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COMPLEXIDADE, APRENDIZAGEM E MEDO: BASES BIOLÓGICAS DAS EMOÇÕES E SENTIMENTOS E A PROBLEMÁTICA EDUCACIONAL DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

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DUGLAS WEKERLIN FILHO

COMPLEXIDADE, APRENDIZAGEM E MEDO: BASES BIOLÓGICAS DAS EMOÇÕES E SENTIMENTOS E A PROBLEMÁTICA EDUCACIONAL

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

SÃO PAULO

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DUGLAS WEKERLIN FILHO

COMPLEXIDADE, APRENDIZAGEM E MEDO: BASES BIOLÓGICAS DAS EMOÇÕES E SENTIMENTOS E A PROBLEMÁTICA EDUCACIONAL

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do Título de Doutor em Educação sob a orientação da Profª Doutora Maria Cândida Moraes.

SÃO PAULO

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BANCA EXAMINADORA

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DEDICATÓRIA

À minha mãe, que sempre me deu carinho, afeto e amor, e sem a qual eu nada seria, pois sempre me acolheu nos momentos mais difíceis de minha vida.

Ao meu amigo Rodnei Moares Marietto, pelo cuidado dispensado a mim nos momentos diários de nossas vidas.

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AGRADECIMENTOS

À minha amiga Gilvânia Bertolini, que não me deixou sentir fraco nos momentos em que minhas forças diminuíam.

À minha orientadora, Maria Cândida Moraes, pela paciência, pela dedicação, pela solicitude e pelo cuidado.

Ao Prof. Joaquim Gilberto de Oliveira, pela amizade e compreensão no momento da minha formação.

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RESUMO

WEKERLIN FILHO, Duglas. Complexidade, aprendizagem e medo: bases

biológicas das emoções e sentimentos e a problemática educacional. Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo. 2007. 135p. Tese de doutorado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2007.

Este trabalho tem como objetivo produzir um referencial teórico atualizado das bases biológicas das emoções, dos sentimentos e do medo, para que possam ser mais bem compreendidas as questões relacionadas à violência nos ambientes escolares, permitindo propor recomendações para que a violência seja menos freqüente e atinja menos pessoas que convivem nesses ambientes. O trabalho traz dados relacionados às diferentes formas de violência que ocorrem nas escolas públicas e particulares da educação básica e um caso na educação universitária, bem como as conseqüências dessa violência em relação à saúde mental dos professores. Para levantamento dos dados foi realizada uma pesquisa de observação direta, na forma de entrevista, bem como uma pesquisa bibliográfica sobre complexidade, diálogo, organização, sistemas, emergências, emoções, sentimentos, medo e violência escolar. Para a complementação das informações obtidas, foi realizada uma pesquisa documental a partir de quatro programas veiculados pela Rádio B-SP sobre a violência escolar em escolas de São Paulo e do Rio de Janeiro. Este trabalho contribui para um melhor encaminhamento e compreensão das questões conflituosas ocorrentes nas mediações de aprendizagem, para que possam ser trabalhadas nos diferentes ambientes escolares e para que as pessoas que neles convivem sintam-se mais bem acolhidas e cuidadas. Propõe também condições para o desenvolvimento de suas potencialidades como seres humanos, eternamente aprendentes.

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ABSTRACT

WEKERLIN FILHO, Duglas. Complexity, learning and fear: biological bases of emotions and feelings and the educational problematic. Program for Post-Graduation in Education: Curriculum. 2007. 135p. Doctoral Thesis. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2007.

This work aims to produce an updated theoretical reference of the biological bases of emotions, feelings and fear so that the issues related to violence in school environments can be better understood, allowing the proposal of recommendations in order to make violence become less frequent and reach less those living in these environments. This work brings data related to different forms of violence that occur in public and private schools of basic education and college education in one case, as well as data related to the consequences of such violence on the mental health of teachers. In order to collect the data, a direct observation research was conducted in the form of the interview of a teacher who has been working in the field of University Education for 37 years. Besides, a bibliographic research was done about complexity, dialogue, organization, systems, emergencies, emotions, feelings, fears and school violence. Aiming to complement the research, a documental research was conducted based on four programs presented by Radio B-SP about school violence at schools in Sao Paulo and Rio de Janeiro. This work gives a social contribution in the sense that conflicting issues in the mediation of learning can be approached in different school environments and that people who live in them can feel welcomed, can develop their potential as human beings and can learn more and better.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 9

1.1 ORIGEM DO PROBLEMA ... 9

1.2 QUESTÃO DA PESQUISA ... 13

1.3 OBJETIVO GERAL ... 13

1.4 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 13

1.5 DELIMITAÇÕES... 14

1.6 RELEVÂNCIA CIENTÍFICA E SOCIAL ... 15

1.7 ABORDAGEM METODOLÓGICA... 16

1.7.1 Pesquisa Qualitativa... 16

1.7.2 Procedimentos Metodológicos e Técnicas de Produção dos Dados para a Realização do Estudo ... 18

1.8 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA ... 21

2 REFERENCIAIS TEÓRICOS... 23

2.1 COMPLEXIDADE... 23

2.1.1 O Diálogo ... 27

2.1.2 Organização ... 30

2.1.3 Sistemas... 34

2.1.4 Emergência ... 39

2.2 EMOÇÃO E SENTIMENTO SEGUNDO DAMÁSIO (1996, 2000, 2004) ... 43

2.2.1 Emoção ... 44

2.2.1.1 Emoções de fundo ... 46

2.2.1.2 Emoções primárias (básicas)... 48

2.2.1.3 Emoções sociais (secundárias) ... 49

2.2.2 Sentimentos ... 50

2.2.2.1 Variedade de sentimentos ... 57

2.2.2.2 Da emoção ao sentimento consciente... 60

2.2.2.3 Para que servem os sentimentos? ... 62

2.2.2.4 Sentimentos e educação ... 66

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2.3.1 Condicionamento do Medo (LEDOUX, 2001) ... 71

2.3.2 Condicionamento pelo Medo Contextual (LEDOUX, 2001) ... 75

2.3.3 A Memória do Medo pode ser Apagada do Cérebro?... 76

2.3.4 Para Finalizar ... 79

2.4 VIOLÊNCIA ESCOLAR ... 81

2.5 PRINCÍPIOS INTERDISCIPLINAR E TRANSDISCIPLINAR ... 87

2.5.1 Interdisciplinaridade ... 88

2.5.2 Transdisciplinaridade ... 92

3 APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS... 102

3.1 DA ENTREVISTA... 102

3.2 DA PESQUISA DOCUMENTAL REFERENTE AOS PROGRAMAS APRESENTADOS PELA RÁDIO B-SP E SOBRE OS TEXTOS SOBRE VIOLÊNCIA ESCOLAR ... 107

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 121

RECOMENDAÇÕES... 124

REFERÊNCIAS... 128

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1 INTRODUÇÃO

Atualmente temos presenciado cenas relacionadas à educação que deixam os educadores extremamente preocupados. Muitos são os casos de agressão física e moral nas escolas, e isso acaba por gerar um desconforto nas pessoas que freqüentam os ambientes educacionais, uma vez que a escola, por essência, deve ser um local onde as pessoas vão porque gostam e para saber mais e melhor.

A seguir serão descritas as situações, no âmbito escolar, que suscitaram a necessidade de uma pesquisa sobre as emoções, sentimentos, medo, complexidade e transdisciplinaridade.

1.1 ORIGEM DO PROBLEMA

As escolas, atualmente, têm sofrido críticas devido ao fato de os alunos demonstrarem, crescentemente, insatisfação por freqüentá-las. Eles vão à escola mais por obrigação do que por vontade. Este fato tem preocupado pesquisadores em educação, brasileiros e internacionais, que estão estudando esse fenômeno, pois o mesmo não está ocorrendo apenas no Brasil.

Verifica-se que muitas escolas têm o ensino ainda centrado no professor, ou seja, este é o transmissor das informações necessárias para que os alunos aprendam. Em conseqüência, o papel dos alunos, na maioria das vezes, é de ouvinte e de repetidor de modelos. Seu envolvimento na aprendizagem é pobre e cansativo, pois eles ficam sentados por horas apenas ouvindo e, em seguida, fazem uma série de exercícios.

Isso já foi comentado ad nauseam por muitos pesquisadores em educação, entre eles D'Ambrósio (2007, p.1), que retrata de forma contundente como estão muitas escolas em relação ao processo de aprendizagem. "O programa tradicional é

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D'Ambrósio (2007) alerta sobre como as escolas estão contribuindo para a limitação da imaginação dos alunos, fato que deve ser considerado, haja vista o imaginário, a curiosidade, a intuição e a criatividade serem integrantes do pensamento humano, devendo ser desenvolvidos e não tolhidos.

