Notas para o acompanhamento das aulas de
Equa¸c˜
oes Diferenciais Ordin´
arias (EDO’s)
Sum´
ario
1 Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias de 1a
. Ordem 3
1.1 Nomenclatura Relativa `as Equa¸c˜oes Diferenciais . . . 3 1.2 Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias de 1a. Ordem . . . . 5
1.3 T´ecnica da Separa¸c˜ao de Vari´aveis para Resolu¸c˜ao de Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias . . . 7 1.4 T´ecnica do Fator Integrante para Resolu¸c˜ao de Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias Lineares de 1a. Ordem 10
1.5 Problemas Envolvendo aLei de Varia¸c˜ao Exponencial . . . 12 1.6 Problemas Envolvendo aLei de Decaimento Radioativo . . . 13
1.6.1 Curiosidade Hist´orica: Um Modelo Matem´atico para Detectar Falsifica¸c˜oes em Obras de Arte de Van Meegeren . . . 13 1.7 Problemas Envolvendo aLei de Resfriamento de Newton. . . 20 1.8 Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias Exatas . . . 21 1.9 Extens˜ao da T´ecnica dos Fatores Integrantes para Resolu¸c˜ao de Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias . . . 23 1.10 Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias de Bernoulli . . . 26
2 Equa¸c˜oes Diferenciais Ordin´arias de 2a
Cap´ıtulo 1
Equa¸
c˜
oes Diferenciais Ordin´
arias de
1
a
. Ordem
Neste cap´ıtulo abordaremos algumas classes das chamadas equa¸c˜oes diferenciais ordin´arias (EDO) de 1a
. ordem e t´ecnicas de resolu¸c˜ao que fazem uso direto das integrais que estudamos previamente.
1.1
Nomenclatura Relativa `
as Equa¸
c˜
oes Diferenciais
Nesta se¸c˜ao apresentamos uma pequena introdu¸c˜ao e a nomenclatura relativa `as chamadas equa¸c˜oes diferenciais. Trata-se de uma introdu¸c˜ao de cunho geral, para que possamos dimensionar o universo dessas equa¸c˜oes. Mais adiante vamos nos restringir `as equa¸c˜oes de 1a. ordem.
Comecemos com a defini¸c˜ao de equa¸c˜ao diferencial.
Uma Equa¸c˜ao Diferencial ´e uma equa¸c˜ao envolvendo uma fun¸c˜ao, suas derivadas e suas vari´aveis independentes. Pelo menos uma das derivadas deve estar presente na equa¸c˜ao.
Exemplos.
Exemplo (1)y′=3y2sen(t+y), sendoy=y(t).
Observa¸c˜ao: y=y(t)significa quey´e uma fun¸c˜ao det, ou seja,ydepende de t. Assim,t´e vari´avel independente e y´e vari´avel dependente.
Exemplo (2)y′′′=e−y+t+y′′, sendoy=y(t).
Exemplo (3)y′′=ax+bx+c, sendoa,becconstantes reais e y=y(x).
Exemplo (4)y′′=a, sendoaconstante real ey=y(x).
Exemplo (5) 1
γ(γT′)′=0, sendoT =T(γ).
Exemplo (6)yuu+yv+ey=uv, sendoy=y(u, v).
Observa¸c˜ao: Note que aquiydepende de duas vari´aveis, que s˜aouev. A nota¸c˜aoyv significa que estamos derivando
a fun¸c˜aoyem rela¸c˜ao `a vari´avelv, enquanto queyuu significa que estamos derivandoyem rela¸c˜ao `a vari´aveluduas
vezes. As fun¸c˜oes de v´arias vari´aveis, suas derivadas (chamadas de derivadas parciais) e suas integrais (chamadas de integrais m´ultiplas) s˜ao estudadas `a parte.
Observa¸c˜oes.
(i)E comum utilizar a nota¸c˜´ ao fracional para derivadas em equa¸c˜oes diferenciais, ou seja,y′= dy
dx (nota¸c˜ao de Leibniz),
sendoy=y(x). Analogamente,y′′= d2y
dx2,yv= ∂y∂v,yuu= ∂
2y
∂u2, etc (essas duas ´ultimas s˜ao nota¸c˜oes de Leibniz para
derivadas parciais). Por exemplo, a equa¸c˜ao diferencial (1) ficaria dy
dt = 3y2sen(t+y), enquanto que a (6) ficaria
∂2y ∂u2 +
∂y
(ii)Resolver (ou integrar) uma equa¸c˜ao diferencial significa encontrar uma fun¸c˜ao que a satisfa¸ca. A fun¸c˜ao solu¸c˜ao pode n˜ao ser ´unica. Por exemplo, y = y(x) = ksen(x), sendo k constante real, ´e solu¸c˜ao da equa¸c˜ao diferencial
y′′+y=0. Observemos que para cadak, uma solu¸c˜ao!
(iii)Lembremos que “encontrar” uma solu¸c˜ao para uma equa¸c˜ao diferencial pode ser de forma impl´ıcita, por meio de uma equa¸c˜ao envolvendo a fun¸c˜ao e suas vari´aveis. Por exemplo, uma solu¸c˜ao y= y(x) para y′ = yeyy−2x ´e dada
implicitamente porxy2− y2−2y+2
ey=0. Observemos que n˜ao d´a para isolar a fun¸c˜aoyna nesta equa¸c˜ao.
(iv)Uma equa¸c˜ao diferencial cuja fun¸c˜ao depende apenas de uma vari´avel ´e chamada deEqua¸c˜ao Diferencial Ordin´aria
(EDO). Dos exemplos acima, apenas(6)n˜ao ´e EDO.
(v) Uma equa¸c˜ao diferencial cuja fun¸c˜ao depende de mais do que uma vari´avel ´e chamada de Equa¸c˜ao Diferencial Parcial (EDP). O exemplo(6)acima ´e uma EDP.
A ordem de uma equa¸c˜ao diferencial ´e a maior ordem de derivada que aparece na equa¸c˜ao.
Nos exemplos acima, (1)possui ordem1;(3),(4),(5)e(6)s˜ao de ordem 2; e(2)possui ordem3.
Uma EDO de ordem n pode ser escrita genericamente comoE x, y, y′, . . . , y(n)
=0, sendo y=y(x). No exemplo
(1)acima,E(t, y, y′) =y′−3y2sen(t+y).
H´a uma classe de EDO’s que s˜ao de interesse especial:
Uma EDO de ordemn´elinear quando for da forma
Pn(x)y(n)+Pn−1(x)y(n−1)+· · ·+P1(x)y′+P0(x)y=Q(x)
sendoP0=P0(x), . . . , Pn=Pn(x)fun¸c˜oes dadas chamadas decoeficientes da EDO linear ePn6=0.
Quando Q=0temos uma EDO linear homogˆenea.
Exemplos.
(1) y′′+ty = 0, com y = y(t), ´e EDO de 2a. ordem linear homogˆenea, sendoP
2(t) =1, P1(t) = 0, P0(t) =t e
Q(t) =0.
(2)y′ =5x+2, comy=y(x), ´e EDO de 1a. ordem linear n˜ao homogˆenea, sendoP
1(x) =1,P0(x) =0eQ(x) =5x+2.
(3)eyy′′+2y′ =2, comy=y(x), ´e EDO de 2a. ordem n˜ao linear, poiseyn˜ao ´e fun¸c˜ao conhecida dex.
(4)4y′′′+sen(x)y′′+5xy=0, comy=y(x), ´e EDO de 3a. ordem linear homogˆenea, sendoP
3(x) =4,P2(x) =sen(x),
P1(x) =0, P0(x) =5xeQ(x) =0.
(5)ty′′′+t2(y′)6
−sen t√y
=t2−t+1, comy=y(t), ´e EDO de 3a. ordem n˜ao linear, poisy′ possui potˆencia6
e−sen t√y
n˜ao ´e da formaPk(x)y(k) comk inteiro n˜ao negativo.
(6) (y′)0=x, comy=y(x), n˜ao ´e equa¸c˜ao diferencial. ´E equa¸c˜ao alg´ebrica(x=1).
Observa¸c˜ao: se fosse(y′)(0)
=xter´ıamosy′=xe, portanto, EDO de 1a. ordem linear.
A solu¸c˜ao de uma EDO pode n˜ao ser ´unica. Elas s˜ao classificadas do seguinte modo: -Solu¸c˜ao geral: ´e um conjunto de solu¸c˜oes padr˜ao para a EDO considerada.
- Solu¸c˜ao particular: ´e uma ´unica solu¸c˜ao, obtida da solu¸c˜ao geral, satisfazendo algumas condi¸c˜oes pr´e-fixadas, cha-madas decondi¸c˜oes iniciais.
1.2
Equa¸
c˜
oes Diferenciais Ordin´
arias de 1
a. Ordem
Uma Equa¸c˜ao Diferencial Ordin´aria (EDO) de 1a. Ordem ´e uma equa¸c˜aoE(x, y, y′) =0 envolvendo:
- uma fun¸c˜ao deriv´avely=y(x)de uma vari´avel real; - a derivada primeiray′=y′(x)da fun¸c˜aoy;
- a vari´avel independentexda fun¸c˜aoy;
sendo que a derivada y′ deve estar presente na equa¸c˜ao.
