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Sumário. Texto Integral. Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 97S108

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Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 97S108

Relator: MANUEL PEREIRA Sessão: 26 Novembro 1997 Número: SJ199711260001084 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA.

Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.

EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO MORTE

DIREITOS DO TRABALHADOR DIREITO PESSOAL

DIREITO PATRIMONIAL TRANSMISSÃO DE DIREITOS

HERDEIRO TRABALHADOR RELAÇÃO DE TRABALHO

Sumário

I - A relação jurídica de trabalho nascida do contrato não se esgota em aspectos pessoais que se extinguem com o falecimento do trabalhador, mas isso não significa que os seus herdeiros não possam reclamar direitos de índole patrimonial provenientes da actividade laboral do falecido.

II - Assim, os herdeiros do trabalhador podem cobrar as retribuições em dívida ao falecido.

III - Do mesmo modo, os herdeiros do trabalhador podem reclamar o crédito do falecido, nascido de escalões de níveis remuneratórios a que aquele devia ter ascendido a partir de determinada data, e a que a entidade patronal não fez ascender, remunerando-o, a partir de então, com base em níveis inferiores.

Texto Integral

Acordam na Secção Social do Supremo Tribuna de Justiça: A, residente no

Porto, demandou em acção com processo ordinário o Banco

Nacional Ultramarino, S.A., pedindo que seja condenado a pagar-lhe a quantia de 2013300 escudos, juros de mora e diferenças da pensão mensal vencidos a partir de 1 de

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Agosto de 1993.

Alegou, no essencial, que foi casado com B, falecida em 8 de Dezembro de 1992, deixando duas filhas, C e D.

A B foi admitida ao serviço do Banco em 6 de Março de 1961, com a categoria profissional de telefonista, em que se manteve até 1 de Abril de 1975, data em que lhe foi reconhecida a categoria de dactilógrafa; trabalhou na agência da Beira, em

Moçambique, até 31 de Dezembro de 1975, altura em que veio para o Continente.

Esteve, assim, integrada no "quadro de pessoal maior", na classe H da respectiva tabela salarial a partir de 1 de Abril de 1975, classe que fora extinta na Metrópole, onde foi integrada na "letra" ou classe G2, sempre no quadro de pessoal maior.

Por efeito do CCTV para o sector bancário (BTE, 1. série, n. 18, de 15 de Maio de 1978), foram alterados os critérios de qualificação e enquadramento dos trabalhadores bancários, com reflexo nos níveis de retribuição, efeitos reportados a Janeiro de 1977.

O Banco Réu reclassificou a B, colocando-a no nível 4 do Grupo I, mas não contando para o efeito, como se impunha que fizesse, todo o tempo anterior à colocação na classe H, em que também esteve no quadro de pessoal maior, 14 anos.

Por isso, não foi colocada no nível 6, a partir de

1977, e deixou de ter acesso ao nível 7 em 15 de Julho de 1980, ao nível 8 em 1 de Julho de 1986 e ao nível 9 em 1 de Julho de 1990, do que resultou ter o Banco deixado de pagar à trabalhadora, desde 1 de Janeiro de

1977 até ao falecimento, a quantia de 1938100 escudos, conforme mapa que junta, montante que integra a herança.

Ainda o Autor tem direito às diferenças na pensão que vem recebendo, perfazendo as vencidas o montante de

75200 escudos, e que são devidas por o Réu não ter reclassificado devidamente a B.

Contestou o Réu excepcionando a intransmissibilidade para os sucessores da falecida do direito reclamado, já que o contrato de trabalho é um contrato "intuitu personae", que se extingue por morte do trabalhador, não podendo ser objecto de sucessão; não pode, por isso, questionar-se o direito a determinado nível ou categoria.

Por impugnação, aduz que a B foi correctamente reclassificada no nível 4, pelo que sempre lhe pagou aquilo a que tinha direito.

Respondeu o Autor à matéria da excepção, defendendo a sua improcedência. Precedendo convite do Meritíssimo Juiz, o Autor veio requerer a intervenção

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principal dos filhos do casal, as atrás referidas C e D, as quais se

apresentaram a intervir, declarando fazer seus os articulados do Autor. Tentada sem êxito a conciliação das partes, proferiu-se saneador-sentença a julgar procedente a excepção peremptória, sendo o Réu absolvido do pedido. Entendeu-se nele que os Autores vêm questionar directamente o direito do "de cujus" a certa categoria profissional, que constitui um aspecto estritamente pessoal incindivelmente ligado à pessoa do trabalhador, que se extingue por morte deste, não sendo objeto de sucessão (artigo 2025 do Código Civil). Apelou o Autor, que viu confirmada pela Relação do

Porto a decisão recorrida.