Ainda pior são os modismos presentes no processo educacional e que trazem sérias preocupações, em razão da volatilidade dos mesmos.

Hoje percebemos que, de modo geral, as emoções e os sentimentos estão sendo tratados, nas escolas, superficialmente, o que tem gerado muitas confusões, deixando professores e alunos desamparados no processo educacional que se desenvolve diariamente nas escolas. Vê-se que os conceitos de emoção e sentimento são confundidos. Há um reducionismo flagrante, ou seja, as atividades passam a ser padronizadas, o que faz com que os desiguais sejam tratados de maneira igual.

Esse reducionismo tem ocorrido porque as escolas precisam se adequar ao mercado educacional do século XXI. A partir disso realizam-se mudanças, sem que haja as necessárias atualizações dos processos e das pessoas que convivem nesses ambientes educacionais.

As escolas querem implantar à força inovações num processo que não foi reconstruído, apenas colocou-se algo a mais. Porém, este não cabe, gerando muitos conflitos que não são resolvidos e que interferem no presente dos alunos e que interferirão na vida futura. Percebe-se a contradição performativa1

presente nessas situações.

Nessa tentativa de inovação verifica-se que professores e alunos ficam à mercê de si mesmos num processo que cada dia mais degrada a qualidade de vida das pessoas que freqüentam e desenvolvem atividades nas escolas. Os fatos apontados anteriormente podem ser vistos nos jornais, em programas de entrevistas e em revistas especializadas.

1 Contradição Performativa de Apel: segundo Apel e Habermas, todo questionamento é, por definição,

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Outro fato importante que deve ser analisado é que, em relação aos professores, tem aumentado significativamente a incidência de transtornos mentais. Isto pode ser comprovado pelas informações publicadas pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo, e que são alarmantes, ao constatarem que cerca de 50% dos professores da rede estadual estão acometidos por algum tipo de transtorno mental (APEOESP, 2006).

As situações demarcadas anteriormente não são novas para mim, pois durante os 30 anos em que sou professor, da educação básica à educação universi-tária, sempre me deparei com casos conflituosos em relação aos professores e alunos.

Nesse meu trajeto percebi várias situações que me marcaram profun-damente, em relação aos professores que ficaram à mercê de si mesmos e acabaram cometendo atos impensados, gerando desconforto, demissão e processos contra eles, os quais, nos casos mais graves acabaram por ser internados em clínicas psiquiátricas. Da mesma forma, presenciei alunos serem taxados de marginais, de maus elementos, de vagabundos, e que acabaram por ser retirados das escolas, negando-se a eles o direito universal da educação. Além disso, vi-os se revoltarem contra as instituições que freqüentavam e cometerem atos absurdos, como queimar o cabelo de uma professora de matemática, explodir os vasos sanitários do banheiro dos professores e atear fogo em uma capela.

Em outro momento tive a oportunidade de trabalhar em uma escola confes-sional e ecológica, por vinte anos, e perceber que as crianças e adolescentes necessitam ser aceitos e que haja atividades nas quais eles possam se desenvolver de acordo com a sua geração, porém nunca se esquecendo do belo, do corpo, do coração, do afeto. Consegui expressar essa situação no pensamento abaixo.

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A partir das situações comentadas senti necessidade de pesquisar como os ambientes escolares podem se tornar lugares em que a violência e os medos sejam enfraquecidos e que as pessoas possam expressar a afetuosidade caracte-rística de nós, seres humanos, e mais ainda, que as pessoas possam fazer parte do mundo atual, que passa por um momento histórico de crises, e não abdiquem da individualidade, da dignidade e das diferenças que nos marcam profun-damente como pessoas. E que as escolas sejam um ambiente em que predomine o bem-estar.

Cabe ainda considerar a animalidade do Homo sapiens, que muitas vezes é deixada de lado, mas que freqüentemente demonstra os estigmas da nossa evolução no dia-a-dia, como bem nos lembra o evolucionista Robert Trives, professor na Harvard University:

O chimpanzé e os seres humanos compartilham 99,5% de sua história evolutiva, no entanto a maioria dos pensadores humanos considera uma excentricidade malformada e irrelevante, enquanto se vêem a si próprios como degraus para o Todo-poderoso. Para um evolucionista isto não pode ocorrer. Não há fundamento objetivo para elevar uma espécie acima de outra (TRIVERS, 2001, p.15).

Nessa mesma forma de pensar vai o etólogo Rirchard Dawkins:

[...] Até agora não falei muito a respeito do homem em especial, embora tampouco o tenha deliberadamente excluído. Parte do motivo por eu ter usado o termo ‘máquina de sobrevivência’ é que ‘animal’ teria excluído as plantas e, para algumas pessoas, os seres humanos (DAWKINS, 2001, p.211).

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1.2 QUESTÃO DA PESQUISA

ƒ É possível, mediante uma construção teórica, científica, competente e atualizada das bases biológicas das emoções, dos sentimentos e do medo, compreender melhor as questões relacionadas à violência ocorrente nos ambientes educacionais e propor recomendações capazes de colaborar com os processos de ensino e de aprendizagem, com vistas a minimizar esta grave problemática?

1.3 OBJETIVO GERAL

ƒ Construir uma base teórica atualizada sobre as bases biológicas das emoções, dos sentimentos e do medo e propor recomendações, sob o olhar da complexidade e da transdisciplinaridade, para a superação do mal-estar e do sofrimento que atinge grande parte da comunidade docente.

1.4 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

ƒ Construir uma fundamentação teórica e atualizada sobre a temática em estudo, capaz de elucidar a problemática relacionada à violência presente nos ambientes educacionais.

ƒ Identificar emoções e sentimentos como bases biológicas condicionantes da aprendizagem.

ƒ Descrever os processos biológicos das emoções, dos sentimentos e do medo.

ƒ Identificar a ocorrência da violência educacional nos documentos em estudo.

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1.5 DELIMITAÇÕES

a) Atualmente muitos estudos têm sido realizados em relação às emoções, sentimentos, memórias, cognição humana, complexidade e transdiscipli-naridade. No presente estudo, optou-se, como autores principais, por Antônio Damásio, Humberto Maturana, Maria Cândida Moraes, Edgar Morin, Basarab Nicolescu, Joseph Ledoux, Ubiratan D'Ambrósio e Saturnino de La Torre. Esses autores mantêm um diálogo permanente e coerente entre eles, o que proporciona a fundamentação teórica da presente pesquisa.

b) O presente estudo relaciona emoções e sentimentos como sendo fenômenos de naturezas diferentes, fisiológica e psicologicamente, de acordo com a visão de Antônio Damásio. Reconhece-se que ambos fazem parte do dia-a-dia dos ambientes escolares, nos seus mais diferentes âmbitos, e necessitam ser, urgentemente, trabalhados nesses ambientes.

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1.6 RELEVÂNCIA CIENTÍFICA E SOCIAL

Há um modismo quando se fala de emoção e sentimento em sala de aula. Existem muitos livros que se propõem a fornecer estratégias didáticas para que se possa efetivamente trabalhá-los, porém o que se vê é muita confusão teórica e muita superficialidade, além das intermináveis cópias que propagam as defor-mações conceituais adotadas nas diferentes obras.

A relevância científica está relacionada ao fato de se buscar um entendimento correto do que é emoção e sentimento e de como trabalhá-los em sala de aula, em uma educação transdisciplinar, e que possam ser trabalhadas nas mediações pedagógicas diárias as diferenças individuais.

Em relação às emoções, não podemos deixar de contemplar Humberto Maturana (1997, p.170), que demonstra a importância fundamental das emoções em nossas atividades diárias.

Na vida cotidiana distinguimos as diferentes emoções olhando as ações e posturas ou atitudes corporais do outro, que pode ser um de nós mesmos, pessoa ou animal não-humano. Além disso, sabemos também que na vida cotidiana cada emoção implica em que somente certas ações são possíveis para a pessoa ou animal que as exibem. Por isso afirmo que aquilo que distinguimos como emoções, ou que conotamos com a palavra

emoções, são disposições corporais que especificam a cada instante o domínio de ações em que se encontra um animal (humano ou não), e que o emocionam, como o fluir de uma emoção a outra, é o fluir de um domínio de ações do outro.

