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Os reflexos das teorias contratualistas na concepção do direito administrativo

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IONICE TEREZINHA PIMENTA POSSANI

OS REFLEXOS DAS TEORIAS CONTRATUALISTAS NA CONCEPÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

Ijuí (RS) 2018

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IONICE TEREZINHA PIMENTA POSSANI

OS REFLEXOS DAS TEORIAS CONTRATUALISTAS NA CONCEPÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientador: Dr. Aldemir Berwig

Ijuí (RS) 2018

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Dedico este trabalho à minha família, pelo incentivo, apoio e confiança em mim

depositados durante toda a minha

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AGRADECIMENTOS

A minha família, que sempre esteve presente, apoiando-me. Foram eles que deram suporte e o incentivo nas horas de dificuldade e incerteza que, por diversas vezes, sobressaltaram-me durante a caminhada. Com eles aprendi que os desafios são as molas propulsoras para a evolução e o desenvolvimento.

Ao meu orientador, Aldemir Berwig, com quem tive o privilégio de conviver e contar. Foi ele que, com dedicação e sabedoria, guiou-me pelos caminhos do conhecimento.

A todas as pessoas que de alguma forma contribuíram para o meu crescimento acadêmico e estiveram ao meu lado durante esta jornada, porque sem elas não teria sido possível tal conquista.

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“O direito deve ser um ativo promotor de mudança social tanto no domínio material como no da cultura e das mentalidades.”

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O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise das Teorias Contratualistas, abordando a concepção dos teóricos da Idade Média em sua busca de uma forma de solucionar os conflitos ocasionados pela instabilidade social, em uma sociedade onde não existiam leis e nem regras. O objetivo de tal investigação é averiguar se, na contemporaneidade, encontram-se reflexos e resquícios dessa construção teórica que deu origem ao Estado moderno, e verificar se tais influências ainda se refletem sobre o Direito Administrativo na atualidade. Ao analisar o surgimento e o desenrolar de tais teorias dentro do contexto histórico, busca-se avaliar o seu caráter transformador da sociedade. Faz um enfoque acerca das Revoluções Americana (1776) e Francesa (1789), que ensejaram o processo de passagem de um Estado absoluto para um Estado de Direito, vindo a mudar o paradigma até então existente na sociedade medieval. Por fim, tece considerações acerca do surgimento e concepção do Direito Administrativo, investigando seus princípios, técnicas e características. Investiga o contexto histórico dessa nova perspectiva. Faz uma breve análise de seus pressupostos e tece considerações sobre os mesmos. Finaliza concluindo que, mesmo com as mudanças que se deram através dos tempos, ainda hoje os ideais teóricos dos contratualistas encontram-se presentes nas considerações à respeito do Direito Administrativo.

Palavras-Chave: Constitucionalismo. Estado de Direito. Bem-estar Social.

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ABSTRACT

The present work of course completion makes an analysis of Contractualist Theories, approaching the conception of middle age theorists in their search for a way to solve conflicts and the crisis of instability caused by a state of nature where there were no laws or rules. The aim of this investigation is to investigate whether there are still reflections and remnants of this theoretical construction that gave origin to the modern State and to verify if these influences are still reflected on the administrative law in the present time. In analyzing the emergence and the development of such theories within the historical context, one seeks to evaluate its transforming character of society. It focuses on the American (1776) and French (1789) revolutions that brought about the process of transition from an absolute state to a state of law, changing the paradigm hitherto existing in medieval society. Finally, it makes considerations about the emergence and conception of Administrative Law, investigating its principles, techniques and characteristics. It investigates the historical context of this new perspective. Make a brief analysis of your assumptions and weave considerations about them. He concluded by concluding that even with the changes that have taken place over time, even today the theoretical ideals of contractualists are present in the considerations regarding administrative law.

Keywords: Constitutionalism. Rule of law. Social Welfare. Modernity.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

1 AS TEORIAS CONTRATUALISTAS E A CRIAÇÃO DO ESTADO ... 10

1.1 Concepção de Thomas Hobbes. ... 11

1.2 Concepção de John Locke ... 14

1.3 Concepção de Jean Jacques Rousseau ... 15

2 DISTINÇÃO ENTRE ESTADO ABSOLUTO E ESTADO DE DIREITO ... 18

2.1 A Revolução Americana ... 19

2.2 A Revolução Francesa ... 20

2.3 A Instauração do Constitucionalismo ... 22

3 O CONTEXTO DO DIREITO ADMINISTRATIVO ... 24

3.1 Princípios do Direito Administrativo ... 26

3.2 Influências Contratualistas ... 27

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 29

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo acerca das Teorias Contratualistas e seu desenrolar através da história, procurando compreender seus desdobramentos e sua repercussão na passagem do Estado Absoluto para o Estado de Direito. Busca-se averiguar se os resquícios desta construção teórica, que deu origem ao Estado como conhecemos hoje, ainda continua a influenciar e se refletir sobre a administração contemporânea e o Direito Administrativo.

Essa busca faz-se necessária para compreender os ideais dos teóricos contratualistas, os quais mudaram de forma significativa toda a concepção do viver em sociedade e se os mesmos depois de atravessar gerações, ainda continuam impactando e repercutindo na sociedade contemporânea.

Para a realização deste trabalho foram efetuadas pesquisas bibliográficas e por meio eletrônico, analisou-se também trabalhos acadêmicos, a fim de enriquecer a coleta de informações e permitir um aprofundamento no estudo sobre as Teorias Contratualistas. Buscou-se revelar a importância que tais percepções tiveram na mudança de paradigma que se deu com a passagem do Estado Absoluto para o Estado de Direito ao instaurar o Estado Moderno, bem como aclarar a percepção quanto às novas perspectivas para o Direito Administrativo contemporâneo.

