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Centro cultural Mafalala

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Academic year: 2021

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CENTRO CULTURAL MAFALALA

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Título | Centro Cultural Mafalala

Subtítulo | A Cultura como matriz da Arquitectura

Discente | Jorge Manuel Custódio Saramago Orientador | Professor Doutor Paulo Almeida

Co-Orientador | Professora Doutora Joana Bastos Malheiro

Resumo

Maputo, capital de Moçambique, é o espelho de uma cidade em constante mudança e renovação. Marcada, não só pelas suas diferentes fases de expansão e consolidação, como também pelo crescimento exponencial, espontâneo e autónomo dos seus bairros períféricos. Apesar de duas realidades aparentemente opostas, as manchas da cidade consolidada e dos bairros peri-urbanos co-habitam numa dinâmica de interligação. É esta simbiose que é alvo de análise no primeiro ponto de estudo do presente projecto final de Mestrado.

A análise desta dualidade, baseia-se e manifesta-se na requalificação do Bairro da Mafalala. Local onde nasceram e cresceram diversas personalidades moçambicanas, que contribuíram para o enriquecimento cultural do país. A identidade do bairro origina a proposta apresentada neste projecto. Este, assume um carácter evolutivo, com base nas dinâmicas de construção e organização autónomas já existentes nas ruas da Mafalala, provenientes dos seus habitantes. É ainda explorada a potencialidade do bairro, enquanto elemento híbrido, para que possa atenuar a dualidade que perpetua.

Palavras Chave

Moçambique; Mafalala; (Re)desenho Urbano; Cultura; Identidade;

Mestrado Integrado em Arquitectura

Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa Lisboa, Março 2019

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Title | Mafalala Cultural Centre

Sub title |Culture as the matrix of Architecture

Student | Jorge Manuel Custódio Saramago

Advisor | Professor Doutor Paulo Almeida

Co-Advisor | Professora Convidada Joana Bastos Malheiro

Abstract

Maputo, capital of Mozambique, reflects a city in constant change and renewal. Marked, not only by the different phases of developing “formal” city, but also, by the exponential, spontaneous and autonomous growth of self-constructed peri-urban neighbourhoods. Despite two seemingly opposing realities, the stain of the consolidated city and the suburban neighborhoods coexist in a dynamic of interconnection. It is this symbiosis that is the subject of analysis in the first point of study of this final Master project.

The analysis of this duality is based on and manifested in the requalification of the Mafalala neighborhood. Site where several Mozambican personalities were born and grew up, which contributed to the country's cultural enrichment. The identity of the neighborhood originates the proposal presented in this project, which assumes an evolutionary character based on the dynamics of construction and autonomous organization already existing on the streets of Mafalala, coming from its habitants. The potentiality of the neighborhood as a hybrid element is explored, so that it can attenuate the duality that it perpetuates.

Keywords

Mozambique; Mafalala; Urban (re)drawing; Culture; Identity;

Master in Architecture

Faculty of Architecture, University of Lisbon Lisbon, March 2019

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AGRADECIMENTOS

Ao Professor Paulo Almeida pela orientação, pelas conversas, pelo conhecimento e sabedoria transmitidos, pelos desafios propostos e por me ‘baralhar’ para poder chegar mais longe.

À Professora Joana Bastos Malheiro, pela incansável disponibilidade, pelas leituras, pelo carinho, generosidade e empenho ao longo de todo o trabalho.

À minha mãe, por todo o carinho e apoio prestados, por nunca me deixar ir abaixo nos momentos mais difíceis e pelas noites passadas em claro ao meu lado.

Aos meus irmãos, Ké e Ruca, pelo exemplo e inspiração que foram e por me apoiarem incondicionalmente.

À Patrícia, pelo caminho que percorremos juntos, pelas noites passadas a estudar lado a lado, pelo carinho, apoio e compreensão. Por me ter ouvido desabafar e chorar tantas vezes, sempre com uma palavra amiga. Pelas maquetes que me ajudou colar e acima de tudo, pela amizade que ficou para sempre.

À Rita e à Teresa, pela amizade, pelos momentos de partilha, pelas conversas, pela disponibilidade, pelos trabalhos de grupo em conjunto e por sere as pessoas maravilhosas que são.

Ao Filipe, à Bia, à Rita, à Duca e ao Luís, pelas conversas e críticas, pela aprendizagem conjunta e porque sem a vossa ajuda, presença e companheirismo, este percurso tinha sido bem mais difícil.

Ao Rui, à Ana e à Vanessa, porque sem vocês ao meu lado desde os 8 anos de idade, isto não tinha a mínima piada!!

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INDÍCE

INTRODUÇÃO ... 03

I | A CIDADE

– DOIS MILÉNIOS DE HISTÓRIA ... 07

1.1 O PROTO-URBANO ... 09

1.1.1 Os Assentamentos Rongas... 09

1.1.2 Os Assentamentos Portugueses ... 11

1.2 O URBANO ... 16

1.2.1 Do Presídio à Vila ... 16

1.2.2 Lourenço Marques, uma Cidade ... 22

1.2.3 A primeira metade do séc. XX ... 25

1.2.4 Do Estado Novo à Independência ... 31

1.2.5 Moçambique Independente ... 38

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II | O BAIRRO

– HISTÓRIA E ESTÓRIAS ... 45

2.1 HISTÓRIA DA MAFALALA ... 47

2.1.1 O Nascimento do Bairro ... 47

2.1.2 O Desenvolvimento e Caracterização do Bairro ... 49

2.1.3 A Transformação na Arquitectura ... 56

2.1.4 Mafalala, um Bairro PeriUrbano ... 59

2.2 ESTÓRIAS, UMA IDENTIDADE ... 64

2.2.1 Cultura, Identidade e Memória ... 64

2.3 MAFALALA, UM CENTRO DE CULTURA ... 71

A. A Música e a Literatura ... 71 B. A Dança e o Tufo ... 73 C. A Pintura ... 74 D. A Escultura ... 76 E. As Máscaras ... 78 F. A Gastronomia ... 80 G. As Capulanas ... 80 2.3.1 A IVERCA ... 82 2.3.2 O Turismo em Moçambique ... 85

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III | O PROJECTO

– CENTRO CULTURAL MAFALALA ... 87

3.1 CONTEXTO ... 89

3.2 A INTERVENÇÃO URBANA ... 90

3.2.1 Construção do Programa ... 90

A. Circulação, Vias, Praças e Espaços Públicos ... 90

B. Equipamentos ... 91 C. Percursos Urbanos ... 93 D. Mercado de Rua ... 94 E. Machambas ... 96 3.3 O EQUIPAMENTO ... 98 3.3.1 Casos de Estudo ... 100

A. Centro de Formação Cassia Coop ... 100

B. Lycee Schorge ... 105 3.3.2 Programa ... 109 A. Museu ... 110 B. Escola ... 111 C. Anfiteatro ... 113 D. Restaurante | Cantina ... 113 3.3.3 O Objecto Arquitectónico ... 114

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IV | REFLEXÕES FINAIS

... 119

BIBLIOGRAFIA ... 121

V | ANEXOS

... 129

MAQUETES FINAIS ... 131

Cidade ... 131

Centro Cultural Mafalala ... 133

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1 - Mapa de assentamentos de grupos étnicos no território moçambicano; ... 10

Figura 2 - Mapa das rotas marítimas portuguesas, 1502; ... 11

Figura 3 - Sofala nos finais do séc. XVI; ... 18

Figura 4 - Sofala no séc. XVII; ... 18

Figura 5- Representação da Vila de Lourenço Marques, 1878; ... 19

Figura 6- Representação da Vila de Lourenço Marques, 1878; ... 19

Figura 7- Primeira representação da vila de Lourenço Marques, 1876; ... 21

Figura 8- Povoação africana na Beira (Gravura do séc. XIX, verifica-se a adesão por parte dos nativos às técnicas europeias); ... 22

