. Algo semelhante do que acontece com a ciência, ocorre também com outras esferas do conhecimento, como a comunicação. Os infográicos necessitam de dife-rentes proissionais para serem produzidos, ou seja, é preciso um diálogo entre saberes, contudo os problemas vão muito além de como a ciência é divulgada, e de como as mídias transpassam esses saberes. Relito sobre o que esses artefatos despertam (conscientemente ou não) em nosso modo de ser/ler/aprender com o mundo.

1.2 Uma busca pelo sensível

Podemos entender que estamos imersos em uma cultura extremamente imagética e, assim como Catunda (1994) diz, é quase impossível comunicar algo não-visual de uma forma não-espacial atualmente. No caso de seus estudos, sobre os cantos dos pássaros - música/sons -

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em consonância com a natureza, e isso necessita de uma “readequação dos sentidos e das for-mas de comunicação com o mundo [...]” (CATUNDA, 1994, p. 129), ou seja, a autora acredita no surgimento de uma nova sensibilidade, que aguce outros sentidos e desenvolva outras for-mas de comunicação com o ambiente que vivemos. Busco na presente pesquisa (re)unir nova-mente os sentidos (visão/audição principalnova-mente) a im de (re)criar sensações sinestésicas que, ao meu ver, são extremamente importantes para nossa comunicação com/no mundo, ativando sutilezas, e quem sabe, despertando novas sensibilidades.

Segundo Lapoujade (2017), para Étienne Souriau, ilósofo da arte, a percepção estética nunca é neutra: temos percepções que são privilegiadas, e elas nos fazem conirmar a favor do que vimos, ouvimos, sentimos. Não só percebemos aquilo que desejamos, como também defen-demos nossos pontos de vista, por isso nunca somos imparciais, estamos sempre sendo atraves-sados por linhas de força, de discurso, de poder. Temos que ter a responsabilidade de comparti-lhar nossas percepções privilegiadas, responsabilidade de fazermos ver, e é nesse momento que nos tornamos criadores: “De sujeito que percebe (ver), torna-se sujeito criador (fazer ver).” (p. 22) É assim que produzimos novas realidades, inventamos novas e diferentes lentes para ver o mundo. Contudo isso demanda posicionamentos de quem cria, isto é, defender a nova realidade que surge, seja ela ilosóica, artística ou cientíica. Precisamos, acredito, lutar e romper com o ceticismo para ela poder ganhar existência, pois assim que uma nova criação surge sua realida-de é questionada. O autor airma que não existimos sozinhos, existimos porque fazemos existir outras coisas, “toda existência precisa de intensiicadores para aumentar sua realidade. Um ser não pode conquistar o direito de existir sem a ajuda de outro, que ele faz existir.” (p. 24 e 25)

Como disse anteriormente, já realizei algumas análises desses artefatos culturais, dos infográicos que povoam as revistas investigadas durante o TCC, porém meu olhar estava foca-do no endurecimento que a ciência provocou à arte existente neles, na impossibilidade de “per-der-se”. Nesta nova etapa acadêmica, o mestrado, navego por outras correntes, não excluindo o que já foi realizado, mas alargando minha pesquisa através de novas questões, mais especiica-mente pensar em que medida a arte poderia ajudar a libertar a ciência e as informações de suas amarras. Contudo, pontuo aqui que não pretendo dicotomizar a arte e a ciência, ou seja, colocar a arte como libertadora e a ciência como rígida, ainal existem práticas cientíicas transgressoras dentro das ciências humanas (e, inclusive, das ciências biológicas), por exemplo, e artes endu-recidas, apegadas a uma ideia cristalizada de vanguarda. Fugir da dicotomização automática e hegemônica- feio/belo, bom/mau, verdade/mentira - também é um exercício diário, muito

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TE, 2013). Ele consiste em um conceito interdisciplinar de pesquisas que envolvem ambientes acústicos, sejam eles quais forem, e suas transformações no espaço-tempo, criando uma in-tersecção entre a ciência, a sociedade e as artes em seus estudos. Um tipo de pesquisa sobre “qualquer porção do ambiente sonoro vista como campo de estudos. O termo pode referir-se a ambientes reais ou a construções abstratas, como composições musicais.” (SCHAFER, 2001, p. 366) O surgimento deste conceito veio de uma vontade de conscientização dos ambientes sonoros cotidianos, na busca de propor possibilidades que favoreçam o bem estar dos seres nos mais diversos contextos. Nesta área de estudos é comum pesquisas que mapeiam as paisagens sonoras e seus efeitos nos habitantes do local, além disso também são comuns estudos na mú-sica experimental contemporânea, como Catunda (1994) nos mostra em suas experimentações na Amazônia com a cantora e compositora Tetê Espíndola e os cantos dos pássaros - falo mais sobre a obra da autora no capítulo seguinte.

