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O Direito da Concorrência: Estudo Comparativo entre a Legislação Brasileira e Sul-Africana

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS – CCJ

Antonieta Naomi Bazan

O Direito da Concorrência: Estudo comparativo entre a Legislação Brasileira e

Sul-Africana

Florianópolis 2019

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Antonieta Naomi Bazan

O DIREITO DA CONCORRÊNCIA:

ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E SUL-AFRICANA

Trabalho de Conclusão do Curso de

Graduação em Direito do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito para obtenção do Título de Bacharel em Direito

Orientador: Prof. Dr. Everton das Neves Gonçalves

Florianópolis 2019

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Antonieta Naomi Bazan

O DIREITO DA CONCORRÊNCIA: ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E SUL-AFRICANA

Este Trabalho Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do Título de bacharel e aprovado em sua forma final pelo Programa de Graduação em Direito.

Local, 2 de julho de 2019.

________________________ Prof. Humberto Pereira Vecchio, Dr.

Coordenador do Curso

Banca Examinadora:

________________________ Prof. Everton das Neves Gonçalves, Dr.

Orientador

Universidade Federal de Santa Catarina ________________________

Me. Lisandro Fin Nishi

Universidade Federal de Santa Catarina ________________________

Carolina Just Bacha

Universidade Federal de Santa Catarina

________________________ Amanda Karolini Burg

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Para João, Ery e Antonieta, a tríade que me ensinou a importância do amor e da luta.

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“Unless someone like you cares a whole awful lot, nothing is going to get better. It’s not.” (Dr. Seuss, 1971)

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão busca, pelo método dedutivo-comparativo, analisar as legislações concernentes à concorrência nas nações brasileira e sul-africana, sendo que a primeira é analisada pela ótica do processo administrativo e a segunda, pelo Poder Judiciário. Os principais marcos teóricos utilizados foram os pensamentos de Paula Forgioni e Ana Frazão. Foi investigada, de forma breve, a história geral no que diz respeito ao Direito da Concorrência, assim como os acontecimentos recentes em ambos os países, particularmente no que compete as questões econômicas para compreender a formação de ambas as Leis. O primeiro Capítulo ficou a cargo de apresentar a lei antitruste brasileira e o segundo a sul-africana. Em seu zênite, o trabalho buscou explorar as semelhanças e diferenças entre os dois sistemas e concluiu que o Competition Act sul-africano demonstra ser mais prático e final, pois a análise, desde o princípio, pelo Judiciário, torna este mais apto e familiarizado com um complexo assunto.

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ABSTRACT

This project intents, through the deductive and comparative methods, analyse legislations concerning competition in the nations of Brazil and South Africa, the first being submitted to the administrative process and the latter to the Judiciary. The main theories approached were the reasonings of Paula Forgioni and Ana Frazão. General history regarding competition law was briefly investigated, as well as recent events in both countries were investigated, especially concerning their economic aspects, in order to comprehend what led to current legal scenarios. The first chapter took charge in presenting the Brazilian antitrust legislation e the second, the South-African. In its zenith, the project aimed explore similarities and differences between the two systems and concludes that the South-African Competition Act demonstrated being the most practical and final, since the analysis, from the beginning, is made by the Judiciary, molding it to be more apt and familiarized with such complex matters.

Keywords: Competition Law. Brazil. South Africa. Legislation.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Esquema do Processo Admnistrativo para Atos de Concentração. ... 45 Figura 2 - Renda média anual do agregado familiar por grupo populacional do(a) chefe do núcleo...56 Figura 3 - Figuras comparativas na decisão de fusões no curso de dois anos. ... 79

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LISTA DE ABREVIATURAS

ANC African National Congress (“Congresso Nacional Africano”) Cade Conselho Administrativo de Defesa Econômica

CC Constitutional Court (“Corte Constitucional”)

GEAR Growth, Employment and Redistribution (“Crescimento, Emprego e Redistribuição”)

IED Investimento Estrangeiro Direto LaE Law and Economics

RDP Reconstruction and Development Programme (“Programa de Reconstrução e Desenvovimento”).

SBDC Sociedade Brasileira de Defesa da Concorrência

SCA Supreme Court of Appeal (“Suprema Corte de Apelação”) Seae Secretaria de Acompanhamento Econômico

Sefel Secretaria de Acompanhamento Fiscal, Energia e Loteria

Seprac Secretaria de Promoção da Produtividade e Advocacia da Concorrência

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 13

2 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA DE DIREITO DA CONCORRÊNCIA ... 15

2.1 SÍNTESE DA HISTÓRIA DO DIREITO DA CONCORRÊNCIA NO MUNDO 15 2.1.1 O Mundo Antigo... 15

2.1.2 Idade Média: As Corporações De Ofício, Embriões Do Capitalismo ... 16

2.1.3 Mercantilismo: As Grandes Navegações, O Novo Mundo E A Expansão Do Capitalismo Comercial ... 17

2.1.4 A Idade Moderna: Tempos Modernos, Práticas Antigas ... 17

2.1.5 Século XIX: O Sherman Act ... 19

2.2 O DIREITO DA CONCORRÊNCIA NO BRASIL ... 21

2.2.1 A (Suposta) Congênita Descontitucionalidade Do Direito Da Concorrência ... 23

2.2.2 Constitucionalizar Ou Descontitucionalizar? Eis A Questão ... 25

2.3 A LEI 12.529, DE 30 DE NOVEMBRO DE 2011 ... 27

2.3.1 As Finalidades ... 27

2.3.2 As Infrações Da Ordem Econômica ... 28

2.3.2.1 O Controle De Condutas ... 28

2.3.2.2 O Controle De Estruturas ... 31

2.3.2.3 Válvulas De Escape ... 33

2.3.3 Territorialidade ... 35

2.3.4 O Sistema Brasileiro De Defesa Da Concorrência... 35

2.3.4.1 O Conselho Administrativo De Defesa Da Economia – Cade ... 35

2.3.4.2 O Processo Administrativo Do Cade ... 42

2.3.4.3 O Poder Judiciário, O Ministério Público E O Cade ... 52

2.3.4.4 A Secretaria De Acompanhamento Econômico ... 53

2.3.5 Disposições Finais Acerca Do SBDC...54

3 A LEGISLAÇÃO CONCORRENCIAL DA ÁFRICA DO SUL ... 54

3.1 ANTES DO COMPETITION ACT: O APARTHEID E SUAS RAÍZES ... 54

3.2 OS REBENTOS DO APARTHEID E OS PLANOS ECONÔMICOS DA NOVA ERA ... 58

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3.3.1 Casos De Aplicação Do Ato ... 63

3.3.2 A Comissão De Concorrência, O Tribunal Concorrencial E A Corte De Apelação ... 63

3.3.3 As Práticas Proibidas ... 65

3.3.4 Controle De Fusões ... 67

3.3.5 Procedimento De Investigação E Adjudicação ... 69

3.3.6 Apelações E Revisões Para A Corte De Apelação ... 71

3.3.7 Disposições Finais Acerca Do Competition Act...71

4 COMPARANDO AS LEGISLAÇÕES ... 71

4.1 OS OBJETIVOS DAS LEIS ANTITRUSTE ... 72

4.2 O CONTROLE DE CONCENTRAÇÕES: ELUCIDAÇÕES CONCEITUAIS . 73 4.3 OS PRINCÍPIOS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO E JUDICIÁRIO E SUAS APLICAÇÕES NAS LEIS CONCORRENCIAIS ... 73

4.4 O CADE E O JUDICIÁRIO ... 75

4.5 O DIREITO DA CONCORRÊNCIA E SEU USO PARA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICA SOCIAL ... 77

5 CONCLUSÃO ... 81

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1 INTRODUÇÃO

Em meio a calorosas discussões cotidianas, o que mais se questiona é: qual o melhor caminho – político, econômico e social - a ser tomado pelo Brasil que resulte em prosperidade a seus cidadãos? A despeito de Escolas parecerem ter chegado à mágica solução, sua concretização é, evidentemente, não tão simples como se aparenta.