Uma EDO de 1a. ordem E(x, y, y′) = 0, sendo y = y(x), sujeita `a condi¸c˜ao y(x
0) = y0, com x0 e y0 dados, ´e
chamada deProblema de Valor Inicial (PVI).A condi¸c˜aoy(x0) =y0tamb´em ´e chamada decondi¸c˜ao inicial.
Exemplos.
(1)2√xyy′ =1, sendoy=y(x). Neste caso,E(x, y, y′) =2√xyy′−1.
(2) yx′ =yex2+2√yex2, sendoy=y(x). Neste caso,E(x, y, y′) = y′
x −yex
2
−2√yex2.
(3)y′=ky, sendoy=y(x)ekconstante real. Neste caso,E(x, y, y′) =y′−ky.
(4)y′=y2
3cos t2+y, sendoy=y(t). Neste caso,E(t, y, y′) =y′−y 2
3cos t2+y.
(5)y′+P(x)y=Q(x), sendoP=P(x)eQ=Q(x)fun¸c˜oes dadas ey=y(x). Neste caso,E(x, y, y′) =y′+P(x)y−
Q(x).
(6)ey′+2y′+x2y=0, sendoy=y(x). Neste caso,E(x, y, y′) =ey′
+2y′+x2y.
Iremos trabalhar apenas com EDO’s nas quais ´e poss´ıvel isolar y′, ou seja, E(x, y, y′) = 0 que pode ser escrita
como y′ =F(x, y). Dos exemplos acima, apenas a EDO (6)n˜ao pode ser escrita comoy′ =F(x, y).
Exerc´ıcios.
Exerc´ıcio (1)Verifique quey=y(x) =e2x ´e solu¸c˜ao (particular) da EDO y′−y=e2x.
Exerc´ıcio (2)Verifique quey=y(x) = c
x+2, sendocconstante real ´e solu¸c˜ao (geral) da EDOy′ =
1
x(2−y).
Exerc´ıcio (3)Verifique quey=y(x) = (x+1) −1 3e
x ´e solu¸c˜ao (particular) da EDO y′ =y−xsujeita `a condi¸c˜ao
inicialy(0) = 23.
Exerc´ıcio (4)Verifique que y=y(x) =e2x+aex, sendo a constante real ´e solu¸c˜ao (particular) da EDO y′+y=
3e2x+2aex.
Exerc´ıcio (5) Verifique que y = y(x) = e2x +aex+ c
ex, sendo a e c constantes reais ´e solu¸c˜ao (geral) da EDO
y′+y=3e2x+2aex.
Problemas Aplicados.
Problema (1) Um bal˜ao sobe com velocidade constante de 4 m/s e est´a `a altura de 25 m acima do solo quando uma pedra ´e solta do bal˜ao. Quanto tempo a pedra gasta para chegar ao solo? (Obs.: despreze a resistˆencia do ar e considere a acelera¸c˜ao da gravidade com intensidadeg=9, 8 m/s2.
Resolu¸c˜ao.
Orientemos o movimento do bal˜ao por meio de um eixo vertical escalonado para representar a altura do bal˜ao em metros, com origem no solo.
s +
a
vpedra
pedra balão vbalão
vbalão( ) =t 4 m s/ é constante
a( ) = - ,t 9 8 m s/ 2
é constante
vpedra= ( )v t é variável
s= ( )s t é variável
Sejam s = s(t) distˆancia da pedra ao solo em metros, v = v(t) a velocidade da pedra em m/s e a = a(t) a acelera¸c˜ao da gravidade em m/s2, todas essas fun¸c˜oes dependentes do tempot, medido em segundos. Lembremos que a velocidade v´e a taxa de varia¸c˜ao instantˆanea da distˆancia em rela¸c˜ao ao tempo, ou seja,v(t) =s′(t), e que a
acelera¸c˜ao ´e a taxa de varia¸c˜ao instantˆanea da velocidade em rela¸c˜ao ao tempo, ou seja,a(t) =v(t)′.
Sejat=0 so instante em que a pedra ´e lan¸cada. Nesse instante a velocidadev=v(t)da pedra ´e de 4 m/s, ou seja, v(0) =4 m/s (positiva, pois a distˆancia da pedra ao solo est´a aumentando nesse instante). J´a a acelera¸c˜ao ´e a(t) = −9, 8 m/s2para qualquer instantet(negativa, pois a velocidade da pedra depois de lan¸cada sempre decresce,
mesmo quando est´a negativa).
Sendo assim, dea(t) =v′(t)temosv′ = −9, 8(uma EDO linear de 1a. ordem), sujeita `a condi¸c˜ao inicialv(0) =4.
Portanto,
v′ = −9, 8⇒ dv
dt = −9, 8⇒v= −9, 8t+k1 Dev(0) =4temos4= (−9, 8)0+k1, ou seja,k1=4.
Conclu´ımos
v=v(t) = −9, 8t+4
De v(t) = s′(t) temos s′ = −9, 8t+4 (uma EDO linear de 1a. ordem), sujeita `a condi¸c˜ao inicial s(0) = 25.
Portanto,
s′ = −9, 8t+4⇒ ds
dt = −9, 8t+4⇒s= −4, 9t
2+4t+k 2
Des(0) =25temos25= (−4, 9)02+4(0) +k
2, ou seja,k2=25.
Conclu´ımos
s=s(t) = −4, 9t2+4t+25
Por fim, queremos o instantet1tal que a pedra atinge o solo, ou seja,s(t1) =0. Assim,
s(t1) =0⇒−4, 9t21+4t1+25=0⇒t1=
−4±p
42−4(−4, 9)25
2(−4, 9) =
−4±√506
−9, 8 ⇒
t1= −1, 89∼ (n˜ao serve, poist≥0) out1=∼ 2, 7
Portanto, a pedra atinge o solo ap´os, aproximadamente, 2, 7segundos.
Uma observa¸c˜ao interessante sobre esse problema: a velocidade da pedra ´e positiva quando ela ´e lan¸cada e negativa quando atinge o solo (pois nesse instante a distˆancia da pedra ao solo est´a diminuindo). Sendov=v(t)uma fun¸c˜ao cont´ınua, deve haver um instante t0em que a velocidade da pedra se anula. Nesse instante a pedra deixa de subir e
come¸ca a descer e, portanto, este ´e o instante em que a pedra est´a `a sua maior alturas0em rela¸c˜ao ao solo. Calculemos
t0es0. O instantet0´e tal que
v(t0) =0⇒−9, 8t0+4=0⇒t0=
2
4, 9 =∼ 0, 41
Parat0= 4,92 temos
s0=s(t0) = −4, 9
2 4, 9
2
+4
2 4, 9
+25=∼25, 82
Portanto, ap´os 0, 41segundos do lan¸camento da pedra, ela atinge a altura m´axima de 25, 82metros. Por fim, obser-vemos que ap´os 0, 41 segundos o bal˜ao est´a `a altura de 25+4(0, 41)=∼ 26, 64 metros. A figura abaixo apresenta o gr´afico da fun¸c˜ao distˆancia e sintetiza os valores de tempo e altura que encontramos no problema.
0
t(em segundos) s(em metros)
(gráfico fora de escala)
2 7,
25
0 41
,
25 82,
Problema (2)Determine a curva y =f(x)do plano cartesiano xyque passa pelo ponto A(9, 4)e cujo coeficiente angular da reta tangente em cada pontoP(x, y)da curva ´e3√x.
Resolu¸c˜ao.
Sabemos que o coeficiente angularmda reta tangente ao gr´afico de uma fun¸c˜ao deriv´avely=f(x)em um ponto P(x, y)desse gr´afico ´em=f′(x). Isto significa que temos a EDO linear de 1a. ordemy′ =3√x, ou seja, dy
dx =3
x
reta tangente de coeficiente angularf x¢( )
gráfico de genérico f
( )
x y
Assim,
dy
dx =3
√
x⇒y=2√x3+k
Mas o ponto A(9, 4) est´a na curva y=f(x). Isto significa quef(9) = 4 (ouy(9) = 4) ´e condi¸c˜ao incial para a
EDO y′=3√x. Assim,4=2√93+k, ou seja,k= −50.
Conclus˜ao,y=2√x3−50´e a equa¸c˜ao da curva pedida.
Problema (3)Determine a curvay=f(x)do plano cartesianoxycom as seguintes propriedades: (i)y′′=f′′(x) =6x;
(ii)Seu gr´afico passa pelo pontoA(0, 1), e possui nesse ponto uma reta tangente horizontal. Quantas curvas como essa existem no plano cartesiano?
Resolu¸c˜ao.
Da EDO linear de 2a. ordemy′′=6x temos:
y′′=6x⇒y′=3x2+k
1⇒y=x3+k1x+k2
O coeficiente angularm da reta tangente ao gr´afico dey = f(x) em um pontoP(x, y) desse gr´afico ´e dado por m=f′(x). Mas no pontoA(0, 1)a reta tangente ´e horizontal, ou seja, seu coeficiente angular ´e nulo, o que no conduz
`a equa¸c˜ao0=f′(0) =y′(0) =3(0)2
+k1. Portanto,k1=0.
Desta forma, temos a equa¸c˜aoy=x3+k 2.
Por fim,A(0, 1)est´a na curvay=x3+k
2. Portanto, 1=03+k2, ou seja,k2=1.
Conclus˜ao: y=x3+1´e a curva pedida.
