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INTENSIVO I Barney Bichara Direito Administrativo Aula 14 ROTEIRO DE AULA. Tema: Responsabilidade civil do Estado

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INTENSIVO I Barney Bichara Direito Administrativo

Aula 14

ROTEIRO DE AULA

Tema: Responsabilidade civil do Estado

1. RESPONSABILIDADE CIVIL E SACRIFÍCIO DE DIREITO

Distinções:

O professor destaca que a responsabilidade civil consiste na obrigação de reparar um dano. Se não há dano, não há responsabilidade civil. Neste caso, pode até existir um outro tipo de responsabilidade (penal, administrativa etc.), mas não haverá responsabilidade civil.

De outro lado, há o sacrifício de direito, o qual é estudado no tema “intervenção do Estado na propriedade”.

✓ O aluno não pode confundir o sacrifício do direito de propriedade, que também enseja indenização, com a responsabilidade civil do Estado.

✓ O professor ressalta que o que causa confusão é que em ambas as matérias há o dever de indenizar. Entretanto, em um caso o Estado indeniza porque causou um dano e, em outro, porque sacrificou um direito do administrado.

Na responsabilidade civil, o Estado age para alcançar o bem comum e, colateralmente, ele causa dano a alguém. Isso porque, em sua atuação, o Estado não visava lesar o administrado. Assim sendo, se ele causa dano a alguém, é obrigado a repará-lo.

Em relação ao sacrifício de direito, o Estado atua de forma preordenada e dirigida para sacrificar o direito do administrado, pois isso, de alguma forma, possibilita o bem comum. Assim sendo, também há indenização.

O professor explica que, no curso Intensivo II, ele trabalhará o tema “intervenção do Estado na propriedade”, a qual comporta as seguintes modalidades: limitações administrativas, requisições administrativas, ocupação temporária, tombamento, servidão, etc.

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O tombamento, por exemplo, é o procedimento administrativo pelo qual o poder público impõe restrições parciais sobre o direito de propriedade para conservar o bem vinculado ao patrimônio cultural brasileiro.

✓ O aluno estuda que o tombamento não dá direito à indenização, salvo se houver dano.

✓ O tombamento em si não gera direito à indenização. Entretanto, se, exemplificativamente, o tombamento fizer com que o preço do imóvel seja reduzido, haverá dano ao administrado e, portanto, haverá dever de indenizar.

Perceba que, neste exemplo, a indenização é decorrente do dano e não do tombamento em si.

O mesmo raciocínio pode ser aplicado às limitações administrativas, que são atos gerais voltados a propriedades indeterminadas e que limitam o direito de propriedade em favor do bem comum. Exemplo: normas administrativas de uso e ocupação do solo urbano.

Em suma: o ato de pagar a indenização, às vezes ocorre porque o Estado causou um dano e, às vezes, porque o Estado sacrificou o direito do administrado e o sacrifício desse direito enseja indenização.

Na desapropriação, por exemplo, o Estado retira a propriedade de alguém de forma obrigatória e originária, pagando uma indenização. A indenização, segundo o professor, se consuma com a indenização.

Assim sendo, na desapropriação, a indenização ocorre em um momento específico e é requisito específico que condiciona a ocorrência ou não da desapropriação.

O que será estudado a partir desse momento é a responsabilidade civil do Estado, que é dever de reparar um dano.

O professor destaca que o mesmo raciocínio também ocorre no contrato administrativo, pois existe a responsabilidade contratual, mas também existe a responsabilidade extracontratual.

Assim sendo, o contratado faz jus à responsabilidade contratual (danos derivados do contrato) e à responsabilidade extracontratual (outros danos).

2. O DANO INDENIZÁVEL

Responsabilidade civil é o dever de reparar um dano (em dinheiro). Logo, se não houver dano, não há responsabilidade civil.

A responsabilidade civil só se caracteriza diante do dano indenizável.

Exemplo: imagine que o prefeito da cidade X foi avisado de que deveria fazer as podas de árvores da rua X, pois, quando chegasse o verão e começasse a chover, as árvores cairiam e causariam danos aos veículos dos administrados. Apesar de insistentes avisos, o prefeito nada faz. Em dezembro, mês das chuvas, não chove. Neste caso, o comportamento negligente do prefeito não causou danos a ninguém. Assim sendo, a conduta negligente do prefeito, nesse exemplo, não gerou responsabilidade civil para o município.

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Dano indenizável é aquele que reúne quatro características:

A. Jurídico – é aquele que consiste em lesão de direito. Só é indenizável o comportamento estatal que lesa um direito. Isso porque há comportamentos do Estado que lesam interesse e não direito, assim, não há dever de indenizar.

Exemplo: o presidente do TJ determina a mudança de endereço do tribunal e, por conta disso, o restaurante que ficava ao lado do TJ sofre perdas enormes financeiras. Neste caso, há lesão ao interesse e não lesão a direito, portanto, não há responsabilidade civil do Estado em relação ao restaurante e não há direito à indenização.

B. Certo – Trata-se de dano concreto/mensurável/real. Não se indeniza dano eventual.

Exemplo: “A” faz uma prova de concurso público, passa na prova objetiva e reprova no exame psicotécnico.

Contra o ato de reprovação que impediu o candidato de tomar posse, “A” ingressa com um mandado de segurança e este demora 7 anos para ser julgado. No final do processo, “A” ganha a ação e isso significa que o ato de reprovação era ilegal. Diante disso, entretanto, não é possível “A” pedir indenização afirmando que, se não fosse o ato de reprovação, ele teria trabalhado e estaria recebendo os vencimentos por 7 anos.