O Estado brasileiro, marcado ao longo de sua história por um intervencionismo menos ou mais intenso, adotou diversas medidas que viabilizassem a fiscalização das entidades privadas. Uma delas foi a construção de um Sistema que vigie a concorrência justa e plena entre empresas, com um ordenamento jurídico próprio. É a Legislação Antitruste que rege o seu funcionamento, edificada ao longo do tempo, quando se notou que, para uma estrutura de mercado eficaz, fazia-se necessária a imposição de regras entre seus atores.

É claro que a discussão acerca de tais medidas não é exclusividade nacional, pois os demais países em desenvolvimento – isto é, países recentemente industrializados ou que pertenciam ao regime socialista soviético e estão expandindo suas influências econômicas – também buscam a bonança. Resultado disso foi a visualização de parcerias e associações, como o BRICs, que uniu cinco nações emergentes: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Tendo primeira reunião formal em 2009, os governos dos cinco países vêm se encontrando anualmente.

A África do Sul foi submetida a países europeus colonizadores até o Século XX, com o início do apartheid. O País sofreu sob o regime autoritário racista do apartheid durante décadas, cujo fim veio somente nos anos 90. Assim como o Brasil em seu período ditatorial, a nação africana teve períodos de crescimento econômico, enquanto reprimia e censurava o próprio povo.

Com o fim do apartheid e ascensão do líder Nelson Mandela, a África do Sul se consolidou como República Democrática Constitucional, com legislações inteiramente voltadas para a proteção de direitos fundamentais individuais e na busca da igualdade. Dentre elas, está o Competition Act no. 89 de 1998, que, como se verá, trouxe tal redação inusitadamente voltada para questões sociais, e não somente econômicas.

Por meio do método dedutivo-comparativo, o presente trabalho busca traçar paralelos e colisões entre as legislações antitrustes do Brasil e da África do Sul e a

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atuação e eficácia de cada uma dentro dos seus sistemas jurídico-legislativos – um, país cujo direito possui uma estrutura ibérica de civil law e o outro, de influência da common law inglesa.

Inicialmente, será abordada a Legislação Antitruste Brasileira. O Capítulo inicia com uma retrospectiva geral e nacional do desenvolvimento histórico do direito da concorrência. Em seguida, passa-se para a dissecação da Lei 12.529 de 30 de novembro 2011, discutindo o seu engajamento com os controles de estrutura e de concentração.

No Capítulo seguinte, avivar-se-á rapidamente a história da África do Sul pouco antes, durante e após o regime do apartheid, para fins de contextualização econômica e social que influenciaram diretamente na construção das leis democráticas – tal qual o Competition Act.

Finalmente, conclui-se o trabalho com a comparação legislativa das duas nações no tocante aos seus sistemas de defesa da concorrência, objetivando demonstrar suas respectivas conquistas e falhas, assim como se pode extrair ensinamentos para melhorar o próprio Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC).

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2 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA DE DIREITO DA CONCORRÊNCIA

2.1 SÍNTESE DA HISTÓRIA DO DIREITO DA CONCORRÊNCIA NO MUNDO

2.1.1 O Mundo Antigo

Na cidade grega de Atenas, após retornar do seu período como chefe da academia real da Macedônia, o filósofo grego Aristóteles afirmava que “o homem é, por natureza, um animal político”1. O estudo da comunidade política era uma das

diversas disciplinas ministradas em seu liceu, além de ramos das ciências naturais e metafísicas, sendo o objeto central da obra “Política”, na qual está o que se considera o primeiro registro do termo “monopólio” na história.

No entanto, referências a práticas de concentração já datavam do código de Hamurabi. Machlup expõe os principais episódios do mundo antigo:

[...] circa 2100 a.C. – Código de Hamurabi, Rei da Babilônia, contém

referências a práticas de monopólio; 347 a.C. – A palavra monopólio é usada pela primeira vez em “Política”, de Aristóteles, em uma discussão sobre pessoas que concentravam o mercado comprando todos os lagares e ferros, vendidos posteriormente gerando maior lucro durante um período de urgente demanda; circa 160 a.C. - Cato, o Ancião, refere-se a associações entre companhias rivais para estabelecer preços monopolísticos; circa 30 d.C. – Tiberius, Imperador Romano, introduz a palavra “monopólio” em Latim em um discurso perante o Senado; circa 79 d.C. Plínio, o Ancião, naturalista romano, registra a frequência de cidadãos contra exações de monopólio; 483 d.C. – O Édito de Zenão I, imperador romano, proíbe todos os monopólios, seja criados por decreto imperial ou por ato privado, acordos e ajustes de preços; 533 a.C. – Código de Justiniano, imperador romano, contém proibição de práticas monopolísticas. (tradução nossa)2

Forgioni, ao analisar julgamentos da Grécia Antiga, conclui que as decisões eram motivadas principalmente pela ideia de “interesse público, ou seja, para o bem

1 ARISTÓTELES. Política. Tradução por C.D.C. Reeve. Indianápolis: Hackett Publishing Company, 1998. Pág. 4.

2 MACHLUP, Fritz. The Political Economy of Monopoly: Business, Labor and Government Politics. Baltimore: The Johns Hopkins Press, 1952.

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da sociedade em geral, muito antes da época moderna”3 para a decisão de incidentes

cotidianos de concentração, observando os impactos sobre a população afetada.

2.1.2 Idade Média: As Corporações De Ofício, Os Embriões Do Capitalismo

O período medieval foi extremamente relevante para as relações de mercancia, particularmente com a introdução das corporações de ofício. Enquanto a Alta Idade Média foi o florescimento da atuação de agentes econômicos privados e suas associações espontâneas e autônomas, a Baixa Idade Média se mostrou como momento de regulamentação dessas reuniões por meio dos estatutos das corporações (determinadas pelos próprios agrupamentos profissionais) e o sistema de Comunas medievais, estabelecidas pelos governantes, como controle externo das corporações.4

Frazão defende que a icônica ascensão de tais institutos reflete a face consciente e deliberada da construção do Direito Comercial pelos próprios agentes mercantis, e não simplesmente um fenômeno “natural”. Assim:

[...] os mercados mercantis apenas existiram em razão do grande poder das corporações de mercadores, que criaram o próprio direito, garantiram seu

enforcement por meio dos tribunais de comércio e ainda asseguraram a

exclusividade da atividade comercial apenas para os comerciantes nelas inscritos.5

Ainda, a autora rebate a ideia da essência purista de laissez-faire, introduzida em especial por Adam Smith e seguidores das Escolas Liberais, comumente repudiando a interferência estatal na economia, quando, desde o princípio, o mercado como se conhece se deu graças à própria intervenção estatal-legal para seu sustento:

Com efeito, a simples instituição do modelo do mercado já exige uma estrutura legal coercitiva mínima, a fim de assegurar a propriedade, a vida e

3 FORGIONI, Paula A. Os Fundamentos do Antitruste. 4ª ed. rev., atual. e ampl.. São Paulo: RT, 2010. Pág. 42.

4 FORGIONI, Op. cit., págs. 46-48

5 FRAZÃO, Ana. Direito da concorrência: pressupostos e perspectivas. 1ª edição. São Paulo: Saraiva, 2017. Pág. 73.

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o cumprimento dos contratos. Mais do que isso, como já apontava Weber, uma ordem jurídica racional é imprescindível para garantir a segurança e a previsibilidade necessárias para a atividade econômica, bem como para a distribuição regular e coordenada de bens e de serviços, dentre outras funções.6

Vê-se aí o início do Direito Concorrencial como o conhecemos, a partir do acordo de corporações que assim decidiram para a manutenção de seu comércio.