Podemos verificar, nas palavras de Humberto Maturana, que as emoções geram domínios de ação, o que significa que elas potencializam ou não determi-nados tipos de ações e reflexões no sujeito aprendiz e que, sendo bem traba-lhadas, ajudam no desenvolvimento cognitivo e emocional dos sujeitos nos ambientes educacionais.

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evidenciados dentro das diferentes culturas. A emoção fundadora da nossa cultura é o medo." (FIALHO, 2001, p.57), e Hilton Japiassu vai mais longe: "Vivemos hoje numa sociedade depressiva ou estressada. Porque individualista e fundada no medo"(JAPIASSU, 2006, p.73).

Em relação aos professores, o que temos presenciado é algo que chega a ser assustador, devido à quantidade de internamentos e licenças médicas que os têm afastado das salas de aula. Não sendo rigoroso, estatisticamente, mas sendo extremamente fiel ao que tem acontecido com os professores, poderíamos dizer que há uma epidemia de doenças relacionadas à saúde mental dos mesmos.

Em relação aos alunos a situação não é melhor, basta ver o aumento da violência dos alunos em relação aos professores, e entre os próprios alunos. Eles vão à escola mais por imposição do que por vontade de aprender, de buscar saber mais e melhor.

1.7 ABORDAGEM METODOLÓGICA

A seguir será apresentada a abordagem metodológica utilizada nesta pesquisa, bem como os procedimentos que foram necessários para o levantamento dos dados para realizar este estudo.

1.7.1 Pesquisa Qualitativa

A temática e o problema foco desta pesquisa, assim como seus objetivos, remetem a um estudo de natureza qualitativa. A opção pela abordagem qualitativa está baseada no interesse de apreender a complexidade do fenômeno e na compreensão de que este não se restringe apenas a dados estatísticos, mas traz, para o interior da análise, o subjetivo e o objetivo dos sujeitos sociais que atuam nas comunidades em que estão inseridos.

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O foco é centralizado no específico, no peculiar, almejando sempre a compreensão do fenômeno estudado, geralmente ligado às crenças, às motivações, aos sentimentos e pensamentos da população estudada (SHMERLING, 1993).

As principais características dos métodos qualitativos são: a imersão do pesquisador no contexto e a perspectiva interpretativa de condução da pesquisa (KAPLAN e DUCHON, 1988).

Em certa medida, os métodos qualitativos se assemelham aos proce-dimentos de interpretação dos fenômenos que empregamos no nosso dia-a-dia, que têm a mesma natureza dos dados que o pesquisador qualitativo emprega em sua pesquisa. Tanto em um como em outro caso, trata-se de dados simbólicos, situados em determinado contexto; revelam parte da realidade ao mesmo tempo em que escondem outra parte.

Maanen (1979, p.521) comenta que:

Para não atravessar uma rua, basta que vejamos se aproximar um caminhão; não é necessário saber o seu peso exato, a velocidade a que corre, de onde vem, etc. Nessa situação, o caminhão pode ser entendido como um símbolo de velocidade e força, e, para a finalidade de atravessar a rua, outras informações seriam prescindíveis.

A citação acima demonstra que há problemas e situações cuja análise pode ser feita sem quantificação de certos detalhes, delimitação precisa do tempo em que ocorrem, o lugar e as causas, e as procedências dos agentes. Tais detalhes, embora obteníveis, seriam de pouca utilidade.

A partir disso os estudos qualitativos diferenciam-se entre si quanto ao método, à forma e aos objetivos. Godoy (1995) ressalta a diversidade existente entre os trabalhos qualitativos e enumera um conjunto de características capazes de identificar uma pesquisa desse tipo, a saber:

ƒ ambiente natural como fonte direta de dados, e o pesquisador como instrumento fundamental;

ƒ caráter descritivo;

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De acordo com as características anteriores, os cientistas da pesquisa qualitativa opõem-se, em geral, ao pressuposto experimental que defende que deve haver um só padrão para todas as ciências, baseado nas ciências da natureza.

Os cientistas experimentalistas não admitem que haja um vínculo indis-sociável entre o sujeito e o objeto, entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito.

O sujeito observador é parte do processo de conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes significado. O objeto não é um dado inerte e neutro, segundo Chizzotti (2001, 2006).

Há uma rede de significados que pode emergir no desenvolver dos fenômenos e que pode ser apreendida pelo pesquisador, o que faz com que ele seja ativo nas descobertas das relações que se ocultam nas estruturas dos fenô-menos que estão sendo estudados. Por isso, geralmente, o processo é mais importante que o produto.

Na pesquisa qualitativa há sempre uma tentativa de capturar a perspectiva dos participantes, isto é, as maneiras como os informantes encaram as questões que estão sendo focalizadas. Ao considerar os diferentes pontos de vista dos participantes, os estudos qualitativos permitem iluminar o dinamismo interno das situações, geralmente inacessível a um observador externo solitário.

1.7.2 Procedimentos Metodológicos e Técnicas de Produção dos Dados para a Realização do Estudo

A pesquisa realizada foi qualitativa, de cunho bibliográfico e documental. Os eixos trabalhados, tanto na pesquisa bibliográfica como na documental, foram: emoções, sentimentos, medo, complexidade e transdisciplinaridade.

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Além da pesquisa bibliográfica, fez-se também o uso de pesquisa documental, como fonte de natureza secundária, portanto, produzida por terceiros, no caso a Rádio B-SP. Para tanto, foram utilizados os quatro programas produzidos por esta emissora, nos quais se encontram diversos e elucidativos depoimentos de professores. A partir destes, foi feita uma análise para constatar os sentimentos presentes em suas falas, o que ajudou a confirmar a gravidade da problemática.

Para uma melhor compreensão dos fenômenos relacionados a esta temática, foi utilizada também, como técnica de pesquisa, uma entrevista semi-estruturada que muito ajudou na averiguação dos fatos, a partir do depoimento de um professor que vem vivenciando um mal-estar na sua vida acadêmica. Este tipo de entrevista permite estudar os motivos, os sentimentos, a conduta das pessoas (LAKATOS e MARCONI, 1996). Neste sentido, para melhor compreensão da situação vivenciada, das emoções e dos sentimentos envolvidos, foi utilizada, de maneira complementar, a Escuta Sensível de Barbier (1998, 2002), cujos procedimentos estiveram presentes nas atitudes do pesquisador durante todo o processo e que muito ajudou a compreender a complexidade da situação em estudo.

Isto porque, mediante a Escuta Sensível, é possível sentir o universo afetivo, imaginário e cognitivo do outro para compreender, do interior, as atitudes e compor-tamentos, bem como o sistema de idéias, de valores, de símbolos. É uma atuação de dentro para fora. Disso pode surgir a aceitação do outro que está no processo e que é uma das marcas fundamentais da escuta sensível (BARBIER, 1998).

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Isso tudo leva a estabelecer um vínculo entre o indivíduo e o escutador, e as proposições podem ser colocadas com prudência. Essas situações ganham importância nas palavras de Ardoino (apud BARBIER, 1998, p.189) ao dizer: "se trata de emprestar significado, e não impô-lo". Mas para que isso ocorra há que existir uma abertura para a totalidade do outro e de si mesmo. Não podemos perder de vista que alguém só é pessoa por meio de uma razão e de uma afetividade, porém é necessária uma interação constante com o outro e consigo mesmo.

Na escuta sensível colocamo-nos por inteiro, com os nossos sentidos, com a nossa corporalidade, com a simpatia, com a empatia, com a nossa intuição e com as nossas emoções e sentimentos.

A partir do que foi comentado anteriormente podemos afirmar que o pesquisador-escutador está aberto para a totalidade do outro e de si mesmo. Trata-se na verdade de entrar numa relação de totalidades na existência humana.

A escuta sensível permitiu estabelecer um diálogo agradável e sincero com o professor Y, pois ele percebeu a minha preocupação em saber como foi o processo por ele vivenciado na turma em que ele dava aula.

Para realizar a entrevista com o professor universitário que apresentou mal-estar ao desenvolver suas atividades, durante o primeiro semestre de 2006, seguiram-se estes passos:

1. levantamento de informações sobre o professor, pela análise de currículo Lattes e com amigos e colegas de trabalho;

2. meditação sobre as informações, ao som da 9ª sinfonia de Bethoveen; 3. conhecer o entrevistado, trabalhando a simpatia, a empatia, formando

vínculo, sendo aceito pelo professor;

4. elaboração das perguntas para desenvolver o diálogo (Apêndice 1); 5. entrevista - 1ª parte: responder às perguntas;

6. pausa para reflexão de 30 minutos;

7. discussão das respostas com o professor;

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1.8 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA

Os meios de comunicação têm veiculado, ultimamente, muitos casos de violência em escolas públicas, e isso tem deixado as pessoas preocupadas. Porém, essa violência não atinge apenas as escolas públicas; as particulares também padecem do mesmo mal. Pensando nesses fatos, a Rádio B-SP, sob a orientação do jornalista H. B, mestre em História pela USP, produziu uma série de quatro programas sobre a violência escolar, nos quais há depoimentos de profes-sores que foram vítimas de algum tipo de violência relacionada à escola. As entrevistas ocorreram em escolas do Rio de Janeiro e de São Paulo.

