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A necessidade do MST desenvolver um canal de comunicação ao TJPR

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO

CURSO DE TECNOLOGIA EM COMUNICAÇÃO INSTITUCIONAL

BRUNA DE FREITAS CASTRO HELOISA BAGATIN CARDOSO

A NECESSIDADE DO MST DESENVOLVER UM CANAL DE COMUNICAÇÃO AO TJPR

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

CURITIBA 2013

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BRUNA DE FREITAS CASTRO HELOISA BAGATIN CARDOSO

A NECESSIDADE DO MST DESENVOLVER UM CANAL DE COMUNICAÇÃO AO TJPR

Trabalho de Conclusão de Curso ou Monografia apresentado como requisito parcial à obtenção do título de Tecnólogas em Comunicação Institucional da Universidade Tecnológica Federal do Paraná.

Orientadora: Profª. Drª. Maurini de Souza

CURITIBA 2013

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Dedicamos este trabalho a todos aqueles que não desistem de suas lutas, a exemplo do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que tanto nos ensinou durante a nossa pesquisa.

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AGRADECIMENTOS

Agradecemos especialmente à professora Maurini de Souza, pela paciência, dedicação e orientação deste trabalho, e por ter compartilhado todo o seu conhecimento sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Agradecemos também a todos os professores do Curso de Tecnologia em Comunicação Institucional, que desde 2006 nos deram o suporte necessário para nos tornarmos profissionais. E, por último, somos gratas a todos os amigos e familiares que não nos deixaram desistir.

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Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca.

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RESUMO

CASTRO, Bruna de Freitas; CARDOSO, Heloisa Bagatin. A necessidade do MST desenvolver um material de comunicação ao TJPR. 2012. Número total de folhas: 98.Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de Tecnologia em Comunicação Institucional) Departamento Acadêmico de Comunicação e Expressão - Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitilba, 2012.

Este trabalho tem como objetivo avaliar a necessidade do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) de desenvolver um material de comunicação específico ao Tribunal de Justiça do Paraná, como forma de divulgar as ações do movimento. Para tal, será realizada revisão bibliográfica sobre a questão agrária, o MST e os ruralistas, diferenciando os posicionamentos de ambos os grupos e conhecer os meios de comunicação utilizados por cada um. Além disso, pretende-se identificar a postura prioritariamente adotada pelos magistrados do TJPR, por meio da análise das cinquenta ementas dos acórdãos do TJPR que envolvem o MST nos últimos 10 anos. O trabalho se pautará nos conceitos de dialética de Marx (2008, 2010) e na concepção de movimento social por Touraine (apud GOHN, 2010), bem como tomará por base os estudos de Gohn (2010) acerca dos movimentos sociais no Brasil e de Carter (2010) sobre a questão agrária brasileira. Pretende-se oferecer os dados coletados à assessoria de comunicação do MST no Paraná e, se for o caso, informar a premência de desenvolver um canal de comunicação destinado ao Poder Judiciário paranaense.

Palavras-chave: Comunicação. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

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ABSTRACT

CASTRO, Bruna de Freitas; CARDOSO, Heloisa Bagatin. A necessidade do MST desenvolver um material de comunicação ao TJPR (The need of a communication guide developed by MST to TJPR). 2012. Número total de folhas: 98. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de Tecnologia em Comunicação Institucional) Departamento Acadêmico de Comunicação e Expressao - Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitiba, 2012.

This survey thematizes the Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra on its relation with the Tribunal de Justiça do estado do Paraná. The theme derives from the formulated problem, that has as an objective evaluate the need from the movement to develop a communication material directed to TJPR. The theme derives from the problem formulated for this research, that has the objective of evaluate the need of the Movement to develop a material of communication directed to TJPR, as a way to publish the movements actions. For such, the research proposes a few especific objectives. It begins with a bibliographical review about the land issue, the MST, the ruralists, distinguishing the positioning from both groups and identifying the communication means used by each one of them. Besides, it intends to colect elelments that can identify the position adopted by judges from TJPR through the analysis of fifty syllabus of the deals of TJPR that envolves the MST in the last 10 years. The research will regularize on the concepts of dialectics from Karl Marx and in the conception of social movement by Touraine, as also will base the studies of Gohn about social movements in Brasil and Carters theory about brazilian agrarian issue. Finaly, realizes a survey of colected data about the MST, and if necessary, informs the necessity to develop a communication channel destined to the Poder Judiciário paranaense.

Keywords: Communication. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Rural

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – O MST É PARTE? EM QUAL PÓLO, AUTOR OU RÉU? RECORRENTE OU RECORRIDO?... 70 TABELA 2 – QUAL O TIPO DE AÇÃO E RECURSO? CLASSIFICADA EM

CÍVEL OU CRIMINAL; A ESPÉCIE DA AÇÃO; E DO RECURSO. ... 72 TABELA 3 – O ESTADO É CONSIDERADO RESPONSÁVEL PELAS

AÇÕES DO MST? (SIM/NÃO) TEM O DEVER DE INDENIZAR OS PROPRIETÁRIOS EM RAZÃO DA OCUPAÇÃO? (SIM/NÃO). O ESTADO É CONSIDERADO OMISSO QUANDO NÃO FORNECE REFORÇO POLICIAL PARA AS

OPERAÇÕES DE DESOCUPAÇÃO? (SIM/NÃO)... 75

TABELA 4 – QUANTAS DECISÕES UTILIZAM COMO FUNDAMENTO OU REFORÇAM O DIREITO À PROPRIEDADE PRIVADA? QUANTAS DECISÕES TRATAM DA FUNÇÃO SOCIAL DA TERRA? ... 77 TABELA 5 – UTILIZA-SE A EXPRESSÃO “OCUPAÇÃO” OU “INVASÃO”?

QUANTAS VEZES APARECE NA EMENTA?... 79 TABELA 6 – SOB A ÓTICA DO SENSO COMUM, FORAM USADOS

TERMOS OU JUÍZOS DE VALOR NEGATIVOS EM REFERÊNCIA AO MOVIMENTO, SUAS CAUSAS OU AÇÕES? QUAIS? ... 81 TABELA 7 – EXISTEM EXPRESSÕES JURÍDICAS QUE POSSUEM

CONOTAÇÃO NEGATIVA QUANDO EMPREGADAS EM RELAÇÃO AOS INTEGRANTES DO MST OU AOS SEUS ATOS? QUAIS? ... 84 TABELA 8 – AS INFORMAÇÕES PRESTADAS PELA MÍDIA SÃO

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LISTA DE QUADROS Quadro 1...27 Quadro 2...27 Quadro 3...28 Quadro 4...31 Quadro 5...32 Quadro 6...34

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SUMÁRIO 1.1 INTRODUÇÃO 01 1 A QUESTÃO AGRÁRIA 04 2 MST E HISTÓRICO DE COMUNICAÇÃO 08 3 RURALISTAS 14 4 LUTA DE CLASSES 19

5 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ 24

6 SISTEMATIZAÇÃO DAS EMENTAS 26

CONSIDERAÇÕES FINAIS 39

REFERÊNCIAS 42

ANEXOS 46

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INTRODUÇÃO

No início dos anos 1960, havia uma disputa entre duas linhas de pensamentos para melhorar a produção agrária no país: de um lado, os que defendiam a reforma agrária e, por outro, o grupo liderado pelos economistas da USP. No período da ditadura militar, a opção do Estado foi investir na busca pela modernização no campo com base na ampliação dos latifúndios, com estímulo ao uso de agrotóxicos e mecanização, com a consequente repressão dos conflitos agrários. Assim, os projetos que defendiam a reestruturação na distribuição de terras no país e que culminaram com a lei proposta pelo presidente João Goulart1 foram abandonados e os problemas sociais que eles combatiam se ampliaram, mesmo com o crescimento econômico da produção agrícola nacional.2

Na década de 1980, em Cascavel, no interior do estado do Paraná, trabalhadores rurais de todo o país fundaram um movimento social camponês para reivindicar o uso da terra para o trabalho e como forma de combater a desigualdade social; surgiu, assim, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Segundo Carter, “em meados da década de 1990, o MST havia se tornado o maior movimento social da América Latina, e a reforma agrária estabeleceu-se na agenda pública do Brasil.” (2010, p. 27). As principais estratégias utilizadas pelos

1

O decreto inicial tinha como relator o Ministro do Trabalho e Previdência Social João Pinheiro Neto.