2.1.3 Mercantilismo: As Grandes Navegações, O Novo Mundo E A Expansão Do Capitalismo Comercial

O advento do mercantilismo no início do Século XV apresentou e moldou a ideia de divisão entre monopólios lícitos e ilícitos, baseados, em especial, pelo conceito de bem comum7. Naturalmente que a política mercantilista entre metrópoles

e colônias pertenciam ao primeiro caso.

Contudo, ao final do Século XVI, a manifestação judicial a respeito dos monopólios mantidos pela Inglaterra trouxe, pela primeira vez, um assentamento de “princípios gerais da common law” em questões monopolísticas. Assim sendo:

Condenou-se a concessão do monopólio pela rainha [Elizabeth] por três principais razões que, modernamente, seriam assim identificadas: (i) prática potencial de preços de monopólio; (ii) diminuição potencial da qualidade do produto; e (iii) estabelecimento de barreiras à entrada de novos agentes econômicos.8

O mercantilismo foi, portanto, a era em que o controle de concentrações foi se tornando preocupações de governos e suas relações comerciais.

2.1.4 A Idade Moderna: Tempos Modernos, Práticas Antigas

A Revolução Industrial irrompeu e as corporações de ofício se foram; dos ateliês, os produtores foram para as fábricas. “A Riqueza das Nações” de Adam Smith

6 FRAZÃO, Direito da concorrência: pressupostos e perspectivas. Pág. 75 7 FORGIONI, Os fundamentos do antitruste. Págs. 53

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se tornou, em 1776, o marco da teoria do liberalismo econômico. Dennis afirma se tratar de “um clássico, não por ser o primeiro a enunciar os princípios fundamentais de competição e liberalismo [...]. É um clássico porque deu ao liberalismo econômico seu primeiro cálculo econômico sólido”9.

O Estado passou a ser visto por uma ótica de atuação mínima – contudo, jamais deixando de garantir a livre concorrência. Forgioni defende que, paradoxalmente, a repulsa liberal pelo poder uno soberano, dele dependeu para a manutenção dos conflitos entre agentes econômicos e repressão dos monopólios10. A autora sintetiza:

O fenômeno a que nos referimos é bem explicado por Habermas. Analisando a atividade governamental, aponta que, a fim de construir e manter o modo de produção (ou seja, o mercado), certos requisitos que viabilizavam a continuidade de sua existência hão de ser preservados. Por exemplo, o Estado deve assegurar as premissas do direito civil, como as instituições básicas da propriedade e da liberdade de contratar. Ao mesmo tempo, deve proteger o mercado contra seus efeitos autodestrutíveis mediante o controle da jornada especial de trabalho, a promulgação de normas antitruste, a estabilização do sistema monetário etc. Essas são, tipicamente, as funções do Estado liberal.11

Tal afirmação, evidentemente, não é uníssona. Machlup, figura da Escola Austríaca, é enfático ao determinar que o melhor a se fazer é fazer nada12.

Explica-se: analisando historicamente as diferentes medidas implementadas contra os monopólios, o economista exemplifica o Estatuto dos Monopólios da Inglaterra em 1624 como um grande sucesso no controle de monopólios, definindo-o como “uma mera proibição de concessão de monopólios pela Coroa”13.

A leitura do referido Estatuto demonstra, no entanto, que as medidas da época vão além de uma simples omissão, porquanto o documento foi um marco em termos de regulação dos institutos do monopólio e da patente, nas modalidades regional14 e

9 DENNIS apud FORGIONI, Op. cit. Pág. 59 10 FORGIONI, Op. cit. Pág. 63-64

11 FORGIONI, Op. cit. Pág. 68.

12 “The most effective kind of action government can take against monopoly is to stop intervening against competition”. (The Political Economy of Monopoly, pág. 183).

13 MACHLUP, The Political Economy of Monopoly. Pág. 183.

14 “Provided alsoe, That this Act or any thing therein contayned shall not in any wise extend or be prejudicial unto the City of London, or to any Cittie Borough or Towne Corporate within this Realme

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condicional15. É um dos produtos da realidade mercantilista e um dos movimentos do

Estado para sua manutenção.

2.1.5 Século XIX: O Sherman Act

Em meio ao assentamento das Revoluções Industriais e o cenário maquinário do crepúsculo do século XIX, em uma antiga colônia do Novo Mundo, filha prodígio do capitalismo mercantil e com então pouco mais de um século de independência, começou a surgir a preocupação com a insatisfação de variados setores da sociedade perante a concentração de capital nas mãos de poucos agentes econômicos. O Sherman Act, promulgado em 1890 nos Estados Unidos, é tido como emblema na história da legislação antitruste, bem como sua vinda fazia parte do prelúdio da chamada Depressão de 189316. O tenebroso cenário, contudo, não era aparente.

Whitten relata que, na época:

Falências declinaram e os passivos de empresas falidas havia caído em 40 porcento. A posição do país no comércio internacional melhorou. Durante o final do século XIX, os Estados Unidos tinham uma rede negative de dívidas. Taxas de passageiro e bagagem pagas a navios estrangeiros que carregavam a maior parte o comércio marítimo americano, custos de seguro, gastos de turistas no exterior, e retornos para investidores estrangeiros mais que compensam o efeito de um saldo positivo de mercadorias. (tradução nossa)17

[...]”. (INGLATERRA, Statue of Monopolies, 1623. Section IX. Disponível em <

http://www.legislation.gov.uk/aep/Ja1/21/3 > Acesso em 12 de abril de 2019.

15 “Provided alsoe That any Declaracion before mencioned shall not extend to any tres Patents and Graunt of Privilege for the tearme of fowerteene yeares or under, hereafter to be made of the sole working or makinge of any manner of new Manufactures within this Realme, to the true and first Inventor and Inventors of such Manufactures, which others at the tyme of makinge such tres Patents and Graunts shall not use, soe as alsoe they be not contrary to the Lawe nor mischievous to the State, by raisinge prices of Commodities at home, or hurt of Trade, or generallie inconvenient; the said fourteene yeares to be from the date of the first tres Patents or Grant of such priviledge hereafter to be made, but that the same shall be of such force as they should be if this Act had never byn made, and of none other” (Statue of Monopolies, Section I.).