Inicialmente, no primeiro capítulo, foi feita uma abordagem sobre as Teorias Contratualistas e as concepções teóricas dos filósofos Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau, que ensejaram a criação e formação do

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Estado a partir de uma nova perspectiva. No segundo capítulo é feita uma análise das Revoluções Americana (1776) e Francesa (1789), que marcaram e consolidaram definitivamente a passagem do autoritarismo absolutista para o Estado de Direito, e deram início às lutas para solidificar as bases e estruturação do Estado moderno. Também foram analisados seus pressupostos e perspectivas a fim de demonstrar quão árdua foi essa busca de alternativas para uma vida melhor em sociedade. Por fim, no terceiro capítulo, buscou-se entender e apreender até que ponto as propostas contratualistas mencionadas, impactaram e tiveram relevância na viabilização e desenvolvimento do Direito Administrativo e na administração contemporânea.

A partir desse estudo, verifica-se que as Teorias Contratualistas, ora estudadas, ao justificarem a necessidade de criação do Estado, como um meio eficaz de sair de um estado de completa desordem e adentrar em um Estado edificado em bases de Direito, contribuíram de forma essencial na construção e evolução de novas alternativas de organização e de administração desta nova ordem de coisas.

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1 AS TEORIAS CONTRATUALISTAS E A CRIAÇÃO DO ESTADO

No presente capítulo será abordado o histórico das Teorias Contratualistas e o arcabouço de suas concepções. Delinearemos o desenrolar e o desenvolvimento deste arsenal imaginário de ideias, que foi responsável pela criação e fundação do Estado e que, ao proporcionar novas perspectivas, serviu como agente de mudanças no contexto social, estruturando um novo paradigma na história.

O marco inicial das teorias em estudo é a análise da condição humana na ausência de uma ordem social minimamente estruturada, a qual os teóricos tratam por estado de natureza. Em tal estado, os indivíduos estariam limitados apenas pelo seu poder e por sua consciência. A partir daí é que as Teorias Contratualistas tentam explicar, cada uma a seu modo, como foi que racionalmente o indivíduo abdicou da liberdade que possuía em seu estado natural para obter os benefícios de uma ordem política (SILVA, 2013).

Em sentido muito amplo o Contratualismo compreende todas aquelas teorias que veem a origem da sociedade e o fundamento do poder político (chamado, quando em quando, potestas, imperium, Governo, soberania, Estado) num contrato, isto é, num acordo tácito ou expresso entre a maioria dos indivíduos, acordo que assinalaria o fim do estado natural e início do estado social e político (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,1998, p. 272).

Este pacto firmado por homens que viviam sem poder nem organização e que estabeleceria as regras de convívio e de subordinação, dar-se-ia através de um contrato (imaginário), onde cada indivíduo abriria mão de parte de sua liberdade em prol da vida em sociedade (RIBEIRO, 2018).

Este pacto firmado produz um censo comum de aceitação que, segundo Berwig trata-se de:

Uma realidade imaginada pautada na ideia de um contrato social que permite como resultado, o estabelecimento de regras que relativizam a liberdade da pessoa e consequentemente, [...], a autonomização e uniformização de condutas, entre outros aspectos. (BERWIG, 2017, p. 22).

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O contrato social seria, portanto, a metáfora que funda a racionalidade social e política da sociedade ocidental, e procurar explicar o surgimento da sociedade e/ou do Estado, buscando dar fundamento e legitimidade aos mesmos. É uma metáfora, na medida em que não ocorreu verdadeiramente, pois parte da hipótese de um estado de natureza pré-político e pré-social, no qual os homens nascem livres e iguais. Esse estado de natureza é suprimido, no momento em que é firmado o acordo (contrato voluntário), que fará nascer o Estado e a sociedade política (ABRAÃO, 2007).

Também para Berwig:

A proposta de pacto social que tem início com as Teorias Contratualistas, indica que [..] o mundo natural não comanda os rumos da sociedade e o pensamento humano é um instrumento para criar novas condições de sociabilidade. A ideia do contrato social passa a ser, assim, o fundamento da fundação de uma nova ordem e possibilita imaginar uma sociedade ideal, na qual os homens cedem parte de sua liberdade para viabilizarem uma segurança proporcionada por um novo estado artificial. (BERWIG, 2017, p. 39).

A partir da constatação de que o pacto social é decorrência da criação humana, é importante analisar a caracterização do estado de natureza e do contrato social, pois verifica-se que os mesmos apresentam-se de formas distintas, conforme o pensamento de cada um dos filósofos que se dedicaram ao tema. Para demonstrar a teoria do contrato social, se passa à análise das abordagens feitas pelos principais expoentes do modelo contratualista de sociedade: Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau.

1.1 Concepção de Thomas Hobbes

Thomas Hobbes viveu na Inglaterra entre 1588 e 1679. Vivendo em uma época de grande turbulência, seu objetivo era defender o poder dos monarcas absolutistas contra os revolucionários, buscando a segurança e a estabilidade. Para este teórico o homem em seu estado de natureza é um ser egoísta, que vive em guerra um contra o outro, onde o homem é lobo do homem (ABRAÃO, 2007).

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Para Hobbes:

[...] durante o tempo em que os homens vivem sem um poder comum capaz de os manter a todos em respeito, eles se encontram naquela condição a que se chama guerra; e uma guerra que é de todos os homens contra todos os homens. Pois a guerra não consiste apenas na batalha, ou no ato de lutar, mas naquele lapso de tempo durante o qual a vontade de travar batalhas é suficientemente conhecida. (HOBBES, 1983, p. 75).

O estado de natureza é um estado primitivo para Hobbes, no qual os indivíduos não têm condições de viver, visto que não se concebem limites ao seu proceder, pois estão todos dentro de uma base igualitária, onde ninguém se subordina a ninguém. A concepção contratualista de Hobbes defende que o gênero humano precisa modificar suas condições de existência, para que não venha a perecer (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,1998).