0
reta tangente gráfico def
x y
A 0 1( , )
-1
Notemos quey(0) =1 ey′(0) =0 s˜ao condi¸c˜oes iniciais para a EDOy′′=6x. Essas condi¸c˜oes iniciais fazem com
que a solu¸c˜ao encontrada seja ´unica, ou seja, n˜ao restam constantes a serem determinadas na equa¸c˜ao da curva.
1.3
T´
ecnica da Separa¸
c˜
ao de Vari´
aveis para Resolu¸
c˜
ao de Equa¸
c˜
oes
Di-ferenciais Ordin´
arias
Sejay′ =F(x, y)EDO de 1a. ordem. Como y′= dy dx, temos
dy
dx =F(x, y).
Sempre podemos escreverF(x, y) = AB((x,yx,y)) como uma fra¸c˜ao.
Suponhamos queB(x, y) =f(y)eA(x, y) =g(x), ou seja,B´e fun¸c˜ao deyeA´e fun¸c˜ao dexapenas. Logo,
dy dx =
g(x)
f(y) ⇒f(y)
dy
dx =g(x)⇒
Z
f(y)dydxdx=
Z
g(x)dx⇒
Z
f(y)dy=
Z
g(x)dx
e, com isso, caso seja poss´ıvel calcular as integrais, criamos uma equa¸c˜ao alg´ebrica emxeyapenas. Se for poss´ıvel, isolamos a solu¸c˜aoye obtemos uma solu¸c˜ao expl´ıcita da EDO.
Observa¸c˜ao: No procedimento descrito acima, se tivermos uma condi¸c˜ao inicialy(x0) =y0, ela pode ser incorporada
nas integrais. Observamos:
Z
f(y)dy=
Z
Como y(x0) =y0 deve satisfazer a equa¸c˜ao acima, temosF(y0) =G(x0) +c, ou seja,c=F(y0) −G(x0). Logo,
F(y) =G(x) +F(y0) −G(x0)⇐⇒F(y) −F(y0) =G(x) −G(x0)⇐⇒
Zy y0
f(y)dy=
Zx x0
g(x)dx .
Exemplos.
Exemplo (1)Resolver o problema de valor inicialy′+2xy=0, sendoy=y(x), comy(1) = 1 e.
Resolu¸c˜ao:
Temos
y′+2xy=0⇒ dy
dx = −2xy⇒ 1 y
dy
dx = −2x, comy(x)6=0para qualquerx⇒
Z
1 y
dy
dxdx=
Z
−2xdx⇒
Z
1
ydy=
Z
−2xdx⇒ln(|y|) = −x2+c
⇒|y|=e−x2ec⇒y=Ae−x2. Para determinar a constanteAusamos a condi¸c˜ao inicialy(1) = 1
e. Temos
1
e =Ae
−12
⇒ 1e =A1
e ⇒A=1.
Conclus˜ao: y=y(x) =e−x2.
Utilizando aobserva¸c˜ao acima, a solu¸c˜ao tamb´em pode ser alcan¸cada do seguinte modo:
Zy
1 e
1
ydy=
Zx 1
−2xdx⇒ln(|y|) −ln
1 e
= −x2+12⇒ln(|y|) +ln(e) = −x2+12⇒|y|=e−x2.
Comoy(1) = 1
e> 0ee
−x2
> 0temosy=y(x) =e−x2.
Uma d´uvida que pode surgir neste exemplo: seria poss´ıvel existir x16= 1 tal que y(x1)< 0? A resposta ´e n˜ao,
porque y deve ser deriv´avel e, portanto, cont´ınua. Como ynunca se anula, chegamos `a conclus˜ao de que y nunca muda de sinal.
Exemplo (2)Resolver a EDOy′ = (1+y)ex, sendoy=y(x)>−1.
Resolu¸c˜ao:
Temos
dy
dx = (1+y)e
x
⇒1+1ydydx =ex⇒
Z 1
1+y
dy
dxdx=
Z
exdx⇒
Z
1
1+ydy=
Z
exdx⇒ln(|1+y|) =ex+c⇒1+y=eex+c⇒y=Aeex−1,
sendoA=ec.
Exemplo (3)Resolver a EDOy(x+1)y′ =x y2+1
, sendox >−1 ey(0) =0.
Resolu¸c˜ao:
Temos
y(x+1)dy
dx =x y
2+1
⇒ y
y2+1
dy
dx =
x
x+1 ⇒
Zy 0
y
y2+1
dy
dxdx=
Zx 0
x
x+1dx⇒
Zy 0
y
y2+1dy=
Zx 0
1− 1
x+1
dx⇒ ln y
2+1
2 −
ln 02+1
2 =x−ln(|x+1|) −0+ln(|0+1|)⇒y
2+1=e2x−2ln(x+1) ⇒
y2= e
2x
eln((x+1)2)
−1⇒y2= e
2x
(x+1)2 −1⇒y=
s
ex
x+1
2
−1.
Exemplo (4) Resolva o problema de valor inicial y′ +P(x)y = 0 (EDO de 1a. ordem linear homogˆenea), sendo
y=y(x), comy(x0) =y0.
Temos
y′+P(x)y=0⇒dy
dx = −P(x)y⇒
1 y
dy
dx = −P(x)⇒
Zy y0
1 y
dy
dxdx=
Zx x0
−P(x)dx⇒
Zy y0
1
ydy=
Zx x0
−P(x)dx⇒
ln(|y|) −ln(|y0|) =
Zx x0
−P(x)dx⇒ln
y y0 = Zx x0
−P(x)dx⇒ y y0
=±e
Rx
x0−P(x)dx⇒y=± y0
e
Rx x0P(x)dx
.
Comoy(x0) =y0deve satisfazer a equa¸c˜ao acima, conclu´ımos que
y= y0
e
Rx x0P(x)dx
´e a solu¸c˜ao geral do PVI.
Exemplo (5)Resolva o problema de valor incialy′+sen(t)y=0, sendoy=y(t), comy(0) = 3 2.
Resolu¸c˜ao:
Vamos resolver essa EDO de 1a. ordem linear homogˆenea sem aproveitar a solu¸c˜ao j´a obtida no exemplo anterior.
Temos
y′+sen(t)y=0⇒ dy
dt = −sen(t)y⇒
1 y
dy
dt = −sen(t)⇒
Z
1 y
dy
dtdt=
Z
(−sen(t))dt⇒
Z 1
ydy=
Z
(−sen(t))dt⇒ln(|y|) =cos(t) +c⇒y=Aecos(t).
Comoy(0) = 3
2 temosA= 3
2e. Logo,y= 3 2ee
cos(t).
Se utilizarmos a solu¸c˜ao do exemplo anterior temosy=
3 2
eRt0sen(t)dt
= 32
e−cos(t)+1 =
3 2ee
cos(t). Exerc´ıcio. Resolva o problema de valor inicialy′+ 1+t2
y=0, sendoy=y(t), comy(0) =√5.
(Resposta: y=√5e−t−t3 3).
Exemplos.
Exemplo (1)Resolva o problema de valor inicial(4y−cos(y))y′−3x2=0, sendoy=y(x), comy(0) =0.
Resolu¸c˜ao:
Temos
(4y−cos(y))y′−3x2=0⇒(4y−cos(y))dy
dx =3x
2
⇒ Z
(4y−cos(y))dy
dxdx=
Z
3x2dx⇒
Z
(4y−cos(y))dy=
Z
3x2dx⇒2y2−sen(y) =x3+c. Comoy(0) =0 temosc=0. Logo,2y2−sen(y) =x3.
Observemos que, neste caso, n˜ao podemos isolar y, ou seja, a solu¸c˜ao ´e dada implicitamente pela equa¸c˜ao acima.
Exemplo (2)Resolva o problema de valor inicial−yy′+ex=0, sendoy=y(x), comy(0) =0.
Resolu¸c˜ao:
Temos
−yy′+ex=0
⇒ydy
dx =e
x
⇒ Z
ydy
dxdx=
Z
exdx
⇒ Z
ydy=
Z
exdx⇒ y
2
2 =e
x+c.
Como y(0) =0 temos c = −1. Logo, y= ±√2ex−2 e, neste caso, x≥0. Al´em disso, com a condi¸c˜ao inicial
dada, h´a duas solu¸c˜oes.
Exerc´ıcios.
Exerc´ıcio (1)Resolva o problema de valor inicialy′=1+x+y2+xy2, sendoy=y(x), comy(0) =0.
(Resposta: y=tgx+ x2 2
sendox+x2 2 6=
π
2 +kπ comk∈Z).
Exerc´ıcio (2)Resolva o problema de valor inicialy′= −y
t, sendoy=y(t), comy(1) =1.
1.4
T´
ecnica do Fator Integrante para Resolu¸
c˜
ao de Equa¸
c˜
oes
Diferenci-ais Ordin´
arias Lineares de 1
a. Ordem
Consideremos a EDO linear de 1a. ordemP
1(x)y′+P0(x)y=Q(x), sendoy=y(x)eP1(x)fun¸c˜ao n˜ao nula para
qualquer x. Logo, podemos dividir a equa¸c˜ao diferencial porP1(x)e escrever
y′+P(x)y=Q(x),
sendoP(x) = P0(x)
P1(x) eQ(x) =
Q(x)
P1(x).
Equa¸c˜oes como a acima podem ser facilmente resolvidas, desde quePseja integr´avel.