Ainda há os comentários de um diretor do documentário “Pro dia nascer feliz", F.T., que trata do desconforto que há nas escolas. Para fazer o documentário foram feitas pesquisas em escolas do ensino médio e fundamental de Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo. O documentário mostra como está a educação pública e privada nesses estados.

As situações anteriores se relacionam com a educação básica, porém a violência também atinge a educação universitária e tem gerado um profundo desconforto nos professores. Um exemplo desse fenômeno, e que foi utilizado nesta pesquisa, é o do doutor em sociologia, prof. Y, que trabalha há 37 anos na educação universitária, na área de gestão ambiental e em um centro de pesquisas ambientais do Estado de São Paulo.

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Foram utilizados ainda textos referentes à violência escolar produzidos pelo Sindicato dos Profissionais do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP), o maior sindicato de professores da América Latina, e os textos das professoras Viviane Cubas e Caren Ruotti sobre violência escolar, as quais desenvolvem pesquisas na Universidade de São Paulo.

Algumas informações quali-quantitativas foram levantadas da pesquisa publicada em dezembro de 2006, na Revista Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, intitulada: Prevalência de transtornos mentais comuns em professores da rede municipal de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, cujas autoras são Sandra Maria Gasparini, Sandhi Maria Barreto e Ada Ávila Assunção.

Outra pesquisa, que serviu para corroborar a anterior, foi a da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, realizada em parceria com o Laboratório de Psicologia do Trabalho da Universidade Federal de Brasília, em 1.440 escolas do País, com 52 mil professores, publicada pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em 2007.

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2 REFERENCIAIS TEÓRICOS

O texto a seguir é formador do corpus teórico desta pesquisa e que contempla os seguintes elementos: complexidade, diálogo, organização, sistemas, emergência, emoção, sentimento, medo, violência escolar e os princípios interdis-ciplinar e transdisinterdis-ciplinar.

2.1 COMPLEXIDADE

Quando se ouve a palavra complexidade, logo vem à mente algo difícil e complicado de ser compreendido.

Segundo Morin (1996, 2001, 2003a, 2003b), complexidade significa aquilo que é tecido junto. Então, o indivíduo e o meio são um só, são produtos e produtores deles mesmos, como os acontecimentos, as ações e as retroações que são tecidos pela nossa realidade e pela trama da vida.

Pensar o complexo é admitir unir conceitos que se opõem e que normalmente seriam enclausurados e com visão limitada. É ser capaz de pensar as contradições, viver com elas e ser capaz de superá-las, mas para isso é necessário saber analisar e sintetizar, é caminhar construindo e reconstruindo, é compreender que há emergência do novo todo o tempo, é ser capaz de viver nas múltiplas realidades que há na vida, diariamente. É compreender que somos uma totalidade que faz parte de uma totalidade maior. É ser capaz de reconhecer que não há razão sem emoção.

O pensar complexo funda-se num pensamento integrador dos diversos modos de pensar e abandona a visão linear que tenta sustentar a ciência tradicional. Pois, esta é insuficiente para lidar com as situações de incerteza que fazem parte da história de vida das pessoas e que estão presentes nas situações de aprendizagem e de conhecimento. É um princípio regulador que não perde de vista a realidade dos fenômenos que constituem a vida diária em nosso planeta.

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nos processos vitais das pessoas, dos animais, da matéria e do Universo. Ela

aumenta com a diversidade de elementos que constituem um sistema.

Então podemos dizer que, quando vemos de forma complexa o

compor-tamento de um sistema, somos nós que o vemos, não o sistema. Como diz Silva

(2005, p.48): "O sistema é uma realidade ontológica, podendo ser vista por outras

ontologias2 que não a minha".

Essa capacidade de ver a complexidade no comportamento de um sistema

é uma episteme, não um conceito. Conceito é o sistema. Episteme é o recurso

cognitivo3 que nos permite construir o contexto dos conceitos que utilizamos, e os

limites de sua aplicação. Ela nos permite a construção de um conhecimento sobre o

mundo que nos rodeia (SILVA, 2005).

A partir disso, Morin (2001, 2003a, 2003b, 2005) afirma que a

complexi-dade faz parte da ordem da razão, isto é, como uma vontade de ter uma visão

coerente dos fenômenos, das coisas e do universo. A razão tem um caráter

eminen-temente lógico, porém necessitamos diferenciar racionalidade de racionalização. A

complexidade admite a racionalidade, mas condena e não assume todos os

excessos saídos da racionalização.

A racionalidade é vista como o diálogo incessante entre as estruturas

lógicas e a aplicação no mundo real.

Há muitos momentos na vida em que o sistema lógico adotado é

insuficiente, pois vislumbra apenas uma parte do real. A racionalidade, de qualquer

modo, não tem a pretensão de fazer surgir a totalidade do real, mas tem muita boa

vontade para dialogar com o que lhe resiste, ou seja, a realidade.

2 Ontologias são as coisas do mundo. Aquilo que possui sua própria natureza e que existe

independentemente de minha cognição e episteme (SILVA, 2005).

3 Cognição é a capacidade biológica do aprender com o operar. Ela, em si é uma complexidade,

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Já a racionalização tem outras características, segundo Morin (2003b,

p.102):

Essa palavra é empregue muito justamente em patologia por Freud e por muitos psiquiatras. A racionalização consiste em querer encerrar a realidade num sistema coerente. E tudo o que, na realidade, contradiz este sistema coerente é desviado, esquecido, posto de lado, visto como ilusão ou aparência.

A racionalidade e racionalização têm a mesma origem, porém ao se desenvolverem tornam-se inimigas uma da outra. É muito difícil saber em que momento se passa da racionalidade para a racionalização; não há fronteira; não há sinal de alarme.

Para sustentar a complexidade na ordem da racionalidade, Edgar Morin

(2003b) propõe três princípios: o dialógico, o recursivo organizacional e o hologramático.

1. Princípio Dialógico:a vida é o maior exemplo, e faz que os inconciliáveis dialoguem numa lógicade complementaridade antagônica.

2. Princípio de Recursão Organizacional: ele sustenta que o fenô-meno complexo é, simultaneamente, produto e produtor de sua

exis-tência. Assim como a sociedade é produzida pelas interações entre os

indivíduos, ela retroage sobre os indivíduos e, uma vez produzida,

produz igualmente estes.

De acordo com Moraes (1997, 2004), a recursividade faz com que a

idéia de causa e efeito não valha para sistemas complexos, pois tudo

que é produzido retorna sobre aquilo que o produziu, de maneira

cíclica, espiralada, em função do processo de auto-organização, no

qual ele mesmo é auto-organizador e autoprodutor.

3. Princípio Hologramático: lembra que a parte está no todo, e o todo está na parte. Buscando um exemplo na Biologia, cada célula do nosso

organismo contém a totalidade do código genético presente em nosso

corpo. Hoje, mais visível ainda são as células-tronco, que podem dar

origem a diferentes tipos de células que constituem o ser humano.

Um exemplo mais contundente pode ser citado. Trata-se do coração

que encontrou o seu assassino. O relato é da psiquiatra que tratou

(27)

Tenho uma paciente, uma menininha de oito anos, que recebeu o coração de uma outra menina, de dez anos, que foi assassinada. A mãe trouxe-a ao meu consultório quando ela começou a gritar à noite por causa de sonhos que tinha com o homem que havia assassinado sua doadora. A mãe dela dizia que a filha sabia quem era o assassino. Ao fim de diversas sessões, eu simplesmente não poderia negar a realidade do que esta criança contava. Finalmente, a mãe dela e eu decidimos chamar a polícia. Servindo-se das descrições fornecidas pela menina, os investigadores localizaram o assassino. Com base nas provas fornecidas por minha paciente, ele foi facilmente condenado. A hora, a arma, o local, as roupas que ele usava, o que a criança assassinada havia lhe dito... tudo que a pequena recipiente de transplante cardíaco relatara era totalmente exato (apud PEARSALL, 1999, p.28).

