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A inclusão social de pacientes psicóticos: um enfoque educativo em psiquiatria por meio de um grupo terapêutico

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Academic year: 2021

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

ANTONIO CARLOS GONÇALVES DO AMARAL

A INCLUSÃO SOCIAL DE PACIENTES PSICÓTICOS:

Um enfoque educativo em psiquiatria por meio de um grupo terapêutico

Ijuí – RS 2013

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ANTONIO CARLOS GONÇALVES DO AMARAL

A INCLUSÃO SOCIAL DE PACIENTES PSICÓTICOS:

um enfoque educativo em psiquiatria por meio de um grupo terapêutico

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Strictu Senso da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, para fins de obtenção do título de Mestre em Educação nas Ciências.

(Linha 2. Teorias pedagógicas e dimensões éticas e políticas da educação)

Orientador: Prof. Dr. Paulo Rudi Schneider

Ijuí – RS 2013

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RESUMO

Esta é uma pesquisa de avaliação, de natureza qualitativa do tipo descritivo exploratório, acrescida da análise de conteúdo nos resultados encontrados. Com esta pesquisa viso avaliar a experiência psiquiátrica em inclusão social dos pacientes psicóticos em tratamento no CAPS II de Ijuí/RS, operacionalizada por meio de uma prática de ensino e aprendizagem em grupo terapêutico de atividade multidisciplinar e sua real competência como alternativa terapêutica. Ressalto que o grupo não pode ser visto só como um instrumento de pesquisa, mas como o próprio meio de socialização. A população foi constituída de doentes mentais com esquizofrenia, que frequentam regularmente os grupos terapêuticos no CAPS II, de Ijuí/RS. Para a coleta de dados, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com perguntas fechadas (objetivas) e abertas (subjetivas) nos três segmentos pesquisados: pacientes, cuidadores/familiares e profissionais da saúde mental atuantes no grupo terapêutico. Essas entrevistas foram aplicadas por um entrevistador, que não participa do grupo, assegurando o tão importante caráter de neutralidade. Utilizei para análise qualitativa o método de Minayo (2001) e para a análise de conteúdo, o método de Bardin (2011). Constatei nas respostas quantitativas o atual estágio de evolução do paciente em seu tratamento; e nas respostas qualitativas, a competência ou não do grupo terapêutico nesse processo evolutivo, que busca a inclusão social desses pacientes. As respostas dos pacientes permitem perceber seu desempenho cognitivo revelando capacidade para uma discussão reflexiva sobre as temáticas escolhidas, o que lhes propicia a apropriação de suas emoções, do seu corpo, de sua história - elementos indispensáveis para a constituição do indivíduo no social. Aos cuidadores/familiares, uma vivência reflexiva sobre as referidas questões, o que podemos considerar uma experiência (aprendizagem) que permite aproximarem-se mais de seu paciente, criando um meio mais acolhedor e mais real para o mesmo. Aos profissionais da saúde mental, a percepção do quanto esses pacientes têm sua capacidade cognitiva presente, embora, inicialmente, mais limitada pela distorção da realidade. Esta capacidade permite aos pacientes fazerem o adequado aprendizado reflexivo sobre sua doença mental e compreender que esta não o impede de participar no social. Concluí que a terapia de grupo foi eficiente para encontrar alternativas junto à educação que permitam a inclusão social, oportunizando ao paciente, aos cuidadores/familiares e profissionais da saúde mental pudessem vivenciar suas práticas de forma reflexiva, transformando-as em experiências (aprendizagem).

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ABSTRACT

This paper is an evaluative research, it is qualitative, descriptive and exploratory with a content analysis on the results. It intends to answer an inquiry on mental health: the power of the therapy group as a treatment option, recovery and rehabilitation in mental health. The study population consisted of patients with schizophrenia who regularly attend therapeutic groups in CAPS II, Ijuí / RS. For data collection were carried out semi-structured interviews with closed questions (objective) and open (subjective) in the three studied segments: patients, caregivers/family members and mental health professionals working in the therapeutic group. They have been applied by an interviewer, who does not participate in the group, giving it a great character of neutrality. The Minayo method (2001) was used for qualitative analysis and the Bardin method (2011) for the content analysis. It is observed in the quantitative answers the group's present stage of evolution in their treatment and it is observed in the qualitative responses, the competence or no of the group therapy in this evolutionary process, which seeks the social inclusion of these patients. Patient responses allow us to perceive their cognitive capacity empowering them for a reflective discussion on the themes chosen, which gives them ownership of their emotions, body, history, indispensable elements for the formation of the individual in society. For the caregivers and family members, a reflective experience on those issues which we consider an experience (learning) enabling them to get closer to their patient, creating a more welcoming and more real atmosphere for them. For mental health professionals, the perception of how much these patients have a cognitive ability present, although initially more limited by the distortion of reality. This ability enables patients to make the suitable reflective learning about their mental illness and how much it does not prevent them from participating in society. It is concluded that the group therapy was effective to find alternatives along with the education that enable a social inclusion. Allowing the patient, caregivers/family members and mental health professionals to experience their practices reflexively, turning them into experience (learning).

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Classificação dos pacientes em relação ao Gênero ... 40

Gráfico 2 – Classificação dos pacientes em relação à Idade ... 41

Gráfico 3 – Classificação dos pacientes em relação à Escolaridade ... 42

Gráfico 4 – Classificação dos pacientes em relação ao Estado Civil ... 43

Gráfico 5 – Classificação dos pacientes em relação à Renda Declarada ... 45

Gráfico 6 – Classificação dos pacientes em relação ao Tempo de Participação no Grupo ... 47

Gráfico 6.1 – Histórico dos pacientes no CAPSII ... 48

Gráfico 7 – Capacidade de identificar a doença mental no outro ... 50

Gráfico 8 – Autopercepção do sofrimento mental ... 53

Gráfico 9 – Sente-se afetado com o estigma e preconceito ... 55

Gráfico 10 – Em casa como prefere estar ... 58

Gráfico 11 – Confiabilidade no outro ... 60

Gráfico 12 – Capacidade de iniciativa em interações sociais ... 62

Gráfico 13 – Tempo gasto com lar, trabalho, estudos ... 64

Gráfico 14 – Capacidade de autonomia ... 66

Gráfico 15 – Gênero dos cuidadores ... 79

Gráfico 16 – Idade dos cuidadores ... 81

Gráfico 17 – Escolaridade dos cuidadores ... 82

Gráfico 18 – Estado civil dos cuidadores ... 83

Gráfico 19 – Renda declarada dos cuidadores ... 84

Gráfico 20 – Percepção da doença mental do outro ... 85

Gráfico 21 – Percepção da doença mental do familiar ... 87

Gráfico 22 – Sente-se afetado com o estigma e preconceito ... 90

Gráfico 23 – Em casa como prefere estar ... 92

Gráfico 24 – Confiabilidade no outro ... 94

Gráfico 25 – Capacidade de iniciativa em interações sociais ... 96

Gráfico 26 – Tempo gasto com lar, trabalho, estudos ... 98

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – A ponte japonesa de Giverny – Claude Monet 1840 ... 71

Figura 2 – O grito – Edward Münch – 1893 ... 72

Figura 3 – O quarto – Van Gogh 1888 ... 74

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 7

1 APORTES TEÓRICOS ... 16

1.1 CONCEITUAÇÕES DE EDUCAÇÃO E PROMOÇÃO EM SAÚDE ... 16

1.2 INDIVIDUAÇÕES NOS REFERENCIAIS PSIQUIÁTRICOS E PSICANALÍTICOS ... 18

1.3 INDIVIDUAÇÃO: CORPO E EMOÇÕES NOS REFERENCIAIS DE ANTÔNIO DAMÁSIO E ESPINOSA ... 21

1.4 INDIVIDUAÇÃO EM UM GRUPO TERAPÊUTICO ... 24

1.5 INDIVIDUAÇÃO NO PARADIGMA DA LINGUAGEM ... 25

1.6 INCLUSÃO SOCIAL EM SAÚDE MENTAL: MEDICAÇÃO E ABORDAGENS PSICOSSOCIAIS ... 26

1.7 INCLUSÃO SOCIAL EM UM GRUPO TERAPÊUTICO... 29

2 CAMINHO METODOLÓGICO ... 31 2.1 PROBLEMATIZAÇÃO DA PESQUISA ... 31 2.2 JUSTIFICATIVA ... 31 2.3 OBJETIVO GERAL ... 31 2.4 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 32 2.5 TIPO DE PESQUISA ... 32 2.6 LOCAL... 33 2.7 SUJEITOS DA PESQUISA ... 34

