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A necessidade de bem-estar na sociedade contemporânea: os procedimentos de gastroplastia e a judicialização do direito à saúde

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Academic year: 2021

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

MARIANA BERTOLDO DORNELES

A NECESSIDADE DE BEM-ESTAR NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA: OS PROCEDIMENTOS DE GASTROPLASTIA E A JUDICIALIZAÇÃO

DO DIREITO À SAÚDE

Ijuí (RS) 2018

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MARIANA BERTOLDO DORNELES

A NECESSIDADE DE BEM-ESTAR NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA: OS PROCEDIMENTOS DE GASTROPLASTIA E A JUDICIALIZAÇÃO

DO DIREITO À SAÚDE

Trabalho de Conclusão do curso de Graduação em Direito, objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso – TCC.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: Dra. Anna Paula Bagetti Zeifert

Ijuí (RS) 2018

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edico este estudo à minha família, pelo incentivo, apoio e confiança em mim depositados durante toda a minha jornada acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, acima de tudo, pela vida, força e coragem. Aos meus pais, pela paciência e dedicação, contribuindo diretamente para que eu pudesse cursar e concluir o Ensino Superior.

À minha grande amiga, Nadine Lang, pelo incentivo nos estudos jurídicos e pelo amor à profissão.

À minha orientadora, doutora Anna Zeifert, pela presteza, seriedade e inteligência com que orientou e enriqueceu este trabalho.

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“Todo mundo tem direito ao erro, mas nem todo mundo tem uma segunda chance.”

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RESUMO

Este Trabalho de Conclusão de Curso explora a saúde como direito fundamental assegurado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, considerando a questão do bem-estar social e enfatizando os princípios da dignidade da pessoa humana, isonomia e mínimo existencial. Embora o direito à saúde seja fundamental, o número de casos que chegam ao Poder Judiciário em busca da sua concretização está em constante crescimento, tendo em vista a falta de efetividade no contexto administrativo. O enfoque central da pesquisa baseia-se nos casos de obesidade, considerada uma questão de saúde pública, uma vez que impossibilita o indivíduo que está acima do peso a ter uma vida digna, não havendo alternativa para muitos casos a não ser a intervenção cirúrgica para, finalmente, ter direito ao bem-estar e à qualidade de vida. Portanto, o trabalho não visa àqueles que buscam os procedimentos de gastroplastia por meras questões estéticas. Direciona também a análise de casos concretos junto ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Por fim, a pesquisa conclui que a criação de programas educacionais e preventivos, e o devido estudo dos problemas sociais atinentes à origem dessa questão, melhoraria a qualidade de vida das pessoas e, consequentemente, o Judiciário não precisaria ser acionado, dado que, a intervenção cirúrgica deve ser vista como última solução para a busca de bem-estar.

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ABSTRACT

This Course Conclusion Work explores health as a fundamental right guaranteed by the Constitution of the Federative Republic of Brazil of 1988, considering the issue of social welfare and emphasizing the principles of the dignity of the human person, isonomy and existential minimum. Although the right to health is fundamental, the number of cases that reach the Judiciary Branch in search of its implementation is constantly increasing, given the lack of effectiveness in the administrative context. The central focus of the research is based on the cases of obesity, considered a public health issue, since it makes it impossible for the overweight individual to have a decent life, and there is no alternative for many cases other than surgical intervention for, finally, have the right to well-being and quality of life. Therefore, the work is not aimed at those who seek the procedures of aesthetic gastroplasty. Finally, after the research it was possible to conclude that the creation of educational and preventive programs, and due study of the social problems related to the origin of this question , would improve people's quality of life and, consequently, the judiciary would not have to be triggered, since surgical intervention should be seen as the ultimate solution to the search for well-being.

Key words: Welfare. Dignity of the human person. Gastroplasty. Obesity. Health.

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LISTA DAS FIGURAS

Figura 1. Causas da obesidade ... 14

Figura 2. Consequências da obesidade infantil ... 15

Figura 3. Evolução da frequência de obesidade no Brasil entre crianças e adolescentes ... 15

Figura 4. Indicações da cirurgia bariátrica ... 30

Figura 5. O maior problema de saúde pública do planeta ... 33

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9

1 DIREITO À SAUDE: TRAJETÓRIA DE RECONHECIMENTO ... 12

1.1 Conceito de saúde e bem-estar ... 12

1.2 A saúde como um direito humano fundamental: a proteção internacional à saúde e a Constituição Federal de 1988 ... 16

1.3 Relação entre o direito à saúde e os princípios do mínimo existencial e reserva do possível ... 20

2 DIREITO À SAÚDE E AO BEM-ESTAR: A JUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE E OS PROCEDIMENTOS DE GASTROPLASTIA ... 25

2.1 Acesso à saúde pelo Sistema Único de Saúde (SUS) como garantia de bem-estar ... 26

2.2 O procedimento de gastroplastia: necessidade x estética?... 30

2.3 A judicialização do direito à saúde nos procedimentos de gastroplastia ... 33

CONCLUSÃO ... 40

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INTRODUÇÃO

As constantes e inegáveis evoluções da sociedade refletem a necessidade de novas interpretações do Direito. A inflação legislativa e a constante busca pela efetivação de direitos postos acabam por resultar em novas perspectivas para a coletividade, pois não seria razoável que um Estado Democrático de Direito mantivesse a concepção imutável de preceitos. Por tal razão, com o passar dos anos, muitos assuntos são reavaliados, reinterpretados e remodelados a fim de atender as demandas dos cidadãos.

No contexto dessas constantes mudanças e novas análises, o direito à saúde tem destaque, haja vista as evoluções tecnológicas e descobertas que afetam diretamente a vida humana. De tal forma, o direito à saúde não pode ficar petrificado em conceitos e abrangências que não acompanham o crescimento e progresso social.

Nesse ínterim, a saúde é um direito que vem sendo tratado de maneira inovadora na atual Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88), que destinou um capítulo específico para abordar a questão, o que nenhum outro diploma havia feito até então. A partir do art. 196, a Carta Magna dispôs a saúde como direito para todos e dever do Estado, sendo de acesso universal e igualitário, e previu políticas sociais e econômicas para a redução de riscos, além da sua promoção, proteção e recuperação. Dispôs, inclusive, sobre o progressista e ímpar Sistema Único de Saúde (SUS) e suas competências.

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Ocorre que, por vezes, por mais que haja, formalmente, um sistema completo, amplo e universal para dar conta das demandas de saúde, o Poder Público impõe obstáculos para aquilo que deveria ser eficaz e prático. Nesse sentido, quando direitos básicos, como a saúde, são negados em âmbito administrativo, a ultima ratio é acionar o Poder Judiciário para que, mediante exaustão probatória, dispêndio de recursos financeiros e de tempo, seja contemplada a efetivação de direitos básicos do cidadão.

A saúde é uma necessidade básica da existência do ser humano, e o Estado se comprometeu a garanti-la, sendo, portanto, um direito subjetivo. A análise da questão, contudo, não se restringe a questões relativas à prevenção ou tratamento de doenças. Com a inflação de diversos direitos, a expansão da sua interpretação e as mutações constantes da sociedade, é necessário analisar a saúde em seus diversos aspectos, o que é uma questão não só de direito básico mas, também, de bem-estar, presente em diversos setores do corpo social. O bem estar de uma sociedade reflete positivamente em diversos setores de um país, não podendo ser tratada apenas reflexa e secundariamente. De nada adianta uma Constituição completa, com diversos direitos consagrados, se a sua efetivação não se faz presente no meio social, e o bem geral, tão almejado, não é alcançado. Nessa lógica, a questão da obesidade é um dos novos, grandes e crescentes problemas da população mundial, e vem sendo tratada secundariamente, recebendo apenas uma atenção remota.