Figura 9- Primeiro plano e plano de ampliação da cidade de Lourenço Marques, 1895; ... 23

Figura 10 - Cidade de Lourenço Marques com desenho da circunvalação, 1903; ... 27

Figura 11 - Planta da Cidade de Lourenço Marques, 1928 ... 31

Figura 12 - Planta da Cidade de Lourenço Marques, 1940 ... 32

Figura 13 - PGULM, planta de organização do solo, 1952 ... 33

Figura 14 - PGULM, plano de unidade residencial indigena, 1952 ... 35

Figura 15 - PDULM, montagem de variadas parcelas do Plano Director de Urbanização de Lourenço Marcos, 1969; ... 36

Figura 16 - PDULM, Estudo de tráfego, acessos a Lourenço Marques, 1969; ... 37

Figura 17 - PDULM, planos parcelares desenvolvidos no decorrer dos trabalhos, 1969; ... 37

Figura 18 - Simbolo da FRELIMO; ... 38

Figura 19 - PEUMM, Planta de ordenamento do território, 2008; ... 41

Figura 20 - PGUMK, Plano Geral de Urbanização do Município de Katembe, 2015 ... 43

Figura 21 - Localização do Bairro da Mafalala na Cidade de Maputo; ... 47

Figura 22 - Localização do Alto Maé e Ponta Vermelha;... 48

Figura 23 - Habitação construída em Zinco e Madeira, Mafalala; ... 50

Figura 24 - Habitação construída em Zinco e Madeira, Mafalala; ... 51

Figura 25 - Habitação construída em Zinco e Madeira, Mafalala; ... 51

Figura 26 - Rostos de ex-moradores ilustres do Bairro da Mafalala. O ex-presidente Samora Machel, os escritores Noémia de Sousa e José Craveirinha e o jogador Eusébio; ... 52

Figura 27 - Mapa Mafalala com sinalização de entradas do bairro e principais artérias do mesmo; ... 53

Figura 28 - Foto de uma das estreitas ruas do Bairro da Mafalala; ... 54

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Figura 30 - Fila de mulheres e crianças para abastecimento de àgua; ... 56

Figura 31 - Habitação planta circular, execução da cobertura cónica tradicional dos Mpfumu; 58 Figura 32- Habitação planta rectangular, detalhe do postal Souvenir de LM, 1900; ... 58

Figura 33 - Mercado de rua, bens alimentares, Mafalala; ... 61

Figura 34 - Figura 32 - Mercado de rua, artesanato, Mafalala; ... 62

Figura 35 – Grupo de Tufo da Mafalala; ... 74

Figura 36 - Grupo de Tufo da Mafalala ... 74

Figura 37 - Mãe África, 1972; ... 76

Figura 38 - Julgamento militantes Frente Libertacao Moçambique, 1966; ... 76

Figura 39 - "Ujamaa, Col. Theophilos Rifiotis e Rita Mendonça. Foto: Theophilos Rifotis.” (Rifiotis, 1994:159);... 78

Figura 40 - "Shetani, Col. Antonio Rosa Gil Clemente. Foto: Isabel” (Rifiotis, 1994:162); ... 78

Figura 41 - "Máscaras de expressões humanas e animalísticas"; ... 79

Figura 42 - Capulana como vestuário; ... 81

Figura 43 - Utilização da Capulana para transporte de bebé; ... 81

Figura 44 - Capulanas; ... 82

Figura 45 - Cartaz 8ª edição Festival Mafalala, 2015; ... 84

Figura 46 - Cartaz 3ª edição Festival Mafalala, 2010; ... 84

Figura 47 - Cartaz 10ª edição FEstival da Mafalala, 2017; ... 84

Figura 48 - Indicação do tour e locais de passagem no Bairro da Mafalala; ... 85

Figura 49- Proposta de estrutura viária com sobreposição de esquiço com espaços públicos pré-existentes no bairro; ... 92

Figura 50 - Localização de alguns pontos de interesse, serviços e equipamentos pré-existentes no bairro; ... 94

Figura 51 - Equipamentos propostos com o novo plano; ... 95

Figura 52 - Percurso da Dança; ... 96

Figura 53 - Percursos Urbanos propostos; ... 96

Figura 54 - Planta do Cento de Treinamento Casia Coop; ... 101

Figura 55 - Alçado Oeste do Centro de Treinamento Cassia Coop; ... 102

Figura 56 - Corte A do Centro de Treinamento Casia Coop; ... 102

Figura 57 - Exterior do Centro de Treinamento Cassia Coop; ... 103

Figura 58 - Fachada do Centro de Treinamento Cassia Coop; ... 103

Figura 59 - Entrada do Centro de Treinamento Cassia Coop; ... 103

Figura 60 - Pátio do Centro de Treinamento Cassia Coop; ... 104

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Figura 62 - Detalhe de uma Janela do Centro de Treinamento Cassia Coop; ... 104

Figura 63 - Planta da Escola Secundária de Burkina Faso; ... 105

Figura 64 - Axonometria Explodida da Escola Secundária de Burkina Faso; ... 106

Figura 65 - Axonometria Explodida de um dos módulos de sala de aula da Escola Secundária de Burkina Faso; ... 107

Figura 66 - Painel de Madeira como Fachada da Escola Secundária de Burkina Faso; ... 108

Figura 67 - Galeria e Pátio da Escola Secundária de Burkina Faso; ... 108

Figura 68 - Pátio Interior da Escola Secundária de Burkina Faso; ... 108

Figura 69 - Exterior da Escola Secundária de Burkina Faso; ... 108

Figura 70 - Quadro representante do Nº de Grupos Culturais por tipo de actividade em cada uma das províncias de Moçambique entre os anos 2011-2013; ... 109

Figura 71 - Quadro representante do Nº de Museus existentes por província em Moçambique no ano de 2014; ... 111

Figura 72 - Distribuição percentual por tipo de actividade; ... 113

Figura 73 - Forma Do Centro Cultural Mafalala ... 114

Figura 74 - Piso 1 Centro Cultural Mafalala ... 116

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LISTA DE ABREVIATURAS

ACAM – Associação Comunitária Ambiente da Mafalala AdeM – Águas de Moçambique

ARPAC – Arquivo do Património Cultural DNH – Direcção Nacional de Habitantes GUC – Gabinete de Urbanização Colonia INFP – Instituto Nacional de Planificação Física INLD – Instituto Nacional do Livro e do Disco ONG – Organização Não Governamental

PARPA – Plano de Acção para a Redução da Pobreza Absoluta

PEDTM – Plano Estratégico para o Desenvolvimento do Turismo em Moçambique PEUMM – Plano de Estrutura Urbana no Município de Maputo

PDULM – Plano Director de Urbanização de Lourenço Marques PGUMK – Plano Geral de Urbanização de Katembe

PGULM – Plano Geral de Urbanização de Lourenço Marques TCCAF - The Coca-Cola African Foundation

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CENTRO CULTURAL MAFALALA

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INTRODUÇÃO

“A Cultura define-se como sendo um conjunto complexo de maneiras de ser, estar, comportar-se e relacionar-se desde o nascimento até à morte passando pelos rituais que marcam os principais momentos do processo de integração social e de socialização. A cultura compreende: os aspectos criativos; as artes visuais e cénicas; os materiais: vestuário, arquitectura e instrumentos de trabalho; os institucionais: as estruturas económicas, sociais, políticas e militares; os filosóficos: ideias, crenças e valores. Estes aspectos estão em constante inter-acção com novas realidades e experiências. Por isso, a Cultura deve ser entendida como sendo a totalidade do modo de vida de um Povo ou Comunidade.”