2.8 INSTRUMENTO DE COLETA E ANÁLISES DE DADOS ... 36

3 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ... 40

3.1 CARACTERÍSTICAS DOS PACIENTES ... 40

3.2 RESULTADOS E DISCUSSÃO DOS MESMOS EM RELAÇÃO AOS PACIENTES PESQUISADOS ... 49

3.3 ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES GRÁFICAS DOS PACIENTES A RESPEITO DE SUAS EMOÇÕES ... 68

3.4 CARACTERÍSTICAS DOS CUIDADORES ... 77

3.5 RESULTADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS SOBRE A PARTICIPAÇÃO DOS CUIDADORES ... 85

3.6 QUESTIONÁRIO AOS TÉCNICOS EM SAÚDE MENTAL ... 102

3.7 RELAÇÕES DOS ASPECTOS OBJETIVO E SUBJETIVO NOS TRÊS SEGMENTOS PESQUISADOS QUANTO ÀS QUESTÕES APLICADAS... 107

4 CONCLUSÃO ... 111

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 116

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INTRODUÇÃO

Considero importante motivação para a realização deste trabalho a revisão da prática baseada na medicalização de pacientes psicóticos, embora uma prática indispensável para suas estabilizações. Esta prática ensinou-me que medicar não estava sendo suficiente para ajudá-los a sair de seu isolamento e para apoiá-los na busca de uma real inclusão social, embora estando fora das crises psicóticas.

Esta reflexão exigiu-me a mudança de paradigmas, isto é, a necessidade de uma autenticidade na busca de novas formas de tratamento. Creio que isto só foi possível pela interação com os pacientes, aprendendo a ouvi-los em sua linguagem não verbal, isto é, seu isolamento gerador de inquietação na busca de algo mais para seus tratamentos.

A importância de encontrarmos tempo para refletirmos sobre nossa experiência pode ser considerada uma grande aprendizagem, ou seja, a reflexão sobre a nossa própria prática, conforme nos mostra Bondía em suas assertivas sobre a importância da reflexibilidade crítica:

A experiência é cada vez mais rara, por falta de tempo. Tudo o que se passa, passa demasiadamente depressa, cada vez mais depressa. E com isso se reduz o estímulo fugaz e instantâneo, imediatamente substituído por outro estímulo ou por outra excitação igualmente fugaz e efêmera. O acontecimento nos é dado na forma de choque, do estímulo, da sensação pura, na forma da vivência instantânea, pontual e fragmentada. A velocidade com que nos são dados os acontecimentos e a obsessão pela novidade, pelo novo, que caracteriza o mundo moderno, impedem a conexão significativa entre acontecimentos. Impedem também a memória, já que cada acontecimento é imediatamente substituído por outro que igualmente nos excita por um momento, mas sem deixar qualquer vestígio. O sujeito moderno não só está informado e opina, mas também é um consumidor voraz e insaciável de notícias, de novidades, um curioso impenitente, eternamente insatisfeito. Quer estar permanentemente excitado e já se tornou incapaz de silêncio. Ao sujeito do estímulo, da vivência pontual, tudo o atravessa, tudo o excita, tudo o agita, tudo o choca, mas nada lhe acontece. Por isso, a velocidade e o que ela provoca, a falta de silêncio e de memória, são também inimigas mortais da experiência (Bondía, 2002, p. 23).

Para Bondía (2002), existe diferença entre experiência e experimento: o experimento é genérico, produz consenso; e a experiência é singular, produz diferença. Este foi o estímulo inicial que recebi do orientador Prof. Dr. Paulo Rudi Schneider no sentido de buscar uma reflexão sobre uma prática em saúde mental

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para que a mesma pudesse ser vivenciada como experiência, considerando experiência como um encontro consigo mesmo, um encontro com algo que se prova. Procuro fazer uma breve reflexão histórica da saúde mental em nosso país, priorizando o seu momento atual, contextualizando-a com perspectivas de diferentes autores que a têm vivenciado com suas singulares experiências.

Penso ser adequado, neste momento destacar o papel inovador e pioneiro para a Psiquiatria Brasileira de Nise da Silveira. Esta Alagoana, nascida em Maceió em 1905, depois de afastada das suas atividades públicas como médica psiquiatra por perseguições políticas, retorna ao trabalho no Centro Psiquiátrico do Engenho de Dentro (Rio de Janeiro), funda a Seção de Terapia Ocupacional no antigo Centro Psiquiátrico Nacional, em 1946, local onde, em 1952, funda o Museu das Imagens do Inconsciente.

Em 1956, cria a Casa das Palmeiras, destinada ao tratamento e à reabilitação de egressos de hospitais psiquiátricos. Nise da Silveira deu um passo extraordinário na direção de criar algo genuíno para a psiquiatria e para a psicologia modernas. Impôs a tarefa de exercer seu trabalho de psiquiatria integrando suas reflexões psicológicas e sociais a um novo modelo de trabalho psiquiátrico, cujo centro de gravidade retirava o paciente de um mundo de clausura em que a arte e vida contrapunham-se e deslocava-o para o interior de um moderno estilo de espaço que afugentava o mal-estar e o tédio.

Num enfrentamento aberto com a psiquiatria da época e a própria arte conceitual, cria nos ateliês na Casa das Palmeiras e no Centro Psiquiátrico Pedro II, no Rio de Janeiro, um tratamento de vanguarda. Jovens psiquiatras e psicanalistas, psicólogos, poetas, críticos de arte e os próprios pacientes encontraram na médica a inspiração para sonhar com seus projetos futuros. Com o encantamento e o rigor de um exame crítico, que lhe era peculiar, a psiquiatra recebia estudantes e pesquisadores de todas as áreas (Silveira, 2008).

Como poderá ser visto no texto referente à reforma psiquiátrica e às diferentes influências do exterior e do próprio Brasil, seria injusto, por interesses obscuros, deixar de valorizar este pioneirismo de Nise da Silveira.

No contexto atual da saúde mental no Brasil, ocorre a mudança do modelo hospitalocêntrico para um modelo de retorno dos pacientes às suas comunidades. A Lei nº 9.716 de 07/ 08 /92 da reforma psiquiátrica no Rio Grande do Sul criou várias mudanças em diferentes áreas de atendimento a esses pacientes. A Lei nº 10216 de

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06 / 04 / 01 do Ministério da Saúde, em seu artigo 1º, cria os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) (Brasil, 2000).

Destaco apoiado na reflexão de Pereira (2001), os importantes elementos da retrospectiva histórica da reforma psiquiátrica no Brasil e as suas diferentes influências, em diferentes períodos.

No Brasil, a partir da década de 1970, surgiu o movimento de Reforma Psiquiátrica, que busca substituir os manicômios por iniciativas sociais, culturais, políticas, científicas, jurídicas, assim como modificar os conceitos e a relação da sociedade com os doentes mentais. A Política de Saúde Mental no Brasil foi fortemente influenciada pela experiência italiana que teve a frente Franco Basaglia. No entanto, na prática, não encontramos uma aplicação efetiva das diretrizes desse modelo. As propostas expressam em seus objetivos uma preocupação em reduzir o número de pacientes internados e o tempo de internações dos mesmos, além de conter referência à participação das famílias e das comunidades na assistência em Saúde Mental, porém os papéis que competem a cada um destes parceiros não são ainda bem definidos ou mesmo compreendidos. (Pereira, 2003; 37(4): p. 93)

Na perspectiva de melhor entender este papel e poder melhor defini-lo em minha prática, motivei-me para repensar a minha vivência profissional em saúde mental com pacientes psicóticos.