16 O Sherman Act não foi a primeira legislação concorrencial no mundo, porquanto,

contemporaneamente, a Áustria já possuía diplomas que regulavam acordos de cartéis. Na América do Norte, o Canadá decretou seu primeiro dispositivo legislativo em 1889.

17 WHITTEN, David O. The Depression of 1893. Disponível em <

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No entanto, a deflação era presente nos anos que se seguiram à Guerra Civil. O nível de desemprego excedeu dez porcento durante 5 anos consecutivos18. O

“padrão ouro e a política monetária, o subconsumo, a grande insolação econômica [...] e a extravagância do governo”19 são elementos considerados por Whitten que

levaram a uma estagnação e consequente recessão econômica.

Simultaneamente, em variados setores da economia, seguindo o exemplo dos responsáveis pela construção das estradas de ferro, em rápida expansão na época, formaram-se cartéis, que não obtiveram sucesso em função da instabilidade de partes que descumpriam seus acordos20. Assim, os agentes econômicos recorreram aos

trustes:

O industrial transferia a um trustee o poder derivado de suas ações, recebendo, em contrapartida, um trust certificate. Os trustes, então, proporcionavam a administração centralizada dos agentes econômicos que atuavam no mesmo mercado, impedindo, de maneira segura e estável, que a concorrência se restabelecesse entre eles.21

O exemplo de maior relevância foi o trust Standard Oil no Estado de Ohio, celebrado em 1882, administrado pelo homem mais rico da Idade Moderna, John Davidson Rockefeller Sr.

Entre 1870 e 1890, o número de fazendas cresceu em 80% e 29% dos fazendeiros estavam com suas propriedades hipotecadas22. A expansão abrupta das

produções agrícolas não lidou com facilidade a eminência da competição advinda de países como Índia e Egito, resultando em uma queda nos preços dos produtos americanos23, assim como a mecanização da produção24. No estado de Kansas, o

milho chegou ao valor de 10 cents o alqueire, metade do custo estimado para a produção. Cherny descreve que “fazendeiros que pegaram [crédito] emprestado para

18 WHITTEN, David O. Op. cit.

19 WHITTEN, David O. The Depression of 1893. 20 FORGIONI. Os fundamentos do antitruste. Pág. 72 21 FORGIONI. Op. cit. Pág. 73

22 WHITTEN, David O. The Depression of 1893. 23 WHITTEN, David O. Op. cit.

24 CHERNY, Andrei. The Next Deal: The Future of Publica Life in The Information Age. New York: Basic Books, 2000. Pág. 24.

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financiar suas esperanças pelo antigo Sonho Americano foram enterrados por rápidos acúmulos de débitos”25.

Os trustes lucravam e cresciam, o número de empresas diminuía e mais e mais partes da população ficavam às suas mercês, isto é, consumidores, pequenos agentes e, especialmente, agricultores.

A nível global, Polanyi documenta o desenvolvimento do questionamento da política antirregulatória liberal pura ao fim do Século XIX, em que rebate a ideia de um “ataque antiliberal”, visto tratar-se unicamente das “fraquezas e perigos inerentes” ao referido sistema de mercado26. Em meio a regulações garantistas aos trabalhadores

e políticas públicas, não foi coincidência que até os próprios liberais demandavam “regulamentações e restrições, por leis e compulsão, argumentando, como o faria qualquer ‘coletivista’, que a liberdade de contrato estava sendo ‘abusada’ por sindicados ou corporações, qualquer que fosse o caso”27.

Em 1888, o compromisso com a regulamentação do poder econômico conduziu as eleições presidenciais norte-americanas, e o projeto apresentado pelo Senador John Sherman já estava em discussão no Congresso. Forgioni afirma que sua promulgação, no entanto, foi alvo de várias críticas principalmente pela sua “vagueza”, pois “não continha regras que disciplinassem o processo de concentração de empresas”28. Outras propostas emergiram e se encaminhou para o aperfeiçoamento

da regulamentação da concorrência.

2.2 DIREITO DA CONCORRÊNCIA NO BRASIL

O Brasil sofreu uma industrialização tardia e compulsória a partir da década de 30, porquanto o modelo exclusivo exportador sofreu impacto grave com a Grande Depressão de 192929. Frazão demonstra que, a despeito de não haver menção

expressa acerca do direito da concorrência na Constituição de 1934, já existia, por

25 CHERNY, Andrei. Op. cit. Pág. 24.

26 POLANYI, Karl. A grande transformação. 2ª edição. Rio de Janeiro: Compus, 2000. Pág. 177. 27 POLANYI, Op. cit, pág. 180.

28 FORGIONI, Os fundamentos do antitruste, pág. 76.

29 VICECONTI, Paulo Eduardo V. O processo de industrialização brasileira. Revista de Administração de Empresas. vol.17 no.6 São Paulo Nov./Dec. 1977. Disponível em <

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-75901977000600003 >. Acesso em 22 de abril de 2019.

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parte de renomados juristas, preocupação com a regulação para manutenção da livre concorrência bem como questões sociopolíticas30.

O Decreto-lei n. 869 de 1938, pode ser considerado a primeira legislação formal antitruste no Brasil. A despeito de prever “como crime a prática de monopólios, artifícios, fraudes, abusos contra a economia popular e usura”, não chegou a ser totalmente implementado pela “falta da criação de um órgão especializado para o combate de tais ilícios”31.

A Lei Malaia – nome popular do Decreto-lei n. 7.666, de 1945 – pode ter sido aquela com mais relevância da regulamentação da concorrência no País, porquanto sob sua vigência foi estruturada a Comissão Administrativa de Defesa Econômica (Cade). Frazão a define como:

’órgão autônomo com personalidade jurídica’ dotado de poderes para intervir sobre as empresas envolvidas em atos contrários à economia nacional, inclusive através de interdições e desapropriações, bem como para realizar o controle de fusões, de incorporações e de dissoluções de empresas de qualquer setor da economia32.

Cordovil et al. argumentam em favor da convergência do desenvolvimento da política industrial com a Legislação Concorrencial Nacional, em que a primeira tem “o papel de promover ações cooperativas que fomentem a competitividade privada” e a segunda o de “manter o vigor competitivo33. No Brasil, os diferentes cenários

econômicos tiveram interações distintas com o direito da concorrência:

Até o presente contexto, defensores de uma visão mais intervencionista do Estado (pró-políticas industriais) e entusiastas de uma abordagem mais liberalizante (pró-livre concorrência) puderam apostar na incompatibilidade da defesa da concorrência com as medidas de políticas industrial. [...] a história brasileira garantiu a ambos os campos uma alternância institucional. No período desenvolvimentista (1950-80), os planos estatais de desenvolvimento, dirigidos à criação da capacidade produtiva brasileira, significaram, na prática, a exclusão de alguns setores à lógica concorrencial.

30 FRAZÃO, Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas, págs. 33-34. 31 FRAZÃO, Direito da concorrência: Pressupostos de perspectivas, pág. 34. 32 FRAZÃO, Op. cit., pág. 35.

33 CORDOVIL, Leonor et al. Nova Lei de Defesa da Concorrência Comentada: Lei 12.529, de 30 de

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Já no período inaugurado pelas reformas liberalizantes da década de 1990, o Estado se retraiu e substituiu sua postura pró-ativa por uma intervenção prioritariamente defensiva. Este movimento foi sustentado por uma nova lei concorrencial (Lei 8.884/1994), que impulsionou o controle das fusões e aquisições34.

