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A magia em ação: um estudo sobre o herói Harry Potter

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Academic year: 2021

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UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

DACEC – DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS, CONTÁBEIS, ECONÔMICAS E DA COMUNICAÇÃO

CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – PUBLICIDADE E PROPAGANDA

NÁDIA LETÍCIA FORMENTINI NUNES

A MAGIA EM AÇÃO: UM ESTUDO SOBRE O HERÓI HARRY POTTER

Ijuí/RS 2014

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NÁDIA LETÍCIA FORMENTINI NUNES

A MAGIA EM AÇÃO: UM ESTUDO SOBRE O HERÓI HARRY POTTER

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito essencial para conclusão do curso de graduação em Comunicação Social, Habilitação em Publicidade e Propaganda, da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – Unijuí.

Orientador: Celestino Perin

Ijuí/RS 2014

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NÁDIA LETÍCIA FORMENTINI NUNES

A MAGIA EM AÇÃO: UM ESTUDO SOBRE O HERÓI HARRY POTTER

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Comunicação Social – Publicidade e Propaganda da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - Unijuí

Data de aprovação:___/___/___

Banca Examinadora:

____________________________________ Profº Celestino Perin (orientador)

____________________________________ Profª Rúbia Schwanke (arguidora)

____________________________________ Profª Nilse Maldaner (suplente)

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“Palavras são na minha nada humilde opinião, nossa inesgotável fonte de magia, capazes de causar grandes sofrimentos e também de remediá-los.” (Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 2)

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer a minha família pela paciência, compreensão e dedicação. Aos meus pais, Marcos e Cleni, pois me fizeram essa pessoa forte, capaz de persistir acima de tudo e pelo incentivo na busca desse sonho. E de maneira especial agradecer pelos sacrifícios feitos para que esse sonho acontecesse. Ao meu irmão Benhur, por me apoiar e estar do meu lado nos bons e maus momentos, sempre tentando trazer um sorriso para o meu dia. Ao meu amado Wilington, por ter aguentado meu mau humor, acalmado minhas preocupações, me incentivando a seguir em frente sempre e principalmente pelo amor e dedicação. Também agradeço aqueles que de alguma maneira me auxiliaram a chegar aqui, professores, amigos, colegas e quem de alguma forma contribuiu para este estudo. A todos por terem aturado minha ausência, meu mau humor e preocupação nestes últimos meses e, acima de tudo, por acreditarem em mim.

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RESUMO

Buscando compreender a criação de personagens para o cinema e a percepção do público em relação às adaptações, este estudo procura analisar o herói existente em Harry Potter e o que o público percebe em relação à obra literária e a produção cinematográfica. Para isto, foi realizado um questionário como objeto de análise da percepção do público consumidor em relação à personagem Harry Potter, tanto nos cinemas quanto nos livros.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 8

2. CINEMA ... 11

2.1 UMA BREVE HISTÓRIA DO CINEMA: ENTENDO MELHOR A SÉTIMA ARTE ... 11

2.2 O INICIO DA CRIAÇÃO ... 14

2.2.1 Roteiro: O que é e como surge? ... 14

2.2.2 Roteiro: Adaptação ... 18

3. DO ROTEIRO AS TELAS: A CRIAÇÃO DA PERSONAGEM ... 22

3.1 PERSONAGEM: ALGUNS CONCEITOS ... 22

3.2 PERSONAGEM: PROCESSO DE CRIAÇÃO ... 25

3.3 O HERÓI ... 32

4. O HERÓI EM HARRY POTTER ... 35

4.1 QUEM É HARRY POTTER? UMA BREVE APRESENTAÇÃO DA PERSONAGEM ... 35

4.2 A JORNADA DO HERÓI HARRY POTTER ... 36

4.3 HARRY POTTER AOS OLHOS DO PÚBLICO ... 43

5. CONCLUSÃO ... 58

REFERÊNCIAS ... 60

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1. INTRODUÇÃO

Uma história pode ser vista de duas maneiras: pela visão do escritor/criador e pela visão do espectador. Na literatura temos a visão do escritor e do leitor, sendo que o primeiro deixa brechas para que aja uma interação do segundo com a história. Essa interação permitida pela literatura é o seu ingrediente secreto, o que conquista os leitores.

Na ótica cinematográfica o autor muitas vezes não é apenas uma pessoa e sim duas pois, o roteirista, que é quem escreve a história, necessita do aval e do auxílio do diretor para pôr em prática essa narrativa. Assim, temos a visão dos autores e dos espectadores. Em uma obra fílmica dificilmente são deixadas brechas para que o espectador possa interagir com a trama, isso porque a transformação de uma obra escrita em imagem inibe a criação de um ambiente na mente do espectador, ele já recebe esta informação pronta.

O universo da literatura e do cinema são ligados pelas adaptações cinematográficas de obras literárias. Essas adaptações geralmente sofrem cortes e algumas modificações da história original por isso, geram uma grande decepção nos fãs dos livros.

Literatura e cinema sempre andaram juntos. Desde a criação do cinema muitas obras literárias foram adaptadas para as telas. E desde sempre houve a preocupação dos leitores quanto a fidelidade do filme ao livro. Esta é uma questão que possivelmente irá se arrastar por muitos séculos, e que, apesar de relevante, não é o que levaremos em conta para esta pesquisa.

Uma personagem escrita na literatura pode ser bem adaptada para um filme? É claro! E isto dependerá única e exclusivamente de quem escreve: o roteirista. Por isto a construção de personagem é parte importante na criação de um roteiro e necessita de atenção redobrada.

Conhecer e reconhecer a personagem são pontos importantes na construção de seu perfil. O consumidor, expectador ou leitor, deve ter claro em sua mente quem é a personagem e o que ela representa. Assim teremos uma personagem coesa e que transmita a mesma ideia ao seu público, de forma que não haja equívocos sobre ela.

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Para a Publicidade e Propaganda esta percepção do público ou consumidor é essencial. É através dela que sabemos se a marca faz sucesso ou não e, se ela está sendo dirigida ao público de forma correta. É necessário olhar através da visão do consumidor para que possamos compreender sua complexidade e assim, alcançar o sucesso. Neste sentido a criação de um bom filme, de uma boa personagem se assemelha com a publicidade, pois, apesar de se realizar todos os métodos possíveis para que um filme ou personagem obtenham sucesso, o que irá determinar o sucesso será o público consumidor.

O aspecto conceitual deste trabalho visa compreender a percepção que o público tem da personagem Harry Potter. Para isto, dediquei-me a leitura dos livros da série Harry Potter, escritos por J.K. Rowling. Também assisti aos filmes da saga, para entender o herói em Harry Potter através da ótica dos filmes. Além disto, a leitura de bibliografias sobre cinema e a construção de personagens foram fundamentais para o desenvolvimento completo do trabalho.

Para realizar a pesquisa, utilizei um questionário online. A pesquisa online se apresenta como uma boa forma de agilizar sobre aspectos opinativos, situação deste estudo. Este questionário, que teve onze perguntas abertas e três fechadas, foi respondido por onze pessoas, de diversos lugares do país e com conhecimento diverso sobre a saga de Harry Potter, tanto no cinema quanto nos livros, sendo um resultado positivo para o estudo. Após aplicação do questionário relacionei as informações trazidas pelos entrevistados com o conteúdo teórico estudado.

O primeiro capítulo deste estudo traz o cinema em primeiro plano. Mostra-se um pouco da história do cinema, enfatizando que o cinema como conhecemos hoje passou por grandes transformações e que, até hoje, se discute quem realmente “criou” esta arte de gravar imagens em movimento. Demonstra-se também o quanto o roteiro é importante na criação para o cinema e como são realizadas as adaptações da literatura para o cinema.

É no segundo capítulo deste estudo que conhecemos um pouco mais sobre a personagem. O que é? Como se cria? São perguntas que são respondidas ao longo deste capítulo. Por fim, o capítulo encerra trazendo como é a jornada do herói descrita por Joseph Campbell, jornada esta que, geralmente, é trilhada por protagonistas bem construídos.