O STF já afirmou em tese de repercussão geral que, no caso do exemplo, não há direito à indenização, pois o dano não é certo.

C. Especial – Especial é o dano que atinge destinatário certo. O destinatário pode ser uma pessoa ou um conjunto de pessoas.

Entretanto se o comportamento estatal lesar toda a coletividade, o Estado não indenizará ninguém (isonomia).

Assim, só é indenizável o dano especial.

D. Anormal – Dano anormal é aquele que ultrapassa os pequenos prejuízos patrimoniais do cotidiano. É aquele que vai além dos meros dissabores rotineiros.

Exemplo: a pessoa passa em um pequeno buraco na rua e o pneu fura. Nesse caso, não há dano indenizável, pois ocorreu um mero dissabor, um dano normal.

3. RESPONSABILIDADE CIVIL E AS FUNÇÕES LEGISLATIVA E JURISDICIONAL

O Estado legisla, julga e administra. Se, no exercício de quaisquer dessas funções, o Estado produz dano, surgirá o dever de indenizar.

A. Função legislativa

Quando o Estado legisla, ele faz ato geral, abstrato, obrigatório e inovador.

Questão: o ato legislativo tem a capacidade de produzir dano indenizável?

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Em regra, o ato legislativo não produz dano indenizável. Isso ocorre porque o ato legislativo é geral e abstrato e, portanto, não causa dano especial.

A lei é, além disso, um ato inovador. Assim, ela inova na ordem jurídica e não retroage para prejudicar o direito adquirido, a coisa julgada e o ato jurídico perfeito.

✓ O ato legislativo não lesa um direito e, portanto, não há dano jurídico. A lei pode contrariar interesses, mas não direito.

Em suma: em razão de suas características (abstração, generalidade e não retroatividade), a lei não produz dano indenizável.

Excepcionalmente, o ato legislativo pode produzir dano indenizável. Se isso ocorrer, haverá responsabilidade civil do Estado por ato legislativo.

Exceções (atos legislativos capazes de causar dano):

1. Leis declaradas inconstitucionais – uma lei declarada inconstitucional pode produzir dano indenizável. Se isso ocorrer, haverá responsabilidade civil do Estado. Entretanto, não quer dizer que toda lei declarada inconstitucional produz dano indenizável, mas apenas que há potencialidade de produzir dano.

2. Lei de efeito concreto – Lei de efeito concreto é lei do ponto de vista formal, pois parte do Poder Legislativo.

Entretanto, ela não tem abstração e generalidade.

3. *Omissões legislativas – O professor destaca que a doutrina falava em responsabilidade civil do Estado por ato legislativo em razão de omissão legislativa. Entendia-se que, em tese, era possível a ocorrência de dano em razão da omissão legislativa. Entretanto, o professor destaca que a lógica dessa hipótese perde a razão com a lei do mandado de injunção individual. Assim sendo, se a pessoa não consegue exercer um direito porque houve omissão legislativa, ele impetra um mandado de injunção.

B. Função jurisdicional

Quando o Estado pratica um ato judicial, ele, em regra, não produz dano indenizável e, portanto, não há responsabilidade civil.

Fundamentos:

✓ Quando o Estado julga, ele aplica a lei ao caso concreto para resolver conflitos sociais com força de coisa julgada.

✓ A decisão judicial não lesa direito, mas contraria interesse. A decisão judicial diz o direito.

✓ Contra decisão judicial, cabe recurso. Assim sendo, a parte pode recorrer e percorrer as várias instâncias existentes.

✓ O processo judicial versa, em regra, sobre uma lide e, portanto, há parte vencedora e parte perdedora.

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Excepcionalmente, o Estado responde pelas decisões judiciais e isso ocorre quando há previsão normativa expressa. São hipóteses em que isso ocorre:

1. Erro judiciário.

2. Prisão além do prazo fixado na sentença.

3. Demora na prestação jurisdicional.

Art. 5º, CF:

“LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;”

“LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”

A conclusão a respeito desta matéria é que a responsabilidade civil do Estado se refere, em regra, à função administrativa.

Tal conclusão deriva do fato de que, como regra, função legislativa e a função jurisdicional não geram dano indenizável.

Assim sendo, tudo o que for trabalhado a partir desse momento envolve a responsabilidade civil do Estado pelo exercício da função administrativa.

4. EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Considerações iniciais:

• Será abordada a evolução histórica da responsabilidade civil do Estado na França. Isso porque foi neste país que o instituto da responsabilidade civil do Estado se desenvolveu de forma mais linear.

• O direito administrativo francês influenciou o Brasil e, portanto, o paradigma francês será estudado a partir desse momento.

• É importante destacar que a sequência histórica que será estudada a partir de agora não ocorreu no mundo inteiro. Trata-se de uma escolha acadêmica para sistematizar a matéria.

A. Teoria da irresponsabilidade

Na Idade Média (Século V a Século XV), não existiam os Estados. O que existiam eram monarquias feudais fragmentadas e descentralizadas.

✓ Como não havia Estado na Idade Média, não há que se falar em responsabilidade civil do Estado.

Em 1453, com a tomada de Constantinopla pelos turcos, ocorreu o fim da Idade Média e o início da Idade Moderna. Na Idade Moderna, surgiu o Estado tal como o conhecemos hoje. O Estado passou a ser formado pelo povo, território e poder.