Conclui-se então que a emergência do Sistema Concorrencial Nacional acompanhou as tendências político-econômicas que assolavam. Disso surge a discussão da constitucionalidade ou não do Direito da Concorrência, que se irá discutir a seguir.

2.2.1 A (Suposta) Congênita Desconstitucionalidade Do Direito Da Concorrência

A Carta Magna de 1946 previa explicitamente em seu art. 148 que:

a lei reprimirá toda e qualquer forma de abuso do poder econômico, inclusive as uniões ou agrupamentos de empresas individuais ou sociais, seja qual for a sua natureza, que tenham por fim dominar os mercados nacionais, eliminar a concorrência e aumentar arbitrariamente os lucros.35

Com tal positivação, o deputado Agamenon Magalhães, entusiasta e disseminador da concepção de uma legislação antitruste, apresentou seu projeto de lei de regulamentação em 1948, que só daria frutos quatorze anos mais tarde, com a Lei n. 4.31736.

A lei, no entanto, teve sua eficácia sufocada pelo regime militar, que foi “favorável à concentração empresarial e à formação de conglomerados”37. Frazão

afirma que, em vários momentos da história nacional, a política antitruste teve oportunidades para se aproximar dos preceitos constitucionais, mas que foi afastada

34 CORDOVIL, Nova Lei de Defesa da Concorrência Comentada: Lei 12.529, de 30 de novembro de

2011. Pág. 24.

35 BRASIL. Constituição Dos Estados Unidos Do Brasil (de 18 de Setembro de 1946). Diário Oficial da União: Poder Legislativo. Rio de Janeiro, RJ, 1946.

36 BAPTISTA, Luiz Olavo. Origens do Direito da Concorrência. Disponível em <

http://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/viewFile/67325/69935 >. Acesso em 28 de abril de 2019. 37 FRAZÃO, Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas. Pág. 37.

(24)

em função da atuação concentracionista estatal, no caso do período ditatorial, ou pela interpretação à luz da Escola de Chicago da lei pós-redemocratização de 1994, o Diploma 8.88438. A lei foi responsável por transformações significativas no Direito da

Concorrência nacional, transformando o CADE em autarquia federal e instituindo o SBDC como é hoje.

Schuartz elabora que o Direito da Concorrência no Brasil sempre esteve à margem das Constituições, no sentido que as teorias e decisões consolidadas se estruturaram por meio de uma estratégia top-down39, particularmente por meio de três

aspectos: a “natureza político-institucional” de uma “singular política pública de controle mais intrusivo do Judiciário”, permitindo que teorias se desenvolvessem antes da aplicação nos casos concretos e “ferramentas conceituais e analíticas para a sua aplicação tecnicamente consistente já estavam relativamente difundidas”; o “referencial normativo” dos Estados Unidos; e a influência determinante de economistas40.

O autor propõe que a teoria normativa top-down institucionalizou o direito da concorrência no país, e mais, revolucionou-o, especialmente no seu aspecto metodológico41. A teoria normativa do direito da concorrência seria uma teoria

consequencialista, tanto no seu aspecto amplo42 quanto restritivo43.

38 FRAZÃO, Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas. Pág. 38.

39 Richard Posner descreve o raciocínio jurídico top-down (“cima para baixo”) em que “o juiz ou outro analista legal inventa ou adota a teoria a respeito de uma disciplina do direito – talvez sobre todo o direito – e a usa para organizar, criticar, aceitar ou rejeitar, explicar ou descartar, distinguir ou ampliar as decisões existentes para fazê-las se conformarem com a teoria e gerar um resultado em cada novo caso que será consistente com a teoria e com os casos canônicos, isto é, casos aceitos como impositivos dentro da teoria. [...] No raciocínio bottom-up (“baixo para cima”) [...] se inicia com palavras de um código ou decreto, ou com um caso ou uma massa de casos, e se move a partir daí [...]. Os raciocínios jamais se encontram” (tradução livre). (POSNER, Richard A. Legal Reasoning From the Top Down and From the Bottom Up: The Question of Unenumerated Constitucional Rights. Chicago Unbound. Chicago: University of Chicago Law Review, 59, págs. 433-450.)

40 SCHUARTZ, Luis Fernando. A Desconstitucionalização do Direito da Defesa da Concorrência. Disponível em <

https://direitorio.fgv.br/sites/direitorio.fgv.br/files/file/A_Desconstitucionaliza%C3%A7%C3%A3o_Do_D ireito_Da_Concorr%C3%AAncia.pdf >. Acesso em 09 de maio de 2019. Págs. 9-10.

41 SCHUARTZ, Op. cit, págs. 10-11.

42 Schuartz explica, substituindo aspectos jurídico-processuais – propriedades normativas, decisões possíveis, etc. – por variáveis, expondo a teoria normativa como um cálculo. A partir daí, demonstra que “[...] uma determinada teoria jurídica será consequencialista se algum dos critérios de correção (jurídica) definidos na teoria em questão para avaliação de decisões (jurídicas) for ‘monotonicamente sensível’ às consequências das decisões.” (Op. cit., pág. 11).

43 “[...] no sentido da supremacia do critério relativo à valoração de consequências sobre os demais critérios de correção eventualmente considerados como relevantes”. (Op. cit., pág. 12).

(25)

2.2.2 Constitucionalizar Ou Descontitucionalizar? Eis A Questão

Em suma, Schuartz afirma que o fato de ser um ramo jurídico “desconstitucionalizado”, não implica que seja “inconstitucional”44 e defende que a

busca de determinados doutrinadores objetivando uma “constitucionalização colonizadora” – que denominou de Teoria Alternativa, em oposição à top-down Teoria Original - levaria a modificações nos campos semântico e metodológico. A Teoria Original “procura determinar premissas normativas e decisões a partir da maximização de um único objetivo normativo (e.g., a soma dos excedentes do consumidor e do produtor) diretamente mensurável em unidades monetárias”45, enquanto a Teoria

Alternativa deveria, necessariamente, levar em consideração elementos principiais no caso concreto, sendo deveras complicado traduzir em uma equação plena, o que não é o caso de sua opositora.

Frazão, contudo, opõe-se a manter o direito da concorrência atrelado somente à concepção de eficiência, como propõe Schuartz, e distante das discussões de natureza constitucional. Primeiramente, argumenta que é improvável que a análise de casos jurídicos seja completamente despida de subjetividade e que “simplesmente não há meios de se delimitar as eficiências de forma absolutamente segura”, como por exemplo por conta da introdução da inovação tecnológica46. Complementa

também narrando o período de superação dos ideais da Escola de Chicago, em que houve o “reconhecimento de que os mercados são mais complexos, mais variados e com mais falhas do que supunham os economistas de Chicago, o que faz com que a confiança neles depositada seja menor, assim como intensifica o medo de estratégias anticompetitivas”47.

Em segundo lugar, a principiologia da dignidade da pessoa humana e da isonomia promulgadas pela Constituição

[...] principalmente na parte em que direciona a atividade empresarial à realização da justiça social, precisa ser levada em consideração em todas as searas da ordem econômica, dentre as quais o Direito da Concorrência. Aliás,

44 SCHUARTZ, A Desconstitucionalização do Direito da Defesa da Concorrência, pág. 15. 45 SCHUARTZ, Op. cit., pág. 18-22.

46 FRAZÃO, Op. cit., pág. 44. 47 FRAZÃO, Op. cit., pág. 45.

(26)

sobre a questão, é oportuna a advertência de Comparato de que ‘é em função desse objetivo o último de realização da justiça social que devem ser compreendidos e harmonizados os demais princípios expressos no art. 170’48.

