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Obsolescência programada: uma análise da in(aplicabilidade) e in(eficácia) da legislação brasileira nos casos de responsabilização civil nos danos causados ao meio ambiente.

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Academic year: 2021

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JULIA ROBERG CRISPIM

OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA:

UMA ANÁLISE DA (IN)APLICABILIDADE E (IN)EFICÁCIA DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA NOS CASOS DE RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL NOS DANOS

CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE

Tubarão 2020

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JULIA ROBERG CRISPIM

OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA:

UMA ANÁLISE DA (IN)APLICABILIDADE E (IN)EFICÁCIA DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA NOS CASOS DE RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL NOS DANOS

CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Linha de pesquisa: Justiça e Sociedade.

Orientador: Prof.ª Marília de Fátima Bueno Záquera, Me.

Tubarão 2020

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Para meu pais, Araildo e Marli, e minha irmã, Amanda, que são minhas verdadeiras inspirações, meus maiores e melhores orientadores na vida, e as pessoas que possuem todo meu amor e admiração.

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AGRADECIMENTOS

Antes de tudo, gostaria de agradecer aos meus pais, pelo apoio incondicional em todos os momentos difíceis da minha trajetória acadêmica. Agradeço por serem pais excepcionais, pilares da minha formação como ser humano, e por sempre me proporcionarem as melhores oportunidades da vida. Sem eles nada seria possível, pois esta monografia é a prova de que todo seu investimento e dedicação valeram a pena.

A minha irmã e ao meu cunhado, por sempre depositarem toda confiança em mim e, em momento algum, duvidarem da minha capacidade. Minha irmã, Amanda, é a pessoa que mais acredita em mim, e eu a agradeço por isso. Sem você, eu não chegaria tão longe.

Aos meus amigos que me acompanharam em toda a caminhada acadêmica, pelo apoio e suporte que me deram em todo o curso e pelas incontáveis horas de ajuda dedicadas a esta monografia.

Agradeço aos integrantes dos meus estágios, primeiramente à Defensoria Pública de Tubarão, onde tive meu primeiro contato com o Direito e onde tanto me ensinaram sobre ser humano, bem como ao Ministério Público de Capivari de Baixo, por me ensinar a matéria jurídica de modo ímpar.

Por fim, à minha orientadora e professora, Marília de Fátima Bueno Záquera, pela paciência e dedicação, pois colaborou muito para a realização deste trabalho.

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“Vivemos em uma época perigosa. O homem domina a natureza antes que tenha aprendido a dominar a si mesmo”. (Albert Schweitzer)

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RESUMO

O presente trabalho monográfico tem como objetivo analisar a (in)existência e a (in)eficácia da responsabilização civil ambiental nos casos de obsolescência programada, considerando-a como sendo uma das estratégias mercadológicas mais impactantes na esfera ambiental. Analisar-se-á também o estímulo da obsolescência programada frente ao consumismo, a diferenciação de seus tipos existentes, bem como os princípios ambientais que a técnica fere. Não obstante, o trabalho abrangerá os tipos de responsabilidade civil no ordenamento jurídico, verificando os impactos ambientais decorrentes desse fenômeno e demonstrando, ao fim, a aplicabilidade da responsabilidade civil ambiental nos casos concretos de obsolescência programada. A metodologia utilizada nesta monografia, quanto à abordagem, é o método qualitativo; quanto ao nível de pesquisa, caracteriza-se como exploratória e, quanto ao procedimento, utilizam-se os métodos bibliográfico e documental, embasando-se principalmente pelos fundamentos doutrinários e jurisprudenciais. Com efeito, o resultado obtido com o estudo foi a descoberta de que, embora a ampla legislação sobre o assunto, não há julgados responsabilizando a prática da obsolescência programada no âmbito do Direito Ambiental, tão somente na esfera do direito do consumidor. Portanto, restou comprovada a inaplicabilidade e ineficácia dos dispositivos legais na responsabilização ambiental dessa técnica. À vista disso, foi possível concluir que a obsolescência programada é um fenômeno que fere os princípios do Direito Ambiental e, mesmo havendo legislação contrária a suas diretrizes, a qual, inclusive, traz a possibilidade de responsabilização ambiental, sua aplicação na esfera jurídica brasileira é escassa. Desse modo, é necessário rever as formas de consumo e produção atuais, além de considerar as consequências socioambientais como um alerta para mudança de paradigmas a bem do ser humano e do meio ambiente, aplicando, portanto, as normas consubstanciadas e os princípios apontados não como forma de orientação, mas, sim, com uma aplicação efetiva em casos concretos.

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ABSTRACT

This monographic work aims to analyze the (in) presence and the (in) liability of environmental liability in cases of programmed obsolescence, considering it as one of the most impacting marketing strategies in the environmental area. The stimulation of programmed obsolescence in relation to consumption will also be analyzed, with a difference from its existing types, as well as the environmental principles that the technique affects. Nevertheless, the work will cover the types of civil liability in the legal system, verifying the environmental impacts caused by this phenomenon and demonstrating, at the end, an application of environmental civil liability in the specific cases of programmed obsolescence. The methodology used in this monograph, regarding the approach, is the qualitative method; as for the level of research, characterizes as exploratory and as for the procedure, uses the bibliographic and documentary methods, based mainly on doctrinal and jurisprudential foundations. In effect, the result obtained in the study was a discovery that, although broad comprehensive legislation on the subject, is not considered responsible for the practice of obsolescence programmed under Environmental Law, only in the sphere of consumer law. Therefore, restore the inapplicability and ineffectiveness of the legal provisions of environmental liability of this technique. In view of this, it was possible to conclude that programmed obsolescence is a phenomenon that affects environmental rights and even though there is legislation contrary to its guidelines, which even brings the possibility of environmental responsibility, its application in the Brazilian legal sphere is scarce. In this way, it is necessary to review the current forms of consumption and production, in addition to considering the socioenvironmental consequences, as a warning for paradigm changes, as well as the human being and the environment, applying, therefore, as substantiated norms and the indicated principles not as a form of guidance, but with an effective application in specific cases.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABDI – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial ART. – Artigo

CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica CC – Código Civil

CDC – Código de Defesa do Consumidor CF – Constituição Federal

CPC – Código de Processo Civil

IBDI – Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática

JPOI – Johannesburg Plan Of Implemenation (Plano de implementação de Joanesburgo) N. – Número

OS – Sistema Operacional

PACE – Plataforma para Aceleração da Economia Circular PIB – Produto Interno Bruto

PNRS – Política Nacional de Resíduos Sólidos PPP – Princípio do Poluidor-Pagador

REE – Resíduos de Equipamentos Eletroeletrônicos RIUNI – Repositório Institucional

STF – Supremo Tribunal Federal STJ – Superior Tribunal de Justiça

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

1.1 DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO-PROBLEMA ... 12

1.2 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA ... 14

1.3 HIPÓTESE ... 14

1.4 DEFINIÇÃO DOS CONCEITOS OPERACIONAIS ... 15

1.5 JUSTIFICATIVA ... 15

1.6 OBJETIVOS... 16

1.6.1 Geral ... 16

1.6.2 Específicos ... 16

1.7 DELINEAMENTO DA PESQUISA ... 17

1.8 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS ... 18

2 OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA ... 19

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA: ASPECTOS DA RELAÇÃO DO HOMEM COM O MEIO AMBIENTE ... 20

2.1.1 Transformação da sociedade de produtores para sociedade consumerista ... 23

2.2 CONCEITO DOUTRINÁRIO E CLASSIFICAÇÃO DA OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA ... 25

2.3 A OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA E A DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE... 28

3 RESPONSABILIDADE CIVIL APLICADA ... 32

3.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL ... 32

3.1.1 Princípios do Direito Ambiental ... 35

3.2 RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL OBJETIVA E A TEORIA DO RISCO INTEGRAL ... 40

3.3 RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL COMPARTILHADA ... 43

4 IMPACTOS DECORRENTES DA OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA E ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL ... 48

4.1 IMPACTOS AMBIENTAIS DECORRENTES DA OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA ... 49

4.1.1 Da Rio92 à Rio+20: Debate acerca do meio ambiente ... 52

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4.3 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL ACERCA DA IMPRESCINDIBILIDADE DA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL ... 57

4.3.1 Recurso Especial n. 984.106 – SC: A responsabilização civil diante da obsolescência

programada ... 60 4.3.2 Ação coletiva contra a empresa Apple no Direito brasileiro e no Direito francês 64

5 CONCLUSÃO ... 70

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema a análise da (in)aplicabilidade e (in)eficácia da legislação brasileira nos casos de responsabilização civil nos danos causados ao meio ambiente decorrentes do fenômeno da obsolescência programada.