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Neste período, todo o poder do Estado emanava da vontade do rei, o qual exercia seus poderes de forma ilimitada (l'état c'est moi).

A teoria da irresponsabilidade vigorou durante a Idade Moderna (Século XV a Século XVIII) e corresponde ao período do Absolutismo.

✓ Pela teoria da irresponsabilidade, o Estado não responde por danos causados aos seus súditos.

No Século XVIII, surge o Iluminismo. A Revolução Francesa de 1789 acaba com o absolutismo. A partir daí, surge o início do mundo contemporâneo e nasce o Estado de direito.

✓ No Estado de direito, o Estado é soberano para legislar. Entretanto, posta a lei, ela é imposta a todos, inclusive ao Estado. Nesse momento, surgiu o princípio da legalidade.

✓ A partir do surgimento do Estado de direito, o Estado se torna sujeito de direitos e obrigações, ou seja, torna-se responsável pelos seus próprios atos.

B. Teoria civilista

Em 1804, surge o Código Napoleônico (Código Civil dos franceses).

✓ Trata-se do primeiro código civil do mundo contemporâneo.

✓ Tal código é a maior obra jurídica desde o Império Romano.

✓ O Código Civil francês orientou as interpretações da época, inclusive, a própria interpretação das hipóteses de responsabilidade civil do Estado.

A partir do início do Século XIX, reconhece-se a responsabilidade do Estado a partir de teorias civilistas. Nessa época, reconhecia-se a responsabilidade civil baseada na culpa e no ato ilícito.

✓ Reconhecia-se a responsabilidade civil do Estado pelos danos produzidos, mas aplicavam-se as regras civis de responsabilidade civil, as quais eram calcadas no dolo e na culpa.

As teorias civilistas passam por dois momentos:

1º) Teoria dos atos de império e atos de gestão.

✓ Ato de império era o ato praticado pelo Estado segundo o regime jurídico de direito público. Era o ato administrativo.

✓ Ato de gestão era o ato praticado pelo Estado segundo o regime jurídico de direito privado.

Segundo essa teoria, se o Estado praticasse ato de império, este ato jamais ensejaria a responsabilidade civil do Estado.

Se o Estado praticasse ato de gestão, tal ato fosse ilegal e causasse dano a terceiros, haveria responsabilidade civil do Estado.

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Em suma: o ato de império era insuscetível de responsabilidade. O ato de gestão, ilícito e que causasse dano poderia ensejar a responsabilidade do Estado. Assim, a vítima deveria comprovar o dano, o fato de o ato estatal ser ato de gestão e, além disso, que tal ato era ilícito. Na prática, poucas vítimas conseguiam comprovar essas características.

2º) Teoria da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva – Com o tempo, a distinção entre atos de império e atos de gestão foi superada e passou-se a aplicar apenas o Código Civil para resolver as questões envolvendo a responsabilidade civil do Estado.

✓ Assim sendo, passou-se a entender que, se o Estado praticasse um ato (qualquer ato) e esse ato fosse ilícito e produzisse dano, o Estado responderia por ele.

C. Teoria Publicista

As teorias publicistas surgem na França a partir do fim do Século XIX e têm como marco histórico o caso Blanco de 1873.

Considerações sobre o caso Blanco:

✓ Em 1873, Agnès Blanco foi atropelada por carruagem que pertencia à Companhia Nacional de Manufaturados de Fumo de Bordeaux (empresa privada que prestava serviço público).

✓ Diante do acidente, o pai de Agnès Blanco ajuizou uma ação na jurisdição comum. Entretanto, esta afirmou não ser competente para o caso, pois a atividade exercida era um serviço público. Após tal decisão, o pai de Agnès Blanco ajuizou outra ação no Conselho de Estado, órgão que exercia a jurisdição administrativa. Este, por sua vez, também se julgou incompetente.

✓ Acima desses dois órgãos, existia o Tribunal de Conflitos, o qual servia para dirimir conflitos de competência.

✓ O Tribunal de Conflitos decidiu que o órgão competente para julgar o caso era o Conselho de Estado (órgão administrativo).

✓ No momento em que o Tribunal de Conflitos atribuiu ao Conselho de Estado o julgamento do caso, este órgão precisou criar um conjunto de princípios e regras de direito público para resolver a questão posta. Isso porque, se o Estado atua segundo normas de direito público, a responsabilidade dele também deve ser à luz do direito público.

✓ As premissas construídas para o julgamento desse caso vieram, posteriormente, a formar o Direito Administrativo.

✓ Esse caso lançou as bases do Direito Administrativo e vai muita além da questão da responsabilidade civil do Estado.

1º) Teoria da culpa administrativa ou culpa do serviço (culpa anônima) – Esta teoria indica que o Estado responde civilmente quando o serviço público não funciona, quando funciona mal ou, ainda, quando o serviço público funciona tardiamente.

✓ Neste caso, a culpa é do serviço (e não do agente).

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Na teoria da culpa administrativa, a responsabilidade é subjetiva. Assim, deve ficar comprovado que o dano teve como causa um comportamento ilícito. Somente com tal prova é possível caracterizar a responsabilidade do Estado.

✓ A vítima não tem que provar dolo ou culpa, pois o Estado não possui ânimo.

Em suma: Pela teoria da culpa do serviço, a responsabilidade civil do Estado é subjetiva, pois depende de comprovação de ato ilícito do Estado. Ocorrem atos ilícitos do Estado quando o serviço público não funciona, quando funciona mal ou, ainda, quando o serviço público funciona tardiamente.