A população acima do peso cresceu notoriamente, muito em razão da qualidade de vida das pessoas, da falta de tempo, da má alimentação aliada à falta de atenção e informação para problemas atinentes à obesidade, o que faz com que o sobrepeso não seja tratado com a devida preocupação.

Em razão dos alarmantes dados sobre o crescimento da população obesa, que implicam diretamente no bem-estar do indivíduo no contexto social em que se encontra inserido, tem-se um novo problema de saúde pública. As pessoas portadoras de obesidade mórbida, por exemplo, não conseguem realizar diversas atividades simples e rotineiras, banais para qualquer pessoa dentro de padrões aceitáveis de Índice de Massa Corporal (IMC). Ocorre que o problema, muitas vezes, é visto como questão estética e puramente superficial, não tendo, por essa razão, nenhum tipo de atenção especial.

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Inegavelmente, na atual sociedade a obesidade acarreta consequências tão graves e irreversíveis que, para determinados casos, não existe outra saída a não ser as intervenções cirúrgicas. É nesse momento que o direito à saúde encontra barreiras, pois ao não receberem atendimento adequado para as suas necessidades, e encontrarem omissão estatal relativa a informações e políticas públicas práticas e efetivas para a questão, as pessoas acorrem ao sistema público de saúde. Corriqueiramente, pedidos administrativos são negados, e como última alternativa, buscam o Poder Judiciário para a consecução de preceitos. Todo esse caminho de frustrações, negativas administrativas, gastos, tempo despendido, poderia ser evitado com políticas que iniciem no nascedouro do problema, tratando-se primeiro a causa, de modo que se evite a consequência. As pessoas carentes de recursos financeiros (a maioria da população brasileira) estão inseridas nesse contexto, pois não conseguem ter os seus pedidos deferidos pelo Sistema Único de Saúde, visto que tratamentos cirúrgicos da obesidade têm valor muito alto.

Nesse sentido, a saúde, que se apresenta como direito subjetivo, não tem efetividade universal quando se fala em tratamentos para a obesidade, sejam eles de diagnóstico ou prognóstico, o que resulta na péssima qualidade de vida para pessoas que têm obesidade, pelo fato de existirem poucas alternativas para a resolução do problema.

A presente pesquisa analisa o atual problema da obesidade como questão de saúde pública, e busca o entendimento acerca da efetiva necessidade de o cidadão com sobrepeso ter acesso aos procedimentos de gastroplastia, seja para conhecer o seu real motivo, as mudanças que proporciona na vida, o bem-estar e os aspectos práticos da questão. O estudo também apresenta uma análise jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul quanto à judicialização de tais procedimentos, uma vez que a esfera administrativa não se mostra eficaz para as demandas da sociedade, cada vez mais presentes.

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1 DIREITO À SAUDE: TRAJETÓRIA DE RECONHECIMENTO

A saúde é um direito social fundamental, estritamente ligada ao direito à vida e à dignidade do ser humano. Embora desde os primórdios já se buscasse o seu reconhecimento, foi somente a partir da promulgação da atual Carta Magna que a saúde foi devidamente reconhecida como um direito fundamental.

Nas palavras de Germano André Doederlein Schwartz (2001, p. 173), “A saúde aparece como meio de vida, um instrumento a serviço da vida. Somente esse argumento já seria o bastante para justificar a necessidade da efetivação do direito à saúde.” Janaína Machado Sturza e Maria Cristina Schneider Lucion (2017) complementam que “a saúde pode ser considerada como um bem comum a todos, como um direito social fundamental necessário à manutenção da vida [...].”

Até um passado recente, a saúde era entendida tão somente como a ausência de doenças, todavia, tal entendimento já está devidamente ultrapassado, pois a saúde engloba condições de vida que possibilitem o bem-estar, seja físico, mental ou social.

1.1 Conceito de saúde e bem-estar

A saúde vai muito além da ausência de doenças, ela se estende a fatores que oportunizam o bem-estar humano. Nesse sentido, o preâmbulo da Constituição da Organização Mundial de Saúde (OMS, 1946) dispõe que:

A saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade. Gozar do melhor estado de saúde que é possível atingir constitui um dos direitos fundamentais de todo o ser humano,

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sem distinção de raça, de religião, de credo político, de condição econômica ou social. A saúde de todos os povos é essencial para conseguir a paz e a segurança e depende da mais estreita cooperação dos indivíduos e dos Estados.

Nesse ínterim, a saúde não pode ser discutida apenas sob o aspecto da funcionalidade do organismo humano, visto que a acepção envolve muito mais que isso. O bem-estar físico está ligado também ao bem-estar mental. O corpo e a mente funcionam concomitantemente e, em consequência, há indubitável importância no atingimento do bem-estar social ligado à saúde de maneira ampla.

Para Ieda Tatiana Cury (2005, p. 42), “A saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença de enfermidade.” Complementa em seguida que: “Gozar do melhor estado de saúde que é possível atingir constitui um dos direitos fundamentais de todo o ser humano, sem distinção de raça, de religião, de credo político, de condição econômica ou social.”

A saúde e o bem-estar humano estão diretamente interligados, e existem inúmeros impactos causados na saúde do ser humano que atingem diversas esferas da vida, que não aquela individual pensada inicialmente. Qualidade de vida, portanto, não diz respeito apenas ao indivíduo em sua singularidade, mas se refere também a questões de sociabilidade, de convivência, de trabalho e de relacionamentos.

Quando a saúde é negativamente atingida, há reflexo nas demais órbitas da vida, seja de forma direta ou indireta. A obesidade, por exemplo, pode levar a inúmeras dificuldades, como de locomoção, para conseguir um emprego ou para aproveitar os momentos de lazer. Indivíduos acometidos por obesidade mórbida, por exemplo, possuem inúmeros problemas, sejam eles de saúde, como hipertensão, dificuldades ao andar, levantar, fazer tarefas simples, ou inerentes à vida em sociedade, como conseguir emprego e formar uma família.

É importante salientar que a alimentação saudável é um direito humano fundamental, com previsão legal a partir da Emenda Constitucional nº 64, que incluiu a alimentação entre os direitos sociais fixados no art. 6º da CF/88. Para Renato Luiz Abreu Machado (2018):

O Direito Humano à alimentação adequada tem duas dimensões: o direito de estar livre da fome e o direito à alimentação adequada. A realização dessas duas dimensões é de crucial importância para a fruição de todos os direitos humanos. Os principais conceitos empregados na definição de Direito Humano à alimentação adequada são disponibilidade de alimentos, adequação, acessibilidade e estabilidade

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do acesso a alimentos produzidos e consumidos de forma soberana, sustentável, digna e emancipatória.

O hábito da alimentação saudável deve iniciar na infância, sendo fundamental para evitar o sobrepeso na idade adulta. O site eletrônico Colégio Ecologia (2018) confirma que:

Manter uma alimentação saudável nessa fase da vida, é garantia de um desenvolvimento físico e intelectual mais saudável. Por isso, ao consumir os alimentos certos nessa fase é possível prevenir uma séria de problemas comuns da infância como a desnutrição, anemia, obesidade, entre muitos outros.

Conforme exemplificado a seguir, a principal causa para a obesidade é o consumo de alimentos não saudáveis aliado à falta de atividade física, o que acarreta inúmeras consequências negativas para a criança (Figura 1).

Figura 1. Causas da obesidade

Fonte: News em Cima da Hora (2018).

A atual geração é rodeada de alimentos que não trazem benefício à saúde, pelo contrário, acarretam inúmeras doenças, como é o caso da pizza, hambúrguer, hot dog, batata frita, entre outros (Figura 2).