Esta pesquisa foi realizada com o interesse de apresentar o entendimento da legislação brasileira e do tratamento jurídico aplicado nos casos de responsabilização ambiental na prática da obsolescência programada. Considerando que a prática fere inúmeros princípios ambientais e vem causando impactos significantes aos recursos naturais do planeta, mostrou-se necessário o aprofundamento sobre o assunto.

A metodologia utilizada nesta monografia, quanto à abordagem, foi qualitativa, quanto ao nível de pesquisa, exploratória e, quanto ao procedimento, utilizaram-se os métodos bibliográfico e documental. Desse modo, a pesquisa embasou-se, principalmente, em jurisprudências e doutrinas que norteiam o Direito Ambiental, a responsabilidade civil e a obsolescência programada.

Além do objetivo principal de analisar a (in)existência e (in)eficácia da responsabilização civil ambiental nos casos de obsolescência programada, o trabalho tem como objetivo específico verificar a construção histórica do fenômeno, o conceito e os tipos de obsolescência programada, bem como de responsabilidade civil no ordenamento jurídico, e uma análise da aplicação e eficácia da legislação brasileira em casos concretos de responsabilização civil ambiental sobre o tema.

Esta pesquisa abordará, no primeiro capítulo, aspectos da evolução história da obsolescência programada, a transformação da sociedade de produtores para a sociedade consumerista, o conceito doutrinário e a classificação do objeto de estudo, bem como as estratégias utilizadas para a prática do fenômeno. No segundo capítulo, serão tratados os tipos de responsabilidade civil aplicada no ordenamento jurídico brasileiro, demonstrando os princípios mais importantes do Direito Ambiental e conceituando cada tipo de responsabilidade civil. Por último, o trabalho irá demonstrar os impactos ambientais gerados ao planeta decorrentes da obsolescência programada e o entendimento jurisprudencial quanto à (in)aplicabilidade e (in)eficácia da responsabilização civil ambiental sobre o fenômeno.

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1.1 DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO-PROBLEMA

A obsolescência programada é uma grande ameaça nos dias de hoje para o meio ambiente, no entanto, para melhor compreender seus impactos no presente e no futuro, é necessário analisar seu passado.

Segundo Miragem (2013, p. 325), a obsolescência programada é uma redução artificial da durabilidade de produtos para que seja forçada a recompra prematura. Essa redução não significa apenas uma menor duração do produto, mas sim a perda de sua utilidade em um período já determinado por essas empresas, objetivando, assim, o descarte dessas mercadorias “velhas” e o consumo de novas.

Embora o conceito de obsolescência planejada conhecido atualmente tenha surgido apenas no século XX, historiadores relatam o surgimento da sua prática já no século XIX, quando o primeiro cartel mundial de que se tem notícia, conhecido como Phoebus, formado por fabricantes de lâmpadas de todo o mundo, decidiu que a vida útil de seus produtos deveria ser deliberadamente reduzida por meio de novas tecnologias, obrigando os consumidores a adquirirem novas lâmpadas, aumentando, assim, o índice de vendas (MORAES, 2015, p. 52).

Já na segunda metade do século XX, consolidou-se a Sociedade do Consumo, caracterizada pelo acesso aos bens e produtos necessários, mas também ao excesso de desejo e consumismo. Neste momento, a obsolescência programada ganhou força e se inseriu de vez no mercado econômico (MORAES, 2015).

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu pela abusividade da prática da obsolescência programada no julgamento do Recurso Especial n. 984106/SC, em 04 de outubro de 2012 (BRASIL, 2012).

Na oportunidade, o Tribunal trouxe os seguintes exemplos de ocorrência do fenômeno:

São exemplos desse fenômeno: a reduzida vida útil de componentes eletrônicos (como baterias de telefones celulares), com o posterior e estratégico inflacionamento do preço do mencionado componente, para que seja mais vantajoso a recompra do conjunto; a incompatibilidade entre componentes antigos e novos, de modo a obrigar o consumidor a atualizar por completo o produto (por exemplo, softwares); o produtor que lança uma linha nova de produtos, fazendo cessar açodadamente a fabricação de insumos ou peças necessárias à antiga. (BRASIL, 2012)

Para melhor entendimento do tema, insta salientar que um dos marcos da obsolescência programada ou também, como é conhecida, obsolescência planejada, é a Lei de Moore. Esse fenômeno surgiu em 1965 e foi criado por Gordon Earl Moore. Segundo o cientista, em quase todos os casos, a eletrônica integrada demonstra alta confiabilidade. Mesmo no atual nível de

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produção baixa - em comparação com a dos componentes discretos - reduz o custo dos sistemas e, em muitos casos, melhora o desempenho do produto (MOORE, 1965, p. 2).

Trata basicamente do aumento de densidade dos dispositivos semicondutores nos chips,

influenciando diretamente na estratégia de ação dos fabricantes. (BRAGA, 2013). Assim, por exemplo, um celular que possui uma determinada quantidade de gigabytes, logo seria ultrapassado por uma nova geração de aparelhos com um sistema de armazenamento mais avançado que o anterior.

Dessa forma, mesmo que um aparelho estivesse em perfeitas condições de funcionamento, teria que ser trocado por outro, uma vez que não seria mais capaz de suportar o armazenamento do antigo aparelho. Tal fato evidencia, assim, uma violação do direito fundamental do meio ambiente ecologicamente equilibrado garantido pelo artigo 225, caput, da Constituição Federal de 1998: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (BRASIL, 1988).

Por outro lado, há quem defenda essa técnica sob o fundamento de que a obsolescência originada pela melhora na função não é objeto de violação, pois é um resultado de avanço no mundo tecnológico, e o que deve ser, inclusive, apoiado e incentivado pelo poder público.

Sabe-se que essa técnica atinge inúmeros consumidores, no entanto, o objetivo deste trabalho é demonstrar os danos ambientais causados pela prática da obsolescência programada e analisar a eficácia ou a falta dela na responsabilização civil ambiental de acordo com a norma brasileira e julgados. Ainda, verificar se a obsolescência programada é uma técnica ilegal ou legítima para o meio ambiente, e se a legislação brasileira prevê o tratamento jurídico adequado nesse âmbito.

Para isso, o Princípio 8 da Declaração das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Rio-92, dispõe que “para atingir o desenvolvimento sustentável e mais alta qualidade de vida para todos, os Estados devem reduzir e eliminar padrões insustentáveis de produção e consumo e promover políticas demográficas adequadas” (ONU, 1992).

Porquanto, ainda que proteja o direito dos consumidores, não resguarda totalmente o direito fundamental ao meio ambiente ecológico. Conforme Moraes (2015), quando a utilização de recursos ou geração de dejetos é maior do que a capacidade do ecossistema de reciclá-los, depara-se com a poluição do meio ambiente e uma crise ambiental, exatamente o que os padrões de produção e consumo da sociedade estão ocasionando.