Ao me referir aos pacientes psicóticos nesta pesquisa, estou me referindo especificamente aos doentes mentais com esquizofrenia. Como a esquizofrenia pode causar grave deterioração das faculdades cognitivas, estigma social e prejuízo funcional, a identificação e as intervenções precoces são necessárias para prevenir o avanço da doença e buscar a máxima reabilitação do paciente. No referencial teórico, dou atenção especial à caracterização do indivíduo psicótico, em especial o esquizofrênico.

Considero importante buscar no D.S.M. IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) os principais sintomas que caracterizam a esquizofrenia considerando que esses sintomas permitem uma linguagem uniformizada, elemento indispensável para a credibilidade das pesquisas em diferentes centros mundiais (Noto, 2012):

A. Sintomas característicos: pelo menos dois dos seguintes quesitos presentes por um tempo significativo durante o período de um mês:

- Delírios – pensamentos falsos; - Alucinações – percepções irreais;

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- Fala desorganizada - alteração do pensamento; - Comportamento desorganizado ou catatônico (total);

- Sintomas negativos – embotamento afetivo, alogia (falta de lógica) e abulia (falta de vontade).

B. Disfunção social e ocupacional durante espaço significativo de tempo. C. Duração: sinais contínuos que persistem no mínimo durante seis meses. D. Exclusão de transtorno esquizoafetivo e transtorno do humor.

E. Exclusão de uso de substâncias e condição médica em geral.

A esquizofrenia é uma doença que tem seu início geralmente na adolescência quando aparecem seus principais sintomas em função das cobranças de desempenho pela família e pela sociedade, necessitando varias formas de tratamento ao longo da vida.

O presente estudo surgiu na perspectiva de busca de uma nova contextualização da psiquiatria na prática de educação em saúde mental. Busco junto à educação métodos de ser mais acessível e efetiva no conflito que surge pelo retorno desses pacientes às suas famílias e a suas comunidades quando não acompanhado do devido preparo de ambas para uma efetiva inclusão social dos pacientes psicóticos (esquizofrênicos).

Assim motivei-me para trabalhar a experiência de inclusão social dos pacientes psicóticos em um grupo terapêutico, no qual as relações interpessoais estão fortemente presentes. Com esse trabalho espero que eles possam refazer seus mundos internos e assim retomar seu desenvolvimento como seres humanos.

Ressalto aqui: sempre que uso o termo inclusão social, neste trabalho, estou me referindo à reabilitação social desses pacientes psicóticos numa experiência humanizante a todos os envolvidos (pacientes, familiares e profissionais da saúde) através de um grupo terapêutico, de característica operativa.

Conforme destaca Barros (2007) sobre a noção de reabilitação social, esta implica as diferentes intervenções terapêuticas de forma planejada:

A noção da reabilitação psicossocial permite o entendimento que qualquer processo terapêutico tem que ser parte de um projeto de intervenção planejado por toda equipe, cujos objetivos gerais dirijam-se ao incremento da: consciência do paciente a respeito dos seus problemas; autonomia afetiva-material-social do paciente; incorporação do paciente na vida de relação social e política (Barros, 2007; 41(Ésp.): 817).

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Com esta pesquisa viso avaliar a experiência psiquiátrica em inclusão social dos pacientes psicóticos em tratamento no CAPS II de Ijuí/RS, operacionalizada por meio de uma prática de ensino e aprendizagem em grupo terapêutico de atividade multidisciplinar e sua real competência como alternativa terapêutica. A necessidade desta problematização se deve ao retorno dos pacientes psicóticos à sua comunidade e à necessidade de práticas terapêuticas inclusivas, considerando o despreparo da família e da própria comunidade para recebê-los.

Na pesquisa utilizei o método de pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória de Minayo (2001); o método análise de conteúdo de Laurence Bardin (2011). Considero importante a abordagem desses dados de forma reflexiva e associativa entre o objetivo e o subjetivo.

As temáticas das questões objetivo-subjetivo avaliadas são relacionadas a seguir:

- Questão 1: Empatia com o sofrimento mental do outro - Questão 2: Autopercepção do sofrimento mental - Questão 3: Lidando com estigma e preconceito - Questão 4: Socialização no ambiente familiar - Questão 5: Confiabilidade no outro

- Questão 6: Capacidade de iniciativa em interações sociais - Questão 7: Tempo gasto com lar, trabalho e estudos - Questão 8: Capacidade de autonomia

Este trabalho objetiva avaliar e compreender a atual experiência de inclusão social dos pacientes psicóticos em uma prática de ensino e aprendizagem em saúde mental, operacionalizada por meio de um grupo terapêutico do qual faço parte, permitindo a eles apropriarem-se de seu corpo, de suas emoções e de sua história para sua constituição como indivíduos sociais. A ideia aqui é destacar o quanto a subjetividade dos pacientes psicóticos pode ser construída individualmente e por meio das relações sociais, no grupo, experimentando, assim, dois movimentos: o da individualidade e do coletivo.

De acordo com Sullivan (1947): “não existe período evolutivo com o ser humano existindo fora do âmbito do desenvolvimento quando a pessoa vive fora do reino das relações interpessoais” (apud Gabbard, 1998, p.133).

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Para Gorenstein (2000), a saúde é definida como o completo bem-estar físico, mental e social, não apenas como ausência de doenças. Durante os últimos anos, tem-se buscado a aferição de aspectos da saúde do doente mental no Brasil.

Atualmente, é necessário falar em qualidade de vida, que se refere ao bem-estar físico, mental e social do indivíduo e a percepção geral de seu estado de saúde, a satisfação em geral com sua vida e suas atividades e a evolução de sua doença. A necessidade de melhor entender as limitações e o sofrimento dos doentes mentais, em especial os pacientes psicóticos, é por si motivação para a avaliação da qualidade de vida dessas pessoas.

Quanto aos determinantes socioculturais e a doença mental, os estudos em saúde mental (Kaplan, 1997) mostram que os estilos de vida, a cognição, os mecanismos de defesa e até mesmo várias doenças mentais possuem relação com a classe social. Como o conceito de classe social pode ser formulado sobre diversos critérios: poder econômico prestigio social, identificação religiosa ou política, considero que pode ocorrer uma tendência a ampla generalização, levando assim a pensamentos estereotipados. Como exemplo, relaciono a atribuição de impulsividade e adiamento de gratificações a classes sociais mais pobres. Existem, porém, outras relações de análise que parecem ter um caráter mais científico, como autonomia e o nível de rendimento econômico.

As pesquisas das ciências do comportamento conseguem estabelecer que os estresses crônicos ocorrem com maior frequência na classe operária do que na classe média. As mesmas pesquisas associam também o fato de que os transtornos mentais, bem como sintomas de desconforto psicológico, ocorrem com maior freqüência nas classes econômicas mais baixas, entre pessoas sem vínculos significativos, entre aqueles que “não têm papéis sociais úteis e entre aqueles que sofrem perdas de vínculos importantes”.

A esquizofrenia é descrita nas mais variadas culturas e nos diferentes grupos socioeconômicos. Nos países mais industrializados, ela ocorre em um número elevado e desproporcional nas classes econômicas mais desfavorecidas ou ditas inferiores. Este fato pode estar relacionado à dificuldade que essas pessoas possuem para saírem desta classe, ou seja, de terem ascensão social. Pode, porém, ocorrer o inverso quando pessoas afetadas pela doença mental e toda a desestruturação que ela pode causar em seu meio familiar têm seu padrão e qualidade de vida diminuída.

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Gorenstein (2000) destaca que, sob o aspecto de Saúde Pública, é muito importante o estudo da qualidade de vida dos doentes mentais, tendo em vista que, à medida que existe melhora neste campo, menores serão as taxas de internações psiquiátricas, menor a sobrecarga para os familiares e/ou sistema de saúde. À medida que cresce a capacidade de controlar os sintomas dos pacientes, priorizando o seu retorno para a comunidade (inclusão social), cresce também o interesse na avaliação de seus sintomas residuais e, consequentemente, sua qualidade de vida.