O terceiro capítulo analisa o herói presente em Harry Potter e explica um pouco como Harry passou por todas as etapas da Jornada do Herói. Traz também, e

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principalmente, a pesquisa realizada com onze pessoas, de diversas idades e escolaridades, com conhecimento variado sobre a saga, o que permitiu compreender melhor a percepção que o consumidor tem sobre Harry Potter e também possibilitou compreender melhor a visão geral do consumidor em relação a personagem.

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2. CINEMA

2.1. UMA BREVE HISTÓRIA DO CINEMA: ENTENDENDO MELHOR A SÉTIMA ARTE

Para entender o cinema primeiro é preciso compreender como surgiu essa arte. Apesar de gerar discussões, a data oficial de “criação” do cinema ocorre em 1895. Revendo filmes daquela época ou um pouco mais a frente, até o início dos anos 1900 podemos perceber que a evolução da arte cinematográfica foi grande e a cada dia recebe mais inovações e criações que possibilitam uma melhoria desse mundo de encantos que é o cinema.

O cinema como conhecemos hoje é uma arte que encanta o espectador. Desde seu início foi assim, porém, nem sempre se teve tantos recursos para chamar a atenção de quem assiste a obra cinematográfica. Os primeiros filmes não tinham mais de 15 minutos, eram em preto e branco e sem som. A evolução das técnicas cinematográficas possibilitou aos roteiristas e aos produtores realizarem obras mais longas, passando dos curtas para os longas metragens. A possibilidade de captação, fixação e arquivamento do som permitiu ainda mais a qualificação das produções com ruídos, textos, interpretações e as trilhas musicais. Parece relativamente simples, porém, para compreender a evolução desta arte é necessário buscar na sua criação a essência do cinema.

A controvérsia na data de criação do cinema passa por dois pensamentos. Enquanto uns defendem que a criação deu-se em 1888 com Tomas Edison, americano considerado um gênio por ter muitas criações, principalmente relacionadas com a eletricidade, que na atualidade são indispensáveis para a sociedade. Outros, creem que a criação veio com os irmãos Lumière. A data é a referência mais forte e mais aceita e diz respeito a apresentação de dois filmes pelos irmãos Auguste e Louis Lumière, no Grand Café em Paris, em 28 de dezembro de 1895, mostrando ao mundo seu cinematógrafo: um aparelho híbrido, que associava as funções de máquina de filmar, de revelação de película e de projeção. Além da apresentação dos filmes é nesta data que começam as relações publicitárias de

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divulgação da produção para as casas de cinema. Como exemplo, podemos citar os

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cartazes com imagens de algumas cenas fotográficas, além de caracteres

específicos das obras.

É claro que, a criação do cinema inicia-se muito antes destas datas. Por ser um processo complexo, certamente houve muitas experiências anteriores até chegar num resultado parecido com o que conhecemos atualmente. Em seu artigo “Arqueologia do Cinema” Cassio Starling Carlos nos traz ideias de Laurent Mannoni. Para este teórico o cinema apresentado pelos irmãos Lumière em 1895 é consequência de uma série de experiências anteriores. Além disto, Carlos, explica que:

Já no século IV a.C., o filósofo grego Aristóteles se inquietou com o fenômeno da projeção da luz. Ao observar o comportamento da luz solar que atravessa um orifício e se reflete numa parede, Aristóteles prenunciou a câmera obscura, a primeira das séries de projeções ilusionistas (Carlos, 1995, apud Binicheski, 2012 p.12).

Outros possíveis criadores da arte cinematográfica podem ser citados. “(...) no século XII tivemos o monge inglês Roger Bacon e seu discípulo John Peckham, que descobriram como utilizar a luz para projetar uma imagem, ao observarem que os raios de luz podem ser vistos em um local obscuro através de um orifício. Em 1588, o físico italiano Giovanni Battista tirou proveito de tal descoberta para o uso ilusionista, ao reunir pessoas em um recinto escuro com um tecido branco em uma parede e um orifício por onde entrava luz na parede oposta. Na parte de fora, entre a fonte de luz e o orifício, imagens eram colocadas para serem projetadas no interior da sala” (Binicheski, 2012, p.12).

Ainda segundo Carlos (1995, apud Binicheski, 2012, p.12) no século XVII “o jesuíta alemão Athanasius Kircher, que teve a ideia de gravar imagens invertidas em espelhos, que refletiam, através de lentes biconvexas, as figuras numa tela branca disposta no interior de uma câmera obscura”. Em 1659 o holandês Christiaan Huygens cria a lanterna mágica, onde colocavam-se duas lentes, uma fixa e outra móvel, em frente a uma lâmpada. Na lente fixa Christiaan desenhou um esqueleto sem o crânio e o braço direito e, na outra lente o restante do corpo. Isto resultou no melhor invento anterior a criação oficial do cinema, onde quando a lente era movida o esqueleto retirava ou colocava o crânio no lugar.

Já durante a Revolução Francesa, temos o físico Étienne –Gaspard Robertson, que utilizava plataformas circulares e móveis para criar imagens de

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monstros e fantasmas para impressionar seu público. No início do século XIX Joseph Plate também deixou sua contribuição para a criação do cinema, ele criou o fenaquitiscópio (do grego phenax, enganador, e skopeô, eu examino). Este equipamento foi a base da animação, pois era composto por um disco com uma série de poses que, ao ser girado, fazia com que a figura apresentada realizasse um movimento completo.

Ainda antes das criações de Thomas Edison e dos irmãos Lumière há registros de pesquisas realizadas por astrônomos físicos e fisiologistas. O fisiologista Étienne-Jules Marey ganha destaque pois,

obteve uma série de registros sucessivos numa película em celuloide. Ao captar, sob um único ponto de vista, cada fase de saltos, corridas, voos e caminhadas, e fixa-los em um suporte transparente, flexível e sensível, o que Marey inventou foi a própria técnica cinematográfica (Carlos, 1995, apud Binicheski, 2012 p.18 e 19).

A partir daí, entra-se na criação de Thomas Edison e dos irmãos Lumière. Edison trouxe ao mundo o cinetoscópio, artefato que já possuía características do cinema atual, como filme em 35 mm em preto e branco ou colorido (neste caso, os coloridos eram pintados à mão), mudo ou com som (com fonógrafo acoplado) e representação de cenas por atores. O fato de não ser reconhecido o ano de 1888 como a data em que inicia-se o cinema deve-se ao fato de que Edison, buscando gerar mais lucro, acreditou que seria melhor se apenas uma pessoa por vez tivesse acesso a sua criação, com o custo de 25 centavos de dólar. A falta da coletividade, princípio fundamental no cinema, é que o fez com que Edison perdesse a oportunidade de ser “oficialmente” o inventor do cinema. E é neste ponto que a invenção de Auguste e Louis Lumière se destaca, os irmãos fizeram a primeira exibição comercial de seu invento em Paris, no Grand Café, em 28 de dezembro de1895, em um evento com várias pessoas na plateia.

Ao longo dos anos a arte cinematográfica foi evoluindo. Iniciou com alguns segundos de gravações e hoje, já temos a possibilidade de gravar quantas horas forem necessárias. Esta evolução do cinema também tornou possível a sua divisão em gêneros. E é no início do século XX, que inicia-se a identificação dos quatro principais gêneros de cinema. O documentário retratava a realidade, este foi o caso dos primeiros filmes, que capturavam o cotidiano das pessoas. Já o gênero experimental é aquele que foge do óbvio, traz enredos e cenas que não são comuns

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e buscam impressionar o espectador. A animação, por sua vez, trazia através do desenho uma nova história. E o ficcional, que tinha seu roteiro criado exclusivamente para um filme, foi o preferido da época. E foi este gênero do cinema que exigiu uma maior duração do filme, pois necessitava desenrolar enredos mais complexos.