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A compatibilização entre Direito e Sustentabilidade é de extrema importância, visto que as regras são necessárias para se concretizar a proteção socioambiental. Nessa inter-relação, a função do Direito é sistematizar e regular as questões que envolvem consumo e meio ambiente, utilizando-se de instrumentos jurídicos de prevenção, reparação, informação, monitoramento e participação (MACHADO, 2007, p. 127).

Diante de tantos efeitos dessa técnica, como, por exemplo, o descarte exagerado de eletrônicos, insta rever se a produção e descarte desses resíduos é uma decisão pessoal ou uma obrigação legal. Dentre os instrumentos legais do Direito Ambiental, cabe destacar a Política Nacional de Resíduos Sólidos – Lei n. 12.305, de 2010 – a qual busca harmonizar a relação de consumo com a redução de resíduos e adequação no momento de descartá-los (BRASIL, 2010).

Para muitos, essa é uma decisão posterior à compra do produto e sem consequência legal, pois ninguém é punido pelo descarte sob o fundamento de que seu produto ficou obsoleto.

Nas palavras de Machado (2011, p. 599), é uma obrigação legal: “Com o posicionamento da Lei 12.305, não se pode admitir que qualquer um seja livre para produzir o resíduo sólido que quiser, quando quiser e onde quiser.”

Para isso, o poder público, juntamente com a sociedade (empresas e consumidor), deve reavaliar os padrões de uso de recursos e as finalidades de crescimento das técnicas de consumo, visto que é de suma importância para o planeta que seja extraída a máxima durabilidade dos produtos para dar efetividade aos princípios do desenvolvimento sustentável e a proteção ao meio ambiente.

1.2 FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

Existe, na legislação brasileira, norma fundamentadora para a aplicação e prática da responsabilização ambiental em casos de obsolescência programada? Qual é sua eficácia?

1.3 HIPÓTESE

Pelo fato de todos serem responsáveis pela destinação correta dos produtos, por terem sido proprietários deles pelo menos uma vez, seja ao adquiri-los como insumos, matérias-primas ou bens de consumo, a Lei n. 12.305/10 instituiu a responsabilidade compartilhada para todos aqueles que participaram do “ciclo de vida do produto”. No entanto, diante dessa responsabilização, é necessária uma maior fiscalização do poder público para a aplicação da lei.

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1.4 DEFINIÇÃO DOS CONCEITOS OPERACIONAIS

A responsabilidade civil ambiental que se caracteriza na pesquisa como “[...] um sistema jurídico baseado no reconhecimento da reparabilidade do dano causado à qualidade ambiental em si mesma considerada e do denominado dano moral ambiental” (ÁLVARO, 2019). Dentro da responsabilidade civil ambiental será abordada também a classificação: a) responsabilidade civil objetiva e teoria do risco integral; e b) responsabilidade civil compartilhada.

A obsolescência programada caracteriza-se como a expressão comum utilizada para descrever as mais diversas técnicas adotadas com o objetivo de estimular o consumo repetitivo (SLADE, 2007, p. 5). Dentro da obsolescência programada será estudada sua classificação, qual seja: a) de qualidade; b) adiada; e c) de função.

1.5 JUSTIFICATIVA

Este trabalho se justifica pela preocupação com o meio ambiente e o crescimento da técnica chamada de obsolescência programada. Segundo o artigo 225, caput, da Constituição Federal, todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo esse de uso comum do povo e necessário para uma benéfica qualidade de vida, cabendo ao poder público e à sociedade o dever de protegê-lo para essa e futuras gerações (BRASIL, 1988).

Dessa forma, percebe-se que a qualidade de vida está interligada com o meio ambiente, ou seja, um depende do outro. A importância do meio ambiente é tanta que seu equilíbrio é essencial para o ecossistema e, inclusive, para a existência de vida no planeta. No entanto, embora haja essa preocupação, ainda há muitas pessoas descomprometidas com essa questão. Não há a atenção necessária que deveria ter, e o atual cenário político demonstra isso.

No mês de agosto de 2019, por exemplo, foi possível ver queimadas acontecendo por todo o Brasil, especialmente na Amazônia, sem a devida fiscalização e responsabilização. Esses acontecimentos afetam não apenas a proximidade e as pessoas que ali habitam, mas o mundo inteiro, ou seja, é um interesse mundial. Portanto, esse assunto é de tamanha importância no cenário atual, e caso não haja consciência do povo e ação do poder público, o meio ambiente será destruído.

Ademais, até o presente ano, em todas as monografias e artigos publicados sobre o assunto “obsolescência programada”, o direito do consumidor veio à frente do Direito Ambiental, fazendo com que a jurisprudência brasileira desse prioridade para o primeiro e deixasse de lado a responsabilidade ambiental.

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Ainda, após uma pesquisa no Repositório Institucional (RIUNI), percebe-se que o único trabalho que abrange o Direito Ambiental e a obsolescência programada é a “Obsolescência planejada e suas implicações no âmbito do Direito Ambiental e do Consumidor” (CARNEIRO, 2018), tendo todas as outras como objeto principal o Direito do Consumidor. No entanto, nenhum dos trabalhos encontrados teve apenas como objeto de estudo o Direito Ambiental, sendo o foco desta monografia, portanto, mais aprofundado neste tema. Além disso, o diferencial desta pesquisa é verificar se há possibilidade de aplicar a responsabilidade e de que forma aconteceria.

Nesse sentido, é de extrema importância pesquisar e analisar o impacto que isso está causando para o planeta, analisando a classificação e tipos de obsolescência programada, o tempo de vida útil dos produtos em que essa técnica é aplicada, os efeitos e impactos no meio ambiente, e outras questões que decorrem desse fenômeno.

1.6 OBJETIVOS

1.6.1 Geral

Analisar a existência e eficácia da responsabilização civil ambiental nos casos de obsolescência programada.

1.6.2 Específicos

Verificar a construção histórica da obsolescência programada.

Analisar o estímulo da obsolescência programada frente a uma sociedade de consumo. Conceituar e caracterizar a obsolescência programada diante dos tipos existentes. Examinar se a técnica da obsolescência programada fere os princípios ambientais. Analisar os tipos de responsabilidade civil no ordenamento jurídico e verificar se podem ser aplicadas na obsolescência programada.

Analisar a ampla legislação sobre o tema e os impactos ambientais decorrentes da obsolescência programada.

Analisar, ao final, a aplicação da responsabilidade civil ambiental em casos concretos de obsolescência programada, principalmente no que se refere ao Direito Ambiental.

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1.7 DELINEAMENTO DA PESQUISA

Quanto à natureza da pesquisa, caracteriza-se como exploratória, visto que pretende analisar como o tema em questão é visto no ordenamento jurídico e no entendimento doutrinário, bem como se verifica que este tipo de pesquisa “[...] volta-se à busca de maior familiaridade com o que se queira pesquisar (problema de pesquisa)” (MARCOMIN; LEONEL, 2015, p. 12). Além disso, objetiva aproximar o autor do tema “Obsolescência Programada” e levantar variáveis relacionadas com a técnica, conceitos dogmáticos, correntes doutrinárias, jurisprudências e princípios ambientais que são ligados ao tema.

Quanto aos instrumentos utilizados para coleta de dados, esta pesquisa se caracteriza como documental e bibliográfica. O critério para seleção do material a ser utilizado na pesquisa basear-se-á na consulta de literatura e jurisprudência dominante na área, reunindo todos os dados encontrados a fim de abordar a existência e eficácia da responsabilidade civil ambiental no âmbito da obsolescência programada. Além de livros e jurisprudências, a presente pesquisa terá, como instrumento para coleta de dados, artigos, revistas, lei seca e demais documentos.