Na saúde pública, em especial na comunidade de Ijuí (RS), ao longo dos anos de 2004 a 2012, sentimos a necessidade de diferentes intervenções terapêuticas no tratamento em saúde mental, sempre com a finalidade da inclusão social dos doentes mentais. Todas essas intervenções estão associadas ao processo de ensino e aprendizagem entre profissionais da saúde, pacientes e seus familiares.

Gonçalves (2001) expressa o que se espera da reforma psiquiátrica no Brasil, que não seja a transferência dos muros do hospital para os muros da casa do doente mental, mas sim:

O que se espera da reforma psiquiátrica não é simplesmente a transferência do doente mental para fora dos muros do hospital, "confinando-o" à vida em casa, aos cuidados de quem puder assisti-lo ou entregue à própria sorte. Espera-se, muito mais, o resgate ou o estabelecimento da cidadania do doente mental, o respeito a sua singularidade e subjetividade, tornando-o sujeito de seu próprio tratamento sem a idéia de cura como o único horizonte. Espera-se, assim, a autonomia e a reintegração do sujeito à família e à sociedade (Gonçalves, 2001; 9(2): p.51).

A promoção da inclusão social é fundamental porque tratamento, recuperação e reabilitação, embora diferentes entre si, não configuram fases estanques no tratamento da doença mental. Na prática, para o melhor êxito, em determinado momento essas três fases se entrelaçam e potencializam-se umas às outras. Por isso, deve ser incentivado esse processo o mais cedo possível, tão logo o indivíduo esteja apto para tal (Louzã, 1999).

Destaco aqui resumidamente o que será abordado nos capítulos que constituem esta dissertação para, assim, termos uma sequência dos principais temas abordados nesta pesquisa, que busca avaliar a competência do grupo terapêutico como opção de tratamento, de recuperação e de reabilitação (inclusão) social de pacientes psicóticos.

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No capítulo um, incluo os principais referenciais teóricos que permitem pensar esta prática de inclusão social dando-lhe um suporte científico com auxilio de diferentes áreas da ciência, tais como:

- a educação que nos fornece elementos para a educação e promoção em saúde mental;

- a psiquiatria e a psicanálise fornecem elementos para pensar o processo de individuação no contexto do social;

- a filosofia e a neurociência nos referenciais de Espinosa e Antonio Damásio, que enfocam o aspecto do corpo e das emoções indispensáveis para a tomada de consciência do individuo como tal.

Neste mesmo capítulo, apresento em enfoque do grupo terapêutico como espaço ideal para que seja trabalhada a individuação no social, destacando a importância da linguagem verbal e não verbal dos pacientes e seus familiares no processo de interação com os profissionais de saúde mental e a importância da medicação e das abordagens psicossociais, especialmente no contexto da terapia de grupo.

No capítulo dois destaco a problematização da pesquisa, sua justificativa, seus objetivos, com um detalhamento adequado desses itens. Abordo o processo metodológico, considerado fundamental por Bardin (2011) para uma adequada coleta de dados e sua posterior análise de conteúdo, a metodologia de Minayo (2001).

No capítulo três procuro fazer a apresentação e a discussão dos resultados nos três segmentos pesquisados, inicialmente individualizada e posteriormente em conjunto, visando dar sempre um enfoque integrativo entre os aspectos objetivo e subjetivo, ou seja, quantitativo e qualitativo. Na análise dos resultados, reservo um espaço para a representação gráfica dos pacientes no que se refere à simbolização de suas emoções vivenciadas através de quadros pintados coletivamente nos grupos.

No quarto capítulo busco, a partir dos resultados obtidos e de suas análises, discutir uma conclusão que, se não definitiva, permite uma resposta à problematização inicial desta pesquisa, isto é, o grupo terapêutico pode ser considerado como uma competente alternativa formal de ensino e aprendizado na psiquiatria? Esta conclusão ocorre num contexto interdisciplinar em saúde mental

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para uma real inclusão social dos pacientes psicóticos sem deixar de considerar que este processo é contínuo assim como é todo o processo de ensino e aprendizagem.

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1 APORTES TEÓRICOS

Inicio os aportes teóricos pela conceituação de educação e de promoção em saúde. É imprescindível apresentar alguns conceitos sobre os referenciais de individuação do paciente psicótico e associá-los às condições adequadas para ele participar efetivamente da experiência de inclusão social.

Esta reabilitação que pretendemos ocorre em um grupo terapêutico, e está baseada nos referenciais psiquiátricos buscando uma relação com uma prática de ensino e aprendizagem em saúde mental, num âmbito interdisciplinar.

Parto do pressuposto de que esses conceitos são pré-requisitos indispensáveis para entender a necessidade que o paciente psicótico (esquizofrênico) tem de apropriar-se de seu corpo, de suas emoções, de sua história e assim realizar sua individuação refazendo seu mundo interno por meio dessas etapas que, acredito, sejam indispensáveis para sua inclusão social. Abordo na sequência os conceitos de educação e saúde, processos de individuação, condições indispensáveis para uma adequada reabilitação social do doente mental.

Em nossa experiência de inclusão social, através de uma prática educativa interdisciplinar, o grupo terapêutico teve um papel fundamental permitindo que o planejamento das tarefas operativas fosse discutido pelos profissionais, pelos pacientes e pelos seus familiares, possibilitando a todos a consciência e responsabilidade de sua participação no individual e no social.

1.1 CONCEITUAÇÕES DE EDUCAÇÃO E PROMOÇÃO EM SAÚDE

Conforme Bondía existe a necessidade de reflexão entre a dicotomia teoria e prática quando pensamos a educação:

Costuma-se pensar a educação do ponto de vista da relação entre a ciência e a técnica ou, às vezes, do ponto de vista da relação entre teoria e prática. Se o par ciência/técnica remete a uma perspectiva positiva e retificadora, o par teoria/prática, remete, sobretudo a uma perspectiva política e crítica. De fato, somente nesta última perspectiva tem sentido a palavra “reflexão” e expressões como “reflexão crítica”, “reflexão sobre prática ou não prática”, “reflexão emancipadora” etc. Se na primeira alternativa as pessoas que trabalham em educação são concebidas como sujeitos técnicos que aplicam com maior ou menor eficácia as diversas tecnologias pedagógicas produzidas pelos cientistas, pelos técnicos e pelos especialistas, na segunda alternativa estas mesmas pessoas aparecem como sujeitos críticos que, armados de distintas estratégias reflexivas, se comprometem, com

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maior ou menor êxito, com práticas educativas concebidas na maioria das vezes sob uma perspectiva política (Bondía, 2002, p. 19).

Podemos entender por educação em saúde quaisquer combinações de experiências de aprendizagem delineadas com vistas a facilitar ações voluntárias conducentes à saúde, e por promoção em saúde, uma combinação de apoio educacional e ambiental que visa atingir ações e condições de vida conducentes à saúde. Candeias (1997) considera como apoio educacional e ambiental as ações multidisciplinares que poderão conduzir os pacientes a atingir condições de inclusão social, tais como suas vivências em um grupo terapêutico e no social em geral. Considero que, em termos de reabilitação social, efetivas vivências em grupo terapêutico e no social em geral devam ser refletidas para a formação de experiências para assim o indivíduo apropriar-se delas.

Utilizando os conceitos de Ruiz (2004) sobre educação em saúde, ressalto que os processos educativos envolvem uma comunicação bilateral ou seja, seguem uma comunicação que envolve o educador e o educando, um processo dialógico para o qual ambos contribuem, cada qual a sua maneira, para a construção do conhecimento. Tais processos ocorrem com base no contexto de vida das pessoas, dos seus cotidianos, das suas experiências e devem ter como propósito libertar as pessoas para que estas possam ser sujeitos sociais capazes de fazer opções construtivas para suas vidas e para a sociedade.