As paisagens sonoras são compostas pelos diferentes sons que fazem um ambiente, podem ser naturais, humanos, tecnológicos, urbanos. O som do mar, do vento, das folhas, dos cantos dos pássaros, dos insetos rastejantes; o som dos carros, dos ônibus, dos passos apres-sados na calçada, das buzinas, dos gritos dos vendedores ambulantes, das músicas tocadas no rádio. É a hibridização desses múltiplos sons e ruídos que fazem surgir as paisagens sonoras. Elas se alteram ao longo do dia, das horas, dos anos, das estações, por isso ao estudá-las tam-bém podemos considerar suas transformações ao longo do tempo. Vendo de um ponto de vista mais geral, as grandes cidades, por exemplo, possuem uma paisagem sonora barulhenta graças ao desenvolvimento tecnológico e dos mais diversos objetos propagadores de ruídos, por isso sons como o dos animais são cada vez mais raros e menos frequentes nesses ambientes. Para Schafer (2001), as paisagens sonoras tendem a ser progressivamente mais barulhentas com o passar do tempo: “a paisagem sonora do mundo está mudando.” (p. 17) Ouvimos cada vez mais sons, cada vez mais altos, vivemos em meio a uma poluição que também é sonora, e anestesia-mos os ouvidos para não senti-la. A poluição sonora é quando não ouvianestesia-mos cuidadosamente, e para Schafer (2001) a solução não é limparmos os ruídos, mas sim questionar quais são os sons que queremos favorecer.

Geralmente quando ouvimos a palavra ruído pensamos em algo que nos incomoda, que está sujando o som que deveria ser posteriormente “limpo”. Por exemplo, para gravar uma música em estúdio, as paredes são acústicas, toda estrutura do lugar tenta evitar ao máximo ru-ídos em suas gravações. Porém, aqui, ruído é diferente de barulho. O ruído, para esta pesquisa,

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2. MODOS DE INCENDIAR A PESQUISA

Já utilizei algumas vezes o termo artefato para me referir aos infográicos, isso porque a abordagem das minhas análises é baseada sobre um olhar que caminha junto aos Estudos Culturais. Este campo de estudos tem por orientação assumir uma desconiança da isenção de interesses e das relações de poder na produção dos conhecimentos, e deste mesmo modo venho buscando orientar minhas investigações. Para falar de Estudos Culturais precisamos pensar sobre o que se entende por cultura, considerada aqui como constituinte do mundo social, nos processos econômicos e políticos, e criadora de signiicações nas práticas cotidianas de diferen-tes grupos. Por isso, para os Estudos Culturais a cultura já não é entendida como alta (música clássica, ópera, ballet) ou baixa (música popular, graite, videoclipes), e sim como todas as práticas culturais que dão sentido às coisas do mundo.

Nas perspectivas pós-modernas o pensamento hegemônico racionalista é questionado, não é descartado, porém seu fechamento à imaginação, à icção, à sensação é contestado. A ideia desses questionamentos não é separar tais mundos, mas sim tentar mesclá-los, nessa visão não existe uma categorização hierárquica, ou seja, não existe um modo de “ser” melhor ou pior que outros modos.

Volto a conversar com Catunda (1994) para falar rapidamente sobre racionalidade e racionalização, e quem sabe elucidar um pouco alguns aspectos das perspectivas pós-modernas citadas acima. A racionalidade, para a autora, se manifesta pelo diálogo entre os sujeitos e entre os sujeitos e o mundo, isto é, ela está presente em nossa capacidade argumentativa, em encarar objeções adversas e resistências da realidade, em confrontar teorias e fatos. Já a racionalização, que tem a mesma origem, se fecha em si mesma e no sistema que ela construiu, não permitin-do qualquer questionamento ou interferência/atravessamentos permitin-do munpermitin-do “externo”. Catunda (1994) diz que em todo conhecimento existe o embate entre a racionalização que se fecha e a racionalidade que se abre. “A racionalidade aberta é evolutiva, não se pode pretender esgotar o real numa teoria, deve se opor a racionalização que bebe da mesma fonte, mas que se fecha a tudo o que não cabe no sistema que construiu.” (p. 116)

Guimarães e Wortmann (2014) nos apresentam, através do levantamento de pesquisas que articulam a Educação Ambiental e os Estudos Culturais, principalmente no sul do país, um mundo onde existe a multiplicidade de “ser”. Isso gera uma necessidade de desnaturalizar (des-construir aquilo que já era natural, como hábitos, princípios, discursos) os estereótipos, deste

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modo podemos ver além dos pré-conceitos construídos socialmente. Esse processo é essencial para analisar os fatos cotidianos, particularmente quando consideramos as inluências midiáti-cas que nos bombardeiam diariamente. O avanço da tecnologia e das mídias possibilitaram a comunicação e os diversos modos atemporais de ser, agir e pensar. O contato constante com es-sas informações molda a construção de “ser”, nossos pontos de vista e noses-sas visões de mundo. Para os Estudos Culturais quando falamos dos signiicados e subjetividades acionadas pela mídia, se a considerarmos enganosa, podemos airmar que existe apenas uma verdade, pois ela se estabelece em jogos de poder/saber.

