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Sôbre um caso de paludismo : tríplice infecção parasitária

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S o b r e um caso

de p a l u d i s m o

Aï$r/i PfP

(2)

It

i

ABÍLIO AUGUSTO DE SOUSA

I

Sobre um caso

de paludismo

( tRíPCTce rcyecçfio PBRnsitARm )

—a Dissertação inaugural apresentada

à Faculdade de Medicina do Porto

j |

A B R I L - 1 9 1 9

P O R T O

Esools Tipográfica da Oficina de S. José Ru* Alexandre Herculano

(3)

Faculdade de Medicina do Porto

DIRECTOR

Maximiano Augusto de Oliveira Lemos

SECRETÁRIO

Álvaro Teixeira Bastos

CORPO DOCENTE

PROFESSORES ORDINÁRIOS Augusto Henrique de Almeida Brandão Anatomia patológica.

Cândido Augusto Corrêa de Pinho ... Clínica epoliclínica ohstéctritM. Maximiano Augusto de Oliveira Lemos História da Medicina. Deontologia

médica. João Lopes da Silva Martins Júnior ... Higiene. Alberto Pereira Pinto de Aguiar Patologia geral.

Carlos Alberto de Lima Patologia e terapêutica cirúrgicas. Luís de Freitas Viegas Dermatologia e Sifiligrafia. José Dias de Almeida Júnior Pediatria.

José Alfredo Mendes de Magalhães... Terapêutica geral. Hidrologia médica. António Joaquim de Sousa Júnior Medicina operate: ia e pequena cirurgia. Thiago Augusto de Almeida Clínica e policlínica médicas.

Joaquim Alberto Pires de Lima Anatomia desciitiva.

José de Oliveira Lima Farmacologia. Álvaro Teixeira Bastos Clínica e policlínica cirúrgicas. António de Sousa Magalhães e Lemos Psiquiatria e Psiquiatria forense. Manuel Lourenço Oomes Medicina legal.

Abel de Lima Salazar Histologia e Embriologia. António de Almeida Garrett Fisiologia geral e especial.

Alfredo da Rocha Pereira Patologia e terapêutica médicas. Clí-nica das doenças infecciosas. Vago

PROFESSORES J U B I L A D O S José de Andrade Oramaxo

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P r ó l o g o

J^e há muito prometêramos a r.ós mesmos estas palavras, porque as considerávamos nossas, absoluta-mente nossas. Como tais, elas traduzirão fielabsoluta-mente aquilo que pensamos sem receio di chocar com qual-quer espécie de conveniência. Diremos aqui hoje o que ontem pensávamos e dizíamos lá fora.

Desde que transpusemos as umbrais solenes do templo de Esculápio, ao nosso ouvido chegou sempre um eco de revolta contra uma lei que, diziam-nos, nos obrigava (terrível pesadelo!) a fazer um livro no fim do curso, condição sine qua non para o desem-penho de nobre sacerdócio a que aspirávamos. Tínha-mos a impressão de que esse eco vinha de muito longe, de muitas gerações passadas..,

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VIU

E ao passo que ouvíamos lá fora bramar contra a lei, a dura lei, aqui em regra fazia se o silêncio.

Poucos se insurgiam contra a exigência do livro, da tese afinal. Não raro líamos neste logar uma jeremiada por vezes lamurienta, em que de envolta

com súplicas de benevolência perante o douto júri, se pretextavam contingências várias, múltiplas compli-cações, no sentido de atenuar a sentença dos que haviam de julgar o trabalho final. Causava-nos estra-nheza que protestando tanta gente contra a lei, esta ainda vigorasse. E francamente supusemos que já ao termo do nosso curso, não lhe suportássemos o rigor. De tantos que por aqui passavam apenas alguns, poucos, ousavam levantar a voz com desassombro

contra a lei draconiana.

Mas a verdade é que a lei cumpre-se e não se discute, antes da sua rigotysa observância. A liber-dade de crítica faculta-nos, cremos, o comentário.

Posto isto diremos o nosso parecer sobre o assunto, respeitando sem dúvida os altos interesses da sciência, mas em boa verdade não esquecendo os nossos. Que cada um diga o que se lhe oferecer. Deixar de dizer com receio de atingir, não a lei, mas os legisladores, isso não. Quando as leis não são justas moãificam-se. Condenar a lei porque obriga a uma prova final seria veleidade. Apreciar o modo como essa prova podia ou devia ser feita, é pelo menos razoável. Não

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IX

basta dizer que a tese, tal como se exige, é um factor de fomento scientífico. Não basta dizer que os 50 exem-plares exigidos visam, não à beneficiação das artes gráficas, mas do derramamento da sciência. Não basta dizer, numa palavra, que deve haver tese. E preciso que os factos demonstrem a sua vantagem para a sciência médica, o mesmo é dizer, para a

Humanidade.

A lei manda que se façam trabalhos originais ; que ela nos abra ampla e airosamente o campo experi-mental, porque só daí podem sair trabalhos desse género. Mas desde que se convencionou chamar trabalho original a um volume de compilação, tese de compilação como também se dis, a um repertório dos trabalhos já feitos, qual a vantagem que daqui advêm à sciência ? Não a vemos.

As Faculdades de Medicina exigem 50 exemplares impressos. Por que não aceitam a prova final manus-crita ou dactilografada e, uma vez reconhecido o seu valor, a não mandam inserir nos seus anais ou em edição de quantos exemplares lhes aprouver ? Não sabemos.

Temos ouvido que só os cábulas assim pensam. Nem só esses.

Pensam assim também os que como nós só confia-ram através de longos anos no esforço próprio, e que ainda nos períodos mais angustiosos e acidentados, quando a energia tinha de ceder a duras condições

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* '

de vida, não deixaram de ver só nesse esforço, o único meio de vencer. Pensam deste modo os que, como nós, entendem que a probidade scientifica impõe que cada um dê provas do que é capas de fazer. E deste modo pensam ainda os que, como nós, nunca solicitaram indulgências nem tão pouco lauréis, como também não deixaram de reconhecer a benevolência e lialdade, a que de resto todo o estudante tem direito.

Pensámos sempre que a tutela escolar só é aceitável quando, respeitando os interesses da sçiência, encara devidamente as aspirações dos tutelados. Quando essa tutela esquece ou menospreza os interesses morais ou materiais dos tutelado», então estes deixarão de ver nela um poder disciplinador para a julgarem apenas um instrumento de força. Daí a reacção. Daí os múltiplos atritos duma tal engrenagem quz os séculos enferrujaram, atritos esses que lhe dão uma marcha pesada, lenta...

Para alguns esses atritos vencem-se à força de trabalho; para muitos o processo é diverso — ado-çam-se à custa duma certa lubrificação. Este processo é em verdade muito cómodo ; nunca o ado-ptámos.

Tínhamos e temos confiança em melhores tempos, em que uma justiça mais límpida há de surgir.

Pugnámos sempre por que cada um marque pelo que vale e não valha pela marca que artificialmente

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e porventura lhe aponham. Nenhum obstáculo nos afrouxou a vontade e se alguém, ante esses obstáculos desanimou, não fomos nós.

Para concluir deixaremos aqui exarada a nossa gratidão aos que nos trataram com aquela bene-volência que não pedimos, com aquela lialdade que sempre e tacitamente soubemos reconhecer.

Aqueles a quem nada devemos, o nosso silêncio.

* * *

O assunto deste trabalho fornos sugerido pela observação dum doente que, como exercício escolar, houvemos de fazer na cadeira de Patologia exótica da Escola de Medicina Tropical, onde estamos matricu-lado. 0 facto de o doente ter revelado pelo exame do sangue uma tríplice infecção parasitária, condu-ziu-nos á leitura do que sobre a questão da unicidade ou pluralidade do hematozoário alguns autores escrevem. Meteceu-nos também especial atenção o estudo da profilaxia anti-palustre, que constitui o capítulo mais importante da higiene colonial. A medicação especifica devia igualmente interessar-nos e assim dedicamos algumas considerações sobre o emprego das soluções quinicas e condições da sua eficácia. A observação do doente tem deficiências como não podia deixar de ter. Procurámos fazê la

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m

tão completa quanto o permitiam os nossos recursos, dentro das circunstâncias impostas.

E assim elaboramos o trabalho que constituirá a prova final do nosso curso. Em nada o julgamos digno da publicidade a que a lei o força. Pela orien-tação que lhe demos e que é de nossa única responsa-bilidade daremos contas.