A educação em saúde é um trabalho dirigido para atuar sobre o conhecimento das pessoas para que elas desenvolvam juízo crítico e capacidade de intervenção sobre suas vidas e sobre o ambiente com o qual interagem. Assim, podem criar condições para se apropriarem de sua existência (autonomia). Nas palavras de Gonçalves, especificamente em relação à educação em saúde mental:

A ocorrência de uma contradição importante entre as propostas da reforma psiquiátrica e a devolução ou manutenção do doente mental na família pôde ser confirmada. O doente mental está sendo entregue à família sem o devido conhecimento das reais necessidades e condições da família, especialmente das cuidadoras em termos materiais, psicossociais, de saúde e qualidade de vida, aspectos estes profundamente interligados. (Gonçalves, 2001, março; 9(2): p.54).

Buscamos corrigir esta contradição apontada acima por Gonçalves (2001), oportunizando, por meio do grupo terapêutico, as informações necessárias aos

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pacientes e familiares para que tenham condições de lidar com uma doença crônica que tanto sofrimento lhes traz, especialmente quando desinformados de como lidar com ela.

1.2 INDIVIDUAÇÕES NOS REFERENCIAIS PSIQUIÁTRICOS E PSICANALÍTICOS

A psiquiatria dinâmica, para Gabbard (1998), constitui uma abordagem de diagnóstico e tratamento, um modo de pensar acerca do paciente e do entendimento clínico, que inclui o conflito inconsciente, os déficits e as distorções das estruturas intrapsíquicas e as relações objetais internas. Este entendimento está fundamentado no conhecimento e na teoria psicanalítica, a destacar: conflito, déficit e as três escolas psicanalíticas.

O conflito origina-se a partir de intensas forças inconscientes que buscam expressão e enfrentam resistências constantes de forças opostas que impedem sua emergência. O déficit refere-se àqueles pacientes que, por quaisquer razões em seu desenvolvimento, apresentam estruturas psíquicas enfraquecidas ou ausentes.

A psiquiatria dinâmica contemporânea baseia-se em “três grandes marcos teóricos psicanalíticos” (Gabbard, 1998, p.23-4, 39-57):

a) psicologia do ego, derivada da teoria psicanalítica clássica de Freud conceitua o mundo intrapsíquico em termos de conflito entre as instâncias. O superego, o ego, e o id batalham entre si, ao passo que a sexualidade e a agressividade demandam expressão e descarga. O conflito entre as instâncias produz ansiedade, gerando-se no ego uma defesa (sintoma neurótico);

b) teoria das relações objetais, derivada do trabalho de Melaine Klein e dos membros da Escola Britânica. O conflito inconsciente não é apenas uma batalha entre impulso e uma defesa; mas também um choque entre pares opostos de relações objetais internas (relações internalizadas:” mãe boa/mãe má”, inicialmente dissociadas e numa fase posterior integradas); c) psicologia do self derivada da tradição interpessoal sullivaniana,

reformulada e elaborada em termos contemporâneos por Heinz Kohut. Esta enfatiza como os relacionamentos externos ajudam a manter a autoestima e a coesão do self, considerando self a representação que o indivíduo tem de si próprio. Esta abordagem entende o paciente como

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tendo uma necessidade intensa de certas respostas das pessoas para conseguir um senso de bem-estar.

Segundo os conceitos de Zimmerman (2004), neurose é o conflito entre o ego e as diferentes instâncias do inconsciente; psicose implica um processo deteriorante das funções do ego a tal ponto que haja, em variáveis graus, algum prejuízo do contato com a realidade.

O indivíduo psicótico (esquizofrênico) é aquele que tem sua noção de ego corporal fragmentada, projetando esta fragmentação no meio externo (Escola da Psicologia do Ego) e passando a ver o mundo externo como fragmentado, distorcido e assim temido. Esta fragmentação tão presente em seu pensamento e em sua linguagem causa-lhe séria repercussão em seu processo de comunicação.

Por outro lado, os conceitos relacionados ao processo de separação-individuação estão muito presentes nos estudos de Mahlher (1993), que se refere ao nascimento psicológico como o processo de separação-individuação: o estabelecimento de desligamento (ser destacado) do mundo real e da relação com este mundo, particularmente no que diz respeito às experiências do próprio corpo do sujeito e ao principal representante do mundo como a criança o experimenta, o objeto primário de amor.

Para a psicanalista Mahler (1993), separação e individuação são concebidas como dois desenvolvimentos complementares: a separação consiste na saída da criança da fusão simbiótica com a mãe, e a individuação consiste nas aquisições que marcam o momento em que a criança assume suas próprias características individuais. Como qualquer processo intrapsíquico, este reverbera através do ciclo da vida, permanece sempre ativo. Portanto, por este enfoque desenvolvimentista o indivíduo psicótico tem uma fixação em uma fase de seu desenvolvimento.

Tomando como referência o processo de separação-individuação no paciente psicótico, ocorre uma fixação em uma dessas etapas, ocasionando-lhe um déficit em seu desenvolvimento psíquico. Fixação muito associada a um processo de frustração, geralmente em seus primeiros anos de vida, com o qual não teve estrutura psíquica adequada para lidar.

Podemos pensar a partir desses conceitos que o indivíduo psicótico tem uma representação interna distorcida dos objetos/mundo externo, que passa a ser visto por ele como assustador e persecutório, com forte repercussão na sua convivência social.

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Na visão da escola das relações objetais, que tem em Melaine Klein uma importante precursora, esta representação de mundo externo dividido em objetos bons e maus e sua representação no mundo interno cria uma fase de evolução, presente em todos, chamada de esquizo-paranoide, seguida de outra fase evolutiva chamada de depressiva, quando esses objetos bons e maus são integrados com suas representações no mundo interno. No paciente psicótico ocorre uma fixação na fase esquizo-paranoide com a consequente divisão e visão distorcida de realidade. Portanto, os estudos de Melaine Klein trouxeram uma importante contribuição para o entendimento do paciente psicótico (Gabbard, 1998, p. 39-57).

Cabe, ainda, ressaltar nessa escola a importante contribuição de W. Bion ao estudo da psicose, especialmente pelo seu interesse pelos fenômenos do conhecimento, pensamento, linguagem, comunicação, vínculos e aos estudos sobre a dinâmica de grupo (Zimerman, 2004, p.121).

Com relação à terceira escola psicanalítica, chamada de escola da psicologia do self, esta prioriza as relações interpessoais que o indivíduo tem no mundo externo e sua representação em seu mundo interno. Gabbard (1998) destaca o papel do psicanalista Harry StackSullivan, que dedicou sua vida a estudar os esquizofrênicos e acreditava que a etiologia do transtorno resultava de dificuldades interpessoais precoces (particularmente no relacionamento pai/mãe-filho) e definiu o tratamento como um processo interpessoal em longo prazo que tenta abordar aqueles problemas precoces.

A maternagem defeituosa, de acordo com Sullivan (1962) (apud Gabbard, 1998, p.135), produz um self carregado de ansiedade na criança e evita que a mesma tenha suas necessidades satisfeitas.

Segundo Gabbard (1998), esquizofrenia refere-se fundamentalmente a pessoas isoladas que não conseguem superar seu medo e descrença dos outros devido a experiências precoces na vida, especialmente de frustrações.

Para Travis (2004) a esquizofrenia é uma doença crônica, complexa e multifatorial:

A esquizofrenia é uma condição clínica heterogênea: o início ocorre nos primeiros anos da idade adulta, e a doença segue um curso crônico com recaídas e remissões. É uma patologia cujo estudo é inerentemente difícil, uma vez que a definição da síndrome esquizofrênica varia com a época e o local. A dificuldade em reconhecimento e avaliação afeta todas as esferas da pesquisa da esquizofrenia e, por conseguinte, a evolução. Já os estudos

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de história natural da doença são influenciados por fatores tais como curso e evolução variados, bem como as definições de remissão e de recuperação. De modo semelhante, os estudos de tratamento e intervenção são afetados pela escolha de grupos de pacientes, a presença ou não e o tipo de grupos controles, e a generalização dos resultados para uma dada população de pacientes (Travis, 2004, p.ix).