Resolução nº12/97 de 10 de Junho. Boletim da República nº23 – I Série A. Publicação Oficial da República de Moçambique;

Moçambique, antiga colónia portuguesa, tem como capital a cidade de Maputo que até à independência do país, em 1975, era denominada por Lourenço Marques, nome do navegador português que explorou a costa de Moçambique pela primeira vez. É este o território que se encontra como alvo de estudo e trabalho no presente documento.

Devido à forte expansão urbana, que se fez sentir neste território no séc. XX, muitos dos bairros indígenas existentes foram empurrados para a periferia da cidade, que havia sido formalizada pelos colonos portugueses. A servir de charneira entre estes bairros periurbanos e a “cidade de cimento”, como é chamada a zona formal, existe uma circunvalação que marca esta dualidade, característica de muitas cidades moçambicanas.

O bairro da Mafalala é um dos mais antigos bairros informais da cidade de Maputo, e é o bairro natal de algumas personalidades moçambicanas como Eusébio da Silva Ferreira (futebolista), José Craveirinha e Noémia de Sousa (poetas), Samora Machel, Joaquim Chissano e Pascoal Mucumbi

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(personalidades da política de Moçambique). A Mafalala é um território que está situado nesta fronteira entre o formal e o informal e é ladeada por duas das mais importantes artérias de acesso à cidade de Maputo.

A escolha do local de intervenção, para este projecto final de mestrado, tem como base e finalidade dar continuidade à disciplina de Laboratório de Projecto VI com o tema ‘Arquitectura Tropical’. O desafio deste projecto prende-se com vários factores. Desde de se tratar de um território novo, no que toca ao exercício de projecto, ao clima, a população local e a busca pela sua identidade e ainda, o exercício de conjugar duas realidades de cidade tão dispares e ao mesmo tempo tão presentes no território.

É nestes desafios que residem as maiores questões do projecto. Que tipo de abordagem deve ser tomada num projecto para um bairro periférico e com uma identidade tão intrínseca? Como conjugar as duas realidades existentes na cidade e ainda assim, manter o carácter do bairro que lhe tão próprio? Como realizar um projecto que dignifique a população local e seja um contributo para o seu desenvolvimento? São questões que foram levantadas inicialmente e que se foram ‘arrumando’ no desenvolver do trabalho.

A estrutura do trabalho é então dividida em três capítulos. Fazendo um ‘zoom in’ à medida que o trabalho avança, passando da grande escala da cidade, para o bairro e finalmente para o projecto.

No primeiro capítulo, é realizada uma viagem por quase dois milénios de história. De forma a tentar compreender a evolução da cidade, e as razões que levaram a que a cidade de Maputo seja a cidade dualista que se apresenta hoje em dia. É o capítulo que fala do território antes de ser conhecido pelos portugueses, da conquista como colónia, a pretensão de outros reinos à posse territorial, da reafirmação da coroa portuguesa, e da grande explosão que se dá no crescimento urbano do território a partir do século XIX.

(29)

O segundo capítulo explora a vida do bairro da Mafalala, o bairro que é alvo de intervenção no presente trabalho. Como se deu o seu nascimento, e a sua caracterização. É neste capítulo que são aprofundados os conceitos de Cultura e Identidade e é feita uma viagem pelos diferentes tipos de arte produzida no país e em especial, no bairro da Mafalala, desde pinuta, escultura, dança, música, entre outros.

As características de formação deste bairro tornam-no num local carenciado de diversas estruturas de apoio à vivencia no local. Deste modo, este projecto final de Mestrado visa responder a estas necessidades através do desenvolvimento de um plano urbano para o bairro e que contribua para a unificação do mesmo à cidade de Maputo. Visa ainda a criação de um edifício de excepção, um Centro Cultural, que faça parte desta nova fusão entre a cidade de cimento e a cidade de caniço. Um edificio que enalteça e dê a conhecer o que é característico e identitário de um povo, a sua Cultura.

O terceiro capítulo aborda a proposta de projecto realizada para o bairro. Esta proposta está segmentada em duas partes. Uma primeira parte referente ao estudo e redesenho urbano do Bairro, onde é idealizado um redesenho que vai ‘beber’ das origens da Mafalala. É realiza uma reinterpretação do existente, são colmatadas lacunas e propostos equipamentos e actividades que visam contribuir para o desenvolvimento da comunidade. Na segunda parte, é abordado o desenvolvimento do equipamento, o Centro Cultural Mafalala. Detentor de diferentes usos, desde museu, escola, anfiteatro e ainda restauração.

A metodologia utilizada foi maioritariamente a leitura e análise de livros sobre os temas em destaque. Outras pesquisas foram realizadas em dissertações ou publicações de revistas. Foram ainda consultados jornais, principalmente no que diz respeito às actividades desenvolvidas no bairro da Mafalala e que têm lugar de destaque em páginas de jornais locais e nacionais.

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(31)

I | A CIDADE

DOIS MILÉNIOS DE HISTÓRIA

IDENTIDADE

“Preciso ser um outro

para ser eu mesmo

Sou grão de rocha

sou o vento que a desgasta

sou pólen sem insecto

e areia sustentando

o sexo das árvores

Existo, assim, onde me desconheço

aguardando pelo meu passado

receando a esperança do futuro

No mundo que combato

morro

no mundo por que luto

nasço.”

Mia Couto

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1.1. | O PROTO-URBANO

1.1.1. | Os Assentamentos Rongas

Os registos arqueológicos que nos levam para o período mais longínquo da história da ocupação do território, do Sul de Moçambique, datam do primeiro século d.C, como refere Morais (2001:52). Esta ocupação traduz-se em “vestígios de assentamentos efémeros de uma comunidade caracterizada por uma economia de subsistência de sector primário, situa-se num quadro espaço-temporal correspondente a uma localização na fronteira entre planícies inundadas periodicamente e savana seca (o que lhes permite uma optimização do acesso aos vários recursos naturais), num período que decorreu até ao primeiro reconhecimento da baía, efectuado pelo navegador português Lourenço Marques.”

O mesmo autor refere ainda que, a maior parte dos acampamentos arqueológicos são pertencentes ao período entre os séculos III e IV d.C., e que nestes, apesar de alguns parecerem temporários, existem outros com evidências de uma ocupação territorial mais sedentária, como por exemplo, “cabanas de adobe e caniço e aldeias com ocupações posteriores evidenciando um grau mais elevado de exploração agrícola, incluindo criação de gado.” (Morais 2001:52). Esta conclusão leva-nos a citar um outro autor, Henriques (1998), este explica que um dos elementos fundamentais no processo de construção do território moçambicano, são as diferentes formas de aglomeração dos homens e a maneira como estes adaptam e integram a Natureza, procurando pô-la ao seu serviço. Com esta informação, podemos concluir que os fenómenos urbanos, de hoje, são antiquíssimos e, resultado das suas relações com a natureza. O mapa, (Figura 1), mostra-nos que foram vários os grupos étnicos que assentaram neste território, sendo o grupo ocupante do território mais a sul de Moçambique designado por ‘Rongas’.

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Em relação a registos escritos que relatam a ocupação humana no território, os mais antigos são relatos de naufrágios, conforme Morais (2001), e datam da época dos descobrimentos marítimos portugueses. Nestes registos, foram anotados vários reinos existentes em redor da actual baía de Maputo. Morais diz-nos que estes reinos eram constituídos por cerca de 500

Figura 1 - Mapa de assentamentos de grupos étnicos no território moçambicano;

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a 2000 membros, e que foram o resultado de um processo longo de assimilação e ocupação, uma vez que foram absorvendo nas suas comunidades, vários migrantes vindos do interior. Henriques (1998) explica ainda que, em muitas aldeias, verifica-se a presença de uma diversidade de origens e competências, que antecedem e anunciam um crescimento definitivo das cidades.