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Figura 2. Consequências da obesidade infantil

Fonte: Comida Boa Muda Tudo (2018).

O site G1 Pará publicou uma matéria no ano de 2014 que procurou chamar a atenção do público, intitulada Alimentação saudável na infância evita doenças futuras. Em seguida, destacou que “Hábitos alimentares são formados desde a gestação. Mesmo com pouco tempo, pais devem acompanhar o que as crianças comem em casa e na escola.”

O cenário brasileiro traz um alerta às pessoas, uma vez que a obesidade infantil está numa crescente desenfreada, colocando em risco a saúde tanto na fase pueril quanto na fase adulta. A Figura 3, a seguir, demonstra dados desse crescimento:

Figura 3. Evolução da frequência de obesidade no Brasil entre crianças e adolescentes

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Estudo de Paola Ferreira (2016), publicado no site eletrônico do Jornal Ponto de Partida (2018), revelou que diversos problemas de saúde que atingem as crianças estão ligados à obesidade infantil, sendo reflexo de uma vida sedentária em que exercícios físicos não são priorizados em vista das novidades tecnológicas, que são bem mais atrativas:

A obesidade infantil está relacionada a várias complicações, tais como colesterol alto, diabetes, hipertensão arterial, problemas de colesterol e triglicérides, assim como também a uma maior taxa de mortalidade. O surgimento destas doenças na infância se relaciona à falta de exercício físico, pois, normalmente as crianças preferem ficar assistindo televisão, no computador ou no celular.

A obesidade está afetando cada vez mais cedo as crianças, como revela a Figura 3. Os dados alarmantes fizeram com que o país tomasse medidas para evitar o crescimento desse grave problema, como refere o site eletrônico da ONU Brasil (2018):

Para combater a obesidade e o sobrepeso, o Brasil assumiu compromissos consideráveis no âmbito da Década de Ação das Nações Unidas para a Nutrição. São eles: deter o crescimento da obesidade na população adulta por meio de políticas de saúde e segurança alimentar e nutricional; reduzir o consumo regular de refrigerante e suco artificial em pelo menos 30% na população adulta; e ampliar em, no mínimo, 17,8% o percentual de adultos que consomem frutas e hortaliças regularmente. A expectativa é cumprir essas metas até 2019.

A saúde e o bem-estar, portanto, caminham concomitantemente, e a saúde não pode ser preservada somente quando há doença. Nesse sentido, o Estado deve promover Políticas Públicas para evitar que alguma doença atinja o cidadão, promovendo o bem-estar a todos para garantir uma melhor qualidade de vida.

1.2 A saúde como um direito humano fundamental: a proteção internacional à saúde e a Constituição Federal de 1988

A saúde é direito fundamental garantido a todos os cidadãos. O Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (ONU, 1966) dispõe no seu art. 12 que:

1. Os Estados Partes do presente Pacto reconhecem o direito de toda pessoa de desfrutar o mais elevado nível possível de saúde física e mental.

2. As medidas que os Estados Partes do presente Pacto deverão adotar com o fim de assegurar o pleno exercício desse direito incluirão as medidas que se façam necessárias para assegurar:

a) A diminuição da mortinatalidade e da mortalidade infantil, bem como o desenvolvimento das crianças;

b) A melhoria de todos os aspectos de higiene do trabalho e do meio ambiente; c) A prevenção e o tratamento das doenças epidêmicas, endêmicas, profissionais

e outras, bem como a luta contra essas doenças;

d) A criação de condições que assegurem a todos assistência médica e serviços médicos em caso de enfermidade.

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No entendimento de Naiara Michele Butsch (2018), as organizações internacionais

[...] possuem um papel de extrema importância no cenário mundial. Essas organizações são formadas por Estados-membros, que juntos cooperam objetivando um resultado pré-definido, possuem também uma estrutura e um regimento interno próprio. Em suma, são dotadas de personalidade jurídica própria e são autônomas. Existe hoje, uma organização internacional destinada a amparar a saúde, conhecida como a Organização Mundial da Saúde (OMS) ou World Health Organization (WHO), em inglês. Como já sabido, possui suas origens ligadas ao pós-guerra, quando o cenário avistado era de fome, miséria, desamparo, medo e doenças. Objetivando evitar novos conflitos e estabelecer a paz mundial criou-se as Nações Unidas e esta deu origem ao Comitê de Higiene, este considerado o embrião da OMS.

Na seara brasileira, o direito à saúde está contido na Carta Maior. Anterior ao efetivo reconhecimento desse direito fundamental, o entendimento de saúde se restringia à “ausência de doença”. E, embora seja um direito público subjetivo e indispensável, assegurado a todas as pessoas, independentemente de cor, raça, classe social, foi somente a CF/88 que incluiu expressamente um título específico para o tema. Nesse sentindo afirma Simone Letícia Severo e Sousa (2015, p. 58):

O Brasil teve sete Constituições. As Constituições brasileiras anteriores a 1988 não garantiam o direito à saúde. No máximo, cabia ao Estado cuidar da assistência pública e da prestação de assistência médica e hospitalar ao trabalhador filiado ao regime previdenciário. A garantia do direito à saúde ao cidadão só apareceu 40 anos após a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Cumpre destacar que antes de 1988 foi a classe operária quem buscou melhores condições de trabalho. Como era de grande necessidade e interesse do Estado que a classe trabalhadora cumprisse com suas tarefas para melhorar a produção, foram atendidos os seus pedidos, contudo, o direito à saúde não abrangia toda a sociedade, conforme aduz Carlos Alexandre Amorim Leite (2014, p. 107):

No entanto, verifica-se que a questão da saúde estava atrelada a uma específica classe social que é a operária, todos aqueles que não contribuíssem com o trabalho não tinham direito a qualquer proteção de saúde. Tal situação refletiu na realidade brasileira, pois as Constituições anteriores a 1988 não traziam qualquer garantia de saúde para os não trabalhadores.

A preocupação dos industriários, portanto, era relativa ao fato de o trabalhador ficar acometido por alguma patologia, ou até mesmo se ausentar da produção, o que diminuiria os seus rendimentos e, consequentemente, acarretaria enormes prejuízos.

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A partir de 1988 diversos aspectos foram alterados e outros reconhecidos pelo Estado. A promulgação da CF/88 efetivou diversos direitos importantíssimos para o crescimento econômico e social do país, e um deles foi o reconhecimento da saúde a todos os cidadãos.

O direito à saúde está expresso na CF/88, no capítulo II destinado à Ordem Social. No seu art. 6º estão estabelecidos os direitos sociais fundamentais, como a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância.

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL, 2018, grifo nosso).

Mais especificamente, é a partir do art. 196 que consta o reconhecimento da saúde como direito de todos e dever do Estado, garantido por meio de políticas sociais e econômicas que visam à redução de doenças e de outros problemas, bem como o acesso universal e igualitário às ações para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (BRASIL, 2018).

O artigo supramencionado usa as expressões “redução do risco de doença”, “promoção”, “proteção” e “recuperação”, cujas expressões são explicadas por Schwartz (2001, p. 27):

Quando fala em “recuperação”, a CF/88 está conectada ao que se convencionou chamar de saúde “curativa”; os termos “redução do risco de doença” e “proteção” estão claramente ligados à saúde “preventiva”, e a “promoção” é a qualidade de vida, posteriormente explicitada pelo art. 225 da Carta Magna.

Não obstante, a Lei n° 8.080/1990, em seu art. 2º, dispõe o seguinte: “A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.” Ainda nesse sentindo, o art. 25, § 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, também preceitua que:

Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família a saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e

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os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. (ONU, 1948).