Pearsall (1999, p.28) comenta sobre a reação dos ouvintes:

A platéia, composta de profissionais de formação científica e clinicamente experientes, permaneceu em silêncio enquanto a terapeuta voltava ao seu lugar. Eu podia ouvir soluços e percebi lágrimas nos olhos dos médicos da primeira fila.

Essa é uma situação que não encontra abrigo na ciência tradicional, mas que pode ser acolhida pelo princípio hologramático da complexidade, ou seja, o coração carregou as informações do todo que representa o ser humano.

Pearsall tornou público esse depoimento somente em 1999, no livro

Memória das Células: a sabedoria e o poder da energia do coração, pois até então era considerado apenas um místico por muitos de seus colegas cientistas. Ele desenvolve pesquisas no campo da cardiologia energética.

De acordo com esses princípios, a complexidade necessita de uma visão sistêmica-organizacional aberta. Ela deve combinar a organização, a informação, a energia, a retroação, as fontes, os produtos e os fluxos do sistema, sem fechar-se em uma clausura para onde pode levar, eventualmente, seu corpo teórico.

(28)

Então, para manter a coerência, a complexidade não destrói as alter-nativas clássicas do pensamento humano, ou seja, não destrói o pensamento analítico, o pensamento reducionista e o pensamento simplificador.

Na verdade, ela tenta restabelecer o diálogo com os pensamentos clás-sicos, com o pensamento simplificado e o pensamento complexo. Deseja a sua complementaridade, compreendendo que a unidade não se opõe à diversidade, nem a quantidade à qualidade, nem um paradigma simplificador se sobrepõe a outro paradigma qualquer. Não é uma coisa nem outra. Muito pelo contrário. É um novo olhar sobre o objeto, um novo olhar articulador, regulador, que ajusta a ação e o pensamento do sujeito sobre o objeto.

A seguir, discutiremos os componentes do pensar complexo que servem de fundamento para esta pesquisa e que serão objeto de análise.

2.1.1 O Diálogo

De acordo com Böhm (2005), diálogo indica a existência de uma corrente de significados que flui entre, dentre e através dos implicados. É a partir dessa corrente de significados que ocorre no interior de um grupo que pode emergir uma nova compreensão. É algo novo e criativo que não se encontra no ponto de partida. É o significado compartilhado que se transforma, em sua plasticidade, em base fundante, que liga e religa, que sustenta o vínculo relacional entre os seres humanos e as sociedades (DEMO, 2005 e MORAES, 2004).

O verdadeiro objetivo do diálogo, segundo Böhm (2005), é o de penetrar no processo de pensamento, e seu espírito verdadeiro seria completamente diferente do espírito de um discurso que vise a um vencedor. Nele ninguém precisa perder, todos podem sair ganhando.

(29)

O criador fez uma coisa maravilhosa, que é podermos olhar a lua nascer, e aqui em Brasília temos este privilégio. Sabemos que o homem branco decifrou este código e no calendário está escrito: dia tal lua nova, lua crescente, lua cheia. Mas o criador não permitiu que descobríssemos quando vamos morrer. E a morte faz parte da vida. Este criador deu aos índios o entendimento para descobrir isso e preparar a qualidade de vida. (apud MORIN, 2000, p.22).

O cacique Marcos Terena argumentou sobre a vida dos índios e sobre a importância que eles dão à qualidade da vida. Ele reconheceu o conhecimento do homem branco, mas acrescenta que há de se ter qualidade no viver diário. Não há agressão, não há imposição de pensamento. Há o reforço da necessidade de se viver junto e com a natureza, e que haja respeito e acolhimento da natureza e das pessoas que nela vivem.

Em outro Momento, Terena dirigiu-se diretamente a Edgar Morin:

Quero também deixar uma mensagem para o professor e dizer que para mim, e em nome da minha tribo e dos meus antepassados, espero que o seu trabalho, a sabedoria que o Criador lhe deu seja científica, mas seja também humana. Porque muitos homens brancos ouvem a sua voz. Nós vamos pedir ao Criador que ele lhe dê a inspiração maior de conversar com as pessoas, de traduzir para elas essa preocupação.

Porque não ser moderno, não ser desenvolvido, não significa ser culturalmente ou intelectualmente pobre. Porque nós, os índios, nascemos com uma sabedoria, um conhecimento, também religioso e espiritual, e quando chegou a civilização nada disso teve valor ou sentido. Porque o homem branco não sabia compreender a linguagem indígena. Alguns políticos transformaram esse conhecimento em belas palavras. Alguns tecnocratas transformaram esses conhecimentos em números para justificar os seus erros. Uma civilização que não deu certo. Nos 500 anos do Brasil, no mínimo, vamos pedir para que o Brasil faça um minuto de reflexão. Que o País desligue seus rádios, televisores e computadores. Que pare um pouquinho, para que possamos construir uma nova expectativa de vida entre os índios e brancos, porque a responsabilidade pelo futuro não é daqueles que vão nascer, mas de nós, que estamos vivos (MORIN, 2000, p.23).

Marcos Terena reconheceu a posição de Edgar Morin como alguém que é ouvido por muitos e com o qual muitos concordam. Mas pediu a ele que não seja apenas cientista, mas que fale incorporado da sua humanidade. Afirmou ainda que os índios não foram respeitados, porque o homem branco não conseguia

(30)

A proposta dele é um pensar complexo porque ele pede que não se estabeleça hierarquização entre os falantes. Ele quer a horizontalidade, em que todos são vistos como legítimos, pois nesse lugar de encontro não há ignorantes absolutos, nem sábios absolutos. Há homens que, em comunhão, buscam conviver com as diferenças e com as similitudes de cada povo. Por isso, o cacique Marcos Terena quer mais ainda. Quer conciliara cultura indígena com a do homem branco.

Como podemos perceber, o diálogo verdadeiro é difícil, pois implica aceitar o outro. É a capacidade de apreender o outro em sua legitimidade, é estar pronto para escutar a voz do outro, é estar pronto para sentir a dor do próximo, é estar pronto para vibrar com a alegria dele.

Nesse processo, é necessário que a amorosidade banhe os diálogos para que o outro seja aceito de modo incondicional e os diálogos fluam sem impe-dimentos (MATURANA, 1997, 1998a, 1998b, 2001), fato que também é demarcado por Paulo Freire:

Ao fundar-se no amor, na humildade, na fé nos homens, o diálogo se faz uma relação horizontal, em que a confiança de um pólo no outro é conseqüência óbvia. Seria contradição se, amoroso, humilde e cheio de fé, o diálogo não provocasse este clima de confiança entre seus sujeitos. (FREIRE, 1975, p.96).

Reconhecendo a importância da amorosidade nos diálogos, podemos juntar David Bohm (2005) a Paulo Freire e a Humberto Maturana, quando ele diz:

Sensibilidade é estar apto a sentir que algo está acontecendo, sentir as súbitas diferenças e similaridades. Se temos um sentido sendo partilhado, este mantém o grupo unido. O ponto é que o amor irá embora se não pudermos nos comunicar e partilhar sentido. Entretanto, se pudermos realmente nos comunicar, então teremos companheirismo, participação, amizade, amor crescendo cada vez mais (BÖHM, 2005, p.4).

Por tudo isso, “blábláblá" não é diálogo, é enganação, é golpe baixo, é embuste. Como também não o é a discussão agressiva, por ser ela uma desinteligência.

(31)

e a natureza e impulsiona as intervenções que sejam mutuamente vantajosas e proveitosas para todos.

Isso é necessário acontecer nas diferentes culturas, em que os diferentes valores aparecem para dialogar. A força do diálogo se manifesta quando se reconhece que há o enriquecimento pelas identidades sociais e culturais existentes na diversidade e que traduzem a singularidade e a multidimensionalidade de cada ser humano.

É importante, ainda, não esquecer que o diálogo entre a teoria e a prática é fundamental, pois há uma complementaridade entre ambas e há a recursividade que nos mostra diferentes momentos em que na ação de uma age a outra. Teoria e prática vivem continuamente sincronizadas, enredadas, entranhadas, e participam solidariamente do processo de construção do conhecimento e da aprendizagem. (MORAES, 2003).

Nesse processo, a mediação pedagógica não é um diálogo em que uma pessoa é mais importante que a outra, pois há um saber relacional em que os interlocutores aprendem e ensinam a partir da realidade em que estão imersos e da ontogênese4 de cada um.

Finalizando: um diálogo complexo almeja soluções consensuais dos conflitos, respeita as diferenças e estimula, nas suas múltiplas dimensões, a responsabilidade individual e coletiva.