A autora também aponta a proposta da possibilidade de o Direito da Concorrência ser um “instrumento de redução da pobreza [...] na medida que a pobreza é igualmente vista como um óbice para o empreendedorismo e o acesso aos mercados”49. sustentando a importância do vínculo do Direito da Concorrência com a

proteção ao consumidor, o estímulo e a proteção à inovação e o combate à corrupção50.

Há, ainda, posições intermediárias, que vislumbram a possibilidade de sustentar tanto o fator constitucional quanto os princípios objetivos de eficiência e racionalidade, derivados, especialmente, da Escola de Posner, ou seja, a Análise Econômica do Direito (Law and Economics ou LaE). Gonçalves assim sustenta:

Como potencialidade, para a LaE é verificável a possibilidade de formação de normas de caráter econômico e interpretação das normas em geral, sob um enfoque de racionalidade econômica, traduzindo eficiência e maximização da riqueza. [...] Através da LaE, é possível avaliar o controle jurídico interpretativo-normativo da atividade econômica. Tanto na elaboração como na interpretação da Lei, segundo a LaE, se verificam a dinamização do sistema econômico, o grau de intensidade no desenvolvimento das atividades, interação dos agentes bem como as necessidades jurídicas próprias para a eliminação dos custos sociais e externalidades, além das diversas imperfeições de mercado51.

Desse modo, autores diversos propõem resolver o impasse (se é que ele existe) entre a constitucionalidade e os propósitos econômicos do Estado Democrático Brasileiro. É importante que o Estado atue nos termos de sua Carta Magna, porém sem perder de vista porque o faz.

48 FRAZÃO, Op. cit., pág. 47.

49 FRAZÃO, Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas. Pág. 49. 50 FRAZÃO, Op. cit., pág. 52.

51 GONÇALVES, Everton das Neves. Teoria de Posner e sua aplicabilidade à Ordem Constitucional

Econômica de 1988. Florianópolis. 1997. Disponível em <

https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/106450 >. Acesso em 19 de junho de 2019. Págs. 357-358.

(27)

2.3 A LEI 12.529, DE 30 DE NOVEMBRO DE 2011

2.3.1 As Finalidades

O dispositivo legal que estrutura e rege SBDC é, nos termos do seu art. 1º, conduzido pelos princípios da liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão do abuso do poder econômico, sendo a coletividade titular dos bens jurídicos protegidos52. Evidentemente, traz-se à

luz os princípios da ordem econômica dispostos do art. 170 da Constituição53. Cordovil

et al. afirmam que a Carta Magna estabeleceu claramente “o controle das práticas anticompetitivas” como “um dos meios escolhidos para garantir os princípios constitucionais da ordem econômica arrolados no art. 170”54, assim como a

concepção de um “mercado livre” não pode ser entendida literalmente, já que todos os países adotam medidas reguladoras com maior ou menor intensidade. O que determinaria a “liberdade” é um nível máximo de tal intervenção, o qual parece não haver nenhuma55.

Os princípios se entrelaçam e se conectam, necessários para a concretização de um e do outro. A livre concorrência “induz uma distribuição de recursos a mais baixo preço” e o “acesso a bens e serviços diversos” pelo consumidor, favorecendo-o56. Os autores determinam:

52 Art. 1o Esta Lei estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência - SBDC e dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames

constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico.

Parágrafo único. A coletividade é a titular dos bens jurídicos protegidos por esta Lei.

53 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995). Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

54 CORDOVIL, Nova Lei de Defesa da Concorrência Comentada: Lei 12.529, de 30 de novembro de

2011. Pág. 45.

55 CORDOVIL, Op. cit., pág. 45-46. 56 CORDOVIL, Op. cit., pág. 47.

(28)

É claro que tais finalidades dependem também da articulação da liberdade de concorrência com outros princípios da ordem econômica na sua aplicação em casos concretos. No caso, por exemplo, da livre iniciativa nota-se que se trata de um conceito complementar ao de livre concorrência, mas essencialmente distintos. Como aponta Miguel Reale: ‘a primeira não é senão a projeção da liberdade individual no plano da produção, circulação e distribuição das riquezas, assegurando não apenas a livre escolha das profissões e das atividades econômicas, mas também a autônoma eleição dos processos ou meios julgados mais adequados à consecução dos fins visados. Liberdade de fins e de meios informa o princípio de livre iniciativa, conferindo-lhe um valor primordial, como resulta da interpretação conjugada dos citados artigos 1º e 170. Já o conceito de livre concorrência tem caráter instrumental, significando o princípio econômico segundo o qual a fixação dos preços das mercadorias e serviços não deve resultar de atos cogentes da autoridade administrativa, mas sim do livre jogo das forças em disputa de clientela na economia do mercado.57

O SBDC ainda admite certas “válvulas de escape”, de forma que, em determinadas situações, a concorrência pode se tornar mais acanhada se assim houver benefícios e análise de eficiências, sopesando suas diretrizes em jogo.

2.3.2 As Infrações Da Ordem Econômica

2.3.2.1 O Controle De Condutas

Frazão reúne três características que definem a infração antitruste: “tipicidade aberta, inexigibilidade de produção de efeitos negativos no mercado (infrações de perigo) e prescindibilidade da culpa”, elementos os quais a autora afirma que comportaria em uma abertura para uma interpretação discricionária pelo Estado58.

Portanto, é imperioso que haja uma análise técnico-jurídica minuciosa e à luz do parágrafo 4º do art. 173 da Constituição: “Art. 173 [...] § 4º A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.”

57CORDOVIL, Op. cit., pág. 48.

(29)

As infrações que a Lei busca reprimir estão expostas em seu Título V – o que Frazão59 considera como parte do controle de condutas no sistema brasileiro. O art.

36, a despeito de discriminar infrações específicas em seu parágrafo 3º - tais quais o acordo de preços de bens e serviços, provocar a oscilação de preços de terceiros, recusar a venda de bens ou prestação de serviços nas condições normais de comércio, vender mercadoria abaixo do preço de custo, etc. – seu caput e incisos manifestam que:

Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados: I – limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; II - dominar mercado relevante de bens ou serviços; III - aumentar arbitrariamente os lucros; e IV - exercer de forma abusiva posição dominante. § 1o A conquista de mercado resultante de processo natural fundado na maior eficiência de agente econômico em relação a seus competidores não caracteriza o ilícito previsto no inciso II do caput deste artigo. § 2o Presume-se posição dominante sempre que uma empresa ou grupo de empresas for capaz de alterar unilateral ou coordenadamente as condições de mercado ou quando controlar 20% (vinte por cento) ou mais do mercado relevante, podendo este percentual ser alterado pelo Cade para setores específicos da economia. (grifo nosso)

Caracterizados pela tipicidade aberta, note-se que os ilícitos acima mencionados estão vinculados aos seus efeitos. Contrariamente ao campo penal, por exemplo, não há tipicidade e descrição exata das condutas a serem punidas. É, como posto por Forgioni, um rol exemplificativo, e não há uma “infração per se”, devendo ser declaradas ilícitas os atos com “efeitos abusivos ou anticompetitivos”60. É o que

se denomina rule of reason ou “regra da razão”.