Claro está, portanto, que a saúde é direito de extrema importância que deve ser garantido a todo ser humano, sendo função do Estado o cuidado para bem-estar para com sua população. Interessante destacar o posicionamento do doutrinador Leite (2014, p. 106) acerca do tema:

O direito à saúde, cerne do presente trabalho, faz parte da relação de direitos sociais essenciais ao homem, juntamente com a educação, alimentação, trabalho e moradia. De fato, o ser humano sem acesso a bens e serviços básicos de saúde encontra-se desamparado pelo Estado e por seus semelhantes, ao não se permitir o seu desenvolvimento pleno como pessoa e cidadão, pois não há condições de autodeterminação sem garantia e efetivação do direito fundamental social à saúde. Assim, o homem necessita do real cumprimento pelo Estado dos deveres de defesa, proteção e promoção da saúde, com a participação do setor privado nessa seara, pois sem a oferta de condições elementares de salubridade (p. e., saneamento básico), medidas preventivas de manutenção de uma vida saudável (p. e., vacinação), bem como bens e serviços com o objetivo curativo (p. e., medicamentos e procedimentos médicos), não pode o indivíduo guiar a sua própria vida nem prover a sua família.

Os textos relacionados à saúde, mais precisamente os arts. 196 a 200 da CF/88, revelam a preocupação dos constituintes com a prevenção e o bem-estar dos cidadãos, dispondo que as políticas sociais devem visar à redução de riscos de patologias, além de idealizar a proteção e recuperação, a fim de evitar doenças e outros agravos.

Nota-se, portanto, que o direito à saúde está intrinsicamente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana, explicitamente previsto no art. 1º, inc. III da CF/88, visto que todo ser humano tem o direito de viver dignamente e, para isso, o Estado deve disponibilizar todos os meios para tanto. Noutro viés, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, no seu art. 1º, reconhece a dignidade da pessoa humana: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.” (ONU, 1948).

A esse respeito se manifesta Sousa (2015, p. 70), ao afirmar que: “O direito à saúde encontra-se na base do princípio da dignidade da pessoa humana, figura entre os direitos fundamentais e está positivado como direito público subjetivo.” Nesse sentido, é dever do Estado assegurar à população o acesso à saúde, observando o princípio da dignidade da pessoa humana e o próprio direito à vida. Isso significa que todas as pessoas possuem direito a uma vida digna, de qualidade e igualitária.

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Não obstante, no contexto dos direitos fundamentais, os princípios supracitados se relacionam à ideia do mínimo existencial. Suscintamente, explica-se o mínimo existencial como sendo o mínimo de condições básicas a uma vida digna.

1.3 Relação entre o direito à saúde e os princípios do mínimo existencial e reserva do possível

Estudos estabelecem que o Estado deve realizar prestações que favoreçam a sociedade mediante a criação de direitos que assegurem o bem-estar do cidadão, como educação, saúde, segurança, trabalho, etc.

Inúmeras vezes, porém, confunde-se o mínimo para existência com o mínimo vital. O mínimo vital, também conhecido como mínimo de subsistência, pode ser dividido em mínimo fisiológico e mínimo sociocultural. O primeiro compreende as condições materiais mínimas, como prestações básicas de alimentação, vestimenta, abrigo, saúde, entre outros. Já o segundo objetiva assegurar ao indivíduo um mínimo de inserção na vida social e cultural da sociedade.

Mais do que condições vitais e elementares para a sobrevivência, Ingo Wolfgang Sarlet e Mariana Filchtiner Figueiredo (2008) expressam que o princípio do mínimo existencial estabelece que a “garantia efetiva de uma existência digna abrange mais do que a garantia da mera sobrevivência física, situando-se, portanto, além do limite da pobreza absoluta.” Em outras palavras, o mínimo existencial tutela uma vida minimamente digna para qualquer ser humano viver, mas não apenas aquilo limitado ao fato de sobreviver acima da pobreza absoluta, mas sim uma garantia mínima de dignidade humana assegurada, tendo em vista todos os preceitos assegurados pela Carta Magna.

No entendimento de Karine da Silva Cordeiro (2012, p. 120):

Há de se garantir, em suma, um standard de vida que corresponda às exigências do princípio da dignidade da pessoa humana. Atingindo esse padrão, certamente estarão atendidas as condições materiais necessárias para que os indivíduos entendam e sejam capazes de exercer plenamente os direitos e liberdades fundamentais.

Logo, quando se fala em mínimo existencial pensa-se nas garantias como moradia, saúde, educação, alimentação, entre outros. A Carta Maior, no seu art. 6º, menciona diversos

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direitos que constituem o mínimo para o ser humano, no intuito de que a pessoa tenha uma vida digna. A fim de complementar esse pensamento, insta mencionar o que refere Ronei Danielli (2017, p. 85):

[...] Compreende papel dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário a concretização dos direitos fundamentais na maior extensão possível, observado como parâmetro mínimo o núcleo essencial desses direitos – a dignidade humana, doravante sintetizado como mínimo existencial.

Cordeiro (2012, p. 107) se posiciona a respeito, afirmando que:

[...] a doutrina mais abalizada vem enfatizando que o mínimo existencial, decorre, também, da proteção à vida e se apresenta como exigência da dignidade da pessoa humana, implicando, consoante o conceito de dignidade anteriormente citado, um completo de direitos fundamentais que garanta a todos as condições existenciais mínimas para uma vida saudável e que lhes propicie a participação ativa nos destinos da própria existência e da vida em sociedade.

Para Leite (2014, p. 83), o mínimo existencial apresenta-se como um dos melhores modelos de garantia dos direitos prestacionais sociais, pois

[...] se trata da menor medida de cada um destes direitos a ser realizada para a satisfação do homem, seja sob uma face mais contida (existencial) ou mais ampla (social), o que acarreta uma maior proteção ao seu conteúdo diante de potenciais restrições. Ademais, aumenta-se a obrigação do Estado em seu implemento, além de diminuir sensivelmente os efeitos de reserva do possível neste domínio, a casos de escassez severa de recursos ou apenas como uma determinante da escolha de opções sociais mais relevantes e racionais. Todavia, não se pode esquecer de outros importantes instrumentos ou métodos de garantia dos direitos sociais a prestações, a exemplo da ponderação de princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Não se pode, contudo, generalizar as necessidades básicas de forma estrita e fechada, eis que devem ser analisadas de acordo com cada grupo, pelas diferentes sociedades, e suprir as necessidades com as especificidades de cada local. Segundo palavras de Cordeiro (2012, p. 125), tem-se que:

[...] Como decorrência, o mínimo existencial deve contemplar os meios que assegurem aos indivíduos, no contexto da sociedade em que vivem, essas capacidades, ou seja, que lhes propiciem realizar, caso assim o desejem, as funcionalidades correspondentes. A especificação das medidas e prestações aptas a tanto deve ser determinada em concreto, ponderando todas as contingências envolvidas, como as condições pessoais e fatores econômicos, sociais, culturais e até geográficos, na medida em que as prestações adequadas para assegurar as capacidades básicas de um indivíduo nem sempre asseguram as de outro, muito embora as capacidades que definem uma vida digna sejam as mesmas em qualquer sociedade.