2.1.2 Organização

A palavra organização vem da palavra grega organon, que significa instrumento (HOUAISS, 2001, p.2079). É por meio da organização, do instrumento, que o sistema expressa a sua identidade e funcionalidade, expressa aquilo que lhe está destinado a desempenhar como totalidade complexa.

4

(32)

Para Morin (1987), organização é aquilo que liga os elementos entre si, que une os elementos com a totalidade e com a totalidade de elementos. É ela que liga e religa e que dá forma, no espaço e no tempo, a uma nova realidade complexa. Ela possui caráter generativo e regenerativo, que garante a sua permanência e existência por meio de sua capacidade de auto-organização.

Organização seria, portanto, aquilo que liga de maneira inter-relacionada elementos, acontecimentos e indivíduos diversos e que, a partir dessa ligação, passam a constituir uma totalidade (MORIN, 1987, 1996, 2001, 2003a, 2003b).

Essa ligação ocorre por meio de interações organizacionais, retroações reguladoras e comunicações informacionais, que fazem com que os componentes estejam associados, dependendo da qualidade de ligação que ocorre entre os elementos.

Segue-se disso que a partir da disposição de relações entre os compo-nentes ou indivíduos é produzida uma unidade complexa ou sistema, dotado de qualidades desconhecidas no nível dos componentes ou dos indivíduos (MORIN, 2001, 2003a, 2003b, 2005).

Morin (2005) propõe que o conceito de organização deve conceber a sua natureza física, pois a introdução de uma dimensão física radical numa organização viva e na organização antropossocial deve ser considerada como elemento transformador da organização física. Isso faz com que haja articulação não apenas da esfera antropossocial com a biológica, mas também de ambas com a esfera física (com o macrofísico e com o microfísico).

(33)

componentes físicos e as relações que esses elementos estabelecem e que nos processos de auto-organização mudam continuamente de estado, ao mesmo tempo em que conservam a organização em função da plasticidade do sistema e do meio.

Como exemplo, podemos citar uma cadeira. Ela é uma organização que possui determinados componentes e propriedades que a caracterizam para que a sua estrutura possa funcionar como tal. A estrutura da cadeira pode ser de ferro, de madeira, de plástico ou de outro elemento qualquer, mas para poder continuar sendo cadeira ela necessita manter os componentes, os elementos e as relações que a caracterizam funcionalmente como tal.

Outro exemplo vem da química, quando trata de substâncias isômeras, entendendo-se por isomeria o fenômeno que possibilita a existência de duas ou mais estruturas para uma mesma fórmula molecular, ou seja, é a possibilidade de existência de mais de um composto com a mesma fórmula molecular.

Como podemos observar no exemplo, ambas as substâncias têm a mesma fórmula (C2H6O), mas têm arranjos estruturais diferentes e,

conse-qüentemente, comportamentos diferentes.

Ainda na química, Ilya Prigogine nos revela o caráter histórico das organi-zações. Quais são as diferenças entre a química orgânica e a química biológica?

(34)

Dessa situação podemos verificar que, na complexidade, a historicidade acompanha os processos de organização, pois a recursividade sempre está presente. Ainda podemos perceber o princípio hologramático, ou seja, o todo contém as partes e as partes contêm o todo. A partir do DNA pode-se, ainda de modo incipiente, ter informações do passado e do presente de um ser vivo.

Na biologia, podemos dar um exemplo que ocorre em muitos laboratórios universitários. Se dissecarmos uma rã em uma aula de biologia é possível conhecer as partes, os componentes, a sua estrutura, mas não a dinâmica do todo, que depende das relações entre as partes dissecadas.

Na medicina, podemos buscar mais um exemplo. Caso um paciente tenha a necessidade de trocar uma válvula natural do coração por uma artificial, o coração manterá a sua organização, pois ele continuará a desenvolver a sua dinâmica que o caracteriza como coração. Caso isso não ocorra, o indivíduo morre.

Esse entendimento do que é organização e estrutura é muito importante para desenvolvermos o pensamento complexo e os desdobramentos deste.

Nesse sentido, Moraes retorna à física clássica para nos alertar sobre as mudanças que o reconhecimento da organização gera:

Voltando ao mundo da física clássica, sabemos que ele era constituído de objetos isolados submetidos a leis que eram universais como, por exemplo, a lei da gravidade. O fato de ser isolado indica que é fechado e distinto, sinalizando que o observador não participa de sua construção. Ao ser fechado, indica que possui uma natureza auto-suficiente independente do meio onde está inserido. Assim, não existiriam os fluxos nutridores, a interpenetração sistêmica de energia, matéria e informação entre objeto e o meio onde está inserido (MORAES, 2004, p.59).

(35)

A partir disso, Morin (2003a, 2003b, 2005) e Moraes (2004) esclarecem que o que era objeto passou a ser explicado a partir de interações, sendo estas constituintes da organização que representa. Portanto, para explicar o átomo era necessário explicar as interações caracterizadoras de sua organização. O mesmo aconteceu à célula, à vida e à sociedade.

Finalizando e destacando: a organização passou a ser a disposição das relações entre os componentes que, por sua vez, produzem uma unidade complexa ou sistema. Toda organização é, portanto, dinâmica e ativa, implicando a presença de interações.

2.1.3 Sistemas

A idéia de sistema acompanha o homem nas diferentes áreas do saber e destaca-se progressivamente em diversos ramos da ciência e da tecnologia, por meio das investigações científicas e das diversas aplicações na medicina, na engenharia eletrônica e na de telecomunicações, nas viagens espaciais, na economia, na administração e na educação, entre muitos outros exemplos. Nós podemos verificar essas situações nas palavras de Durand:

Assim, entre 1940 e 1960, assistimos a uma verdadeira explosão de conceitos e novas ações em inúmeros domínios das ciências e das técnicas. Este fenômeno ocorreu essencialmente nos Estados Unidos, que se beneficiavam então de um dinamismo notável, não só científico, mas também econômico e político. Esse grande movimento, num país particularmente pragmático, correspondeu à necessidade de dispor de um instrumento conceptual capaz de ajudar a resolver problemas complexos nos mais diversos domínios: criação de instrumentos de orientação de tiro aéreo, compreensão do funcionamento do cérebro humano, direção de grandes organizações industriais, fabrico dos primeiros grandes computadores, etc. (DURAND, 1992, p.12)

Esse impulso, ocorrido nos anos 1940 a 1960, trouxe consigo uma variedade muito grande de conceitos relacionados a um mesmo fenômeno e que necessitam ser diferenciados.

(36)

1. Saussure5: "uma totalidade organizada por elementos solidários, que

podem definir-se apenas uns em relação aos outros, em função do seu lugar nesta totalidade".

2. Bertalanffy6: "é um conjunto de unidades com inter-relações mútuas".

3. Lesourne7: "é um conjunto de elementos ligados por um conjunto de

relações".

4. Rosnay8: "conjunto de elementos em interação dinâmica, organizado

em função de um fim".

5. Ladrière9: "objeto complexo, formado por componentes distintos,

ligados entre si por um certo número de relações".

6. Morin:10 "unidade global organizada por inter-relações entre os

elementos, ações ou indivíduos".

Como podemos perceber, as três primeiras são muito próximas e trazem as noções de relação e de totalidade. Já as outras três trazem a noção complementar.

Utilizaremos a definição proposta por Edgar Morin para desenvolver o pensamento complexo. Essa definição fornece elementos para que possa ser aplicada a todos os objetos da física, da biologia, da sociedade, da astronomia, enfim, em outros campos do saber e do viver.

Esse conceito, de acordo com Morin (1987, 1996, 2003b) e compartilhado por Moraes (1997), demarca a existência de um agregado de coisas, independen-temente de sua natureza, um conjunto de relações entre os elementos e a

existência de propriedades compartilhadas.

5

Ferdinand de Saussure: lingüista suíço.

6

Karl Ludwig Von Bertalanffy: biólogo austríaco.

7

Jacques Lesourne: economista francês.

8

Jöel Rosnay: biólogo molecular francês.

9

Jean Ladrière: filósofo e matemático belga.

10

(37)

Essas propriedades são produtos das relações que se estabelecem entre as partes, entre os subsistemas constituintes, que permitem a ocorrência de processos de transição de estruturas que passam de um nível inferior para outro superior, a partir das modificações ou transformações de suas propriedades.