*

* *

Ao ilustre professor DR. ALBERTO DE AGUIAR

pela honra que nos conferiu, aceitando a presidência deste trabalho, o nosso reconhecimento.

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CAPÍTULO I

Principais factos 6 datas da história

do paludismo e do seu agente

i/ESDE mui remotos tempos se admitia que as febres intermitentes saíam dos pântanos.

Julgava-se que gérmens provenientes da decom-posição das matérias orgânicas emanavam das águas estagnadas e flutuavam no ar. Era a teoria dos miasmas ou da mal'aria.

A acção nociva das águas pantanosas sobre a saúde humana era já conhecida, cinco séculos antes de Cristo.

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das intermitentes, assinalando as afecções do baço e a hidropisia de natureza palustre, os tipos de febre quotidiana, terçã e quarta, e a maior frequên -cia destas no estio e no outono.

Em todas as expedições militares aos países tropicais, a malária vem sempre no primeiro plano das causas dizimadoras dos exércitos expedicio-nários. Assim sucedeu aos franceses em Madagas-car, nos quais a mortalidade pelo paludismo foi elevadíssima.

Depois que PASTEUR demonstrou que as doenças

eram causadas por seres infinitamente pequenos, procurou-se descobrir o microorganismo agente da malária. LANGISI atribuía as febres intermitentes

a animálculos microscópicos engendrados pela putrefacção dos vegetais, os quais eram susceptíveis de penetrar no sangue. Aconselhava-se a não respirar o ar dos pântanos, para o que se deviam defender as vias respiratórias da penetração dos parasitas, por uma ligeira gaze. Era também de conselho comer alho que, dizia-se, tinha a pro-priedade de destruir e afastar os gérmens das febres,

Ao passo que no ponto de vista etiológico os conhecimentos sobre a infecção malárica pouco avançavam, a terapêutica e a profilaxia alargavam os seus domínios.

A descoberta da acção da casca da quina, na ' metade do século xvn, abriu uma nova fase na

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3

história do paludismo. É desta época que data a distinção das febres em dois grupos: aquelas que se curavam com a casca da quina e as que este remédio não fazia ceder; estas eram as perniciosas. SYNDENHAM demonstra que só a quina

se devia usar no combate das febres perniciosas com sintomas de apoplexia.

LANCISI em 1717, fala dos benefícios que às

regiões palustres adveem da drenagem dos terrenos e constata a diminuição das febres após esta bene-ficiação. Assinala a nocividade das emanações que distinguia em inorgânicas e orgânicas animadas, incluindo nestas os numerosos e pequenos insectos, entre os quais, os mosquitos, descrevendo já os principais factos da vida destes dípteros.

TORTI em 1753 fez um estudo muito completo

das intermitentes e subcontinuas, simples e perni-ciosas.

No princípio do século xix as doutrinas da escola de BROUSSAIS, levaram a considerar as febres

palustres como devidas a um processo flogístico do aparelho digestivo ao qual se juntavam, nas febres perniciosas, reações do baço, fígado e cérebro. Esta doutrina teve como consequência desastrosa a des-crença na acção da quinina. Foram KELSCH e KIENER

que, retomando os trabalhos de TORT:, conseguiram

introduzir na terapêutica os sais de quinina, já então descobertos por PELLETIER e GA VENTOU, em

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4-1820. Os conceitos de LANCISI sobre a influência

dos terrenos e dos insectos no desenvolvimento das febres palustres foram do mesmo modo combatidos, a ponto de se admitir que os acessos febris resultavam da diferença de temperatura entre o dia e a noite, a qual se reflectia sobre os sistemas vascular e nervoso. Ao tempo em que se discutiam estas hipóteses sobre a etiologia da malária, RASORI

sustenta que as febres palustres eram produzidas por parasitas, que renovavam os acessos, no momento da sua reprodução, variável segundo as espécies.

MECKEL e VIRCHOW estudam as alterações

anáto-mo-patológicas da malária. Descrevem a melanemia do baço,, do fígado e do cérebro como específica do paludismo, acabando com o exagero a que se havia chegado de atribuir ao paludismo outras pirexias infecciosas, como a febre tifóide, a disenteria e a febre amarela. Daqui resultou o abuso da quinina. São ainda KIENER, KELSCH, BAGELLI e outros

que definem bem o quadro clínico do paludismo. Dentre as diferentes descobertas de microorga-nismos pretensos agentes do paludismo, entre os quais se citavam algumas algas, aquela que maior número de defensores conseguiu reunir foi a de

KLEBS e TOMMASI GRODELI em 1879. Estes autores

isolaram uma bactéria a que deram o nome de

Bacillus malariae. Pretenderam ter provocado

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5 produtos da vasa dos pântanos e ter conseguido traçados termométricos de febres intermitentes de

tipo regular, em animais.

De tal modo foi aceite este agente, que a desco-berta do verdadeiro parasita do paludismo por

LAVERAN, em 1880, só passados anos foi reconhecida

universalmente. Fazendo o estudo da melanemia, cuja natureza vinha sendo discutida desde os traba-lhos de MECKEL em 1847, LAVERAN observou, àlêm

dos leucócitos melaníferos «elementos esféricos, cilíndricos ou em crescente, de forma muito regular, pigmentados, muito distintos dos leucócitos.»

De 1880 a 1886 estudam-se as diferentes fases do ciclo evolutivo. do parasita do paludismo no sangue humano. MARCHIAFAVA e GELLI em

prepara-ções de sangue palustre coradas pelo azul de metilena, reconhecem nos glóbulos rubros a presença de parasitas em forma de anéis, os quais, muito peque-nos no início, aumentavam de volume e adquiriam pigmento à custa da hemoglobina, enquanto os glóbulos rubros se descoravam. Observaram que no momento dos acessos esses corpos amiboides se dividiam em um certo número de corpúsculos, úni-cos que se encontravam no sangue depois da acme.

Por via endovenosa injectaram sangue palustre

num indivíduo são, provocando deste modo a aparição dos sintomas da malária, ao mesmo tempo que verificaram no sangue desse indivíduo a

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exis-tência de parasitas idênticos aos que tinham inje-ctado. GOLGI descreve o ciclo evolutivo do

hemato-zoário. Em sangue palustre retirado pouco tempo depois do acesso, confirma a existência das formas anulares. Nos dois dias seguintes de apirexia cons-tata que os parasitas aumentam de volume e se segmentam em corpúsculos que no conjunto tomam a forma de rosácea. No momento do acesso observa que o glóbulo estala e os corpúsculos se vão fixar a novos glóbulos. Nesta altura ainda não se haviam interpretado os corpos em crescentes e os flagelos.

Supunham uns que eram formas de degenerescência dos parasitas; LAVBRAN considerava-os como as

formas últimas do seu desenvolvimento. Na mesma época, SIMOND, EIMBR, PFEIFFER, SIEDLESCKY

deter-minam os ciclos evolutivos das coccídeas, desco-bertas por VOGEL em 1845.

DescreViam-se, antes de 1892, dois géneros de coccídeas com ciclos evolutivos diferentes; numas o parasita, depois de se desenvolver nas células, enquistava-se e era eliminado para o meio exterior; noutras havia apenas um ciclo endogéneo, no qual o parasita se dividia e reproduzia no próprio seio do hóspede infectado. A coccídea conhecida há mais tempo era o Cocádium oviforme, que se encontra frequentemente no fígado e canais biliares do coelho, e cujo ciclo evolutivo nessa época era assim des-crito : O gérmen do parasita, depois de ter penetrado

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numa cécula do tubo digestivo ou dos canais bi-liares do coelho, aumenta de volume e, uma vez atingido o limite de desenvolvimento, cai no canal sob a forma de quisto de duplo envólucro. O seu protoplasma contrai-se e divide-se em quatro espo-roblastas, dos quais resultam os esporos ; cada um destes contêm dois esporozoítos.

Os esporos são ingeridos pelo coelho nos alimen-tos, indo ûih'rgar-se nas células e reproduzir a infe-cção. Em 1870, EIMER descobre um parasita no

intes-tino do rato, a que chamou Qregarina faleiformis. Esta e outras coecídeas descritas, foram agrupadas

por SCHNEIDER no género eimeria. Nestas não havia

a formação de quistos. O protoplasma dividia-se em células redondas que depois tomavam a forma de gomos de laranja, dando ao conjunto o aspecto dum barrilete. Estes elementos do barrilete quando maduros reproduziam a infecção. PFEIFFER em 189S2

estudando a coecídea do coelho notou que o número de parasitas encontrados no tubo digestivo era muito superior ao dos esporozoítos ingeridos.