Surge então, segundo este pensador, a necessidade de uma força capaz de subjugar e canalizar tais egoísmos. Como solução, aparece a figura do Estado que, através de um contrato social imaginário, transfere a este todos os poderes pertencentes aos participantes de tal acordo, com o objetivo de acabar com a guerra, buscando a paz e a segurança (ABRAÃO, 2007).

Sobre o contrato social, Hobbes afirma:

Cedo e transfiro meu direito de governar-me a mim mesmo a este homem, ou a esta assembleia de homens, com a condição de transferires a ele teu direito, autorizando de maneira semelhante todas as suas ações. Feito isso, à multidão assim unida numa só pessoa se chama Estado, em latim cívitas. É esta a geração daquele grande Leviatã [...]. É nele que consiste a essência do Estado, a qual pode ser assim definida: Uma pessoa de cujos atos uma grande multidão, mediante pactos recíprocos uns com os outros, foi instituída por cada um como autora, de modo a ela poder usar a força e os recursos de todos, da maneira que considerar conveniente, para assegurar a paz e a defesa comum. Àquele que é portador dessa pessoa se chama soberano e dele se diz que possui poder soberano. Todos os restantes são súditos. (HOBBES, 1983, p. 105-106).

Este acordo, para Berwig (2017), traduz-se em uma realidade imaginada, uma construção abstrata que possibilita sua realização material, a qual vai possibilitar ao homem que viva em uma sociedade onde um poder supremo, exercido pelo Estado, vai assegurar o bem-estar social. Assim, aos indivíduos

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possibilita uma vida melhor, reduzindo os riscos voluntários decorrentes das paixões e possibilitando, num primeiro momento, como ordem construída, que se assegurem direitos que serão instituídos como garantias formais nesse Estado artificial.

Sob tal perspectiva, o contrato social de Hobbes seria uma espécie de acordo havido entre os membros de uma sociedade, que reconhecem uma autoridade soberana sobre todos, de um conjunto de regras, dentro de um regime político, embora neste primeiro momento ainda se esteja sob uma ordem absoluta. Essa noção de contrato, deixa claro que os indivíduos abrem mão da total liberdade para subjugarem os outros em prol de uma autoridade ou governo, buscando obter vantagens de ordem social (SILVA, 2013).

Segundo Bobbio, Matteucci e Pasquino:

O fato de a expressão excelente da soberania residir no poder legislativo deriva das premissas do próprio texto de Hobbes. Só o direito positivo sabe desalojar as paixões humanas e impedi-las positivamente através de sanções. Nesse sentido, o direito positivo não é mais do que um mergulho necessário, artificial e racional, dentro do direito natural, cujas leis eram continuamente violadas, no Estado de natureza pelas paixões... A sua grande essência inventiva, que reside na abstração do poder numa vontade artificialmente unificada, é o instrumento racional com que o homem salva a própria concretude: a vida. No Estado, o homem se salva, não se perde. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 6).

Através de um contrato que é irrevogável, o indivíduo renuncia literalmente a seus poderes naturais, exceto à vida, e transfere seus poderes ao soberano, senhor da lei, da propriedade e da força, a ser utilizado quando necessário para garantir a segurança. Verifica-se aqui a defesa da soberania absolutista, onde a obediência ao governo constituído é um dever, porquanto é resultado de uma decisão. Assim, a autoridade final da sociedade política em Hobbes, é uma vontade soberana e autônoma frente às vontades individuais (OLIVEIRA, 2006).

Ao fundamentar o absolutismo da política no absolutismo do homem, Hobbes funda a brutalidade necessária do poder no Estado, que mesmo se constituindo em uma criação humana artificial, foi a maneira encontrada para

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moderar a tragicidade de seu destino, que não seria outro senão a morte. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998).

1.2 Concepção de John Locke

Dando continuidade à concepção de Estado, se passa ao segundo teórico, John Locke, considerado o pai do liberalismo clássico, o qual constrói uma teoria que tem como propósito evitar o despotismo e a tirania em favor de causas liberais. Este pensador viveu de 1632 a 1704 na Inglaterra. O traço marcante em sua teoria é a defesa do contrato social em oposição à tirania e ao absolutismo (BERWIG, 2017).

Diferentemente do modelo hobbesiano, o estado de natureza de Locke é de relativa paz, pois para ele os homens já eram dotados de razão e desfrutavam da propriedade. Para este filósofo, entretanto, isto não quer dizer que não havia conflitos. Por isso, a necessidade de criação de um contrato, que serviria de passagem para uma sociedade política e civil (ABRAÃO, 2007).

No Contrato Social de Locke os indivíduos não necessitam renunciar a todos os direitos, porque estes fazem parte da natureza humana, sendo, portanto, inalienáveis. O que os indivíduos renunciam é o direito de fazer justiça por seus próprios meios ao proteger sua propriedade, buscando viver em paz (ABRAÃO, 2007).

Segundo a teoria exposta por este pensador, se estabelece

[...] um juiz na Terra, investido de autoridade para resolver as controvérsias e reparar os danos que possam advir a qualquer membro dessa sociedade – juiz este que é o legislativo ou os magistrados por ele nomeados [...]. sempre que houver pessoas desprovidas de uma tal autoridade à qual apelar para a decisão de quaisquer diferenças entre elas, essas pessoas encontrarão ainda no estado de natureza, do mesmo modo que qualquer príncipe absoluto em relação àqueles que estiverem sob seu domínio (LOCKE,1998, p. 460 e 461).

O estado de natureza, portanto, é um estado de igualdade onde a superioridade física não confere direito ao poder, podendo mudar conforme os

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acontecimentos, e onde a liberdade é apenas condição de independência para dominar-se a si próprio. No estado de natureza não há nem soberanos, nem súditos, nem senhores e nem servos, mas uma força potencial em estado difuso (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,1998).