2º) Teoria da responsabilidade objetiva ou teoria do risco

Pela Teoria do risco, o Estado responde objetivamente, ou seja, é responsável por danos decorrentes de atos legais ou ilegais.

✓ A responsabilidade objetiva não depende de ato ilícito. O que importa é a conduta estatal e o dano causado.

Questão: Qual o fundamento da responsabilidade objetiva?

A teoria do risco traduz a ideia de que, tendo grandes poderes, o Estado possui grandes responsabilidades.

Atenção: o surgimento da teoria do risco não significou o fim da teoria da culpa administrativa ou culpa do serviço. Isso significa que o Conselho de Estado, à medida que aplicava a lei e exercia a jurisdição administrativa, ia aplicando as duas teorias para situações diferentes.

✓ Cada teoria continuou a ser utilizada para casos e situações diferentes.

Atenção: a teoria do risco se divide em “risco administrativo” e “risco integral”. Em ambas, a responsabilidade é objetiva, pois são modalidades da teoria do risco.

Diferença entre risco administrativo e risco integral:

Teoria do risco administrativo – Para esta teoria, o Estado responde objetivamente, mas se admite causa excludente de responsabilidade.

Nessa teoria, a caracterização do risco exige três elementos: conduta (lícita ou ilícita), nexo e dano. Logo, se o Estado provar algum evento que rompa o nexo causal, ele fica desobrigado a reparar.

Assim, o Estado responde objetivamente, mas é possível haver causa excludente de responsabilidade: caso fortuito ou força maior, culpa exclusiva da vítima e culpa exclusiva de terceiro.

No risco administrativo, a responsabilidade é afastada quando o Estado consegue demonstrar que o dano não decorre de comportamento dele.

Teoria do risco integral – Neste caso, o único requisito necessário para ensejar a responsabilidade do Estado é a ocorrência do dano.

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Na teoria do risco integral, a responsabilidade do Estado é objetiva, pois não se discute ato ilícito. A norma afirma que basta o dano para caracterizar a responsabilidade.

Para essa teoria, não se admite causa excludente de responsabilidade.

O risco será integral quando o ordenamento jurídico estabelecer como único requisito o dano.

Em suma: quem define se o risco é administrativo ou integral é o ordenamento jurídico de cada Estado. Se o ordenamento jurídico, por meio da Constituição e/ou leis, estabelecer o dano como único requisito para a responsabilidade do Estado, o risco será integral.

Observação: Evolução histórica no Brasil

1º. Constituição de 1824 e 1891- Não contemplavam a matéria, traziam apenas a responsabilidade do servidor em decorrência da prática de ato ilícito.

2º. *Código Civil de 1916 – Responsabilidade subjetiva das Pessoas Jurídicas de Direito Público.

✓ O Código Civil de 1916 previu a responsabilidade subjetiva do Estado.

3º. Constituição de 1934 e 1937 – Responsabilidade solidária entre o Estado e o servidor.

4º. *Constituição de 1946 – Responsabilidade objetiva das Pessoas Jurídicas de Direito Público e direito de regresso em face do servidor na hipótese de culpa.

Atenção: a Constituição de 1946 foi a primeira constituição que previu a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público. Nesse momento, o Código Civil de 1916 deixou de ser aplicado em relação a este assunto, pois esta parte não foi recepcionada pela Constituição de 1946.

5º. Constituição de 1967 e 1969 – Responsabilidade objetiva das Pessoas Jurídicas de Direito Público e direito de regresso em face do servidor na hipótese de culpa ou dolo.

As constituições de 1967 e 1969 continuaram a prever a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público e direito de regresso em face do servidor nos casos de dolo ou culpa.

6º. Constituição de 1988 – Responsabilidade objetiva das Pessoas Jurídicas de Direito Público e das Pessoas Jurídicas de Direito Privado Prestadoras de Serviços Públicos e direito de regresso em face do causador do dano na hipótese de dolo ou culpa.

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A Constituição de 1988 amplia a responsabilidade civil. Ela repete a regra da responsabilidade objetiva para as pessoas jurídicas de direito público e prevê, também, a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público.

✓ A Constituição de 1988 prevê o direito de regresso contra o causador do dano, seja ele servidor ou não.

7º. Código Civil de 2002 – Responsabilidade objetiva das Pessoas Jurídicas de Direito Público e das Pessoas Jurídicas de Direito Privado Prestadoras de Serviços Públicos e direito de regresso em face do causador do dano na hipótese de dolo ou culpa.

Observação: a teoria do risco no Brasil

A CF/1988 previu no art. 37, §6º1 a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público.

Essa responsabilidade é baseada no risco administrativo, ou seja, o Estado é o responsável objetivo, mas são admitidas causas excludentes de responsabilidade.

Observação: hipóteses de risco integral

No Brasil, há hipóteses de risco integral, as quais ocorrem quando a norma condicionar apenas a comprovação do dano como ensejadora da responsabilidade.

1º) CF, art. 21, XXIII, “d”2 – Dano nuclear.

2º) Lei 6.194/1976 – DPVAT.

3º) Lei 10.744/2003 - Dispõe sobre a assunção, pela União, de responsabilidades civis perante terceiros no caso de atentados terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos, contra aeronaves de matrícula brasileira operadas por empresas brasileiras de transporte aéreo público, excluídas as empresas de táxi aéreo.