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Nesse ínterim, compreende-se que garantir o direito à saúde e à própria vida não se resume apenas em preservar um mínimo para sobrevivência. O indivíduo tem o direito de ter assegurados os seus direitos sociais para que seja possível o desenvolvimento de uma sociedade justa e igualitária, cada vez mais distante de desigualdades sociais e regionais, como preza a Carta Magna, em seu art. 3º. Schwartz (2001, p. 147) se posiciona de forma clara acerca da falta de efetivação do direito à saúde no Brasil:

Há um flagrante desrespeito e uma facciosa não aplicação do art. 196 da CF/88, o direito à saúde como dever do Estado e direitos de todos. Como direito social e processo sistêmico que é, a saúde depende de ação positiva estatal, de um Estado Intervencionista em sua mínima complexidade – garantidor da vida –, esbarrando em sistemas sociais jurídicos, burocráticos, econômicos, políticos, entre outros, para sua efetivação, bem como das próprias decisões derivadas de ditos sistemas

Schwartz (2001, p. 147) complementa em outro parágrafo: “Por motivos vários, os recursos destinados à saúde são insuficientes para atender à demanda da população. Os governos optam pelo ajuste das contas públicas em detrimento dos gastos sociais.”

Nesse contexto, para assegurar os direitos sociais, econômicos e culturais, faz-se necessário um dispêndio financeiro, o que torna a efetivação desses direitos mais difíceis, visto que o Estado tem recursos limitados. Conforme Leite (2014, p. 28): “No entanto, o financeiramente possível sob o viés fático não é apenas um obstáculo à realização dos direitos sociais, mas também representa um limite à concretização dos direitos de liberdade.”

A Carta Maior também estabelece que os poderes devem garantir e efetivar os direitos sociais, pois são um compromisso jurídico-político, e dependem de diversas circunstâncias, especialmente da disponibilidade financeira. Pelo fato de o Estado, muitas vezes, não cumprir com seu papel de garantia de direitos, faz-se necessária a busca pela solução com ajuda do Poder Judiciário. Mostra-se, portanto, cada vez mais notória a judicialização de causas envolvendo a saúde, haja vista a inefetividade da consecução de direitos pela via do Poder Executivo.

Ocorre que, por vezes, quando o indivíduo aciona o Poder Judiciário, por já não ter conseguido a tutela necessária pela via administrativa, o Poder Público também se esquiva de efetivar o direito do cidadão sob a alegação de insuficiência de recursos, por via da aplicação

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do famigerado princípio da reserva do possível (ou princípio da reserva de consistência) para casos envolvendo a saúde. Nesse sentido, o Exame da OAB (2018) se manifesta:

O princípio da reserva do possível regulamenta a possibilidade e a abrangência da atuação do Estado no que diz respeito ao cumprimento de alguns direitos, como os direitos sociais, subordinando a existência de recursos públicos disponíveis à atuação do Estado. Portanto, a efetivação dos direitos sociais está vinculada às possibilidades financeiras do Estado.

Assim, em inúmeras situações, quando o Poder Público é acionado para garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, especialmente no que tange à saúde, a argumentação gira em torno da escassez ou limitação de recursos, os quais não podem ser dispendidos para atender tais demandas.

Frisa-se que num Estado Democrático de Direito não se podem negar direitos fundamentais aos cidadãos sob a alegação de carência de recursos. O direito à saúde é, como todo exposto, direito subjetivo e fundamental do indivíduo, devendo ser a ele garantido o mínimo para viver com dignidade de acordo com suas necessidades, e observados todos os direitos sociais consignados pela Carta Magna.

Ainda que tenha havido ampliação da proteção dos direitos fundamentais em diversos sentidos, o Estado não pode simplesmente alegar que não há recursos para suprir as necessidades mínimas dos cidadãos. É nesse viés que o mínimo existencial deve prevalecer sobre a reserva do possível, numa ótica de ponderação de interesses, pois quando se trata de direito fundamental, o mesmo deve ter a maior relevância possível. Nesse sentido se manifesta Suélen Pereira Coutinho do Nascimento (2018):

Assim, aponta-se que a partir do momento em que o Estado não oferece condições mínimas para que sejam concretizados os direitos “mínimos existenciais”, ele não está dando o devido valor aos princípios basilares do nosso Estado Democrático, os quais são os princípios mestres do presente tema: Direito à Vida e Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Ademais, é dever do Estado preservar a vida e garantir os direitos que são assegurados constitucionalmente a todo cidadão. Nas palavras de Eduardo Fochesatto (2018):

A saúde e a vida estão extremamente próximas e ligadas. Por essa posição de supremacia ao lado do direito à vida humanamente digna é que a saúde se revela o mais importante dos direitos expostos no artigo 6º da Lei Maior, constituindo, indubitavelmente, o mínimo existencial à saúde.

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Não se mostra razoável a alegação do Estado que afirma não ter recursos para bancar pedidos fundamentados no direito à saúde, pois é preciso respeitar os princípios e os fundamentos que garantem a todo o ser humano uma vida digna para viver, ou seja, o mínimo existencial.

Os direitos fundamentais previstos na CF/88 não estão elencados de forma aleatória, e sim, porque são essenciais ao ser humano e estão sintonizados com os princípios basilares. Para Fochesatto (2018):

Não havendo o mínimo necessário para sua existência, encerra a possibilidade de sobrevivência do homem. O princípio da dignidade da pessoa humana e suas condições de existência não podem estar abaixo de um mínimo, do qual nem mesmo detentos, pessoas de baixa renda e até mesmo doentes mentais podem ser privados

A consecução de direitos tão basilares para a sobrevivência possibilitaria o desenvolvimento do papel social com vistas a uma sociedade justa e igualitária, como preconiza a Carta Maior. Consequentemente, os direitos fundamentais, justamente por serem o fundamento da vida humana, deveriam ser assegurados pelo Estado que, como já muito frisado, tem a obrigação de garanti-los.

Caso as funções de implementar políticas públicas estejam sob competência do Poder Executivo e Legislativo, não há outra saída a não ser provocar o Poder Judiciário para que se faça valer, por via da coerção, garantindo os direitos que são negados pelas outras esferas. Destarte, nos casos de omissão dos outros Poderes, em que há o comprometimento do Direito, seja individual ou coletivo, o Judiciário deve intervir.

É devido à falta de eficiência na prestação do serviço básico de saúde por parte dos poderes públicos que a cada dia aumenta o número de demandas judiciais em busca do direito à saúde, principalmente quando se trata da obesidade. A sociedade contemporânea criou um estereótipo de “corpo ideal” e não raras vezes acredita-se que os procedimentos de gastroplastia possuem o objetivo de inserir aqueles com sobrepeso nesse estereótipo de pessoas “magras”.

O que ocorre é que as cirurgias bariátricas têm como principal enfoque o bem-estar e a qualidade de vida das pessoas acima do peso. É por isso que o Estado tem papel fundamental na concretização desses procedimentos, pois não se trata de questões meramente estéticas, mas sim de qualidade de vida no contexto da sociedade contemporânea. O que se

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observa, contudo, é que mesmo em casos extremamente complexos, onde há real necessidade de tratamento, as pessoas não têm seus pedidos deferidos na esfera administrativa e a consequência disso é a judicialização da questão.

2 DIREITO À SAÚDE E AO BEM-ESTAR: A JUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE E OS PROCEDIMENTOS DE GASTROPLASTIA

O atual cenário brasileiro revela que há grande aumento nas demandas judiciais em busca da concretização do direito à saúde, principalmente ao que diz respeito às cirurgias bariátricas. Na maioria dos casos, as pessoas que procuram, via administrativa, a concretização desse procedimento, recebem a negativa para a sua consecução.

Segundo palavras de Schwartz (2001, p. 159):

[...] se é certo que a saúde é juridicamente protegida, também pode-se arriscar, com margem mínima de erro, que uma parcela de culpa da inefetividade do art. 196, CF/88, encontra-se na falta de vontade política, na ausência de respeito à Constituição por parte dos Poderes Públicos e na ausência de compreensão do porquê existirem Poderes Constituídos imbuídos da defesa do interesse público – e que no entanto não cumprem sua função.