1.1.2. | Os Assentamentos Portugueses

A Npfumo

1

,

era já conhecida dos navegadores portugueses desde a

altura da descoberta do caminho marítimo para a Índia, por Vasco da Gama. Estes nomearam-na de Baía Formosa, Baía da Boa Paz ou ainda Baía da Lagoa. A prova desta afirmação, como relata Lima (2015), é o facto desta baía constar no planisfério português de 1502 (fig.2).

O assentamento Português em território Moçambicano, deu-se como consequência do interesse e necessidade de implantação de pontos estratégicos, ao longo da costa oriental africana. Desta forma, tornou-se possível dominar o território e, guardar a rota marítima para a Índia. Assim, política e economicamente, apenas em 1544 é que os navegadores portugueses começaram a explorar a Baía da Lagoa, a mando de El-Rei D.

1 Nome da Chefatura principal na margem Norte do estuário aquando a chegada dos portugueses;

Figura 2 - Mapa das rotas marítimas portuguesas, 1502;

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João III. Nesta altura, a baía passa a chamar-se Lourenço Marques, em homenagem ao navegador português, responsável pela ‘descoberta’ e exploração do território.

Lobato (1948), narra que durante quase 200 anos, a baía de Lourenço Marques, foi ponto de paragem nas rotas mercantis dos navios portugueses, que por ali passavam anualmente. Era local que exportava marfim e de onde os portugueses arranjavam alguns escravos, mas que não tinha muito mais utilidade uma vez que, por ser muito pantanoso, não servia para habitar. Apesar do valor quase nulo que o território tinha para a coroa portuguesa, a Metrópole não abdicava do domínio territorial, e por várias vezes, foi necessário reclamá-lo como português já que era alvo de várias tentativas de instalações por parte de estrangeiros. Por vezes, os navios portugueses permaneciam por alguns meses à espera que o marfim chegasse à costa, e para que esta estadia fosse mais cómoda, Lobato (1948) diz que, há memórias de que os marinheiros construíam aldeias de palhotas, mas nada definitivo. A baía de Lourenço Marques nunca teve nenhum edificado de carácter fixo ou definitivo até finais do séc. XVIII. Com o decorrer do tempo, a baía começou a ser mais visitada por embarcações estrangeiras que portuguesas. Este facto deve-se à irregularidade da navegação portuguesa por aqueles lados, provocando a cobiça de outras nações europeias. Uma vez que o território não estava protegido, tornou-se um alvo de fácil acesso.

O sistema colonial português tinha dois principais objectivos: evangelizar e tirar da terra o máximo benefício possível para a Metrópole, não existindo uma preocupação de soberania. “Todas as questões indígenas eram deixadas aos chefes nativos, cujo poder se respeitava. Havia uma espécie de feudalismo colonial. Os régulos e chefes reconheciam a supremacia do Rei de Portugal, prestavam-lhe vassalagem, facilitavam o comércio, permitiam a evangelização, guiavam.se nas questões mais importantes pelo conselho das nossas autoridades, permitiam a colonização e o livre trânsito aos mercadores, e, em troca, eram senhores livres das suas terras e dos seus súbditos, que governavam segundo seus usos e costumes.” (Lobato 1948:5). Apesar desta relação com os nativos, nunca houve qualquer desleixo em relação aos estrangeiros. A Metrópole sempre fez de tudo para

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reivindicar os “direitos da coroa à posse das terras descobertas ou conquistadas e ao exclusivo comércio nos seus domínios.” (Lobato, 1948:6). Mendes (1985) refere que, em 1721, a Baía foi ocupada pelos holandeses e que estes edificaram um forte em alvenaria ao qual chamaram Forte da Lagoa. No entanto, apenas uma década após a edificação do forte, em 1733, os holandeses abandonam a Baía “derrotados pela insalubridade do clima, pelo malogro do comércio com os indígenas e da conquista do Monomotapa.” (Mendes 1985:79). Durante os anos que se seguiram, o controle pelo comércio na baía de Lourenço Marques, originou frequentes tentativas de posse da mesma, por parte dos franceses e ingleses. No entanto, foi a tentativa austríaca que desencadeou toda a restante história do desenvolvimento de Moçambique.

Entre 1774 e 1775, Guilherme Bolts2 aparece em Lisboa com ideias de

ser nomeado cônsul português dos negócios no oriente. Não teve muita sorte, quando foi reconhecido como Homem pouco honesto que fora. Daqui passou para Viena, e depois para Trieste, onde conseguiu que alguns mercadores abastecessem um navio para ele iniciar as suas viagens comerciais. Passou pelo Rio de Janeiro e daí seguiu para a baía de Lourenço Marques, onde fundou uma feitoria, por não encontrar nenhuma autoridade portuguesa que o impedisse. Chegou à baía em Março de 1777, levava consigo 155 homens e algumas mulheres. Em Maio do mesmo ano, 2 meses após a sua chegada, já assinara tratados com alguns régulos nativos, onde estes cederam terras dos dois lados do estuário e que agora passaram a ser propriedade de Bolts, para este poder realizar povoações e levantar fortalezas. Estas instalações eram de uma construção muito básica: “palhotas de paus e caniços, cobertas a campim.” (Lobato, 1948:26). Em 1778, já tinha fundado 8 feitorias ao longo da costa moçambicana, duas das quais na baía de Lourenço Marques. A estratégia dos austríacos passou por

2 Guilherme Bolts, Tenente Coronel ao serviço da Imperatriz Maria Teresa de Áustria. Era uma “pessoa conhecida nos meios ultramarinos de Lisboa, onde fez as primeiras tentativas de carreira colonial, começou por ser caixeiro de uma casa inglesa estabelecida na capital, mas passando a Londres entrou ao serviço da Companhia Inglesa das Índias. Enriqueceu, não se sabe como, mas de certo por meios pouco honestos, porque a Companhia Inglesa Sequestrou-lhe os bens.” (Lobato, 1948:8)

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pagar mais pelos panos, pela arroba e pelo marfim, para conquistarem o mercado indígena, e tornar as negociações dos navios portugueses mais difíceis. A notícia desta situação chega à Metrópole um ano depois, através de cartas envidas pelos governadores da Índia e de Moçambique. Pertencendo a Baia ao Domínio da Coroa Portuguesa, não era permitido nenhuma destas posses territoriais e fortificações estrangeiras. Os próprios nativos reconheciam a situação como não sendo favorável. No entanto, apesar de os portugueses terem sido os primeiros a conquistar as terras de Moçambique, foi também o reino português que as abandonou, deixando de passar pelas mesmas por alguns anos, obrigando assim, os indígenas a negociar com os navios estrangeiros que apareciam.