A teoria de Locke diferencia-se de seu predecessor, já que seu fundamento é outro, pois não concorda que o homem é lobo do homem. O teórico entende que os homens livremente escolhem seus governantes, dando aos mesmos o poder necessário para que possam conduzir o Estado, buscando a garantia dos direitos essenciais que serão expressos a partir do contrato social (BERWIG, 2017).

Na concepção de Locke, para que o homem possa sair do estado em que vivia e adentrar na sociedade civil objetivando remediar os inconvenientes de um estado de natureza, a única maneira é aceitar juntar-se aos outros em uma comunidade, para viverem em paz e segurança dentro de suas propriedades (ABRAÃO, 2007).

Como resultado da teoria de Locke, tem-se a elaboração do individualismo que delineará o perfil do emergente Estado Liberal, a inalienabilidade do indivíduo à vida, à liberdade e à propriedade. Seu propósito, portanto, será o de evitar o despotismo e a tirania, em favor das causas liberais (ABRAÃO, 2007).

1.3 Concepção de Jean Jacques Rousseau

Jean Jacques Rousseau viveu de 1712 a 1788 e foi um dos principais teórico do iluminismo, tendo suas ideias grande influência na Revolução Francesa. Na concepção deste pensador de grande importância no século XVIII quando se trata de pensar a constituição do Estado como organizador da sociedade civil, o homem nasceria bom, mas a sociedade o corromperia. Ou seja, mesmo nascendo livre, por toda parte estaria o homem preso, cativo de

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suas vaidades e orgulho, tornando-se escravo de suas necessidades (RIBEIRO, 2018).

Apesar disso, Rousseau, que teria sua teoria refletida na Revolução Francesa, acreditava ser possível pensar em uma sociedade ideal. Para este teórico, a única maneira de preservar a liberdade do homem e ao mesmo tempo garantir a segurança e o bem-estar da vida em sociedade, seria através da instituição de um contrato social, onde prevaleceria a soberania política da vontade coletiva (RIBEIRO, 2018).

Tal conjuntura fica igualmente clara na compreensão de Ribeiro quando, ao citar Weffort, menciona que o ponto fundamental no entendimento de Rousseau é que a propriedade privada seria a origem da desigualdade entre os homens.

Desde o momento em que um homem teve necessidade do auxílio do outro, desde que se percebeu que seria útil a um só indivíduo contar com provisões para dois, desapareceu a igualdade, a propriedade se introduziu, o trabalho se tornou necessário. (WEFFORT apud RIBEIRO, 2018, s.p.).

Daí a importância do contrato social de Rousseau, onde seria definida a questão da igualdade entre todos os homens, que, depois de terem perdido sua liberdade natural, ganhariam em troca a liberdade civil. Tal contrato seria um mecanismo para o estabelecimento deste pacto. Dessa forma, o Estado não seria soberano por si só, mas suas ações deveriam ser dadas em nome da soberania do povo, o que indicaria a valorização da democracia no pensamento de Rousseau (RIBEIRO, 2018).

Tal entendimento também é compartilhado por Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998, p. 47), pois

[...] partindo da hipótese da origem contratualística do Estado, Rousseau, via no próprio Estado um organismo criado pelo consenso voluntário dos homens livres e iguais por sua natureza. Identificada a fonte dos poderes do Estado na vontade de todos os componentes da comunidade [...].

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O contrato social de Rousseau, portanto, representa a criação de uma ordem social capaz de manter o equilíbrio entre a vontade geral e o interesse individual, de defesa da propriedade e de controle dos abusos do poder soberano. Ao expor suas ideias, Rousseau (apud VILALBA, 2013) expressa a inserção de sua teoria política no contrato social, a qual gera a história da realidade humana no mais íntimo de suas necessidades.

Em outras palavras, enquanto para Hobbes e Locke a sociedade civil é a sociedade política civilizada (civilizada na medida em que é política), a sociedade civil de Rousseau é a sociedade civilizada, mas não necessariamente ainda a sociedade política, pois esta somente surgirá do contrato (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,1998).

O contrato social estabelece para a humanidade, portanto, uma nova condição, ou seja, uma nova realidade criada pelo imaginário, pois a partir de sua aceitação coletiva possibilita o estabelecimento de convenções e, por consequência, a padronização do pensamento (BERWIG, 2017) em torno de uma criação social.

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2 DISTINÇÃO ENTRE ESTADO ABSOLUTO E ESTADO DE DIREITO

Depois da análise e compreensão dos ideais contratualistas, busca-se elucidar os aspectos da passagem do Estado Absoluto para o Estado de Direito, bem como os fundamentos dessa transição. Para tal intento será objeto deste enfoque as duas importantes revoluções do século XVIII: a Revolução de Virgínia (1776) e a Revolução Francesa (1789), as quais marcaram o fim do Estado absoluto.

Absolutismo é, para Bobbio, Matteucci e Pasquino, a

[...] forma de Governo em que o detentor do poder exerce este último sem dependência ou controle de outros poderes, superiores ou inferiores. [...] seria defini-lo como "sistema político em que a autoridade soberana não tem limites constitucionais", ou apenas "sistema político que se concretiza juridicamente através de uma forma de Estado em que toda a autoridade (poder legislativo e executivo) existe, sem limites nem controles, nas mãos de uma única pessoa". O problema decisivo é o dos limites [...] (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 2).

Ou seja, trata-se de um poder que não tem limites pois quem os determina é o próprio senhor absoluto, o monarca. Aparenta um quadro despótico, a partir do qual ocorre a revolução. Para os autores acima citados é a tentativa, acompanhada do uso da violência, de derrubada e substituição das autoridades políticas existentes objetivando efetuar mudanças profundas nas relações políticas, no ordenamento jurídico-constitucional e na esfera socioeconômica.