[...] poder e saber são dois lados de um mesmo processo. As relações de força constituem o poder, ao passo que as relações de forma constituem o saber, mas aquele tem o primado sobre este. O poder se dá numa relação lutuante, isso é, não se ancora numa instituição, não se apóia em nada fora de si mesmo, a não ser no próprio diagrama estabelecido pela relação diferencial de forças; por isso, o poder é fugaz, evanescente, singular, pontual. O saber, bem ao contrário, se estabelece e se sustenta nas matérias/conteúdos e em elementos formais que lhe são exteriores: luz e linguagem, olhar e fala. É bem por isso que o saber é apreensível, ensinável, domesticável, volumoso. E poder e saber se entrecruzam no sujeito, seu produto concreto, e não num universal abstrato. [...] aquilo que opera esse cruzamento nos sujeitos é o discurso, uma vez que é justamente no discurso que vêm a se articular poder e saber. (VEIGA-NETO, 2007, p. 130)

Um dos caminhos dos Estudos Culturais é a linha da pedagogia cultural. Nela, as prá-ticas, os produtos e os espaços culturais são considerados educativos e minha pesquisa com os infográicos era situada nessa perspectiva durante a graduação, na qual os considerava educati-vos e construtores de identidades no mundo social. Ainda olho para essa mídia como produtora de signiicados que modiicam a nossa vida, principalmente no que diz respeito a ciência. Além disso, creio que ela é carregada de conceitos que estão continuamente sendo construídos, não só pelo conhecimento cientíico, mas também por entrelaçamentos com o conhecimento popular.

Até aí tudo bem, não via problemas em situar minha pesquisa nessa área de estudo, na verdade achava muito potente estar conversando com ela. Porém, com o passar do tempo e de algumas conversas com colegas e professores, comecei a indagar um pouco mais os conceitos que envolvem a pedagogia cultural. Um dos aspectos que encontrei é que apesar de sua impor-tância para o estudo de práticas culturais formadoras de cidadãos fora das instituições escolares, alguns de seus conceitos entram em conlito com o campo das artes, por exemplo. Para eles a pedagogia cultural pode ser uma redução das possibilidades e uso da arte enquanto proliferação sensível, isto é, ao transformar quase tudo em pedagógico acabamos limitando seus signiicados

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Além desse movimento de investigação, houve a proposição de sairmos pelos lugares que habitamos perguntando para as pessoas das mais diferentes idades o que elas achavam sobre nossos “objetos”, portanto, nas oportunidades que tinha, questionava quem conseguia sobre o que eles achavam que era um infográico. Trago aqui algumas das frases ditas durante uma aula que participei junto com a turma de licenciatura em Ciências Biológicas na UFSC em junho de 2018:

“São informações com muitos gráicos e notícias atrativas.” “Me faz lembrar de setas, dados, porcentagens, gráicos...”

“Ele é autoexplicativo, não é?”

“Quando você fala infográico penso em uma linguagem universal, acessível.” “Um objeto que une informação e imagem. Uma forma de passar informação que não é

tra-dicional.”

Depois desse movimento, quando pensávamos nas pesquisas, perguntávamos: “o que pode?”. “O que pode um infográico?”

É durante esse processo cartográico que buscamos chacoalhar nossos entendimentos sobre as coisas já ditas, numa tentativa de deixar novas percepções serem acionadas sobre aquilo que temos certeza. Convicções podem ser perigosas quando estamos num processo de pesquisa. Podemos dar as mãos para os nossos clichês e com eles fazer algo diferente surgir, para isso acontecer precisamos permitir os atravessamentos do que nos rodeia, permitir sermos afetados pelas linhas de força que perpassam nossos cotidianos e, inclusive, nosso campo de es-tudo. Um movimento de pesquisa em que precisamos ser transformados para poder transformar, e por esse motivo necessitamos cultivar a atenção e nos mantermos relaxados ao mesmo tempo, para que as linhas que se entretecem nos espaços/tempo possam nos atravessar. Assim assumi-mos uma postura na pesquisa, na qual partiassumi-mos da concepção de que não há neutralidade, pois

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O mapa neste tipo de cartograia não trabalha sozinho, precisa do seu “canteiro de obras” para fazer sentido. A metáfora do “canteiro de obras” foi utilizada pela professora Ana Preve durante o seminário para nos dizer que os processos, as sujeiras, os ruídos geralmente “eliminados” das nossas pesquisas na hora de escrevê-la, devem estar evidentes, e no caso do método da cartograia, devem seguir a obra inal para fazer sentido. A cartograia consiste em acompanhar processos, em mostrar aquilo que sustenta o que desejo apresentar, diferente da ciência moderna que prega a limpeza, o controle de variáveis, o distanciamento entre sujeito e objeto. Contudo, o método cartográico não pretende ser melhor nem pior, apenas ser outro modo de fazer pesquisa.