No que tange à pesquisa bibliográfica, Boccato (2006, p. 266) elucida que:

A pesquisa bibliográfica busca a resolução de um problema (hipótese) por meio de referenciais teóricos publicados, analisando e discutindo as várias contribuições científicas. Esse tipo de pesquisa trará subsídios para o conhecimento sobre o que foi pesquisado, como e sob que enfoque e/ou perspectivas foi tratado o assunto apresentado na literatura científica. Para tanto, é de suma importância que o pesquisador realize um planejamento sistemático do processo de pesquisa, compreendendo desde a definição temática, passando pela construção lógica do trabalho até a decisão da sua forma de comunicação e divulgação.

Tocante à abordagem, ela é qualitativa, uma vez que o objetivo não é contabilizar quantidades e resultados, mas sim compreender as causas e consequências da técnica apresentada e analisar sua aplicabilidade no âmbito jurídico, de acordo com doutrinas e jurisprudências.

Quanto ao procedimento utilizado para análise de dados, a problemática da pesquisa irá se embasar pelos fundamentos doutrinários e jurisprudenciais, a fim de analisar a existência e eficácia da responsabilização civil ambiental nos casos da técnica apresentada.

Ainda, tomará como referência os seguintes elementos: a construção histórica da obsolescência programada; a caracterização diante dos tipos existentes; a análise da ilegalidade da técnica frente aos princípios ambientais; o estímulo da técnica frente ao consumismo e a análise da aplicação da responsabilidade civil em casos concretos.

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1.8 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS

Além da Introdução e Conclusão, os capítulos deste trabalho serão divididos da seguinte forma, no primeiro capítulo serão analisados aspectos da evolução histórica da obsolescência programada, a transformação da sociedade de produtores para a sociedade consumerista, o conceito doutrinário e a classificação do objeto de estudo, bem como as técnicas utilizadas na prática da obsolescência programada.

No segundo capítulo, serão demonstrados os tipos de responsabilidade civil aplicada no ordenamento jurídico brasileiro. Inicialmente, trazendo as noções introdutórias da responsabilidade civil e os princípios mais importantes do Direito Ambiental e, em seguida, conceituando a responsabilidade civil objetiva e a teoria do risco integral, e a responsabilidade civil compartilhada.

No terceiro e último capítulo, serão analisados os impactos da obsolescência programada e a orientação jurisprudencial acerca da responsabilidade civil ambiental. Primeiramente, serão demonstrados os impactos decorrentes da técnica, o debate acerca do meio ambiente na conferência Rio92 a Rio+20 e as diretrizes da Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Por último, uma pesquisa acerca da existência ou inexistência de orientação jurisprudencial quanto à imprescindibilidade da reparação do dano ambiental e quanto à (in)aplicabilidade e (in)eficácia da responsabilização civil ambiental nos casos de obsolescência programada.

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2 OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA

O presente capítulo apresenta aspectos gerais acerca da evolução da técnica conhecida como obsolescência programada, analisando a relação do homem com a natureza e verificando o processo de criação desse método, bem como as estratégias utilizadas nos dias de hoje.

Segundo Vieira e Rezende (2015, p. 68), “a obsolescência programada é uma estratégia utilizada pelos fabricantes, que programam para que a vida útil dos produtos de consumo tenha tempo determinado, com o objetivo de estimular a aquisição de novos objetos dentro de um curto período de tempo”.

Esse fenômeno, que estimula diretamente o consumismo, vem causando inúmeros impactos tanto para o meio social quanto para o meio ambiente, haja vista que, cada vez mais, se mostra um modelo completamente insustentável (MORAES, 2015).

Os avanços tecnológicos e a redução do ciclo de vida dos aparelhos eletrônicos geram um crescimento exponencial de resíduos, que ao não obterem a destinação adequada, podem causar problemas sérios à saúde e ao meio ambiente:

Nesse sentido, escreve Bauman (2008, p. 45):

Novas necessidades exigem novas mercadorias, que por sua vez exigem novas necessidades e desejo; o advento do consumismo inaugura uma era de ‘obsolescência embutida’ dos bens oferecidos no mercado e assinala um aumento espetacular na indústria da remoção do lixo.

Após a utilização constante desse modelo de consumo, a sociedade passou a deparar-se com um contratempo: os limites da natureza. Isso porque, com a superexploração dos recursos naturais e a superprodução de resíduos sólidos, tornou-se evidente a aproximação de uma crise, na qual os efeitos sociais e ambientais são cada vez mais importantes, atentando para a necessidade de uma alteração no modo de vida das sociedades atuais (MORAES, 2015).

Assim, nota-se que a obsolescência programada é um dos fenômenos causadores dos lixos eletrônicos, e embora seja benéfica para os produtores e donos de empresas, é indiscutivelmente prejudicial ao meio ambiente.

Nesse sentido, importa ressaltar que, ainda que o paradigma da obsolescência programada possa surtir efeito em muitas áreas do Direito, elegeu-se neste trabalho a esfera ambiental para tratar, visto que a técnica vem destruindo um que é direito fundamental de todos, e que sem ele causaria extinção humana.

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2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA: ASPECTOS DA RELAÇÃO DO HOMEM COM O MEIO AMBIENTE

Para entender melhor os rumos tomados pela humanidade na escolha do modelo de desenvolvimento atual e os impactos que esse modelo trouxe para o meio ambiente, é necessário fazer uma análise da relação do homem com a natureza e como essa relação foi construída.

A história do homem com a natureza não teve um desenvolvimento linear, lógico e homogêneo, de forma que passou por diversas mudanças, acompanhando as inerentes pluralidades e diversidades humanas (MORAES, 2015).

Outrossim, além dos acontecimentos naturais, o pensamento humano passou por diversas alterações, existindo fases em que o homem se submetia à natureza, e outras em que o homem era o centro do universo e a natureza existia apenas para servi-lo (MORAES, 2015).

Desde o aparecimento da humanidade, sabe-se que o ser humano atua e interfere na natureza pelo simples fato de existir. O homem necessita utilizar dos recursos naturais para sobreviver.

Nesse sentido, o ser humano sempre esteve em constante luta pela sobrevivência e, como necessitava de ajuda para buscar alimentos, procurou formar grupos a fim de realizar a caça aos animais (MORAES, 2015).

Assim, iniciou a formação de uma das primeiras populações primitivas, os conhecidos caçadores-coletores. Com um estilo de vida nômade, foi possível identificar algumas características desse grupo, uma delas de contrair casamento como forma de estabelecer vínculos sociais com outros grupos distintos, facilitando a busca de alimento para ambos os grupos (KELLY, 1995).

Dessa forma, tendo em vista a utilidade e benefícios que os grupos obtiveram no momento em que se relacionaram, principalmente na área da caça, o homem se viu obrigado a aprender a conviver em grupo. Nessa linha, os grupos foram desenvolvendo técnicas de sobrevivência, até o momento em que descobriram a agricultura. No entanto, embora tenham transitado por muito tempo entre esses dois modelos de sobrevivência, a atividade agropastoril prevaleceu em razão do crescimento populacional e da necessidade de armazenamento dos recursos obtidos (MORAN, 2008).

A partir desse momento, a agricultura começou a crescer significativamente, de modo que a irrigação passou a utilizar a água e os insumos agrícolas de maneira intensiva, como exemplo deste último os agrotóxicos e adubos. Além disso, a tecnologia teve um grande avanço sobre a utilização do solo e dos recursos hídricos. Assim, como consequência, houve o aumento

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das áreas utilizadas pela agricultura e valorização dos recursos hídricos do planeta (PHILIPPI JR; ALVES, 2005).

Não obstante, juntamente com os fatores positivos vieram os negativos, isto é, a agricultura passou a sujeitar o meio ambiente a grandes pressões, trazendo desgastes ao solo e a ocorrência de desmatamento nas florestas (MORAES, 2015).