2

“[...] o Estatuto da Terra jamais foi implantado. Era um “faz-de-conta” para resolver pelo menos momentaneamente os problemas no campo. Para viabilizar a sua política econômica, o Estado manteve a questão agrária sob o controle do poder central. Por essa política, o acesso à terra ficou fechado aos camponeses e totalmente aberto à empresa capitalista. O Estatuto da Terra escancarou-se, então, como um instrumento estratégico para controlar as lutas sociais e desarticular os conflitos por terra. As únicas e pouquíssimas desapropriações serviram apenas para diminuir os conflitos ou realizar projetos de colonização (veja no item a seguir), De 1965 até 1981, foram realizadas 8 desapropriações em média por ano, apesar de terem ocorrido pelo menos 70 conflitos por terra anualmente. Desse modo, apesar de o Estatuto da Terra aparecer, por suas definições, como querendo modificar a estrutura fundiária e punir o latifúndio, a política agrícola e agrária dos militantes promoveu a modernização tecnológica das grandes propriedades. Ao mesmo tempo, os grandes proprietários tinham livre acesso aos órgãos do Estado, como o Ministério da Agricultura, o INCRA etc., exercendo forte controle sobre o Poder Judiciário e o Congresso Nacional. Enfim, o Estatuto da Terra não saiu do papel e a política agrária real do regime militar significou, de fato, a entrega de mais terras aos comerciantes e industriais. E foi nesse período que se entregaram grandes extensões de terras públicas da região amazônica a grupos empresariais e também a multinacionais que, segundo o INCRA, possuem hoje 30 milhões de hectares no Brasil. A modernização tecnológica da agricultura não significou a eliminação das formas tradicionais de relações de trabalho. O desprezo aos direitos trabalhistas chegou ao ponto de provocar o ressurgimento do trabalho escravo no campo. A violência para bloquear as formas de organização e representação também ganhou corpo, conseguindo paralisar as lutas.” (MORISSAWA, 2001, p. 99-100).

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participantes do MST para pressionar a redistribuição de terras é a ocupação de lotes, avaliados como improdutivos, e a resistência e combate às políticas conservadoras (MST, 2009b).

Por sua vez, os proprietários rurais perceberam a necessidade de se reunir para resguardarem o direito à propriedade e fundaram, assim, a União Democrática Ruralista (UDR), em 1985. Essa classe influenciou a criação da bancada ruralista, a qual constitui uma frente parlamentar que age em favor dos interesses dos latifundiários3 e do agronegócio4

Os trabalhadores rurais sem-terra e os grandes proprietários de terra têm, então, protagonizado uma luta de classes no Brasil, cada qual em defesa de seus interesses. Interesses antagônicos geram ações judiciais, sobretudo na discussão acerca da (i)legalidade das ocupações de lotes. Deste modo, para solucionar os conflitos agrários, os juízes precisam reconhecer esse dualismo de posições e eleger uma das posturas para adotar em seus veredictos.

e procura obstar os projetos de Reforma Agrária, sob o argumento de proteção da propriedade privada (UDR, 2011). Em razão da forte influência e ligação dos ruralistas com o Governo, a redistribuição de terras tem ocorrido de forma lenta e sem muita eficácia. Além disso, influenciando os meios de comunicação de massa de maior circulação do país, os ruralistas buscam a criminalização e exclusão dos movimentos sociais campesinos, em especial, do MST.

3

Latifundiário é a denominação que recebe o proprietário do latifúndio, ou seja, do imóvel rural que excede aos limites máximos permitidos – 600 (seiscentas) vezes o módulo médio da propriedade rural e 600 (seiscentas) vezes a área média dos imóveis rurais, na respectiva zona – ou que tenha área igual ou superior à dimensão do módulo de propriedade rural, mas seja mantido inexplorado em relação às possibilidades físicas, econômicas e sociais do meio, com base nos artigos 4º e 46, parágrafo primeiro, da Lei 4.504/1964 (Estatuto da Terra). Do conceito de latifúndio do professor argentino Antonio Vivanco depreende-se que constitui a utilização deficitária da terra agrícola, caracterizada geralmente pela existência de uma vasta área e com o emprego de mão de obra assalariada, com escassa produção de bens e serviços, pouca organização e com baixo rendimento, impondo más condições de vida e de trabalho. (VIVANCO, 1967, p. 51).

4

“Podemos definir, então, o agronegócio como o conjunto organizado de atividades econômicas que envolve a fabricação e fornecimento de insumos, a produção, o processamento e armazenamento até a distribuição para consumo interno e internacional de produtos de origem agrícola ou pecuária, ainda compreendidas as bolsas de mercadorias e futuros e as formas próprias de financiamento, sistematizadas por meio de políticas públicas específicas. [...] Além do conceito econômico da atividade, há um projeto de lei de iniciativa do Senado Federal de nº 325/2006 (em análise com a relatoria) que dispõe sobre o Estatuto do produtor e define, em seu art. 2º, o agronegócio como ‘...o conjunto global de operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas; das operações de produção nas unidades agrícolas e itens produzidos a partir deles, incluindo os serviços de apoio’.” (BURANELLO, 2011. p. 44).

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Assim, nesta pesquisa, pretende-se identificar, num primeiro momento, os contextos das ações relacionados às decisões dos magistrados do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, nos casos em que o MST é citado. Para tanto, serão consideradas as ementas5 dos acórdãos6

Com base nos resultados obtidos, será avaliado o contexto no qual o MST se insere nas decisões judiciais, procurando extrair dos julgados quais as percepções dos magistrados em relação ao movimento, contribuindo para avaliar qual o grau de necessidade e enfoque na possível elaboração de um canal de comunicação entre o MST e o Poder Judiciário Paranaense.

proferidos pela Corte Paranaense, disponíveis para consulta no site da instituição nos últimos 10 anos, ou seja, de 2002 a setembro de 2011, perfazendo um total de 50 julgados (ver Anexo A).

Este trabalho está assim dividido; o primeiro capítulo apresenta um panorama geral da questão agrária brasileira, enquanto o segundo capítulo aprofunda-se no histórico do MST. O terceiro capítulo deste trabalho visa abordar a União Democrática Ruralista e o quarto discorre sobre o conceito de Luta de Classes do Karl Marx. O quinto capítulo descreve o Tribunal de Justiça e a organização interna. O sexto capítulo é baseado nos resultados da sistematização das 50 ementas analisadas.

5

“Ementa. Em sentido próprio do Direito, quer ementa significar o resumo que se faz dos princípios expostos em uma sentença ou em um acórdão, ou o resumo do que se contém numa norma, levado à assinatura da autoridade a quem compete referendá-la ou decretá-la. [...] Ementa do acórdão ou da sentença. A ementa é formada por duas partes: a verbetação e o dispositivo. A verbetação é a sequência de palavras-chave, ou de expressões, que indicam o assunto discutido no texto; o dispositivo é a regra resultante do julgamento no caso concreto, devendo, como o dispositivo da sentença, ser objetivo, conciso, afirmativo, preciso, unívoco, coerente e correto.” (SILVA, 2005, p. 517).

6

“Acórdão. Na tecnologia da linguagem jurídica, acórdão, presente no plural do verbo acordar, substantivo, quer dizer a resolução ou decisão tomada coletivamente pelos tribunais. A denominação vem do fato de serem todas as sentenças, ou decisões proferidas pelos tribunais, na sua conclusão definitiva e final, precedidas do verbo acordam, que bem representa a vontade superior do poder, ditando o seu veredicto.” (SILVA, 2005, p. 56).

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1. A QUESTÃO AGRÁRIA

A história da nação brasileira foi e continua sendo escrita em consonância com o processo evolutivo do setor agrário. Quando as primeiras caravelas portuguesas atracaram nos mares do país, os europeus ficaram impressionados com a diversidade da flora e fauna. O pau-brasil era abundante e logo começou a ser extraído com a utilização de mão de obra indígena. A árvore inspirou o nome dessa terra descoberta que passou a ser chamada de Brasil.7

No período colonial8

No Brasil Império existiram medidas governamentais para promover a agricultura e modernizá-la, como a facilitação do crédito, a diminuição de impostos e o estabelecimento de franquias aduaneiras. Em 1888, ocorria a abolição da escravatura com a assinatura – pela princesa Isabel – da lei 3.353

o grande atrativo do solo brasileiro eram as plantações de cana de açúcar – chamadas de ouro branco – e de cacau. Para cuidar das lavouras, foram trazidos os navios negreiros com escravos da África e, nesse momento, começavam a surgir as primeiras formações de aldeias com famílias constituídas. Por conseguinte, para ampliar as áreas de canaviais e expandir a ocupação do território brasileiro, os portugueses começaram a implantar a pecuária extensiva no intuito de auxiliar a força motriz da atividade agrária, bem como para retirar o couro e servir de carne.