O livro “Pistas do método da cartograia - pesquisa-intervenção e produção de subje-tividade (vol. 1)” organizado por Eduardo Passos, Virgínia Kastrup e Liliana da Escóssia em 2012, foi uma das bases que utilizamos para discutir a cartograia durante o seminário na Udesc e, consequentemente, reletiu nas escolhas das referências metodológicas desta pesquisa. No texto de apresentação, escrito por Passos, Kastrup e Escóssia, os autores contam como o livro foi produzido coletivamente durante três anos de trabalho por grupos de pesquisa que investi-gam processos de produção de subjetividade na Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O grupo elaborou pistas metodológicas da cartograia inspirados nos pensamentos de Deleuze e Guattari somados às suas inquietações metodológicas - os ilósofos Gilles Deleuze e Félix Guattari não proporam a cartograia como método, eles discutiram ilosoicamente a pesquisa social, são outros autores, como esses que produziram o livro, que vão instituí-la como método possível.

O método da cartograia não pretende ser maior nem menor, não pretende ser excludente com outros métodos:

Os impasses metodológicos são muitas vezes atribuídos à natureza da pesquisa qualitativa, que reúne grande parte das investigações no campo dos estudos da subjetividade.[...] Esta requer procedimentos mais abertos e ao mesmo tempo mais inventivos. Por outro lado, a distinção entre pesquisa quantitativa e quali-tativa, embora pertinente, surge ainda insuiciente, já que os processos de pro-dução da realidade se expressam de múltiplas maneiras, cabendo a inclusão de dados quantitativos e qualitativos. Pesquisas quantitativas e qualitativas podem constituir práticas cartográicas, desde que se proponham ao acompanhamento de processos. (PASSOS; KASTRUP; ESCÓSSIA, 2012, p. 8)

A questão, para eles, vai além da distinção das pesquisas em qualitativas e quantitativas. “A questão é como investigar processos sem deixá-los escapar por entre os dedos.” (p. 8) Existe

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sa se faz no processo, na processualidade do que nos toca. É assim que o método cartográico caminha, com o princípio de que estamos o tempo todo em processo. O cartógrafo, atravessado pelas intensidades, mapeia as conexões de sua pesquisa e altera a realidade.

Pensando em algumas ideias de Mills (2009) permaneço com o diário em mãos. Ainal, como o próprio autor diz, o pesquisador social não separa sua vida pessoal do seu trabalho, ele utiliza um para enriquecer o outro, e assim acaba planejando modos de vida que auxiliam na sua própria produção. Tal arquivo, ou diário, consiste em uma miscelânea de trechos de livros, referências bibliográicas, experiências vividas, imagens, fotograias, se mantendo em eterno movimento: partes são abandonadas enquanto outras são adicionadas, para o autor essa mobi-lidade é sinal de progresso. Portanto, anoto/desenho/coleciono, seja sobre estruturas de textos, modos de escrever, assuntos lidos, experiências vividas, marcas do corpo, sentimentos.

No texto “Diários como atuantes em nossas pesquisas: narrativas iccionais implicadas” de Medrado, Spink e Mello (2014), os autores fazem um breve histórico dos diferentes usos dos diários na sociedade ao longo do tempo, evidenciando seus limites e suas potencialidades. Po-rém, a parte que mais chamou atenção e, que acredito conversar com a metodologia do presente trabalho, - baseada no uso de um diário - é quando os autores vão falar de como os pesquisado-res são cientes da obrigação do capítulo metodológico. Cientes da descrição dos procedimen-tos, estratégias e materiais utilizados na pesquisa e, como isso pode estar atrelado ao rigor da objetividade cientíica, ou “por outro lado – como defendemos aqui o modo como fazemos uma pesquisa (metodologia) – constitui-se como parte essencial para abertura de diálogo com outros pesquisadores e estudiosos sobre o tema pesquisado [...]” (p.277). Portanto, a metodologia não precisa estar situada em um capítulo à parte, ainal são as descrições e argumentações sobre caminhos seguidos e abandonados que vão constituir a metodologia do pesquisador (p. 278). Os diários não são mais vistos somente como instrumentos de pesquisa, mas também como par-ticipantes da pesquisa, ainal a separação entre sujeito e objeto torna o diário um objeto inerte, diminuindo sua potencialidade. Neste caso, o diário não é mais um simples poço de anotações e informações esperando para ser consultadas, “mas a produção de intensidades, materializadas em conceitos” (p. 279). São eles que vão misturar as palavras e as coisas…