Inconformados, recorreram os Autores da revista, tendo assim concluído a sua alegação: a) No presente caso, não há qualquer divergência sobre a natureza do contrato de trabalho e sobre a qualificação deste como contrato "intuitu personae" e, por isso, sobre a sua insusceptibilidade de ser transmitida "ope legis" e "mortis causa" a posição contratual do "de cujus" para os seus

herdeiros. b) Os recorrentes vieram a juízo pedir a condenação do

Réu no pagamento de retribuições que não foram pagas e são devidas como contrapartida do trabalho prestado no

âmbito do contrato individual de trabalho entre o Réu e a falecida B. c) A B, muito antes de falecer e durante a vigência do seu contrato de trabalho, exigiu repetidamente e por vários modos as diferenças salariais em causa, tendo ela própria em vida contratado e dado poderes a um advogado para colocar o assunto em tribunal. d) O objecto do pedido são retribuições salariais vencidas e não pagas, tratando-se, por isso, de um direito de natureza económica. e) Não há fundamento jurídico para sustentar a tese de que, extinto o contrato individual de trabalho, não poderá "questionar-se mais qualquer dos seus aspectos", se com tal tese se pretende negar o direito aos herdeiros de reclamar diferenças salariais vencidas e não pagas. f) A morte inesperada e prematura da B ela não extinguiu o direito a tais retribuições. g) E, porque se trata de uma relação jurídica patrimonial, os herdeiros da B foram, por morte desta, chamados à respectiva titularidade, podendo, por isso, demandar o Réu. h) O recorrente A também alegou factos e normas jurídicas que fundamentam parte do pedido que diz respeito à sua própria pensão de sobrevivência. i) O que os recorrentes vieram discutir e pedir a tribunal, enquanto sucessores da falecida B, são relações jurídicas patrimoniais, que se integram

indiscutivelmente no objecto de sucessão (ver artigo 2024 do Código Civil), e não um contrato de trabalho ou qualquer outra relação jurídica "intuitu

personae", como conclui erradamente o acórdão sob recurso, subsumindo a questão no artigo 2025 do Código

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considerado que no caso em apreço os recorrentes pretendem discutir e pedir apenas quantias em dinheiro, o que se integra perfeitamente no âmbito do referido artigo 2024, e não pretenderam nem pretendem fazer valer qualquer direito que deva extinguir-se por morte da referida B, razão pela qual não tem aplicação o também citado artigo 2025 do Código Civil. l) Consequentemente, deve revogar-se o acórdão recorrido e julgar-se improcedente a excepção, ordenando-se a continuação do processo.

Na contra-alegação, o recorrido defende a confirmação do julgado.

A Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta, no douto parecer de folhas 132-4, entende que a revista deve ser concedida.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

O acórdão em recurso considerou provados os seguintes factos: 1) O Réu, em 6 de Março de 1991, admitiu ao seu serviço

B para trabalhar sob as suas ordens e mediante retribuição, tendo esta relação de trabalho durado até 1 de Agosto de 1992, data em que se verificou a

reforma da dita trabalhadora.

2) O Réu colocou a B, desde a sua admissão, na sua agência então chamada da Beira, em Moçambique, a qual aí trabalhou a até 31 de Dezembro de 1975, data em que veio para Portugal (Metrópole).

3) Em Moçambique, a B atendia o telefone.

4) Após o seu regresso à Metrópole, a B foi colocada na classe G-2. 5) A B faleceu no dia 8 de Dezembro de

1992.

6) O Autor era casado com a B.

7) As intervenientes C e D, nascidas, respectivamente, em 27 de Setembro de 1962 e 23 de

Agosto de 1963, são filhas do A e de B.

Discute-se no recurso tão só a questão de saber se o direito que os Autores afirmam ter-se constituído na esfera jurídica da sua falecida esposa e mãe, concretamente o decorrente de um nível salarial superior àquele com que a entidade patronal, durante certo período, remunerou a trabalhadora, se lhes transmitiu por via sucessória, certo que são eles os herdeiros da finada. Diga-se que o montante das diferenças da pensão que o

Autor reclama por direito próprio, é necessariamente determinado em função da retribuição que fosse devida à falecida esposa, dependendo assim do que for decidido relativamente à questão colocada atrás.

A tal questão, como se disse, responderam negativamente as instâncias, que consideraram inhereditáveis, por intimamente ligados à pessoa da falecida titular, os direitos peticionados na acção.