Para tanto, definamos a fun¸c˜ao
v(x) =eRP(x)dx ,
que ´e chamada de fator integranteda EDOy′+P(x)y=Q(x), sendoy=y(x). O fator integrantev(x) =eRP(x)dxcumpre a seguinte propriedade:
v′(x) =eRP(x)dx
Z
P(x)dx
′
=v(x)P(x).
Desta forma, multiplicandoy′+P(x)y=Q(x)porv(x)temos
y′(x)v(x) +v(x)P(x)y(x) =v(x)Q(x)⇒y′(x)v(x) +y(x)v′(x) =v(x)Q(x)⇒
(y(x)v(x))′ =v(x)Q(x)⇒y(x)v(x) =
Z
v(x)Q(x)dx⇒y(x) = 1
v(x)
Z
v(x)Q(x)dx.
Portanto, a solu¸c˜ao da EDO ´e
y= 1
v(x)
Z
v(x)Q(x)dx.
Observemos quev6=0, por isso podemos realizar a divis˜ao acima, e que obteremos uma solu¸c˜ao expl´ıcita quando vQfor integr´avel.
Observa¸c˜ao: mais adiante estenderemos a t´ecnica do fator integrante para uma classe mais abrangente de EDO’s no qual a linear de primeira ordem est´a inserida, as chamadas EDO’s exatas.
Exemplos.
Exemplo (1)Resolver a EDOxy′ =x2+3y,x > 0.
Resolu¸c˜ao.
Dexy′=x2+3y,x > 0, podemos escrever
y′− 3
xy=x,
ou seja, P(x) = −3
x eQ(x) =x.
Sendo uma EDO linear de primeira ordem, seu fator integrante ´ev(x) = e
R
(−3
x)dx =e−3ln(x)+k = eln(x
−3)
ek =
x−3ek.
Assim,
y= 1
x−3ek
Z
x−3ekxdx=x3
Z
x−2dx=x3 −x−1+c
⇒y= −x2+cx3,
sendocconstante real.
Exemplo (2) Um tanque cont´em500litros de ´agua doce. Uma solu¸c˜ao que cont´em 0, 5kg/l de fertilizante sol´uvel escoa para o tanque a uma taxa de 1 l/min, e a mistura ´e bombeada para fora do tanque a uma taxa de3 l/min. Depois de quanto tempo a quantidade de fertilizante ser´a m´axima no tanque?
Resolu¸c˜ao.
0 5 kg l 1 l min
, /
/
3 l min/
500 l
Para simplificar, chamaremos o fertilizante sol´uvel apenas desal.
Sejay=y(t)a quantidade, em quilogramas, de sal no tanque no instantet, medido em minutos. Logo,y(0) =0. Sejay′=y′(t)a taxa de varia¸c˜ao instantˆanea da quantidade de sal em rela¸c˜ao ao tempo, medida em kg/min.
Sejav=v(t) =500−(3−1)t=500−2to volume, em litros, de solu¸c˜ao no tanque no instantet. Logo,0≤t≤250 min.
A taxa de varia¸c˜ao da quantidade de sal por litro no instante t´e, portanto, yv((tt)) kg/l. Essa tamb´em ´e taxa de sa´ıda de sal por litro do tanque.
Naturalmente, a quantidade de sal no tanque em um determinado instante ´e igual `a quantidade de sal que entrou menos a quantidade de sal que saiu at´e aquele instante. Isto nos leva a considerar que a taxa de varia¸c˜ao da quantidade de sal por minuto passando pelo tanque no instante t, medida em kg/min, ´e igual `a taxa de entrada (em kg/min) menos a taxa de sa´ıda (em kg/min). Esquematicamente temos:
kg
min tanque = kg
min entra − kg
min sai =⇒ kg
min tanque = kg
l . l
min entra − kg
l . l min sai Matematicamente temos:
y′(t) = (0, 5).(1) − y(t)
v(t).3=⇒
y′(t) + 3
500−2ty(t) =0, 5.
que ´e uma EDO linear de 1a. ordem n˜ao homogˆenea, sendoP(t) = 3
500−2t eQ(t) =0, 5.
Seu fator integrante ´e
v(t) =eRP(t)dt=eR5003−2tdt=e
3ln(|500−2t|)
−2 +k=eke
ln
(500−2t)−32
=ek(500−2t)−32.
A solu¸c˜ao ´e
y=y(t) = 1
v(t)
Z
v(t)Q(t)dt= 1
ek(500−2t)−32
Z
ek(500−2t)−32
2 dt=
(500−2t)32
2
Z
(500−2t)−32dt
= (500−2t)
3 2
2
(500−2t)−12 +c
= 500−2t 2
1+c(500−2t)12
= (250−t)1+c√500−2t.
Mas sabemos quey(0) =0. Logo,(250−0) 1+c√500−0
=0, ou seja,c= − 1
10√5. Portanto,
y=y(t) = (250−t)
1−
√
500−2t
10√5
.
O gr´afico deyest´a representado na figura abaixo. Observemos que h´a um ponto cr´ıtico. Vamos encontr´a-lo.
0
gráfico dey=y t( )
Temos
y′(t) =
√
500−2t
10√5 −1+
500−2t
20√5√500−2t =
2(500−2t) −20√5√500−2t+500−2t
20√5√500−2t =
3√500−2t−20√5
20√5 =⇒
y′(t) = 3 √
500−2t
20√5 −1.
Mas set1´e ponto cr´ıtico dey′, ent˜ao y′(t1) =0, ou seja,
3√500−2t1
20√5 −1=0⇒3
p
500−2t1=20
√
5⇒500−2t1=
2000
9 ⇒t1=250−
1000
9 =⇒
t1=∼138, 9min .
Por fim, observemos quey′′(t) = − 3
20√5√500−2t < 0para0 < t < 250, o que significa que o gr´afico de y=y(t)
possui concavidade para baixo e o ponto cr´ıticot1´e de m´aximo global.
Conclus˜ao: ap´os aproximadamente138, 9minutos teremos a maior quantidade de sal no tanque e essa quantidade ser´a dey(138, 9)=∼ 37quilogramas.
1.5
Problemas Envolvendo a
Lei de Varia¸
c˜
ao Exponencial
Sejay=y(t)fun¸c˜ao dependente da vari´avelt. Dizemos que a vari´avelyest´a submetida `aLei de Varia¸c˜ao Exponencial
quando a taxa de varia¸c˜ao (crescimento ou decrescimento) instantˆanea deyem rela¸c˜ao atvaria de forma proporcional a y, ou seja, quando dydt =k.y, sendokconstante n˜ao nula.
Geralmente, em problemas envolvendo a Lei de Varia¸c˜ao Exponencial, y = y(t) representa a quantidade de indiv´ıduos de uma popula¸c˜ao no instante t, sendot, naturalmente, a vari´avel independente tempo. Portanto, y′ =
dy
dt (t) ´e a taxa de crescimento ou decrescimento da quantidade y em rela¸c˜ao ao tempo. Quando n˜ao h´a fatores
inibidores nessa popula¸c˜ao (como doen¸cas, fome, guerras ou escassez de recursos) essa taxa y′ ´e proporcional a ye
representa, aproximadamente, a diferen¸ca entre quantos indiv´ıduos est˜ao nascendo e quantos indiv´ıduos est˜ao morrendo na popula¸c˜ao, por unidade de tempo, no instante t.
A EDOy′=ky´e separ´avel:
dy
dt =ky⇒
1 y
dy
dt =k⇒
Z1
y dy
dtdt=
Z
kdt⇒
Z1
ydy=
Z
kdt⇒ln(|y|) =kt+c⇒|y|=ekt+c⇒|y|=ektec ⇒|y|=Aekt,
sendo A = ec > 0 constante. Quando y representa quantidade de indiv´ıduos de uma popula¸c˜ao, temos y > 0 e
y=Aekt.
Exemplo. Um grupo de 10.000 pessoas doentes est´a sendo tratado. Verificou-se que o n´umero dos que est˜ao se curando no grupo, no instante t, ´e proporcional ao n´umero de doentes no grupo nesse instante. Isso significa que a taxa de cura, em rela¸c˜ao ao tempo, ´e proporcional `a quantidade de doentes. Ap´os um ano do in´ıcio do tratamento,
2.000pessoas se curaram. Quanto tempo decorrer´a para que o n´umero de doentes chegue a apenas1.000pessoas?
Resolu¸c˜ao.
Trata-se de um problema envolvendo aLei de Varia¸c˜ao Exponencial.
Fa¸camosy=y(t)como sendo o n´umero de doentes no grupo no instantet, sendotmedido em anos. Logo,y′=ky, sendoy(0) =10.000 ey(1) =8.000.
Vimos quey=Aekt. Logo,
10.000=Aek.0⇒A=10.000
8.000=10.000ek1⇒k=ln(0, 8)
Assim,y=10.000eln(0,8)t.
1.6
Problemas Envolvendo a
Lei de Decaimento Radioativo
Decaimento radioativo ´e o processo pelo qual ´atomos inst´aveis (radioativos) podem emitem massa ou radia¸c˜ao para o ambiente.
Por exemplo:
- Carbono-14´e um is´otopo radioativo do carbono e pode decair (“transformar-se”), com o passar do tempo, em Nitrogˆenio-14, que ´e est´avel (n˜ao radioativo). O is´otopo “comum” do carbono, o Carbono-12´e est´avel, ou seja, n˜ao ´e radioativo.