É no gênero ficcional que se destaca David Griffith, conhecido como pai do cinema. O distanciamento e a aproximação dos personagens em relação a câmera nos filmes de Griffith foi o que estabeleceu o que conhecemos hoje por planos de câmera. Estes planos são definidos pelo roteirista e pelo diretor, são eles que definem a intensidade da cena.

A partir destes primeiros passos é que se inicia a caminhada para a formação da grande arte que é o cinema atual. Muito ainda se discute sobre a verdadeira “criação” do cinema, porém, é indiscutível que esta novidade foi, e continua sendo, instrumento de magia e encantamento.

2.2. O INÍCIO DA CRIAÇÃO

2.2.1. Roteiro: o que é e como surge?

“Num filme, o espectador se deixa evolver, de boa vontade, em qualquer boa história que lhe for apresentada, seja ela de mistério, intriga, comedia, assuntos históricos ou aventura. Envolve-se conscientemente na história, e, se o filme for bom, geralmente sai do cinema emocionalmente mexido” – Chris Rodrigues.

Imaginar, criar, sonhar um mundo novo. Desde o tempo das cavernas o ser humano tem a necessidade de contar histórias e a criação do cinema possibilitou ao homem transformar suas histórias em imagens. Este novo advento, que surgiu “oficialmente” para o mundo no fim do século XVIII, desde o início contou histórias e encantou o público.

Atualmente, após anos de evolução e inovação, o cinema precisa de muito mais para encantar o espectador. É preciso criar uma trama que envolva

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emocionalmente quem a assiste e para isto, é necessário iniciar com um bom roteiro.

A criação de um filme começa com o roteiro. O roteiro nada mais é que uma história contada em seus mínimos detalhes, cada fala e trejeito da personagem são pensados e detalhados no roteiro e tem um propósito maior dentro da história, além de construírem seu caráter. Syd Field (1995, p.2) nos traz que “o roteiro é como um substantivo – é sobre uma pessoa, ou pessoas, num lugar, ou lugares, vivendo sua “coisa”.”

Para Comparato (2000, p.20) “um bom roteiro não é garantia de um bom filme, mas sem um bom roteiro não existe com certeza um bom filme”. Defendendo isto o autor traz que um bom roteiro precisa possuir três aspectos fundamentais, são eles: Logos, Pathos e Ethos.

Logos é a palavra e é ela que dá estrutura ao roteiro. Segundo o autor “o logos é essa palavra, o discurso, a organização verbal de um roteiro, sua estrutura geral” (Comparato, 2000, p.21).

Pathos é o que dá vida ao roteiro. É “o drama, o dramático de uma história humana. É, portanto, a vida, a ação, o conflito quotidiano que vai gerando acontecimentos” (Comparato, 2000, p.21).

O ethos, por sua vez, é a mensagem que a história nos passa. É a razão pela qual a história foi criada. “A mensagem tem sempre uma intenção. É inútil tentar fugir à responsabilidade de a emitir. Tudo é escrito para produzir uma influência. É o ethos, a ética, a moral, o significado último da história. As suas implicações sociais, políticas, existenciais e anímicas. O ethos é aquilo que se quer dizer, a razão pela qual se escreve” (Comparato, 2000, p.21).

Comparato (2000, p.21) afirma que “esta forma escrita a que chamamos roteiro é algo de muito efêmero: existe durante o tempo que leva convertendo-se num produto audiovisual”. E para se criar um bom resultado final é necessário criar um bom roteiro. Isto depende muito de quem escreve: o roteirista.

O trabalho de um roteirista não se baseia apenas no talento para escrever e criar, mas também na capacidade para colocar seu trabalho num caminho adequado de produção. É, portanto, imprescindível refletir sobre o funcionamento da indústria audiovisual como arte e como “fábrica de sonhos”. (...) o roteirista, antes de ter ideias e de sonhar tem de conhecer a realidade que o rodeia (Comparato, 2000, p.37).

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Criar um mundo totalmente novo ou apenas uma história que se passa em uma cidade real? A primeira vista parece algo simples, afinal, desde o início dos tempos o ser humano cria histórias que encantam gerações. De fato, criar histórias nunca foi um ato complexo, porém, a criação para o cinema envolve muito mais do que a criação de uma boa história. O roteiro de um bom filme deve ser pensado como uma trama complexa com pequenos detalhes que fazem toda a diferença na história.

Um bom roteiro é construído por etapas. Um passo de cada vez, é assim que o roteirista busca criar uma nova história. Comparato aponta que existem seis etapas para se chegar a um bom roteiro, são elas: ideia, conflito, personagens, ação dramática, tempo dramático e unidade dramática. Cada etapa deve ser feita a seu tempo e a ideia deve ser o primeiro passo.

Para escrever um roteiro, precisa-se de uma ideia. Algo tão simples e tão complexo quanto uma ideia: “O primeiro e mais óbvio dos atos do entendimento...O engenho para dispor, inventar e representar alguma coisa."1 A ideia é um processo mental, fruto da imaginação. Do encadeamento de ideias surge a criatividade. Ideia e criatividade estão na base da confecção da obra artística (Comparato, 2000, p.72).

E é de uma ideia simples que se inicia a criação de um roteiro. Mas para que essa ideia seja um roteiro e um filme de sucesso é preciso que o roteirista siga os passos da criação.

O segundo passo consiste em criar um conflito. Este conflito será a base para a criação do roteiro e é nesta etapa que se elabora a storyline. A storyline é a síntese de uma história e “diz-se que um bom roteiro, uma boa obra de teatro, se pode resumir numa única frase” (Comparato, 2000, p.23).

“Todo drama é conflito. Sem conflito não há personagem; sem personagem, não há ação; sem ação, não há história; e sem história, não há roteiro” (Field, 1995, p.5). Assim sendo, é o conflito que dá vida a trama e é a partir dele que se define o que vai ser desenvolvido durante a história contada.

A criação de personagens é a terceira etapa do processo. São as personagens que dão vida à história e é nesta etapa que o roteirista começa a desenhá-las para assim criar a sinopse. Esta sinopse deve conter a descrição do caráter de uma personagem e é nela que situa-se a história no tempo e no espaço.

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Criar personagens é uma parte complexa do roteiro. Syd Field (1995, p.18) afirma que “o personagem é o fundamento essencial de seu roteiro. É o coração, alma e sistema nervoso de sua história. Antes de colocar uma palavra no papel, você tem que conhecer o seu personagem”. Field nos traz que a criação de uma personagem deve ser feita através de um processo. Este processo consiste em dar à personagem contexto e conteúdo.

O contexto diz respeito à necessidade de se criar a personagem. Já o conteúdo é a essência da personagem, ou seja, aquilo que ela realmente é e representa: seus defeitos, virtudes e sua personalidade.

Para Comparato o roteirista precisa criar um universo que não revele todas as características da personagem logo de cara. Assim, o suspense irá prender o espectador e encantá-lo a cada nova descoberta.

A função do roteirista é revelar aspectos do personagem aos leitor e público. Temos de descobrir algo sobre o seu personagem. Na progressão do seu roteiro, o personagem geralmente descobre algo sobre sua complicação na história ao mesmo tempo que o público. Desta forma, personagem e público partilham da descoberta do pontos de virada que sustentam a ação dramática (Comparato, 2000, p. 25).

Ao encerrar a etapa da criação de personagens inicia-se a quarta etapa na construção de um roteiro: a ação dramática. Esta define como será contada a história e para isto o autor defende que deve ser criar uma estrutura, onde o enredo é organizado em cenas, formando o esqueleto da história. É basicamente onde a história começa, onde o conflito e as ações das personagens começam a se unir para formar uma história.

O tempo dramático é o quinto passo dessa caminhada. Nesta parte é definido quanto tempo deve durar cada cena. É também o momento em que toda a estrutura montada anteriormente ganha vida. O roteirista começa a dar falas, emoções e personalidade as suas personagens, além de desenvolver as problemáticas da história. Através da inserção dos diálogos o roteirista irá colocar na trama as emoções, a personalidade e os problemas das personagens. Essa adição de diálogos permite que verifique-se uma cena mais detalhada e é a partir daí que temos o que pode ser chamado de rascunho de roteiro.