Lobato (1948) explica que, o projecto de Bolts para Lourenço Marques, não passava só pelo comércio e construção de feitorias. A ideia era “formar uma colónia com pretos importados de Inhambane”, mandar construir um dormitório, em volta de um pátio, com portas apenas para o interior, onde iria fechar 50 casais a fim de se reproduzirem, e que se iriam ocupar das “machambas”3. Esta atitude de Bolts não era altruísta. A criação desta

colónia, servia como base a um plano maior. Para usufruto e criação de condições de vida, para fundar uma colónia alemã. Era um plano elaborado, pensado e com método. Foi o reconhecimento deste facto, por parte da metrópole portuguesa, que obrigou o Governo a resolver o assunto e a reivindicar o poder de Portugal sobre a baía de Lourenço Marques. Em Janeiro de 1781, parte uma expedição, em direcção à baía, com instruções exactas sobre como agir: desembarcar, atacar, e como proceder com os ingleses e austríacos. A fragata, chegou a Lourenço Marques, e alguns tripulantes desceram, entraram na feitoria e os austríacos renderam-se sem oferecer nenhuma resistência. Os soldados arrasaram com o forte e todos os armazéns austríacos. Na manhã seguinte, ao nascer do sol, foi hasteada a bandeira nacional. A notícia destes últimos acontecimentos espalhou-se rapidamente, e os régulos nativos começaram a surgir. Foram realizadas

3 “Terreno agrícola para produção familiar, terreno de cultivo.” “Do changana maxamba, «idem» ou do suaíli mashamba, plural deshamba, «plantação, terreno cultivado»”. Consultado em https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/machamba, a 30/12/18, às 14:56.

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entrevistas individuais onde se deram lugar, também, a algumas renegociações. Os indígenas deviam respeito à Coroa Portuguesa, e não deviam permitir que mais nenhum estrangeiro se alojasse naquelas terras sem autorização, em troca, os portugueses não voltariam a deixar de visitar os territórios moçambicanos, nem de levar os bens necessários e acordados com aquelas comunidades. Foram estas renegociações que puseram termo a um passado instável e que levou o governo de Lisboa a fundar, em 1782, um presídio na baía. Assim, iníciou-se um novo capítulo na história da baía de Lourenço Marques, efectivando o assentamento português no território.

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1.2.

O URBANO

1.2.1. Do presídio à Vila

“O presídio, assim designado por ser dotado de guarnição militar, representa não só uma estrutura, evidentemente, de caracter militar, como funções defensivas, como é, simultaneamente, um elemento primário da estruturação urbana; correspondendo a uma estratégia do ponto de vista militar, traduzia-se numa edificação que, requalificando-se numa segunda fase, constituía um elemento privilegiado e portante do assentamento urbano da sociedade civil consubstanciando o primeiro núcleo urbano e funcionando a sua muralha como limite urbano.” (Morais, 2001:55).

Na publicação de Lobato (1948), podemos observar que foram dadas ordens por parte da Rainha de Portugal, D. Maria I4, para que se fundasse um

presídio em Lourenço Marques, a fim de se restabelecer o comércio. Joaquim de Araújo5 é nomeado Governador e Capitão-Mor da Baía. É ele que

comanda e dá início à construção do forte e da feitoria. Para além disso, tinha a missão de “(...) controlar e reafirmar os direitos de Portugal àqueles territórios, monopolizando o comércio local como também decidir qual o sítio exacto para a implantação da fortaleza (...)” (Morais et al., 2012:12). Contrariamente à decisão dos austríacos, Joaquim de Araújo escolhe a margem norte do estuário para fundar o presídio, “(...) terras do régulo da Matola, que lhe cedeu graciosamente todo o terreno necessário.” (Lobato, 1948: 112). O presídio foi inaugurado no dia de S. José6, no ano de 1782,

4 D. Maria I iniciou o seu reinado a 24 de Fevereiro de 1777 e terminou-o a 20 de Março de 1816;

5 “Joaquim de Araújo, o fundador do Presídio, nasceu em Lisboa, Campolide, no ano de 1726 e era filho de Manuel de Araújo. (...). Atingiu o posto de capitão-tenente da Armada. (...). Em 26 de Novembro de 1781 foi nomeado Governador e Capitão-Mor da Capitania do Cabo das Correntes, Baía de Lourenço Marques, Ilha de Unhaca e seus subúrbios, pelo Governador interino Vicente Caetano da Maia e Vasconcelos, (...)”. (LOBATO, 1948: 104-105).

6 Segundo Lobato, o único relato da inauguração do presídio foi feito pelo Frei Francisco de Santa Teresa, no entanto, Lobato explica que este relato apresenta dois erros de redação, “(...) cometeu o frade dois erros graves e seguidos. É que o acto só teve lugar em 1782, de certeza, e se foi a 19 de Abril não foi em dia de S. José que é a 19 de Março.” (LOBATO, 1948: 105).

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conforme o autor. Ainda no início da sua construção, feita de palhotas em capim, e fraca estacaria, a totalidade do presídio arde, pertencendo a culpa a um soldado. Porém, não ficou de fora a hipótese de ter sido um ataque por parte de nativos. No decorrer do mesmo ano, inesperadamente, morre Joaquim de Araújo, conforme nos conta Morais (2001). Os anos seguintes foram anos de grande instabilidade, caracterizados por abandonos do presídio, falta de investimento, escassez de recursos e o próprio clima. Os destacamentos que eram feitos para Lourenço Marques também não ajudavam já que eram formados por desterrados e os comandos eram entregues a militares com pouca experiência. Lobato (1948), diz que as consequências destes últimos actos descritos foram “deploráveis”, e que foi necessário recomeçar do zero, toda a tentativa de implantação de um presídio na baía de Lourenço Marques, a começar pelas renegociações com os indígenas.

Morais (2001) conta que, em 1796, o presídio é atacado e destruído por franceses, tendo sido reedificado quatro anos depois com a chegada de uma nova expedição, comandada pelo tenente ajudante Luís José que estava encarregue dessa mesma reedificação. O presídio efectivou-se a partir de 1805, com esta força militar, que constituiu uma pequena povoação dentro da fortificação, como explica Melo (2013). As obras arrastaram-se por vários anos até que, em 1814, refaz-se a obra em pedra e cal, sob ordens do governador Pereira Ramos. Henriques (1998) explica que os materiais e técnicas que foram utilizados impõem-se aos usados pelos africanos, determinando assim a evolução da arquitectura e por consequência as condições de vida.

Quando se começou a sentir a necessidade de fortalecer a presença portuguesa no território, nasceu a companhia comercial de Lourenço Marques, em 1825, tendo chegado a terra no ano seguinte, com o objectivo de formar uma colónia agrícola. Foi a presença destes “pioneiros de Lourenço Marques” que impulsionou o desenvolvimento e inseriu alguma estrutura de

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assentamento da futura vila. “(...)para além da Fortaleza, havia agora também os edifícios da Companhia, a casa do governador como edifício público a destacar e as habitações dos residentes, (...)”. (Morais, 2001:60). Com estas novidades começou-se a expandir o assentamento português para fora das muralhas da fortaleza. “(...) as cazaz, que estaõ á direita do Forte, e formaõ a povoaçaõ pertencente á guarnição e empregados estaõ construídas sobre areia solta: e a sua construção he de estacas enterrada n arêa, e enlaçadas com caniço, e barradas e caiadas.” (TEIXEIRA, 1838. IN: MORAIS et al., 2012: 13). A Companhia foi dissolvida em 1835, no entanto, “o fluxo de colonizadores para Lourenço Marques continuou, lutando-se arduamente pela melhoria e sobrevivência da povoação.” (Morais, 2001:60).

A grande maioria das representações deste tipo de assentamentos mostra-nos uma visão de territórios africanos construídos por europeus. Podemos observar que são sempre representados como sendo ilhas, sejam naturais ou criadas pelo Homem, com o objectivo de autonomizar os grupos. Apesar de os materiais e as técnicas de construção portuguesas se sobreporem às locais, o autor Henriques (1998), explica que os povos conquistadores não repelem na totalidade as escolhas dos africanos. Nas imagens que se seguem (fig. 3 e 4) nota-se uma clara partilha de espaços comuns, mantendo sempre as comunidades em separado.