9

Após o período Imperial, instalou-se a República Velha

, mais conhecida por Lei Áurea.

10

7

Cf. "Brasil" desde quando?. Portal SESCSP. Disponível em: <http://www.sescsp.org.br/sesc/hotsites/paubrasil/cap2/testemunha.htm>. Acesso em: 01 set. 2010.

dirigida pela política do café-com-leite. As oligarquias paulistas (os produtores de café) e as mineiras (os responsáveis pela produção leiteira) alternavam-se no poder. Os latifundiários passaram a empregar mão de obra de imigrantes (italianos, espanhóis, alemães, entre outros). Ademais, praticamente ao mesmo tempo em que se

8

Cf. História do Brasil Colônia - O Período Colonial. Sua Pesquisa.com. Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/colonia>. Acesso em: 01 set. 2010.

9

Cf. BRASIL. Leis, etc. Collecção das leis do Imperio do Brazil de 1810. v. 1. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1891, p.228.

10

Cf. República Velha. Cultura Brasil. Disponível em:

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praticava a economia cafeeira, a extração da borracha11

De acordo com Oliveira (1988, p.132-75) na década de 1940, os Estados Unidos da América estavam fomentando pesquisas no âmbito da comunicação para desvendar o processo de aceitação ou rejeição das inovações agrícolas por parte dos agricultores, viabilizando a prática de extensão rural. Todavia, com o término da Segunda Guerra Mundial e início da Guerra Fria, os norte-americanos precisavam manter sua hegemonia ideológica e econômica – com o discurso de país capitalista e desenvolvido – sobre os demais países, em especial os de terceiro mundo, chamados de subdesenvolvidos.

desenvolveu-se na Amazônia, durante a chamada Belle Époque.

Nesse paradoxo, segundo Oliveira, surge a ideia de que o desenvolvimento está atrelado à tecnologia – países de primeiro mundo, cidades e grandes centros industriais – e o subdesenvolvimento à ausência dela – países periféricos e localidades afastadas, como o meio rural. Dessa forma, era necessária uma difusão de recursos para modernizar as sociedades atrasadas. Assim, houve um acordo entre os governos brasileiro e americano, no qual o Brasil facilitava a concessão de crédito se o agricultor importasse os equipamentos e tecnologias estadunidenses (OLIVEIRA, 1988, p. 34). A partir dos anos 1970, o Brasil entrou nos ciclos de produção de soja – chamado ouro verde – e de trigo, cujas commodities permanecem operantes até o presente momento e impulsionam o agronegócio (EMBRAPA, 2010).

Nas esferas econômica e política, os dados fornecidos pela Federação da Agricultura do Estado do Paraná12 expressam a importância do setor agropecuário atualmente, visto que representam um terço do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e a mesma quantia dos empregos e exportações do país. Ademais, o governo federal13

11

Cf. SOUZA, Rainer. Ciclo da borracha. Brasil Escola. Disponível em: <http://www.brasilescola.com/historiab/ciclo-borracha.htm>. Acesso em: 01 set. 2010.

reservou a quantia de R$ 107,5 bilhões para o plano Agrícola e Pecuário (PAP) 2009/2010. Em relação aos dados do Paraná, o estado tem 442 mil propriedades rurais, sendo que, em 2008, o estado exportou o equivalente a US$ 15,2 bilhões e produziu, em média, 48% do trigo, 26% do milho, 23% do frango e 20% da soja nacional.

12

FAEP, 2009, p. 3.

13

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O Brasil está entre os países com maior desigualdade social no mundo, de acordo com a pesquisa "De volta ao País do Futuro", realizada em 2012, no Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (CPS/FGV); o país ainda encontra-se entre as 12 nações mais desiguais do mundo.

A desigualdade social é um problema que se iniciou há muitos anos, desde o período colonial. Os portugueses, quando aqui desembarcaram, vieram com o objetivo de explorar e acumular a riqueza das terras brasileiras. As sesmarias, regime que vigorou até 1850, são um exemplo de injustiça da distribuição de terra, pois apenas brancos e católicos tinham o direito de recebê-las, segundo Morissawa (2001).

Entre as leis da propriedade rural no Brasil, destaca-se a Lei n. 601/1850 (Lei de Terras) e a Lei n. 4.504/1964 (Estatuto da Terra), ambas com o intuito de proteger a elite e os grandes proprietários de terra.

A Lei n. 601/1850 (Lei de Terras) veio como um marco do império que em um contexto da sociedade mundial, na qual a Europa, movida pela expansão do capitalismo, vivia uma grande evolução comercial e social. O Brasil precisaria não só reorganizar essa estrutura, como também dar à terra um caráter mais comercial do que social, como era observado pelos grandes engenhos e latifúndios de pessoas influentes.

A terra passa a ser um importante e fundamental gerador de lucros para a economia do estado. Com a lei de 1850, regulamenta-se o registro público de todas as terras e o governo passa a ter o controle total de terras devolutas, isto é, terrenos ou propriedades públicas que nunca entraram legitimamente em domínio particular. Isso ficou conhecido, apesar de timidamente e ineficaz na tentativa de solucionar o problema agrário do país, como um primeiro plano de reforma agrária. Observou-se um pequeno retrocesso na expansão latifundiária; por outro lado, as terras passam a ter dono: o governo ou os coronéis com influência política determinante para manter seus domínios territoriais no interior.

Sem conseguir comercializar as terras devolutas, devido ao alto preço, nem impedir ou delimitar a atuação dos coronéis, o governo passa a acumular terras públicas.

Conforme Morissawa, “a Lei de Terras significou o casamento do capital com a propriedade da terra” (2001, p. 71 - grifo da autora), afirmação compatível com a definição de Sampaio (2010), que coloca a referida lei como a maneira encontrada

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pelas elites da época para evitar que as classes pobres adquirissem uma propriedade de terra.

Ano mais tarde, no início de 1964, o presidente João Goulart organizou um Comício no qual defendeu reformas políticas, onde aconteceram muitas manifestações populares em prol da reforma agrária. Porém, logo em seguida o conjunto de ações de Jango, como o presidente era conhecido, foi derrubado pelo golpe militar que não tinha interesse em ir contra os grandes latifundiários. Com a ditadura, surgiu então uma nova regulamentação legislativa da propriedade de terra, a Lei n. 4.504/1964 (Estatuto da Terra), em busca de apaziguar as manifestações dos campesinos e ao mesmo, sem ferir os interesses políticos da elite brasileira. O Estatuto da Terra diz que o Estado tem a obrigação de garantir o direito ao acesso à terra para quem nela vive e trabalha, porém, tais ações não foram colocadas em prática.

O Estatuto, diz ainda, que: “Considera-se Reforma Agrária o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade”. Porém, mais de 45 anos depois, não houve uma aplicação verdadeira das ideias defendidas pela lei.

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2. MST E HISTÓRICO DE COMUNICAÇÃO

De todos os movimentos sem-terra existentes, o maior e mais expressivo é o MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que contabiliza mais de 1.500 militantes atuantes em 24 estados brasileiros. De acordo com Gohn (2010, p. 143), até 2009 o movimento havia assentado em torno de 370 mil famílias em 1.800 assentamentos, e mais 130 mil famílias em acampamentos. E os números vêm crescendo a cada ano. Hoje o Grupo tem aproximadamente 1,14 milhões de membros, 1,8 mil escolas primárias e secundárias, mais de 2 mil assentamentos, escola de nível superior, diversos meios de comunicação, 140 agroindústrias, 61 cooperativas rurais (CARTER, 2010, p. 38).

O surgimento oficial do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi na cidade de Cascavel, Paraná, na década de 1980, durante uma reunião de camponeses formados por “posseiros, atingidos por barragens, migrantes, meeiros, parceiros, pequenos agricultores” (MST, 2009a). Enfim, trabalhadores sem-terra que viam seus direitos cerceados por um projeto governamental de “modernização do campo” que privilegiava os latifúndios e os grandes conglomerados agroindustriais com liberação de crédito, utilização de agrotóxicos e mecanização da produção. Decidiram então lutar em prol da Reforma Agrária e das transformações sociais para o campo14

Apesar de sua fundação ser datada de 22 de janeiro de 1984, para Fernandes, o MST “não teve sua criação no 1º Encontro Nacional de Sem-Terra, em janeiro de 1984, mas nas primeiras ocupações de terra organizadas no Sul do país em 1979” (2010, p. 165). Ele é considerado herdeiro de outros movimentos brasileiros pela distribuição de terra na área rural (INTERVOZES, 2011, p. 14).