Além disso, outro fator significativo para a relação do homem com a natureza foram as interferências religiosas ao longo da história, marcadas pelas religiões judaica, cristã e islâmica. Segundo Ost (1995, p. 35), as religiões trouxeram uma visão relativa da natureza, deixando claro que o Criador era omnipotente e havia entregado ao homem um bem maior para usufruto. Assim, o ser humano entendia que a natureza era submissa a seus interesses e que havia sido criada para satisfazer suas vontades.

De acordo com Corbisier (1988, p. 188), Deus é onipresente, não porque ocupa um corpo ou lugar, mas sim porque é ele quem dá ao ser todas as coisas. Desse modo, assim como a alma está em todas as partes do corpo, Deus está em todos os seres e em cada um em particular. Nota-se a importância da religião na história do homem, visto que este passou a ter outra visão sobre o mundo após sua influência.

Seguindo a linha histórica, foi uma questão de tempo até que os grupos, que antes eram agrícolas, evoluíssem e criassem algo maior e mais complexo: as cidades. Nesse momento, o homem migra do meio rural para o meio urbano, transformando o modelo de sobrevivência da agricultura para o comércio (MORAES, 2015, p. 27).

No entanto, com o crescimento populacional acelerado, o mercado de trabalho não conseguiu absorver todos os trabalhadores, principalmente pela falta de qualificação profissional dos homens que haviam saído do campo e migrado para a cidade.

Segundo Moraes (2002, p. 10), a questão ambiental deve ser trabalhada não como resultante de um relacionamento entre homens e a natureza, mas como uma faceta das relações entre os homens, isto é, como um objeto econômico, político e cultural.

Nesse contexto, após a saída do campo para a cidade, a relação do homem com a natureza passou a ser uma consequência das ações do ser humano. Isso porque o crescimento populacional trouxe diversos impactos para a natureza, como o aumento de lixo, a criação de favelas em áreas ilegais, a poluição e outros fenômenos.

No entanto, foi no século XV que houve a mudança mais significativa da visão do homem sobre a natureza, com o início do movimento que se chamou de Modernidade. Dentro desse processo nasceu o movimento Renascentista, no qual o homem estava liberto dos vínculos naturais que o faziam pensar ser um lugar fixo e imutável no Universo, e a partir desse momento

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deveria iniciar o incansável processo de compreensão e dominação desse movimento planetário (MORAES, 2015, p. 28).

Para Corbisier, nesse momento o homem atuava da seguinte forma:

Obcecado por Deus, o homem não se via porque só tinha olhos para Deus no qual não podia ver refletida a sua imagem. Como poderia o finito refletir o infinito? Reconciliado com ele mesmo, o homem precisava ver-se, conhecer-se, inclusive em sua dimensão física, material, em seu corpo, em seu rosto, de frente, de perfil e na expressão de seu olhar. E é o espelho que traz essa possibilidade, de ver-se a si mesmo, como só os outros, até então, podiam vê-lo. (1988, p. 278)

Portanto, tendo em vista que a partir desse pensamento o homem começou a valorizar-se e priorizar valorizar-seus interesvalorizar-ses em relação ao uso da natureza, esvalorizar-se movimento teve grande influência nos impactos atuais.

Posteriormente, no século XVIII, o mundo se deparou com uma nova fase: o movimento iluminista. Também conhecido como século das luzes, esse movimento trouxe características que eram inexistentes até então, como: liberdade, progresso, fraternidade, governo constitucional e separação da Igreja-Estado.

Nesse momento, o homem já havia conquistado a liberdade de pensamento, no entanto, com o movimento, conseguiu buscar uma capacidade nunca vista na história: fazer uso da própria razão independentemente da direção de outrem, e principalmente da direção de Deus.

A liberdade individual se torna o centro da discussão sobre política à medida que a filosofia política iluminista promovia a centralidade dos direitos individuais, diferenciando os compromissos dos antigos e medievais da ordem e hierarquia. Nesse sentido, pode-se afirmar que o Iluminismo teve sua primeira expressão teórica, mais concentrada, em fins do século XVII, com o inglês John Locke – considerado o pai do liberalismo –, preocupado em “modificar” a concepção de súditos da coroa britânica para cidadãos. Defenderia a liberdade e a tolerância religiosa (MELLO; DONATO, 2011, p. 253).

De acordo com Crescenzo (2012, p. 5), a primeira fase da filosofia moderna ainda sofria a influência dos séculos obscuros, uma vez que quem comandava as ideias era a Igreja, sendo dirigida pelos padres. Com a chegada da segunda fase, o mundo dividiu-se em dois hemisférios distintos: de um lado estavam aqueles que gostavam de raciocinar e de outro, aqueles que preferiam crer na Igreja.

Assim, iniciou-se o movimento que abriu portas para o pensamento e trouxe liberdade para o homem agir pelas próprias razões. Com todo esse crescimento, a relação do homem com

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a natureza mudou drasticamente, fazendo com que este tomasse propriedade e liberdade para usufruir da natureza sem algum problema.

2.1.1 Transformação da sociedade de produtores para sociedade consumerista

Como visto anteriormente, a relação do homem com a natureza iniciou-se logo com o aparecimento da humanidade. Desde então, o ser humano passou por diversas mudanças, tanto decorrentes da forma de pensar como das necessidades naturais que a sobrevivência impôs. Contudo, da mesma maneira que a relação do homem com a natureza se transformou ao longo do tempo, houve também uma mudança significativa na forma em que o consumo se faz.

O fenômeno chamado de consumo e denominado como ato de “adquirir e utilizar bens e serviços para atender às necessidades” (LEONARD, 2011, p. 158) fez com que a sociedade deixasse de ser uma sociedade de produtores, para se tornar uma sociedade consumerista.

De acordo com Bustamante (2007, p. 9, apud MORAES, 2015, p. 31), é necessário classificar as necessidades que são embasadas pelo consumo como: básicas, culturais e do sistema produtivo.

As primeiras, chamadas de necessidades básicas, a autora denomina “[...] como as necessidades de alimentação e segurança, por exemplo, são insubstituíveis e imprescindíveis para a manutenção da vida humana” (p. 31). Assim, percebe-se que essa é uma forma de consumo necessária a sobrevivência do homem, ao qual sem ela seria impossível viver.

Quanto às necessidades culturais, “[...] são aquelas necessidades vinculadas ao sentido de pertença à determinada classe/comunidade ou relacionadas a hábitos, podendo ser reais ou induzidas” (p. 31). Aqui, tem-se a distinção entre a alta cultura, baseada nos padrões clássicos, e a baixa cultura, baseada nas tradições populares. No entanto, ambas se relacionam por serem necessidades decorrentes da cultura de cada sociedade.

Por fim, denomina as necessidades de consumo advindas do sistema produtivo como as que “[...] se referem tanto aos insumos por eles utilizados quanto ao consumo do que foi produzido, o que, como se verá a diante, acarreta na criação artificial de necessidades nos consumidores” (p. 31). Assim, nota-se que essa é uma necessidade criada diretamente pelo consumo, de modo que tornou mercadorias - que antes não eram necessárias - agora indispensáveis para a vida humana.

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O crescimento expressivo e singular do consumo nas últimas décadas decorre do fato de que o ser humano não mais consome apenas para suprir suas necessidades básicas, como alimentação, saúde e moradia, mas também para atender aos seus desejos por produtos e bens supérfluos. E, como consequência, na sociedade é ofertada diariamente uma grande quantidade de produtos, bens e prestações de serviços. (VIEIRA; REZENDE; 2015, p. 67)

Destarte, levando em conta o crescimento significativo desse fenômeno, pode-se separar a evolução das formas de consumo em duas fases, a fase sólida da modernidade, a qual se caracteriza pela sociedade de produtores. E a fase líquida da modernidade, para a qual a sociedade deixa de ser produtora para ser consumista.

Na fase sólida da modernidade, tem-se como marco histórico a Revolução Industrial, cuja posse e consumo de bens era unicamente para o conforto e segurança do homem, pois sua intenção não era quantidade e sim qualidade dos bens.