Obs.: dois elementos qu´ımicos s˜ao is´otopos quando possuem o mesmo n´umero de pr´otons e el´etrons, mas diferem no n´umero de neutrons.
- Urˆanio-238 ´e radioativo e pode dacair, ap´os uma s´erie de transforma¸c˜oes intermedi´arias, em Chumbo-206, que n˜ao ´e radioativo.
O tempo de decaimento de um ´atomo que iniciou esse processo de transforma¸c˜ao depende do elemento qu´ımico. ´
E comprovado experimentalmente que a taxa de decaimento radioativo de um elemento qu´ımico, em rela¸c˜ao ao tempo, em uma amostra, ´e proporcional `a quantidade de ´atomos do elemento presente na amostra. Isto significa que a taxa de decaimento radioativo segue a Lei de Varia¸c˜ao Exponencial, que vimos acima.
Se y= y(t)´e a quantidade de ´atomos radioativos da amostra no instantet, ent˜aoy′ = ky. Isso significa que,
a menos de sinal, y′(t) ´e a quantidade de ´atomos da amostra que est´a deixando de ser radioativo, por unidade de
tempo, no instantet.
Comoy=y(t)est´a diminuindo, temosy′(t)< 0e, portanto,k < 0.
Para evitar trabalhar com k negativo, alguns autores adotam k = −λ com λ positivo. Sendo assim, a EDO considerada ´ey′ = −λy, cuja solu¸c˜ao ´ey=Ae−λt.
Todo ser vivo (animal ou vegetal) possui Carbono-14em uma quantidade proporcional ao Carbono-12no corpo. Essa propor¸c˜ao ´e aproximadamente a mesma propor¸c˜ao de Carbono-14 e Carbono-12na atmosfera. Quando o orga-nismo morre, o Carbono-14 presente no corpo come¸ca a decair. Sabemos, por meio de experimentos, que o tempo necess´ario para que a metade dos ´atomos de Carbono-14 de uma amostra decaia ´e de aproximadamente5.700 anos. Esse ´e o chamadotempo de meia-vidado Carbono-14. Sendo assim, por meio da medi¸c˜ao da quantidade de Carbono-14 em um corpo que j´a foi orgˆanico ´e poss´ıvel saber a data aproximada de sua morte.
Exemplo. Por meio da compara¸c˜ao da rela¸c˜aoCarbono-14
Carbono-12na atmosfera e
Carbono-14
Carbono-12em um osso fossilizado, concluimos
que10% do Carbono-14do osso decaiu. Qual ´e a idade aproximada do f´ossil? Consideremos que o tempo de meia-vida
do Carbono-14´e de5.700anos.
Resolu¸c˜ao.
Sejay=y(t)a quantidade de ´atomos de Carbono-14no osso fossilizado, sendoto tempo medido em anos. Sejamt0=0 o instante da morte do organismo et1 o instante atual.
Queremost1.
Como o decaimento radioativo segue a Lei de Varia¸c˜ao Exponencial, temosy′=ky, cuja solu¸c˜ao ´ey=Aekt.
Ap´os t1anos da morte do organismo, h´a 90% de Carbono-14no osso. Logo,
y(t1) =0, 9y(0)⇒Aekt1 =0, 9Aek0⇒kt1=ln(0, 9).
Mas o tempo de meia-vida do Carbono-14´e de5700anos. Isso significa que
y(5700) =0, 5y(0)⇒Aek5700=0, 5Aek0
⇒5700k=ln(0, 5)⇒k= ln(0, 5)
5700 .
Deste modo,
ln(0, 5)
5700 t1=ln(0, 9)⇒t1=
5700ln(0, 9)
ln(0, 5) =∼ 866 anos.
1.6.1
Curiosidade Hist´
orica:
Um Modelo Matem´
atico para Detectar Falsifica¸
c˜
oes em
Obras de Arte de Van Meegeren
Esta se¸c˜ao ´e um suplemento `as notas de aulas e sua leitura n˜ao ´e obrigat´oria no estudo das EDO’s. O conte´udo foi baseado principalmente na referˆencia:
Braun, M.Differential Equations and Their Applications. Short version. New York: Springer Verlag. 1978.
dos nazistas. Nesse per´ıodo, foram encontradas pelo ex´ercito aliado, em uma mina de sal na ´Austria, uma enorme quantidade de obras de arte pilhadas dos pa´ıses ocupados pelos alem˜aes e escondidas l´a pelos nazistas. Imediata-mente, foram convocados especialistas em arte, para a identifica¸c˜ao e o repatriamento das obras. Entretanto, havia uma pintura antiga adquirida pelo alto comandante nazista Hermann Wilhelm Goering, intitulada “Woman taken in adultery”, do famoso pintor holandˆes do s´eculoXVII Johannes Vermeer (1632-1675), que os especialistas desconhe-ciam. Na busca efetuada pelo governo holandˆes, pela origem da obra, foram descobertos registros de uma empresa que atuou durante a guerra vendendo in´umeras obras de arte holandesas para os nazistas. Dentre as vendas, havia a da referida obra. Essa venda foi feita a Goering intermediada por um banqueiro que afirmou agir em nome de um pintor holandˆes chamado Henricus Antonius Van Meegeren de que a obra procedia.
Hermann Goering “Woman taken in adultery”. Johannes Vermeer Van Meegeren
Em29de maio de 1945, Van Meegeren foi localizado e preso sob a acusa¸c˜ao de colaborar com o inimigo por meio de venda clandestina de patrimˆonio cultural holandˆes, uma vez que ele n˜ao revelou a procedˆencia da obra. A senten¸ca para crimes de colaboracionismo com inimigos de guerra era a pena de morte.
Neste ponto, cabe ressaltar que n˜ao era raro surgirem “obras perdidas” de grandes pintores depois de muito tempo de sua morte, na posse de fam´ılias, geralmente, abastadas. Em particular, Vermeer n˜ao era muito conhecido no mundo da arte at´e o in´ıcio do s´eculo XX, quando seu talento fora, ent˜ao, reconhecido. ´E sabido que Vermeer morreu muito pobre e que, antes de morrer, trocava quadros por comida. Sua vi´uva, para sobreviver, vendeu todos os seus quadros remanescentes a pre¸cos irris´orios e, provavelmente, muitas de suas obras se perderam. Hoje, certamente, n˜ao restam mais do que cerca de 40 de suas pinturas. Sendo assim, os per´ıtos em arte acreditaram, em um primeiro momento, que a obra “Woman taken in adultery” era um “Vermeer perdido”.
Entretanto, no dia12de julho de1945, para tentar escapar da pena de morte, Van Meegeren surpreendeu o mundo ao revelar que a referida obra n˜ao era original. Ele mesmo a havia pintado entre1941e1942, utilizando as t´ecnicas e o estilo de Vermeer, do qual ele era profundo conhecedor. Al´em disso, ele tamb´em revelou que a obra “The disciples at Emmaus”, confeccionada entre1936e1937, e outros quatro “Vermeer’s”, al´em de dois “De Hoogh’s” (outro pintor holandˆes do s´eculo XVII) eram falsifica¸c˜oes de sua autoria.
Essas revela¸c˜oes, embora chocantes, n˜ao foram em um primeiro momento levadas muito a s´erio. As autoridades holandesas desconfiavam que Van Meegeren queria escapar a todo custo da morte e que, por isso, estava inventando essa hist´oria. Al´em disso, a obra “The disciples at Emmaus” foi atestada como original, um “Vermeer perdido”, ap´os uma an´alise detalhada de dois dias por um famoso historiador de arte chamado Abraham Bredius. No entanto, para comprovar a veracidade de sua hist´oria, Van Meegeren predispˆos-se a pintar, em sua cela, uma obra chamada “Jesus amongst the doctors” para demonstrar o quanto era habilidoso na imita¸c˜ao do estilo de Vermeer. Durante a execu¸c˜ao dessa obra, Van Meegeren colaborou com as autoridades, revelando suas t´ecnicas e procedimentos de falsifica¸c˜ao e envelhecimento de obras de arte.
N˜ao demorou muito para as autoridades levarem a s´erio a hist´oria de Van Meegeren. Ele, de fato, era muito habilidoso. Uma equipe de qu´ımicos, f´ısicos, t´ecnicos e peritos em arte foi montada para examinar as obras citadas por Van Meegeren (e outras de origem duvidosa) para comprovarem se as obras eram, de fato, falsas.
Naturalmente, as falsifica¸c˜oes n˜ao foram desvendadas t˜ao facilmente, uma vez que Van Meegeren conhecia muito bem as t´ecnicas empregadas pelos peritos. De fato, as telas utilizadas eram do s´eculo XVII e ele procurava utilizar os mesmos pigmentos de tinta que Vermeer utilizava, al´em de “cozer” as pinturas em forno para que assumissem o aspecto de envelhecidas pelo tempo. Van Meegeren comprava pinturas do s´eculo XVII de pouco valor e raspava a velha tinta endurecida para aproveitar a tela. Para o processo de envelhecimento da tinta, ele `as vezes utilizava
fenoformalde´ıdo que ap´os o “cozimento” endurecia enormemente a tinta. Resqu´ıcios desse produto qu´ımico (que s´o foi descoberto no s´eculo XIX) foram encontrados pelos peritos em v´arias das obras de Van Meegeren. Al´em disso, pigmentos do moderno “azul cobalto” (que n˜ao existia na ´epoca de Vermeer) tamb´em foram encontrados em algumas das referidas obras. Radiografias foram empregadas para tentar descobrir se a tela era originalmente de uma outra pintura. Em particular, a obra “Woman taken in adultery”, comprada por Goering, era uma pintura de uma batalha com cavalos.