4º) Lei 12.663/2012 – art. 23: “A União assumirá os efeitos da responsabilidade civil perante a FIFA, seus representantes legais, empregados ou consultores por todo e qualquer dano resultante ou que tenha surgido em função de qualquer incidente ou acidente de segurança relacionado aos Eventos, exceto se e na medida em que a FIFA ou a vítima houver concorrido para a ocorrência do dano.”

1 CF, art. 37, §6º: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos

responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

2CF, art. 21, XXIII, “d”: “a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa;”

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✓ ADI 4976/DF – Segundo o STF, a responsabilidade objetiva do art. 37, §6º da CF é uma responsabilidade mínima assegurada pelo texto constitucional. Entretanto, a legislação pode ampliar a responsabilidade do Estado. A lei não pode reduzir tal responsabilidade.

5º) Dano ambiental (REsp 1.374.284).

5. SUJEITOS À NORMA CONTIDA NO ART. 37, §6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

O art. 37, §6º da CF estabelece a responsabilidade objetiva do Estado. Tal responsabilidade pode ser ampliada pelas leis infraconstitucionais.

CF, art. 37, § 6º: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

O art. 37, §6º da CF define quais são os sujeitos submetidos à responsabilidade objetiva. São eles:

A. Pessoas JURÍDICAS de direito público;

B. Pessoas JURÍDICAS de direito privado prestadoras de serviços públicos.

São pessoas JURÍDICAS de direito público: União, estados, municípios, DF, territórios, autarquias, fundações públicas de direito público, consórcios públicos de direito público.

São pessoas JURÍDICAS de direito privado prestadoras de serviços públicos: fundações públicas com personalidade de direito privado, consórcios públicos de direito privado, empresas públicas, sociedades de economia mista, empresas subsidiárias (prestadoras de serviços públicos), concessionários de serviços públicos, permissionários de serviços públicos e autorizatários de serviços públicos.

Observação:

O art. 37, §6º da CF apenas estipula a responsabilidade civil da pessoa jurídica (de direito público ou de direito privado).

Isso é importante porque as permissões de serviços públicos podem ser concedidas para pessoas físicas.

✓ A permissão de serviços públicos (art. 2º, IV, Lei 8987/953) pode ser para pessoas físicas ou jurídicas. Da mesma forma, a autorização de serviços públicos também pode ser para pessoas físicas ou jurídicas. Assim sendo, o

3Lei 8987/95, art. 2º, IV: “permissão de serviço público: a delegação, a título precário, mediante licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco.”

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professor destaca que, quando a permissão ou a autorização de serviços públicos é feita para pessoas físicas, não se aplica a responsabilidade objetiva do art. 37, §6º da CF.

STF: A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição Federal.

RE 591874 (repercussão geral).

✓ O art. 37, §6º da CF não distingue terceiros usuários e não usuários do serviço público. Desse modo, a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva, independentemente de o terceiro ser ou não usuário do serviço.

OBS: Responsabilidade dos notários e oficiais de registro:

O oficial registrador e o notário são pessoas físicas que passam em um concurso e exercem função pública por delegação.

RE – 842846 – 27/02/2019

“O Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa.”

✓ O STF, no RE 842846, afirma que, se os tabeliães e registradores oficiais causarem danos a terceiros, haverá a responsabilidade objetiva do Estado. É assegurada a ação de regresso.

Lei 8.935/1994, art. 22: “Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso. (Redação dada pela Lei nº 13.286, de 2016).

(...)”

✓ A Lei 8.935/1994 afirma que os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis (responsabilidade subjetiva) por todos os prejuízos que causarem a terceiros.

✓ O professor destaca que deve ser adotado o posicionamento do STF a despeito do estabelecido no art. 22 da Lei 8.935/94.

Observação importante:

✓ Obra pública não é serviço público.

✓ Obra é contrato administrativo – Lei 8.666/93 ou da Lei 14.133/2021. Tais leis não tratam de serviços públicos, mas sim de obras, serviços, compras.

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Exemplo: Imagine que o Estado de São Paulo, pretendendo fazer uma obra, fez uma licitação e a empresa “X” sagrou-se como vencedora. A empresa assinou o contrato administrativo e executou a obra. Neste caso, a responsabilidade civil da empresa não é a do art. 37, §6º da CF, mas sim a responsabilidade da lei de licitações e contratos.

6. SITUAÇÕES QUE ENSEJAM A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

Esse tópico denota quais são as situações que geram a responsabilidade civil do Estado (hipótese de incidência da responsabilidade civil do Estado).

A. Condutas Comissivas = Responsabilidade Objetiva.

Na conduta comissiva, o Estado (ou quem lhe faça as vezes) pratica um ato administrativo e causa dano a terceiro. Tal responsabilidade é baseada na teoria do risco administrativo.

Se a responsabilidade é objetiva, a ação do Estado pode ser lícita ou ilícita. Assim sendo, o Estado também responde pelos danos causados a terceiros quando o ato for legal.

Obs.: na teoria do risco integral, não é necessária conduta do Estado, pois basta a ocorrência de dano.

B. Condutas Omissivas = Responsabilidade Subjetiva

O professor destaca que sempre houve divergências na doutrina sobre a responsabilidade civil do Estado na omissão.

Hely Lopes Meirelles e José dos Santos Carvalho Filho sempre defenderam que mesmo na omissão a responsabilidade do Estado é objetiva.

✓ Entretanto, o professor destaca que, se na ação e na omissão as consequências são as mesmas, não faz sentido distingui-las.

Celso Antônio Bandeira de Mello e o STJ entendem que, nas condutas omissivas, a responsabilidade do Estado é subjetiva, aplicando-se a teoria da culpa.