Destaco a importância da associação desses diferentes referenciais psicanalíticos, quer sejam de déficit ou conflito, quer sejam das diferentes escolas psicanalíticas, para entender de uma forma integrada que o paciente psicótico sofre uma fixação em determinada etapa de seu desenvolvimento, especialmente pela limitação em lidar com frustração, causando-lhe uma visão fragmentada de mundo externo/interno, bem como uma visão parcial de objetos/mundo externo, assim como de relacionamentos interpessoais tumultuados e suas representações distorcidas em seu mundo interno, resultando sempre numa visão assustadora de mundo externo.

Considero que este entendimento baseado nos aportes teóricos de Gabbard (1998) referenciados acima possa dar sustentação teórica para que o trabalho terapêutico em grupo ofereça ao paciente psicótico um mundo acolhedor de iguais, permitindo assim a reconstrução de seu mundo interno num processo de individuação no social. Para a reconstrução de seu mundo interno (individuação) considero indispensável apropriar-se: de seu corpo, de suas emoções, de seus sentimentos e de sua história; o que podemos compreender com os referencias de Espinosa e de Antonio Damásio.

1.3 INDIVIDUAÇÃO: CORPO E EMOÇÕES NOS REFERENCIAIS DE ANTÔNIO DAMÁSIO E ESPINOSA

Em seu estudo sobre as inter-relações de corpo emoções ou afetividade humana, Damásio (2004) retoma as ideias pioneiras de Espinosa¹, que, em pleno século XVII, que já considerava indispensável a “noção corporal” para o ser humano vivenciar seus sentimentos e poder controlá-los adequadamente. Está ideia de noção corporal pode ser considerada ao equivalente psicanalítico de ego corporal dentro da escola da psicologia do ego. Chauí (1995) faz uma importante ligação entre Espinosa e a obra de Freud, especialmente em relação aos sentimentos e como lidar com eles.

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Damásio (2004) procurou localizar Espinosa em seu contexto do século XVII, incluindo suas relações com seu tempo e com seu contexto histórico religioso. Espinosa, ao escrever seus textos filosóficos, enfrentou intensas dificuldades para ser entendido em sua época.

Conforme Chauí observou em Espinosa, o radicalismo da razão livre e a alegria de pensar sem submissão:

Todavia, se nos acercarmos da filosofia espinosiana sem idéias pré-concebidas, descobriremos por que, afinal, Espinosa foi excluído da comunidade judaica, da sociedade cristã e da “república dos sábios” coerentes. (...) É o radicalismo da razão livre e da alegria de pensar sem submissão a qualquer poder constituído-seja este religioso, político, moral ou teórico-e a decisão de afastar tudo quanto nos cause medo e tristeza que torna Espinosa perigoso e odiado, para uns, mas também tão amado, para outros (Chaui, 1995, p. 12).

No enfoque de Gleizer (2005), as grandes linhas da teoria da afetividade humana desenvolvida por Baruch Espinosa (1632-1677) em sua principal obra: “A

Ética demonstrada à maneira dos geômetras”, mostram a ruptura com o preconceito

voluntarista, com a crença de que o sujeito é senhor absoluto de suas determinações. Isto acarretará na Ética a substituição da postura moralista pela do cientista natural e tornará possível a elaboração de uma autêntica ciência da afetividade humana.

Esse conhecimento, no entanto, não é apenas uma atividade intelectual digna e prazerosa que viria satisfazer uma curiosidade científica desinteressada e existencialmente neutra. Segundo o projeto de liberação proposto na Ética, só o conhecimento verdadeiro das causas dos mecanismos afetivos, aos quais estamos submetidos, permite elaborar uma técnica realista para moderar as paixões e reduzir os efeitos naturalmente obsessivos, ambivalentes e alienantes que explicam a experiência de desilusão de que partiu Espinosa.

Nas palavras de Osório (2013), Espinosa localiza-se em um contexto histórico em que predominava a visão de ciência como uma relação simples entre causa e efeito. Espinosa, baseado em sua experiência de afetividade, pode associar outras causas que não só a mente, mas também o corpo para perceber essas emoções; pode, assim, dar os primeiros passos em direção a uma nova ciência, que veio a consolidar-se em meados do séc. xx. É possível, assim parafrasear Descartes a partir de Espinosa: “Penso, sinto, logo existo.”

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Para Osório, a forma de estudar os fenômenos de causa e efeito está associada ao pensamento Cartesiano, muito presente até meados do séc. XX:

Em meados do século XX, emergiu, no âmbito do saber humano, uma nova maneira de pesquisar e compreender os fenômenos que a ciência estudava. Para se aquilatar o significado dessa verdadeira revolução epistemológica basta recordar que, desde a mais remota antiguidade até então, a Ciência procurava entender os fenômenos naturais que investigava segundo um padrão que denominamos causa efeito, ou seja, partia-se de um fato ou evento natural (efeito) e procurava-se o que o determinara (causa). Esse procedimento era universal e abrangia não só a natureza física, mas também o comportamento dos seres vivos. É o que se convencionou chamar pensamento cartesiano, por ter Descartes como seu ícone e sua máxima “penso, logo existo” como divisa (Osório, 2013, p. 9).

Esta compreensão por Damásio (2004) cria neste uma profunda empatia por Espinosa, pois seus trabalhos, utilizando esses referenciais de corpo e emoções ou afetividade, mostram o pioneirismo de Espinosa ao passar do dualismo cartesiano para um monismo, isto é, corpo e mente formados por uma única substância, no sentido de ser que existente em si mesmo, e por si mesmo, sem depender de nenhum outro.

Observa Damásio com auxílio da neurociência e de sua atual tecnologia de imagens, o quanto o corpo tem representação no cérebro através de mapas cerebrais que são traduzidos por imagens à nossa consciência. Essas imagens formadas nos mapas cerebrais partem da “noção corporal” captada pelo senso de percepção de nosso corpo no momento em que a emoção ou afeto é desencadeado (Damásio, 2004, p.206-9).

Para o paciente psicótico (esquizofrênico) aprender a conhecer suas emoções e controlá-las adequadamente, conforme abordagem acima, mão implicar uma verdadeira experiência de inclusão social, isto é, tornar-se um indivíduo social. Fazendo uso dessas ideias sobre corpo e emoções ou afetividade humana apresentada anteriormente, buscamos, ao longo de uma prática de ensino aprendizagem em um grupo terapêutico, a possibilidade de pacientes psicóticos conhecerem suas emoções, controlá-las “adequadamente”, fazendo assim sua individuação e, ao mesmo tempo, estabelecendo relações sociais mais amplas.

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1.4 INDIVIDUAÇÃO EM UM GRUPO TERAPÊUTICO

Considero importante a associação desses diferentes referenciais psicanalíticos e psiquiátricos, quer sejam de déficit ou de conflito, quer sejam das diferentes escolas psicanalíticas, para entender de uma forma integrada que o paciente psicótico sofre uma fixação em determinada etapa de seu desenvolvimento, especialmente pela limitação em lidar com frustração, causando-lhe uma visão fragmentada de mundo externo/interno, bem com uma visão parcial de objetos/mundo externo, assim como de relacionamentos interpessoais tumultuados e suas representações distorcidas em seu mundo interno, resultando sempre uma visão assustadora de mundo externo.

Considero que este entendimento baseado nos referenciais teóricos de Gabbard (1998) pode dar sustentação teórica para que o trabalho terapêutico em grupo ofereça ao paciente psicótico um mundo acolhedor, de iguais, permitindo assim a reconstrução de seu mundo interno num processo de individuação no social. Acredito que a psicoterapia de grupo proporciona ao paciente uma oportunidade de ele aprender como ele mesmo funciona em grupo: os papéis que desempenha, as expectativas e fantasias inconscientes que tem sobre os grupos e os obstáculos que encontra no convívio com os outros no trabalho e em casa. As dimensões únicas da experiência grupal podem ser apenas parcialmente exploradas na psicoterapia individual.

Entendo importante destacar o pioneirismo dos trabalhos de Bion (apud Zimerman 2001, p.107) com grupos, pois os mesmos possuem relevância em sua produção científica. Os grupos propiciaram-lhe conhecer os mecanismos psicóticos, e isto lhe permitiu um aprofundamento nos estudos dos esquizofrênicos e em seus problemas ligados ao pensamento, à linguagem e ao conhecimento.