Observando ainda um coecídea semelha me à descrita por EIMER, emitiu a hipótese de que esta

não era senão uma forma da coecídea do coelho. Estabeleceu então que o género eimeria era apenas uma modalidade do coccidium, de modo que aquele representaria o ciclo endogéneo em que o parasita se reproduzia no seio do mesmo animal, e este

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cons-tituiria o ciclo exogéneo, pelo qual a infecção se transmite de animal para animal.

SCHAUDINN, SIEDLEGKI e SiMOND confirmam em

1897 o conceito de PFEIFFER. O último destes

obser-vadores vai mais longe e consegue encontrar as formas do género eimeria em coelhos aos quais fez absorver esporos maduros de Coccidium oviforme.

Em 1889, METSGHNIKOFF estudando a coccídea

do intestino da salamandra, tinha observado, entre os elementos parasitários, pequenas massas providas de flagelos muito móveis, formando uma verda-deira cabeleira. Não conseguindo esclarecer o seu papel, encarregou SIMOND de o estudar. Este

obser-vador reconheceu que o Coccidium oviformis dava origem não ao quisto de duplo envólucro, mas ainda a duas formas de divisão de tipo eimeriano. Umas que não eram mais que os barriletes do género

eimeria, deslocavam-se quando livres no intestino

com movimentos lentos ; outras mais pequenas e mais móveis representavam os elementos filamen-tosos observados por METSCHNIKOFF. Considerou

estas como elementos femininos. Segundo a moderna terminologia, as células eimerianas correspondera aos esquizontos ; as massas que continham os fla-gelos, microgametocitos com os respectivos micro-gametas; os elementos do barrilete, merozoítos.

SCHAUDINN e SIEDLEGKI estudam o ciclo evolutivo

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constatam o fenómeno da fecundação. MAC-CALLUM

em 1897 descobre no paludismo das gralhas o fenó-meno da fecundação, isto é a penetração de macro-graraeta (gameta masculino), no microgameta (ga-meta feminino).

Em 1883, KING fundando se em dados

epidemio-lógicos, atribui ao mosquito um papel importante na disseminação do paludismo.

KOCH refere que os negros de certa região

chamam mbu, ao mesmo tempo à malária e ao mosquito. LAVERAN emite a mesma hipótese era

1884. Ross descobre as primeiras fases da evolução do parasita humano no anopheles.

Dois anos depois, o mesmo autor constata o ciclo completo da evolução do parasita do palu-dismo das aves no sangue e nos mosquitos da sub-familia culicina. '

Foi por esta época que Giussi determinou o ciclo evolutivo do hematozoário nos mosquitos da sub-familia anophelina.

Em 1900, PATRICK MANSON demonstra o papel

infectante em anopheles parasitados, que lhe haviam sido enviados da Italia por BIGNAMI. Foi seu próprio

filho, T H . MANSON, quem se fez picar por aqueles

mosquitos por diferentes vezes, desde 29 de Agosto a 4 de setembro daquele ano. Em 3 do mesmo mês experimenta arrepios e febre. Tem outro acesso em 15 e a 16 o sangue revelou parasitas de paludismo.

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\ j

C A P Í T U L O II

0 hematozoário de Laveran. Classificação,

Hâjim ou mais parasitas do paludismo?

Argumentos e controvérsias — ~ —

V HEMATOZOÁRIO de LAVERAN pertence à classe

dos esporozoários, segundo as modernas classifi-cações (BRUMPT, BRAUN-LEFERT). GRASSI nas suas

pri-meiras pesquisas sobre os parasitas da malária, incluia-o na classe dos rizópodos.

Entre os que sustentaram que o parasita do paludismo pertencia à classe dos esporozoários contavam-se METSCHNIKOFF, DANILEWSKY e LABBÉ.

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m

As pesquisas feitas sobre o ciclo de vida destes parasitas no organismo do mosquito deram todo o apoio a este modo de ver. De facto o parasita no seio destes artrópodos tem o desenvolvimento típico dos esporozoários.

A principal diferença que hoje se estabelece entre esta classe e a dos rizópodos, consiste em que o parasitismo daqueles tem sempre uma fase de evolução nas células ou nos tecidos. Em geral também os esporozoários não emitem pseudópodos, ao contrário de que sucede nas amibas.

Segundo BRAUN-LEFERT (1915), na ordem dos

hemosporideos agrupam-se os parasitas dos

glóbu-los rubros ou brancos dos vertebrados, onde se dão numerosas multiplicações esquizogónicas ; espo-rogonia nos artrópodos hematófagos ; corpo de for-ma variável e não apresentando membrana. Divi-dem-se em quatro famílias:

Halterídea, leucocitozoíãea, babesídea, ê plasmo-, dídea. É a esta última que pertencem os parasitas

do paludismo.

Várias classificações se fizeram dos parasitas dos glóbulos vermelhos, resultando este facto da grande riqueza de formas compreendidas na oçdem dos hemosporideos. De dia para dia aumenta o número das espécies estudadas. As divergências nas classificações resultam principalmente do facto que alguns observadores teem tendência a admitir ura

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polimorfismo dentro de limites muitos largos, como

DANILEWSKY, que quereria identificar os parasitas

das aves com os da malária humana ; outros teem pelo contrário a tendência oposta de multiplicar as espécies.

*

A questão da unicidade ou pluralidade do para-sita não está em absoluto resolvida. Vejamos quais os factos e argumentos em que se apoiamos duas doutrinas.

Se bem que a discussão sobre o assunto não date de muitos anos, quási todos os autores estão de acordo em sustentar que as espécies parasitárias são múltiplas e em relação com o tipo febril, a ponto de hoje não se discutir já se os parasitas do paludismo pertencem ou não a uma ou mais espécies mas quantas sejam as variedades que se devem distinguir.

LAVERAN pertence àqueles que consideram os

parasitas da malária humana como formando uma só espécie polimorfa, espécie única com evolução variável.

Os vários tipos febris não seriam devidos a parasitas diferentes, mas a uma reacção ainda des-conhecida e diversa, segundo o organismo atacado.

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14

LAVERAN afirma que há muitos casos de febre

em que o tipo febril e a forma parasitaria não ofere^ cem nenhuma relação. A esta afirmação de LAVERAN

se opõem todas as pesquisas modernas, na opinião dos unicistas, especialmente dos observadores ita-lianos, que distinguem três espécies de parasitas maláricos em relação íntima com o tipo febril. Foi

GOLGI quem fundamentou esta doutrina.

BRUMPT descreve três espécies de parasitas;

Plasmodium malariae, plasmodium vivax e Plasmodium falciparum ou prœcox.

MARCHIAFAVA e BIGNAMI classificam os parasitas

do seguinte modo :

l.o _ Parasitas estivo-outonais ou da tropical. 2.0 — Parasitas da terçã.

3.0 —Parasitas da quarta.

Esta classificação, segundo os autores, é a que melhor se coaduna com os factos observados, por-que àlêm de fugir a quaispor-quer controvérsias, admite no primeiro grupo a existência de variedades afins. Pondo de parte a discussão sobre se dentre os parasitas estivo-outonais podemos distinguir parasi-tas de terçã maligna e de quotidiana, vejamos quais os argumentos em que assenta a doutrina da

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ÉÊtài mÈÊtái w*m î I - .- ■ —*■ ■ ■'■■■■■ -n-ii----'-•■"•■< ■' ' ■ " • ■ • ■ - - ■ ■ ' ■ I M M <

pluralidade do heraatozoário, com existência própria e inalterabilidade de forma:

a) Os mosquitos infectados num doente por­

tador de parasitas de uma espécie, só transmitem essa espécie.

6) Nos países onde existe unia só espécie de febre, a terçã benigna, por exemplo, todos os doen­ tes apresentam a respectiva espécie de hema­ tozoários.

c) As três espécies de parasitas apresentam uma constância perfeita dos caracteres morfológicos e biológicos essenciais, de modo a poderem­se dis­ tinguir com facilidade ao exame microscópico, e em todos os países maláricos do mundo foram encon­ tradas e reconhecidas com os mesmos caracteres fundamentais.

d) São inoculáveis de homem para homem e

reproduzem a forma típica parasitária e a respectiva forma clínica no inoculado, sem se transformarem uma na outra.

e) Teem uma relação íntima indiscutível com uma espécie clínica determinada.