O diário, como airmamos, é um atuante: com ele e nele a pesquisa começa a ter certa luidez, à medida que o pesquisador dialoga com esse diário, construindo relatos, dúvidas, impressões que produzem o que nominamos de pesquisa. Esse companheirismo rompe com o binarismo sujeito-objeto, tornando o diário também um ator/atuante que permite a potencialização da pesquisa. Ao invés de atores con-trapostos (pesquisador/pesquisado; técnicas/instrumentos; tema/objetivo), temos

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4. TECENDO UM FIM INEXISTENTE

Os infográicos carregam consigo, como já argumentei na minha dissertação, uma po-lítica visual bem deinida, eles possuem tanto uma dimensão formativa, ligada à cognição, quanto uma dimensão estética, ligada à arte. Contudo, a dimensão cognitiva se coloca em uma posição superior à sensível, sufocando-a, pois nós privilegiamos a informação e o conheci-mento que ela pode nos oferecer, somos nós em nossas práticas cotidianas que criamos esses tipos de hierarquias. É válido lembrar que isso não ocorre exclusivamente com os infográicos, a prática de privilegiar a cognição está por todos os lugares, como nas escolas e nas mais va-riadas instituições de ensino, onde medem o desempenho de seus alunos através de avaliações em que a cognição deve ser, na maioria das vezes, a sua única aliada. O espaço para o sensível se mantém silenciado. Apesar dos infográicos possuírem ambas as dimensões, o pensamento cognitivo mantém seu lugar de prestígio, isso porque a arte não possui intenções diretas, não clama por inalidades, ela aposta na perturbação, na formação pelo estranhamento, e quando ela é apresentada para conirmar algo do campo cognitivo, o campo do sensível é suprimido. Não foi fácil subverter as marcas deinidas dos infográicos, as quais projetam um sujeito passivo que recebe informações mastigadas, quase com uma função de substituir pensamentos mais complexos e entregar as conclusões prontas - algo que não dá o que pensar. Eles são bons no que fazem, informação rápida, eiciente, objetiva, mas me incomodaram. Por isso durante as ex-perimentações busquei construir algo a partir deste lugar de incômodo, com o desejo de causar estranheza, de ativar uma estética da formação: deixar as sensibilidades virem à tona.

Retirei os textos dos “sonigráicos” produzidos na ideia de deslocar a atenção da cogni-ção e ativar outros sentidos, uma tentativa de causar estranhamento, uma perspectiva estética da educação, permitindo que o campo do sensível possa se expressar. Ao acionar outras dimensões estéticas dos infográicos, exijo dos leitores/experimentadores e de mim mesma, uma certa alteridade, uma necessidade de habitar corpos outros. Caminhar entre a cognição e a sensação tornou-se relexo de uma caminhada entre as ciências e as artes, uma busca pelos espaços e possibilidades que existem entre os extremos. Dentro das instituições de ensino privilegiamos as informações oriundas da ciência quase sempre voltadas para o cognitivo, mas o que pode a educação quando se encontra com a arte, com a estética? Uma aposta na formação pela estra-nheza, pela perturbação. Exige outros corpos, exige sensação.

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tém vivo seu discurso com eles. Em certos momentos da pesquisa houve uma grande preo-cupação com a questão da representação e se eu deveria continuar produzindo imagens que representavam algo - preocupações evidentes no diário. Mas acabei compreendendo que não há como escapar da representação, se escapasse desse fator não poderia mais conversar com os infográicos, me distanciaria de tal forma que falar de infograia não faria mais sentido algum. Por isso, parto do princípio que ao deslocar certas partes que compõem este tipo de represen-tação cultural realizo ações micropolíticas, ou seja, aqui neste território de pesquisa faço os infográicos dançarem a minha música, mas isso não signiica que eles deixarão de existir, eles existiam antes desta investigação e continuarão existindo depois dela. Eu me incomodei com a forma dos infográicos, mas eles não se incomodam comigo, por isso esta pesquisa se movi-menta em pequenas e potentes ações, de perfurar, transgredir, subverter, fazer algo novo romper superfícies endurecidas por convicções.

Houve durante o processo de pesquisa uma reconexão com o mundo da cultura. O corpo já não é mais o mesmo que iniciou esta escrita, e sinto isso com todos os sentidos. O cultivo da atenção ao som, aos espaços, ao presente, alterou meu modo de se relacionar com o mundo ao redor. Quando fui para Belém, em 2018, para o VII Encontro Nacional de Ensino de Biologia (ENEBio), só conseguia ouvir os sons. Às vezes icava parada imóvel entre as pessoas, fechava lentamente os olhos e escutava. Tateava aquele novo território com os tímpanos. Sinto que os olhos já não dão mais conta de se relacionar com os espaços. As cidades, as praias, as lorestas, parecem ser tão mais do que aquilo que conseguimos ver. Agora quando saio de casa presto atenção nos sons, não sempre, ainal o corpo e a mente também descansam, mas quando me ponho atenta, o que me atravessa em cheio é o som, depois o cheiro, depois o tato, parece que dessa forma meu corpo se faz mais presente.