.

Com o golpe militar de 1964, os movimentos rurais foram sufocados. Porém, o retorno de colonos que haviam participado de lutas sociais no Brasil e a recusa de alguns outros em aceitar terras fora do Estado foram os primeiros passos da reorganização dos camponeses semterra. Nos anos de ditadura sofreram grande influência da Igreja Católica, que levou ao surgimento da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 1975.

14

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No primeiro Congresso, durante as Diretas-Já, o MST proclamava: “Sem Reforma Agrária não há democracia”. Conseguiram influenciar os constituintes para elaboração dos artigos 184 e 186 da Constituição Federal15

Segundo o MST “os interesses do latifúndio encontravam nos aparatos do Estado suas melhores ferramentas de repressão ou omissão”. Como resposta lançaram o lema “Ocupar, Resistir e Produzir”, em 1990. E a cada 05 anos, os militantes reavaliam seus objetivos em Congressos e renovam o lema do movimento. Em 1995, o mote era “Reforma Agrária. Uma luta de todos”, em 2000 lançaram “Reforma Agrária. Por um Brasil sem latifúndio”.

, cuja vitória para os militantes foi a garantia de desapropriação de terras improdutivas que não cumprem sua função social.

16

Esta palavra de ordem estava materializada no outro Brasil que queremos construir no cotidiano. Está nas mais de 400 associações e cooperativas que trabalham de forma coletiva para produzir alimentos sem transgênicos e sem agrotóxicos. Estão nas 96 agroindústrias que melhoram a renda e as condições do trabalho no campo, mas também oferecem alimentos de qualidade e baixo preço nas cidades. Um outro país que construímos com 2 mil escolas públicas em acampamentos e assentamentos que garantem o acesso à educação à mais de 160 mil crianças e adolescentes Sem Terras ou que alfabetizaram 50 mil adultos e jovens nos últimos anos. Ou ainda, nos mais de 100 cursos de graduação em parceria com universidades por todo o Brasil (MST, 2009a).

No V Congresso o lema era por “Reforma Agrária, por Justiça Social e Soberania Popular”, e, para os militantes, a luta passa a ser contra a ordem econômica internacional e a globalização da miséria. É citado o caso do embate com a empresa suíça Syngenta Seeds, no Paraná, com produção transgênica e contaminação do Parque Nacional do Iguaçu denunciados pelos militantes, cujo interesse era utilizar a área para produção agroecológica.

O MST elenca três objetivos principais: 01) luta pela terra; 02) luta por Reforma Agrária; 03) luta por uma sociedade mais justa e fraterna. Portanto, os trabalhadores rurais buscam resolver os problemas de “desigualdade social e de

15

“Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: [...]” (BRASIL, 1998)

16

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renda, a discriminação de etnia e gênero, a concentração da comunicação, a exploração do trabalhador urbano”17

A proposta de Reforma Agrária do MST divide-se em quatro pilares: democratização do acesso à terra, desenvolvimento e ampliação da agroindústria local, educação e mudança do modelo tecnológico agrícola existente no Brasil. (GOHN, 1997, p.146)

.

As principais estratégias utilizadas pelos participantes do MST para pressionar à redistribuição de terras é a ocupação de lotes, avaliados como improdutivos, e a resistência e combate às políticas conservadoras (MST, 2009b).

Para conseguir obter crescimento e visibilidade, o MST formulou estratégias de comunicação e identificação. O movimento defende que “O fundamental é que a comunicação desenvolva um papel mobilizador, organizador, agitador, propagandeador, educativo, formativo, nessa grande luta de classes.” (MST, 2001. p. 143). Nesse contexto, investiu-se na formulação de símbolos, como O hino18 17 MST, 2009b. do 18 Hino do MST:

Vem teçamos a nossa liberdade braços fortes que rasgam o chão sob a sombra de nossa valentia desfraldemos a nossa rebeldia e plantemos nesta terra como irmãos! Refrão:

Vem, lutemos punho erguido Nossa Força nos leva a edificar Nossa Pátria livre e forte Construída pelo poder popular

Braços Erguidos ditemos nossa história sufocando com força os opressores hasteemos a bandeira colorida despertemos esta pátria adormecida o amanhã pertence a nós trabalhadores! Refrão:

Vem, lutemos punho erguido Nossa Força nos leva a edificar Nossa Pátria livre e forte Construída pelo poder popular Nossa Força regatada pela chama da esperança no triunfo que virá forjaremos desta luta com certeza pátria livre operária camponesa nossa estrela enfim triunfará! Refrão:

Vem, lutemos punho erguido Nossa Força nos leva a edificar Nossa Pátria livre e forte Construída pelo poder popular (MST, 2009c).

(21)

MST, para ser cantado durante os eventos; e a bandeira, em cor vermelha19, branca20, verde21 e preta22, com o mapa do Brasil23, contendo as figuras do trabalhador e da trabalhadora24 segurando o facão25

Logo no início do movimento, na década de 1980, foi lançado o “Boletim Informativo da Campanha de Solidariedade aos Agricultores Sem Terra”, posteriormente, recebeu o nome de “Boletim Sem Terra”. Em 1984, foi organizado o Jornal Sem Terra (JST), que surgiu antes da fundação oficial do MST e, desde então, tem sido um instrumento de formação e informação para o Movimento e para a sociedade. Com publicação mensal e voltada principalmente para os trabalhadores rurais sem-terra e simpatizantes, JMST procura agregar forças na luta pela Reforma Agrária e por um projeto popular para o Brasil. Conta com tiragem de 20 mil exemplares, aceitando assinaturas em todo território nacional e também no exterior. A assinatura anual, com 12 edições, custa 30 reais, e a bianual, de 24 edições, custa 55 reais, pode ser feita pela internet ou adquirida nas secretarias do MST

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26

A base de comunicação do MST é o Jornal Sem Terra (JST), cujos objetivos são: “ser um instrumento de formação e agitação, capaz de estimular a unidade ideológica, a visão global de luta, propiciar conhecimentos sobre realidade brasileira; reforçar organizações aliadas e alimentar a mística revolucionária” (MST, 2001, p.134).

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Na década de 1990, outras mídias começaram a ter mais força, e as reconfigurações do campo político exigiram que o movimento produzisse outras formas de comunicação. Destaca-se o portal do MST (www.mst.org.br), concentrando uma série de informações acerca do movimento, como história, objetivos, notícias, livros, vídeos, e até produtos à venda, como agenda, broches, bonés e chaveiros. Há o informativo Letra-Viva, que pode ser recebido via e-mail, após cadastro no site. Outro meio de comunicação com popularidade é o

19

“Representa o sangue que corre em nossas veias e a disposição de lutar pela Reforma Agrária e pela transformação da sociedade”. (MST, 2009d).

20

“Representa a paz pela qual lutamos e que somente será conquistada quando houver justiça social para todos.” (MST, 2009d).

21

“Representa a esperança de vitória a cada latifúndio que conquistamos.” (MST, 2009d).

22

“Representa o nosso luto e a nossa homenagem a todos os trabalhadores e trabalhadoras que tombaram, lutando pela nova sociedade.” (MST, 2009d).

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“Representa que o MST está organizado nacionalmente e que a luta pela Reforma Agrária deve chegar a todo o país.” (MST, 2009d).

24

“”Representa a necessidade da luta ser feita por mulheres e homens, pelas famílias inteiras.” (MST, 2009d).

25

“Representa as nossas ferramentas de trabalho, de luta e de resistência.” (MST, 2009d).

26

(22)

Facebook27

De acordo com Gohn (1997,p. 145), o MST passou a ter relação com a mídia a partir dos anos 1990, quando as ocupações de terra eram previamente avisadas à imprensa para que fossem noticiadas. Contudo, essa grande exposição levou o movimento a ocupar manchetes diariamente, o que ocasionou efeitos negativos à sua imagem. Por conseguinte, o MST passou a ser utilizado, pela mídia, como elemento de geração do medo da insegurança junto à opinião pública, com a criminalização de suas ações (GOHN, 1997p.147).

, com todo o conteúdo do site. Em 02 de julho de 2012, 5.571 pessoas haviam curtido a página. Em 23 de fevereiro de 2013, 20.185 pessoas haviam curtido a página, quase triplicando o número.