Imprescindível tocar no tema judicialização do direito à saúde sem mencionar o Sistema Único de Saúde (SUS), que tem por objetivo garantir o acesso integral, universal e gratuito de todas as pessoas aos serviços de saúde. Entretanto, apesar da criação desse

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importante órgão percebe-se que há um crescente aumento nas demandas do Judiciário, tendo o Poder Judiciário papel de extrema importância na efetivação do direito fundamental à saúde.

2.1 Acesso à saúde pelo Sistema Único de Saúde (SUS) como garantia de bem-estar

O Sistema Único de Saúde surgiu pela primeira vez na CF/88, depois de muitas regulamentações anteriores, em que os legisladores buscavam atender as demandas sociais atinentes à saúde. Nesse sentido afirmam Manoel Valente Figueiredo Neto et al. (2010):

A saúde preconizada na Constituição está inspirada no debate da Reforma Sanitária brasileira iniciado na década de 70, com grande expressão no resultado do intenso e participativo debate ocorrido na 8ª Conferência Nacional de Saúde em 1986. Durante a década de 90 assiste-se à árdua luta pela implantação do SUS, ainda que se esteja distante de completar esta tarefa, muito se avançou.

Saúde é qualidade de vida e, portanto, deve estar vinculada aos direitos humanos, ao direito ao trabalho, à moradia, educação, alimentação e lazer. O direito à saúde, especialmente quando examinado sob a ótica da qualidade de vida, exige também que a superação das desigualdades envolva o acesso democrático a alimentos, medicamentos e serviços que sejam seguros e que tenham sua qualidade controlada pelo Poder Público. Qualidade de vida implica o reconhecimento do ser humano como ser integral. O conceito de cidadania que a Constituição assegura deve ser traduzido nas condições de vida da população. Ressalta-se que a promoção da atenção à saúde é fundamental e faz parte do elenco de políticas sociais para construção de uma sociedade justa e democrática, missão central do SUS.

O acesso universal ao SUS, como explica a CF/88, faz justamente referência ao fato de ser um programa que alcança a população em geral, sem discriminações, atendendo a prerrogativa de que a saúde é um direito social e direito público subjetivo do cidadão. A esse respeito se manifestam Figueiredo Neto et al. (2010):

A instituição do SUS, a partir da Constituição Federal de 1988, representa um marco histórico das políticas de saúde em nosso país, pois na nova constituição, a atenção à saúde passa a ser assegurada legalmente como direito fundamental de cidadania, cabendo ao Estado a obrigação de provê-la a todos os cidadãos brasileiros e estrangeiros que vivem no Brasil. E desde a sua instituição, quatro pontos sobre a gestão têm sido apontados como fundamentais: a descentralização, o financiamento, o controle social e a gestão do trabalho.

O direito à saúde, afirmado na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, está claro na Constituição Federal de 1988 que define a Saúde como direito de todos e dever do Estado, indicando os princípios e diretrizes legais do Sistema Único de Saúde – SUS.

Segundo o art. 198 da CF/88, o SUS se organiza de acordo com determinadas diretrizes, quais sejam:

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Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:

I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;

II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

III - participação da comunidade (BRASIL, 2018).

Constata-se, portanto, a importância dada pela CF/88 à proteção da saúde, prezando pela descentralização do atendimento para que seja possível alcançar todas as regiões, mediante um atendimento integral e prioritário para a prevenção, bem como valorizando a participação da comunidade. No contexto de tais diretrizes, é notória a questão do atendimento integral à saúde, que é assim entendida pela Fiocruz (2018):

Pela perspectiva dos usuários, a ação integral em saúde tem sido frequentemente associada ao tratamento respeitoso, digno, com qualidade e acolhimento. Por isso, este valor paira como uma orientação geral nos serviços de saúde, já que o Estado tem o dever de oferecer um “atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais”, como oficializou a Constituição Federal de 1988.

Contextualizando toda a normativa da CF/88 referente à questão da saúde, observa-se que o legislador priorizou o tratamento da saúde ao mencionar que a questão tem tratamento integral e preventivo.

Em que pese a ausência prática da consecução do direito à saúde no momento da constituição do SUS, adveio a necessidade de regulamentação de toda essa matéria complexa e exigente. Assim, foi promulgada a Lei n° 8.080/1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e deu outras providências. Da mesma forma, foi promulgada a Lei n° 8.142/1990, que dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde, e deu outras providências. Desta forma, é notória a preocupação do legislador para com a regulamentação da saúde.

Mesmo, porém, existindo um arsenal de regulamentação para a consecução do direito à saúde, o Poder Público não supre as necessidades dos cidadãos, uma vez que não concretiza os seus direitos em vista de ausência de recursos ou sua destinação para outras áreas, sob argumentos encontrados em diversas teorias legitimadoras, como, por exemplo, a reserva do possível.

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Assim sendo, não há outra alternativa para os cidadãos que não possuem plano de saúde particular a não ser socorrer-se sob o manto do Poder Judiciário para tentar, em última alternativa, ver os seus direitos garantidos.

Como já exposto, a questão da saúde não se restringe à ausência de doenças, pois para a consecução de uma vida digna são necessários outros instrumentos que a garantem plenamente. Observa-se que o problema atinente à obesidade da população vem crescendo a cada ano, e que é preciso tratar a questão como sendo de saúde pública. A prática de atividades físicas pelas pessoas deve se tornar um hábito pois auxilia na busca por mais saúde. Segundo entendimento de Nabil Ghorayeb (2018):

Nos últimos oito anos a população ativa passou de 30,3% para 37,6% em 2016, porém, infelizmente, a prática diminuiu com a idade, sendo mais frequente entre os 18 a 24 anos, o que ajudou no ganho de peso com o avançar da idade. Tanto o excesso de peso como a franca obesidade são fatores de risco bem estabelecidos para a maioria das doenças cardiovasculares como as doenças das coronárias (angina e infarto do miocárdio), insuficiência cardíaca e a fibrilação atrial. Algumas pesquisas constataram um paradoxo surpreendente. Quando os cardiopatas eram muito magros ou grandes obesos, a evolução foi mais lenta e difícil, diferentemente dos com leve obesidade. Os dados científicos de pesquisas feitas em Framingham, nos EUA, atribuem principalmente à obesidade o surgimento de 23% das doenças cardiovasculares dos homens e 15% das cardiopatias nas mulheres, descartados os outros fatores de risco conhecidos.

Entre as crianças a obesidade também vem sendo um problema, visto que estão em constante desenvolvimento, tanto físico como mental. Nas palavras de Jean-Philippe Chaput e Angelo Tremblay (2018):

A obesidade infantil resulta de uma falha do sistema de autorregulação do corpo na modulação de influências ambientais em relação às propensões genéticas individuais. Diversos fatores envolvidos nas complexas interações genes-ambiente que causam a obesidade promoverão um equilibro energético positivo em longo prazo. Resultados de estudos longitudinais sugerem que a causa última da obesidade tende a ser um pequeno desequilíbrio crônico de energia, que é difícil de detectar por meio dos métodos atuais de mensuração de ingestão e gasto de energia.É provável que mudanças ambientais – por exemplo, em nutrição e estilo de vida – sejam as principais responsáveis pela atual epidemia de obesidade, uma vez que um conjunto de genes não pode modificar-se em menos do que uma geração.

Na grande maioria dos casos a obesidade se dá em razão de condições ambientais, o que leva à conclusão de que uma educação para boa alimentação, desde os primeiros meses de vida até a fase de maior desenvolvimento de um ser humano, é um bom caminho para evitar uma obesidade doentia e a necessidade de intervenção cirúrgica.