Radiografia de “Woman taken in adultery”
Ap´os essas evidˆencias, em2de outubro de1947, a acusa¸c˜ao de colabora¸c˜ao com o inimigo contra Van Meegeren foi comutada pela de fals´ario e ele foi condenado a mais um ano de pris˜ao. Como ele esperava ser liberto sem condena¸c˜ao, Van Meegeren recusou-se a terminar a obra “Jesus amongst the doctors” que estava pintando na cela, n˜ao mostrando, na pr´atica, como seria o processo de envelhecimento da obra. Entretanto, Van Meegeren j´a havia colaborado enormemente com as autoridades, revelando suas t´ecnicas e, de certo modo, ajudando na arte de desvendar detalhes sutis em pinturas falsas. Talvez por esse motivo, sua pena tenha sido pequena; afinal, ele acabou ganhando a fama de ser o holandˆes que enganou os nazistas.
Infelizmente, Van Meegeren jamais saiu da pris˜ao. Em30de dezembro de1947, ele sofreu um ataque card´ıaco em sua cela e morreu.
Mas a hist´oria n˜ao acabou com sua morte. Mesmo com as provas apresentadas pelos peritos, muitas pessoas, algumas delas altamente qualificadas no ramo da arte, recusavam-se a acreditar que a obra “The disciples at Emmaus”, que fora inclusive comprada pela prestigiada Sociedade Rembrandt por cerca de 170.000 d´olares (atuais), era uma falsifica¸c˜ao, pois se tratava de um quadro extremamente bem feito com qualidade impec´avel, ao contr´ario das demais obras listadas por Van Meegeren. Os peritos justificaram que essa obra fora a primeira falsifica¸c˜ao de Van Meegeren, que, por n˜ao ter sido reconhecido como um grande pintor pela sociedade holandesa, queria provar o contr´ario pintando algo excepcional. Entretanto, essa justificativa n˜ao satisfez os c´eticos, que queriam uma prova eficaz e definitiva para essa suposta obra de Van Meegeren.
´
E curioso como a hist´oria desenrola-se de modo diferente para certos personagens. ´E conhec´ıvel que in´umeros grandes gˆenios da humanidade, n˜ao s´o da pintura mas tamb´em da escultura, da literatura e da m´usica, n˜ao tiveram grande reconhecimento durante a vida e muitos morreram muito pobres. Isso ocorreu com o pr´oprio Vermeer citado acima, mas tamb´em com Vincent van Gogh, Rembrandt, Aleijadinho, Edgar Allan Poe, Oscar Wilde, Franz Schubert, Wolfgang Amadeus Mozart e muitos outros. ´E ineg´avel que algu´em que produziu obras que enganaram tanta gente capacitada no mundo da arte tenha talento. ´E verdade tamb´em que Van Meegeren era muito rico para a ´epoca, pois ganhou muito dinheiro com suas falsifica¸c˜oes durante a Segunda Guerra Mundial (estimativas atuais calculam que sua fortuna girava em torno de 25 milh˜oes de d´olares!), mas hoje ele ´e apenas lembrado como um fals´ario aproveitador. Sua imagem na hist´oria, certamente, seria outra se ele tivesse se conformado em levar uma vida honesta.
Vale a pena lembrar que Goering foi o fundador da terr´ıvelGestapo, a pol´ıcia secreta nazista, e que esteve `a frente de terr´ıveis atrocidades durante o holocausto, sendo inclusive indicado, durante a primeira metade da guerra, como um poss´ıvel sucessor do pr´oprio Adolf Hitler. Ele foi capturado em6de maio de1945e, ap´os julgamento no Tribunal de Nurenberg, foi condenado `a forca em 15 de outubro de 1946. Ele cometeu suic´ıdio um dia antes da execu¸c˜ao, ingerindo cianeto de pot´assio.
radioativo. Embora a radia¸c˜ao tenha sido descoberta em 1896por Henri Becquerel e algumas de suas propriedades tenham sido descobertas por Marie Curie em1898, foi por volta de1906que Ernest Rutherford descobriu o decaimento radioativo. A partir de ent˜ao, a ciˆencia n˜ao parou de progredir no campo da data¸c˜ao de f´osseis (que algum dia foram seres orgˆanicos), rochas e objetos manufaturados a partir dos min´erios que s˜ao extra´ıdos das rochas.
Vimos na se¸c˜ao acima a EDO (que alguns autores chamam de modelo matem´atico) y′ = ky para data¸c˜ao, por
decaimento radioativo, de determinado elemento qu´ımico. Comok < 0, adotemosk= −λ, comλ > 0. Vamos adotar, portanto, a EDO
y′ = −λy,
sendoλaconstante de decaimento radioativo do elemento qu´ımico ey=y(t)a quantidade de ´atomos radioativos do elemento na amostra no instantet.
Primeiro passo:Como calcularλ?
Lembremos que otempo de meia-vida de um elemento qu´ımico´e o tempo necess´ario para que a metade dos ´atomos do elemento qu´ımico na amostra deixe de ser radioativa.
Suponhamos quey(t0) =y0 seja a quantidade de ´atomos radioativos no instantet0.
Logo, temos que resolver oproblema de valor inicial
y′ = −λy
y(t0) =y0 (1)
Resolvendo:
dy
dt = −λy⇒ 1 y
dy
dt = −λ⇒
Z
1 y
dy
dtdt=
Z
(−λ)dt⇒
Z
1
ydy=
Z
(−λ)dt⇒ln(|y|) = −λt+k1⇒y(t) =k2e−λt.
Assim,
y0=k2e−λt0 ⇒k2=
y0
e−λt0.
Logo,
y(t) = y0 e−λt0e
−λt=y
0e−λ(t−t0). (2)
Se fizermost=t1tal que yy(t01) = 12, temos quet1−t0´e o tempo de meia-vida do elemento qu´ımico. Assim,
1
2 =e
−λ(t1−t0)
⇒t1−t0=
ln(2)
λ ,
ou seja,
t1−t0=∼
0, 6931
λ .
Desta forma, sabendo-se o tempo de meia-vida do elemento qu´ımico, podemos determinarλ.
Observa¸c˜ao: a unidade de medida deλ´e(unidade de tempo)−1.
Exemplos: Tempo de meia-vida de: Is´otopo Chumbo-210: 22anos. Is´otopo Carbono-14: 5.730anos.
Is´otopo Urˆanio-238: 4.500.000.000 anos. (urˆanio ´e o elemento de maior n´umero atˆomico que encontramos na natureza)
Segundo passo:Como calculart−t0? (“idade” da amostra a partir det0)
Temos por(2)que
t−t0=
lny0
y
λ .
Assim, se soubermosλ,y(t)(quantidade de ´atomos radioativos de um determinado elemento qu´ımico em uma amostra no instantet) e y0(o mesmo no instantet0), saberemost−t0.
Rochas e min´erios contˆem uma pequena quantidade de Urˆanio-238, que ´e um is´otopo de urˆanio inst´avel e que se desintegra segundo a cadeia abaixo:
238
92 U−Urˆanio-238
42α
−→
4,5bilh˜oes de anos 234
90 Th−T´orio-234
0−1β
−→
24dias 234
91 Pa−Protact´ınio-234
0−1β
−→
1,2minutos
234
92 U−Urˆanio-234
42α
−→
200.000anos 230
90 Th−T´orio-230
42α
−→
80.000anos 226
88 Ra−R´adio-226
42α
−→
1600anos
222
86 Rn−Radˆonio-222
42α
−→
3,8dias 218
84 Po−Polˆonio-218
42α
−→
3minutos 214
82 Pb−Chumbo-214
0
−1β
−→
27minutos
214
83 Bi−Bismuto-214
0
−1β
−→
20minutos 214
84 Po−Polˆonio-214
42α
−→ menos de1segundo
210
82 Pb−Chumbo-210
0
−1β
−→
22anos
210
83 Bi−Bismuto-210
0
−1β
−→
5dias 210
84 Po−Polˆonio-210
42α
−→
138dias 206
82 Pb−Chumbo-206
(n˜ao-radioativo)
Observa¸c˜ao. A nomenclatura utilizada acima ´e
n´umero de massa
n´umero atˆomico Elemento,
sendo:
→n´umero atˆomico =n´umero de pr´otons = n´umero de el´etrons.
→n´umero de massa =n´umero de pr´otons + n´umero de neutrons.
→ 42α´e part´ıcula a chamada part´ıculaalfa (ou n´ucleo de h´elio42He), composta por dois pr´otons e dois neutrons que
s˜ao emitidos do n´ucleo.
→ 0−1β´e part´ıculabeta, (ou el´etron 0−1e), composta, naturalmente, por um el´etron. Nesse processo, um neutron se
transforma em um pr´oton e um el´etron. O el´etron ´e emitido do n´ucleo.