Apesar das decisões terem sido tomadas com bastante cuidado, tentei não premeditar muito o que poderia acontecer, tentei deixar luir processualmente, estabeleci alguns objetivos e percorri a estrada conforme caminhei. Relexo de uma prática de escuta paciente, onde parti da ideia, desenvolvida com Kohan (2017), de que mesmo quando planejamos, devemos deixar nos levar pelo inesperado, por aquilo que não se cumpre nas expectativas e preparações da pesquisa, assim permitimos um caminhar pelas alteridades que compõe a troca potente oriunda dos encontros que a formam. Os processos acabaram transbordando para todos os cantos desta pesquisa, não era algo planejado, mas acabei encostando em autoras, colegas, professoras, que me levaram a repensar, a criar outros caminhos durante o próprio caminhar. Em certo momento,

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gital sem suprimir a beleza das notas escritas à mão, os esboços, as marcas nas páginas. Talvez o diário possa parecer ruidoso demais e acabar dando a ideia de não conversar com a proposta da pergunta guia de pesquisa e de algumas considerações tecidas sobre o excesso de informações na sociedade contemporânea, por isso, pontuo aqui, que o diário não tem o intuito e nem a força de responder a pergunta da pesquisa, ele responde e tenta honrar o método escolhido, a proces-sualidade, a cartograia. Quem tem a intenção de responder a pergunta central desta pesquisa são as experimentações: os “sonigráicos”.

O diário de pesquisa, nesta investrigação, não funciona como comumente costumamos pensar, ele se aproxima mais de uma ideia de rascunho, de esboço, no qual registrei e vivenciei um processo criativo/inventivo através das composições, invenções e anotações. A potência do rascunho é permitir um caminhar entre modos de existência, é permitir que as linhas do trabalho possam instaurar diferentes percepções e diálogos, possam causar estranheza. Foi mantendo o estado de esboço presente que consegui apresentar o avesso da pesquisa, as intempéries, as conquistas, o que abandonadei e o que acolhi. Demonstrando os movimentos de um pesquisar cambiante, escorregadio, em educação. Além disso, a leitura do diário, pode, inclusive, desper-tar sensibilidades outras ao sentirmos e ouvirmos os “sonigráicos”.

Durante as explorações acadêmicas e as experimentações, me deparei com o livro “As Existências Mínimas” do ilósofo David Lapoujade (2017). Aciono ele para elucidar um pouco a ideia de rascunho/esboço, relexão importante para esta pesquisa que expõe seu avesso, os rascunhos do processo.

O autor cultiva uma ideia de que não há como existir uma plenitude sobre as coisas, ou seja, que as explicações, relexões, debates, gerem uma verdade absoluta sobre algo. Ele airma que isso causa uma ilusão sobre o mundo, preferindo se apoiar nos esboços, nos rascunhos, que surgem através dos territórios endurecidos pelas convicções de verdade. Alguns voltam a se perder, outros ressurgem e ganham existência, assim como o próprio ato de pesquisar, onde esboços serão acionados e outros abandonados. A noção das potências do rascunho, dos esbo-ços, são questões importantes para esta pesquisa, que tem como um de seus objetivos funcionar como um sketchbook, em eterno estado de rascunho ruidoso, mantendo a potência naquilo que não se completa, ou que, ao se completar, fragmenta coisas outras.

Lapoujade (2017) nos apresenta diferentes modos de existência. Os fenômenos são um modo de existência que possui uma maneira própria, eles possuem uma “arquitetura momen-tânea” (p. 29), um pôr do sol, galhos chacoalhando com o vento, as pegadas apagadas na beira