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A obesidade também afeta o psicológico das crianças, que estão em fase de desenvolvimento, não apenas físico mas também mental, como explicam Chaput e Tremblay (2018):

Crianças obesas estão expostas a estigmas de peso e podem ser vulneráveis a efeitos psicológicos, como depressão, e efeitos sociais, como o isolamento. As consequências de tendências desfavoráveis, como o isolamento ou o retraimento social, podem contribuir para a exacerbação da obesidade por meio de vulnerabilidades psicológicas que aumentam a tendência a comer demais e a atividades sedentárias. É evidente que essas tendências desfavoráveis, o preconceito e a discriminação são parte da vida cotidiana dessas crianças com sobrepeso. Além disso, com o aumento da incidência de obesidade infantil, foram identificadas também outras consequências da obesidade para as crianças, entre as quais apneia obstrutiva do sono, problemas ortopédicos, hiperandrogenismo, diabetes do tipo 2 e doenças cardiovasculares.

O tratamento, tanto para prevenir a obesidade quanto para reverter casos, gira, principalmente, em torno de uma mudança de estilo de vida, com a inclusão de uma alimentação saudável, exercícios físicos e uma vida social equilibrada. Por vezes, contudo, mudar o estilo de vida fica muito mais difícil, haja vista a demanda de tempo e trabalho que a sociedade atual exige. Nesse sentido afirma Suzana Dias Freire (2018):

Não há outra forma para falar em prevenção à obesidade nos dias de hoje, senão através de uma reflexão sobre alimentação saudável e prática de atividades físicas. A modernidade incita ao sedentarismo. As facilidades tecnológicas trazem consigo a tendência ao mínimo esforço. Um exemplo disso é a variedade de atrativos que estimulam as crianças a ficarem paradas em frente a videogames, computadores e DVDs. De outro lado, o estresse e o acúmulo de atividades levam à inevitável sensação de falta de tempo. Agendas assoberbadas e a necessidade de trabalhar, produzir e render cada vez mais fazem parte da rotina do dia a dia. Assim, tanto a alimentação adequada, quanto os exercícios físicos são facilmente deixados de lado.

De forma geral, como já exposto, a obesidade vem sendo, de fato, uma grande vilã para a saúde. Ela envolve, inclusive, novas discussões sobre a descoberta de um tratamento preventivo e uma educação anterior, para que as pessoas cada vez menos precisem de intervenção cirúrgica.

É preciso, portanto, tratar a obesidade como questão de saúde pública e entender que ela envolve muitos setores, como alimentação, exercícios, atendimentos psicológicos, conversas e discussões sobre o tema. Tudo isso para que seja possível perceber a obesidade como uma doença e não apenas uma questão estética, superficial e alvo de preconceitos, bem como encontrar meios que possibilitem não apenas a sua cura mas um tratamento preventivo.

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2.2 O procedimento de gastroplastia: necessidade x estética?

A obesidade é uma grave doença que atinge significativa parcela da população brasileira. Devido ao excesso de peso e aos diversos problemas aliados à patologia, muitas pessoas procuram meios de cura. Dentre os tratamentos destacam-se os procedimentos de gastroplastia que, na visão de Mariana de Oliveira Silva (2018), constituem

[...] um meio de alcançar o objetivo de redução do peso, e depende do empenho e determinação do paciente e da equipe de saúde, pois a rotina diária desse cliente passará a contar com uma nova disciplina de autocontrole, cumprimento das orientações passadas pelos profissionais, adequação a um novo estilo de vida e principalmente, o desejo de se manter saudável. Cabe aos enfermeiros orientar e acompanhar esse paciente para que o sucesso terapêutico seja real.

A esse respeito se posicionam Liete Francisco Marcelino e Zuleica Maria Patrício (2018), que assim expressam:

A cirurgia bariátrica possibilita erradicar as comorbidades inerentes à obesidade, assim como promove a redução IMC, porém, tende a provocar déficits nutricionais importantes, se não houver suplementação nutricional adequada. Essa situação exige acompanhamento profissional sistemático com apoio em exames laboratoriais. A alopécia é exemplo disso, pois pode estar relacionada à deficiência de zinco, de proteínas e de ácidos graxos essenciais.

A intervenção cirúrgica é indicada para pessoas que possuem índice elevado de gordura, e que devido ao excesso de peso podem desencadear significativas patologias, exemplificadas na Figura 4. Segundo Arthur Frazão (2018):

A cirurgia bariátrica pode ser feita em casos de obesidade mórbida ou quando o IMC é maior que 35 kg/m2 e esteja presente alguma das seguintes doenças, segundo o

Conselho Federal de Medicina: [...]. No entanto, apenas pacientes que não obtiveram resultados com tratamento clínico e nutricional por pelo menos dois anos podem fazer a cirurgia.

Diferente do que na maioria das vezes se acredita, o procedimento de gastroplastia é recomendado quando há casos de extremo descaso com a saúde, que pode desencadear outras patologias, como exemplifica a figura a seguir:

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Fonte: Frazão (2018).

A cirurgia bariátrica, portanto, vai além da questão estética. Para Chris Bertelli (2018), especialistas não cansam de reforçar que o procedimento é um tratamento cirúrgico para uma doença grave – a obesidade. A cirurgia bariátrica, contudo, não deve ser encarada pelo paciente como uma forma rápida de se livrar dos quilos a mais sem muito esforço, pois as questões complexas atinentes à cirurgia bariátrica não se concentram apenas na dificuldade de deferimento pelo SUS, mas também em todo o procedimento concreto, que demanda dedicação dos pacientes, bem como o preenchimento de diversos requisitos. Assim sendo,

Para fazer uma cirurgia bariátrica é preciso haver identificação de obesidade Grau III com Índice de Massa Corpórea (IMC) maior que 40 kg/m2, que seja resistente ao tratamento convencional há pelo menos dois anos contínuos de dietoterapia, psicoterapia, medicamentoso e exercícios físicos, ou IMC de 35 kg/m2 associado a

doenças crônicas, como diabetes mellitus tipo 2, dislipidemias, hipertensão arterial, ausência de patologias endócrinas, transtornos mentais, entre outros, também associados à redução na expectativa de vida. Ao cadastrar o paciente deve-se ter um médico-cirurgião responsável com especialização em cirurgia bariátrica, reconhecido pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e com experiência profissional na área. (JORGE FILHO apud GÓES et al., 2012).

Segundo o Hospital Sírio Libanês (2018), o procedimento de gastroplastia pode ser dividido em três grupos: “cirurgias puramente disabsortivas (não são utilizadas mais), cirurgias restritivas e cirurgias com técnica mista”. Atualmente, a técnica mista tem sido mais utilizada, mais especificamente a técnica de Fobi-Capella, ou bypass gástrico com anel, que consiste na redução do estômago por meio de grampeamento.

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A Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM, 2018a) explica o procedimento utilizado pela técnica mista:

São consideradas as cirurgias de ouro, são cirurgias que apresentam elevados índices de satisfação, excelente controle das doenças associadas, excelente manutenção do peso perdido a longo prazo. São as cirurgias mais realizadas no Brasil e no mundo. Essa técnica causa uma restrição na capacidade de receber o alimento pelo estômago que se encontra pequeno e possui um desvio curto do intestino com discreta má absorção de alimentos. E conhecida como cirurgia de yy-pass gástrico ou cirurgia de fobi-capella.

A técnica do Bypass Gástrico (gastroplastia com desvio intestinal em Y de Roux), como já citado, é a técnica mais praticada no Brasil, devido à sua segurança e eficácia. Segundo consta no site eletrônico da Clinobeso (2018),

Espera-se que o paciente perca de 80 a 100% do excesso de peso. É considerado um procedimento misto, pois há modificação no estômago (redução/restrição) e no intestino (desabsorção). Nesse procedimento é realizado o grampeamento da porção superior do estômago com a construção de uma bolsa gástrica (pouch) com aproximadamente 50 ml e um desvio do intestino, promovendo restrição à entrada do alimento e um aumento dos hormônios que diminuem a fome [...].