Por isso, Frazão destaca a importância do diálogo entre direito e economia na análise do que chama de “condutas por efeito” para estudar “a racionalidade ou os propósitos de determinadas condutas, bem como para compreender os efeitos positivos e negativos que delas decorrem”61.

59 FRAZÃO, Op. cit., pág. 252.

60 FORGIONI, Os fundamentos do antitruste. Pág. 136.

(30)

Mattos retrata a expressão “mercado relevante”, a partir de uma visão individualizada, isto é, identificando agente e concorrentes, descrevendo-a:

É a partir desse mercado relevante construído que irá se definir o

market-share de cada um dos agentes e, por conseguinte, os presumíveis efeitos

anticoncorrenciais de uma concentração ou as possibilidades de abuso por parte de determinada empresa. No caso de um ato de concentração, quanto maior o número de empresas incluídas no mercado relevante, menor o market-share das empresas fundentes e, por conseguinte, menores, em média, os impactos negativos presumidos sobre a concorrência. Analogamente, no caso de condutas abusivas, quanto maior o número de empresas incluídas no mercado relevante da empresa acusada, menor o seu market-share e, por conseguinte, menor, na média, a capacidade presumida da mesma de empreender comportamentos anticompetitivos.62

Cumpre notar, igualmente, que se está diante de uma situação de análise a partir da responsabilidade objetiva. Nos termos de Cavalieri:

Na responsabilidade objetiva é irrelevante o nexo psicológico entre o fato ou atividade e a vontade de quem a pratica, bem como o juízo de censura moral ou de aprovação da conduta. Enquanto ‘a culpa é vinculada ao homem, o risco é ligado ao serviço, à empresa, à coisa, ao aparelhamento. A culpa é pessoal, subjetiva; pressupõe o complexo de operações do espírito humano, de ações e reações, de iniciativas e inibições, de providências e inércias. O risco ultrapassa o círculo das possibilidades humanas para filiar-se ao engenho, à máquina, à coisa, pelo caráter impessoal e o objetivo que o caracteriza’63.

É aqui que se insere a atuação do Direito Administrativo Sancionador, porquanto o Direito da Concorrência é filiado “aos postulados do Direito

62 MATTOS, Cesar. Mercado relevante na análise antitruste: uma aplicação do modelo de cidade linear. Revista IBRAC – Direito da Concorrência, Consumo e Comércio Internacional. São Paulo: Revista do

IBRAC, n. 5, p. 8-9, 1998. Disponível em <

http://www.ibrac.org.br/UPLOADS/PDF/RevistadoIBRAC/Revista5n5.pdf >. Acesso em: 15 de maio de 2019.

63 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 10ª edição. São Paulo: Atlas, 2012. Pág. 152.

(31)

Administrativo”64. Desse modo, Frazão aponta dificuldade em se aplicar punições

quando os princípios são comuns ao Direito Penal65, e, logo, dependentes de culpa.

A autora, portanto, conclui que, além do aspecto objetivo de aferição do prejuízo causado e sua reparação material, cabe também avaliar se a conduta é reprovável ou não66.

Além do controle de condutas, o SBDC impõe também a repressão e desestímulo de atos de concentração, que modificam os ideais concorrenciais do livre mercado.

2.3.2.2 O Controle De Estruturas

O controle de estruturas serve para “prevenir a formação de estruturas de mercado que causem danos ou riscos para a concorrência”67. Está abordado pelo

Título VII, “Do Controle de Concentrações”, na lei em análise. Assim dispõe o art. 88 e seus parágrafos:

Art. 88. Serão submetidos ao Cade pelas partes envolvidas na operação os atos de concentração econômica em que, cumulativamente: I - pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de reais); e II - pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais) 68. § 1o Os valores mencionados nos incisos I e II do caput deste artigo poderão ser adequados, simultânea ou

64 OLIVEIRA, Amanda Flávio de. O Direito da Concorrência e o Poder Judiciário. 1ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2002. Pág. 7.

65 FRAZÃO, Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas. Pág. 260.

66 “Entretanto, a aplicação de penas aos administrados somente pode ter por pressuposto a ação reprovável, já que aqui se está impondo uma medida aflitiva que apenas se justifica diante do ilícito, ou seja, do agir de forma contrária à esperada ou exigida pela lei. Por essa razão, a demonstração da reprovabilidade é fundamental para a aplicação de uma sanção. Basta lembrar que o princípio da culpabilidade, segundo Ferrajoli, consiste essencialmente na desqualificação da responsabilidade objetiva, reiterando a importância da reprovabilidade como condição necessária para justificar a punição do injusto”. (Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas. Pág. 266.)

67 FRAZÃO, Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas. Pág. 110.

68 Cumpre notar que, nos termos da Portaria Interministerial no. 994, de 30 de maio de 2012, os valores atualmente considerados nos casos dos incisos I e II são R$ 750.000.000,00 (setecentos e cinquenta milhões de reais) e R$ 75.000.000,00 (setenta e cinco milhões de reais), respectivamente.

(32)

independentemente, por indicação do Plenário do Cade, por portaria interministerial dos Ministros de Estado da Fazenda e da Justiça. § 2o O controle dos atos de concentração de que trata o caput deste artigo será prévio e realizado em, no máximo, 240 (duzentos e quarenta) dias, a contar do protocolo de petição ou de sua emenda. § 3o Os atos que se subsumirem ao disposto no caput deste artigo não podem ser consumados antes de apreciados, nos termos deste artigo e do procedimento previsto no Capítulo II do Título VI desta Lei, sob pena de nulidade, sendo ainda imposta multa pecuniária, de valor não inferior a R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) nem superior a R$ 60.000.000,00 (sessenta milhões de reais), a ser aplicada nos termos da regulamentação, sem prejuízo da abertura de processo administrativo, nos termos do art. 69 desta Lei. § 4o Até a decisão final sobre a operação, deverão ser preservadas as condições de concorrência entre as empresas envolvidas, sob pena de aplicação das sanções previstas no § 3o deste artigo. § 5o Serão proibidos os atos de concentração que impliquem eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante, que possam criar ou reforçar uma posição dominante ou que possam resultar na dominação de mercado relevante de bens ou serviços, ressalvado o disposto no § 6o deste artigo. [...]

Segundo Frazão, há três tipos principais de concentrações:

(i) concentrações horizontais, quando ocorrem entre concorrentes no(s) mesmo(s) mercado(s) de produtos ou serviços; (ii) concentrações verticais, quando ocorrem entre não concorrentes, mas que atuam na mesma Cadeia econômica; e (iii) conglomerados, quando ocorrem entre não concorrentes que atuam em mercados distintos e não relacionados.69

A Lei 12.529/2011, em seu art. 90, identifica as seguintes hipóteses de concentração:

Art. 90. Para os efeitos do art. 88 desta Lei, realiza-se um ato de concentração quando: I - 2 (duas) ou mais empresas anteriormente independentes se fundem; II - 1 (uma) ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma

(33)

ou outras empresas; III - 1 (uma) ou mais empresas incorporam outra ou outras empresas; ou IV - 2 (duas) ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture. Parágrafo único. Não serão considerados atos de concentração, para os efeitos do disposto no art. 88 desta Lei, os descritos no inciso IV do caput, quando destinados às licitações promovidas pela administração pública direta e indireta e aos contratos delas decorrentes.