Por fim, na última etapa, a unidade dramática, o roteiro já deve estar finalizado. Nesta última etapa o diretor, com o roteiro final em mãos, verifica a

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unidade dramática das cenas, ou seja, verifica a possibilidade de gravar cada cena. E assim dá-se início a criação audiovisual.

2.1.2. Roteiro: adaptação

O processo de criação de um roteiro original visto no capítulo anterior é muito complexo. Ele exige criatividade e organização do roteirista. Exige também paciência, é claro, pois, para se criar um bom roteiro podem ser gastos meses de trabalho.

Para falar sobre adaptação precisamos compreendê-la. Em uma leitura rápida pode-se dizer que um roteiro adaptado é a recriação de uma história, porém, a criação de um roteiro deste tipo contempla muito mais do que isto:

(...) a adaptação é uma transcrição de linguagem que altera o suporte linguístico utilizado para contar a história. Isto equivale a transubstanciar, ou seja, transformar uma substância, já que uma obra é a expressão de uma linguagem. Portanto, já que uma obra é uma unidade de conteúdo e forma, no momento em que fazemos nosso conteúdo e o exprimimos noutra linguagem, forçosamente estamos dentro de um processo de recriação, de transubstanciação (Comparato, 2000, p.33).

A percepção de que o roteiro adaptado é apenas uma história recriada dá a quem vê filmes originais e adaptados a ingênua crença de que as adaptações dão menos trabalho ao roteirista. Ao contrário do que se imagina, este tipo de roteiro exige muito do roteirista. “Uma adaptação implica certas limitações criativas, uma vez que o roteirista tem de levar em conta o conteúdo da obra, os ambientes, as personagens, etc.” (Comparato, 2000, p.331).

Contar uma história que já foi contada antes até parece ter vantagens. Porém, deve se levar em consideração que o roteirista precisa ter todo o cuidado no momento em que escreve para que não saia do enredo proposto pela história. E este é um grande desafio.

“Claro que o fato de recriar implica o risco de que o produto reelaborado perca em relação ao original. No entanto, às vezes sucede que a adaptação resulta melhor do que o próprio original” (Comparato, 2000, p.331). Ou seja, uma obra bem adaptada pode ter um bom resultado e até mesmo um sucesso maior que o seu

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original. Um exemplo no qual se evidencia esse fato é o filme “Clube da Luta” de 1999, dirigido por David Fincher, com roteiro de Jim Uhls. Este filme foi baseado em um livro de Chuck Palahniuk e, além de ter feito um grande sucesso, o filme conseguiu explorar muito mais as personagens e a história contada pelo livro, fazendo com que muitos dos fãs do filme decepcionem-se ao ler a história contada por Chuck Palahniuk.

Evidentemente não é qualquer obra que pode ser adaptada para o cinema. Para isto é necessário “escolher uma obra adaptável, isto é, que possa ser transformada sem perder qualidade” (Comparato, 2000, p.331) e, está claro que nem todas as obras podem ser utilizadas para uma adaptação. Esta é mais uma das atribuições do roteirista, ele precisa saber identificar quais obras podem ou não ser adaptadas, ter a percepção de quais poderão render uma boa história para as telonas ou não.

Para compreender o que se passa durante o processo de produção de um roteiro adaptado é necessário levar em conta que existem vários graus ou tipos de adaptação. É Comparato (2000) que explica estes graus ou tipos e cada uma das suas especificidades. O primeiro tipo ou grau de adaptação definido por ele é a “adaptação propriamente dita”. Este grau consiste em ser fiel a obra, buscando não alterar o enredo da história, nem tempo, localização ou personagens citados na obra original.

O segundo grau, ou tipo de adaptação, é definido como “baseado em...”.

Neste caso, exige-se que a história se mantenha integra (embora se altere o final). Podemos modificar os nomes das personagens e algumas situações, e, embora a fidelidade que o adaptador guarda ao original seja menor, este deve poder ser reconhecido (Comparato, 2000, p.332).

O “baseado em...” é o tipo de adaptação bem comum e está presente em várias obras famosas. Este é o caso também nos filmes da saga Harry Potter. Em todos os filmes o roteirista teve a liberdade para fazer alterações, mas nenhuma delas fez com que o filme deixasse de ser fiel à obra escrita por J.K. Rowling. É esta a essência deste segundo tipo ou grau de adaptação: manter-se fiel à obra original.

“Inspirado em...”, este é o terceiro grau ou tipo de adaptação definido por Doc Comparato. Ele nos explica que: “O roteirista toma como ponto de partida a obra original: seleciona uma personagem, uma situação dramática e desenvolve a história

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com uma nova estrutura” (Comparato, 2000, p.332). Neste caso, o autor pode basear-se em uma história já existente e utilizar uma personagem do original para criar uma nova trama ou, segui-la de uma maneira diferente. Além disto, o enredo original poderá ser alterado também. Como exemplo, pode-se pegar uma trama de um homem que perde tudo e transformar em uma bela história de superação, demonstrando que nem sempre aquilo que você quer para a sua vida é o melhor que poderia acontecer.

Para o quarto grau, intitulado “recriação”, o autor trouxe a seguinte definição: “O roteirista apodera-se do plot principal e trabalha livremente com ele, isto é muda as personagens, desloca a história para outro tempo e espaço e cria uma nova estrutura (Comparato, 2000, p.332). O plot é, segundo Comparato (2000, p.476) a “espinha dorsal dramática do roteiro; núcleo central da ação dramática”. Ou seja, o roteirista pode apoderar-se da trama principal e desenvolver a história em outro tempo ou espaço e até mesmo com outras personagens, criando uma nova história.

O último grau ou tipo de adaptação assemelha-se ao primeiro, a “adaptação propriamente dita”. O quinto grau ou adaptação é denominado “adaptação livre” e, segundo Comparato:

É um trabalho muito próximo da adaptação propriamente dita. Não há alteração da história, do tempo, de localização nem de personagens. Consiste apenas em dar mais ênfase a um dos aspectos dramáticos da obra (...). A história mantém-se íntegra, mas através de uma nova visão, deum novo ponto de vista criado pelo roteirista. (2000, p.333)

Uma história adaptada para o cinema poderá ter qualquer um destes tipos de adaptações. O grau ou tipo de adaptação que será utilizado dependerá exclusivamente do roteirista e da solicitação que lhe é feita em relação a história.

Ter esta percepção é importante pois uma obra adaptada não consegue trazer a história completa contada em um livro. Isto se deve a diferença entre as linguagens apresentadas em cada obra. Enquanto a obra fílmica utiliza-se, basicamente, de imagens e falas das personagens para demonstrar sentimentos a obra literária nos traz questionamentos muito mais complexos, ela não só mostra o sentimento da personagem como detalha aquele sentimento em palavras que tocam a alma do leitor fazendo com que ele se sinta parte daquele momento.

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(...) Uma das grandes diferenças entre a linguagem visual e a escrita está na forma como elas se apresentam ao receptor. A primeira traz em si uma mensagem objetiva, quase fechada para a participação do telespectador; a segunda está sujeita a participação ativa do leitor, podendo este desempenhar um papel único na construção do sentido da mensagem (Araujo, 2011, p.8).

É claro que não é apenas o tipo de linguagem que difere uma obra literária de uma obra fílmica. Apesar de muitos insistirem em realizar comparações entre livros sua adaptação para o cinema é preciso se ter em mente que os dois comunicam de forma diferente. "Na verdade, literatura e cinema comunicam diferentemente e faz pouco sentido encontrar paralelos exatos entre os dois níveis de comunicação denotativa" (Araujo, 2011, p.10).

Mesmo assim, a insistência em traçar um paralelo entre estes dois tipos de obra é grande. Cinema e Literatura sempre andaram juntos, desde a criação do cinema obras literárias vem sendo adaptadas para a sétima arte. E desde então temos críticas em relação a este tipo de adaptação.