Durante a II Grande Guerra mundial, a psiquiatria e a psicanálise passaram a ter um destacado papel. Bion, atuando na atividade militar pela Inglaterra, utilizou o recurso grupal para os programas de reabilitação e de readaptação dos militares, tendo em vista que os distúrbios emocionais se constituíam importante causa de inativação dos militares. Assim, em um hospital militar, realizou reuniões coletivas, nas quais se discutiam os problemas comuns e se estabeleciam programas de exercícios e atividades. Esse local tornou-se o berço da “comunidade terapêutica”,

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cujo modelo, após a guerra, ganhou importante destaque principalmente nos Estados Unidos.

No começo de 1948, Bion organizou os grupos unicamente com terapêuticos, a partir dos quais fez importantes observações e contribuições que permanecem inspiradoras e válidas na atualidade.

Por razões didáticas, optei por separar esses dois itens: individuação e inclusão social em grupo, embora nos referenciais teóricos eles não ocorram isolados, mas simultaneamente, pois a individuação só ocorre no social. Optei por assim proceder para dar um maior destaque ao funcionamento do grupo e aos referenciais de seu funcionamento. Destaco que a individuação só ocorre no social com auxílio da linguagem.

1.5 INDIVIDUAÇÃO NO PARADIGMA DA LINGUAGEM

De acordo com Marques (1993, pg.84) para Jürgen Habermas ocorre na neomodernidade a substituição do paradigma da relação sujeito-objeto pelo paradigma da relação comunicativa baseada na relação entre sujeitos, ou seja, mudança da filosofia da consciência para a filosofia da linguagem. Além disso, Habermas baseia-se numa razão argumentativa com vistas ao entendimento e à estruturação de três universos: o objetivo das coisas, o subjetivo das vivências, e o social das normas.

Habermas associa a linguagem a três funções e às respectivas aplicações filosóficas a elas associadas, a saber: a função da reprodução cultural na qual Gadmer desenvolve sua hermenêutica; a função social na qual Marques destaca a teoria do agir comunicativo; a função de socialização a partir da qual S.H.Mead projetou sua psicologia social. Ocorre uma forte articulação através da linguagem entre o objetivo, o social e o individual ou subjetivo relacionado através do processo de socialização e individuação (Marques, 1993, p.76).

Marques (1993, pg.84), em seu “diálogo” com Habermas, destaca como este entende o próprio processo de socialização como também de individuação. Afirma ser necessário perceber a língua “como meio que inclui simultaneamente a todos os participantes em interações, como membros numa comunidade de comunicações, e os submete a uma severa individualização”. Neste diálogo, acentua a sua teoria da ação comunicativa sob o aspecto funcional do entendimento. A ação comunicativa

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serve à tradição e à renovação do saber cultural; sob o aspecto da coordenação, serve à integração social e à criação da solidariedade; e sob o aspecto da socialização, finalmente, serve à formação das identidades pessoais (HABERMAS 1988 II: 195-6 apud Marques, 1993, pg.87)

A arte como linguagem ocupa um espaço importante para permitir aos pacientes psicóticos expressarem seus sentimentos, usando assim uma linguagem indispensável para sua constituição como indivíduos no social, conforme já havíamos destacado em Marques.

Conforme Monteiro, para Jung a arte é a linguagem da alma; permite escutar a alma de outrem:

A arte é a linguagem da alma. Jung revela um universo repleto de mitos, símbolos, sonhos, religiosidade, arte e alquimia. Compreende o homem na sua totalidade e traz uma percepção de que a criação está dentro de nós e que, se quisermos conhecer o mundo, devemos mergulhar mais em nós mesmos. Se o processo analítico visa a “escutar” a alma de outrem, a arte será um veículo que torna essa “escuta” possível. Se visarmos compreender o social, um grupo de pessoas deveremos estar abertos às suas músicas, aos poemas, as pinturas, as danças, e as outras manifestações da alma. Tudo que se faz com arte se faz com alma. Por meio da expressão artística, realiza-se uma comunicação que está além das fronteiras, que não precisa estar baseada restritamente no código verbal (Monteiro, 2009, p.21).

No grupo terapêutico em questão, temos a pretensão de relacionar a arte como uma maneira de os pacientes expressarem suas emoções, algo que se constitui como indispensável para sua individuação no social (grupo terapêutico). O verbal não transmite todos os conteúdos internos. Muito antes de o homem escrever, ele desenhava. A arte sempre foi uma função estruturante da consciência do individuo.

1.6 INCLUSÃO SOCIAL EM SAÚDE MENTAL: MEDICAÇÃO E ABORDAGENS PSICOSSOCIAIS

Barros apresenta a necessidade de um novo olhar por parte dos profissionais que trabalham em saúde mental para a reabilitação social dos doentes mentais:

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A necessidade de se construir um novo olhar para o cuidado baseado no diálogo e na criatividade possibilita a transformação social do papel dos profissionais no exercício da sua prática. [...] cuidar é mais que um ato: é uma atitude. Além disso, arcabouço conceitual da reabilitação psicossocial é um instrumental que pode possibilitar a construção desse novo olhar. Nesta perspectiva, cuidar é considerar a importância da construção de projetos de vida, significativos para cada usuário, como eixo central da ação terapêutica. As transformações necessárias na prática em saúde mental na enfermagem psiquiátrica estão avançando, pois os conhecimentos produzidos nesta área incorporam estratégias de acolhida e continência que consideram, em todos os momentos, o exercício da cidadania ativa dos doentes mentais (Barros, 2007; 41(Esp): p.815).

Apesar de estar bem estabelecido que o tratamento medicamentoso, com a utilização de antipsicóticos, tem seu papel fundamental, as abordagens psicossociais, com enfoque multidisciplinar, são indispensáveis para que ocorra uma efetiva inclusão social do paciente psicótico. Essas abordagens podem estar incluídas em um conceito mais amplo, considerado como psicoeducação.

No que se refere à medicação antipsicótica, para que a participação do paciente psicótico seja efetiva no grupo terapêutico, consideramos indispensável que ele esteja estável, isto é, que seus sintomas psicóticos estejam controlados. Esta estabilidade, para ocorrer, requer o uso regular de medicação antipsicótica.

Até a década de 50 não havia medicamentos específicos para o tratamento da psicose. Muitos pacientes precisavam ser internados por tempo prolongado ou até por tempo indefinido. Com o surgimento da Clorpromazina, primeiro medicamento capaz de atuar e diminuir as alucinações e os delírios, principais sintomas psicóticos, começa o efetivo tratamento medicamentoso, que possibilita que sejam dados os primeiros passos para o tratamento da psicose fora do modelo tão estigmatizado até essa época.

A medicação, por meio dos processos biológicos, isto é, através da intervenção nos mediadores químicos cerebrais, consegue corrigir esse desequilíbrio químico. No caso do paciente psicótico (esquizofrênico) caracterizado pelo excesso de dopamina, permite corrigir seu delírio e sua alucinação de fragmentação corporal tão presentes em suas crises psicóticas.

Atualmente existem os chamados antipsicóticos de última geração, denominados atípicos, pois causam menos efeitos colaterais, permitindo melhor adesão ao tratamento e o controle adequado dos sintomas psicóticos, que tanto sofrimento causa ao paciente e aos seus familiares. Dentre esses medicamentos

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ressalto a medicação Clozapina, pois esta, além de causar menos efeitos colaterais, contribui para permitir ao paciente melhor condição de inclusão social.

Afirma Gabbard (1998) que a não aceitação da medicação prescrita é um problema contínuo no tratamento de muitos pacientes esquizofrênicos (psicóticos crônicos). Terapeutas envolvidos no tratamento de pacientes que sofrem de esquizofrenia (psicose crônica) devem considerar a aceitação da medicação uma preocupação ao longo do tratamento. Cada paciente deve ser educado em relação à probabilidade de recaída se a medicação for interrompida, lembrando que sempre em uma recaída, sempre ocorre um empobrecimento de seu mundo interno.