✓ Princípio da legalidade - Em respeito ao princípio da legalidade, o Estado só faz o que a lei manda. Se a lei não manda, a Administração não faz e, neste caso, há omissão lícita. Se a lei manda e a Administração não faz, há ilegalidade.

✓ De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello, só há a responsabilidade se a omissão for ilícita, ou seja, a lei manda e o Estado não faz. Em se tratando de condutas omissivas, o Estado só tem responsabilidade por atos ilícitos praticados.

✓ Omissões lícitas, na visão do autor, não geram responsabilidade civil.

C. Situações de Risco Criadas pelo Estado (Responsabilidade Objetiva)

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Neste caso, a responsabilidade também será objetiva, baseada na teoria do risco (administrativo ou integral). Nesta hipótese, não há ação direta ou omissão do Estado (não há conduta estatal). O que causa diretamente o dano não é a atuação do Estado, mas uma situação ou contexto criado pelo Estado sem o qual aquele dano não ocorreria.

Em suma, nessa hipótese, o Estado cria uma situação de risco.

✓ Se o dano decorre de situações de risco criadas diretamente pelo estado, a responsabilidade é objetiva e o risco é administrativo ou integral (a depender do que a lei estipula).

Celso Antônio Bandeira de Mello afirma que sempre que o Estado assume a guarda de coisas ou pessoas perigosas, ele assume o risco e responde objetivamente por isso.

Exemplos:

• Material nuclear;

• Armamentos;

• Presos em presídios;

• Hospícios;

• Animais selvagens em zoológicos; etc.

Exemplo: se um presidiário foge e, durante a fuga, mata uma pessoa.

Diante desse exemplo, Celso Antônio Bandeira de Mello afirma que não se trata de responsabilidade subjetiva. O raciocínio feito pelo autor se refere ao fato de que o dano apenas ocorreu porque o Estado produziu uma situação de risco. Assim sendo, neste exemplo, a hipótese de incidência da responsabilidade civil não é a omissão do Estado, mas sim uma situação de risco criada pelo Estado (existência de um presídio na localidade). Trata-se, portanto, de responsabilidade objetiva.

Obs.: a responsabilidade objetiva em casos de situações de risco criadas pelo Estado pode ser integral ou administrativa, a depender do que estiver disposto em lei.

Exemplo: no caso de presos em presídios, há responsabilidade objetiva porque o Estado produziu o risco, mas ela estará baseada no risco administrativo, pois admite causas excludentes de responsabilidade.

OBS: Hely Lopes, José dos Santos Carvalho filho e algumas decisões do STF afirmam que, mesmo na omissão, a responsabilidade é objetiva.

Jurisprudência:

RE 841526 – “Em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no art. 5°, inciso XLIX, da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte de detento.”

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EMENTA: “A responsabilidade civil estatal, segundo a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, § 6º, subsume-se à teoria do risco administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto paras as omissivas, posto rejeitada a teoria do risco integral (...)”

RE 136861 – “Para que fique caracterizada a responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes do comércio de fogos de artifício, é necessário que exista a violação de um dever jurídico específico de agir, que ocorrerá quando for concedida a licença para funcionamento sem as cautelas legais ou quando for de conhecimento do poder público eventuais irregularidades praticadas pelo particular.”

✓ A responsabilidade civil do Estado nos casos de comércio de fogos de artifício ocorre em caso de omissão: o Estado deveria fiscalizar, mas não fiscalizou. O Estado não poderia ter concedido o alvará de funcionamento sem as cautelas devidas, mas fez isso. Trata-se de responsabilidade subjetiva, pois quem pleiteia a indenização deve comprovar a violação de um dever jurídico específico de agir (comprovação de ato ilícito).

RE 724347 - STF: “Na hipótese de posse em cargo público determinada por decisão judicial, o servidor não faz jus à indenização sob fundamento de que deveria ter sido investido em momento anterior, salvo situação de arbitrariedade flagrante.”

✓ Imagine que “A” fez concurso e foi reprovado. Entretanto, “A” ingressa na justiça e, depois de 10 anos, ganha o pleito relativo ao erro do concurso. Neste caso, segundo o STF, o servidor não faz jus à indenização sob fundamento de que deveria ter sido investido em momento anterior.

RE 724347 – “Em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no art. 5°, inciso XLIX, da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte de detento.”

RE 580252 – “Considerando que é dever do Estado, imposto pelo sistema normativo, manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição, a obrigação de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento.”

STJ – “A responsabilidade civil do Estado por condutas omissivas é subjetiva, devendo ser comprovados a negligência na atuação estatal, o dano e o nexo de causalidade.”

✓ O STJ consolida o entendimento de Celso Antônio Bandeira de Mello, ou seja, a responsabilidade civil do Estado por condutas omissivas é subjetiva.

(16)

STJ – “Há responsabilidade civil do Estado nas hipóteses em que a omissão de seu dever de fiscalizar for determinante para a concretização ou o agravamento de danos ambientais.”

✓ O Ibama responde pelos danos causados a terceiros se ficar comprovada a sua negligência em fiscalizar.

Exemplo: rompimento da barragem da Vale em Mariana. Neste caso, a própria empresa Vale responde pelos danos.

Entretanto, se ficar comprovado que houve omissão do Estado no dever de indenizar, também haverá responsabilidade civil do Estado.

STJ – “Em se tratando de responsabilidade civil do Estado por rompimento de barragem, é possível a comprovação de prejuízos de ordem material por prova exclusivamente testemunhal, diante da impossibilidade de produção ou utilização de outro meio probatório.”