A relação do cinema com a literatura é antiga e desde o seu início sofria contestações. Antes do surgimento do direito autoral, em 1910, os produtores cinematográficos utilizavam-se de histórias vinda de livros e peças de teatro para representar em seus filmes. Desde então, diversas obras literárias tem sido adaptadas para o cinema. (Souza, Antoniutti, 2012, p. 2)

Mas, não é o nível de fidelidade de uma recriação que define a sua qualidade. Obras muito fiéis a história original muitas vezes perdem a graça, não tem o elemento surpresa e, acabam sendo fracassos. Por outro lado, obras muito bem adaptadas por vezes tiveram seus roteiros escritos com base na adaptação livre, onde tudo pode ser alterado, e tornam-se grandes sucessos. Por isto, nem sempre uma boa história é sinônimo de um bom filme. Neste caso o ideal e necessário é um bom roteirista, que saiba transmitir a história de forma a criar um enredo envolvente e, é claro, de um bom diretor, que possa executar esse plano criado pelo roteirista de uma maneira inovadora e que, principalmente, envolva o espectador do início ao fim.

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3. DO ROTEIRO AS TELAS: A CRIAÇÃO DA PERSONAGEM

3.1. PERSONAGEM: ALGUNS CONCEITOS

Toda boa história tem como base boas personagens. E, eles necessitam um do outro para que sejam coesos, pois se complementam. Afinal, o que seria de uma história sem personagens? Provavelmente ela não existiria, pois é impossível contar uma história sem uma personagem. E uma personagem sem uma história? Toda criatura que exista necessariamente vive uma história, por isto, uma personagem não vive sem história.

Mas, afinal, o que é uma personagem? Numa leitura simples, a personagem é um ser, que possui vida e personalidade. Mas, não é apenas isto. Esta é uma visão simples que não demonstra a profundidade de uma personagem, a partir desta visão poderíamos pensar que ela é como uma pessoa real.

Precisamente pela limitação das orações, as personagens tem maior coerência que as pessoas reais (e mesmo quando incoerentes mostra pelo menos nisso coerência); maior exemplaridade (mesmo quando banais; pense-se na banalidade exemplar e certas personagens de Tchecov ou Ionesco); maior significação; e, paradoxalmente, também maior riqueza – não por serem mais ricas do que as pessoas reais, e sim em virtude da concentração, seleção densidade e estilização do contexto imaginário, que reúne os fios dispersos e esfarrapados da realidade num padrão firme e consistente (Candido et al, 1998, p. 35).

O manual da nossa linguagem, o dicionário, traz a palavra personagem com quatro conceitos diferentes. As principais definições que o dicionários nos apresenta, são: “Pessoa fictícia de uma obra literária ou teatral” e “representação de um ser humano numa obra de arte. É claro que o dicionário nos traz a tradução literal da palavra e para que se possa entender uma personagem não basta apenas o senso comum ou a definição de um dicionário. É necessário compreender a profundidade da representação da personagem.

Comparato define a personagem como personalidade. Sua abordagem explica que: “(...) vem a ser algo assim como personalidade e aplica-se às pessoas com um caráter definido que aparecem na narração” (2000, p.111). Assim, ela

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ganha vida a partir da criação de uma personalidade, de um caráter, algo que vai representar.

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Para Syd Field, a personagem não representa apenas uma coisa, ela deve ser vista de várias maneiras. Ele é “PONTO DE VISTA – é a maneira de olharmos o mundo. É um contexto” (Field, 95 p.27). Este contexto diz respeito ao que a personagem é, por exemplo: “pode ser pai ou mãe e, portanto, representar o ponto de vista ‘dos pais’”.

O autor explica que personagem “é ATITUDE – um contexto – uma maneira de agir ou sentir que revela a opinião de uma pessoa” (Field, 1995 p.28). A atitude da personagem já esclarece muito sobre ela, pois pode ter atitudes inferiores, superiores, positivas, negativas, entusiastas, etc.

Field define também que personagem é “COMPORTAMENTO. A essência do personagem é ação – o que uma pessoa faz é o que ela é” (Field, 1995, p.29). Ou seja, as ações, comportamentos que as personagens tem, definem também o que elas são.

Para além disto, Field declara que personagem é, também, o que ele chama de “REVELAÇÃO”. O suspense é necessário, descobrir a personagem aos poucos é fundamental para o sucesso de uma obra. A revelação é muito mais do que isto, ela diz respeito ao aspecto fundamental é o tempo de revelação das coisas durante o roteiro, Syd Field nos explica:

A função do roteirista aspectos do personagem ao leitor e ao público. Temos de descobrir algo sobre o seu personagem. Na progressão do seu roteiro, o personagem geralmente descobre algo sobre sua complicação na história ao mesmo tempo que o público. Dessa forma, personagem e público partilham da descoberta dos pontos de virada que sustentam a ação dramática (1995, p.31).

Outro aspecto importante de uma personagem é a “IDENTIFICAÇÃO”. Para que seja boa, o leitor ou o público precisa se identificar com ela. O espectador precisa pensar que conhece alguém assim.

Personagem também é “AÇÃO”. A ação é o elemento fundamental definir uma personagem, pois, “o que uma pessoa faz é o que ela é, e não o que ela diz” (Field, 1995, p.31). Assim, a ação a define em todos os sentidos: caráter, sentimentos e personalidade.

Assim, personagem é ponto de vista, atitude, comportamento, revelação, identificação e ação. E, uma personagem pode ter todos esses “atributos” ou apenas alguns deles, isto depende de quem a revela para o leitor, ou seja, o roteirista.

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Beth Brait ressalta que a personagem pode ter diversas funções. A primeira é a função decorativa, uma personagem com função decorativa não é dispensável, porém, segundo Brait, é: “aquela considerada inútil a ação, aquela que não tem nenhuma significação particular, a que inexiste do ponto de vista psicológico” (2004, p.48). Apesar desta definição ter um cunho pejorativo, Brait explica que não é desta maneira que esta deve ser vista. “Como elemento decorativo a personagem, se está no romance, desempenha uma função. Ela pode construir um traço de cor local, ou um número indispensável à apresentação de uma cena em grupo” (Brait, 2004, p.48).

Agente da ação, esta é outra função que pode ser desempenhada pela personagem. Estudos realizados por E. Souriau e W. Propp, mostram que a personagem pode ser também “agente da ação”. Este estudo divide o “agente da ação”, que nem sempre é o personagem, em seis categorias. A primeira categoria é denominada “condutor da ação”, esta é a personagem que dá o primeiro passo, impulsiona a ação. Este passo poderá nascer de um desejo, necessidade ou de uma carência.

A personagem “agente da ação” pode ser também “oponente”. Esta, pode ser entendida como a antagonista. Ela é a força que possibilita o conflito. Para além, o “agente da ação” pode ser “objeto desejado”, ou seja, uma força de atração que traz a representação de um objetivo ou valor a ser atingido.

Outra função que pode ser desempenhada pela personagem “agente da ação” é de “destinatário”. Esta é a personagem beneficiária da ação, ela nem sempre é o condutor da ação, mas, tem o objeto desejado e isto é o que a envolve na trama. Quando a personagem possui função auxiliar, que ajuda ou impulsiona outra “agente da ação”, ela é definido como “adjuvante”. Por fim, sendo aquela que intervém em uma ação buscando resolvê-la, a “agente da ação” será então “árbitro” ou “juiz”.

Beth Brait acrescenta que a personagem pode ter também a função de porta-voz do autor. Neta caso, o que se leva em conta é que a criação do roteiro é uma somatória das experiências vividas pelo autor e que, portanto, transparecem em sua obra. Porém, como Brait (2004, p.50) nos explica, esta é uma visão discutida entre os autores, pois como sugere a autora: “nesse sentido, a personagem seria um amálgama das observações e das virtualidades de seu criador”. É necessário compreender ainda, que a personagem como porta-voz do autor não deve ser

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comparado com uma biografia ou autobiografia, na realidade. Brait (2004, p.51) nos explica, através dos autores de L’universe du roman, que para compreender esta função precisamos “ultrapassar a reconstituição anedótica da biografia, a descoberta das fontes literárias ou histórias e a análise superficial das ideias para atingir os níveis de apreensão invisíveis a essa primeira abordagem”.