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"É, com efeito, inquestionável, que o contrato de trabalho é uma relação jurídica de natureza estritamente pessoal onde a qualidade da pessoa é essencial na decisão das partes em contratar. Assim, extingue-se tal relação por morte de trabalhador, não podendo ser objecto de sucessão. Pelo que, certos aspectos da mesma, designadamente como no caso dos autos, certa categoria profissional a que o "de cujus" deveria ter direito, determinado nível de vencimento, não podem ser questionados pelos seus sucessores.

Ora, o que os apelantes pretendem é precisamente questionar essa categoria, esse nível, direitos intimamente ligados à pessoa do "de cujus", e do seu

titular.

São, por isso, inereditáveis, por virtude da sua própria natureza, extinguindo-se à morte do respectivo titular" - fim da transcrição.

Como julgamos, esta argumentação, seguramente, não colhe.

Se é certo que a morte do trabalhador põe termo ao contrato de trabalho que o vinculava ao empregador - tornou-se em definitivo impossível a prestação da actividade que determinara a contratação, estando arredada a

transmissbilidade aos herdeiros da obrigação primeira em que o trabalhador ficou constituído, a prestação daquela actividade (artigo 1152 do Código Civil e 1 da LCT), com o que se afirma o "intuitu personae" que presidiu à contratação (ver Bernardo Lobo

Xavier, "Curso de Direito do Trabalho", páginas 296, e A.J. da Motta Veiga, "Lições de Direito do Trabalho",

6. edição, página 352) - não é menos certo que a relação jurídica de trabalho, nascida do contrato, não se esgota em aspectos pessoais, que se extinguem com a extinção do contrato.

A relação jurídica de trabalho é complexa, envolve componentes de diversa ordem implica direitos e obrigações de matrizes distintas.

Aliás, a definição de contrato de trabalho, se acentua a pessoalidade da

prestação a que o trabalhador se obrigou, também afirma de modo inequívoco a obrigação patrimonial assumida pelo empregador, de remunerar a actividade que o trabalhador põe à sua disposição.

E é esta posição credora do trabalhador que as instâncias esqueceram.

Com efeito, se é inquestionável que a falecida B deixou de poder desempenhar a sua actividade, e os seus herdeiros de poder reclamar direitos que

pressupunham o exercício daquela, ou a possibilidade de um tal exercício, isso não significa, de modo nenhum, que direitos de índole patrimonial nascidos da actividade que a trabalhadora havia desenvolvido, automaticamente se

extinguissem com a morte daquela.

Se, por exemplo a entidade patronal tivesse salários em atraso, julgamos que ninguém ousaria defender, apoiando-se no carácter pessoal do contrato de

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trabalho, que a morte do trabalhador desse credor levava à extinção do crédito, impossibilitando os herdeiros de cobrar as retribuições que estavam em dívida.

Decisivamente, a nosso ver, não se desenha em termos substancialmente diferentes a questão que surge colocada na acção: os herdeiros da

trabalhadora não querem mais do que ver reconhecido o crédito da falecida esposa e mãe, nascido de escalões ou níveis remuneratórios a que a

trabalhadora devia ter ascendido a partir de 1977, e a que a entidade patronal não fez ascender, remunerando-a a partir de então com base em níveis

inferiores.

Trata-se de um crédito pecuniário reportado ao trabalho que foi prestado em certo período, que a trabalhadora bem podia ter reclamado; e a tê-lo feito, o falecimento da Autora na pendência da causa jamais podia levar à extinção da instância por inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide - julgamos ser esta uma conclusão incontroversa.

Por a acção ter sido proposta pelos herdeiros, a solução não pode ser diversa: eles querem obter a condenação da entidade patronal a pagar o que

consideram que era devido à falecida, certo montante em dinheiro, e só isso -desconsideramos agora o que respeita às diferenças da pensão pedidas pelo A. -, pelo que carece de sentido invocar relações de carácter estritamente

pessoal nascidas do contrato de trabalho para negar o crédito reclamado. Trata-se de um direito de conteúdo patrimonial, de sua natureza não

extinguível por morte do respectivo titular, e que a lei não fez extinguir (artigo 2025 n. 1 do Código Civil), estando excluída a hipótese da renúncia que o n. 2 do preceito contempla.

Integra, pois, a herança da falecida, a cuja sucessão a lei chama os Autores -artigos 2024 e 2133 n. 1 aínea a) do Código Civil.

Termos em que se concede a revista, revogando-se o acórdão recorrido, devendo os autos prosseguir em ordem ao conhecimento do mérito do que se mostra pedido.

Custas pelo recorrido.

Lisboa, 26 de Novembro de 1997 Manuela Pereira,

Almeida Deveza, Couto Mendonça.

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