✓ No caso de rompimento de barragens, é possível a comprovação de prejuízos de ordem material por prova exclusivamente testemunhal.

STJ – “Não há nexo de causalidade entre o prejuízo sofrido por investidores em decorrência de quebra de instituição financeira e a suposta ausência ou falha na fiscalização realizada pelo Banco Central no mercado de capitais.”

O professor pede para o aluno tomar cuidado, pois esse entendimento não é coerente/coincidente com o visto anteriormente (rompimento da barragem e omissão do Estado na fiscalização).

Neste caso, mesmo que o Banco Central seja o responsável pela fiscalização de instituições financeiras, ele não responde por suposta ausência ou falha na fiscalização.

STJ – “O Estado não responde civilmente por atos ilícitos praticados por foragidos do sistema penitenciário, salvo quando os danos decorrem direta ou imediatamente do ato de fuga.”

Exemplo: se o preso foge e, nesse momento, ele ataca uma pessoa, o Estado responde. Entretanto, se o preso fugiu e, 3 semanas depois, causou dano a alguém, o Estado não responde por isso.

STJ – “A Administração Pública pode responder civilmente pelos danos causados por seus agentes, ainda que estes estejam amparados por causa excludente de ilicitude penal.”

✓ Legítima defesa é causa excludente de ilicitude (ato lícito). Entretanto, a responsabilidade do Estado é objetiva e, portanto, o Estado responde por atos lícitos e ilícitos.

(17)

STJ – “É objetiva a responsabilidade civil do Estado pelas lesões sofridas por vítima baleada em razão de tiroteio ocorrido entre policiais e assaltantes.”

STJ – “O Estado possui responsabilidade objetiva nos casos de morte de custodiado em unidade prisional.”

STJ – “O Estado responde objetivamente pelo suicídio de preso ocorrido no interior de estabelecimento prisional.”

STJ – “A existência de lei específica que rege a atividade militar (Lei n. 6.880/1980) não isenta a responsabilidade do Estado pelos danos morais causados em decorrência de acidente sofrido durante as atividades militares.”

✓ Militar se sujeita a regime jurídico específico. Entretanto, quando a questão não envolver regras próprias do regime militar, aplica-se a eles o direito administrativo comum, pois eles também integram a estrutura do Estado.

7. PARTICIPAÇÃO DA VÍTIMA

A. Culpa exclusiva da vítima

Se quem causou o dano foi a própria vítima, não há conduta do Estado. Se não há conduta do Estado, o Estado não pode ser responsável pelo dano. Portanto, a culpa exclusiva da vítima exclui a responsabilidade civil do Estado.

Exemplo: surfista de trem.

B. Culpa concorrente

Na culpa concorrente, há dano, mas a vítima colaborou (concorreu) para o dano. Não há exclusão da responsabilidade do Estado.

Na culpa concorrente, há um comportamento do Estado e um comportamento da vítima. Ambos os comportamentos causaram o dano.

Neste caso, o Estado ainda é responsável. Entretanto, por equidade, há uma redução do valor da indenização.

Obs. Quando a vítima concorre para o dano, há atenuação do valor da indenização. Porém, o valor da indenização não tem nada a ver com responsabilização. Responsabilidade civil é o dever de reparar. Haverá o dever de reparar, ainda que haja culpa concorrente.

STJ: A despeito de situações fáticas variadas no tocante ao descumprimento do dever de segurança e vigilância contínua das vias férreas, a responsabilização da concessionária é uma constante, passível de ser elidida tão somente quando cabalmente comprovada a culpa exclusiva da vítima. (Tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/73 - Tema 517).

(18)

STJ: No caso de atropelamento de pedestre em via férrea, configura-se a concorrência de causas, impondo a redução da indenização por dano moral pela metade, quando: (i) a concessionária do transporte ferroviário descumpre o dever de cercar e fiscalizar os limites da linha férrea, mormente em locais urbanos e populosos, adotando conduta negligente no tocante às necessárias práticas de cuidado e vigilância tendentes a evitar a ocorrência de sinistros; e (ii) a vítima adota conduta imprudente, atravessando a via férrea em local inapropriado. (Tese julgada sob o rito do art. 543-C do CPC/73 - Tema 518).

Exemplo: imagine que uma pessoa, ao atravessar a linha férrea que passa no centro urbano, seja atropelada. No caso do exemplo, a pessoa atravessou a linha férrea em local indevido e foi atropelada. Neste caso, há culpa concorrente da vítima, pois há dois fatos juntos que produzem o dano: o fato de o Estado ter que fiscalizar e o fato de a vítima não poder atravessar no local inadequado.

8. REPARAÇÃO DO DANO

A reparação do dano se faz com o pagamento da indenização.

✓ A responsabilidade é o dever de reparar.

A. Formas de reparação do Dano

A reparação do dano se faz com o pagamento da indenização.

As formas de pagar a indenização podem ser:

1º. Administrativa

A reparação do dano se dá administrativamente quando há acordo entre a vítima e o causador (consensual, por acordo).

Neste caso, tem-se uma forma amigável de reparar o dano e ela ocorrerá se houver consenso entre o causador do dano e a vítima.

✓ A lei do estado de São Paulo, por exemplo, prevê a possibilidade de acordo para pagamento de indenização por danos morais de forma administrativa.

✓ Para haver acordo, deve haver aceitação da vítima. Além disso, deve haver previsão legal para se fazer o acordo.