A partir disso, Moraes (2004, p.62) esclarece:

Um sistema seria então uma totalidade/parte, que possui integralidade e funcionalidade específicas, mas que, ao mesmo tempo, integra outra totalidade e participa de outros sistemas em diferentes níveis, sistemas estes que a englobam e/ou restringem.

Como exemplo, podemos citar a Terra. Ela é um sistema complexo constituído de totalidades e partes que se explicitam e integram um fluxo único de energia universal. Então, a totalidade é parte de uma outra totalidade, e assim o é indefinidamente. Também é importante a presença de interações entre as partes.

Esse conjunto totalidade/partes compõe a realidade e constitui o mundo dinâmico no qual os objetos se interconectam mediante interações recorrentes.

A totalidade e as partes que constituem um sistema se relacionam no interior de um ambiente no qual há trocas de energia, matéria e informação. Desse modo, a interpenetração sistêmica pode ser energética, material ou informacional nos dife-rentes níveis. Portanto, um sistema só pode ser compreendido se incluirmos nele o seu ambiente, que é parte dele próprio e que, ao mesmo tempo, constitui o seu entorno e os fluxos que o nutrem (MORAES, 1997). De outra maneira: o sistema e o meio estão acoplados incondicionalmente. Caso isso não ocorra o

sistema se desintegra.

(38)

e biológicas da água desse ambiente para que possa se manter vivo. Muitas vezes ele se encapsula,para continuar vivo, quando as condições ambientais são desfavoráveis. Apesar de mudar a sua estrutura, mantém a sua organização. Disso podemos ainda afirmar que todo sistema aberto tem uma historicidade.

Morin (2003b) e Maturana (1997) afirmam que qualquer sistema é aberto e fechado simultaneamente, fato que não é aceito pela termodinâmica tradicional, pois a abertura e o fechamento são tratados, por ela, como opostos e não como complementares. Ela considera que um sistema fechado não troca matéria com o meio exterior. Podemos citar o exemplo de um balão cheio de gás, que não troca matéria, mas pode, por sua transparência, receber radiação do sol e irradiar calor gerado pelo choque de átomos constituintes (BRUSCHI, 2003).

Mas, Maturana (1997) demonstra em sua teoria autopoiética que um ser vivo é estruturalmente aberto e organizacionalmente fechado. Pois, caso mude a organização, ele perde a sua condição de vivência e perece.

As situações anteriores podem ser verificadas nos seres humanos quando percebemos que a afetividade é nutridora e transformadora quando interio-rizamos tudo aquilo de que necessitamos para a manutenção da nossa organi-zação viva, para que possamos nos desenvolver, evoluir, amar e ser amados e transcender. Do mesmo modo, temos necessidade de obter energia, proteínas, gorduras, sais minerais e outros nutrientes que entram na composição das estru-turas que mantêm a nossa organização como seres vivos animais, e para que mantenhamos a nossa autonomia.

Lembrando que não é autonomia absoluta, ela é sempre autonomia relativa, pois continuamente há a necessidade de relacionamento com o meio no qual o sistema está imerso.

(39)

Disso podemos compreender que no uno há o múltiplo, a diversidade. Esta é importante para a manutenção da vida na Terra. Na educação não é diferente, pois há que se ter sempre uma visão em que a diversidade possa ser acolhida como algo natural. Há a configuração inclusiva, em que o diferente deve ser compreendido na escola, na sala de aula, em todos os ambientes escolares, e deve ser levado para a casa, para o bairro onde mora, para as comunidades em que vivemos, enfim, para a nossa vida diária.

Moraes (2003, 2004) alerta-nos que, para mantermos as diferenças, há o surgimento da exclusão, da dissociação e da repulsão. Mas, para que o sistema possa existir, as forças de atração, as ligações, as afinidades e a inclusão devem predominar. Assim, as forças antagônicas estão presentes, mas precisam ser supe-radas, neutralizadas, para que o sistema não desintegre. Isso demarca que em todo o sistema a complementaridade e o antagonismo estão presentes.

Isso nos leva a compreender que o todo também é incerto, conflituoso e insuficiente, pois a relação totalidade/parte é sempre uma relação aberta, estando sujeita ao indeterminismo, ao acaso e ao inesperado. Então, um sistema aberto é sempre um sistema incerto, no qual essa incerteza é condição indispensável para a criação sistêmico-organizacional, no que se refere à autonomia física, biológica, social e cultural do sistema (MORAES e TORRE, 2004).

Isso ocorre devido aos fluxos vitais e à capacidade de auto-organização dos sistemas que implicam as incertezas, as bifurcações, podendo levar o sistema à degradação e à desordem em função das constantes entradas de energia, matéria e informação que desestabilizam o sistema (MORAES, 2004 e PRIGOGINE, 2002a).

Ciurana (2000); Moraes (1997, 2004); Morin (2003b); e Prigogine (1996, 1999, 2002a, 2002b) afirmam, então, que é praticamente impossível que um sistema seja fechado em si mesmo. Eles compreendem que a totalidade é eco-sistêmica11,

11

(40)

relacional e é simultaneamente totalidade/parte. É uma unidade global que é parte de outra unidade global, que é também parte de outra unidade.

Finalizando, o conceito de sistema é um dos parâmetros da complexi-dade, faz parte da base fundante, indicando que um conceito necessita do outro para a sua definição. Então podemos dizer que a complexidade é uma propriedade do sistema, assim como o sistema constitui a base da complexidade.

2.1.4 Emergência

O fenômeno da emergência tem sido estudado pela ciência, em seus diferentes campos do saber. Há várias classificações e muitas divergências a respeito das explicações sobre elas.

A complexidade retoma esse conceito, pois a emergência é uma das propriedades que constituem os sistemas complexos.

Para o físico argentino Mário Bunge (1980; 2004), a emergência é uma novidade qualitativa (ontológica). Ele propõe que toda emergência é explicável (epistemológica) pela análise da totalidade emergente em seus componentes e pelas interações destes últimos.

Por exemplo, a sexualidade é uma propriedade que emerge ao nível biológico, mas não é uma propriedade ininteligível, sendo explicada pela biologia molecular e pela evolução. A primeira explica o mecanismo da fecundação e, a segunda, as vantagens (e variedade e, portanto, seleção) da sexualidade.

Mário Bunge propõe que não podemos explicar muitas propriedades emergentes devido à nossa ignorância sobre os fatos, e não por causa do compor-tamento dos sistemas.

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[...] Para aqueles que, como Boltzmann, tiveram a idéia de exprimir a irreversibilidade graças a uma probabilidade, a resposta era óbvia: a probabilidade nascia da nossa ignorância das trajetórias exatas. Por conseguinte, a irreversibilidade é a expressão da nossa ignorância.

Atualmente, perante o papel criativo dos fenômenos irreversíveis, esta concepção foi abolida: caso contrário seríamos obrigados a atribuir as estruturas que observamos à nossa ignorância. É verdade que a ignorância é mãe de muitas desgraças, mas é sempre difícil atribuir-lhe o poder de nos criar. Por conseguinte, devemos superar a tentação da ignorância, como superamos a tentação de explicar a física quântica com variáveis desconhecidas.

Prigogine coloca como novidade a existência de processos irreversíveis. Um exemplo pode ser o de que, quando um corpo passa ao lado da Terra, a trajetória do nosso planeta muda, desloca-se e, a seguir, permanece diferente, não volta à situação precedente.

Na nossa vida psicológica também verificamos um exemplo significativo de irreversibilidade. O medo, uma vez instalado no nosso sistema emocional, ficará latente para toda a nossa vida. Ele poderá não se manifestar por um longo período, mas ao passarmos por um período de estresse ele pode voltar. Portanto, o medo não é apagado, mas mantido sob controle com a ajuda da psicologia. (LEDOUX, 2001).

Prigogine aceita a irreversibilidade e descarta a tentação da ignorância, trazendo à tona a noção de emergência (1999, p.65):

Verificamos que os fenômenos irreversíveis dão origem a novas estruturas e, a partir do momento em que aparecem novas estruturas como conseqüência da irreversibilidade, já não nos é permitido acreditar sermos os responsáveis pelo aparecimento da perspectiva do antes e do depois.

Nessa situação, devemos substituir, a cada momento, a nossa infor-mação sobre o "ponto" por uma inforinfor-mação sobre um sistema de pontos, pois o conhecimento de que dispomos das condições iniciais, sejam elas quais forem, não nos permitirá seguir a trajetória no curso do tempo.