Para Vilalba (2013), a causa principal das revoluções, neste contexto, baseia-se no conceito de soberania do povo, mudando o direito da vontade singular do príncipe para a vontade geral do povo. Seguindo este raciocínio, entende-se que o movimento revolucionário burguês surgido no século XVIII representa

[...] o fim de um longo período, também marcado pela guerra civil, e a restauração da monarquia. E é, além disso, significativo que a Revolução americana e até mesmo a Francesa, no início, não fossem concebidas pelos seus autores como algo original e inédito, mas como retorno a um estado de coisas justo e ordenado, que havia sido perturbado pelos excessos, pelos , abusos e pelo desgoverno das autoridades políticas, e que devia ser restaurado, quer se tratasse de

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eliminar as exorbitâncias do Governo colonial inglês, quer se devesse moderar o exercício despótico do poder da monarquia borbônica (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 1.123).

O Estado Absoluto serviu de justificação e cenário para que se instalasse e se perpetuasse todo o tipo de desmandos e arbitrariedades do poder desenfreado e sem limites do rei. Para Mendonça (2010), o absolutismo foi o grande responsável pelas crises do século XVIII que desembocaram nas revoluções.

2.1 A Revolução Americana

O modelo constitucional inglês que serviu de supedâneo e deu origem a primeira Declaração de Direitos, no sentido moderno do constitucionalismo, ocorreu nas antigas colônias da América no século XVIII, em 1776, onde o congresso convocou as colônias desprovidas de governos eficientes a darem-se autonomamente uma estável organização política (MENDONÇA, 2010).

Para o autor acima mencionado, tudo começou com a crise econômica inglesa desencadeada pelos prejuízos econômicos resultantes da guerra dos cem anos, a qual refletiu nas colônias americanas de maneira que as mesmas passaram a ser alvo de excessivos boicotes econômicos, sem que houvesse preocupação alguma com seus direitos ou suas reclamações.

Dirley da Cunha Júnior (apud MENDONÇA, 2010,p.5) esclarece que

[...] Virgínia era uma das treze colônias inglesas na América do Norte impactadas pela crise, de modo que representantes do seu povo, visando um governo democrático e a limitação dos poderes, formularam a Declaração do Bom Povo da Virgínia. Tal documento especificava à população a existência de direitos naturais essenciais a qualquer ser humano que não podiam jamais serem esquecidos.

A partir da Declaração da Virgínia é que passou a existir em favor da coletividade uma verdadeira limitação ao poder soberano, a qual, além de estabelecer direitos de liberdade, trazia, também, condições para que esses direitos fossem efetivados. Essa Declaração inspirou não só as futuras

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declarações das ex-colônias inglesas, como também a Constituição Norte-Americana de 1787 (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,1989).

Foram os Estados Unidos, portanto, que trouxeram para a história a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, a qual se traduziu na primeira grande Declaração de Direitos vista pela humanidade. Tal documento afirmou que “[...] todos os homens são, por natureza, livres e têm direitos inatos, especificamente, o direito à vida e à liberdade, o direito de adquirir e possuir a propriedade, como também, de procurar obter a felicidade e a segurança.” (MENDONÇA, 2010). Este embrião plantado de forma revolucionária impactou em outros ordenamentos sendo reconhecido na atualidade.

2.2 A Revolução Francesa

A França, mais que os Estados Unidos da América, foi de importância fundamental para a consolidação dos diretos fundamentais no contexto da história mundial e trouxe à tona, sob o manto do pensamento iluminista, o liberalismo, por intermédio da Revolução Francesa (MENDONÇA, 2010).

Vários foram os fatores que levaram o povo francês à Revolução: a divisão do catolicismo, o fator econômico e também o fator político, foram alguns deles. Com o surgimento do protestantismo acirraram-se as revoltas e guerras religiosas. Enquanto o povo passava fome e era encarcerado em prisões, o clero e a nobreza acumulavam privilégios. Os intelectuais passaram, então, a escrever e distribuir panfletos contra os atos do governo e desmandos do papa, posicionando-se favoráveis à liberdade religiosa, ocasionando mais revolta (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,1989).

Fatos importantes ocorridos durante da Revolução, como a queda da bastilha, são demonstrações de freio à crueldade e ao absolutismo da época. O rei deixa de praticar suas arbitrariedades extremadas para seguir os mandamentos do liberalismo, respeitar a vontade do popular por meio das leis e governar para o povo, respeitando seus direitos individuais e sua liberdade. É

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neste cenário que se fundamenta o viés positivista para a aplicação da lei, pois todos se submetem a lei, o juiz devendo ater-se ao texto codificado, posto que qualquer margem de liberdade na decisão poderia levar a uma eventual arbitrariedade (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,1989).

Neste contexto revolucionário, em 26 de agosto 1789 foi divulgada, na França, a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, a qual afirma, em seu artigo 3º, que o princípio de toda a soberania reside essencialmente na nação e que nenhum corpo nem indivíduo pode exercer autoridade se não emanar expressamente dela (FRANÇA, 1789). Tal Declaração marcou o constitucionalismo liberal, por trazer princípios universais (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,1989). Governar para o povo e respeitar a vontade dos mesmos através das leis são direitos conquistados, que hoje temos consolidados em todas as constituições existentes.

Além das garantias individuais, que já constavam nas declarações contemporâneas, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, trouxe também os princípios da liberdade, da igualdade, da propriedade e da legalidade. Inspirada pela Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, todavia, não se aplicava somente a uma parcela da sociedade ou a um determinado grupo; mas sim a todas as pessoas, pois se destinava ao “homem e ao cidadão”. Pela excelente descrição de direitos que possuía seu texto, por sua universalidade, sendo incomparável sua importância, é que se fez presente na Constituição francesa, em seu preâmbulo (MENDONÇA, 2010).

A Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, bem como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, foram conquistas da sociedade, as quais inspiraram todas as seguintes Constituições e Declarações de Direitos. A partir delas, os direitos individuais e os direitos de liberdade, consolidaram-se no mundo todo (MENDONÇA, 2010).