Para os autores Vieira e Rezende (2015, p. 66), a Revolução Industrial teve grande importância nessa transformação:

A Revolução Industrial transformou os meios de produção quando proporcionou um grande crescimento comercial e viabilizou à classe burguesa o acúmulo de capital em decorrência da lucratividade oriunda do desenvolvimento econômico. Com o novo modelo de produção consolidou-se o Capitalismo, caracterizado por muitas evoluções tecnológicas e pelo surgimento do consumo de massa, e o consequente estímulo ao desenvolvimento industrial e ao progresso da ciência.

Tendo em vista que com o desenvolvimento industrial a classe burguesa começou a acumular capital/dinheiro, as empresas se viram obrigadas a criar novas técnicas de consumo, pois a produção era alta (aumento da oferta) e o capital também, assim, bastava implementar uma nova ideia de consumo no mercado (MORAES, 2015).

Nessa linha, com o intuito de transformar o modo de consumo, as empresas começaram a implementar estratégias – como a obsolescência programada, por exemplo – a fim de tornar seus consumidores mais “selvagens” no momento de consumir (MORAES, 2015).

Nesse sentido, destaca Bauman (2008, p. 38):

A passagem do consumo ao ‘consumismo’, quando aquele [...] tornou-se especialmente importante, se não central, para a vida da maioria das pessoas, o verdadeiro propósito da existência. E quando nossa capacidade de ‘querer’, ‘desejar’, ‘ansiar por’ e particularmente de experimentar tais emoções repetidas vezes de fato passou a sustentar a economia do convívio humano.

As técnicas foram sendo implementadas pouco a pouco, até o momento em que a sociedade necessitava do consumo excessivo para satisfazer suas vontades.

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Na sequência, a modernidade entra na fase líquida, a qual teve como marco histórico o fim da Segunda Guerra Mundial. No entanto, tendo em vista a alta capacidade de produção e a escassez de capital, causadas pela fase anterior, foi nesse momento que o ideal consumerista despencou.

Silva caracteriza a sociedade consumista da seguinte forma:

Na sociedade consumista, o modo ser de existir é desestimulado de todas as maneiras, pois ser não demanda consumo nem a obtenção de lucro. Uma pessoa satisfeita com sua aparência, com seu ofício, com seus afetos e seus valores éticos não necessita consumir (de forma abusiva e/ou compulsiva) cosméticos, cirurgias plásticas, namorados e/ou namoradas ‘da hora’ ou títulos de bons cidadãos em instituições de visibilidade social (2014, p. 13).

Nesse período, tem-se como referência o empresário Henry Ford, segundo Leonard (2011, p. 96), o homem desenvolveu uma técnica cuja finalidade era dobrar o salário de seus funcionários e reduzir suas jornadas de trabalho. Desse modo, os empregados teriam mais tempo e dinheiro para poder consumir.

Neste preâmbulo, os homens eram a chave do mercado, isto é, era necessário mantê-los trabalhando e consumindo. O trabalho já não era mais o foco principal, servia apenas para que ganhassem dinheiro e após pudessem gastá-lo no mercado afora.

Conforme explica Silva (2014, p. 12), “a cultura consumista e individualista está tão profundamente enraizada em nosso comportamento diário que, na maioria das vezes, não percebemos o quanto vivemos sob a ditadura do ter”.

Dessa forma, percebe-se o quanto a transformação da sociedade se fez pela influência do consumismo e de suas técnicas implementadas, não só na época, como até o momento.

2.2 CONCEITO DOUTRINÁRIO E CLASSIFICAÇÃO DA OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA

Como visto, o consumismo ganhou força com o marco histórico da Revolução Industrial, assim, foi possível acompanhar sua evolução por meio das obras bibliográficas citadas. No entanto, ao contrário disso, o tema obsolescência programada, ainda que praticado nesta época – como uma técnica para impulsionar o consumo exagerado –, só apareceu por escrito no final da década de 1920.

Obsolescência, segundo o Dicionário Online de Português (2019), significa “estado do que está prestes a se tornar inútil, ultrapassado ou obsoleto; processo pelo qual algo passa até se tornar antigo ou ultrapassado”.

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De acordo com Slade (2007, p. 58), Justus George Frederick foi o homem que reconheceu a técnica pela primeira vez em um artigo publicado na revista Advertising and Selling. Para ele, esse fenômeno era chamado de “obsolescência progressiva” e significava comprar para se atualizar, para estar moderno, dentro das regras de estilo, e não para utilizar o produto até seu total desgaste.

O autor explica que a ideia era estimular a compra de novos produtos, mais eficientes, atualizados e de novo estilo, em substituição ao antigo pensamento de usar os produtos até seu desgaste. Além disso, os produtores tentaram mascarar o conceito de obsolescência, reduzindo seus aspectos negativos e destacando o conceito de uma técnica “progressista” para o mercado (SLADE, 2007, p. 58).

Com efeito, apesar de poucas obras bibliográficas nessa época, a técnica estava em constante crescimento, de forma mascarada. E foi a partir desse artigo publicado que começaram a nomeá-la como “obsoletismo” e “obsolescência programada” (MORAES, 2015, p. 59).

Após esse período, os autores trouxeram um novo conceito para essa estratégia consumerista. No entender de Vieira e Rezende (2015, p. 67):

Tal desejo constante por objetos com tecnologias mais avançadas faz com o que as produções anteriores se tornem ultrapassadas num curto prazo, o que implica em desperdício, com consequentes e drásticos impactos ao meio ambiente. Isso porque a busca pelos recursos naturais é cada vez maior em função da estratégia empresarial denominada obsolescência programada.

Ainda, de acordo com Silva (2012, p. 182):

A obsolescência programada, para os que ainda não estão familiarizados com o conceito, é uma estratégia da indústria para ‘encurtar’ o ciclo de vida dos produtos, visando a sua substituição por novos e, assim, fazendo girar a roda da sociedade de consumo, poderíamos dizer que há uma lógica da ‘descartabilidade’ programada desde a concepção dos produtos. Em outras palavras, as coisas já são feitas para durarem pouco.

Nesse sentido, a obsolescência programada foi dividida em três tipos de técnicas: de função, qualidade e de desejabilidade.

Para Packard (1965), a primeira delas, chamada obsolescência de função e também conhecida como obsolescência técnica, denomina-se quando um novo produto que executa melhor determinada função é incluído no mercado, tornando sua versão anterior obsoleta.

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Segundo o autor, essa técnica é “louvável”, pois “todos aplaudimos quando podemos discar um número a centenas de milhas de distância ao invés de fazer a ligação por intermédio de telefonistas” (PACKARD, 1965, p. 51).

De fato, essa técnica pode ser benéfica se os produtos lançados forem mais tecnológicos, fáceis de serem decompostos, menos poluentes e possíveis de reciclagem. No entanto, outras questões devem ser analisadas, uma vez que o lançamento de novos produtos com tanta frequência acaba intensificando a exploração dos recursos naturais e consequentemente a crise socioambiental.

O segundo método é a obsolescência de qualidade, a qual, conforme Packard (1965, p. 51) acontece quando um produto é projetado para quebrar ou ser gasto em um tempo menor do que levaria normalmente.

Para o desenvolvimento dessa estratégia, inicialmente, a indústria teria que praticar três ações: o aumento das vendas, a elevação dos preços e a utilização de estratégias que pudessem assegurar que os consumidores voltassem ao mercado para adquirir novos produtos antes do que seria normalmente necessário (PAKARD, 1965, p. 88). Contudo, para garantir o êxito da técnica, a indústria de mercado impôs o alto custo para a conservação e conserto dos bens de consumo (PACKARD, 1965, p. 122).