Na pesquisa publicada no livro Vozes Silenciadas (INTERVOZES, 2010, p. 43), há a análise de 301 matérias que mencionaram o MST ao longo do período em que ele foi alvo da uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) no Congresso Nacional. Identificou-se que 65,7%, ou 198 matérias, abordam o MST com expressões e adjetivos negativos. Ainda sobre a pesquisa divulgada, das 301 matérias, 83 não tiveram nenhuma fonte ouvida, colocando em risco a credibilidade do tema e privilegiando o ponto de vista do autor (Idem, p. 45). Das fontes autorizadas ou dignas de crédito costumam ser representantes da sociedade (como integrantes do Executivo, do Legislativo ou do Judiciário) e especialistas. No primeiro caso, há fontes que, teoricamente, falam em nome do povo ou que tomam decisões com potencial para se tornar notícia, já que interessam a uma grande quantidade de pessoas. No segundo caso, estão aqueles que se consideram movidos por interesses científicos e, portanto, numa ideia positivista da ciência, não se aproveitam de interesses pessoais.

Nos dizeres de Gohn (2001, p. 149):

Os espaços comunicacionais são estratégicos tanto ao movimento, para publicitar suas demandas e buscar algum espaço contra-hegemônico como para seus opositores, que buscam desqualificá-los e isolá-los da opinião pública ao retratá-los como fonte e origem da violência.

Em geral, os meios de comunicação de massa criminalizam os movimentos sociais.

27

(23)

Embora a sociedade esteja dividida em classes e cada qual devesse ter suas próprias idéias, a dominação de uma classe sobre as outras faz com que só sejam consideradas válidas, verdadeiras e racionais as idéias da classe dominante.(CHAUÍ, 1980, p.36)

Em relação ao MST, por exemplo, isso é aparente quando ele é associado com ações violentas, como invasão e destruição de propriedades. Levando em conta que os meios de comunicação de massa influenciam a formação da opinião pública, enxerga-se a necessidade do MST desenvolver políticas de comunicação externa, para atingir públicos além dos próprios militantes e simpatizantes.

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3. UNIÃO DEMOCRÁTICA RURALISTA

A União Democrática Ruralista (UDR) foi fundada em 1985, na cidade de Presidente Prudente (São Paulo). Atualmente a UDR possui sua sede em Brasília. A entidade começou a se estabelecer durante o Congresso Nacional sobre a reforma Agrária, organizado pela Confederação Nacional da Agricultura, em contraposição à “apresentação da proposta do Plano Nacional de Reforma Agrária, elaborado por um conjunto de técnicos, alguns comprometidos com a reforma agrária e contou com a participação de sindicalistas rurais”

A UDR define-se como:

uma entidade sem fins lucrativos, organizada para defender incondicionalmente os direitos e interesses do produtor rural brasileiro, patrocinando sempre que necessário a manutenção do Instituto de propriedade "imóvel rural" como direito privado, de acordo com a Constituição do País.” (UDR, 2013a)

No site é possível se associar à UDR preenchendo o cadastro com envio de cópia do Imposto Territorial Rural (ITR). A entidade oferece aos seus associados serviços jurídicos no caso de ocupação da propriedade por grupos sem terra, por intermédio de advogados, para ajuizamento de “ações de reintegração de posse, interditos proibitórios e aberturas de inquéritos, responsabilizando os invasores pelos crimes cometidos”. Somente em Presidente Prudente há aproximadamente dois mil associados. (UDR, 2013b)

Na ocasião da criação da UDR, os proprietários rurais visavam resguardar o direito à propriedade privada, influenciando o Congresso Nacional para instituir leis conforme os seus interesses. Segundo consta no site da UDR, os ruralistas se organizaram para reagir a “ala política de esquerda radical” que pretendia implantar o sistema comunista no país (UDR, 2013c). Deste modo, afirmam que conseguiram inserir na Constituição Federal de 1988, a garantia à propriedade rural produtiva. O site da Revista Veja informa que os proprietários rurais, responsáveis pela criação da UDR, objetivavam arrecadar fundos para eleger parlamentares que defendessem os interesses da classe ruralista, e também promoviam leilões para comprar armas para capatazes e peões, a fim de proteger a propriedade rural contra ocupações28

28

Cf.

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http://veja.abril.com.br/arquivo_veja/questao-agraria-reforma-mst-mlst-udr-stedile-rainha-eldorado-carajas.shtml. Consultado em: 20/01/2013.

(25)

Esses procedimentos influenciaram a criação da bancada ruralista, a qual constitui uma frente parlamentar que age em favor dos interesses dos latifundiários29 e do agronegócio30

Em razão da forte ligação dos ruralistas com o Governo, a redistribuição de terras tem ocorrido de forma lenta e sem muita eficácia. Além disso, influenciando os meios de comunicação de massa de maior circulação do país, os ruralistas, quando possível, buscam a criminalização e exclusão dos movimentos sociais campesinos.

. Dentre as estratégias adotadas pelos ruralistas para manutenção da propriedade privada está a de obstar os projetos de Reforma Agrária (UDR, 2011). Por isso, considera-se a UDR um grupo com interesses antagônicos ao MST, uma vez que o movimento social busca justamente a redistribuição de terras.

No site da UDR existe um link denominado “invasões”, onde constam notícias acerca das ocupações efetivadas pelos sem-terra, classificando o MST como um grupo praticante de ações ilegais com promoção da desordem. É possível observar que no link dos “artigos”, a primeira notícia que aparece tem como título: “O MST e o STF”, no qual o advogado redator nomeia os militantes de “bandidos” equiparando a ocupação de terras ao crime de roubo. E no link “informativos” existem várias notícias sobre a UDR alertando o STF e o STJ sobre desapropriações de propriedades rurais consideradas injustas pelos ruralistas, encontros dos ruralistas com os Presidentes das seccionais da OAB, e também denúncias da UDR contra o MST e a Via Campesina ao Ministério Público. Portanto,

29

Latifundiário é a denominação que recebe o proprietário do latifúndio, ou seja, do imóvel rural que excede aos limites máximos permitidos – 600 (seiscentas) vezes o módulo médio da propriedade rural e 600 (seiscentas) vezes a área média dos imóveis rurais, na respectiva zona – ou que tenha área igual ou superior à dimensão do módulo de propriedade rural, mas seja mantido inexplorado em relação às possibilidades físicas, econômicas e sociais do meio, com base nos artigos 4º e 46, parágrafo primeiro, da Lei 4.504/1964 (Estatuto da Terra). Do conceito de latifúndio do professor argentino Antonio Vivanco depreende-se que constitui a utilização deficitária da terra agrícola, caracterizada geralmente pela existência de uma vasta área e com o emprego de mão de obra assalariada, com escassa produção de bens e serviços, pouca organização e com baixo rendimento, impondo más condições de vida e de trabalho. (VIVANCO, 1967, p. 51).

30

“Podemos definir, então, o agronegócio como o conjunto organizado de atividades econômicas que envolve a fabricação e fornecimento de insumos, a produção, o processamento e armazenamento até a distribuição para consumo interno e internacional de produtos de origem agrícola ou pecuária, ainda compreendidas as bolsas de mercadorias e futuros e as formas próprias de financiamento, sistematizadas por meio de políticas públicas específicas. [...] Além do conceito econômico da atividade, há um projeto de lei de iniciativa do Senado Federal de nº 325/2006 (em análise com a relatoria) que dispõe sobre o Estatuto do produtor e define, em seu art. 2º, o agronegócio como ‘...o conjunto global de operações de produção e distribuição de suprimentos agrícolas; das operações de produção nas unidades agrícolas e itens produzidos a partir deles, incluindo os serviços de apoio’.” (BURANELLO, 2011. p. 44).

(26)

depreende-se que a UDR se mune de diversos recursos para influenciar o Congresso Nacional e o Poder Judiciário para manutenção do direito à propriedade privada e, por conseguinte, refutando as ações do MST contrárias aos interesses da entidade.

Em 1987, a UDR contratou a ADS – Assessoria de Comunicação Ltda. para reformular suas estratégias de comunicação e imagem perante o público. Segundo a empresa, era preciso melhorar a forma da comunicação das mensagens apregoadas pelos ruralistas, pois de um modo geral, os integrantes falavam alto demais. O presidente da época, Ronaldo Caiado, além de falar gritando, tinha o costume de dar risadas que soavam como deboche perante os ouvintes. Assim, dentre os diversos objetivos para mudar a imagem da UDR, a agência destacou:

[...] promover ampla divulgação das atividades da UDR, para formar mentalidade favorável por parte da opinião pública para com a entidade; e promover um maior conhecimento sobre a importância do produtor rural no processo de desenvolvimento e crescimento socioeconômico do país (CONRERP, 1987: 10).