Bobbio, Matteucci e Pasquino (1989) aduzem formalmente que o término do absolutismo se dá com a Revolução Francesa, quando marca a passagem de um Estado cujos membros deixaram de ser súditos, para se tornarem sujeitos

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de direitos. É o rompimento do Estado Absoluto e o surgimento do constitucionalismo moderno, que passa a reconhecer os direitos do indivíduo perante o Estado.

2.3 A Instauração do Constitucionalismo

A Constituição de um Estado (ordenamento constitucional), considerada sua lei fundamental e organizada num sistema de normas jurídicas, escritas ou costumeiras, cria e regula a forma do Estado, seu governo, a aquisição e o exercício do poder, o estabelecimento de seus órgãos, os limites de sua ação e os direitos fundamentais dos homens, dentre outros aspectos. Se constitui no conjunto de normas que organiza os elementos constitutivos de um Estado (REIS; PASCON, 2003).

Pedro Lenza (2018, p. 27), citando Canotilho, define o constitucionalismo como uma “[...] técnica específica de limitação do poder com fins garantísticos.” Afirma que os textos constitucionais contém regras que limitam o poder e afastam a visão autoritária do antigo regime ao estabelecer direitos fundamentais. Para Reis e Pascon (2003, p. 5) “[...] é mediante normas que o direito pretende obter o equilíbrio social, impedindo a desordem e os delitos, procurando proteger a saúde e a moral pública, resguardando os direitos e a liberdade das pessoas.”

A sociedade é assim submetida ao poder do Estado, que se torna o responsável pela segurança e a organização social. Bobbio, Matteucci e Pasquino destacam em que consiste essa mudança de perspectiva ocorrida no cenário do século XVIII:

O poder constituinte do povo conhece já procedimentos satisfatoriamente consolidados [...], capazes de garantir que a nova ordem corresponda à vontade popular. É justamente por este motivo que o poder constituinte do povo, que instaura uma nova forma de Estado, pode ser encarado como a última e mais amadurecida expressão do contratualismo democrático: um contrato entre os cidadãos e as forças políticas e sociais, que define as formas pelas quais os representantes ou comissionados do povo devem exercer o poder, bem como os limites dentre os quais eles devem se movimentar.

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Se a ditadura soberana constitui um mero fato, produtor do ordenamento, o poder constituinte do povo é uma síntese de poder e direito, de ser e dever ser, de ação e consenso, uma vez que fundamenta a criação da nova sociedade no iuris consenso. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO,1989, p. 43).

A constituinte, portanto, ao instaurar um novo Estado, se houver participação ou representação popular, instaura também uma nova sociedade fundada no consenso de seus cidadãos. Este intento, organizado de forma convencional e consensual, funda a constituição do Estado e do poder político, assegurando direitos e liberdades civis, que funcionam como limites de atuação do Estado Moderno (BERWIG, 2017).

Bobbio, Matteucci e Pasquino (1989) concordam que é na conjuntura dessas mudanças proporcionadas pela nova visão de direitos e pela concepção de um Estado que agora respeita seus antigos súditos, então cidadãos, que se assenta o pressuposto ideológico da constituinte. Estando, portanto, instituído o poder constituinte, cuja forma de manifestação se faz pela Assembleia Constituinte, como órgão extraordinário faz surgir um novo ordenamento: a Constituição.

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3 O CONTEXTO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

É no contexto das grandes mudanças, até agora elucidadas, que se observa o surgimento da concepção de Direito administrativo, cuja abordagem vai se pautar pela doutrina de Celso Antonio Bandeira de Mello (2016), a qual analisa a ideia de interesse público como o objeto de concretização necessária pela Administração Pública.

A evolução histórica nos leva a perpassar os vários momentos pelos quais o Direito Administrativo irrompeu e se consolidou. Sobrevindo a Revolução Francesa e estando a vida sob os holofotes do iluminismo, não havia disposições que subjugassem a conduta soberana do Estado ao Direito nas suas relações com os administrados. Surge então a necessidade de um novo conjunto de leis, formado por princípios novos que pudessem dar conta dos conflitos. Era um novo Direito, ainda não legislado, o Direito Administrativo (BANDEIRA DE MELLO, 2016).

Esse novo direito é reflexo do Estado que nasce a partir das ideias iluministas e se distancia do Estado absoluto, com nova organização.

No momento em que a exigência da distribuição e coordenação do trabalho administrativo assumiu relevo e dimensões sempre crescentes no decorrer da experiência dos ordenamentos estatais modernos e contemporâneos, de tal modo que deu origem ao aparecimento e ao desenvolvimento de estruturas específicas, o termo Administração Pública, do ângulo de seus destinatários, passou a indicar o complexo de estruturas que, conquanto se encontrem em posições de subordinação diferentes, em relação às estruturas políticas e de Governo, representam uma realidade organizativa distinta daquelas. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 11).

Como diria Ribeiro (2018), estando agora o Estado institucionalizado, há necessidade urgente que se organize, no sentido de adequar-se às novas alterações sociais e econômicas agora estabelecidas. A filosofia socializante, de agora em diante, significa a adaptação do Estado tradicional às novas condições sociais e econômicas da civilização.

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Nesse sentido, o Estado é um instrumento que busca proporcionar aos indivíduos uma convivência capaz de propiciar a realização de seus fins, de modo que o Direito tem a missão de efetivar uma forma de convívio humano na qual se realizem concomitantemente as plenitudes da pessoa e da coletividade (REIS; PASCON, 2003). O Direito Administrativo, neste viés, é um Direito que nasce para regular a conduta do Estado e mantê-la afivelada aos preceitos da legalidade, sendo por excelência um direito que se coloca em defesa ao cidadão (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998).