As lâmpadas foram as primeiras vítimas desse fenômeno. Estudiosos relatam o surgimento da sua prática já no século XIX, quando o cartel conhecido como Phoebus decidiu que a vida útil de seus produtos (lâmpadas) deveria ser reduzida por meio de novas tecnologias, a fim de obrigar os consumidores a adquirirem novas lâmpadas, aumentando assim as vendas (MORAES, 2015, p. 52).

Foi a partir desse fato que os produtores começaram a perceber o quão benéfico para o mercado seria implementar tecnologias que reduzissem o tempo de vida útil de seus produtos.

Por fim, tem-se a obsolescência de desejabilidade, a qual tem como objetivo tornar o produto ultrapassado em razão do estilo. Nos dizeres de Packard (1965, p. 51), “[...] o produto torna-se gasto em nossa mente porque um aprimoramento de estilo ou outra modificação faz com que fique menos desejável”.

Com efeito, a invenção de marcas e a publicidade têm desempenhado um papel fundamental no desenvolvimento da atual sociedade de consumo, tendo em vista que essa tática visa a influenciar a compra de novos produtos em virtude de seu design “desejável” e moderno, deixando de lado a análise de sua qualidade.

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Para Latouche (2009, p. 18), “[...] a publicidade nos faz desejar o que não temos e desprezar aquilo de que já desfrutamos. Ela cria e recria a insatisfação e a tensão do desejo frustrado”.

Além disso, Moraes (2015, p. 53) explica que “[...] em 1932, a obsolescência planejada pela desejabilidade era a regra para os produtores de carros americanos, e essa estratégia foi tão bem-sucedida neste ramo que se espalhou rapidamente para várias outras indústrias, tais como de relógios e rádios”.

A propósito, a respeito das técnicas apresentadas, insta salientar que, de acordo com o que escreve Magera (2013, p. 97-98), os países comunistas não chegaram a aplicá-las:

[...] no bloco comunista na Europa do Leste, a obsolescência programada não poderia ser aplicada. Pelo contrário, as indústrias criaram máquinas que chegavam a durar 25 anos. O sistema socialista da antiga URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) tinha uma outra concepção de produção. Não havia a figura do capitalista e o Estado era o dono do modo de produção. Com a falta de recursos, a obsolescência não era desejada, visto que causaria prejuízo para o Estado.

Dessa forma, percebe-se que a história da obsolescência é recente e se desenvolveu principalmente nos países da América. Inicialmente surgindo como uma estratégia benéfica para a sociedade e donos de empresas, e posteriormente descoberta como um fenômeno consumista e altamente lesivo para o meio ambiente.

2.3 A OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA E A DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE

Compreendidos os tipos de obsolescência planejada, neste trabalho será dado enfoque à obsolescência programada de desejabilidade e de qualidade, tendo em vista a imperceptibilidade de suas práticas pela sociedade e pelos impactos ambientais que vem causando.

Utilizando-se da evolução tecnológica, novas mídias apareceram para conectar o consumidor em todas as formas possíveis. Como exemplo, têm-se os aparelhos celulares, cuja evolução se deu mais rápido do que se podia imaginar. Hoje é possível acessar e-mail, rádio, TV digital, mídias sociais e fazer ligações, tudo por meio do celular.

O problema da rápida evolução é que essas tecnologias podem ser usadas tanto de forma positiva quanto de forma negativa, e muitas vezes se tornam aliadas da técnica de obsolescência programada. Por exemplo, por meio das mídias sociais, filmes, propagandas e novelas, todos os dias o consumidor é convidado para “satisfazer” o desejo de consumir e substituir seus produtos por novos.

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Nesse sentido, Bauman (2003, p. 99) descreve essa relação como um ciclo vicioso:

Numa sociedade de consumo, compartilhar a dependência do consumidor – a dependência universal das compras – é a condição sine qua non de toda liberdade individual [...] Num arroubo de sinceridade, um comercial de TV monstra uma multidão de mulheres com uma variedade de penteados e cores de cabelos, enquanto o narrador: ‘Todas únicas; todas individuais, todas escolhem X’ (X sendo a marca anunciada de condicionador). O utensílio produzido em massa é a ferramenta de variedade individual [...] Sua dependência não se limita ao ato da compra. Lembre-se, por exemplo, o formidável poder que os meios de comunicação de massa exercem sobre a imaginação popular, coletiva e individual.

Aqui têm-se exemplos clássicos de métodos e estratégias utilizadas na obsolescência programada de desejabilidade. A partir do momento em que as empresas começaram a perceber o quanto as mídias sociais, filmes e novelas influenciam na escolha do consumidor, esses meios foram utilizados para tornar produtos menos “desejáveis” e ultrapassados.

Além disso, outro fator importante para essa técnica foram os chamados “influenciadores digitais”. Ao consultar o Dicionário Online de Português (2019), a descrição de influenciador aparece como “que ou quem influencia ou tem alguma espécie de influência sobre algo ou alguém”.

Assim, o influenciador digital ocupa papel decisivo no momento do consumo de bens supérfluos. Isso porque, muitas vezes, o consumidor não necessita do produto em questão, ou até já possui um de mesma qualidade, no entanto, o fato de “pessoas da moda” estarem utilizando, faz com que o consumidor deseje e compre o item lançado.

Sobre o tema, explicam Pedrosa e Pereira (2013, p. 7):

A obsolescência de desejabilidade ou obsolescência psicológica consiste em gastar produto na mente do proprietário. Assim, o proprietário/consumidor é induzido a desejar um produto novo, mesmo que o produto que já possua esteja em perfeitas condições de uso ou atenda perfeitamente bem os fins a que se destina. Desse modo, o estilo passou a ser cultuado como um importante elemento na desejabilidade de produto.

Ora, atualmente não é difícil o consumidor considerar o produto que tem em casa, velho e ultrapassado, haja vista que novos modelos são lançados a toda hora. Percebe-se que, na maioria dos casos, o modelo sucessor do produto já é implementado no mercado no ano seguinte, ou antes, o que acaba desvalorizando os modelos anteriores e estimulando a troca, mesmo que o produto a ser substituído não possua defeitos.

Como exemplo dessa situação, tem-se o caso do lançamento do iPad 4, da empresa Apple, que lançou a versão poucos meses depois de ter colocado em circulação o iPad 3. Os

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usuários, embora a nova versão não apresentasse mudanças técnicas, viram o seu produto como ultrapassado e procuraram comprar a nova versão (PENA, 2020).

De acordo com Andrade e Lima (2018, p. 1246):

O exemplo da Apple demonstra o grau de lesividade do fenômeno da obsolescência para a sociedade de consumo contemporânea, intensificando a promoção do descarte prematuro de bens obsoletos, o aumento do lixo tecnológico, o esgotamento dos recursos naturais e perda dos valores humanos com o vigor do hiperindividualismo pós-moderno. Deste modo, o fenômeno da obsolescência e a prática do consumismo, originam à sociedade impactos diversos que ferem direitos de todos, arriscando a posteridade da vida humana, discussão que será adiante levantada.

Desse modo, a obsolescência planejada de desejabilidade induz o consumidor a se preocupar mais com o estilo, aparência, forma e cores dos produtos do que com a própria qualidade. Essa valoração está diretamente relacionada às necessidades de reconhecimento social e valores sociais distorcidos na evolução do homem.

Por outro lado, como demonstrado, a obsolescência planejada de qualidade visa a programar um produto para quebrar ou ser gasto em um tempo menor do que o previsto.

Conforme Packard (1965), com essa técnica os fabricantes ganham mais nas vendas, disponibilizando produtos com uma vida útil controlada e ganhando na assistência técnica, vendendo serviços e peças de substituição. Assim, quanto mais acessórios são adicionados aos produtos, mais acessórios podem apresentar defeitos. Dessa forma, há maiores lucros de vendas e de manutenção.

Assim, nota-se que um dos métodos aplicados nessa técnica é a implementação de peças que apresentem defeitos após um curto período de uso, a fim de que a manutenção ou substituição dessas peças também seja uma fonte de renda para os produtores.