✓ Se não houver acordo, a reparação do dano será judicial.

2º. Judicial

A vítima do dano, diante da ausência de acordo, ajuíza uma ação em face do causador do dano.

STJ – “Os danos morais decorrentes da responsabilidade civil do Estado somente podem ser revistos em sede de recurso especial quando o valor arbitrado é exorbitante ou irrisório, afrontando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.”

(19)

B. Réu na Ação de Reparação de Danos

Questão: Quando a vítima decide ajuizar uma ação judicial de indenização para obter a reparação do dano, quem será o réu?

➢ Duas correntes:

1º. Somente pode ser ajuizada em face da pessoa jurídica (Hely Lopes Meirelles)

Segundo Hely Lopes Meirelles, quando a vítima decide ajuizar uma ação judicial de indenização para obter a reparação do dano, ela somente pode ingressar em juízo em face da pessoa jurídica.

2º. Agente causador do dano (Celso Antônio Bandeira de Mello)

De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello, a ação poderia ser ajuizada diretamente em face do causador do dano ou em face do Estado.

✓ A lógica neste caso é “quem pode o mais, pode o menos”. Se a vítima pode ajuizar em face da pessoa jurídica e não ter o encargo de demonstrar dolo ou culpa, ela pode ajuizar a ação em face do causador do dano e comprovar dolo ou culpa.

RE 1027633 – “A teor do disposto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, sendo parte ilegítima para a ação o autor do ato, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

Neste RE, o STF decidiu que a vítima deve ajuizar a ação contra a pessoa jurídica.

OBS: Denunciação da Lide

A doutrina afirma que não é possível a denunciação à lide. O CPC, entretanto, afirma que sim.

CPC, art. 125: “É admissível a denunciação da lide, promovida por qualquer das partes:

II - àquele que estiver obrigado, por lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo de quem for vencido no processo.

§ 1o O direito regressivo será exercido por ação autônoma quando a denunciação da lide for indeferida, deixar de ser promovida ou não for permitida.”

C. Prescrição

Questão: Qual é o prazo que a vítima tem para formular em juízo o seu pedido de indenização em razão de dano provocado pelo Estado? 5 anos.

(20)

1º. Pessoas jurídicas de Direito Público:

Se o dano for causado por pessoa jurídica de direito público, utiliza-se o Decreto 20.910/1932.

Decreto 20.910/1932

“Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.”

2º. Pessoas jurídicas de Direito Privado Prestadoras de Serviços Públicos:

Se o dano for causado por pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, utiliza-se a previsão da Lei 9.494/1997.

Lei 9.494/1997

“Art. 1º-C. Prescreverá em cinco anos o direito de obter indenização dos danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos.”

Atenção: O prazo prescricional para ajuizamento de ação de reparação de danos é de 5 anos, seja ação contra pessoa jurídica de direito público, seja ação contra pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público. Entretanto, o fundamento legal para tal prazo é diferente, podendo ser o Decreto 20.910/1932 ou a Lei 9.494/1997, a depender do caso.

STJ – “As ações indenizatórias decorrentes de violação a direitos fundamentais ocorridas durante o regime militar são imprescritíveis, não se aplicando o prazo quinquenal previsto no art. 1º do Decreto n. 20.910/1932.”

STJ - “O termo inicial da prescrição para o ajuizamento de ações de responsabilidade civil em face do Estado por ilícitos praticados por seus agentes é a data do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.”

9. O DIREITO DE REGRESSO

Trata-se do direito de ressarcimento.

Direito de regresso é o direito de receber de volta: a ação é ajuizada em face da pessoa jurídica e esta indeniza a vítima.

Posteriormente, a pessoa jurídica que pagou a indenização cobra o agente causador do dano.

A. Fundamento

O fundamento é a prática de ato ilícito. Só há direito de regresso se houve ato ilícito.

B. Formas do exercício do direito de regresso

(21)

A pessoa jurídica indeniza a vítima e, depois, em caso de prática de ato ilícito, ela se volta contra o causador do dano e cobra o ressarcimento (direito de regresso). Esse direito pode ser feito de forma amigável ou judicial.

1º Amigável: Trata-se de acordo feito entre o agente causador do dano/servidor e a pessoa jurídica que indenizou a vítima.

2º Judicial: Se não houver acordo, a pessoa jurídica que indenizou o dano ajuíza uma ação de regresso em face do agente causador do dano.

C. Prescrição

Questão: Qual é o prazo que o Estado tem para ajuizar uma ação de regresso em face do causador do dano? O STF definiu que há prescrição, mas não definiu o prazo. O STJ, por sua vez, definiu o prazo de 5 anos (por simetria).

RE 669069/2016 – “É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil.”

✓ A ação de ressarcimento decorrente de ilícito civil prescreve.

RE 852475/2018 – “São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa.”

RE 636886 – “É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas.”

Observação: o professor destaca que não se deve confundir a ação de ressarcimento baseada em ilícito civil (prescritível) com ação de ressarcimento baseada em improbidade administrativa por ato doloso que cause dano ao erário (imprescritível).

RE 669069 – “É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil.”

AREsp 768.400/DF (...)

5. O STJ tem entendimento jurisprudencial no sentido de que o prazo prescricional da Fazenda Pública deve ser o mesmo prazo previsto no Decreto 20.910/32, em razão do princípio da isonomia. (...)

Atenção: o STJ entende que, se o Estado tem 5 anos para ser cobrado, ele tem 5 anos para cobrar (princípio da simetria e da isonomia).

Referências

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