Resta identificado, portanto, o Direito Administrativo, que fora encarado de início com estranheza, pois que um direito “excepcional”, que discrepava de tudo o que se conhecia até então, com princípios e regras que exorbitavam as relações entre os particulares. Foi o mesmo sendo construído por obra da jurisprudência do Conselho do Estado francês, órgão encarregado de resolver as contendas entre a administração e seus administrados (BANDEIRA DE MELLO, 2016).

A partir de tal concepção pode-se entender que

Com o aparecimento dos regimes constitucionais, a administração foi subordinada à lei e inserida no chamado poder executivo estatal. Isto, porém, não fez senão dar uma roupagem formal mais atualizada ao que já era uma ordem conceitual e prática preexistente. Os novos princípios e os novos dispositivos institucionais agiram não no sentido da transformação mas no da limitação e controle da ação administrativa em relação ao público. A ação administrativa foi regulamentada quanto aos interesses e metas a perseguir e também quanto ao âmbito das suas possibilidades de intervenção, particularmente as do tipo unilateral e autoritário. Todavia, a intervenção foi configurada igualmente como manifestação de autoridade (legislativamente circunscrita) para satisfação de interesses próprios do titular da soberania, não do príncipe, mas da entidade estatal. (BOBBIO, MATTEUCCI, PASQUINO 1989, p. 13).

Estando o Estado agora concebido e constituído sobre bases de legalidade, a Administração surge, consequentemente, com o propósito de direcionar sua atuação, no sentido de satisfazer o interesse do povo. Assim, fica entendido que os atos emitidos por quem representa o titular do poder, que é o povo, são, acima de tudo, atos que manifestam e que cumprem deveres de

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implementar a finalidade legal que os justifica, ou seja, os interesses da coletividade (BANDEIRA DE MELLO, 2016).

Pela elucidação dos já referidos autores, portanto, chega-se às bases ideológicas do Direito Administrativo, resultantes do Estado de Direito, ideário da Revolução Francesa e, por conseguinte, ideal de Rousseau e seu contrato social. Ao submeter o Estado ao Direito, firma-se o princípio da igualdade entre os homens e, sobremaneira, a soberania popular. É neste diapasão que se assenta o Direito Administrativo (BANDEIRA DE MELLO, 2016).

3.1 Princípios do Direito Administrativo

Para Bandeira de Mello (2016) só há uma disciplina autônoma quando esta se assenta sobre um conjunto de princípios e regras que lhe dão identidade. Consequentemente, ao falar sobre Direito Administrativo, supõe-se que existam princípios que lhe são peculiares e que formam um sistema lógico e coerente: o regime jurídico administrativo.

Da mesma forma, estando o Direito Administrativo entroncado no Direito Público, e sendo o Direito composto por um conjunto de normas estabelecidas pelo poder político, as quais se impõem e regulam a vida social de um povo em determinada época, obviamente deve ser sua caracterização normativa determinada por interesses pertinentes à sociedade (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1989).

Para sustentar a ideia de uma disciplina autônoma, Bandeira de Mello expõe seus fundamentos assim especificando as questões integrantes do regime jurídico administrativo:

Princípio é, pois, por definição mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhe o espírito e servindo de critério para exata compreensão e inteligência delas, exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo, conferindo-lhe a tônica que lhe dá sentido harmônico. (BANDEIRA DE MELLO, 2016, p. 54).

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Os princípios se traduzem nas ideias centrais de um sistema e norteiam toda a interpretação jurídica do mesmo, conferindo-lhe um sentido lógico e estabelecendo o alcance de suas regras. São linhas gerais aplicadas a determinada área do Direito, que constituem sua base e determinam as estruturas em que se assentam institutos de relevante importância na aplicação do Direito Administrativo (MEDAUAR, 2018).

Estes princípios se traduzem nos fundamentos de um regime jurídico administrativo, normas centrais das quais derivam todos os demais princípios e normas do Direito Administrativo. E este, por sua vez, assenta-se sobre dois princípios basilares, a supremacia do interesse público e a indisponibilidade do interesse público (BANDEIRA DE MELLO, 2016). Assim, sustenta-se, também no Direito Administrativo, que o ordenamento jurídico do Estado tem a finalidade maior de atender ao interesse da sua população. Se estrutura, assim, o Direito Administrativo, para assegurar a satisfação do interesse público, o interesse maior da sociedade organizada.

3.2 Influências Contratualistas

O pensamento humano é a condição que possibilita a criação de novas condições de sociabilidade e possibilita a construção de uma nova ordem como resultado imaginário de uma sociedade ideal (BERWIG, 2017). Nesse aspecto, os teóricos contratualistas tiveram uma fértil imaginação em suas Teorias Contratualistas, as quais geraram uma proposta de pacto social. Nestas condições e pensando na tradição iluminista, pode-se afirmar que

O Estado moderno, Estado de direito, é uma construção do imaginário e de uma moderna teoria oriunda do pensar humano. É uma espécie de ficção que tem por finalidade construir uma realidade mais justa que a antiga concepção absolutista do poder. (BERWIG, 2017. p. 82).

O fundamento dessa nova ordem estabelecida a partir de um contrato imaginário, está na segurança proporcionada por um novo Estado social. Berwig (2017) acentua que este acordo se traduz em uma realidade imaginada, que vai possibilitar ao homem viver em sociedade, e onde o poder exercido pelo Estado

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vai assegurar aos indivíduos uma vida melhor, reduzindo os riscos voluntários decorrentes das paixões e elencando direitos que serão instituídos como garantias formais nesse Estado artificial.

O homem, estando agora inserido na sociedade e compreendendo ser um ser eminentemente social que busca concretizar seus objetivos, sente a necessidade de estabelecer relações com seu grupo social e, à partir do estabelecimento dessas relações, entende a preemência de normas que organizem a conduta social desta nova ordem então instituida (REIS; PASCON, 2003). Tais normas organizam o Estado e a sociedade. Ao organizarem tais perspectivas, terminam organizando a própria vida humana.