Figura 3 - Sofala nos finais do séc. XVI;

Gravura publicada por Henriques, 1998;

Figura 4 - Sofala no séc. XVII;

Gravura publicada por Henriques, 1998;

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Durante a segunda metade do séc. XIX, surgiram duas ameaças ao território: a guerra com os Vátuas7 e as pretensões de Inglaterra sobre

Lourenço Marques. Estando numa situação de instabilidade e de guerra, com o perigo eminente de invasões vátuas, surge a ideia de se criar uma linha de defesa na orla do presídio, desde a baixa pantanosa até à praia. A conclusão desta construção dá-se em 1867 impedindo-se que existisse uma entrada facilitada aos nativos dentro deste povoado. Nesta altura a povoação era já formada por “cinquenta e seis casas de pedra e cal e sessenta e sete palhotas e os seus habitantes dedicavam-se ao comércio com o interior”. (Mendes, 1985:81). “As casas eram todas térreas e volumosas, com terraços para desafogo nos dias de muito calor, como se usou em Goa, Mombaça, Ibo e Moçambique”. (Castilho, 1906:37 in Mendes, 1985:81), (fig 5 e 6).

7 “Nome genérico dado aos indígenas de Moçambique,ao sul do rio Save,que tinham tradições guerreiras.”;

Consultado emhttps://www.dicionarioinformal.com.br/landins/a 22 de Janeiro de 2019;

Figura 5- Representação da Vila de Lourenço Marques, 1878; Figura 6- Representação da Vila de Lourenço Marques, 1878;

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Desta forma, reuniram-se as condições necessárias para a realização de um investimento em Lourenço Marques, transformando-o num dos núcleos principais da África oriental. O crescimento urbano desta povoação acentuou-se cada vez mais a partir de 1870, como nos diz Mendes (1985). A 19 de Dezembro de 1876, o povoado de Lourenço Marques é elevado a vila:

“Atendendo a que a povoação de Lourenço Marques, na província de Moçambique, se tem tornado últimamente importante pelo progressivo aumento da sua população e pelo desenvolvimento do comércio, hei por bem ordenar que a referida povoação seja elevada à categoria de Vila, com a denominação de Vila de Lourenço Marques, ficando por esta minha mercê obrigada a respectiva câmara municipal a tirar cartas, pagos previamente os competentes direitos.

O Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, e interino da Marinha e Ultramar, assim o tenha entendido e faça executar.

Paço, em 19 de Dezembro de 1876 – Rei. – João de Andrade Corvo.”

In PGULM, vol. 1 (1952:6)

O crescimento da Vila deu-se sem ultrapassar os limites da linha de defesa. É neste mesmo ano que surge a primeira planta desenhada deste território, (fig.7). “Pode verificar-se que o pequeno aglomerado estava organizado em torno da Praça da Picota (actual Praça Sete de Março), da qual partiam quatro ruas, sendo a parte ocidental a mais ocupada. A norte corria a linha de defesa e este pequeno povoado estava separado do continente por um pântano, atravessado pela mais importante via de penetração para o interior – a estrada de Lidemburgo”. (Mendes, 1985:81-82).

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O surgimento desta povoação foi tardio dentro do que é o contexto do urbanismo português ultramarino, uma vez que as ilhas atlânticas haviam sido ocupadas no século XV e que o processo de urbanização do Brasil deu-se em meados do século XVI. Apesar disso, Melo (2013), afirma que este primeiro povoado de Lourenço Marques, apresenta características semelhantes a outras estruturas urbanas que também surgiram durante o período de expansão, sendo estas: “o traçado geométrico regular adaptado à topografia, mas não racionalizado; o protagonismo urbanístico da rua, em que as vias principais mais largas se dispõem paralelamente à costa, desenhando uma estrutura de quarteirões lineares, com rua de ambos os lados, idênticos aos do período medieval; a existência de uma praça estruturante de cariz mais renascentista, articulando as vias e o acesso da língua de areia à margem continental, onde se localizam os equipamentos prioritários, apresentando uma constância e interação espacial; o espaço hierarquizado e a independência morfológica relativamente ao cerco muralhado”. (Rossa, 2002; Teixeira; Valla, 1999. IN: Melo, 2013: 73). Esta descrição de Melo (2013) corresponde com Henriques (1998) quando diz que os povos colonizadores, quando alojados em novos territórios, tendem a recriar a sua cultura, integrando as suas formas arquitectónicas e espaciais, ajustando-se ao lugar, tendo em conta as condições geofísicas. A relação

Figura 7- Primeira representação da vila de Lourenço Marques, 1876;

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entre os colonos portugueses e os moçambicanos levaram a alterações nos espaços de socialização africanos, bem como no surgimento de novas povoações. Assim, podemos concluir que este processo de assentamento e de evolução urbana leva a um cruzamento de influências entre os nativos e os colonos (fig. 8).

1.2.2. Lourenço Marques, uma Cidade

A evolução urbana deste território foi lenta durante o século XVIII, e explodiu a partir da segunda metade do século XIX. A vila de Lourenço Marques é elevada a cidade em 1887:

“Tomando em consideração o notável incremento que tem tido a Vila de Lourenço Marques, capital do districto do mesmo nome, na província de Moçambique, em resultado dos melhoramentos materiais ali últimamente realizados, e atendendo à excepcional importância que tanto aquela Vila como o seu porto hão de adquirir com a próxima exploração do caminho de ferro que há de ligar, por uma comunicação fácil e rápida, aquele districto com a república do Transvaal, importância que é já hoje muito sensível no aumento da navegação e do comércio e na transformação rápida que se está

Figura 8- Povoação africana na Beira (Gravura do séc. XIX, verifica-se a adesão por parte dos nativos às técnicas europeias);

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operando nas condições económicas e sociais daquela povoação: hei por bem decretar que a mencionada Vila seja elevada à categoria de cidade com a denominação de: cidade de Lourenço Marques.

O Ministro e Secretário de Estado dos Negócios da Marinha e Ultramar assim o tenha entendido e faça executar.

Paço, em 10 de Novembro de 1887 – Rei – Henrique de Macedo”

In PGULM, vol. 1 (1952:6)

Neste mesmo ano, chega uma expedição das obras públicas de Lisboa, comandada pelo Engenheiro Joaquim José Machado8, para elaborar

aquele que viria a ser o primeiro plano da cidade (fig. 9). Este plano surgiu num contexto intrínseco a uma prática urbanística directamente relacionada com alguns modelos de desenvolvimento urbano de metrópoles, nomeadamente o de Lisboa, resultado de uma política municipal de obras públicas, como explica Morais (2001).

8 Engenheiro militar e governador responsável pela implementação de infraestruturas (vias, portos e troços ferroviários) em Angola e Moçambique.

Figura 9- Primeiro plano e plano de ampliação da cidade de Lourenço Marques, 1895;

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O novo plano de ampliação, pretende dar continuidade à estrutura pré-existente, tornando-a parte integrante e estruturante na nova cidade, propondo uma reinterpretação da estrutura existente. Neste contexto, as maiores alterações à preexistência foram a demolição da linha de defesa e a secagem dos pântanos, que circundavam o aglomerado da antiga vila de Lourenço Marques, sendo esta a primeira obra de saneamento. Para além do aglomerado existente dentro da linha de defesa, foram também assumidos como permanências na elaboração deste plano, o traçado da linha férrea, que à data já tinha começado a ser construída, bem como algumas construções que já se encontravam fora da orla defensiva, nomeadamente “o novo Hospital, a nova Igreja, o novo Quartel, na zona do Alto Maé, o jardim da Sociedade de Horticultura e Floricultura (actual Jardim Tunduru) e a estrada para a Ponta Vermelha, junto à qual já se encontrava um considerável núcleo de edificações, para além da residência do Governador.” (Morais, 2001:88).