Afinal, “ao encarar a personagem como ser fictício, com forma própria de existir, os autores situam a personagem dentro da especificidade do texto, considerando a sua complexidade e o alcance dos métodos utilizados para apreendê-la” (Brait, 2004, p.51).

3.2. PERSONAGEM: PROCESSO DE CONSTRUÇÃO

“Como um bruxo que vai dosando poções que se misturam num mágico caldeirão, o escritor recorre aos artifícios oferecidos por um código a fim de engendrar suas criaturas” – Beth Brait.

Para representar uma personagem o autor se mune de vários artifícios. Geralmente, a construção de uma personagem em um texto dá-se pela descrição da mesma na história, com características físicas e psicológicas que a compõem. Assim, passamos a conhecê-la, muitas vezes, através das ações que ela irá executar.

Para criar uma personagem, o autor leva em consideração muitos aspectos. Syd Field (1995) recomenda que se conheça a personagem que se quer criar. Para criar uma personagem devemos criar primeiramente o contexto em que ela se insere: é pai, mãe, adolescente, criança? Estuda, trabalha, dedica-se a um hobby? Quem é? O que faz? Onde faz? Estes são aspectos que definem em que contexto a personagem poderá se inserir.

Este é o primeiro passo para a criação da personagem. Criado o contexto em que ela se insere, inicia-se a criação da personalidade. A personalidade irá se desenvolver ao longo das páginas, e é formada pelas atitudes e pensamentos da personagem.

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Field (1995, p.34) explica que existem duas maneiras de se criar um roteiro. “Uma é ter a ideia e depois criar os personagens que caibam nessa ideia”. Neste processo, cria-se primeiro o ambiente e a ideia de qual será a trama desenvolvida neste ambiente e depois, criar as personagens para esta trama. “A outra maneira de abordar um roteiro é criar um personagem; deste personagem emergirão um necessidade, uma ação e uma história” (Field, 1995, p.34). Neste modelo a personagem principal geralmente é quem motiva a criação da história. Este é o caso em que o autor tem uma ideia incrível para personagem sem ao menos ter história e, a partir disto, cria uma nova trama.

O autor explica que a caracterização pode ser abordada de várias maneiras. Para ele, a melhor forma é utilizar o método que pode dar ao roteirista várias possibilidades de criação, deixando que ele escolha aquilo que irá ou não usar. Para Field, “(...) quando criamos um personagem temos de listar nuances de forma que possamos escolher usá-las ou não usá-las” (1995, p. 38).

Este método segure uma fórmula que inicia com a definição da personagem principal. Após é preciso definir a vida dela em duas categorias: interior e exterior. A vida interior diz respeito ao momento que inicia a criação ou nascimento da personagem até o momento em que o filme começa, este processo dá a ela uma forma. Já a vida exterior é um processo que inicia com o filme e se encerra com a conclusão da trama, neste processo se revela a personagem. O autor defende ainda que o escritor deve construir, a partir destes pontos, uma biografia sobre suas personagens: “Forme seus personagens criando biografias para eles e depois revele-os através de suas ações e possíveis traços físicos” (Field, 1995, p.23).

O filme utiliza imagens e sons para comunicar, por isso o roteirista precisa revelar as nuances de suas personagens através das ações. “A essência do personagem é a ação. Seu personagem é o que ele faz. Filmes são um meio visual e a responsabilidade do escritor é escolher uma imagem que dramatize cinematograficamente o seu personagem” (Field, 1995, p.22).

Existem também alguns recursos que o autor pode utilizar para criar a personagem durante o filme, como o modo em que a história é vista. O autor pode utilizar o narrador em primeira ou terceira pessoa, construindo a personagem sob uma perspectiva externa. Beth Brait diz que “o narrador é uma câmera” quando está em terceira pessoa e conta a história de uma personagem, ele vê a história de fora e a conta conforme a sua perspectiva. Porém, este narrador não é quem toma conta

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da história, ele constrói a personagem através de suas palavras e a história não é conduzida por ele, mas sim, pela personagem.

A apresentação da personagem por um narrador que está fora da história é um recurso muito antigo e muito eficaz, dependendo da habilidade do escrito que o maneja. Num certo sentido, é um artificio primeiro, uma manifestação quase espontânea da tentativa de criar uma história que deve ganhar a credibilidade do leitor (Brait, 2004, p. 55).

No momento em que “a câmera finge registros e constrói as personagens” o narrador está também em terceira pessoa. Neste caso, a câmera irá simular um registro contínuo. Esta simulação é feita através da focalização da personagem apenas nos momentos precisos e que interessam ao andamento da história e dos seres que a vivem.

Outro ponto de vista é quando “a personagem é a câmera”. Aqui o narrador se apresenta em primeira pessoa e está diretamente ligado aos acontecimentos.

Por este processo, os recursos selecionados pelo escritor para descrever, definir, construir os seres fictícios que dão a impressão de vida chegam diretamente ao leitor através de uma personagem. Vemos tudo através da perspectiva da personagem, que, arcando com a tarefa de “conhecer-se” e expressar esse conhecimento, conduz os trações atributos que as presentificam as outras personagens (Brait, 2004, p.60).

Este é um modo de criação e exposição de personagem muito complexo. Para se ter uma ideia, este mesmo tipo de caracterização pensado por um ser humano, onde processo de autoconhecimento por si só já é complexo, dá a noção de que compartilhar este conhecimento com outros se torna um grande desafio. É por isto que, segundo Brait (2004, p.61), somos levados a crer que “esse recurso resulta sempre em personagens densas, complexas, mais próximas dos abismos insondáveis do ser humano”. Para além disto, a autora afirma que “esse recurso ajuda a multiplicar a complexidade da personagem e da escritura que lhe dá existência” (Brait, 2004, p.61). Porém, devemos levar em conta que toda personagem bem desenvolvida tem por trás um grande escritor, que é quem dará a ela todos os recursos possíveis para que seja complexa, densa e, acima de tudo, viva.

Outro artifício utilizado pelo autor para apresentar a personagem ao público é a apresentação da personagem por ela mesma. De fato, utilizar este recurso a torna

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mais real, pois ela mesmo conta sua história. Conforme Brait salienta existem diversas formas de abordar uma personagem por este ângulo. A primeira delas é o diário íntimo. Na forma de diário “o emissor, a voz narrativa, não pressupõe um receptor” (Brait, 2004, p.61). Assim, cada “página” expõe a vida da personagem com base nos fatos decisivos de sua vida e, são repassadas ao expectador da maneira como ela as vê.

Também é possível abordar a personagem sendo apresentada por ela própria através do romance epistolar e das memórias. Neste tipo de abordagem, diferentemente do diário, o monólogo tem um receptor definido. Os recursos utilizados nesta abordagem fazem com que sua caracterização aconteça em um tempo passado, através disso, o autor vai sutilmente, como um pretexto, mostrando o presente e as nuances da interioridade da criação.

Há ainda outra possibilidade na apresentação da personagem pela própria, a do monólogo interior. Esta abordagem mergulha significativamente na caracterização interior da personagem. Através dela o autor leva o leitor até os pensamentos da personagem, deixando-o muito mais próximo da consciência daquele ser, tornando esta relação mais complexa.

A radicalização dessa forma de caracterizar a personagem, flagrada na ausência de pontuação, no volume de sintagmas que se sucedem de forma a reproduzir um jorro de consciência que obedece a um mínimo de sintaxe, permite a confluência de conteúdos psíquicos dispares e a reprodução dos movimentos alógicos dos pensamentos apanhados em seu estado de nascimento e expressão (Brait, 2004, p.62 e 63).