Segundo Packard (1965, p. 122-126), outras técnicas implementadas são: a) o aumento do preço das peças do produto; b) a complexificação das peças para dificultar o concerto pelo próprio consumidor; c) o aumento da inacessibilidade das peças necessárias para o conserto; d) a diminuição de informações sobre o produto e seu conserto; e) o encorajamento dos consumidores a jogarem fora as peças quebradas.

Dessa forma, as estratégias usadas na obsolescência planejada de qualidade ajudam a aumentar o volume de negócios das empresas de conserto e dos fabricantes de peças, ocasionando um superfaturamento por parte deles. Por outro lado, os consumidores, influenciados pela técnica e indispostos a encarar o alto custo do conserto e da manutenção, optam por aceitar a substituição do produto por um novo lançado no mercado (PACKARD, 1965, p. 123).

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Portanto, com a inserção de novas tecnologias no mercado, a sociedade pós-moderna, objetivando alcançar um desenvolvimento econômico cada vez melhor, viu-se envolvida em um processo mercadológico sedutor. O setor produtivo possui condições para lançar bens de consumo atrativos e, para manter o lucro, consegue reduzir a vida útil dos bens, praticando o fenômeno da obsolescência programada e atingindo uma gama de efeitos negativos e impactantes ao meio ambiente, principalmente no descarte do lixo econômico (ANDRADE; LIMA, 2018, p. 1246).

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3 RESPONSABILIDADE CIVIL APLICADA

O objetivo do presente capítulo é abordar o instituto da responsabilidade civil, as diferentes teorias existentes e apresentar a teoria adotada no Brasil.

No primeiro momento, serão abordadas as noções introdutórias acerca do instituto da responsabilidade civil, cujo objetivo é apresentar os requisitos necessários para a configuração da obrigação de reparar. Na sequência, a apresentação dos princípios fundamentais do Direito Ambiental, bem como seus conceitos doutrinários, suas especificidades e sua importância para a responsabilização civil no Direito brasileiro.

Por último, serão apresentadas a “Responsabilidade Civil Ambiental Objetiva e a Teoria do Risco integral” e a “Responsabilidade Civil Ambiental Compartilhada”, cujo objetivo é demonstrar o entendimento doutrinário e jurisprudencial relativo à responsabilidade civil por danos ambientais no Brasil.

3.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL

Segundo Gagliano e Pamplona Filho (2013, p. 51), a responsabilidade deriva da transgressão de uma norma jurídica civil preexistente, impondo ao infrator a consequente obrigação de indenizar o dano. Nas palavras de Rui Stoco:

A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade humana, de impor a todos o dever de responder por seus atos, traduz a própria noção de justiça existente no grupo social estratificado. Revela-se, pois, como algo inarredável da natureza humana (STOCO, 2007, p. 114).

No mesmo preâmbulo, Maria Helena Diniz define a responsabilidade civil como:

A aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva). (DINIZ, 1998, p. 34)

Portanto, no estudo da Responsabilidade Civil, fundamental de início mencionar os três elementos que a compõem: conduta, dano, também denominado resultado ou prejuízo, e nexo causal (MONTENEGRO, 1992).

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De acordo com o artigo 927, caput, do Código Civil, “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. O artigo 186 do Código Civil define como ato ilícito “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral” (BRASIL, 2002).

Além disso, o artigo 187 do Código Civil dispõe que “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes” (BRASIL, 2002).

Portanto, verifica-se que o primeiro elemento essencial para responsabilização civil é a conduta humana, comissiva ou omissiva, e causadora de um dano ou prejuízo. No entendimento de Maria Helena Diniz a conduta é:

A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado (DINIZ, 2005, p. 43).

Nesse norte, no Direito atual, a tendência é não deixar a vítima da conduta sem ressarcimento, de forma a reparar seus danos, tanto morais quanto patrimoniais. Assim elucida Carlos Alberto Bittar:

O lesionamento a elementos integrantes da esfera jurídica alheia acarreta ao agente a necessidade de reparação dos danos provocados. É a responsabilidade civil, ou obrigação de indenizar, que compele o causador a arcar com as consequências advindas da ação violadora, ressarcindo os prejuízos de ordem moral ou patrimonial, decorrente de fato ilícito próprio, ou de outrem a ele relacionado. (BITTAR, 1994, p. 561)

O segundo elemento caracterizador da responsabilidade civil é o dano. Sua existência é requisito essencial para a responsabilidade civil. De mesmo modo entende o doutrinador Sérgio Cavalieri:

O ato ilícito nunca será aquilo que os penalistas chamam de crime de mera conduta; será sempre um delito material, com resultado de dano. Sem dano pode haver responsabilidade penal, mas não há responsabilidade civil. Indenização sem dano importaria enriquecimento ilícito; enriquecimento sem causa para quem a recebesse e pena para quem a pagasse, porquanto o objetivo da indenização, sabemos todos, é reparar o prejuízo sofrido pela vítima, reintegrá-la ao estado em que se encontrava antes da prática do ato ilícito. E, se a vítima não sofreu nenhum prejuízo, a toda evidência, não haverá o que ressarcir. Daí a afirmação, comum a praticamente todos os autores, de que o dano é não somente o fato constitutivo mas, também, determinante do dever de indenizar (CAVALIERI FILHO, 2008, p. 71).

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Ainda, na explicação de Rui Stoco: “O dano é, pois, elemento essencial e indispensável à responsabilização do agente, seja essa obrigação originada de ato ilícito ou de inadimplemento contratual, independente, ainda, de se tratar de responsabilidade objetiva ou subjetiva.” (STOCO, 2007, p. 128).

Segundo Réche (2009), para que o dano seja indenizável é necessária a existência de alguns requisitos. Primeiramente é preciso que haja a violação de um interesse jurídico patrimonial ou extrapatrimonial de uma pessoa física ou jurídica. Após, é necessário ter a certeza do dano e a subsistência do dano, isto é, ele deve ser exigível no momento do ajuizamento da ação, não cabendo aqui a indenização se o dano já foi reparado.

Caracterizado o dano, importante salientar que este se divide em duas espécies. Com base em Ferreira (1986, p. 519), o termo “dano” provêm do latim damnum, e pode significar mal ou ofensa pessoal, prejuízo moral. Por outro lado, também pode ser entendido como prejuízo material causado a alguém pela deterioração ou inutilização de seus bens.

Conforme explica Nader (2016, p. 88):

O dano se diz patrimonial quando provoca a diminuição do acervo de bens materiais da vítima ou, então, impede o seu aumento. Materializa-se por danos emergentes, com a diminuição do patrimônio, ou por lucros cessantes, quando a vítima se vê impedida da atividade que lhe traria proveito econômico.

Outrossim, Moraes (2003, p. 143-145) explica que dano patrimonial é a diferença entre o que se tem e o que se teria, não fosse o evento danoso. O próprio significado da palavra indenizar provém do latim in dene, que significa devolver o patrimônio ao estado anterior, isto é, eliminar o prejuízo e suas consequências.

Desse modo, nota-se que o dano patrimonial pode ser dividido entre danos emergentes, com a diminuição de seu patrimônio ou por lucros cessantes, quando a vítima é prejudicada em uma atividade que lhe traria vantagem econômica.

Por outro lado, segundo Guedes (2019), o dano moral é uma lesão de interesse não patrimonial, uma violação a um estado psíquico do indivíduo. Ainda que seja normalmente vinculado à dor, ao sofrimento, à tristeza, o dano moral não está restrito a estes elementos.

Carlos Roberto Gonçalves, ao tratar sobre o tema, assevera que:

Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, intimidade, a imagem, o bom nome, etc., como se infere dos art. 1º, III, e 5º, V e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação (GONÇALVES, 2008, p. 359).

Referências

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