A empresa de comunicação orientou os ruralistas para: ao criticarem a reforma agrária também apresentem soluções ao problema. Igualmente prestaram assessoria ao presidente da UDR para adequar os “gestos, posturas e a maneira de vestir”. A ADS resume o trabalho desenvolvido com a entidade nos seguintes tópicos:

* contatos pessoais com todos os editores dos principais veículos de comunicação de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Brasília, Curitiba e Belo Horizonte, para explicar os reais objetivos da UDR;

* participação de Ronaldo Caiado no programa Roda Viva, da TV Cultura de São Paulo, em outubro de 1987. Durante cinco horas, num programa simulado, Caiado foi preparado para a sabatina dos jornalistas de Roda

Viva. O programa — segundo a ADS — foi um sucesso, muito contribuindo

para Caiado passar a imagem de democrata;

* o sucesso dessa entrevista na TV Cultura repercutiu — a íntegra da entrevista foi reproduzida no jornal O Estado de São Paulo, na edição de 12 de outubro de 1987;

* foi implantado um sistema de resposta direta às notícias negativas sobre a UDR;

* Para manter uma unidade de comunicação e proporcionar para as UDRs regionais o apoio de especialistas em comunicação, a ADS estabeleceu um sistema de contatos telefônicos com todas as regionais;

(27)

* foram elaborados o jornal nacional da entidade e os jornais das sedes regionais. (CONRERP, 1987: 10)

A agência ainda destaca a organização da passeata, em 11/07/1987, em Brasília, pela execução do “Plano Nacional de Reforma Agrária” dentro da lei, com mais de cinqüenta mil participantes. O evento conseguiu ampla cobertura da imprensa e dos meios televisivos. Sagrando-se o mote da UDR pelo “cumprimento da lei” (CONRERP, 1987: 10).

Em 2004, os ruralistas, com apoio da Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (Faesp), realizou o manifesto “Acorda Brasil” para se opor às ocupações dos sem-terra31. E lançaram também o movimento “maio verde”, com reforço ao agronegócio, em contraposição ao movimento “abril vermelho” promovido pelo MST32

A UDR defende, então, os interesses dos proprietários rurais sob o argumento de proteger o direito à propriedade privada em observância da legislação, consequentemente, contrapondo-se aos objetivos dos movimentos sociais campesinos, em especial o MST, no tocante à Reforma Agrária. Assim, caracteriza-se a luta de clascaracteriza-ses entre os dois grupos em busca do acesso e da titularidade da terra.

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Igualmente é possível observar que os ruralistas buscam parcerias com outras entidades e buscam influenciar o Poder Público a aderir à causa que apregoam. Os magistrados do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná recebem quinzenalmente o Boletim Informativo da Federação da Agricultura do Paraná (FAEP), cujo conteúdo se perfilha aos objetivos da UDR, com defesa à propriedade privada e ao agronegócio, críticas aos movimentos sociais – principalmente ao MST -, além de rotineiramente publicar entrevistas e notícias de associados à UDR.

Logo, no presente trabalho desenvolvido, parte-se da premissa de que a classe do patronato aproveita o canal de comunicação desenvolvido pela Faep para atingir também ao Judiciário Paranaense.

31

Cf. http://www.faeal.org.br/coluna_faeal_semana.asp?offset=220&id=45

32

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4. LUTA DE CLASSES

Segundo Karl Marx (2008, p. 17), o sonho utópico é uma revolução parcial, meramente política; deste modo, é necessária que determinada classe (secção da sociedade civil), a partir da sua situação particular, suscite uma emancipação geral da sociedade. Contudo, para desempenhar o papel libertador, é preciso que essa classe revolucionária se identifique com a sociedade e a reconheça como representante geral.

Para que a revolução de um povo e a emancipação de uma classe particular da sociedade civil coincidam, para que uma classe represente o todo da sociedade, outra classe tem de concentrar em si todos os males da sociedade, uma classe particular deve encarnar e representar um obstáculo e uma limitação geral. Uma esfera social particular terá de surgir como o crime notório de toda a sociedade, a fim de que a emancipação de semelhante esfera surja como uma emancipação geral. Para que uma classe seja classe libertadora par excellence, é necessário que outra classe se revele abertamente como a classe opressora. (Marx, 2008, p. 18)

Todavia Marx explica que a essência dos indivíduos (e de suas respectivas classes) constitui um egoísmo modesto, mesquinho, em que cada esfera da sociedade passa a se reconhecer a partir do momento em que pode oprimir e não quando é oprimida, dificultando uma emancipação geral. “Assim, todas as oportunidades de desempenhar um papel importante desaparecem antes de propriamente terem existido, e cada classe, no preciso momento em que inicia a luta contra a classe superior, fica envolvida numa luta contra a classe inferior.” (Idem, p. 19). Logo, conforme o autor, a emancipação positiva somente poderia ocorrer do proletariado, porque corresponde à dissolução de todas as demais classes na sociedade civil.

Com base na concepção marxista, o MST e os ruralistas representam classes da sociedade civil com interesses diametralmente opostos. Cada grupo usa estratégias para angariar simpatizantes e caracterizar a outra classe como o mal da sociedade. Na década de 1990, a utilização da mídia para noticiar as ocupações do MST foi estratégica, porém a exposição excessiva das ações do movimento ocasionou um efeito negativo, “e o MST passou a ser utilizado, pela mídia, como elemento de geração do medo e da insegurança junto à opinião pública. Neste

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século, a criminalização de suas ações tem sido a tônica da grande mídia nacional.” (GOHN, 2010, p. 147).

Conforme Marx e Engels, a sociedade tem necessidade de criar um órgão para defender seus interesses (o poder do Estado), todavia, quanto mais independente da sociedade se torna, o Estado mantém-se mais atrelado à classe dominante e aos seus interesses econômicos, e mais rapidamente cria uma nova ideologia. Por conseguinte, os juristas perdem a consciência de que os fatos econômicos são revestidos de motivos jurídicos para serem sancionados em lei e, na análise do caso concreto, consideram apenas a forma jurídica sem levar em consideração o conteúdo econômico (MARX; ENGELS, 2010, p. 133-134).

No Brasil, a legislação rural foi formulada “numa correlação de forças políticas favoráveis aos interesses dominantes no campo” (CARTER, 2010, p. 289). Justo (2002, p. 44-45) explica que os conflitos fundiários surgiram com a Lei de Terras de 1850, quando as terras devolutas passaram a ser monopólio do Estado, garantindo a propriedade privada pela lei, e admitindo apenas a posse da terra pela compra – possível apenas àqueles que possuem condições financeiras para tanto.

No início dos anos 1960, havia uma disputa entre duas linhas de pensamento para melhorar a produção agrária brasileira: de um lado, os que defendiam a reforma agrária (o Partido Comunista Brasileiro – PCB – em que se destacaram Caio Prado Jr., Ignácio Rangel e Alberto Passos Guimarães; setores reformistas da Igreja Católica; e a Comissão Econômica para a América Latina – CEPAL – com a atuação do economista Celso Furtado) e, por outro, o grupo liderado pelos economistas da USP (sendo o então professor Delfim Neto o nome de maior destaque). No período da ditadura militar, a opção do Estado foi investir na busca pela modernização no campo com base na ampliação dos latifúndios, com estímulo aos usos de agrotóxicos e mecanização, ocorrendo grande repressão dos conflitos agrários. (DELGADO, 2010, p. 82-83).

Assim, os projetos que defendiam a reestruturação na distribuição de terras no país e que culminaram com a lei proposta pelo presidente João Goulart33 foram abandonados e os problemas sociais que eles combatiam se ampliaram, mesmo com o crescimento econômico da produção agrícola nacional. Conforme Morissawa:

33

O decreto inicial tinha como relator o Ministro do Trabalho e Previdência Social João Pinheiro Neto.

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[...] o Estatuto da Terra jamais foi implantado. Era um “faz-de-conta” para resolver pelo menos momentaneamente os problemas no campo. Para viabilizar a sua política econômica, o Estado manteve a questão agrária sob o controle do poder central. Por essa política, o acesso à terra ficou fechado aos camponeses e totalmente aberto à empresa capitalista. O Estatuto da Terra escancarou-se, então, como um instrumento estratégico para controlar as lutas sociais e desarticular os conflitos por terra. As únicas e pouquíssimas desapropriações serviram apenas para diminuir os conflitos ou realizar projetos de colonização. Desse modo, apesar de o Estatuto da Terra aparecer, por suas definições, como querendo modificar a estrutura fundiária e punir o latifúndio, a política agrícola e agrária dos militantes promoveu a modernização tecnológica das grandes propriedades. Ao mesmo tempo, os grandes proprietários tinham livre acesso aos órgãos do Estado, como o Ministério da Agricultura, o INCRA etc., exercendo forte controle sobre o Poder Judiciário e o Congresso Nacional(2001, p. 99-100).