O plano é aprovado em 1892, desencadeando uma nova etapa do desenvolvimento urbano de Lourenço Marques. Foram concebidas três novas praças, a primeira para servir a estação de caminhos de ferro e as outras duas como parte integrante da nova estrutura urbana, sendo o resultado da subtração do quarteirão. Uma destas praças estava destinada a tornar-se o novo centro da cidade e a outra, que estava localizada junto à nova linha de defesa, nunca chegou a ser construída. Em relação à estruturação das vias, foram geradas três rotundas que se encontravam no cruzamento das vias principais. Este plano culmina na projecção e realização de 58 novos quarteirões com cerca de 1 a 3 hectares cada um. Nem tudo foi fácil para a realização deste novo plano da cidade de Lourenço Marques. Mendes (1985) explica que para além das condições topográficas, o plano tinha de obedecer a certas condições politicas. Assim, a cidade devia ter uma “base económica de natureza portuária”. Uma vez que as terras a oriente estavam concedidas a estrangeiros, ao Dr. Oscar Sommerschield9 e à

Transval Delagoa Bay Investiment, Ltd., como refere Mendes, não foi fácil a ampliação ocorrer para este lado. A partir de 1895, a cidade começa então a

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expandir-se na direcção da ponta vermelha, pertencente à The Eastern e South African Telegraph, Ltd.10, e que passa a fazer parte da nova estrutura

urbana. Vanin (2013) explica que este plano lançou as bases para o desenvolvimento urbano da cidade, sendo que foi esta a matriz dos planos seguintes.

Alguns factores como, “(...) a localização numa baía de fácil acesso em qualquer parte do ano e a posição estratégica de entrada no território sul-africano, que decretaram o importante papel que o porto desempenharia; a descoberta de ouro em Lidemburgo, em 1873; e eventos políticos – a proclamação da sentença arbitral de Mac-Mahon11, em 1875, que reconhece a soberania portuguesa sobre Lourenço Marques contra as pretensões da Inglaterra; a anexação do Transval por esta última, em 1877 (Mendes, 1985); e a definição das fronteiras desta região na conferência de Berlim, em 1885” (Enders, 1997 in Melo, 2013:74), levaram a que a cidade de Lourenço Marques fosse elevada a capital da província portuguesa em Moçambique a 1 de Dezembro de 1898.

Maputo, como hoje conhecemos, deve as suas características a este plano que prevê o crescimento da povoação numa malha ortogonal que não é geometricamente perfeita. Este plano “(...) contava vastas artérias, abria avenidas de vinte metros de largura e 2000 metros de extensão, largas ruas transversais de vinte metros de largura, descrevia rotundas, alargava praças, esboçava jardins; numa palavra, fazia de uma vila insignificante e tortuosa uma cidade ocupando uma área de cento e tal hectares, larga, aberta, ventilada e formosa.” (Noronha, 1895:98 in Mendes, 1985:84).

1.2.3. O crescimento de Lourenço Marques até meados do séc. XX

A ascensão da cidade de Lourenço Marques a capital de província concedeu-lhe um carácter político de alta dimensão, levando à criação de um

10 Empresa britânica que surge, em 1879, no seguimento da pretensão de Iglaterra sobre a África do Sul. Surge com o fim de assegurar uma ligação telegráfica ao longo da costa leste de África;

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conjunto de edificados e estruturas públicas. Parte do que deu origem a esta ascensão foi a vertente comercial e portuária da cidade e a expansão da linha férrea entre Lourenço Marques e a capital do Transval. Durante a primeira metade do século XX, o desenvolvimento de Lourenço Marques esteve associado à economia ferro-portuária e sul-africana, seguindo uma evolução lenta e consolidando as estruturas públicas da cidade, como o Hospital Central e as áreas residenciais. Assim, durante este período, a cidade cresceu para norte e para oeste, onde houve um maior desenvolvimento. Este foi realizado em fases que seguiam vários planos que tinham sempre como base as premissas do plano de 1887. A partir de 1900 iniciou-se o abastecimento regular de água e electricidade, sob gestão da Delagoa Bay Developments Company, o que levou a que, em 1904, começassem a circular elétricos12 na

cidade, desenvolvendo, ao longo de 9 anos, percursos com uma extensão de 12,5 Km. Estes percursos abrangiam a zona da Baixa (antigo núcleo da colónia), a parte central da cidade, a Ponta Vermelha, o Alto Maé e o centro financeiro comercial. Uma vez que um dos pontos geradores do desenvolvimento de Lourenço Marques foi o porto, este é alvo de várias melhorias e ampliações dos seus equipamentos. A primeira grande obra no porto foi a ponte-cais Gorjão, inaugurada em 1903, “projectada para atingir uma extensão de cerca de 1400 metros, entre a praça 7 de Março e a ponte da Companhia Neerzelandesa, a oeste, ficando em frente da Fortaleza uma doca com novo desenho”. (Morais, 2001:101). À semelhança da metrópole, em 1903, surge também em Lourenço Marques uma circunvalação que une o porto da cidade à Ponta Vermelha, com um raio de 2km com centro na praça 7 de Março, (fig. 10), o objectivo desta linha passa por estruturar a malha ortogonal e serve como linha de fiscalização tributária da cidade. Tem também uma intenção defensiva face aos indígenas;

12 Segundo Morais (2012), os eléctricos eram abertos de ambos os lados para suportar o clima tropical que se faz sentir e de um ó piso. Foram fornecidos pela Dick, Kerre Co. Lda e pela Milhe Car Company;

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Se até agora, a historiografia da cidade de Lourenço Marques se tem baseado na zona projectada, implementada e ocupada pelos portugueses, a chamada Xilunguíne13, é legítimo questionar o que aconteceu às populações

autóctones que habitavam as terras próximas da nova capital colonial. Laranjeira (2016) explica que, na transição do século XIX para o século XX, na esperança de melhores condições de vida, começaram a surgir as primeiras zonas suburbanas onde se aglomeraram pessoas de origem africana. No entanto, “o magnetismo da cidade nem sempre correspondeu às expectativas desses povos, tendo contribuído para a sua desagregação socias e desenraizamento do meio rural e tradicional de onde provinham.” (Laranjeira et al, 2016: 110). O nascimento e o crescimento destas zonas suburbanas distinguem-se por se encontrarem em áreas insalubres, de génese espontânea e muitas vezes ilegais na sua forma de ocupação. Se por um lado, em Londres, os subúrbios surgem na sequência do êxodo rural e da falta de preparação da cidade para acolher o elevado número de pessoas, nas cidades coloniais Africanas, é o regime colonial que restringe as

13 Nome Ronga que foi atríbuido pelos nativos à cidade colonial e que significa Cidade dos brancos, Laranjeira et al, (2016);

Figura 10 - Cidade de Lourenço Marques com desenho da circunvalação, 1903;

Publicado em: https://delagoabayword.wordpress.com/category/historia-mocambique/plano-de-lourenco-marques/ - Consultado a 24/05/2018 às 16:47;

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populações africanas à periferia da cidade através de barreiras sociais, económicas e legislativas. O discurso colonial que justificava a segregação social incluía, para além da missão civilizadora, a questão da higienização. Assim, em 1909, com intenção de isolar os povos não europeus nos subúrbios, é elaborado um relatório pelo Serviço de Saúde de Lourenço Marques:

“A acumulação em que vivem pretos, índios e chineses, em casas que são verdadeiros antros, com os hábitos de imundice que os caracterizam, constitui um dos mais poderosos elementos de insalubridade urbana e é um perigo permanente sob o ponto de vista do alastramento de qualquer epidemia. (...) Aqueles que ficam agora sem casa, procurarão em breve (...) instalar-se nos terrenos suburbanos, disseminando sem ordem e sem critério as suas moradias, de modo a cingirem a cidade de focos de infeção, dificilmente policiáveis. Seria de uma grande conveniência para a higiene de Lourenço Marques que nos subúrbios da cidade fosse escolhido um local conveniente para o estabelecimento de uma povoação para indígenas e outra para asiáticos. Nessas povoações, que deveriam obedecer a um plano previamente estudado, permitir-se-ia a construção de palhotas ou de casas rudimentares de madeira e zinco, sendo proibidas as edificações de alvenaria. Esta proibição teria por fim poder-se destruir facilmente a povoação, ou parte dela, rapidamente sem grandes prejuízos quando disso houvesse necessidade. (...) Aos indígenas, a proibição de habitarem dentro da cidade estender-se-ia a todos, com exceção dos que, pelas suas condições sociais e modo de vida, merecessem tratamento especial, e dos serventes que vivessem na casa dos seus patrões.”