Após o procedimento cirúrgico, o paciente necessita diversos cuidados e precisa fazer mudanças não só alimentares, mas comportamentais e de exercícios, tudo isso mediante a supervisão de profissionais da saúde, a fim de obter resultado eficaz da cirurgia e melhora na qualidade de vida. Importante mencionar que os cuidados com o paciente devem iniciar antes da operação e se estender após a sua realização. A SBCBM (2018b) menciona que:

O preparo pré-operatório otimiza a segurança e os resultados da cirurgia bariátrica e metabólica. Solicita-se ao paciente que se esforce para perder um pouco de peso antes da cirurgia, pois alguns quilos a menos podem oferecer melhores condições à anestesia geral e à operação.

Além disso, a SBCBM (2018b) recomenda que: “No pré-operatório, o paciente deve realizar uma série de exames, como endoscopia digestiva, ultrassom abdominal e exames laboratoriais, e passar em consulta com os profissionais obrigatórios: cirurgião, cardiologista, psiquiatra, psicólogo e nutricionista.”

Após o procedimento os cuidados devem ser redobrados, pois a gastroplastia provoca alterações hormonais que auxiliam na saciedade, o que pode desencadear deficiências de vitaminas e minerais. Por essa razão é indispensável o acompanhamento com profissionais habilitados da saúde.

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A Clínica Alcides Branco (2018) alerta nesse sentido que:

Embora muito raramente, a cirurgia pode gerar complicações, como infecções, tromboembolismo (entupimento de vasos sanguíneos), deiscências (separações) de suturas, fístulas (desprendimento de grampos), obstrução intestinal, hérnia no local do corte, abscessos (infecções internas) e pneumonia. Além disso, sintomas gastrointestinais podem aparecer após a refeição. Os pacientes predispostos a esses efeitos colaterais devem observar certos cuidados, como reduzir o consumo de carboidratos, comer mais vezes ao dia – pequenas quantidades –, e evitar a ingestão de líquidos durante as refeições.

Para obter resultados duradouros é fundamental evitar os principais motivos para a obesidade, que na sociedade atual são decorrentes da rotina com refeições rápidas, nada saudáveis, somados à falta de exercícios físicos. A obesidade é originária de uma sociedade falida na obtenção do bem-estar, e de um Estado que fracassou na consecução de uma vida digna para as pessoas. Tudo isso acaba por tornar a obesidade um grave problema de saúde.

2.3 A judicialização do direito à saúde nos procedimentos de gastroplastia

Como já exposto, em que pese o legislador regulamentar quase que inteiramente a matéria atinente à saúde, o Poder Público, por vezes, não atua na sua consecução, negando pedidos sob diversas alegações, sobretudo de carência ou ausência de recursos.

Neste contexto situam-se as pessoas que portam algum tipo de obesidade e têm o seu pedido de gastroplastia negado pelo SUS, que pré-conceitua as pessoas acima da faixa do peso sob a ótica estritamente estética, quando na verdade se trata da busca pelo bem-estar. O tema já é tratado como o maior problema de saúde pública em esfera mundial (Figura 5):

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Fonte: OMS (2018a).

A obesidade afeta a maioria dos países do Planeta. O Jornal Deutsche Welle publicou em 2014 e o site Carta Capital (2018a) reproduziu que:

Mesmo em países industrializados, a má alimentação em forma de sobrepeso é um problema da pobreza e do nível educacional. Enquanto na Ásia o macarrão instantâneo pobre em nutrientes é o que contribui para a má nutrição, em países industrializados, cidadãos mais pobres comem cada vez mais produtos prontos com alto teor de gordura, açúcar e sal, como, por exemplo, hambúrgueres, batatas fritas, cachorros-quentes, sopas instantâneas, torradas e pizzas congeladas. O resultado: muitos obesos também sofrem de subnutrição, já que ingerem poucos nutrientes.

A Figura 6, a seguir, permite visualizar a ocorrência mundial de obesidade, cujos dados foram capturados do site oficial da Organização Mundial de Saúde (2014):

Figura 6. Ocorrência mundial de obesidade (em % da população total)

Fonte: Carta Capital (2018a).

A título de curiosidade, insta mencionar que nos Estados Unidos, no ano de 2013, a obesidade foi definitivamente tratada como doença pela American Medical Association. A justificativa para essa classificação, segundo Drauzio Varella (2017), reproduzida no site Carta Capital (2018b), é a seguinte:

1. Reconhecer a obesidade como doença ajudará a comunidade médica a lidar com esse tema complexo que afeta pelo menos um em cada três americanos.

2. A resolução pressionará as operadoras de saúde a criarem mecanismos para compensar as consultas médicas, pelo tempo gasto em alertar os pacientes sobre os riscos de permanecer com índices de massa corpórea acima de 30 (IMC = peso/altura x altura) e orientá-los a seguir programas de perda de peso.

A obesidade é considerada pelo excesso de peso, o que é explicado pelo site eletrônico da Livraria Florence (2018, grifo do autor):

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A obesidade é caraterizada pelo excesso de gordura corporal, comparada com a sua massa magra. Ela acontece quando a ingestão de alimentos é maior que o gasto calórico realizado pelo corpo.

A principal causa da obesidade é a junção de uma alimentação muito calórica e uma vida sedentária. Mas a obesidade também pode ser a consequência de tratamentos realizados com remédios fortes, além disso, muitas pessoas possuem histórico de obesos na família e, por sua genética, têm mais facilidade para ganhar peso.

A obesidade pode acarretar várias doenças, como a hipertensão, diabetes, problemas respiratórios, estomacais e nas articulações, além de estar mais propenso ao desenvolvimento do câncer.

A obesidade é uma doença crônica que pode ocasionar inúmeras outras doenças, acarretando significativas consequências, até mesmo a morte, tendo em vista os agravos decorrentes de uma obesidade mórbida. Devido a isso, é de extrema importância realizar tratamento para a reversão do quadro. Nesse sentido, Nívea Chacur (2018) destaca:

Com a obesidade mórbida podem aparecer também diversas outras doenças, como problemas cardíacos, trombose venosa, hipertensão arterial, problemas articulares, depressão, dislipidemias, problemas articulares nos joelhos e coluna lombar, doença arterial – com riscos de desenvolver um infarto do miocárdio ou acidente vascular encefálico – e diabetes mellitus. Somando os problemas de saúde, pessoas que sofrem com obesidade mórbida também sofrem com discriminação e problemas cotidianos, como dificuldades em realizar tarefas corriqueiras (como amarrar os sapatos e sentar no ônibus), dificuldade para comprar roupas com tamanho apropriado e mais. Pessoas com essa doença têm sensação de fadiga constante, pouca resistência física e limitações de movimento.

Para reverter quadros sérios de obesidade existem as cirurgias bariátricas, assim conhecidas popularmente. O procedimento de gastroplastia, porém, é extremamente oneroso para a maioria da população brasileira, que já tem dificuldades para manter as suas responsabilidades com um salário mínimo, quanto mais arcar com tais gastos. Por esse motivo há grande procura pelo procedimento por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

Como já observado ao longo deste estudo, a busca administrativa para a consecução da cirurgia para reverter quadros de obesidade não é simples e, na maioria das vezes, acaba sendo indeferida sem qualquer fundamentação adequada para a negativa. Consequentemente, não há outra solução para a questão a não ser tornar a demanda litigiosa mediante a busca do Poder Judiciário para resolver a questão. Somente analisando caso a caso será provada a real necessidade de deferimento das cirurgias de gastroplastia custeadas pelo SUS.

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