George Meszaros (2010, p. 433-459) correlaciona a questão do MST com do Estado de Direito no Brasil, explicando que a oposição se utiliza da premissa “todos devem cumprir e se sujeitar a lei” para deslegitimar as ações do movimento e considerá-lo como ofensivo à democracia nacional, porém sem tecer maiores considerações de como é realizado o processo legislativo (criação das leis) e tampouco como são interpretadas e valoradas as normas legais pelo Poder Judiciário. Apesar da retórica de neutralidade e imparcialidade da legislação, a análise social e histórica demonstra a permeabilidade da lei decorrente da pressão social; no caso, a União Democrática Ruralista e os grupos do establishment econômico e político (por exemplo, a Confederação Nacional da Agricultura, a qual possui poder de veto sobre as políticas do governo) são muito mais influentes do que o MST (MESZAROS, 2010, p. 440). Durante o processo Constituinte, as questões mais polêmicas não foram tratadas de forma exaustiva e completa na Constituição Federal e ficaram para ser incluídas posteriormente, contudo apesar do texto constitucional estipular os requisitos para desapropriação de propriedades rurais com fim de reforma agrária, o processo “é feito por meio de uma intricada rede jurídica, administrativa, econômica e social, mediada por juízes, órgãos administrativos – como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).” (MESZAROS, 2010, p. 441).

Justo (2002, p. 47-48) expõe que o direito à propriedade previsto no Código Civil pode ser utilizado como fundamento tanto do posseiro, cuja terra serve para o trabalho e moradia, quanto do capitalista que usa a terra para negócios e, geralmente, ostenta um título de propriedade privada. O autor prossegue explicando

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que é das contradições desse direito que “nascem as interpretações distintas sobre a terra camponesa e a terra capitalista, terra de trabalho e terra de negócio”.

Por sua vez, Meszaros destaca a desigualdade nas condições de defesa judicial entre os grandes proprietários de terras, cuja estrutura permite contratar escritórios advocatícios de renome e também articular politicamente as normativas legais, em relação aos membros do MST – no princípio contavam com advogados voluntários e não tinham o costume de manter uma assessoria jurídica prévia aos conflitos e permanente (MESZAROS, 2010, p. 445). A partir de 1996, com a criação e o apoio da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (Renap), o MST passou a exercer também uma ação militante jurídica e investir nessa área, com uma política mais ativa do que meramente defensiva, inclusive, capacitando membros do movimento para compor o setor jurídico (Idem, p. 446-447).

Conforme Meszaros, muitos magistrados reforçam o desequilíbrio já existente na legislação ao optarem pela máxima da propriedade privada, com base no Código Civil, em uma concepção meramente patrimonialista ao invés de se valerem de teorias mais progressistas baseadas nas garantias fundamentais e nos princípios constitucionais da função social da propriedade e da dignidade da pessoa humana. Assim, “com um ponto de partida como esse, as ações do MST e outras organizações de trabalhadores rurais se parecem mais com uma tentativa de reequilibrar a ordem social e jurídica do que uma tentativa de subverter essa ordem ou a democracia.” (Idem, p. 440-441)

Segundo o autor (p. 437), o MST seria taxado como ilegal por dois motivos principais: 1) generalização dos atos de transgressão, casos isolados de mau comportamento, infrações e crimes passaram a macular a imagem de todo o grupo, apesar de tais atos não serem tolerados pelo MST; 2) e, principalmente, devido às ocupações de terra.

“O sistema é notoriamente injusto, burocrático, moroso e saturado de preconceitos de classe”, afirma Meszaros (2010, p. 438). Os trabalhadores rurais sem-terra e os grandes proprietários de terra, têm, então, protagonizado uma luta de classes no Brasil, cada qual em defesa de seus interesses. Interesses antagônicos geram ações judiciais, sobretudo na discussão acerca da (i)legalidade das ocupações de lotes. Deste modo, para solucionar os conflitos agrários, os juízes precisam reconhecer esse dualismo de posições e eleger uma das posturas para adotar em seus veredictos, buscando a imparcialidade. Com base em pesquisas

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realizadas pela OAB, o autor explica o descrédito da lei e do Judiciário perante a população brasileira, incluindo, os militantes do MST.

Apesar da estátua vendada de Ártemis, a deusa grega da justiça, na entrada do Supremo Tribunal Federal, denotando imparcialidade, outras representações, mais negativas e incisivas, povoam o imaginário popular. Isso inclui expressões comuns como: “A lei é para inglês ver”, “Da Justiça, o pobre só conhece castigos” e “Há uma lei para o rico e outra para o pobre”. É possível argumentar que o aforismo mais poderoso, prejudicial e esclarecedor é atribuído ao maior estadista e legislador do Brasil do século XX, Getúlio Vargas: “Aos meus amigos tudo, para os inimigos, a lei”. A mensagem por trás desses exemplos é clara: a justiça é seletiva. (MESZAROS, 2010, p. 439)

Justo (2002, p. 51) defende que a violência é consequência do modelo de desenvolvimento do país, logo, estaria equivocado o clamor pela Justiça “como se as desigualdades sócio-econômicas pudessem ser equacionadas pela igualdade jurídico formal” [...] O enfoque é de que o ‘direito’ é instaurado e mantido pela violência; logo, esta é inerente à sociedade de classes. O direito positivo ao punir a ação dos injustiçados perpetua a violência.” Assim, menciona que nos países semiperiféricos que se democratizaram nos últimos 30 anos, os Tribunais “começaram a assumir suas parcelas de ‘co-responsabilidade política na atuação providencial do Estado, pois se os conflitos políticos estão sendo judicializados, isto não pode deixar de se traduzir na politização dos conflitos judiciários.” (JUSTO, 2002, p. 125). Conclui que “a argumentação judicial é o território privilegiado para explicitar modos de vida e formas de se pensar o conflito. Assim, o Tribunal é um dos espaços onde se constrói a cidadania.” (JUSTO, 2002, p. 100).

Seguindo o pensamento marxista de que a sociedade é formada por classes, as quais possuem interesses próprios e antagônicos, podendo adquirir a posição de opressoras ou oprimidas, a UDR e o MST representam classes distintas que disputam o acesso à terra. A arena de discussões entre ambos os grupos pode ocorrer no Tribunal, em processos judiciais, cuja interpretação da lei comporta dois direitos: a terra de trabalho e a terra de negócio. O magistrado, para fazer justiça, deve analisar se a lei não é fruto da ordem política e econômica de uma única classe e se a sua aplicação não vai fomentar o estado de violência e disputa antidemocrática. Caberá ao juiz optar por alguma das interpretações extraíveis da legislação.

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5. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ

À época do Brasil Império, quando o território nacional ainda era dividido em Províncias, o Imperador D. Pedro II homologou o Decreto nº 2.342, elaborado pelo Ministro da Justiça, Manoel Antônio Duarte de Azevedo, a fim de estabelecer as sedes dos onze Tribunais de Relação que seriam criados. Assim, São Paulo e Paraná teriam como sede a cidade de São Paulo34

Contudo, os paranaenses restaram desgostosos com a subordinação em relação ao Estado vizinho, haja vista a dependência do Tribunal Paulista para receber seus Juízes, além de acarretar a demora e onerosidade dos processos devido à vinculação jurisdicional.

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Deste modo, o advento da Proclamação da República e o movimento político instaurado em torno do Governo de Mal. Deodoro da Fonseca propiciaram o aparecimento nos Estados dos “Tribunais de Apellação”. Logo após, dois advogados paranaenses solicitaram à Assembléia Constituinte do Estado Federal do Paraná a aprovação da Lei nº 3 de 1891, que autorizava o Presidente do Estado a organizar provisoriamente todos os serviços públicos, realizar a divisão judiciária e administrativa e, inclusive, decretar a Lei Orgânica da Magistratura.

Então, o Presidente Generoso Marques assinou o Decreto nº 1, de 15 de junho de 1891, criando toda a Justiça do Paraná, fazendo jus a alcunha de pai do Poder Judiciário. Assim, o primeiro Presidente do Tribunal de Apellação do Paraná foi o Des. José Alfredo de Oliveira, natural do Estado da Bahia.