A prescrição de medicação antipsicótica deve ocorrer no contexto de uma aliança terapêutica entre terapeutas das diferentes áreas e o paciente, cuidadosamente construída ao longo do tratamento. Essas abordagens podem estar incluídas em um conceito mais amplo considerado como psicoeducação.

A psicoeducação, para Noto (2012), pode ser definida como um conjunto de informações sistemáticas, estruturadas e didáticas sobre um transtorno mental e seu tratamento, além de priorizar os aspectos emocionais no sentido de capacitar os participantes: pacientes, familiares e profissionais da saúde mental a enfrentar as situações práticas criadas pela doença. Criam-se assim as condições e a necessidade para um diálogo efetivo entre os diferentes saberes em saúde mental, cujo foco principal passa a ser a vivência social do paciente e seus familiares.

Essa patologia atinge aproximadamente 1% da população mundial.

Enquanto não houver alternativas sociais e públicas suficientes para suprir tal demanda de tratamento, que ocasiona custos financeiros e emocionais elevadíssimos, cada indivíduo e cada família necessitam realizar sua própria busca de um ambiente de estudo ou de trabalho que permitam a possibilidade de sua plena inclusão social. As associações de familiares de doentes mentais devem atuar buscando suprir as lacunas institucionais. Esta capacidade de participação dos pacientes e dos familiares deve ser considerada, seja por iniciativa própria ou estimulada ativamente pela estrutura da saúde pública na área da saúde mental em todas as etapas de sua desejada reabilitação social.

Em seu trabalho sobre Esquizofrenia, Louzã (1999): “Dois Enfoques Complementares” destaca a atuação da ASSOCIAÇÃO NACIONAL PRÓ-SAÚDE MENTAL, a qual desenvolve um projeto denominado “Projeto Fênix”, em São Paulo. Este projeto é mantido por uma entidade civil, sem fins lucrativos, dirigida por

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doentes mentais e seus familiares, com o apoio da comunidade e de destacados profissionais de diversas áreas de atuação. O trabalho desta associação revela o quanto os pacientes e os familiares podem desempenhar um papel ativo em sua reabilitação social, cabendo à sociedade ter a sensibilidade para percebê-lo.

Louzão: O “Projeto Fênix” por sua vez segue os seguintes princípios:

a) Os doentes mentais e seus familiares têm o direito à qualidade de vida, à cidadania e à dignidade moral, espiritual, social e econômica, conforme valores humanitários universais enunciados em declarações internacionais de direitos, constituições nacionais e estaduais e demais leis e dispositivos legais, priorizando para tal fim a defesa do direito ao tratamento intra e extra-hospitalar, a recuperação de saúde e reintegração social dos doentes mentais.

b) O Projeto Fênix assume a responsabilidade inalienável de defesa de tais princípios, propondo-se a articular, em conjunto com representantes do Estado e entidades da sociedade civil, o desenvolvimento de atividades direcionadas à conquista e ao usufruto pelos doentes mentais e seus familiares dos direitos acima enunciados, comprometendo-se a defendê-los em todos os foros pertinentes até os limites e recursos (Louzã, 1999, p.59).

O referido autor, em outro momento comenta que há poucas opções institucionais adequadas à plena inclusão social de pacientes esquizofrênicos e que o preconceito social é grande. Poucos são os ambientes realmente adequados, embora o doente mental em boa recuperação tenha pleno potencial adaptativo e produtivo em situações acolhedoras. Entre estes ambientes adequados a inclusão social discute-se, a seguir, a competência do grupo terapêutico na referida tarefa.

1.7 INCLUSÃO SOCIAL EM UM GRUPO TERAPÊUTICO

Na opinião de Zimermann & Osório (1997), existem dois tipos de grupo: os grupos operativos, que exercem a função básica de ensino e aprendizagem, institucionais, comunitários e os grupos psicoterapêuticos. Os grupos psicoterapêuticos, que podemos considerar um subtipo do operativo, destinam-se a produzir insight no indivíduo ou no grupo. O nosso estudo foi realizado comum grupo operativo, cuja tarefa de ensino e aprendizagem esteve relacionada ao processo de individuação e inclusão social dos pacientes psicóticos, ou seja, a constituição do indivíduo no social.

O indivíduo psicótico não perde sua capacidade de aprender a vivenciar suas emoções e assim aprender a viver em grupo, no social. Segundo Riviére

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(2009), o grupo é um local ideal para o paciente reaprender a vivenciar suas emoções, mas isto só pode ocorrer após ele ter uma imagem corporal não fragmentada, isto é, uma realidade não distorcida, mas recuperada e reorganizada ao longo do tratamento. A medicação e o atendimento individual nas diferentes áreas têm importante papel, além do atendimento em grupo, na recuperação de ego corporal. Após refazer a sua imagem corporal (ego corporal), o paciente psicótico poderá vivenciar suas emoções em grupo, e assim, reconstruir um código de convivência social, indispensável na sua reabilitação social.

Para Yalom (2006), o grupo permite uma importante experiência emocional corretiva, isto é, a mudança. No nível comportamental e no nível mais profundo de imagens internalizadas de relacionamentos passados, não ocorre principalmente por meio de interpretação e do insight, mas por uma significativa experiência relacional no aqui-e-agora, que rejeita as crenças patogênicas do paciente. A vivência das emoções no grupo é variada, desde as ansiedades com as mudanças (resistências) e o seu confronto com a motivação para tal numa dialética educativa: resistências versos mudanças.

Igualmente, os aspectos operativos (tarefas específicas) em um grupo terapêutico de aprendizagem nos mostram a importância do aprendizado das mudanças (Riviére, 2009). Esta técnica baseia-se no E.C.R.O. (Esquema Conceitual Referencial e Operativo), técnica desenvolvida pelo psicanalista argentino Enrique Pichon-Riviére. Essa técnica é baseada no estabelecimento de tarefas a serem trabalhadas terapeuticamente em um ambiente grupal. Ressalto que esta conceituação teórica (aspectos operativos) poderá referendar a prática buscada pela psiquiatria de ensino e aprendizagem que vem ocorrendo de forma autônoma, sem estar controlada e mecanizada em uma teoria única. Ela poderá reforçar a universalidade de determinados temas nesse processo de inclusão social de pacientes psicóticos, tais como individuação no social.

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2 CAMINHO METODOLÓGICO

2.1 PROBLEMATIZAÇÃO DA PESQUISA

Alternativas terapêuticas em psiquiatria associadas a um processo de ensino e aprendizagem, buscando a inclusão social de pacientes psicóticos em seu retorno à comunidade. A terapia de grupo consegue ser competente para realizar a inclusão social dos pacientes psicóticos em sua comunidade?

2.2 JUSTIFICATIVA

A avaliação-validação ou não da competência do grupo terapêutico neste processo de inclusão social e as diferentes intervenções nos permitirão ver o quanto esta experiência pode constituir-se num processo pedagógico de psicoeducação neste tema tão atual e que tende a constituir-se cada vez mais em uma prioridade em saúde mental.

O meu estudo se propõe a avaliar as diferentes intervenções em diferentes momentos da reabilitação social, bem como a integração multidisciplinar ao longo desse processo.

A pesquisa pretende ouvir os três segmentos (pacientes, familiares e profissionais de saúde mental) envolvidos e fazer uma reflexão sobre o processo de ensino e aprendizagem ao longo dessa trajetória além da própria adequação ou não dos referenciais teóricos. Pode oportunizar a todos os envolvidos uma oportunidade de crescimento, e também de dividir com outros campos das ciências a nossa vivência.

O conflito sócio familiar gerado pelo despreparo deste meio para acolher o paciente psicótico crônico grave em seu retorno à comunidade após a desintitucionalização, constitui-se numa forte motivação para a realização deste trabalho.

2.3 OBJETIVO GERAL

Compreender e avaliar a experiência psiquiátrica em inclusão social dos pacientes psicóticos em tratamento no CAPS II de Ijuí/RS, operacionalizada por

Referências

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