BILLET admite a existência de duas espécies de

parasitas que não­podem transformar­se uma na outra: — o hematozoário da terçã, cujo ciclo evolutivo dura 48 horas, e o da terçã que evolui em 72 horas. Cada uma destas espécies se apresentaria quando

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da primeira invasão sob uma forma especial com gâmetas em crescente. Aparentemente idênticas neste período, as duas espécies poderiam diferen-ciar-se no momento das recidivas em terçã ou quarta.

A terçã- maligna, para este autor, seria uma-forma primitiva e complicada duma febre que evo-luiria secundariamente como uma terçã benigna ou quarta.

A persistência dos caracteres morfológicos e biológicos constitui um facto de alta importância scientífica e de grande valor prático, porquanto permite fazer com segurança o diagnóstico diferen-cial microscópico entre as três espécies de parasitas, sendo também no ponto de vista do prognóstico um precioso elemento.

Assim, desde que se esteja em presença de uma forma estivo-outonal ou tropical, estamos habili-tados a afirmar que a infecção pode tornar-se per-niciosa, visto como só a espécie praecox dá origem a esta forma grave do paludismo.

Contribuíram notavelmente para estabelecer o conceito da imutabilidade das espécies os resul-tados das inoculações de sangue malárico no homem. Por estas experiências se demonstrou que quando sob a pele ou nas veias do homem não se injecta sangue com uma única espécie de parasitas, desenvolvem-se somente os parasitas da espécie inoculada e correspondentemente resulta

(25)

^^MUh^MWWM mU***Çm. iriWWMm***'** ws

uma febre do mesmo tipo da do indivíduo que forneceu p sangue. São poucas as experiências deste género, mas, no dizer de MARGHIAFAVA a

BiGNAMr, o rigor com que se verificaram funda-menta plenamente o conceito das espécies distintas. Depois de citarem varias experiências de inoculação em que se reproduziram as formas parasitárias e clínicas, apontam estes autores apenas dois casos que contrariara esta doutrina. São os casos de

GUALDI e ÁNtoLisEi, que injectaram sangue com

parasitas da quarta e obtiveram num deles o desen-volvimento de parasitas estivo-outonais e no outro, parasitas da terçã. AXTOLISEI atribui o aparecimento

de parasitas diferentes dos inoculados à coexistên-cia das outras espécies que haviam passado desa-percebidas nos primeiros exames.

Continuando na defesa da doutrina pluralista, afirmam os mesmos autores, que a relação íntima entre cada uma das espécies e a respectiva forma clínica foi reconhecida pelo maior números de observadores. Segundo estes, as três espécies para-sitárias diferem entre si por algumas modalidades patogénicas. Os que sustentam o polimorfismo do

hematozoário, e neste número encontiatn-se

LAVE-RAN, METSGHNIKOFF e outros, apoiam-se no facto de,

no mesmo indivíduo, se alternarem os tipos febris. Mas isto na opinião dos pluralistas demonstra somente que as varias espécies parasitárias e os

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18

respectivos tipos febris, podem no mesmo doente sueeder-se e alternar-se, e não prova que haja uma transformação das espécies. Tais factos demonstram que as infecções mixtas produzidas por duas espécies de parasitas, teem tendência antes a suce-der-se que a sobrepor-se.

Em favor desta proposição citam-se as interes-santes experiências de DIMATTEI que. inoculando

parasitas da quarta num impaludado, cujo sangue continha corpos em crescente, viu deseiívolver-se a quarta ; inversamente, inoculando num portador de quarta, sangue com crescentes, notou que aquela desapareceu, enquanto a infecção estivo-outonal se manifestava.

Os partidários da doutrina unicista* à frente dos quais se encontra LAVERAN, defendem com

argumen-tos não menos poderosos a sua maneira de ver. O grande mestre da parasitologia sustenta a unicidade do hematozoário que tem o seu nome não só no campo laboratorial, como no ponto de vista clínico e anátomo-patológico, no qual considera a sua dou-trina indiscutível. De facto a anatomia patológica mostra que as alterações hemáticas e viscerais do paludismo, como a melanemia e a esplenomegalia, são comuns a todas as febres palustres. O trata-mento é o mesmo para todas elas. Um- outro facto de ordem clínica, em apoio da mesma doutrina, é a observação corrente de que, especialmente nos

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pai-19 ses quentes, as febres de primeira invasão não oferecem um tipo definido, terção ou quartão, sendo pelo contrário contínuas ou quotidianas. MARCHOUX

assinala o facto de nos indígenas se encontrarem reservatórios de parasitas de grandes formas, aò passo que as formas de terçã maligna se observam de preferência nos europeus. Refere mais este autor numa memória publicada em 1897, o caso de um militar impaludado no Senegal, no qual acompanhou a evolução da doença. O sangue do doente exami-nado frequentes vezes, revelou sempre a existência de parasitas da terçã maligna. Mandado para França, o doente foi viver nos arredores de Paris, tendo durante a licença alguns acessos febris.

Ao exame do sangue nenhum hematozoário da espécie falciparum foi encontrado, notando-se simplesmente as grandes formas de parasitas. Nada havia que fizesse crer. quando em África, numa dupla infecção. Em Fiança não habitou qualquer região impaludada.tGomo explicar a desaparição do

prœcox e a existência das outras espécies?

MARCEÍÍAFAVA explica o facto dizendo que em

geral os parasitas da terçã benigna não modificam o desenvolvimento dos da terçã maligna que é a infecção predominante. No sangue dos doentes que apresentam uma infecção mixta de prœcox e

vivax, estes apenas se revelam nos primeiros

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20

parasitas da terçã benigna, após um longo período de latência, podem reaparecer, dando uma terçã simples ou dupla, ao mesmo tempo que a espécie

prœcox se foi gradualmente atenuando. Ficaria

assim explicado o facto de um doente poder apre-sentar primeiramente uma febre estivo-outonal e, passados meses, ter uma recidiva em que só apareçam parasitas da terçã benigna. Observando ainda o mesmo autor casos de infecção mixta de parasitas de terçã benigna e de quarta, notou que a febre in-termitente é de tipo irregular, com tendência à con-tinuidade. Num doente com igual associação para-sitária, do mesmo passo que diminuíam de inten-sidade os acessos da quarta e conjuntamente o número dos respectivos parasitas, havia uma acu-mulação das formas da terçã que pouco a pouco deram logar a acessos quotidianos. São factos desta ordem, pondera BIGNAMI, que originaram a

dis-cussão sobre a possibilidade da transformação de uma forma parasitária noutra, como querem os unicistas.

Uma outra observação em que parece ter havido transformação do prœcox em vivax, é referida

por JANCZO em 1908. Tratava-se de um doente que à

entrada no hospital (agosto de 1895), apenas revelou parasitas prœcox tanto no sangue periférico como no sangne obtido por punção do baço. Em 5 reci-divas com o carácter típico das febres perniciosas,

(29)

'•

91 foi sempre encontrado aquele parasita e nenhum da espécie vivax, a despeito de lhe serem feitas 91 análises de sangue. A 13 de Fevereiro do ano seguinte encontraram-se ainda gâmetas do prœcox.

De súbito, a 15 do mesmo mês, depois de um violento arrepio com febre intermitente típica, e em numerosos exames, somente se revelaram parasitas

vivax. O autor atribui este fenómeno à

transfor-mação do parasita, talvez pela influência do clima e das estações. É preciso confessar, acrescenta, que a hipótese da transformação explicaria muitos fenó-menos epidemiológicos até hoje não esclarecidos.

kâVERAN analisando as observações laborato-riais que levaram a» admitir a pluralidade das espécies, constata que as formas em rosácea devem preceder a aparição dos crescentes. O facto de, durante a malária crónica, na qual os crescentes são abundantes, não se encontrarem as rosáceas, explica-se pela lentidão com que se opera a reprodu-ção do parasita. A maior ou menor rapidez da repro-dução da mesma espécie, é que origina as diferentes formas em rosácea que se observam nas febres terçã, quarta e perniciosa. Quando esta reprodução se efectua com grande actividade, dá-se a segmen-tação antes que o parasita tenha atingido o estado adulto. Nestas condições a doença reveste um carácter agudo, muitas vezes pernicioso. O tipo terção ou quartão da febre resultaria da maior ou

(30)

n

menor actividade da segmentação. Sabe-se de resto que na primeira fase do seu desenvolvimento os para-sitas não se distinguem. Os próprios partidários da pluralidade reconhecem nesta fase, a falta de cara-cteres diferenciais entre as três espécies. GOLGI

aponta como principal diferença entre os parasitas da terçã e da quarta, o número de segmentos dos corpos em rosácea. As pesquisas de LAVBRAN

mos-tram pelo contrário que o número de merozoítes é variável em doentes atingidos de terçã e até no mesmo doente.

DANILBWSKY, depois de lembrar que se observa

muitas vezes o polimorfismo dos protozoários, conclui que a diferenciação dos parasitas, de modo algum afasta a possibilidade da origem comum de um só e mesmo micróbio gerador, exis-tindo livremente/ fora do organismo.

A polimorfia sob a qual o parasita se revela ao nosso exame e a impossibilidadde de o cultivar e de verificar todas as suas transformações, é que deram origem, afirma LAVERAN, à doutrina

plu-ralista.

As condições era que vive o parasita são muito variadas: sangue do doente, resistência das hematias, actividade dos leucócitos, clima, estações, etc. Gompreende-se como as formas em crescente se encontram quási sempre nos indivíduos que sofreram uma longa impregnação malárica e que

(31)

23

por isso se apresentam fortemente anemiados. Admi-te-se pois que as condições de meio em que vive o parasita, teem grande influência sobre as formas que êle toma.

Do mesmo modo intervêm o tratamento nestas alterações. Assim a quinina detêm a evolução dos parasitas e impede o enquistamento dos corpos amiboides. Pelo contrário, os crescentes resistem melhor àquele alcalóide. O facto foi verificado por muitos observadores. O corpo amiboide adere ordinariamente ao glóbulo rubro, podendo no entanto viver no estado livre. Geralmente o desen-volvimento destes elementos produz no organismo uma viva reacção. O doente vê-se obrigado a tomar quinina, sendo esta que impede o hemato-zoário de se inquistar. Nas formas crónicas o organismo habituado ao parasita reage pouco; o doente vai passando sem quinina porque o seus acessos febris são ligeiros e o parasita pode sem estorvo percorrer todas as fases do desenvolvimento até se enquistar.

BRUMPT descrevendo a acção patogénica das

três espécies do hematozoário, atribui ao

Plasmo-dium falciparum as formas remitentes, contínuas e

perniciosas do paludismo. LAVEKAN pelo contrário,

assinala grande número de factos que demonstram que os elementos em crescente do falciparum podem existir tanto nas febres regulares, como

(32)

u

nas intermitentes irregulares, contínuas ou per-niciosas.

Este autor observou em 136 doentes portadores de corpos era crescente todas as variedades clíni-cas do paludismo, assim distribuídas:

Quotidianas Terçãs Quartas

Intermitentes irregulares

Intermitentes de lipo indeterminado Contínuas

Acidentes perniciosos Caquexia sem febre

Inversamente, constatou que muitas vezes fal-tam os crescentes em febres palustres de tipo irregular. Em 56 casos apenas 23 apresentavam corpos em crescente; nos restantes 33 somente encontrou corpos amiboides.

Em muitos casos verificou a coexistência dos corpos amiboides, facto pelo qual em sua opinião os partidários da multiplicidade do parasita são obri-gados a admitir a frequência das infecções mixtas.

BRUMPT regista a associação bastante frequente

do praecox ao vivax; quanto ao P. malariae, diz ser muito rara a sua associação a qualquer dos outros. Este ponto está de acordo com o que se

47 13 2 2 42 10 13 7

(33)

25

tem observado no laboratório da Escola de;Medi-cina Tropical. Em 52 exames positivos, encontra-ram-se as diferentes espécies assim distribuídas:

Plasmodium prcecox .. Plasmodium vivax.... Plasmodium malariœ.., PI. prcecox, -\- PI. vivax PI. vivax -f PI. malariœ

BRUMPT encontrou 3 vezes em 150 lâminas,

a associação do vivax ao praecox (2 */0);

CARDA-MATIS e DJAMETIS 14 vezes em 300 casos (4,6 %).

O doente da nossa observação constitui pois um caso em que para os unicistas se teria revelado por condições varias-reacção orgânica, acção do clima no qual permaneceu 4 anos, e t c . , - u m polimorfismo completo. Para os pluralistas tratar-se há de uma infecção mixta das três espécies do hematozoário. Para concluir diremos que não vimos referida esta associação nos autores que consultámos.

O exame microscópico foi feito no laboratório da Escola de Medicina Tropical e confirmado pelo professor de parasitologia e director do mesmo labo-ratório, DR. AIRES KOPKE. Neste laboratório também

se não tinha observado ainda esta associação, ou porque os elementos parasitários não se apresen-tassem nitidamente diferenciados, ou porque de facto ela não existisse.

26 5 0 % 19 36 »

4 7,6 » 2 3,8 » 1 1,9 »

(34)

C A P Í T U L O III

Diagnóstico laboratorial e clínico.

Intermitência e perniciosidade nas

febras palustres

\J DIAGNÓSTICO do paludismo assenta sobre

dois factos fundamentais: parasitismo e doença. O exame histológico do sangue é o elemento mais importante do diagnóstico. A pesquisa do hematozoário de LAVERAN tem a mesma

importân-cia para o diagnóstico do paludismo, que a do bacilo de KOCH para o diagnóstico da tuberculose

(35)

28

laboriosa e mesmo infrutífera, já porque o mo-mento da colheita do sangue seja mal escolhido, já por serem os hematozoários muito raros. Pode estabelecer-se como regra que o exame praticado no começo do acesso febril resulta muitas vezes negativo. Quando se trata de um doente portador de terçã benigna ou quarta, a pesquisa será sempre positiva, desde que o doente não tenha tomado quinina, porquanto sabemos que toda a evolução dos parasitas daquelas formas clínicas se faz na corrente circulatória, sendo portanto fácil encontrá-lo no sangue periférico por picada do dedo. Se porém o doente teve quinina algumas horas antes, podemos não constatar a existência de parasitas. E pois de regra fazer a colheita de sangue antes do emprego da medicação específica. Tratando-se de uma terçã maligna já o caso é diferente.

Os esquizontos adultos do praecox abando-nam a circulação periférica para se dividirem nos capilares profundos. Se só uma geração de parasitas existir, poderá o exame ser negativo, a menos que se pratique a punção do baço, o que em verdade não é prático e pode redundar em uma grave he-morragia. Este órgão torna-se muito friável no paludismo ; daí a recomendação de ser percutido suavemente, a qual LAVERAN considera injustificada.

Mas o caso de uma terçã maligna simples, afirma MARCHOUX, é excepcional. O aparecimento

(36)

29 de pigmento resultante da divisão do parasita e subsequente fagocitose pelos leucócitos é também um elemento de valor; na auzência dos parasitas do sangue periférico a constatação dos leucócitos melaníferos autoriza-uos a pôr o diagnóstico. Nas infecções recentes a pigmentação dos glóbulos brancos encontra-se no momento do acesso e em maior quantidade à volta da elevação térmica pre-crítica, ao passo que nas infecções antigas, só dois ou três dias depois a vamos observar. Para

LAPTCHINSKY a pigmentação dos leucócitos não é

privativa da infecção palustre, podendo aparecer na febre recorrente. Donde conclui o mesmo autor, que a melanemia, assim como a mononucleose, não são sinais absolutos de diagnóstico. Praticamente reco-nhece-se o pigmento melânico com facilidade pela sua birrefringência.

No exame microscópico do sangue dum impa-ludado podem surgir causas de erro, como sucede para algumas alterações dos glóbulos rubros que se prestam a confusão com o hematozoário — glóbulos vacuolados, plaquetas, elementos que aparecem no interior dos glóbulos e que por vezes aparentam para-sitas. Por estas considerações se vê que não devemos afirmar com segurança a não existência do paludis-mo senão depois de longos e pacientes exames em vários períodos do acesso e da apirexia. Só depois de assim procedermos, é que estaremos habilitados

(37)

30

a asseverar que se trata da infecção malárica, ou doutra qualquer infecção ou auto-intoxicação.

Em muitos casos o exame do sangue é o único elemento de diagnóstico de que dispomos. Quando, por exemplo, o doente se apresenta em estado de delírio ou coma, sem que ao clínico seja possível colher os antecedentes mórbidos, surge a indeci-são sobre se se trata dum acidente pernicioso, duma meninginte cérebro-espinal, dum caso de insolação ou de alcoolismo. Será o exame do sangue que tirará todas as dúvidas. Este exame tendo alta importân-cia no ponto de vista do diagnóstico, é também dum grande valor prognóstico ; por êle se pode avaliar não só da gravidade da infecção, como da probabi-lidade de recaídas.

A abundância de elementos parasitários no sangue está quási sempre em relação com a gravi-dade da doença ; nos doentes atingidos de acessos perniciosos ou sob a ameaça destes acidentes, os parasitas encontram-se ordinariamente em grande quantidade no sangue. Esteve neste caso o nosso doente, cujo exame hematológico revelou numero-sos elementos parasitários das três espécies, predo-minando consideravelmente o praecox.

O exame do sangue dum impaludado fornece também no qua respeita às alterações sofridas pelos diferentes elementos hemáticos, alguns dados im-portantes de diagnóstico. Falámos já da

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pigmenta-31

ção dos leucócitos mononucleares, fenómeno este devido à fagocitose dos hematozoários e observado

pela primeira vez por LAVERAN. Daqui resulta que

no paludismo a fórmula leucocitária oferece uma mononucleose mais ou menos acentuada, atingido em certos casos 54 por 100.

A mononucleose encontra-se nos períodos de apirexia, tanto no paludismo agudo como crónico. Segundo MARCHOUX eleva-se de 5-10 a 15-20 por 100.

Há também linfocitose, principalmente nos impaludados crónicos. Diz BIGNAMI : «De facto

encontra-se nestes doentes (refere-se aos anémicos com repetidas recidivas e caquéticos) um aumento relativo dos leucócitos grandes mononucleares e dos linfocitos, e uma diminuição dos glóbulos de núcleo polimorfo e granulações neutrófilas».

Na opinião deste autor, o aumento por vezes considerável dos linfocitos seria uma consequência do tumor crónico do baço, porquanto está ave-riguado que a supressão ou diminuição da função esplénica determina uma linfocitose. No nosso doente havia de facto uma notável linfocitose no primeiro exame do sangue, isto é, quando o doente, sob a iminência dum grave acidente pernicioso, se apresentava profundamente anemiado e com o baço consideravelmente hipertrofiado e doloroso (28-1).

Numa segunda determinação a percentagem de linfocitos baixou apenas de 36 a 29.

(39)

áé

O aparecimento de hematias nucleadas obser-va-se em regra nos estados anémicos agudos.

Vejamos agora os caracteres morfológicos de cada uma das espécies de parasita, isto é, os ele-mentos de diagnóstico da espécie que nos fornece o microscópio. Pode observar-se no caso da terçã maligna simples que o ciclo do parasita praecox se faz em 48 boras. Gonsideram-se no esquizonto deste tipo duas fases : uma paraglobular em que o parasita permanece em contacto com a periferia do glóbulo sem o penetrar; outra endoglobular. Esta fase que dura algumas vezes 12 a 15 horas é, pela sua duração, característica do tipo praecox. Nas outras duas espécies o parasita penetra quási imediatamente no interior do glóbulo rubro. O esquizonto apresenta então a forma de anel, cora o contorno protoplásmico linear, nítido, muito fino.

No interior vé-se o núcleo constituído por uma pontuação excêntrica que dá ao conjunto o aspecto dum anel com engaste. O glóbulo não é aumen-tado de volume, ao passo que o parasita tornan-do-se endoglobular aumenta ao mesmo tempo as suas dimensões. O glóbulo parasitado descora-se pouco a pouco. No mesmo campo microscópico podemos encontrar muitos glóbulos parasitados e alguns com dois e três parasitas. Este facto já por si é característico do praecox. Encontram-se por vezes à superfície dos glóbulos manchas de forma

(40)

33

variável, pouco numerosas, de côr vermelha intensa pelo método de LEISHMAN, diferindo das

granu-lações que se observam no vivax. São as manchas

de MAURER. A forma dos gâmetas em crescente é

característica do praecox.

A esquizogonia dá se nos órgãos profundos, baço, fígado, cérebro e sobretudo na medula óssea, onde quási exclusivamente se pode observar o esqui-zonto completo com 30 a 32 merozoítos.

No vivax o período paraglobular é muito curto, razão por que é raro observar-se. O esquizonto do

vivux tem igualmente a forma de anel muito

seme-lhante ao do praecox, sendo mais volumoso que este. Ao fira de 12 horas o parasita aumenta con-sideravelmente de volume, ao mesmo tempo que o glóbulo sofre alterações importantes que permitem distinguir esta espécie das restantes. Além da hiper-trofriii e descórameuto do glóbulo, vêera-se cons-tantemente numerosas granulações típicas, regular-mente arredondadas e do mesmo tamanho. São as granulações de SCHUFFXER, exclusivas do tipo vivax.

As formas de divisão observam-se com relativa frequência no interior dos glóbulos. Os merozoítos são em número de 16 a 20, dispostas em forma de rosácea. O ciclo endoglóbular, ao contrário do que se dá no praecox, é fácil de seguir no sangue periférico.

(41)

34

outros, apresenta a forma inicial anular, toma depois um aspecto que o diferencia dos primeiros.

O parasita oferece a forma vermicular, es-tendendo-se duma extremidade do diâmetro do glóbulo à outra; o núcleo torna-se linear e para-lelo ao seu grande eixo.

Do aspecto piriforme, com uma extremidade afilada, o parasita no segundo dia de apirexia, toma uma disposição em faixa, depois de se ter arredon-dado a extremidade afilada. Esta faixa quadrilátera que reveste o esquizonto do malariœ é absoluta-mente característica. Ao passo que nas outras duas espécies o glóbulo sofria alterações no volume, no contorno e na coloração, aqui o glóbulo não apre-senta modificação importante. A forma era rosácea contêm em geral 8 merozoítos. Das três espécies de hematozoários é esta a menos abundante no sangue dos maláricos. Nas outras podemos encon-trar no mesmo campo, principalmente na espécie

prœcox, muitos parasitas (12 a 20); na malarice,

passam-se muitos campos sem se observar nenhum. No nosso doente eram muito raras as faixas. Mas mesmo em doentes com quarta simples o facto se verifica. Por isso talvez, é este o menos conhecido e estudado.

Eis muito resumidamente os principais cara-cteres diferenciais dos três parasitas do paludismo ou, como querem os unicistas, dos três aspectos sob

(42)

35

os quais, graças a variados factores, o mesmo e único parasita, se nos revela.

Passados sucintamente em revista os principais elementos relativos ao parasitismo málarico, falemos agora dos sintomas da infecção palustre e do seu valor relativo no ponto de vista do diagnóstico.

A periodicidade foi durante muito tempo consi-derada como carácter indispensável das febres palus-tres; hoje porém não se lhe liga esse valor.

«A intermitência e a periodicidade, escreve

GIULL, não se observam quando dos acidentes da

primeira infecção; este tipo, excepcional nas rein-fecções sucesssivas que se reproduzem anualmente e, em vários casos muitas vezes no ano, é anor-malmente registado nos períodos ulteriores; só tor-cendo os factos é que se acaba por o encontrar, se bem que por isso os clínicos se esforcem».

COLIN diz que se deve adoptar a ideia e o termo

de febres contínuas, sem qualquer reserva, qualquer expressão pela qual a continuidade não pareça tão real e absolutamente verdadeira como no tifo.

O tipo febril intermitente não é exclusivo da infecção malárica, observando-se, entre outras doen-ças, na calculose do fígado, em certas pneumonias» tuberculose, influenza, febre tifóide, séptico-pioemia criptogénica, supurações, etc.

Não nos alargaremos na exposição dos sinto-mas que interessam ao diagnóstico diferencial de

(43)

36

cada uma destas afecções ; queremos tão somente acentuar que muitas vezes o tipo intermitente da febre, especialmente nos países da malária, conduz ao*emprêgo de uma medicação quínica intempestiva, pelo facto de se taxar de palustre uma pirexia, cuja causa é bem diversa. Por isso, desde que o doente não necessite duma intervenção imediata, devem-se constatar dois ou três acessos antes de intervir, a menos que o exame do sangue tenha resultado positivo.

O clínico não deve ter confiança nas declara-ções do doente no respeitante à febre, mas somente nas indicações do termómetro. Ha doentes que não teem noção do acesso, em razão de não sentirem arrepio que falta muitas vezes, assim como o pe-ríodo de suojes.

No caso do nosso doente a febre não revestiu um carácter típico. O doente referiu que desde muitos meses vinha tendo febre todos os dias. No hospital a temperatura elevou-se no primeiro acesso a 39°,8, no segundo a 38° e nos seguintes baixou à normal, sob a acção enérgica da quinina. As febres das recidivas activas apresentam o tipo remitente ou tendência à continuidade, como sucede nas febres de invasão. É de supor que neste doente a curva termométrica oferecesse o tipo remitente.

O fácies do doente apresenta uma palidez ter-rosa muito especial, desde que o doente tenha

(44)

so-I

37

t

frido uma impregnação mala rica mais ou menos longa. Nos acessos da primeira invasão, pelo con-trário, o aspecto do doente éo que costumamos ver nos estados infecciosos agudos, com face vultuosa, injecção das conjuntivas, lacrimação, etc. Em poucos dias, ao fim duma semana, o doente apresenta todo ura outro aspecto — a palidez terrosa da face, com subicterícia, côr amarela das conjuntivas, asas dos nariz e comissuras labiais.

A anemia dos impaludados tem qualquer coisa de particular que a distingue dos estados similares doutras infeções.

Nenhuma infecção a produz tão rapidamente e com tanta intensidade como o paludismo. A perda de glóbulos rubros durante os acessos é muito considerável. Nos primeiros paroxismos fe-bris a renovação das heraatias repõe o equilíbrio globular. Bem depressa este equilíbrio se rompe e o indivíduo de acesso para acesso vai acusando um

deficit globular cada vez maior. Este facto é muito

mais acentuado na forma tropical quotidiana, na qual um indivíduo, ainda que vigoroso, pode perder em 24 horas 1.000.000 a 2.000.000 de glóbulos. Bastam,

diz BIGNAMI, 20 a 30 dias de febre simples,

quo-tidiana ou terçã, para fazer baixar o número de glóbulos de 5.000.000 a 1.000.000. Nas formas perni-ciosas a perda de glóbulos é mais intensa ainda;

(45)

glóbulos baixou em 24 boras do normal a 1.000.000 por cm9.

A anemia, a congestão crónica do baço e a dis-pepsia constituem a tríade sintomática do paludismo crónico. Quando se examina um impaludado cró-nico, ressalta logo à vista o contraste entre a ema-ciação do doente e o abaulamento do ventre.

A esplenomegalia é um dos sintomas mais impor-tantes. Nem sempre se encontra nas febres de pri-meira infecção, mas é constante nas formas cróni-cas. O volume que toma o baço depende principal-mente da duração da doença, embora circunstân-cias especiais, como a região, a idade do doente e outras condições individuais, pareçam influenciá-la.

Tem se observado que nas crianças o tumor esplénico se desenvolve mais rapidamente que no adulto, ao contrário do que se nota no velho em que a hipertrofia se opera lentamente. O baço em certos impaludados atinge proporções enormes.

A esplenomegalia não é contudo um sintoma que, por si só, autorize ao diagnóstico da malária. Na febre tifóide, septicemia e outras infecções, o baço aumenta de volume, embora não atinja as dimensões do grande baço palustre. Ha casos porém onde essa hipertrofia pode igualar a do paludismo crónico, especialmente a caquexia ; são a esplenomegalia pura, as cirroses do fígado e o cancro esplénico.

(46)

39 A hepatomegalia é mais tardia que a hipersple-nia e faz-se em geral no sentido transversal, como sucede para o baço; este facto, diz GRALL,

obser-va-se de preferência nos indivíduos que adquiriram o seu paludismo no estado adulto.

A dispepsia é muito frequente nos impaludados crónicos e traduz-se quási sempre por eructações, digestões difíceis, sensação de plenitude, flatulência manutenção do apetite. Estes sintomas acompa-nham-se em geral de acidentes nervosos, inferiori-dade cerebral caracterizada pela abatia intelectual, amnésia verbal e por vezes irritabilidade de carácter. As perturbações de carácter são de grande impor-tância, particularmente nos acidentes perniciosos.

Citam-se casos de doentes que, sob a ameaça dum acesso pernicioso, se tornam loquazes ou agressivos, chegando a despedir insultos à

entou-rage, e nos quais o estado geral se não modifica

a ponto de suspeitarmos dum acidente grave, mesmo fatal, que se avizinha.

Ainda nos doentes longamente submetidos à impregnação palustre teem importância os sintomas respiratórios. É o pneumo-paludismo. Nas febres de reinfecção os fenómenos agudos intercorrentes são o edema congestivo, a hiperemia flegmásica dos alvéolos e consecutivamente hemorragia e atelecta-sia de certas porções pulmonares.

(47)

40

mormente da direita; a respiração era um tanto difícil; a precussão e a auscultação confirmaram o estado congestivo. Para GRALL, no paludismo do

adulto a localização pulmonar faz-se nas bases, ao contrário do que se observa nas crianças em que são os vértices os mais frequentemente tocados.

Constituem elementos de alto valor no diagnós-tico do paludismo, a permanência do doente em regiões palustres, a profissão e os antecedentes mórbidos. Ao colher a história, o clínico não deve preguntar ao doente se teve as febres ou mesmo febre.

Muitos respondem negativamente por ela lhes passar desapercebida ou até por terem uma noção errónea do que sejam as febres, e dos variados modos por que elas se podem manifestar, não tendo mesmo a consciência do seu estado. Este facto verifi-ca-se muitas vezes nas regiões afastadas dos centros médicos è onde os sintomas da doença não são de natureza a chamar a atenção do doente.

No caso da nossa observação o doente declarou que durante dois anos passou muito bem e não teve febres.

Esmiuçando mais os antecedentes constatámos que êle teve realmente acessos ligeiros mas fre-quentes. Sucede mnitas vezes que as manifestações palustres começam por formas aberrantes. A longa permanência em regiões impaludadas é um elemento

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41 seguro no diagnóstico da infecção malárica. Sobre este ponto escreve GRALL:.«NÓS admitimos, ao

con-trário da maioria dos autores, que a impregnação malárica é inevitável, nas colónias palustres desde a primeira poussée estacionai. O benefício que se pode obter, que se deve obter pela protecção e a profi-laxia medicamentosa, não pode dar senão um resul-tado - o de reduzir, durante, longos meses, as mani-festações da intoxicação a formas abortivas. Esta profilaxia nunca 6 bastante perfeita para que, num meio activamente palustre, os habitantes escapem' a toda a impregnação. A intoxicação por esboçada que seja, continua a sua evolução progressiva, de tal modo que quando a economia sucumbe ao se-gundo ou terceiro ano, estas reacções, sendo semelhantes, não são idênticas às de um ataque realmente inicial. É preciso lembrar que permanên-cias sucessivas nas diferentes regiões pulustres se adicionam por mais completa e prolongada que possa ser a latência da doença».

O efeito rápido da medicação quínica, não só sobre os acidentes graves do paludismo como nas formas larvadas, é também um precioso elemento de diagnóstico.

A acção da quinina é sobremodo notável no tratamento dos acessos perniciosos. Esta acção foi frisante no nosso doente, que chegou a estar sob um prognóstico muito sombrio.

(49)

Os sintomas apresentados autorizam-nos a clas-sificar de pernicioso o seu acesso palustre. Os acessos perniciosos revestem aspectos muito varia-dos que, à primeira vista, não mostram relação alguma entre si: - febre com estado tifóide ou delírio, estado comatoso, algidez, sintomas coleriformes, febre biliosa com hemoglobinuria, gastralgia, con-vulsões epileptiformes, etc Estes acessos não se observam senão em indivíduos que tiveram já um ou mais ataques de febre palustre. O conhecimento dos antecedentes é pois de grande interesse. LAVERAN

nunca observou acidentes perniciosos em indivíduos anteriormente indemnes ao paludismo. As causas ocasionais e predisposições individuais teem um papel importante na eclosão destes acidentes, assim como as doenças anteriores, as grandes privações e fadigas. Contudo o elemento indispensável, o único que permilte afirmar a natureza palustre destes acessos, é o exame do sangue, que contêm sempre em casos tais, elementos parasitários em grande número.

Têm-se procurado classificar por modos vários os acessos perniciosos.

Chegaram a descrever-se 20 espécies de febres perniciosas. MAILLOT rejeita estas classificações e

considera apenas como febres perniciosas aquelas em que os acidentes são tão graves que tornam iminente a morte do doente. Para este autor, são

(50)

perniciosos os casos em que há lesões do aparelho cérebro-espinal, dos órgãos abdominais ou das vísceras torácicas, devendo a classificação funda-mentar-se sobre esta tripla ba«se.

DUTROULAU divide as febres perniciosas em

quatro grandes grupos : comatosas, atáxicas, álgidas e biliosas. Segundo a classificação de LAVERAN, o

acesso pernicioso observado no nosso doente é uma variante de acesso comatoso, em que os fenó-menos nervosos são fenó-menos acentuados. É o acesso soporoso, sobre o qual escreve este autor: «O acesso soporoso é uma forma atenuada do acesso coma-toso; o doente parece estar sob a influência do ópio, mergulhado em estupor, sem prestar atenção ao que se faz em volta dele ; quando o interrogamos em voz alta, olha com ar espantado a pessoa que lhe fala; parece compreender as preguntas que lhe fazem mas mal lhes responde, manifestando impa-ciência contra os que o incomodam>. Mas estes acidentes dissipam-se com uma rapidez maravi-lhosa, observa o mesmo autor, e no dia seguinte o doente apenas se queixa de fraqueza, ao mesmo tempo que retoma toda a sua lucidez. Opera-se uma verdadeira ressurreição.

O termo perniciosidade foi empregado outrora para designar as formas graves que terminavam pela morte. Quando ainda os sais de quinina não haviam sido introduzidos na terapêutica

(51)

anti-pa-44

lustre, considerava-se como febre intermitente normal aquela que habitualmente se curava. Os práticos admitiam nas perniciosas «uma acção miste-riosa que a transformava e lhe agravava o prognós-tico ao extremo. A perniciosidade mal conhe-cida nas "suas manifestações e causas ficava colo-cada para àlêm da intervenção médica.

A febre intermitente curava-se espontaneamente; a perniciosa, abandonada a si mesma, era fatal. Mesmo depois de ser conhecida a acção específica da quinina, sempre que surgia um acesso per-nicioso, era atribuído a qualquer tara do doente ou a outra doença que se sobrepunha. Alguns autores explicam hoje estas manifestações, nomeadamente as que se localizam nos centros nervosos, pela pro-dução de embolias e trombos parasitários. Para outros, este mecanismo não se verifica em todos os acessos;.o que se observa na maioria dos casos é uma abundante pululação de parasitas no sangue. Outros ainda fazem depender a gravidade dos acessos mais da data recente da renovação parasi-tária, que daquela pululação. GRALL não considera

a perniciosidade como resultante da acumulação de parasitas e de toxinas, antes pretende ver nelas a consequência dum paludismo renovado, enxertado num paludismo antigo, que colocou o doente em condições de resistência inferior, pelos repetidos ataques. E assim reúne as formas perniciosas e

(52)

45 larvadas no grupo das formas anormais do palu-dismo, em-que os órgãos e aparelhos atingidos, ao contrário do que habitualmente sucede, não são os órgãos hemopoiéticos. «Ha perniciosidade, diz

GfíAhL, todas as vezes que no decurso do paludismo,

fora da intervenção duma causa eficiente e sem cor-relação directa com a marcha da doença, um fenó-meno se exagera a ponto de ser' imediatamente ameaçador e de se tornar causa suficiente da morte». Dissemos que os antecedentes mórbidos dos impaludados constituem um valioso subsídio para o diagnóstico. Analisemos alguns fenómenos colhi-dos na história do nosso doente. O mais importante foi o aparecimento de edemas por todo o corpo, verdadeira anasarca, que obrigou o doente a inter-nar-se no hospital de Malange, para onde teve de ser transportado, fazendo uma travessia pelo mato durante uma semana. Refere o doente que esta anasarca foi passageira, desaparecendo durante aquele percurso. KELSCH e KIENER descrevem duas

formas anátomo-patologica de nefrite aguda :

«Nefrite difusa—Sobrevêm no primeiro período

da infecção. Desenvolve-se no decurso de algumas semanas ou meses. A anasarca é considerável e de desenvolvimento rápido; as urinas escassas, com muita albumina, muito coradas, algumas vezes san-guinolentas * com sedimento abundante. Noutros casos os edemas são parciais e móveis; urinas

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claras, abundantes e poucos albuminosas, podendo aparecer bruscamente oligúria, e haver n\ urina sangue ou somente hemoglobina.»

« Nefrite com granulações - Observa-se de prefe-rência nos indivíduos que tiveram muitas recidivas ; começa com anasarca e ascite com desenvolvi-mento rápido; as urinas são pouco abundantes, muito coradas, albuminosas, com sedimento abun-dante. Os sintomas urémicos desenvolvem-se com excepcional gravidade.»

Pelo que o doente nos narrou, não havia oli-gúria, as urinas eram claras e tudo se resolveu em poucos dias. TATYER registando a frequência da

albuminúria nos impaludados, afirma que na maio-ria dos casos o prognóstico é favorável e verifica-se a cura. RUM PICCI observou casos de negrite aguda

com anasarca, não havendo vestígios de albumina. Por outro lado, descreve-se um síndroma a que

GRALL liga muita importância nas manifestações

iniciais do paludismo. «Uma das mais importantes a investigar, assinala este autor, é a anemia pro-topática, aquela de que descrevemos e definimos a forma extrema sob a denominação de caquexia

primitiva e caquexia hidroémica».

Numerosos são os impaludados cuja história média começa por esta sintomatologia». Este sintoma é assim descrito : «Ao fim de poucas semanas, em seguida a três ou quatro acessos intermitentes que

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nada apresentaram de particular no ponto de vista da gravidade e tenacidade ; em seguida à febre inter-mitente de começo ou ainda por vezes bruscamente, fazia-se (Tonkim, 1885) um edema difuso dos mem-bros, da face e do tronco, não havendo albumina nas urinas, nem sopro cardíaco, a não ser às vezes um murmúrio anémico, tumefacção notável sem ser extrema do baço e do figado, anemia rápida, côr ligeiramente subictérica. Ha nestes factos um duplo facto particul ,",:•: a rapidez de aparição destes ede-mas, a antiguidade e gravidade aparentes das lesões viscerais. Este edema caquéctico aparecido em alguns dias desaparece por vezes rapidamente sob uma única influência — a da quininat.

Tratar-se hia de nefrite difusa ou deste síndro-ma ? Actualmente não ha lesão renal como o demons-trou a análise da urina. Os edemas do doente apa-receram e desapaapa-receram rapidamente sob a acção da quinina.

Um outio acidente que merece registar-se na história do doente é uma conjuntivite que lhe sobre-vem no hospital de Mossâmedes, quando ali se tra-tava de uma erupção vesiculosa, e que se caracte-rizava por hiperemia intensa com epífora, não ha-vendo nevralgia superaorbitária. Esta complicação repetiu-se mais tarde no hospital ds Loanda.

LAVE-RAN fazendo notar que este conjuntivite intermi-tente se acompanha sempre de hiperemia e

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lacri-48

mação, formula a seguinte pergunta : «A conjunti-vite pode desenvolver-se independentemente da ne-vralgia ?»

«Em apoio desta hipótese, acrescenta, observa-ram-se alguns factos, que me parecem pouco conclu-dentes». O caso deste doente parece corroborá-los. Também GRALL escreve sobre o asmuto :

«Contraria-mente à opinião de LEON COLIN e aos resultados da

minha observação pessoal, a conjuutivite intermi-tente, sem coincidência de nevralgia orbitaria, foi considerada por numerosos observadores como podendo caracterizar o ace&so e substituir as mani-festações ordinárias da doença». RAYMOND faz notar

que há nestes casos congestão e não inflamação, secreção exagerada e não muco-pús. Eis a sintomato-logia indicada por este autor: «A afecção conjuntival é sobretudo caracterizada por uma hiperemia consi-derável de um ou dos dois olhos, acompanhada de fotofobia, sem dores intraorbitarias ou periorbitárias com lacrimação abundante ; as pálpebras são atin-gidas ou não pela tumefacção. Estes fenómenos apa-recem subitamente durante algumas horas para cessarem em seguida ; apresentam-se com ou sem acesso febril, constituindo algumas vezes só por si

todo oacesso.» -/ A sintomatologia apresentada pelo doente era

a duma conjuntivite intermitente sem nevralgia, nem purulência.

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C A P Í T U L O IV

A acção da quinina sobre o

hemato-zoário. 0 emprego dos sais de

quinina. Terapêutica

A

X I ACÇÃO da quina no paludismo era desde

muito tempo conhecida e largamente aplicada. Depois do isolamento da quinina por PELLETIER

e CAVENTOU em 1820, o emprego deste aicaloide e

dos seus sais generalizou-se por toda a parte. A quina tinha àlêm de outros, o inconveniente de ter uma pequena percentagem em quinina. São precisos 60 gr. de quina para ter 1 gr. de quinina ; daí a

Referências

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