No entanto, a Corte e seus membros tiveram um longo percurso até definirem seus nomes e títulos, pois o Tribunal de Justiça do Paraná já se denominou “Tribunal de Apellação”, “Supremo Tribunal da Justiça”, “Superior Tribunal de Justiça” e, novamente, “Tribunal de Apelação”, bem como os magistrados iniciaram com o cargo de Desembargadores, depois passaram a receber o nome de Ministros, mas retornaram em 1946, até os dias atuais, com a titulação de Desembargadores.

O Poder Judiciário estadual divide-se em primeiro e segundo grau de jurisdição. Exceto raras exceções previstas na lei, a regra é que as ações propostas sejam analisadas pelo magistrado de primeiro grau (cada cidade ou região possui

34

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seu fórum que atende a comunidade local). Quem entra com a ação é chamado de parte autora/requerente e quem responde pela ação é denominado de parte ré/requerida. Para garantir a lisura e segurança às partes da prestação da justiça, são princípios constitucionais a ampla defesa, contraditório e a possibilidade do duplo grau de jurisdição. Ou seja, se as partes estiverem inconformadas com a decisão prestada pelo juiz de primeiro grau, podem pedir revisão do julgado ao Tribunal de Justiça (segundo grau de jurisdição) por intermédio de recursos35

O TJPR conta com o número de 120 (cento e vinte) desembargadores e 60 (sessenta) juízes substitutos em 2º grau. Cada câmara é composta por 05 (cinco) desembargadores. Dispõe de 18 Câmaras Cíveis e 05 Câmaras Criminais, com divisão das matérias por especialidades

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36

Os julgamentos dos recursos podem ser feitos por decisão unipessoal do relator (nas hipóteses do art. 557 do Código de Processo Civil

. Contudo, o Órgão Especial do TJPR aprovou a criação de mais 25 cargos de Desembargador, aguardando a aprovação pela Assembléia Legislativa e a dotação orçamentária. Isto significa que poderá ter remanejamento da competência das câmaras, existindo a possibilidade de instalar câmaras especializadas em direito agrário, conforme recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Contudo, tal projeto precisa de apoio político e social.

37

) e, mais frequentemente, por decisão cameral. Na câmara de julgamento, cada recurso é decidido por um quorum julgador de três integrantes (relator, revisor e vogal)38

A Federação da Agricultura do Paraná (FAEP) distribui Boletins Informativos quinzenalmente a todos os desembargadores, com matérias voltadas aos interesses dos ruralistas (inclusive com entrevistas de integrantes da UDR), bem como matérias com críticas ao MST. Diante disto, constatou-se a necessidade do MST também buscar um veículo de comunicação para expressar suas áreas de atuação e lutas. Assim, os magistrados podem receber informações de ambos os grupos.

.

35

Cf. http://www.tjpr.jus.br/historico-tjpr-museu

36

Apenas a título de nota, cabe explicar que a matéria relativa à desapropriação para fins de reforma agrária é de competência exclusiva da União (art. 22, II, c/c art. 109, I, ambos da Constituição Federal), portanto é julgada na Justiça Federal.

37

Art. 557 - O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.

§ 1º-A - Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso.

38

(35)

O interesse em ter o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná como público-alvo foi justificado pelo fato de ser o órgão máximo do Poder Judiciário paranaense, com um número reduzido de magistrados, porém suas decisões se tornam parâmetro ao restante de juízes de primeiro grau distribuídos em todo o estado.

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6. RESULTADOS DA SISTEMATIZAÇÃO DAS EMENTAS

Neste capítulo, pretende-se identificar, num primeiro momento, os contextos das ações relacionados às decisões dos magistrados do TJPR, nos casos em que o MST é citado. Para tanto, foram consideradas as ementas dos acórdãos, disponíveis para consulta no site da instituição (www.tjpr.jus.br) nos últimos 10 anos: de 2002 a setembro de 2011. A consulta realizada utilizou o verbete “MST” e obteve como resultado 50 acórdãos (ver Anexo A).

Como forma de sistematizar os dados coletados, com base em uma análise quantitativa e qualitativa, foram elaboradas oito perguntas para identificar quais os contextos das ações do MST relacionadas às decisões dos magistrados, assim como – se há ou não procedimentos e elementos comuns nos julgados, caracterizando-se como favoráveis ou desfavoráveis ao MST. As perguntas são as seguintes:

1. O MST é parte? Em qual polo, autor ou réu? Recorrente ou recorrido?

2. Qual o tipo de ação e recurso? Classificada em Cível ou Criminal; a espécie da ação; e do recurso.

3. O Estado é considerado responsável pelas ações do MST? (sim/não) Tem o dever de indenizar os proprietários em razão da ocupação? (sim/não). O Estado é considerado omisso quando não fornece reforço policial para as operações de desocupação? (sim/não).

4. Quantas decisões utilizam como fundamento ou reforçam o direito à propriedade privada? Quantas decisões tratam da função social da terra?

5. Utiliza-se a expressão “ocupação” ou “invasão”? Quantas vezes aparece na ementa?

6. Sob a ótica do senso comum, foram usados termos ou juízos de valor negativos em referência ao movimento, suas causas ou ações? Quais?

(37)

7. Existem expressões jurídicas que possuem conotação negativa quando empregadas em relação aos integrantes do MST ou aos seus atos? Quais?

8. As informações prestadas pela mídia são levadas em consideração na decisão?

Em relação à primeira pergunta, a pesquisa demonstrou que o MST era parte em 26 processos, em uma ação consta como autor e todas as ações restantes como réu. Destes, 20 processos são autores os proprietários de imóveis rurais, 03 são de autoria do Ministério Público e 02 são promovidos por concessionária de rodovias. MST (Parte) MST (Autor) Proprietário (autor) MP (Autor) Concessionária (autora) 52% 3,84% 76,92% 11, 54% 7,69% Quadro 1.

Nos outros 24 processos nos quais o MST não atuou: 20 são ações promovidas por proprietários contra o Estado, 02 são ações promovidas pelo Ministério Público contra seguranças da fazenda, e 02 são ações com discussões entre particulares (não envolvendo o MST, apesar de ter sido citado na ementa).

MST (Não é parte) Proprietário (autor) MP (autor) Particulares (autor)

48% 83,33% 8,33% 8,33%

Quadro 2.

Portanto, das 50 ementas pesquisadas os proprietários rurais figuram como autores em 40 ações (correspondente a 80% do total), o que demonstra a capacidade, possibilidade e interesse em maior grau de buscar o judiciário em relação ao MST para resolver os conflitos nos quais estão envolvidos. Deste modo, os donos de terra têm maior acesso ao Poder Judiciário do que os militantes, restando a estes apenas contestar as alegações daqueles em situação de

(38)

desvantagem. A única ação que o MST moveu contra o proprietário do imóvel ocupado foi para cobrar pelo cultivo de plantações na área, sendo que o magistrado de primeiro e segundo graus não deferiram o ressarcimento sob a alegação de que a ocupação era ilegal (acórdão nº 047, Anexo A).

Em relação aos recursos, vale explicar que há interesse em recorrer por parte de quem teve uma decisão desfavorável contra si e uma mesma decisão pode acarretar recurso de mais de uma parte (tanto autor quanto réu, e ainda de terceiro prejudicado pela decisão), porém todos os recursos são julgados em acórdão único. Então, apesar de serem 50 acórdãos, isto não significa que são apenas 50 recursos. Na pesquisa realizada, há 65 recursos no total, isto significa que em 15 decisões houve recurso do autor e do réu. Cabe salientar ainda que nas ações em que o Estado figura como parte, a reanálise da sentença final pelo Tribunal é obrigatória, chamando-se de reexame necessário (função similar ao recurso de apelação).

O MST recorreu em 22 processos no qual era parte (26), ou seja, em 84,62% das decisões tomadas em primeiro grau foram desfavoráveis ao movimento para ensejarem interposição de recursos ao Tribunal de Justiça. Em 19 dessas decisões, os recursos eram apenas do MST, de 02 decisões recorreram o MST e proprietários rurais, em 01 ação o MST e o Ministério Público.

Dos processos que o MST não é parte (24), há 18 recursos por parte dos proprietários rurais (sendo que 02 destes recursos se referem às ações em que o MST não está envolvido), 17 recursos do Estado – justamente nas ações onde os donos da terra cobram do Estado a responsabilidade pela ações do MST -, e 02 recursos são do Ministério Público.

Relação de recursos (65) e as partes que os interpuseram:

MST Proprietário Estado MP 22 recursos 34.4% 23 recursos 35.9% 17 recursos 25% 3 recursos 4.7% Quadro 3.

Ainda foi possível verificar que dos 50 acórdãos pesquisados, apenas 04 se referem a ações criminais (8%), sendo que as 46 restantes são da área cível (92%).

Referências

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