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do mar, um amanhecer nas dunas… Eles dependem de uma nuance. As coisas são outro modo de existência, caracterizadas pela persistência de existir. Assim como os fenômenos, as coisas também se manifestam, mas persistem na existência, elas se mantém através de suas manifesta-ções. Contudo, para uma coisa existir ela precisa de outras, isto é, ela possui sua existência liga-da a outras, por isso as coisas necessitam de uma organização própria, que conseguem manter sua estabilidade, diferentemente dos fenômenos que possuem uma estrutura evanescente. Já os seres de icção habitam a existência dos imaginários, baseada no desejo, no medo, na fantasia, no entretenimento. É um modo de existência social, que depende do discurso, das crenças, das culturas para existir. Os imaginários dependem da nossa crenças e afetos para poderem existir. Por último ele nos fala do modo de existência dos virtuais, tão frágil quanto a dos imagi-nários, mas diferentemente deles não está ligado às crenças ou aos afetos. Os seres que habitam esse modo de existir estão em estado de rascunho, em esboço, eles se confundem com o nada, mas não o são. Os virtuais aspiram a existência. Sua manifestação em rascunho, fragmentada, abre leques de novas possibilidades, se desenham por entre as realidades, num movimento de existência e não existência. Eles não são pré-determinados, o que os torna múltiplos nas pos-sibilidades, mas ao mesmo tempo frágeis em sua impermanência, em sua evanescência. Um diário de pesquisa prolifera virtuais. Assim como os outros modos possuem formas de se mani-festar e de airmarem sua realidade, os virtuais manifestam-se em suas incompletudes. “Ou seja, são os virtuais que introduzem um desejo de criação, uma vontade de arte no mundo. Eles são a origem de todas as artes que praticamos.” (p. 38) Os mais diversos campos do conhecimento, compostos por inventores e criadores, se alimentam dos virtuais para se fazerem existir e pros-seguir, pois os virtuais necessitam de outros seres para que possam se manifestar, assim como os criadores necessitam dos virtuais para criar realidades. Todo pesquisador precisa dos virtu-ais, tanto quanto eles precisam de nós. Eles possuem a arte de existir inacabada, portam uma certa expectativa, imploram um porvir. Os virtuais acompanham os outros modos de existência, as realidades se alteram constantemente, se fragmentam, podem se tornar inacabadas, frutos do que podem vir a ser, elas podem passar de um modo para o outro, hibridiza-los. Porém os virtu-ais não deixam de ser virtuvirtu-ais, eles acompanham as transições dos modos de existência, criam pontes, quando realidades são criadas e outras se fragmentam. Manter um estado de rascunho é permitir que a pesquisa não se conclua em uma única possibilidade, mas que ela prolifere potências.

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permitiram acontecer. Nas obras de Deleuze, o ilósofo aciona um diálogo entre o ilosóico e o não-ilosóico, sem privilegiar nenhum dos dois, pelo contrário, airmando que ambos são modos de pensar e de se expressar, e por isso possuem a mesma importância: “tornar possível o pensamento.” (VASCONCELLOS, 2005, p. 1218) A ilosoia é um campo de estudo que, para Deleuze, consiste em constituir problemas e criar conceitos, e a história da ilosoia busca problematizar ambos. É assim que Deleuze se aproxima do pensamento sem imagem, com base em sua crítica à premissa de que o pensamento é algo natural, de que “basta pensar “verdadei-ramente” para pensar com veracidade - a natureza reta do pensamento, o bom senso universal-mente compartilhado.” (VASCONCELLOS, 2005, p. 1219) Na contínua construção de uma ilosoia da diferença, o ilósofo ainda nos apresenta mais dois pontos essenciais que constroem o que ele chama de imagem dogmática do pensamento, algo que para Deleuze, imobiliza o pen-samento. O primeiro ponto é o de que o sentimento, o corpo, a sensação, as subjetividades, são vistas como forças externas que nos levam ao erro, que se opõe ao pensamento “verdadeiro”; o segundo é que “[...] para pensar, precisamos apenas de um método; um método que nos faça pensar bem e verdadeiramente.” (VASCONCELLOS, 2005, p. 1219) Contrapondo essas três características essenciais da imagem dogmática do pensamento, Deleuze em seus estudos sobre Nietzsche, airma que o pensamento não é algo natural.

O pensamento não pensa sozinho e por si mesmo, como também não é perturbado por forças que lhe permaneceriam exteriores. Pensar depende necessariamente das forças que se apoderam do pensamento. (VASCONCELLOS, 2005, p. 1220)

Em seus estudos sobre Proust, Deleuze nos apresenta a imagem dogmática do pensa-mento como uma imagem racionalista da ilosoia, e a contesta sugerindo uma nova imagem da ilosoia, ancorada nas relações entre as forças externas que movimentam o pensamento, per-mitindo encontros, intercessões. Portanto, para a ilosoia proposta pelo autor, pensar é colocar o pensamento em movimento, é permitir que as forças externas o atravessem e o mobilizem. “Pensar é, além disso, interpretar. [...] pensar é explicar, desenvolver, decifrar, traduzir signos.” (VASCONCELLOS, 2005, p. 1220)

Deleuze vai explorar em suas obras a imagem do pensamento quais as possibilidades de exercitá-lo, que para ele, como vimos antes, consiste em retirar o pensamento da imobilidade, o levando para seu lado mais extremo, que é a criação de conceitos. Vasconcellos (2005) nos diz que tais conceitos devem aliar o ilosóico e o não-ilosóico, permitindo que as linhas de

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intuito de, talvez fracassadamente, nos envolver nessas oscilações comuns ao ato de pesquisar. Viver a escrita e a arte como experiência, deram ao texto certo ritmo. Ao falar de sons, viver os sons, experimentá-los, transgredí-los, somados ao modo que escolhi escrever estas páginas, ou seja, viver a escrita, transformaram a pesquisa em um texto sonoro, que batuca, aumenta e diminui o volume, ecoa vozes em coro, outras em solo. As coisas não se separam durante um percurso de investigação, elas se misturam, se tecem juntas, praticamos nossas per-guntas de pesquisa diariamente e, assim, podemos colocar nosso corpo inteiro nesta experiência que se espalha pelos cantos.