Para construir a personagem pode ser utilizado o artifício da personagem como testemunha. Neste sentido, ela é apresentada por um narrador, que é testemunha da história que está sendo contada. “O narrador, de forma discreta, vai criando um clima de empatia, apresentando a personagem principal de maneira convincente e levando o leitor a enxergar, por um prisma ao mesmo tempo discreto e fascinado, a figura do protagonista” (Brait, 2004, p.64).

Todos os autores salientam a importância da perícia do autor na hora de escrever um texto. Pode-se escolher qualquer tipo de abordagem para construir e apresentar uma personagem ao público, porém, é o autor que dará a ela vida e profundidade.

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A narração em primeira ou terceira pessoa, a descrição minuciosa ou sintética de traços, os discurso direto, indireto ou indireto livre, os diálogo e os monólogos são técnicas escolhidas e combinadas pelo escritor a fim de possibilitar a existência de suas criaturas no papel. Dependendo de suas intenções e principalmente de sua perícia, ele vai manipular o discurso, construindo essas criaturas, que, depois de prontas, fogem ao seu domínio e permanecem no mundo das palavras à mercê dos delírios que esse discurso possibilita aos incontáveis receptores (Brait, 2004, p.67).

O processo de criação de personagens descrito por Comparato (2000), em seu livro “Da Criação ao Roteiro”, inicia com a criação da sinopse. A sinopse compreende o argumento da criação, é onde deve ocorrer o nascimento da personagem.

O nascimento da personagem que vai começar a desenvolver o conflito é determinado no próprio instante em que se começar a escrever a sinopse. Poder-se-ia dizer que a sinopse é o reino da personagem, e, quanto mais desenvolvida estiver, mais possibilidades terá o roteiro (Comparato, 2000, p.112).

Há dois tipos de sinopse. A pequena sinopse possui de duas a cinco folhas e seu texto compreende apenas a história das personagens principais. A grande sinopse possui texto mais elaborado e pode conter até diálogos, é o chamado “roteiro literário”.

A sinopse pode ser vista como a defesa das personagens. Ela explica quando, onde, quem e qual a história que será desenvolvida, além disto, deve utilizar texto claro e simples, pois é a primeira forma de um roteiro. Deve ser sólido, pois é a partir deste texto que se iniciam os seguintes passos da criação. E é com um bom argumento que se dá o primeiro passo para a construção do filme.

É na sinopse que se definem quem serão as personagens e como serão. O protagonista, personagem básica, é o herói da história e pode ser uma pessoa ou grupo de pessoas, ou qualquer coisa que possa se expressar. “Hierarquicamente, o protagonista está em primeiro plano, no centro da ação, e é, por conseguinte, o mais trabalhado e desenvolvido” (Comparato, 2000, p.122).

A personagem com função de ator secundário ou coadjuvante é aquela que está sempre ao lado da protagonista. E, segundo Comparato (2000), ela pode nascer à medida que se constrói a trama. Já a que possui função de componente dramático tem por objetivo ser elemento de união, explicação ou solução e não possui tamanha profundidade.

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Conhecer a personagem a fundo é peça fundamental na construção de um roteiro. Para isto, deve-se levar em conta a adequação desta figura dramática à história. Esta adequação leva em conta o fato de a criação ter se dado antes ou depois da trama. É preciso levar em conta que independentemente de quem venha primeiro “o importante é que o produto final resulte harmonioso, como uma interação personagem-história indestrutível, como se de uma grande verdade se tratasse” (Comparato, 2000, p.124).

A construção de um perfil para a personagem exige também o conhecimento de que, no cinema, ela é o que fala e faz. Pensamentos e sentimentos são expressos através de ações e diálogos, pois é esta a melhor maneira que o audiovisual tem de desenrolar uma história. Mesmo assim, existe ainda a possibilidade de se utilizar um narrador para decifrar a mente da personagem, embora não seja muito usual e, segundo Comparato, nem muito efetivo, na maioria dos casos.

A maneira de falar também é um detalhe importante da construção do perfil do ser atuante de uma obra: “(...) se gagueja ou é lento, se tem sotaque do sul ou é mudo etc.” (Comparato, 2000, p.126). Através de atributos como estes, podemos definir um primeiro traço de seu perfil. Elementos básicos sobre a maneira de falar já são suficientes para construir uma boa sinopse.

O perfil da personagem depende também de seu nome. Batizar uma personagem é uma tarefa árdua, pois, assim como o seu modo de falar, o nome pode dizer muito sobre ela. Geralmente, o autor utiliza este recurso para definir classe social, o caráter e até sua tipologia. Isto não quer dizer especificamente que uma personagem nominada de uma forma não poderá ter características que diferem ao que o nome nos leva a crer.

Uma personagem precisa “ser real”. É assim que Comparato define e explica que:

Uma personagem tem de possuir todos os valores que se consideram universais (morais, éticos, religiosos, afetivos, políticos, etc.), e também os chamados pessoais, que apenas têm significado naquela personagem específica (obsessão pelo trabalho, mania de ordem, etc.) (Comparato, 2000, p.128).

Para ser real, a personagem precisa ter densidade humana. Isto quer dizer que ela não deve ser perfeita e sim, contraditória e conflituosa. E, assim como o ser

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humano, deve ser única. Além disto, a figura dramática também deve ter atos conscientes, que realiza de própria vontade e, atos inconscientes, que realiza no momento da emoção, involuntariamente. Outro aspecto importante é que ela tenha equilíbrio, ou seja, que tenha os aspectos positivos e negativos, assim como o ser humano, e não seja apenas uma marionete obediente nas mãos do autor.

No que diz respeito à personagem ser real, Comparato demonstra que existem duas maneiras de se ver esta figura: redonda e plana. A personagem plana é aquela que tem um perfil único, com traços fixos. Já a redonda apresenta outros aspectos. Enquanto a plana é previsível, a redonda é sempre uma surpresa. O autor geralmente se vale dos dois tipos de personagens para sua criação, uma mais complexa (a redonda) e outra mais estereotipada (a plana).

A composição da personagem deve considerar outros fatores, para assim desenhá-la através das palavras. Para isto, Comparato (2000) nos traz três grandes grupos de fatores básicos sobre a personagem. O fator físico leva em conta aspectos como: idade, peso, altura, presença, cor do cabelo, cor da pele, etc. Já o fator social leva em conta classe social, religião, família, origens, trabalhos que realiza, nível cultural, etc. Por fim, o fator psicológico deve conter dados como ambições, anseios, frustrações, sexualidade, perturbações, sensibilidade, percepções, etc. Além de levar em conta os aspectos citados é preciso verificar que o intelecto da personagem tenha a ver com as emoções que tem. Só assim é possível criar uma identidade forte.

Algumas características são essenciais para a criação de uma personagem. Em “Da criação ao roteiro” Comparato (2000) nos traz um quadro com algumas características como: parcimonioso – pródigo; gentil - violento; inteligente – estúpido; justo-injusto; entre outras. Estas características não devem ser vistas como antônimos e, é preciso levar em conta que a lista de características pode ser infinita, dependendo da complexidade e do tipo da personagem.

O contraste da personagem é o que a destaca perante as demais, tornando-a única em relação a outras personagens e aos seres vivos. São as contradições que definem este contraste e trazem o nível dramático à criação. Porém, não deve se confundir uma personagem contraditória com uma personagem em conflito. A personagem “exprime a sua complexidade através de ações antagônicas e quase sempre leva a cabo atos díspares, porque tem uma direção dramática” (Comparato,

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2000, p.134). Já a personagem em conflito não tem uma direção ou objetivo dramático, por isto ela não evolui dramaticamente.

A protagonista é aquele que está em primeiro plano na história. A antagonista é o seu oposto, e é construída da mesma forma, podendo ser uma pessoa, um grupo ou qualquer ser que tenha vida. “O antagonista deve ter o mesmo peso dramático que o protagonista, mas não é necessário desenvolvê-lo com a mesma profundidade dramática” (Comparato, 2000, p.136).