Um determinado pigmento (corante) branco chamado dealvaiade (ou ´oxido de chumbo, ou ainda chumbo branco) ´e usado pelo menos por mais de2.000anos em tintas usadas para pinturas de obras de arte. O alvaiade ´e feito a partir do chumbo (metal) que, por sua vez, ´e obtido do min´erio de chumbo por um m´etodo chamado redu¸c˜ao ou fundi¸c˜ao que visa separar o metal do res´ıduo (chamado de lava).
Esse processo elimina de 90 a 95 por cento do R´adio-226 e seus descendentes radioativos presentes no min´erio, exceto o Chumbo-210 que se agrega ao Chumbo-206 (metal).
Desta forma, pinturas contˆem Chumbo-210 e uma pequena quantia de R´adio-226.
Logo, ´e natural tomar o Chumbo-210 como elemento qu´ımico usado na data¸c˜ao das obras de arte.
Quarto passo:em obras de arte, nossa equa¸c˜ao n˜ao ´e homogˆenea...
Se o alvaiade n˜ao contivesse R´adio-226, poder´ıamos usar a equa¸c˜ao(1)para a data¸c˜ao.
No processo de fabrica¸c˜ao do alvaiade, o Chumbo-210original ficou, mas o que mantinha o suprimento de Chumbo-210 n˜ao, exceto por uma pequena quantia proveniente do R´adio-226.
(Na natureza, as taxas de desintegra¸c˜ao de todos os elementos radioativos do min´erio de chumbo em um per´ıodo de tempo “pequeno” eram mantidas constantes devido ao suprimento de Urˆanio-238, cuja taxa de desintegra¸c˜ao ´e muito pequena)
Assim, se y(t)´e a quantidade de Chumbo-210em um grama de alvaiade na obra de arte no instante ter(t)´e a taxa de desintegra¸c˜ao do que restou do R´adio-226 no instantet, temos:
y′(t) = −λy(t) +r(t). (3)
(r(t)´e medida em n´umero de ´atomos de R´adio-226 desintegrados em Chumbo-210 por grama por minuto - note que o tempo de desintegra¸c˜ao do Radˆonio-222 at´e o Chumbo-210 ´e muito pequeno comparado ao tempo considerado na data¸c˜ao)
Ainda: λ ´e a constante de desintegra¸c˜ao radioativa do Chumbo-210 e y(t0) = y0 ´e a quantidade de ´atomos de
Chumbo-210no instante de fabrica¸c˜ao do alvaiade.
Sejay=y+x, sendoy(t)quantidade de Chumbo-210proveniente da fabrica¸c˜ao do alvaiade no instantetex(t) a quantidade de Chumbo-210 proveniente do pouco que restou do R´adio-226no instantet. Logo,
y′=y′+x′ =y′+r(t)⇒y′= −λy+r(t).
Mas a quantidade de Chumbo-210que vem do R´adio-226´e muito pequena (pois, al´em da quantidade deste ´ultimo ser pequena, o tempo de meia-vida do R´adio-226´e de1.600anos). Logo,y=∼ ye temos a equa¸c˜ao(3).
Como o interesse ´e analisar obras de arte que possuam por volta de300anos, consideremos quer(t) =r(constante) nesse per´ıodo (isso ´e razo´avel devido ao longo per´ıodo de meia-vida do R´adio-226).
Logo, a equa¸c˜ao fica
y′(t) = −λy(t) +r⇒y′+λy=r. (4)
Quinto passo: resolvendo a equa¸c˜ao:
Usando o fator de integra¸c˜aov(t) =eRλdt =eλt+k, temos que a equa¸c˜ao(4)possui solu¸c˜ao y(t) = 1
eλt+k
Z
eλt+krdt=e−λtr
eλt
λ +c
= r
λ +cre
−λt.
Dey0=y(t0)temos
y0=
r
λ+cre
−λt0
⇒c= y0e
λt0
r −
eλt0
λ .
Assim,
y(t) = r
λ +
y0eλt0
r −
eλt0
λ
re−λt= r
λ+y0e
−λ(t−t0)− re
−λ(t−t0)
λ ⇒
y(t) = r
λ 1−e
−λ(t−t0)+y
0e−λ(t−t0) (5)
que ser´a o modelo matem´aticopara data¸c˜ao de quadros de Vermeer e de Van Meegeren.
Sexto passo: e agora?
Note que se soubermosy(t),r,λey0, saberemost−t0 em(5), que ´e a idade do quadro.
Temos que y(t), r s˜ao f´aceis de determinar experimentalmente a partir do alvaiade do quadro. Temos tamb´em queλpode ser obtido do primeiro passo, uma vez que a meia-vida do Chumbo-210´e conhecida (22anos).
J´a y0 ir´a depender da concentra¸c˜ao original de Urˆanio-238 - que pode variar de 0, 00027% at´e3%. Portanto, y0
ir´a depender da concentra¸c˜ao de R´adio-226no min´erio de chumbo que foi utilizado para fabricar o alvaiade.
Medindo a taxa de desintegra¸c˜ao de R´adio-226 em diversas amostras de alvaiade feitos de min´erio de chumbo de jazidas do v´arios locais no mundo, temos que esta pode variar de0, 18at´e140desintegra¸c˜oes por grama por minuto. Conclus˜ao: a menos que saibamos de onde prov´em o alvaiade dos quadros, ´e imposs´ıvel, por esse modelo, datar com relativa precis˜ao os quadros.
S´etimo passo:Ser´a que perdemos tempo?
No entanto, para quadros que foram confeccionados a mais de trezentos anos, podemos brincar mais um pouco com a equa¸c˜ao(5).
Suponhamos que a idade do quadro que queremos datar seja de300anos. Ser´a que a equa¸c˜ao(5)conduzir´a a um absurdo se o quadro tiver 20 anos? (lembre-se que no caso das obras de arte de Van Meegeren, a data¸c˜ao ocorreu vinte anos (1967) depois de sua morte em1947).
Assim, trabalhando com o tempo em minutos, temos
λy0=λy(t)e300(525.600)λ−r
e300(525.600)λ−1. (6) A taxa de desintegra¸c˜ao do Chumbo-210, depois de22anos, ´e aproximadamente igual `a taxa de desintegra¸c˜ao do Polˆonio-210 (que ´e suprimido justamente pelo Chumbo-210, pois sua meia-vida ´e muito curta). Logo, podemos obter y(t)a partir da taxa de desintegra¸c˜ao do Polˆonio-210.
Observa¸c˜ao: O que ´e mensur´avel na pr´atica n˜ao ´e quantidade de ´atomos de um determinado elemento, mas sim a quantidade de radia¸c˜ao α4
com radia¸c˜ao alfa. Por esse motivo, precisamos analisar o Polˆonio no lugar do Chumbo, que s´o emite radia¸c˜ao beta e, portanto, n˜ao ´e mensur´avel na pr´atica. J´a no caso dern˜ao h´a problema, pois o R´adio-226emite radia¸c˜ao alfa.
No caso do quadro “The disciples at Emmaus”, a taxa de desintegra¸c˜ao do Polˆonio-210´e 8, 5´atomos por grama por minuto de alvaiade e a taxa de desintegra¸c˜ao do R´adio-226´e de0, 8´atomos por grama por minuto de alvaiade.
Mas,λy(t) = −y′(t) =8, 5(a taxa do Chumbo-210´e igual a taxa do Polˆonio-210).
Temosr=0, 8. Temosλ= tln(2)
1−t0 =
ln(2)
22×525.600min.
Logo, a equa¸c˜ao(6)fica:
λy0=8, 5e
300(525.600)ln(2)
22(525.600) −0, 8
e30022(525.600(525.600)ln()2) −1
=98.050;
ou seja, a taxa de desintegra¸c˜ao do Chumbo-210 no momento da fabrica¸c˜ao do alvaiade seria de98.050 ´atomos por grama de alvaiade por minuto.
Oitavo passo:o que significay′(t0) = −98.050?
A taxa de desintegra¸c˜ao do Chumbo-210 original ´e a mesma taxa de desintegra¸c˜ao do Urˆanio-238 original do min´erio, pois ´e esse ´ultimo que mant´em a taxa do Chumbo-210 na natureza, devido `a sua enorme meia-vida. Logo,
y′(t0) =z′(t0) = −λU238z0,
sendoz0a quantidade de Urˆanio-238 por grama do min´erio de chumbo.
Temos
z0=
98.050
ln(2) (4,5×109)×525.600
=3, 346×1020
´atomos por grama de min´erio de chumbo.
Nono passo:e da´ı que em cada grama do min´erio de chumbo pode haver3, 346×1020 ´atomos de Urˆanio-238?
Sabemos dos conceitos de qu´ımica b´asica que 6, 02×1023 ´atomos de Urˆanio-238 tˆem massa238 gramas. Assim,
temos que 3, 346×1020 ´atomos tem massa 238(3.346×1020)
6.02×1023 =0, 132gramas.
Logo, um grama do min´erio de chumbo utilizado para fabricar o alvaiade do quadro “The disciples at Emmaus” possuiria0, 132gramas de Urˆanio-238, ou seja, uma concentra¸c˜ao de13, 2% de Urˆanio-238.
Acontece quen˜ao existemin´erio de chumbo com uma concentra¸c˜ao t˜ao elevada de Urˆanio na natureza (no m´aximo temos 3%).
D´ecimo passo:finalmente as conclus˜oes...