Por isso é que se pode dizer que as Teorias Contratualistas, concebidas a partir da ausência de uma ordem minimamente estruturada (SILVA, 2013), fundaram e legitimaram a racionalidade social e política ao fundarem o Estado de direito e possibilitarem o Estado social (ABRAÃO, 2007). Este Estado social, progrediu a ponto de podermos falar em direitos de cidadania como responsabilidade ou competência estatal.

Compreende-se assim que o Direito Administrativo sofre influência das Teorias Contratualistas justamente porque estas possibilitam que a razão humana crie o Estado moderno e tudo o mais que o caracteriza. O contrato social portanto, estabeleceu para a humanidade uma nova condição, ou seja, uma nova realidade criada pelo imaginário, e sua aceitação coletiva permitiu o estabelecimento de convenções e, por consequência a padronização do pensamento (BERWIG, 2017).

Em última instância, o Direito Administrativo é fruto de um pacto que cria um Estado, uma Administração Pública e toda a estrutura necessária para o seu funcionamento em prol da sociedade, através da lei. Se no Estado absoluto o Estado não se submetia à ordem jurídico, com esse novo pacto social o Estado passa a ser regulado pela imaginação, é uma ficção que funciona concretamente em razão de que a partir de tais teorias as pessoas dão vida à estrutura estatal.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

É no contexto das relações humanas que o homem estabelece condições de convívio com seus semelhantes. Estas interações, sejam afetivas, de liderança ou de disputa, são complexas e geralmente acompanhadas de constantes conflitos.

O conflito é por natureza a mola propulsora que instiga o ser humano a mudar, criando novas possibilidades de fazer uma releitura das situações e a criação de novas oportunidades. Traduzindo-se, dessa forma, em uma conotação positiva na evolução social.

Contudo, a incapacidade de uma resolução plena das controvérsias, em razão da complexidade e aumento dos problemas provenientes destas interações, reforçado pela ausência de uma cultura de pacificação, desassossega o ser humano e o instiga a buscar uma maneira de acelerar o deslinde de tais situações.

A idealização das Teorias Contratualistas trouxe à tona a consciência da necessidade de criação de uma estrutura (Estado), que desse conta de resolver a responsabilização das pessoas pelas suas ações e a consciência da necessidade de seu comprometimento na solução apresentada.

Com a criação do Estado de Direito, concebido e articulado em um arcabouço de normas e regimentos novos que trazia a perspectiva de uma vida melhor, é que o constitucionalismo moderno fez-se necessário, a partir de um ideário que estabeleceu direitos aos cidadãos. Para organizar este Estado

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moderno que passou a assegurar a integridade e os direitos dos cidadãos, surgiu a necessidade de alocar-se dentro de uma sistemática melhor estruturada e organizada: foi criado o Direito Administrativo.

Ao percorrer o caminho da história dos grandes pensadores e estudiosos do Contratualismo, nota-se, por fim, que tal construção foi de fundamental importância para o aparecimento e desenvolvimento do Direito administrativo. E, apesar das mudanças ocorridas com o passar do tempo, os preceitos das Teorias Constratualistas ainda hoje se refletem e continuam a influenciar a Administração contemporânea e o Direito Administrativo.

Em outras palavras, pode-se afirmar que o Direito Administrativo é decorrência da construção histórica e reflete os traços fundamentais das teorias estudadas, de forma que visa justamente garantir os direitos do cidadão contra a arbitrariedade estatal. Desta forma, o Direito Administrativo termina sendo reflexo principalmente da construção que se originou com a Revolução Francesa e, posteriormente, com a visão do Conselho de Estado francês.

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REFERÊNCIAS

ABRAÃO, R.M.Z.B. Justiça como Ordem: O Contrato Social e a análise crítica da realização da justiça e da igualdade na modernidade. Direito & Justiça, Porto Alegre, v. 33, n. 2, p. 211-230, dezembro, 2007.

BANDEIRA DE MELLO, C. A. Curso de Direito Administrativo. 33. Ed. São Paulo 2016.

BERWIG, A. A perspectiva imaginária do direito como uma dimensão do

mundo humano: desdobramentos para o ensino jurídico. 2017. 193 p. Tese

(Doutorado em Educação nas Ciências). Unijuí, Ijuí, 2017.

BOBBIO, N; MATTEUCCI, N; PASQUINO, G. Dicionário de Política. trad. Carmen C. Varriale et all. 1. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1998. FRANÇA. Declaração de direitos do homem e do cidadão. 1789. Disponível em: <http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-à- criação-da-Sociedade-das-Nações-até-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html>. Acesso em: 10 nov. 2018.

HOBBES, T. Leviatã: Os pensadores. trad. João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

LENZA, P. [org.]. OAB primeira fase. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2018. LOCKE, J. Dois tratados sobre o governo. trad. Julio Fischer. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

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MENDONÇA, H. K. Direitos de Geração e Revolução Liberal: O Iluminismo como fonte de Direitos Fundamentais. 2010. Disponível em:

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OLIVEIRA, R. N. Do estado moderno ao estado constitucional. Algumas considerações. Revista Eletrônica Direito e Política, Itajaí, v.1, n. 1, 3º

quadrimestre de 2006. Disponível em: <www.univali.br\direitoepolítica>. Acesso em: 15 jun. 2018.

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REIS, M; PASCON, C. N. Direito para Administradores. São Paulo: Pioneira Thomson, 2003.

RIBEIRO, P. S. Rousseau e o contrato social. Brasil Escola. Disponível em: <https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/rousseau-contrato-social.htm>. Acesso em 25 jun. 2018.

SILVA, H. A. Hobbes, Rousseau e a Teoria Crítica: características e

consequências de uma apropriação. Tese (Doutorado). Universidade

Federal de Campinas, São Paulo, 2013.

VILALBA, H, G. O contrato social de Jean-Jacques Rousseau: uma análise para além dos conceitos. Revista Eletrônica de Pesquisa na Graduação em

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