Vida e música não se separam, ambos são movimentos que não estão dados. Por isso, co-locamos nosso corpo presente ao caminhar entre eles, aguçamos tato, paladar, audição... Aciono Kohan (2018), novamente, para airmar: não criamos sozinhos. Treinar uma escuta sensível é como um gesto generoso de permitir encontros-outros. Deixar que o imprevisível, despertado pelos sentidos, pelo corpo presente, também tome conta de nossas pesquisas, de nossas aulas, aprender a seguir com eles. Se pensarmos em uma aprendizagem criativa, que opera como um ato artístico, precisamos nos perder juntos. Assim exploramos novos territórios ou desterrito-rializamos aquilo que temos como dado. Esta pesquisa também tenta funcionar como um modo de “perder-se”, busca em sua processualidade, evidenciar os caminhos construídos conforme o corpo se fazia presente, conforme praticava a pesquisa. Foi ao perder referências ixas, convic-ções, entendimentos, que consegui realizar o mestrado. Por isso, não há como o texto se fechar em uma única “verdade” possível.

Quase que num ato contrário de fechamento em uma conclusão, este texto tenta acio-nar possibilidades múltiplas, proliferação de pensamentos, de intercessores. É uma tentativa de abraçar a criação na prática de pesquisa em educação e na própria docência. Trilhar pistas, caminhos, para acionar outras possbilidades, permitindo que uma educação mais sensível possa se manifestar. Desenvolver a sutileza dos sentidos pode ecoar em uma educação mais atenciosa. O som, a audição, experimentados e treinados ao longo destes dois anos de pesquisa, despertam uma aprendizagem que cria marcas no corpo, permitem sentir e ler um infográico com um cor-po sensível. Ao deslocar o conceito de infográico, libertando-o de certa forma de suas amarras informacionais ligadas somente a cognição e a visão, apostei no esforço de exaurí-lo até perfu-rá-lo, evidenciando esse processo a cada etapa da pesquisa, deixando que uma educação mais sensível pudesse emergir e que arte se manifestasse sem inalidades distintas.

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projetando para o exterior, despertando sensações outras, misturando os sentidos, alterando as percepções, treinando músculos e mente...

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Diário

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sumário

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DIÁRIO

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OS REGISTROS DA FORMA

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Nas páginas a seguir apresento fragmentos do diário de pesquisa mutável, híbrido, nô-made. Misturam-se cotidiano, pesquisa, prazeres, dores, sofrimentos, todos embalados pelo ritmo de pesquisa - que alterna de acordo com a disposição da pesquisadora.

Convido-as(os) para embarcarem comigo em uma viagem pelos mares das experimen-tações. (Re)viver experiências de campo e dos processos, desde a produção das imagens, dos sons, até a forma da escrita e da própria dissertação. Alerto para a possibilidade de acidentes e tempestades; de tranquilidade e contemplação.

Estique as costas, os pulsos, os dedos, o pescoço. Alongue o pulmão, os ouvidos, o tímpano, o coração, a mente.

Respire pela pele, pelos olhos, pela boca. Suspenda, brevemente, o tempo.

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Músicas e imagens. Os dois caminham juntos, sinto as imagens e os sons surgirem internamente, naturalmente, percorrendo meu corpo.

Ouvir as folhas Ouvir a areia Ouvir o mar Ouvir os pássaros Ouvir os insetos Ouvir o sol…

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Bebendo Ficção do seminário “A nau incendiária da icção” profº Dr. Leandro Guimarães

Experimentar com o corpo para depois se amparar.

Espacialidade: escorre….quais espacialidades habito, percorro, experimento na/pela/com a icção?

Transgressão: transgredir limites, sem que eles deixem de existir…

Transpor de um universo sensível à outro. Qual a potência disso para a educação?

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O Belo Perigo - Foucault (2016):

(leitura feita para seminário da icção)

“Quando começo a escrever um estudo, um livro, qualquer coisa, não sei realmente aon-de isso vai, nem em que vai dar, nem o que aon-demonstrarei. Só aon-descubro o que tenho para demonstrar no próprio movimento da escrita, como se escrever fosse precisamente diag-nosticar aquilo que eu queria dizer no exato momento em que comecei a escrever.” (p. 49)

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Referências

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