Concluimos que o quadro “The disciples at Emmaus” n˜ao pode ser um quadro de300anos. Por outro lado, se fizermost−t0=20anos, chegaremos a concentra¸c˜oes de Urˆanio-238 aceit´aveis.
Tabela de desintegra¸c˜oes dos quadros suspeitos de falsifica¸c˜ao:
Quadro Taxa desintegra¸c˜ao 210
84 Po Taxa desintegra¸c˜ao 22688 Ra
The disciples at Emmaus 8, 5´atomos/grama/min 0, 8´atomos/grama/min
The washing of the feet 12, 6´atomos/grama/min 0, 26´atomos/grama/min
Woman reading music 10, 3´atomos/grama/min 0, 3´atomos/grama/min
Woman playing music 8, 2´atomos/grama/min 0, 17´atomos/grama/min
Lacemaker 1, 5´atomos/grama/min 1, 4´atomos/grama/min
Officer 5, 2´atomos/grama/min 6, 0´atomos/grama/min
Procedimento an´alogo mostra que “The Washing of the Feet” (Lavando os P´es), “Woman Reading Music” (Mulher Lendo M´usica) e “Woman Playing Music” (Mulher Tocando Bandolin) s˜ao falsos tamb´em (pois as taxas de desinte-gra¸c˜ao do 210
84 Po e 22688 Ra s˜ao muito discrepantes), enquanto “Lacemaker” (Rendeira) e “Officer” (Garota Sorrindo)
“The washing of the feet” “Woman reading music” “Woman playing music”
“Lacemaker” “Officer”
Obras reconhecidamente falsificadas por Van Meegeren:
The Woman Taken in Adultery - “falso Vermeer”;
Jesus Amongst the Doctors - “falso Vermeer”;
The Disciples at Emmaus - “falso Vermeer”;
The Washing of the Feet - “falso Vermeer”;
Woman Reading Music - “falso Vermeer”;
Woman Playing Music - “falso Vermeer”;
The Head of Christ - “falso Vermeer”;
The Last Supper, 1st. version - “falso Vermeer”;
The Last Supper, 2nd. version - “falso Vermeer”;
The Blessing of Jacob - “falso Vermeer”;
Man and Woman at a Spinet - “falso Vermeer”;
Interior with Cardplayers - “falso Pieter de Hoogh”;
Interior with Drinkers - “falso Pieter de Hoogh”;
Portrait of a Man - “falso Terborgh”;
Woman Drinking - “falso Frans Hals”.
1.7
Problemas Envolvendo a
Lei de Resfriamento de Newton
A Lei de Resfriamento de Newton ´e o princ´ıpio, verificado em laborat´orio, segundo o qual a taxa de resfriamento de um corpo, por unidade de tempo, ´e proporcional `a diferen¸ca entre a temperatura do corpo e a temperatura constante do meio em que o corpo se encontra.
Fa¸camosT =T(t)a temperatura do corpo no instantet,Taa temperatura constante do ambiente no qual o corpo
est´a inserido e y=y(t) =T(t) −Taa diferen¸ca entre a temperatura do corpo e do ambiente no instantet.
Observando quey′=T′, temos queyse enquadra em um problema envolvendo a Lei de Varia¸c˜ao Exponencial, ou
seja,y′=ky, cuja solu¸c˜ao ´ey=Aekt. Substituindo, temos a EDOT′=k(T −T
Exemplo. Um ovo cozido a98◦C´e colocado em uma pia com ´agua a18◦C. Ap´os 5minutos a temperatura do ovo ´e
de 38◦C. Supondo que a temperatura da ´agua da pia n˜ao tenha aumentado significativamente, quanto tempo levar´a
para o ovo chegar a20◦C?
Resolu¸c˜ao.
SejaT =T(t)a temperatura no ovo no instantet, comtmedido em minutos. SejaTa=18a temperatura, em graus Celsius, da ´agua.
Al´em disso,T(0) =98eT(5) =38. Queremost1tal queT(t1) =20.
Pela Lei de Resfriamento de Newton temosT′ =k(T−T
a), cuja solu¸c˜ao ´eT =Aekt+Ta.
DeT(0) =98temos
T(t) =Aekt+Ta⇒98=Aek0+18⇒A=80.
DeT(5) =38temos
T(t) =80ekt+Ta⇒38=80ek5+18⇒k=
ln(0, 25)
5 .
Assim,
T(t) =80eln(0,255 )t+18.
ComoT(t1) =20temos
T(t1) =20⇒80e
ln(0,25)
5 t1+18=20
⇒ ln(0, 25)
5 t1=ln
1 40
⇒t1=
5ln 1
40
ln(0, 25) =∼ 13, 3minutos.
1.8
Equa¸
c˜
oes Diferenciais Ordin´
arias Exatas
Toda EDO’s de 1a. ordemy′ =F(y, x), sendoy=y(x), pode ser escrita como
y′ = −MN((x,yx,y)). Portanto, dydx = −MN((x,yx,y)), o que significa:
M(x, y)dx+N(x, y)dy=0 .
Dizemos que uma EDO M(x, y)dx+N(x, y)dy = 0 ´e exata quando existir uma fun¸c˜ao u = u(x, y) cont´ınua e
deriv´avel tal que
∂u
∂x(x, y) =M(x, y) ∂u
∂y(x, y) =N(x, y)
Uma EDO exata pode ser resolvida facilmente. Observe:
M(x, y)dx+N(x, y)dy=0⇒
∂u
∂x(x, y)dx+ ∂u
∂y(x, y)dy=0⇒ ∂u
∂x(x, y) dx dx+
∂u ∂y(x, y)
dy dx=
0 dx⇒ ∂u
∂x(x, y) dx dx+
∂u ∂y(x, y)
dy dx=0
Mas,
∂u ∂x(x, y)
dx dx+
∂u ∂y(x, y)
dy dx =
du dx(x, y)
pela Regra da Cadeia para fun¸c˜oes de duas vari´aveis (lembre-se queu´e, na verdade, fun¸c˜ao dexapenas). Assim, quandoy=y(x)temos:
du
dx(x, y) =0⇒ u(x, y) =k
sendokconstante.
Se for poss´ıvel, isolamosyemu(x, y) =ke obtemos uma solu¸c˜ao expl´ıcita da EDO.
Teorema. Uma EDO de1a. ordemy=F(y, x)escrita na formaM(x, y)dx+N(x, y)dy=0comMeNcont´ınuas
e deriv´aveis em um retˆanguloD= ]a, b[×]c, d[´e exata se, e somente se,
∂M
∂y (x, y) = ∂N
∂x (x, y).
(demonstra¸c˜ao: ver livro do Martin Braun, p´ag. 67 e 68)
Exemplo 1. Resolver a EDOy′ = −ycos(x)+2xey
sen(x)+x2ey+2. Se poss´ıvel explicitary=y(x). Resolu¸c˜ao.
Temos(ycos(x) +2xey)dx+ sen(x) +x2ey+2
dy=0, ou seja:
M(x, y) =ycos(x) +2xey
N(x, y) =sen(x) +x2ey+2 ⇒
∂M
∂y (x, y) =cos(x) +2xey ∂N
∂x (x, y) =cos(x) +2xe y ⇒
∂M
∂y (x, y) = ∂N ∂x (x, y)
Portanto, a EDO ´e exata (teorema). Logo, existeu=u(x, y)tal que ∂u
∂x(x, y) =M(x, y)e ∂u
∂y(x, y) =N(x, y). Logo,
∂u
∂x(x, y) =ycos(x) +2xe
y (1) ∂u
∂y(x, y) =sen(x) +x2ey+2 (2)
Da Equa¸c˜ao(1):
u(x, y) =ysen(x) +x2ey+g(y)⇒∂u
∂y(x, y) =sen(x) +x
2ey+g′(y)
que, comparada com a Equa¸c˜ao(2), fornece:
g′(y) =2⇒g(y) =2y+d
Portanto:
u(x, y) =ysen(x) +x2ey+2y+d
Como paray=y(x)temos u(x, y) =k, chegamos aysen(x) +x2ey+2y+d=k, ou seja,
ysen(x) +x2ey+2y=c.
Infelizmente n˜ao d´a para isolar oyna express˜ao acima, entretanto, se tivermos uma condi¸c˜ao inicial, encontramos a constante ce, para cada valor da vari´avel independentex, ´e poss´ıvel encontrary=y(x)numericamente.
Exemplo 2. Resolver a EDOy′ = − yx+6x
ln(x)−2, sendox > e
2. Se poss´ıvel explicitary=y(x).
Resolu¸c˜ao.
Temos yx+6x
dx+ (ln(x) −2)dy=0, ou seja:
M(x, y) = yx +6x N(x, y) =ln(x) −2 ⇒
∂M
∂y (x, y) = 1 x ∂N
∂x (x, y) = 1 x
⇒ ∂M∂y (x, y) = ∂N ∂x (x, y)
Portanto, a EDO ´e exata (teorema). Logo, existeu=u(x, y)tal que ∂u
∂x(x, y) =M(x, y)e ∂u
∂y(x, y) =N(x, y). Logo,
∂u
∂x(x, y) = y
x+6x (1) ∂u
∂y(x, y) =ln(x) −2 (2)
Da Equa¸c˜ao(1):
u(x, y) =yln(x) +3x2+g(y)⇒ ∂u
∂y(x, y) =ln(x) +g′(y)
que, comparada com a Equa¸c˜ao(2), fornece: