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A eficiência e a importância da separação dos poderes para a democracia brasileira: validade e aplicabilidade da teoria dos freios e contrapesos no cenário político brasileiro atual

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA HELENA RODRIGUES CAETANO MACIEL

A EFICIÊNCIA E A IMPORTÂNCIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES PARA A DEMOCRACIA BRASILEIRA: VALIDADE E APLICABILIDADE

DA TEORIA DOS FREIOS E CONTRAPESOS NO CENÁRIO POLÍTICO BRASILEIRO ATUAL

Araranguá 2020

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HELENA RODRIGUES CAETANO MACIEL

A EFICIÊNCIA E A IMPORTÂNCIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES PARA A DEMOCRACIA BRASILEIRA: VALIDADE E APLICABILIDADE

DA TEORIA DOS FREIOS E CONTRAPESOS NO CENÁRIO POLÍTICO BRASILEIRO ATUAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientadora: Profª Elisângela Dandolini Esp.

Araranguá 2020

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HELENA RODRIGUES CAETANO MACIEL

A EFICIÊNCIA E A IMPORTÂNCIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES PARA A DEMOCRACIA BRASILEIRA: VALIDADE E APLICABILIDADE

DA TEORIA DOS FREIOS E CONTRAPESOS NO CENÁRIO POLÍTICO BRASILEIRO ATUAL

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Araranguá, 14 de dezembro de 2020.

______________________________________________________ Profª Elisângela Dandolini, Esp.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Profª Nádila da Silva Hassan, Esp.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Profª Rejane da Silva Johansson, Esp.

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Dedico este trabalho a meu amor, Henrique, que está comigo desde o início da graduação, nunca me deixando duvidar das minhas competências pessoais, acadêmicas ou profissionais. Por ser melhor do que eu mereço.

Aos meus pais, Ana e Clemerson, e a minhas irmãs, Érica e Emilly, por todo apoio e compreensão nos momentos mais difíceis de minha formação.

E, por fim, ao meu cachorro, Harry, por ser luz na minha vida e me dar todo amor do mundo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, a Deus pelas oportunidades que me foram dadas na vida, principalmente por ter conhecido pessoas e lugares interessantes, mas também por ter vivido fases difíceis, que foram matérias-primas de aprendizado.

À minha família pelo carinho e compreensão, que são o suporte de toda a minha vida e sei que poderei contar com ela pelo resto dos meus dias.

Ao meu amor, Henrique, por todo apoio, compreensão, amor e enorme paciência que tem comigo todos os dias, em especial nesses últimos. Obrigado por sempre me entender e nunca desistir de mim.

Agradeço a minha orientadora Elisângela por me apoiar na pesquisa acadêmica. E a todo o corpo docente da Unisul, que me apoiou durante os cinco anos de graduação.

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“A capacidade do homem para a justiça faz a democracia possível, mas a inclinação do homem para a injustiça faz a democracia necessária” (Reinhold Niebuhr)

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RESUMO

A presente monografia procurou analisar o princípio da separação dos poderes e a teoria dos freios e contrapesos. O objetivo principal do trabalho foi analisar a eficiência e a importância da separação dos poderes para a democracia brasileira, bem como avaliar a aplicabilidade do sistema de freios e contrapesos no cenário político brasileiro atual. Ainda, objetivou-se descrever a evolução histórica da divisão dos poderes do Estado, descrever o conceito da teoria do sistema de freios e contrapesos, analisar o princípio constitucional da Tripartição dos Poderes e, por fim, verificar quais os limites de controle que os poderes da União exercem entre si. Para tanto, o trabalho valeu-se da pesquisa exploratória, por meio de fontes documentais e bibliográficas. As principais conclusões foram que o princípio da separação dos poderes e a teoria dos freios e contrapesos continuam válidos e eficazes no Brasil, diante da crise vivenciada no ano de 2020. Concluiu-se, ainda, que para que haja melhor eficiência dos atos do governo, é preciso que ocorra a flexibilização do princípio constitucional da separação dos poderes, de modo que cada Poder poderá realizar intensa fiscalização e controle sobre o outro. No entanto, há que se respeitarem os limites de independência constitucionalmente previstos, para que ocorra harmonia no país.

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ABSTRACT

This monograph sought to learn about the principle of separation of powers and the theory of brakes and counterweights. The main objective of the work was to analyze the efficiency and importance of the separation of powers for Brazilian democracy, as well as evaluating the applicability of the brake and counterweight system in the current Brazilian political scenario. Furthermore, the aim of this research was to describe the historical evolution of the division of state powers, describe the concept of the system theory of checks and counterweights, analyze the constitutional principle of tripartition of powers and finally to check what limits of control the Union's powers exercise between them. To this end, the work used exploratory research, through documentary and bibliographic sources. The main conclusions were that the principle of separation of powers and the theory of brakes and counterweights remain valid and effective in Brazil, in the face of the crisis experienced in 2020. It is concluded that in order to ensure better efficiency of government acts, it is necessary to relax the constitutional principle of the separation of powers, so that each power can perform intense supervision and control over the other. However, the limits of constitutionally provided independence must be respected in order for harmony to occur in the country.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 9

2 CONCEITO DE SEPARAÇÃO DOS PODERES ... 11

2.1 EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE SEPARAÇÃO DOS PODERES ENQUANTO DOUTRINA ... 11

2.2 EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE SEPARAÇÃO DOS PODERES ENQUANTO PRINCÍPIO NO DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO ... 16

2.3 TEORIA DOS FREIOS E CONTRAPESOS ... 20

3 O CONTROLE DOS PODERES NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ... 25

3.1 BREVE CONTEXTO HISTÓRICO ... 25

3.2 PODER EXECUTIVO ... 30

3.3 PODER LEGISLATIVO ... 37

3.4 PODER JUDICIÁRIO ... 40

4 APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES ... 46

4.1 LIMITE DA INTERFERÊNCIA QUE OS PODERES EXERCEM ENTRE SI ... 46

4.1.1 Medida provisória ... 47

4.1.2 Impeachment ... 52

4.1.3 Comissão Parlamentar de Inquérito ... 55

4.1.4 Cotrole de constitucionalidade ... 58

4.2 A EFICÁCIA, OU NÃO, DA SEPARAÇÃO DOS PODERES NO BRASIL ATUAL . 60 5 CONCLUSÃO ... 65

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho estuda o princípio da separação dos poderes, consagrado pelo artigo 2º da Constituição Federal e, ainda, a teoria dos freios e contrapesos, ambos em relação à sua validade e à sua aplicabilidade no Brasil.

Como é sabido, o princípio da separação dos poderes está previsto na Constituição Federal de 1988 em seu artigo 2º, o qual afirma que os poderes da União, Executivo, Legislativo e Judiciário, são independentes e harmônicos entre si (BRASIL, CRFB, 2020). O que significa dizer que, apesar de possuírem autonomia, necessitam uns dos outros para o seu funcionamento completo.

Segundo Maldonado (2003), esse sistema foi desenvolvido por Montesquieu e Locke, como uma técnica de limitação de poder, a qual foi posta em prática nas Revoluções Liberais Burguesas dos séculos XVII e XVIII, frente aos abusos e à concentração de poder dos governos Absolutistas na Idade Moderna.

No Brasil, os poderes são divididos em 3 (três), sendo eles, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Conforme destaca Camargo, essa tripartição de poderes, é apenas uma das formas de atingir o seu objetivo principal, qual seja, evitar o abuso de poder por aqueles que o detém. Dessa maneira, é esperado que qualquer forma de separação de poder entre diversos órgãos cumpra a função de conter os excessos de poder (2017, p. 8).

No entanto, apesar de que, na teoria, a Tripartição de Poderes seja uma forma de controle de poder e de defesa do Estado Democrático de Direito, muitas vezes essa técnica é contestada, seja por aqueles que representam a população ou pela própria população, que se questionam se essa seria a melhor forma de política a ser adotada em um país vasto de tantas culturas e diferentes classes sociais, como o Brasil.

Outrossim, como afirma Silveira (2020), verifica-se, no cenário atual, diante de um pandemia, onde o falso antagonismo entre saúde e economia foi tomado de forma excludente, sendo manuseado por alguns como simples e perigosas peças de xadrez, que a interferência de um Poder sobre outro está cada vez mais aflorada, passando a se questionar se isto atenta contra a Tripartição dos Poderes e contra o princípio determinado pelo artigo 2º da CF/88, uma vez que temos, por exemplo, atos judiciais monocráticos e temporários contestando atos executivos do Governo.

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Nesse enquadramento, o presente trabalho de conclusão de curso tem por objetivo analisar a eficiência e a importância da separação dos poderes para a democracia brasileira, bem como avaliar a aplicabilidade do sistema de freios e contrapesos no cenário político brasileiro na atualidade.

Com efeito, o estudo foi esquematizado em três capítulos: o inaugural que traz a evolução do conceito de separação dos poderes enquanto doutrina e princípio constitucional, dando destaque as todas as menções ao referido princípio nas diversas Constituições já promulgadas no Brasil e apresentando, por fim, a teoria dos freios e contrapesos.

O segundo capítulo analisa os poderes estatais, trazendo seus conceitos, atribuições, características e as formas de controle previstas na CF/88.

E, por fim, o último capítulo desperta o objeto-chave da pesquisa, corroborando com a teoria trazida durante todo trabalho, apresentando situações práticas de interferência e a analise o princípio da separação dos poderes sob a ótica de sua validade e de sua eficiência.

O método de pesquisa utilizado, no presente trabalho, foi o da pesquisa exploratória, através da extração de informações em fontes documentais e bibliográficas, valendo-se da legislação, da jurisprudência e, principalmente, de doutrina, a partir de monografia, de artigos de periódicos jurídicos, tanto impressos quanto eletrônicos, de vídeos de conteúdo jurídico, etc.

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2 CONCEITO DE SEPARAÇÃO DOS PODERES

Esse capítulo foi dividido em dois subtítulos: o primeiro trata da evolução do conceito de separação dos poderes enquanto doutrina e o segundo apresenta a evolução do conceito de separação de poderes enquanto princípio do direito constitucional brasileiro.

2.1 EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE SEPARAÇÃO DOS PODERES ENQUANTO DOUTRINA

A doutrina da separação dos poderes possui sua base histórica no século XVII, passando por várias alterações ao longo de sua evolução. Assim, para Medeiros (2008), “é totalmente equivocado tomar como absoluta e definitiva qualquer das versões apresentadas pelos vários pensadores da Ciência Política”.

Apesar disso, não se pode deixar de mencionar que Aristóteles trouxe a ideia de separação de poderes, ainda na Grécia antiga, em sua obra Política, na qual apresenta a definição de uma constituição mista. Assim, segundo Piçarra,

[...] constituição mista, para Aristóteles, será aquela em que os vários grupos ou classes sociais participam do exercício do poder político, ou aquela em que o exercício da soberania ou o governo, em vez de estar nas mãos de uma única parte constitutiva da sociedade, é comum a todas. Contrapõem-se-lhe, portanto, as constituições puras em que apenas um grupo ou classe social detém o poder político (1989 apud MALDONADO, 2003, p. 223).

Dessa maneira, Aristóteles, ao referir-se à teoria da separação dos poderes, diferenciava a assembleia geral como aquela responsável pela função deliberativa, um segundo grupo, denominado magistrados, como sendo aquele responsável pela função administrativa, e, ainda, um terceiro grupo, responsável pela função de julgar, o Judiciário (CARVALHO, 2008, p. 166).

Segundo Barros (2010, p. 151), o objetivo da teoria da separação dos poderes, desde a antiguidade, consistia na limitação do poder político.

De acordo com Grohmann (2001, p. 77), “a reflexão sobre o poder dividido apresentou-se desde a Grécia antiga e a principal preocupação que a animou permaneceu ao longo dos tempos: como evitar a tirania”.

É importante ressaltar que Aristóteles não definiu uma teoria completa acerca da separação dos poderes, no entanto, contribuiu muito para fundamentar um entendimento mais

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abrangente sobre a referida teoria, posto que apresentou a existência de funções diferentes de um mesmo Estado, bem como trouxe à tona o perigo da concentração de poder em um só ente (BARBOSA, 2006, p. 3).

Ainda na Inglaterra no século XVII, a noção de separação de poderes foi ligada à ideia de Rule of Law. Para Carlos (2016, p. 154), “A Rule of Law é considerada a matriz histórica do estado de direito, e, também, a origem próxima da doutrina da separação dos poderes como técnica de distribuição orgânico-funcional do poder estatal”.

Segundo Maldonado,

O desenvolvimento das instituições representativas inglesas, lança a Inglaterra a um Estado constitucional sem praticamente ter passado pelo absolutismo. Isso se justifica pelo fato de que a doutrina da separação dos poderes surgiu na Inglaterra, século XVII, diretamente ligada à idéia [sic] de rule of law, primeira forma histórica do que viria a ser o Estado Constitucional ou de Direito, que tem como um dos elementos essenciais a separação dos poderes (2003, p. 226).

É nesse sentido que Locke e Montesquieu começam a sistematizar a doutrina da separação de poderes como uma técnica de limitação de poder para os governos absolutistas presentes naquela época (MALDONADO, 2003, p. 227).

Tendo como premissa o cotrato social, a construção teórica de Locke acerca da separação dos poderes supõe que a sociedade política, que seria titular de uma espécie de poder supremo instituiria um governo ao qual seriam conferidos os poderes de fazer leis e de tutelar a proteção coletiva e individual dos seus integrantes. O exercício dessa função seria confiado a um órgão supremo denominado Poder Legislativo (CARLOS, 2016, p. 155).

Locke foi um filósofo pioneiro em relação à ideia de separação dos poderes sob a influência do Iluminismo, chegando à conclusão de três funções do Estado, quais sejam: a legislativa, a executiva e a federativa (SOUZA, 2008, p. 5-6).

Destarte, segundo Maldonado (2003), Locke não contemplou a Tripartição dos Poderes como conhecemos hoje, referindo-se ao Poder Judiciário como uma atividade-meio do Poder Legislativo.

Os filósofos que, até então, se propunham a idealizar uma divisão de tarefas do Poder, que, como visto, foi Aristóteles e John Locke, a fizeram, mas de forma genérica. Restringiram-se a apontar quais as funções estatais, entretanto, não especificaram cada uma delas em cada uma das suas atribuições (SOUZA, 2008, p. 6).

Ressalta-se, portanto, que a maior contribuição de Locke, como filósofo, foi apresentar um teoria política embasada na liberdade do homem e em seus direitos mais

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naturais, embora não tenha se preocupado em apresentar formas de garantias dessas liberdades e direitos (BARBOSA, 2006, p. 5).

Todavia, o desenvolvimento da teoria da separação dos poderes deu-se através de Montesquieu, o qual supôs que a sociedade deveria organizar-se de modo que o poder fosse constituído como um freio ao próprio poder, com a finalidade de garantir a liberdade individual (CARLOS, 2016, p. 156).

Para Maldonado (2003, p. 228), Montesquieu com “clareza d’agua, revela ao mundo os contornos da acepção mais difundida da separação de poderes”.

Quando, na mesma pessoa ou no mesmo corpo de Magistratura, o Poder Legislativo é reunido ao Executivo, não há liberdade. Porque pode temer-se que o mesmo Monarca ou mesmo o Senado faça leis tirânicas para executá-las tiranicamente. Também não haverá liberdade se o Poder de Julgar não estiver separado do Legislativo e do Executivo. Se estivesse junto com o Legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário: pois o Juiz seria o Legislador. Se estivesse junto com o Executivo, o Juiz poderia ter a força de um opressor. Estaria tudo perdido se um mesmo homem, ou um mesmo corpo de principais ou nobres, ou do Povo, exercesse estes três poderes: o de fazer as leis; o de executar as resoluções públicas; e o de julgar os crimes ou as demandas dos particulares (MONTESQUIEU, 2000, p. 167-168).

Nesse sentido, Carlos (2016, p. 157) ressalta que

A teoria de Montesquieu engendrou um complexo sistema no qual cada órgão do Estado desempenharia funções distintas e, ao mesmo tempo, interdependentes, com atividades que caracterizariam uma forma de concentração de outra esfera de poder. Com efeito, somente a partir da teoria de Montesquieu é que a formula clássica da divisão funcional tripartida do poder do estado passou a predominar no âmbito do constitucionalismo liberal.

Para Barbosa (2006, p. 5), “foi através de Montesquieu que esse aspecto político do Estado ganhou destaque e maior projeção, acabando por tornar-se um dos dogmas das Constituições democráticas”.

Assim, Montesquieu diferencia as funções do Estado como poderes diferentes, sendo estes inconfundíveis, atuando harmonicamente, dando possibilidade para que houvesse a desconcentração das atribuições do Estado, evitando assim os governos absolutistas (BARBOSA, 2006, p. 6).

A ideia fundamental é que um poder tenha a capacidade de barrar ao outro de modo a forçar um acordo, e vice-versa, criando a moderação nas decisões e gestão do Estado. Evita-se assim o abuso de poder por parte de algum corpo e obtém-se, em decorrência do não-abuso de poder, a liberdade política (GROHMANN, 2001, p. 79).

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O poder concentrado em um só órgão ou em um só ente possibilita a tirania, e basta que o indivíduo esteja diante desta possibilidade para que seja configurado o medo e a insegurança, estabelecendo a falta de liberdade política (GROHMANN, 2001, p. 79).

Segundo Ham (2005, p. 7), “o mais importante para Montesquieu era a possibilidade de se garantir a liberdade dos indivíduos, através da divisão dos poderes e do sistema de freios mútuo”.

No entanto, cabe aqui ressaltar que Montesquieu considerava apenas dois poderes como principais, sendo eles o Executivo e o Legislativo, pois afirmava que o Poder Judiciário não era um Poder propriamente dito e sim, invisível e nulo (HAM, 2005, p. 8).

[...] Montesquieu firmou o sistema de freios e contrapesos, conferindo ao poder executivo participação legislativa, por sua faculdade de impedir. Recusando ao poder legislativo qualquer participação na execução, consagrou-lhe, todavia, o direito de examinar o modo pelo qual se executam as leis por ele elaboradas, sendo ainda este poder composto de duas câmaras, com forças mutuamente equilibradas, munidas das respectivas faculdades de impedir e estatuir, uma em relação à outra (BARBOSA, 2006, p. 7).

Montesquieu não atribui certas opções ao Poder Judiciário, pois, de acordo com o seu pensamento, apenas os Poderes Legislativo e Executivo eram essencialmente políticos (BARBOSA, 2006, p. 8).

Posto isso, a ideia de liberdade, firmada por Montesquieu, atribuída à teoria da separação dos poderes, foi intensamente recepcionada pelas organizações constitucionais dos Estados Modernos (BARBOSA, 2006, p. 8).

Além disso, Carlos (2016, p. 292) afirma que a Constituição Americana, de 1787, pode ser considerada “um marco normativo moderno da separação dos poderes” e, ainda, que a Constituição Francesa teria uma defesa mais apaixonada. Afirma o autor que

[...] encontra-se na constituição francesa de 1791, na parte relativa à declaração dos direitos de homem e do cidadão (preâmbulo), cujo artigo 16 previa que toda sociedade na qual não esteja assegurada a garantia dos direitos do homem nem determinada a separação dos poderes, não possuiria constituição (CARLOS, 2016, p. 157).

De acordo com Maldonado (2003, p. 230), a formulação da doutrina da separação dos poderes é um marco para o início do Estado de Direito.

[...] a separação dos poderes, como técnica para limitação do poder, é posta em prática nas Revoluções Liberais Burguesas dos séculos XVII e XVIII – Revolução Gloriosa, Inglaterra 1688/89, Independência Norte-Americana, 1776, e Revolução Francesa, 1789 – em resposta aos abusos e iniquidades resultantes, entre outros

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fatores, da concentração de poderes nas mãos do soberano, típica do Absolutismo da Idade Moderna (MALDONADO, 2003, p. 230).

A separação dos poderes, por adquirir status de forma de limitação de poder por meio do próprio poder, foi amplamente recepcionada pelas constituições que estavam sendo elaboradas naquele momento (HAM, 2005, p. 19).

A partir de então, começou-se a postular que a funções de limitação de uma Constituição só seria completa se estivesse ligada à separação dos poderes do Estado (BARBOSA, 2006, p. 8).

A obra escrita em 1788, conjuntamente por Hamilton, Madison e Jay, de título “O Federalista”, contribuiu para a instituição do primeiro sistema de governo republicano firmado na separação dos poderes (HAM, 2005, p. 19)

Assim, a Constituição dos Estados Unidos de 1787 possui clara ligação com a ideia de separação dos poderes, pois dedica seu primeiro artigo ao Legislativo, o segundo ao Executivo e o terceiro ao Judiciário, não permitindo que um poder interfira no outro, bem como não possibilita a transferência de poderes, ainda que em partes ou por um período de tempo (BARBOSA, 2006, p. 8).

Foi nesse contexto que surgiu, em 1789, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada na França, declarando em seu artigo XVI que qualquer sociedade na qual a garantia dos direitos não está em segurança, nem a separação dos poderes determinada, não tem constituição (BARBOSA, 2006, p. 8, grifo nosso).

Dessa maneira, a teoria da separação dos poderes ligada à ideia do Estado Democrático, influenciou na confecção do conhecido sistema de freios e contrapesos, o qual já possuía suas bases apresentadas por Montesquieu (BARBOSA, 2006, p. 8).

Para Souza (2008, p. 20), os criadores do sistema de freios e contrapesos “estavam preocupados em limitar o poder, reconheceram a ineficiência da Separação de Poderes em limitar poder. O sistema de freios e contrapesos não nega vigência à Separação de Poderes, mas a complementa”.

Nesse momento histórico não mais se exigia uma limitação rígida das ações do Estado, o que muitas vezes engessava o desempenho de suas funções, mas reclamava-se uma atuação estatal que atendesse às exigências da sociedade, cada vez mais graves e urgentes, primando pela sua eficiência. Surge, pois, a necessidade de adaptar a clássica separação dos poderes a essas novas aspirações, mantendo-se, entretanto, a sua função de frear a invasão do Estado na esfera individual (BARBOSA, 2006, p. 9).

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2.2 EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE SEPARAÇÃO DOS PODERES ENQUANTO PRINCÍPIO NO DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO

Ao longo de quase 500 anos de história, o Brasil já confeccionou mais de 5 (cinco) constituições, devido às mudanças que ocorreram nos séculos que se passaram. Pode-se destacar que algumas liberdades e limitações à prática de determinados atos, bem como os contextos sociais e políticos vivenciados, desde a independência até os dias atuais, refletiram na criação de todas as Constituições (FERREIRA, 2017, p. 1).

Assim, segundo Souza (2007), “o Brasil, seguindo a tendência da legislação constituinte ocidental, adotou o princípio da separação dos poderes em todas as Constituições, inclusive na imperial de 1824. Entretanto, existe uma exceção que foi a Constituição de 1937”.

Por outro lado, importante ressaltar que o princípio da separação dos poderes, apesar de estar presente na maioria das Constituições brasileiras, não foi visto em sua forma clássica, ou seja, com três poderes, priorizado suas independências e harmonia (FERREIRA FILHO, 2015, p. 70).

Nessa toada, surge a primeira Constituição do Brasil, a Carta Imperial de 1824, a qual foi outorgada por D. Pedro I. Essa Constituição apresentava a existência dos Poderes Legislativo, Executivo, Judiciário e Moderador, esse último soberano sobre todos (SOUZA, 2008, p. 14).

A Carta Imperial de 1824 seguia a lição de Constant e previa, além dos três Poderes – Legislativo, Executivo e Judiciário – um quarto, o Poder Moderador (art. 10). Dizia deste ser ele “a chave de toda a organização política”, sendo “delegado privativamente ao Imperador” (art. 98). A este era também dado o Poder Executivo, que o exercitaria por seus ministros (art. 102) (FERREIRA FILHO, 2015, p. 71)

Durante período de vigência da Carta Imperial, de acordo com Ferreira Filho (2015, p. 71), “no Primeiro Império, o Imperador reinou e governou. No Segundo, a partir de 1840, instaurou-se um parlamentarismo, em que, todavia, o poder moderador é que determinava a alternância dos gabinetes”.

Nesse passo, veja-se que o Poder Moderador, conferido ao Imperador, que também comandava o Poder Executivo, acaba por desequilibrar, de certa forma, a relação entre os Poderes, que fora estabelecida naquela Constituição (MALDONADO, 2003, p. 232).

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Efetivamente, o que se percebe é que essa separação de poderes aconteceu apenas no plano formal, já que, na realidade a instituição do Poder Moderador e a sua delegação privativa ao imperador D. Pedro I, que também era chefe do Poder Executivo, figurou mais como uma dissimulação para assegurar a permanência da concentração do poder nas mãos do soberano (FREIRE, 2015, p. 24).

Já a Constituição de 1884 vigorou até a queda do Império, com a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889. Em consequência da proclamação da República surgiu uma nova ordem constitucional republicana, com a chegada da Constituição de 1891, que possuiu vigência até o ano de 1930 (SOUZA, 2008, p. 16).

A primeira Constituição da República, a “Constituição da República dos Estados Unidos do Brazil”, consagrou a tradicional tripartição dos poderes, repudiando a monarquia, adotando o presidencialismo norte-americano como solução para a titularidade do Poder Executivo (MALDONADO, 2003, p. 233).

Ainda, pode-se apontar, como diferença entre a Constituição Imperial e essa de 1891, o fato de que, na Constituição Imperial, configurava-se a independência entre os Poderes, enquanto que a Constituição de 1891 não estabeleceu a referida independência entre os Poderes (SOUZA, 2008, p. 16).

A Constituição de 1891 não negava a delegação de poderes, de modo que o Poder Executivo, representado pelo Presidente da República, absorveu a função de legislar em determinados casos. Essa usurpação de função não se deu com tamanha força como ocorreu depois da Crise Econômica Mundial de 1929, mas já foi sentida pelos doutrinadores da época (SOUZA, 2008, p. 16).

Por fim, resta mencionar que, foi nessa Constituição que fora estabelecida a cláusula de não cumulação de função, ou seja, segundo o artigo 79, uma mesma pessoa não poderia ocupar mais de um cargo ao mesmo tempo, possuindo funções nos Poderes Executivo e Legislativo, por exemplo (BECKER, 2004, p. 39).

Chega-se, então, na Constituição de 1934, que não apresentou a separação dos poderes de forma muito diferente da Constituição de 1891, no entanto, trouxe novas funções ao Senado Federal, o qual, além de ajudar a Câmara dos Deputados, também seria um órgão coordenador entre os poderes (FERREIRA FILHO, 2015, p. 71).

De acordo com Souza (2008, p. 18), a função que fora atribuída ao Senado Federal, era semelhante àquela do Poder Moderador, dessa maneira o Poder Executivo foi estabelecido como órgão supremo do Estado. No entanto, segundo o autor, pôde-se perceber que, na prática, a intenção do constituinte não foi alcançada.

A bem da verdade, após o desencadeamento da Quebra da Bolsa de Nova Iorque em 1929, o Poder Executivo se viu obrigado a tomar posições e decisões rápidas. Não

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poderia ficar dependente da lentidão do Legislativo na confecção das leis, então o Presidente da República passou a editar Decretos-Lei com mais frequência (SOUZA, 2008, p. 18).

Ressalta-se por fim que, não fora descartada dessa Constituição a sobreposição do Poder Executivo sobre os demais, situação que ficou mais evidente após as Emendas de 1935, que concederam poderes extraordinários de guerra ao chefe do Poder Executivo (FREIRE, 2015, p. 71).

Com a chegada da Ditadura da Era Vargas, é outorgada uma nova Constituição, no ano de 1937. A falta da menção ao Princípio da Separação dos Poderes na nova Constituição é um dos vários abusos presentes naquela época. E a inexistência do referido princípio trouxe certas consequências à democracia e aos direitos individuais (SOUZA, 2008, p. 18).

Apesar da Constituição de 1937 diferenciar os Poderes Legislativo e Judiciário, o Poder Executivo, por sua vez, não era mencionado, sendo esse substituído por um capítulo inteiro dedicado ao Presidente da República, colocando-o como autoridade suprema do Estado (MALDONADO, 2003, p. 234).

Este seria a “autoridade suprema do Estado”, tendo as tarefas de coordenar “a atividade dos órgãos representativos, de grau superior, de dirigir “a política interna e externa”, de promover ou orientar a “política legislativa de interesse nacional” e de superintender “a administração do país” (art. 73). Em matéria de legiferação, gozava do poder de iniciativa geral, o que os membros do Parlamento só teriam condição de fazê-lo em ato coletivo, subscrito por um terço dos integrantes de uma de suas câmaras (FERREIRA FILHO, 2015, p. 72).

Assim, não se vê uma harmonia ou equilíbrio em uma Constituição que indicava o Presidente da República como autoridade suprema. Além disso, foi conferido, ao então presidente, a prerrogativa de dissolver a Câmara dos Deputados caso não aprovasse suas medidas durante o estado de guerra ou emergência (MALDONADO, 2003, p. 234).

Além dos poderes supramencionados, tantos outros foram conferidos ao chefe do Poder Executivo, tais como: tornar sem efeito a decisão judicial que declarasse inconstitucional uma lei (art. 96, § único), em verdadeiro confronto com a independência dos Poderes e com a Coisa Julgada; e suspender projeto de lei no Parlamento, caso o Governo manifestasse a intenção de apresentar outro (SOUZA, 2008, p. 19, grifo nosso).

Outrossim, segundo Ferreira Filho (2015, p. 72), “o Presidente da República possuía, durante o Estado Novo que essa Carta pretendia institucionalizar, um poder absoluto”.

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Portanto, de acordo com o artigo 180, o Presidente da República poderia legislar por meio de decretos-leis sobre todas as matérias sob as quais a União possuía competência legislativa, sendo o presidente, o Poder Executivo e o Legislativo, bem como, por meio de atos seus, poderia declarar judicialmente as inconstitucionalidades, posto que não havia um Poder Legislativo de fato (FERREIRA FILHO, 2015, p. 72).

Não se pode deixar de mencionar que Getulio Vargas também era o senhor da Constituição. Afirma Ferreira Filho (2015, p. 72) que o presidente “seguramente, era um ditador, na acepção moderna e plena do termo”.

Ao final da ditadura de Vargas, o Brasil faz as pazes com a democracia, realizando assim uma nova Constituição, em 1946, trazendo novamente ao texto constitucional o princípio da separação dos poderes em seu artigo 36 (MALDONADO, 2003, p. 236).

A Constituição de 1946 tratou de resgatar os valores democráticos que foram suprimidos pela Constituição de 1937. Restabeleceu o sistema baseado na idéia [sic] de Separação de Poderes e promoveu a aplicação da competência e o fortalecimento do Poder Legislativo. Restaurou também a autonomia dos tribunais, as garantias individuais para os magistrados (art. 9546) e assegurou a coisa julgada (SOUZA, 2008, p. 21).

A Constituição de 1946 vigorou por 20 anos, passando por altos e baixos, trazendo consigo a cláusula de inacumabilidade entre aqueles que ocupavam os cargos nos Poderes da República (SOUZA, 2008, p. 21).

No entanto, o Poder Legislativo, através do Congresso Nacional, não conseguiu administrar toda a sua responsabilidade, dando possibilidade à fraude do plebiscito de 1962 para derrubada do parlamentarismo, assim como por ter se humilhado diante dos Atos Institucionais de 1946-1969 (PONTES DE MIRANDA, 1987 apud SOUZA, 2008, p. 21).

Em seguida, tem-se a Constituição de 1967, a qual estabeleceu o princípio da separação de poderes de modo muito parecido com o da Constituição de 1946, todavia um pouco menos rígido, tendo em vista que houve o fortalecimento do Poder Executivo em relação aos demais Poderes. Além disso, houve a Emenda Constitucional nº 1 de 17 de outubro de 1969, permitindo que o Executivo legislasse por meio de decretos-lei (SOUZA, 2008, p. 22).

Por fim, chega-se na Constituição Cidadã de 1988, a qual, segundo Ferreira Filho (2015, p. 73), possui maior destaque, pois “[...] inclui a separação dos poderes entre as

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matérias, cuja abolição não pode sequer ser objeto de deliberação, mesmo em sede de Emenda Constitucional (art. 60, § 3º)”.

Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário (BRASIL, CRFB, 2020).

No entanto, a Constituição vigente será melhor discutida e analisada no decorrer dos próximos capítulos do presente trabalho.

2.3 TEORIA DOS FREIOS E CONTRAPESOS

De acordo com Ferreira Filho (2015, p. 79), a separação dos poderes, no campo doutrinário, foi apresentada por Montesquieu como uma receita para se fazer política, e tinha, como objetivo, introduzir o sistema de freios e contrapesos, em que cada Poder poderia agir com a finalidade de impedir que o outro Poder realizasse atos abusivos.

A divisão completa e absoluta dos poderes não era uma ideia defendida por Montesquieu, pelo contrário, mas foi a partir dele que foram desenvolvidas formas de controle recíproco entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, construindo assim, o sistema de freios e contrapesos (HAM, 2005, p. 14).

Segundo Barbosa e Saracho (2019, p. 1628-1629), Montesquieu formulou a separação dos poderes como um instrumento para impossibilitar a concentração de poder, acreditando, também, ser necessária tal divisão para afastar governos absolutistas e impedir a criação de normas tirânicas, bem como para que cada Poder fosse autônomo e limitado.

Com isto, cria-se a ideia de que só o poder controla o poder, por isso, o Sistema de freios e contrapesos, onde cada poder é autônomo e deve exercer determinada função, porém, este poder deve ser controlado pelos outros poderes (BARBOSA; SARACHO, 2019, p. 1629).

Ainda, Barbosa e Saracho (2019, p. 1629) afirmam que, com esse sistema, um “Poder do Estado está apto a conter os abusos do outro de forma que se equilibrem. O contrapeso está no fato [sic] que todos os poderes possuem funções distintas, são harmônicos e independentes”.

A teoria da separação dos poderes apresentada por Montesquieu começou a ser melhor desenvolvida nos Estados Unidos, por meio do artigo “O Federalista”, no qual os americanos revolucionários encontravam-se temerários em relação ao Poder Legislativo nos moldes apresentados por Montesquieu, e por isso, apresentaram um sistema que possuía como

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principal finalidade o fortalecimento do Poder Executivo, diminuindo a força do Poder Legislativo, trazendo garantia de equilibro entre os Poderes (CARLOS, 2016, p. 293).

Carlos, (2016, p. 293-294) aponta, ainda, algumas diferenças entre o modelo apresentado por Montesquieu e aquele apresentado pelos americanos, pois enquanto a teoria de separação dos poderes de Montesquieu possuía como prioridade a ascensão da liberdade individual, a dos americanos tinha como objetivo aprimorar as funções do Estado, já que a principal preocupação que os americanos possuíam era de fato o equilíbrio entre os Poderes Legislativo e Executivo.

Nota-se ainda que, após o caso Marbury v. Madison, de 1803, responsável por apresentar um novo modelo de constitucionalidade, somado às bases doutrinárias e à Constituição Americana de 1787, criou-se uma nova ideia do controle entre os poderes, nomeada pelos os estadunidenses como checks and balances, de modo que as funções dos estados deveriam ser divididas entre diversos órgãos, os quais se auxiliariam mediante controles recíprocos (CARLOS, 2016, p. 304).

Nessa perspectiva, frente a essa preocupação em relação à separação dos poderes e com o intuito de evitar a defraudação de certos órgãos, criou-se um sistema complementar à teoria da separação dos poderes, qual seja, o sistema de freios e contrapesos (FREIRE, 2015, p. 21, grifo nosso).

O referido sistema apresentou uma técnica para controle dos poderes que possuía como objetivos, segundo Carlos (2016, p. 294), “i) evitar a tirania; ii) limitar a autoridade, impedindo arbitrariedades, e iii) preservar a liberdade individual.”

Como já mencionado no tópico anterior deste capítulo, na apresentação clássica do princípio da separação dos poderes, o Poder Judiciário era tratado como função intermediária, sendo a combinação da jurisprudência da Suprema Corte advinda da judicial review, alinhada à doutrina americana da separação dos poderes, crucial para que o Poder Judiciário fosse reconhecido da mesma maneira que os Poderes Executivo e Legislativo (CARLOS, 2016, p. 294).

Para Carlos (2016, p. 294), “a interpenetração de funções anunciada pelos checks and balances flexibilizou a noção rígida de separação de poderes do modelo liberal europeu, sem contudo, descaracterizar a essência e os objetivos do princípio”.

Os criadores desta idéia [sic], que estavam preocupados em limitar o poder, reconheceram a ineficiência da Separação de Poderes em limitar poder. O sistema de

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freios e contrapesos não nega vigência à Separação de Poderes, mas a complementa, “garantindo a cada um dos poderes a preservação de suas competências.” (KATO, 2000 apud SOUZA, 2008, p. 9).

Segundo Bonavides (2007, p. 74), “o sistema de freios e contrapesos constituiu a primeira correção essencial que se impôs ao referido princípio, como decorrência até certo ponto empírica, da prática constitucional, bem que não estivesse ausente as reflexos de Montesquieu”.

A teoria de Montesquieu, que prioriza a divisão vertical do exercício do poder político, e a teoria americana, que destaca a distribuição de funções entre órgãos do Estado e controle recíproco entre estes, devem ser compreendidas como esferas não excludentes, mas, sim complementares, pois, afinal, possuem o mesmo objetivo, que é preservar a esfera de liberdade dos indivíduos a partir da limitação do exercício do poder político (CARLOS, 2016, p. 295).

De acordo com Dallari (2011, p. 196), segundo a teoria do sistema de freios e contrapesos, o Estado pode praticar atos de duas espécies, quais sejam: gerais e especiais.

Segundo o autor os atos gerais podem ser apenas exercidos pelo Poder Legislativo, o qual emite regras de maneira geral e abstrata, não especificando, no momento da criação, a quem a regra será aplicada, de maneira que o Poder Legislativo não opera diretamente na sociedade, não possuindo formas de combater abusos de poder, nem para trazer malefícios os benefícios para certos grupos ou pessoas (DALLARI, 2011, p. 196).

Depois de formulada a norma geral, o Poder Executivo atua por meio de atos especiais, sendo que possui diferentes formas de atuação, mas ainda impossibilitado de agir por meio de atos discricionários, devido ao fato de que todos os seus atos estão limitados por aqueles atos gerais já praticados pelo Poder Legislativo (DALARRI, 2011, p. 197).

Por fim, acerca do Poder Judiciário, Dallari (2011, p. 197) afirma que “se houver exorbitância de qualquer dos poderes surge a ação fiscalizadora do poder judiciário, obrigando cada um a permanecer nos limites de sua respectiva esfera de competências”.

Portando, verifica-se que o princípio da separação dos poderes deu origem ao sistema de freios e contrapesos, o qual pode ser explicado de maneira simplificada. Assim, os atos gerais, executados de maneira exclusiva pelo Poder Legislativo, atos esses que se materializam por meio de emissões de normas gerais e específicas, limitam o Poder Executivo, que só poderá atuar por meio de atos especiais, resultantes dessas normas gerais. E para que se possa evitar o abuso de poder e a usurpação de competência entre os poderes,

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tem-se o controle de constitucionalidade exercido pelo Poder Judiciário (SARACHO; BARBOSA, 2019, p. 1631).

Percebe-se, portanto, que o sistema de freios e contrapesos consiste em técnica de controle recíproco entre os três poderes. Esse sistema tem como propósito evitar que um dos poderes usurpe a esfera de competência dos demais e consequentemente ponha em questão o dogma da separação dos poderes (FREIRE, 2005, p. 21)

Segundo Barbosa e Saracho (2019, p. 1629), utilizar o sistema de freios e contrapesos é, de fato, uma tentativa de evitar que aconteça abusos no âmbito dos poderes, mantendo, assim, o equilíbrio entre eles. Os autores ainda exemplificam essa relação afirmando que o

[...] Judiciário, ao declarar a inconstitucionalidade de uma lei é um freio ao ato Legislativo que poderia conter uma arbitrariedade, ao ponto que o contrapeso é que todos os poderes possuem funções distintas fazendo, assim, com que não haja uma hierarquia entre eles, tornando-os poderes harmônicos e independentes (BARBOSA; SARACHO, 2019, p. 1629).

Tem-se, ainda, a chamada relativização do princípio da separação dos poderes, no qual verifica-se que, nos dias atuais, de certo modo, quando cada poder exerce sua função principal, não a exerce com exclusividade (HAM, 2005, p. 14).

Ham (2005, p 15) afirma que “a ‘separação entre os poderes’ e o ‘sistema de freios e contrapeso’ seriam irreconciliáveis, mas operam lado a lado. Ocorre que o último não fere a independência funcional dos poderes, pelo contrário, completa e auxilia um ao outro”.

Recomenda-se, pois, na atualidade, uma leitura mais flexível do princípio em detrimento da visão dogmática, de maneira que sejam lançadas luzes sobre a separação de poderes enquanto princípio jurídico constitucional de natureza instrumental. E a doutrina americana dos checks and balances, seguramente, contribuiu para a compreensão do princípio em termos funcionais, mitigando a ideia de que este pudesse constituir um fim em si mesmo (CARLOS, 2016, p. 295).

Para que seja possível que um Poder exerça a função de checar o outro Poder, foi estabelecido, como requisito necessário, a independência entre eles (HAM, 2005, p. 15). Ainda, segundo mesmo autor, “é imprescindível a vigilância de um poder pelo outro. As funções de cada um não podem ser extrapoladas sem que outro poder possa intervir e controlar este desequilíbrio” (HAM, 2005, p. 15).

A separação de poderes é percebida como independência entre duas partes. Isso significa que uma parte – com formas de existência que não dependem da outra – dispõe de poderes próprios, os quais, para serem empregados, não necessitam de sanção de qualquer outro. Já o sistema de freios e contrapesos significa que uma parte tem o poder de verificar as ações da outra, checar e balancear, e, ainda, bloquear ou obstaculizar as ações da outra. A questão contida na construção da

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armadura institucional do sistema de governo é como estabelecer o equilíbrio entre ter poderes independentes e autônomos e a capacidade de circunscrever o outro (GROHOMANN, 2011, p. 83).

No entanto, além da independência entre os Poderes, há que se falar ainda em harmonia. Esta deve ser vista por meio do respeito entre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, ressaltando-se que a referida harmonia não impossibilita a interferência entre os Poderes, interferência essa que possui como objetivo garantir o controle assegurado pelo sistema de freios e contrapesos, impedindo assim, atos arbitrários (BULOS, 2014 apud FREIRE, 2015, p. 22).

O Sistema de Freios e Contrapesos consiste no controle do poder pelo próprio poder, sendo que cada Poder teria autonomia para exercer sua função, mas seria controlado pelos outros poderes. Isso serviria para evitar que houvesse abusos no exercício do poder por qualquer dos Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Desta forma, embora cada poder seja independente e autônomo, deve trabalhar em harmonia com os demais Poderes (BARBOSA; SARACHO, 2019, p. 1630, grifo nosso).

Portanto, levando em consideração que aquele que detém o poder, possui a tendência de abusar dele, é de extrema necessidade que a Constituição determine meios pelo quais os próprios Poderes possam exercer o controle reciprocamente entre si, com a finalidade de que nenhum deles desvie a atuação dos demais, para que assim estabeleçam uma relação de equilíbrio (FREIRE, 2015, p. 22).

No próximo capítulo, veremos quais os meios e as formas que a Constituição Cidadã de 1988 estabeleceu para a aplicação tanto do sistema de freios contrapesos quanto do princípio da separação dos poderes.

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3 O CONTROLE DOS PODERES NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 3.1 BREVE CONTEXTO HISTÓRICO

A Constituição vigente foi aprovada em 22 de setembro de 1988, mas, para uma melhor compreensão da Constituição Cidadã, é necessário retornarmos um pouco no tempo.

Para entender bem a Constituição de 1988 é preciso entender o cenário político do momento e como ela foi elaborada. A elaboração desta Constituição foi o ápice do processo de abertura política iniciada pelo presidente Ernesto Geisel (1974-1979), que a definiu como uma abertura “lenta, gradual e segura” (MATTOS, 2020, p. 165).

O deputado Dante de Oliveira, do partido do PMDB, apresentou, no início de 1983, uma Emenda Constitucional que reestabelecia a eleição direta para o cargo de Presidente da República, o que ocasionou grande euforia na população do país, tendo em vista o contexto histórico em que o Brasil se encontrava, com a recente extinção do AI-5 e com a anistia dos presos perseguidos pela ditadura militar em 1979 (VILLA, 2011, p. 78).

Segundo Villa, foi no ano de 1984 que o conhecido movimento das Diretas Já ganhou força. Essa campanha democrática, que tinha como principal objetivo a aprovação da Emenda Constitucional, apresentada pelo deputado Dante Oliveira, para que fossem realizadas as eleições de forma direta, ocorreu quando a referida emenda não foi aprovada pela Câmara, não chegando nem mesmo a ser votada pelo Senado (2011, p. 78). Para o autor, “a derrota da emenda contou com a participação decisiva do governo federal, dos partidários de Paulo Maluf e do presidente do PDS, José Sarney, que pressionaram os deputados usando de todos os meios imagináveis. Houve uma enorme frustração nacional” (VILLA, 2011, p. 78).

Dessa maneira, aponta o autor em comento, que foi necessário criar uma estratégia para que o Colégio Eleitoral elegesse indiretamente aquele que assumisse o compromisso de convocar uma nova Assembleia Constituinte e, assim, pudessem ser restabelecidas as eleições diretas para presidente novamente no Brasil, essa pessoa seria o governador mineiro, Tancredo Neves (VILLA, 2011, p. 78-79).

E para conseguir vencer no Colégio Eleitoral era necessário dividir o PDS, como acabou ocorrendo. Em agosto foi lançada a Aliança Democrática, união entre o PMDB e os dissidentes liberais do PDS. Tancredo e os peemedebistas tiveram de aceitar o vice-presidente indicado pelos dissidentes: José Sarney (VILLA, 2011, p. 78).

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Em que pese o nome de José Sarney causasse grande rejeição, tendo em vista ser a favor do regime militar, ele foi necessário para que houvesse vitória da oposição no Colégio Eleitoral. Tancredo foi eleito presidente em 15 de fevereiro de 1985 tendo falecido em abril do mesmo ano, não assumindo, portanto, o cargo de presidente da república, fazendo com que seu vice, José Sarney, assumisse a presidência (VILLA, 2011, 79).

O presidente eleito tinha assumido o compromisso de convocar uma Assembleia Constituinte. Para agilizar o trabalho, propôs criar uma comissão para elaborar um anteprojeto a ser enviado, como proposta do Executivo, para os constituintes. Seria um meio de rapidamente dar ao país uma nova Constituição (VILLA, 2011, p. 79).

O plano feito por Tancredo Neves para dar mais agilidade aos trabalhos que seriam posteriormente realizados, não foi seguido por José Sarney e, de acordo com Villa, “meses de discussões acabaram em uma gaveta. E, quando os constituintes iniciaram seus trabalhos, tiveram de partir do nada, pois a Constituição em vigor era do regime militar e, obviamente, não servia como ponto de partida” (2011, p. 79).

Villa, acerca da convocação da Assembleia Constituinte, escreveu que

Não pode ser esquecida a polêmica sobre a convocação da Constituinte. Algumas correntes defendiam a Constituinte exclusiva, ou seja, seria dissolvida após a aprovação da Carta e convocadas novas eleições, como em 1933. Contudo, o governo queria que a Constituinte se transformasse em Congresso Nacional após a promulgação da Carta e considerava um risco político duas eleições em prazo tão curto. Acabou sendo aprovada a proposta governamental (2011, p. 79).

Alessandro Nicoli Mattos (2020, p. 165) afirma que essa forma de criar uma Assembleia Nacional Constituinte significou a continuação da política nacional da época, tendo em vista que a mesma seria formada por integrantes do antigo regime, regime esse que deveria ser superado pela nova Constituição.. O autor afirma, ainda, “que este fato garantiu uma estabilidade durante a transição de regimes, mas também significou que a nova Constituição ficou limitada em alguns temas que estão “incompletos” até hoje” (2020, p.165).

O texto final da Constituição foi aprovado na sessão de 22 de setembro de 1988. Recebeu 474 votos favoráveis e apenas 15 contrários. Os 15 eram da bancada do PT, que considerou a Carta “elitista e conservadora”. Apenas um deputado petista se recusou a votar “não”: João Paulo, de Minas Gerais. Duas semanas depois, em 5 de outubro, após longos 20 meses de trabalho – período em que foram apreciados 65.809 emendas, 21 mil discursos e nove projetos –, foi promulgada a Constituição, com cerimônia transmitida por rádio e televisão (VILLA, 2011, p. 80, grifo nosso).

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Portanto, visto o contexto histórico e político no qual foi aprovado o texto constitucional vigente, passa-se à análise do tema central do presente capítulo: as formas de controle estabelecidas na Constituição de 1988.

Nesse passo, a Constituição Cidadã, consagrou o princípio da separação dos poderes em seu artigo 2º e, segundo Souza (2008, p. 24), tal princípio foi inserido como fundamental e imutável.

Art. 2º: São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário (BRASIL, CFRB, 2020).

Souza (2008, p. 34) afirma que, ao inserir a ideia de Separação dos Poderes dentre os princípios fundamentais, a Constituição “expressa decisão meramente política do constituinte, pois passa a ser uma diretiva básica para toda a ordem constitucional, além de orientar o modo do exercício do poder estatal”.

Tendo em vista, todo o esforço empregado para que fosse realizada a redemocratização, o constituinte originário, estabeleceu, como cláusula pétrea, o princípio da separação dos poderes, cláusula esta firmada no artigo 60, § 4º, inciso III da Constituição de 1988 (NERY JÚNIOR, 2020, p. 12).

O legislador constituinte conferiu extrema proteção à Separação de Poderes ao erigi-la à categoria de cláusuerigi-la pétrea ao poder constituinte de reforma. Este fato apresentou-se como uma novidade dentre as Constituições brasileiras. As Cartas Políticas de 1946 e de 1967 estabeleceram somente a “Federação” e a “República” como cláusula limite ao poder de reforma constitucional (SOUZA, 2008, p. 23).

A separação dos poderes possui, como principal finalidade, conforme já visto anteriormente, evitar a concentração de poder em um só corpo, bem como distinguir as funções do Estado, todavia para que haja tal separação é necessário haver independência e harmonia entre os Poderes da República (CAMARGO, 2017, p. 51).

A tripartição ditada pela Constituição Federal delineada pelo binômio independência e harmonia, deixa claro a indelegabilidade que ordinariamente não possibilita a delegação de funções; impossibilidade do exercício simultâneo das funções (artigo 56 da Constituição Federal) e no fato de que uma norma infraconstitucional não pode subtrair competências (GOUVEIA; AMARAL, 2008, p. 3).

Camargo (2017, p. 52) aponta que, como mecanismo para firmar um sistema de freios e contrapesos, a harmonia, estabelecida na Constituição de 1988, pressente o respeito entre os Poderes, ressaltando a necessidade de a relação entre os três Poderes dar-se a partir da

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possibilidade de interferência que lhes é imposta pela própria Carta Magna, sem, no entanto, que tal harmonia invada a competência uns dos outros.

Verifica-se, ainda, que a Constituição de 1988 regulou as relações entre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário no Título IV, de nome Da Organização dos Poderes, trazendo regras constitucionais que estruturam e determinam as atribuições, como também regulam as relações entre os referidos Poderes, mencionando ainda, as obrigações e direitos de cada órgão (CARLOS, 2016, p. 201).

Souza (2008, p. 27) afirma, ainda, que a separação dos poderes está firmada, na Constituição, em vários artigos, tendo seu maior conteúdo no Título IV, como já mencionado anteriormente, mencionando que “o princípio está caracterizado pela grande flexibilidade, bem maior do que aquela proposta por Montesquieu”.

A flexibilização da Separação de Poderes é necessária para que se possa aplicá-la em consonância com a evolução do papel do Estado e para que haja a fiscalização entre eles, a fim de se impedir a supremacia de um em detrimento do outro. Ela se justifica também para permitir uma melhor governabilidade e o controle recíproco entre os Poderes, dentro da idéia [sic] Norte Americana de freios e contrapesos (SOUZA, 2008, p. 27).

Carlos (2016, p. 201) concluiu, após analisar as normas presentes na Constituição de 88, que essa trouxe diversas hipóteses que concedem legitimidade para que os Poderes exerçam uma espécie de controles recíprocos entre eles. Tais hipóteses serão analisadas ao decorrer do presente capítulo.

Segundo Lenza, diante da flexibilização do princípio da separação dos poderes, verificou-se que cada órgão, além de exercer suas funções típicas (estas em maiores proporções), exercem também funções atípicas, funções estas que possuem natureza típica para o outro órgão. No entanto, mesmo ao exercerem a função atípica, não ocorrerá o desrespeito ao princípio da separação dos poderes, tendo em vista que essa competência foi garantida na Constituição Federal de 1988 (2015, p. 589).

O esquema inicial rígido, pelo qual uma dada função corresponderia a um único respectivo órgão, foi substituído por outro onde cada poder, de certa forma, exercita as três funções jurídicas do Estado: uma caráter prevalente e as outras duas a título excepcional ou em caráter meramente subsidiário daquela. Assim constata-se que os órgãos estatais não exercem simplesmente funções próprias, mas desempenham também funções denominadas de atípicas, quer dizer, próprias de outros órgãos (BASTOS, 1997, p. 343, grifo do autor).

Vê-se, portanto, que essa flexibilização do princípio da separação dos poderes é necessária para a completa aplicação do sistema de freios e contrapesos, no entanto, é

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necessário ter muita cautela com a referida flexibilização para que não ocorra a desfiguração total da ideia e da finalidade do princípio da separação dos poderes: a garantia da liberdade e a limitação do poder (SOUZA, 2008, p. 27).

Importante ressaltar que a Constituição Cidadã não se utiliza do termo freios e contrapesos, todavia, nota-se que esse sistema está intrinsicamente ligado à relação harmoniosa necessária entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário (CAMARGO, 2017, p. 52).

Assim se é verdade que ao Poder Executivo cumpre aplicar a lei de ofício, ao Poder Legislativo, inaugurar o ordenamento jurídico por meio de atos gerais e abstratos, e ao Judiciário, julgar as lides com definitividade, não é menos verdade que devem exercer também suas funções atípicas, muitas delas com vistas à concretização da harmonia entre os três Poderes. Desse modo, para que a separação dos poderes seja mantida de forma harmônica, foi necessário prever diversos mecanismos, concretizadores da harmonia e equilíbrio dos Poderes, chamados de freios e contrapesos (CAMARGO, 2017, p. 53, grifo nosso).

Camargo (2017, p. 53) destaca, ainda, que, apesar de Constituição de 88 ter previsto diversos mecanismos de controle, “o povo, representado pelo Poder Constituinte Originário, que culminou na promulgação da Constituição de 1988, é o maior e mais importante instrumento de controle a eventuais abusos cometidos pelos temporários titulares do poder”.

Não existirá, pois, um Estado democrático de direito, sem que haja Poderes de Estado e Instituições, independentes e harmônicos entre si, bem como previsão de direitos fundamentais e instrumentos que possibilitem a fiscalização e a perpetuidade desses requisitos. Todos estes temas são de tal modo ligados que a derrocada de um, fatalmente, acarretará a supressão dos demais, com o retorno do arbítrio e da ditadura. (MORAES, 2020, p. 454, grifo nosso).

Assim, verifica-se que a total separação dos poderes e das funções do Estado não é possível e nem ao menos aceitável, devendo a flexibilização do referido princípio existir, culminada com as formas de freios e contrapesos presentes no ordenamento jurídico para que possa haver o controle do poder, trazendo maior eficiência nos governos (SOUZA, 2008, p. 29).

Desta forma, dividido o poder e individuados seus órgãos, assim como superada a idéia [sic] da prevalência de um sobre o outro, através da compreensão da necessidade de equilíbrio, independência e harmonia entre eles, admitindo-se, inclusive a interferência entre eles, ganha força a idéia [sic] de controle e vigilância recíprocos de um poder sobre o outro relativamente ao cumprimento dos deveres constitucionais de cada um. Aí estão presentes os elementos essenciais caracterizadores do moderno conceito do princípio da separação dos poderes (MALDONADO, 2003, p. 18).

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Para uma melhor análise das formas e dos mecanismos de controle que cada um dos Poderes exerce, faz-se necessário conceituar as palavras: freios e contrapesos. Utilizaremos os conceitos atribuídos por Camargo, quais sejam:

Por meio de freios quer-se significar mecanismos de neutralização, que outorguem a um determinado Poder a possibilidade de parar uma ação de outro Poder.

Por contrapesos, entender-se-á toda medida capaz de balancear uma ação, atitude, medida tomada por um Poder, por meio de influência de outro(s) Poder(es) na tomada de decisão, mediante sua participação, porém incapaz de sua neutralização. (CAMARGO, 2017, p. 54, grifo nosso).

Passamos à análise específica de cada Poder, todas em âmbito federal.

3.2 PODER EXECUTIVO

Montesquieu diferenciou as funções do Poder Executivo como aquelas que deveriam, segundo Bastos, (1997, p. 367) “fazer a paz ou a guerra, enviar e receber embaixadores, estabelecer a segurança e prevenir as invasões”.

Atualmente, o sistema de governo adotado no Brasil, por força da Constituição Federal de 1988, e mantido pelo artigo 2º da ADCT, é o presidencialista, possuindo grande influência norte-americana. Esse sistema pressupõe que as funções de Chefe do Estado e de Chefe de Governo serão concentradas em uma única pessoa, qual seja o Presidente da República (LENZA, 2015 p. 775).

A Chefia do Poder Executivo foi confiada pela Constituição Federal ao Presidente da República, a quem compete seu exercício, auxiliado pelos Ministros de Estado, compreendendo, ainda, o braço civil da administração (burocracia) e o militar (Forças Armadas), consagrado mais uma vez o presidencialismo, concentrando na figura de uma única pessoa a chefia dos negócios do Estado e do Governo (MORAES, 2020, p. 571).

A Constituição Federal descreve o Poder Executivo entre os artigos 76 a 91. Em específico, o artigo 76 estabelece que, quando tratarmos de esfera federal, esse poder será exercido pelo Presidente da República, com a ajuda dos Ministros de Estado, possuindo um mandato de 4 anos (GOUVEIA; AMARAL, 2008, p. 5).

A partir dos artigos 76 a 91 da Constituição Federal, fica patente que a função típica do Poder Executivo é a prática de atos de chefia de Estado, chefia de governo e atos de administração. Assim, a função tradicional do Poder Executivo é a administração do Estado em consonância com as leis aprovadas pelo Poder Legislativo (GOUVEIA; AMARAL, 2008, p. 6).

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As competências privativas do Presidente da República estão elencadas no artigo 84 da Constituição Federal. Destacam-se, as competências que possuem natureza de chefe de Estado, nas quais o Presidente representa a República Federativa do Brasil nas relações internacionais e, internamente, nos casos dos incisos VII, VIII, e XIX do referido artigo, representando dessa maneira a unidade do Estado brasileiro. O mesmo artigo menciona, ainda, as competências privativas de natureza de chefe de Governo, sendo elas a prática de atos de administração e de natureza política, previstas nos incisos de I a VI; IX a XVII e XX a XXVII do mesmo dispositivo legal (LENZA, 2015 p. 778).

Com tão amplas atribuições, que repetiram regra clássica do constitucionalismo brasileiro de concentração de poder pessoal do Presidente, houve necessidade do legislador constituinte em garantir a imparcial e livre atuação, balizada por óbvio, pelos princípios constitucionais e pela legalidade, do Chefe do Poder Executivo, a fim de manter-se a independência e harmonia dos Poderes da República, fixando-se prerrogativas e imunidades para o Presidente da República (MORAES, 2020, p. 517).

Assim, em que pese o princípio da separação dos poderes, adotado pela CF/88 em seu artigo 2º, afirmar que, os Poderes da União são independentes e harmônicos entre si, os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, como já visto anteriormente, exercem funções típicas e atípicas, não existindo exclusividade absoluta no exercício de tais atos constitucionais (MORAES, 2020, p. 517).

O Executivo, portanto, além de administrar a coisa pública (função típica), de onde deriva o nome república (res publica), também legisla (art. 62 – Medidas Provisórias) e julga (contencioso administrativo), no exercício de suas funções atípicas. Aponte-se que Montesquieu concebeu o Poder Executivo como definidor e realizador constante da política de ordem interna e das relações exteriores (MORAES, 2020, p. 517).

Pode-se citar, como função atípica exercida pelo Poder Executivo, a qual representa uma forma de freio e contrapeso, a sua participação no processo legislativo, tendo a possibilidade de, até mesmo, alterar o seu resultado ao final do referido processo (CAMARGO, 2017, p. 54).

Considerando a o conceito de freios e contrapesos adotados no presente trabalho, Camargo (2017, p. 54) afirma que “a participação do Poder Executivo no processo legislativo ora configura freio, ora configura contrapeso.”

À vista disso, tem-se o mecanismo do veto, estabelecido no artigo 66 da Constituição Cidadã. Segundo Maldonado (2003, p. 19), “a previsão constitucional da possibilidade do VETO do Poder Executivo à elaboração legislativa é exemplo mais

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difundido de forma de controle da atividade típica do Poder Legislativo por parte Executivo” (grifo do autor).

Alexandre de Moraes, em seu livro Presidencialismo, afirma que o veto é manifestado através da não concordância do Presidente da República referente ao um projeto de lei já aprovado pelo Poder Legislativo, e finaliza, dizendo que o veto é consagrado “[...] como técnica de controle de exercício de poder político, para garantia do Estado de direito.” (2013, p. 187).

A natureza jurídica do veto é outro dos muitos pontos que não encontram unanimidade na doutrina constitucional, existindo inúmeros juristas defensores da tese de tratar-se de um direito, outros os entendem como um poder; havendo ainda tese intermediária que consagra o veto como um poder-dever do Presidente da República (MORAES, 2020, p. 718).

Camargo (2017, p. 55) definiu o veto como “ato expresso do Chefe do Poder Executivo por meio do qual este utiliza a sua prerrogativa de negar sanção a um projeto de lei aprovado pelo Poder Legislativo”.

Carlos (2016, p. 201), por sua vez, afirma que o veto é um mecanismo de controle recíproco:

[...] a demonstrar a existência de vários mecanismos de controle recíproco entre os Poderes, é de se mencionar a possibilidade de o Presidente da República vetar, total ou parcialmente, o projeto de lei que considerar inconstitucional ou contrário ao interesse público (CF/88, art. 66) (CARLOS, 2016, p. 201).

Além disso, Camargo (2017, p. 55) constata que “o veto é, pois, uma das diversas técnicas de controle de exercício político que garante a existência e o funcionamento do Estado de Direito”.

O veto está estabelecido na Constituição em seu artigo 66, in verbis:

Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará.

§ 1º - Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. § 2º O veto parcial somente abrangerá texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea.

[...]

§ 4º O veto será apreciado em sessão conjunta, dentro de trinta dias a contar de seu recebimento, só podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos Deputados e Senadores

§ 5º Se o veto não for mantido, será o projeto enviado, para promulgação, ao Presidente da República.

Referências

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