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A partir do exposto, Edgar Morin concorda com as idéias de Prigogine e define emergência (apud MORAES, 2004). "Emergências são qualidades ou propriedades novas de um sistema que nascem das organizações viventes." Ele enfatizou em sua definição o vivente, porém as emergências acontecem em qualquer sistema de não-equilíbrio. Nesse mesmo caminho vai Moraes (2004, p.179):

O surgimento espontâneo de um novo sistema ou de uma nova unidade global resulta do indeterminismo inscrito no tecido do universo e como conseqüência dos processos físico-químicos e biológicos que acontecem na natureza, significando que algo emerge sem precedentes ou sem ser determinado pelo passado.

Podemos afirmar que, a partir do momento em que algo emerge em um sistema, nunca mais ele será o mesmo.

Se fizermos a transposição para o processo de ensino-aprendizagem e para a construção do conhecimento, percebemos que são sempre fenômenos emergentes, em que a emoção reconfigura a aprendizagem gerando espaços operacionais de ação e reflexão, sendo ainda percepção, intuição e tudo o que constitui a estrutura do sistema vivo. De outra maneira: aprendemos com a nossa corporalidade e pelas coisas incorporadas pela nossa humanidade.

Nas emergências citadas anteriormente pode surgir a presença de atratores estranhos que estão presentes na vida do nosso planeta e no nosso dia-a-dia. Prigogine esclarece esse fenômeno:

É um caso um pouco complexo, não de cada ponto de atracção, mas de uma curva fechada que traduz um comportamento periódico. Descobriu-se há pouco tempo que, muitas vezes, o ponto de atracção é um conjunto de pontos e que o sistema é atraído primeiramente por um ponto, depois por outro, e ainda por outro. Fala-se então de atração estranha. [...] Chamam-se fractais, porque a sua dimensão (no Chamam-sentido da geometria) não é um número inteiro. Com os pontos de atracção que são fractais devem esperar-se comportamentos muito irregulares, caóticos e contínuas flutuações (PRIGOGINE, 1999, p.69).

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marcações das faltas e dos impedimentos. De repente, surge um ponto de bifurcação e um torcedor de um time acaba sendo agredido por um torcedor da outra torcida, desencadeia-se uma atração em que outros se envolvem e de repente as duas torcidas entram em choque e a polícia passa a atuar para controlar, podendo chegar a situações caóticas, em que há fluxos intensos de raiva e ódio, que ficam fora de controle, como já aconteceu em São Paulo, quando as torcidas se enfrentaram, invadiram o campo de jogo e se agrediram de modo feroz, ocasionando a morte de torcedores.

Nós podemos perceber que o todo e as partes dos sistemas que estão em interação marcam o comportamento de um sistema complexo e muitas vezes há comportamentos muito irregulares, chegando a ser caóticos e com contínuas flutuações. A emergência leva à modificação no comportamento dos sistemas enquanto ele existir.

Outro ponto importante é apresentado por Moraes (2004). Ela vê também a emergência com sendo a possibilidade de novas qualidades, sempre incluindo os predecessores e, depois, agregando os novos padrões que emergiram em sua nova estrutura organizacional.

Ela demonstra que não se quer jogar o passado fora, ele faz parte do presente, mas foi superado, modificado e ressignificado.

Da mesma maneira, Prigogine (1999, p.74) insiste em que devemos ver de outra maneira a termodinâmica.

A mensagem do segundo princípio da termodinâmica não é uma mensagem de ignorância, é uma mensagem sobre a estrutura do universo. Os sistemas dinâmicos que estão na base da química, da biologia, são sistemas instáveis que avançam para um futuro que não pode ser determinado antecipadamente porque tenderão a cobrir tantas possibilidades, tanto espaço quanto tiver à sua disposição.

(44)

Assim, Prigogine, Moraes e Morin nos mostram que as emergências dos sistemas de não-equilíbrio fazem parte da vida na Terra e da Terra, bem como do processo de educação das pessoas, nas escolas, nas famílias, na sociedade.

Se por um lado precisamos aceitar a incerteza do futuro, a instabilidade do presente e o surgimento de novas qualidades dos sistemas de não-equilíbrio, por outro é necessário colocar à disposição dos alunos, nas escolas, as mais diversas situações que envolvam o cognitivo, o afetivo e o emocional, para que possam emergir as possibilidades mais diversas de pessoas humanas.

Nessa mesma forma de pensar, Varela (1996) afirma que a cognição humana também é emergência de estados globais em uma rede de componentes simples, sendo que esses estados globais envolvem a corporeidade humana e estão imbricados com as histórias vividas pelo ser humano. Portanto, não se restringe apenas ao cérebro, mas ao corpo como uma totalidade.

Disso tudo Morin (apud MORAES, 2004) coloca como ponto de destaque a consciência humana. Ela é o produto global das interações e de interferências cerebrais inseparáveis das interações e interferências da cultura sobre o indivíduo. É uma emergência extraordinária do cérebro humano, graças à reflexão do sujeito e à busca incessante em ser mais na vida dos "homens", e em querer superar o processo evolutivo que nos condiciona ao deixar marcas e estigmas que sempre surgem e ressurgem na vida de qualquer humano, porém a evolução não determina como viveremos porque a consciência emerge da reorganização do cérebro.

A seguir comentaremos sobre as emergências que nos acompanham diariamente em todas as atividades que realizamos – são elas as emoções.

2.2 EMOÇÃO E SENTIMENTO SEGUNDO DAMÁSIO (1996, 2000, 2004)

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2.2.1 Emoção

Hoje já há provas suficientes de que os organismos simples na escala zoológica apresentam reações emocionais.

Quando um protozoário encontra-se em um meio aquático, é fundamental que ele consiga perceber como estão as condições ambientais. É a temperatura, são as vibrações e os choques que podem arrebentar a sua membrana, é o pH da água e a disponibilidade de alimento que estão em jogo, e ele reage, ou seja, procura um local no meio em que haja a preservação da sua integridade física, química e biológica. E assim ele o faz, caso contrário estará correndo risco de morte. A visão anterior é aceita pelo biologista celular Bruce Lipton, ao afirmar: "[...] células simples analisam milhares de estímulos do microambiente em que habitam. Por meio da análise desses dados, as células selecionam as respostas comportamentais apropriadas para assegurar a sobrevivência delas" (LIPTON, 2005, p.38).

Desse modo, esse ser sem cérebro já apresenta a essência do processo de emoção presente nos seres humanos, ou seja, detectar os objetos ou situações que necessitam de evasão ou bom acolhimento. Ele é capaz de reagir e buscar um local do ambiente em que mantenha a vida e, se possível, com bem-estar. O protozoário não aprendeu isso, ele já nasceu com isso, está no genoma dele. Cabe destacar que isso ocorre sem a necessidade da consciência, do raciocínio ou de decisão.

Diante disso, Damásio nos apresenta o seu entendimento do que vem a ser uma emoção.

1. "Uma emoção propriamente dita é uma coleção de respostas químicas e neurais que formam um padrão distinto." (2004, p.61).

Portanto, o sistema nervoso conta e muito nesse processo. Quanto mais desenvolvido o cérebro, espera-se que seja mais capaz de reagir às situações que estimulam as reações.

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cuja presença real ou relembrada desencadeia a emoção. As respostas são automáticas." (DAMÁSIO, 2004, p.261). Por isso, a emoção é na maioria das vezes pública, ou seja, ela não é consciente. Ela simplesmente ocorre, independentemente da vontade da pessoa que está vivenciando essa emoção.

3. O cérebro está preparado pela evolução para responder a certos EEC com repertórios de ação específicos. Mas as respostas não se limitam às respostas herdadas, inclui muitas outras adquiridas pela experiência individual. A ontogênese de cada indivíduo contribui para que as emer-gências surjam. Muito mais ainda, não se pode prever todas as reações de cada pessoa, pois cada um de nós tem a sua própria história de vida. A escola e os professores necessitam compreender e aceitar que cada aluno é único. Mesmo que todos os alunos tenham passado por uma mesma experiência, em uma atividade escolar.

4. "O resultado imediato destas respostas é uma alteração temporária do estado do corpo e do estado das estruturas cerebrais que mapeiam o corpo e sustentam o pensamento." (DAMÁSIO, 2004, p.61). Quando estamos em uma situação emocional, sofremos alterações da nossa totalidade como seres humanos. O corpo como um todo é afetado, não apenas o cérebro.

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FIGURA 2 - A AMÍGDALA E O MEDO
FIGURA 3 -  SISTEMAS DE VIOLÊNCIA
FIGURA 4 - LÓGICA DO TERCEIRO INCLUÍDO
FIGURA 6 - RELAÇÃO PROFESSOR X ALUNOS DA TURMA C
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Referências

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