Os incisos I e III tratam de “operações de compenetração societária”, envolvendo a criação e extinção de pessoas jurídicas. A segunda hipótese trata de quaisquer aquisições de controle, bem como as aquisições de ativos. Por fim, o inciso IV se refere a contratos associativos lato sensu70. O dispositivo também realiza

ressalvas quanto aos contratos realizados pelo Estado.

2.3.2.3 As Válvulas De Escape

Forgioni implica que “é necessário [...] que Lei Antitruste contenha meios técnicos que permitam à realidade permear o processo de interpretação/aplicação das normas nela contidas” e que “estes meios técnicos” se denominam “válvulas de escape”71. Ou seja, a lei Antitruste autoriza, em certos casos, atos a priori

anticoncorrenciais se trouxerem benefícios a ponto de que, se forem opostos, podem, de forma violenta, impactar negativamente a economia.

Legalmente, foram assim dispostas as possibilidades de aceitação de atos de concentração elencados anteriormente:

Art. 88 [...] § 6o Os atos a que se refere o § 5o deste artigo poderão ser autorizados, desde que sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os seguintes objetivos:

I - cumulada ou alternativamente: a) aumentar a produtividade ou a competitividade; b) melhorar a qualidade de bens ou serviços; ou c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico; e II - sejam repassados aos consumidores parte relevante dos benefícios decorrentes.

70 FRAZÃO, Op. cit., pág. 121.

(34)

Forgioni também argumenta que o próprio conceito elástico de “mercado relevante” pode ser considerado como uma segunda válvula de escape, porquanto “a operação de determinado mercado relevante, normalmente o primeiro passo na análise de uma prática antitruste, possibilita a flexibilização do texto normativo, colocando-o a serviço da política a ser implementada”72.

2.3.3. Territorialidade

A lei admite não só a sua intervenção em casos que tenham se dado em território nacional, mas também que tiverem repercussões sobre ele73. Reputa as

empresas estrangeiras como “domiciliadas” as que tiverem filial, agência, sucursal, escritório, estabelecimento, agente ou representante no Brasil, sendo notificadas e intimadas dos atos processuais por meio destes74.

Talvez o maior desafio seja alcançar os casos de práticas anticoncorrenciais fora do território nacional. A respeito, Cordovil et al. elaboram:

[...] o critério dos efeitos acaba por estender a jurisdição de um país sobre atos que não foram praticados em seu território e sobre pessoas que não residem ou são sediadas neste país. Algumas jurisdições, como a norte-americana, são conhecidas por sua longa manus, ou seja, por aplicar sua legislação, de forma feroz, além dos limites de seu território.75

A despeito de casos de cartéis internacionais já foram abordados e condenados pelo Brasil, ainda não é pacífica a sua aplicação.

2.3.4 O Sistema Brasileiro De Defesa Da Concorrência

72 FORGIONI, Op. cit., pág. 229.

73 Art. 2o Aplica-se esta Lei, sem prejuízo de convenções e tratados de que seja signatário o Brasil, às práticas cometidas no todo ou em parte no território nacional ou que nele produzam ou possam produzir efeitos.

74Art. 2º [...] § 1o Reputa-se domiciliada no território nacional a empresa estrangeira que opere ou tenha no Brasil filial, agência, sucursal, escritório, estabelecimento, agente ou representante. § 2o A empresa estrangeira será notificada e intimada de todos os atos processuais previstos nesta Lei, independentemente de procuração ou de disposição contratual ou estatutária, na pessoa do agente ou representante ou pessoa responsável por sua filial, agência, sucursal, estabelecimento ou escritório instalado no Brasil.

75 CORDOVIL, Nova Lei de Defesa da Concorrência Comentada: Lei 12.529, de 30 de novembro de

(35)

O SBDC é formado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e pela antiga Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda76.

Esta última foi extinta e hoje foi substituída por duas novas secretarias: a Secretaria de Acompanhamento Fiscal, Energia e Loteria (Sefel) e Secretaria de Promoção da Produtividade e Advocacia da Concorrência (Seprac).

2.3.4.1 O Conselho Administrativo De Defesa Da Economia – Cade

Protagonista nas discussões acerca de Direito da Concorrência, o Cade é autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça77, constituído, inovadoramente,

por três órgãos: o Tribunal Administrativo de Defesa Econômica, a Superintendência-Geral e o Departamento de Estudos Econômicos78. A despeito de existir desde 1962,

o Cade passou por reformas e reestruturações, de forma que adquiriu uma atuação mais eficaz ao longo dos anos79.

O Tribunal Administrativo80 é o órgão judicante, composto de um Presidente e

seis Conselheiros, com mandatos de quatro anos, não coincidentes e vedada a

76 Na presente gestão presidencial, incorporado pelo Ministério da Economia, juntamente com os Ministérios de Planejamento, parte do Trabalho e de Indústria, Comércio Exterior e Serviços. (ZANLORENSSI, Gabriel et al. A composição dos ministérios no governo Bolsonaro. Nexo Jornal. 31/12/2018, atualizado em 02/01/2019. Disponível em <

https://www.nexojornal.com.br/grafico/2018/12/31/A-composi%C3%A7%C3%A3o-dos-minist%C3%A9rios-no-governo-Bolsonaro >. Acesso em 14 de maio de 2019.)

77 Art. 4o O Cade é entidade judicante com jurisdição em todo o território nacional, que se constitui em autarquia federal, vinculada ao Ministério da Justiça, com sede e foro no Distrito Federal, e competências previstas nesta Lei.

78 Art. 5o O Cade é constituído pelos seguintes órgãos: I - Tribunal Administrativo de Defesa Econômica; II - Superintendência-Geral; e III - Departamento de Estudos Econômicos. 79 CORDOVIL et al., Nova Lei de Defesa da Concorrência Comentada: Lei 12.529, de 30 de

novembro de 2011. Pág. 67.

80 Art. 6o O Tribunal Administrativo, órgão judicante, tem como membros um Presidente e seis Conselheiros escolhidos dentre cidadãos com mais de 30 (trinta) anos de idade, de notório saber jurídico ou econômico e reputação ilibada, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovados pelo Senado Federal. § 1o O mandato do Presidente e dos Conselheiros é de 4 (quatro) anos, não coincidentes, vedada a recondução. § 2o Os cargos de Presidente e de Conselheiro são de dedicação exclusiva, não se admitindo qualquer acumulação, salvo as constitucionalmente permitidas. § 3o No caso de renúncia, morte, impedimento, falta ou perda de mandato do Presidente do Tribunal, assumirá o Conselheiro mais antigo no cargo ou o mais idoso, nessa ordem, até nova nomeação, sem prejuízo de suas atribuições. § 4o No caso de renúncia, morte ou perda de mandato de Conselheiro, proceder-se-á a nova nomeação, para completar o mandato do substituído. § 5o Se, nas hipóteses previstas no § 4o deste artigo, ou no caso de encerramento de mandato dos

Conselheiros, a composição do Tribunal ficar reduzida a número inferior ao estabelecido no § 1o do art. 9o desta Lei, considerar-se-ão automaticamente suspensos os prazos previstos nesta Lei, e suspensa a tramitação de processos, continuando-se a contagem imediatamente após a recomposição do quorum.

Referências

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