Compondo a história, juntamente com protagonista e antagonista encontram-se atores encontram-secundários ou colaboradores e componentes dramáticos. Atores secundários são aquelas personagens que estão sempre ao lado da protagonista, mas que não são tão aprofundadas quanto ela. Já as personagens de componente dramático são elementos explicativos, e são utilizados como elementos de ligação e conclusão durante a história. Segundo Comparato (2000), estas personagens são normalmente estereotipadas e sem qualquer complexidade.

Personagens que servem de componente dramático deixam a obra mais consistente e existem inúmeras possibilidades para estes aparecerem durante a trama. Contudo, o componente dramático não é formado apenas por personagens, ele pode ser também um objeto. Neste caso, o objeto pode funcionar como objeto de ligação (como o robô no filme Guerra nas Estrelas), de solução (o selo de uma carta no filme Charada) ou explicativo (a criptonita no filme Superman).

A criação de personagens prevê vários tipos e estilos de criar e pensar a personagem. Pode-se construir a personagem primeiro e depois sua história, como também podemos ter a história e depois encaixar a personagem dentro dela. Prevê também a criação de personagens de todos os tipos, complexas, em conflito, não complexas, primárias, secundárias e até como elemento de componente dramático. Mas, por mais que o esforço de criação e caracterização de uma personagem venha pelas mãos do roteirista, o sucesso e compreensão da personagem só ocorrerá se o consumidor final compreender a ideia do roteirista; eis a importância de uma construção de personagem sólida.

Mas, se a construção de uma personagem, o conjunto de traços que compõem a sua totalidade permite inúmera leituras, dependendo da perspectiva assumida pelo receptor, dos códigos utilizados em determinados momentos par aa viabilização dessas leituras, isso não significa que a dimensão da personagem seja ditada unicamente pela capacidade de análise e interpretação do leitor. (Brait, 2004, p.67)

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3.3. O HERÓI

Construir um herói vai muito além de construir um protagonista. Joseph Campbell delimita, em seu livro “A Jornada do Herói”, que a trajetória de um herói passa pelas diferentes fases da vida e também diz respeito ao amadurecimento da identidade e da consciência da personagem. O herói, assim como o protagonista, vive situações cotidianas, o que faz com que o espectador se identifique facilmente com ele. É claro que o personagem herói não deve ser perfeito, assim como o ser humano “real” ele precisa ter suas imperfeições para que o público se identifique.

A jornada do herói, descrita por Campbell, nos traz a busca por conhecimento, descoberta e afirmação da identidade da personagem. No início da jornada, ela é apresentado em seu mundo comum e é neste mundo que o herói é exposto para o expectador.

O segundo passo da jornada é o chamado para a aventura. Nesta etapa o herói recebe um chamado que quebra sua rotina e faz com que ele deixe seu mundo comum para iniciar uma nova caminhada.

Já no terceiro passo de sua jornada o herói recusa-se a aceitar sua aventura. Essa recusa pode vir pelo fato de a personagem acreditar que o desafio é muito grande, por acreditar que não é melhor do que ninguém e pensar não ter condições de superar este desafio. A recusa serve também como recurso para mostrar ao expectador a grandiosidade da jornada que está por vir.

O quarto passo na jornada do herói diz respeito ao seu encontro com o mentor. O mentor de um herói pode ser alguém experiente ou alguém que o leve a tomar uma decisão. O herói quando encontra seu mentor o tem como uma referência e busca obter seu afeto e admiração.

O quinto passo nessa jornada compreende a passagem do limiar ou travessia do umbral. Nesta fase, o herói mergulha em um novo mundo, aprofundando-se em sua jornada, uma decisão que poderá vir de várias maneiras, pois assim como o personagem pode decidir realizar esta jornada, ele pode ser obrigado a isto.

É na sexta etapa desta jornada, chamada de “testes, aliados e inimigos”, que é desenvolvida a maior parte da história. Neste ponto da história o herói é levado a

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grandes provações. Ele pode recebe ajuda, voluntária ou involuntária, o que pode levar ele a fazer amigos e inimigos, que irão auxiliar ou dificultar a sua trajetória.

A seguir, o herói encontra-se próximo ao seu objetivo, é o sétimo passo. E é quando o herói alcança este estágio que aparecem dificuldades que fazem com que o final fique indefinido. Por fim, o personagem entra na provação máxima e dá o seu oitavo passo. É onde está o maior ponto de tensão da história, onde se dá o desenrolar final da busca do herói e, geralmente, este ponto tem um confronto com o principal inimigo. Após passar por esta provação, o herói conquista o nono passo em sua jornada: a conquista da recompensa.

O próximo passo diz respeito ao caminho de volta. Nesta volta, geralmente o herói morre, para que possa completar sua trajetória. A etapa que se segue diz respeito a ressurreição do herói, onde, graças aos seus sacrifícios, ele recebe a dádiva de voltar dos mortos, fortalecido para vencer a ameaça final.

Por fim, o herói irá retornar para o seu mundo comum ou viver no novo mundo que se apresentou a ele. Esta é a conquista do elixir, quando o herói, mesmo não ganhando um bem material, tem um grande ganho em seu caráter, voltando para casa totalmente transformado e estas transformações afetam a todos a sua volta.

A jornada do herói tem por si só essa função: transformar a personagem, o herói. Ela inicia mostrando o herói em seu ambiente comum e o apresentando a adversidades e são essas adversidades que formam o caráter e transformam o simples personagem em um verdadeiro herói.

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4. O HERÓI EM HARRY POTTER

4.1. QUEM É HARRY POTTER? UMA BREVE APRESENTAÇÃO DA PERSONAGEM

O que uma viagem de trem pode nos proporcionar? Para Joanne Rowling uma viagem de volta para casa representou muito mais do que se pode imaginar. No ano de 1990, enquanto olhava pela janela de um trem lotado, Joanne teve sua primeira ideia para criar Harry Potter: um menino magricela, de cabelos pretos, e que usava óculos.

No momento em que idealizou Harry, Joanne não tinha sequer uma caneta para esboçar suas ideias, mas isso fez com que ela as amadurecesse durante aquela viagem. E naquela mesma noite começou a nascer o esboço do que seria o primeiro livro da série de grande sucesso: Harry Potter e a Pedra Filosofal.

Harry Potter é um menino franzino e tímido que vive com seus tios em um bairro de Londres. Ele nos é apresentado como um menino que perdeu os pais ainda bebê e, por isto, foi criado pelos tios. Até as vésperas de seu décimo primeiro aniversário Harry vive uma vida normal, sofrendo nas mãos da família que o adotou. E é no dia de seu aniversário de onze anos que a história do pequeno Harry Potter toma uma nova proporção: ele descobre que é um bruxo.

Esta ideia esteve presente na cabeça de J.K. Rowling, nome escolhido por Joanne para publicar seus livros à época. Desde a viagem de trem Joanne já sabia como seria composto esse personagem e, só depois de cria-lo é que buscou aprofundar-se na história.

O engraçado é que Harry veio a minha mente quase inteiramente formado – eu o vi muito, muito claramente; eu podia ver esse pequeno garoto magricela de cabelos negros, essa estranha cicatriz na sua testa, eu soube instantaneamente que ele era um bruxo, mas /ele/ não sabia disso ainda. E então eu comecei a trabalhar na história. Essa foi – essa foi a ideia básica. Ele – ele é um garoto que é mágico, mas que não sabe disso ainda, daí eu penso ‘como ele pode não saber?’ Entende, portanto eu – eu trabalhei de frente para trás partindo desse ponto e foi quase como se a história já estava lá esperando que eu a encontrasse e – ahn – pareceu para mim que a mais sólida explicação para ele não saber que era um bruxo, era a de que seus pais foram bruxos que morreram– e que ele foi criado por trouxas–

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pessoas não mágicas. (Rowling, J.K. Entrevista concedida a Christopher Lydon para o “The Conection” da rádio WBUR, 12 de outubro de 1999).

Referências

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