Lourenço Marques Guardian, 1909 in Laranjeira et al (2016: 114)

No mesmo ano em que este relatório é redigido, a cidade pouco se tinha expandido, sendo que a maior parte da ocupação tinha ocorrido para

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poente onde estas construções eram feitas em madeira e zinco. Laranjeira (2016), afirma que a preocupação do governo colonialista era maior com a movimentação dos africanos, do que com o combate à insalubridade dos subúrbios, continuando a existir um crescente desenvolvimento na ‘Xilunguíne’. Prova disto é que, em 1912, com a intensificação do trânsito portuário, surge a necessidade de uma reconstrução do muro-cais, “num projecto global de desenvolvimento na área ribeirinha da cidade”. (MORAIS, 2001:101). A execução deste plano é da autoria de Costa Serrão e o processo de construção termina em 1914. A expansão para nordeste começa a ser possível a partir deste mesmo ano, quando o estado português negociou os terrenos com a Delagoa Bay Lands Investiments, Ltd., como explica Mendes (1985). No ano seguinte e por iniciativa do general Machado, é iniciado o aterro de Maxaquene. Após o aterro do pântano, a ideia é tornar esta zona no bairro comercial da cidade, Morais (2010). É no seguimento desta expanção da área comercial que a partir deste período começam a surgir variados planos de ampliação da cidade, dando continuidade ao traçado já existente. Este crescimento urbano direcionado à Ponta Vermelha, mantém a estrutura urbana pré-existente e dá continuidade à densificação do edificado, tanto na zona da Baixa como no Bairro Central e no Alto Maé, até à circunvalação. Esta radicalidade no desenho urbano, segregava os indígenas a uma distância suficientemente segura do centro da cidade mas mantinha-os perto o suficiente dos seus postos de trabalho, onde eram necessários.

“A cidade cresce com uma área suburbana caracterizada por uma estrutura de assentamento espontânea, originada por um fenómeno de migração proveniente de zonas rurais, a par com edificado de carácter efémero que viria a ser denominado de caniço, a cidade informal, adequirindo potencialmente uma outra urbanidade. (...)” (Morais et al, 2012:??)

Morais (2012) fala de um dos planos que surge neste período e que se foca no melhoramento da praia da Polana com o objectivo de atrair população de África do Sul, criando uma estância de qualidade, o que seria uma óptima fonte de receitas. A implementação deste plano teve inicio com

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a construção de uma ramificação do caminho de ferro até à praia, em 1911, culminando em 1922 com a conclusão da construção do Hotel Polana, “Obra há muito desejada e bastante representativa das características que passam a dominar o novo bairro traçado, a zona mais “elegante” e priveligiada da cidade.” (Morais et al . 2012: 70).

Na planta da cidade, que data de 1928, (fig. 11), podemos observar a maior densidade de construção na zona ocidental, enquanto que a zona oriental, o bairro da Polana, Ponta Vermelha e Alta Maxaquene, não evidenciam um crescimento igual. Por outro lado, são as zonas onde “os jardins tornavam mais agradáveis as áreas residenciais”. (Mendes, 1985; Melo, 2013). Por isso mesmo são estes bairros que são ocupados principalmente por estrangeiros, uma vez que correspondem às zonas mais altas da cidade, dispunham de uma maior exposição solar e eram zonas mais arejadas. O bairro de Maxaquene era ocupado por habitações mais modestas porque, apesar de ter igual salubridade, ficava com as fachadas mais expostas aos raios solares e tinha uma menor visibilidade para o mar. O bairro central faz então a transição entre o que é a “zona rica e europeia e a dos negros, mais pobre.” O bairro Alto-Maé apresenta habitações cuidadas, construídas em zinco e madeira e corresponde a uma população “mestiça”. (Mendes, 1985). Acentuaram-se as diferenças do uso do solo segundo as suas cotas altimétricas, o que nos remete para mais uma característica do que é o urbanismo português. (Melo, 2013) “(...) a cidade alta, mais fresca e arejada, destinada aos edifícios administrativos, às principais instituições cívicas e religiosas e às residências das classes mais altas; e a cidade baixa, destinada às actividades marítimas, aos serviços e ao comércio, bem como às classes mais baixas, junto ao porto e aos locais de emprego. (Mendes, 1985; Morais, 2001; Teixeira; Valla, 1999; in Melo, 2013:76).

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1.2.4. Do Estado Novo à Independência

A par do crescimento da cidade colonial, começaram a aumentar também as pressões suburbanas como consequência da multiplicação dos núcleos indígenas (em 1927 eram 20.642 os habitantes na área urbana; em 1935 mais que duplicaram chegando a um total de 47.390 habitantes, destes, cerca de metade era indígena e a outra metade não; em 1940 são 68.223 os habitantes em que, não chegam a 25.000 a população não indígena. Vanin (2013) explica que esta ocupação gerou problemas que exigiam soluções de grande dimensão. Sendo a população indígena claramente maioritária, encontrava-se localizada nos subúrbios e nos bairros mais carenciados, como na zona do Alto Maé (fig. 12). Um dos problemas gerados passa pelas pressões feitas por parte de investidores estrangeiros no sentido de serem realizadas amplas áreas residenciais. Vanin (2013) justifica ainda que foi este conjunto de transformações, em conjunto com a necessidade de expansão dos limites do conselho e a criação de uma nova imagem para a capital da colonia que levaram o governo colonial a elaborar um novo plano para a

Figura 11 - Planta da Cidade de Lourenço Marques, 1928

Publicado em: http://www.igeoe.pt/cartoteca/bibliopac/images/Mo%C3%A7_1.jpg - Consultado a 24/05/2018 às 16:48;

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cidade. Assim, em 1947, é solicitado ao Gabinete de Urbanização Colonial que sejam tomadas medidas rapidamente.

O pedido deste plano chega num período muito próprio do urbanismo português que procurava, na sua prática, consolidar a imagem do regime, não só em Portugal como também nas suas colónias. (Morais et al, 2012). João Aguiar14, responsável pelo Gabinete de de Urbanização Colonial (GUC15)

e autor do Plano Geral de Urbanização de Lourenço Marques (PGULM), desloca-se a Lourenço Marques, em Outubro de 1947, onde permanece por um mês. Uma vez que este plano surge num contexto de aumento exponencial da população, João Aguiar, inclui na elaboração do plano, um exaustivo levantamento da cidade a nível histórico, climático, geográfico e populacional (identificado por grupos étnicos) como explicam Milheiro e Fiúza (2012). O plano é composto por dois volumes sendo que o primeiro

14 João Aguiar – Responsável pelo GUC, faz parte de uma nova classe de urbanistas, com diversas formações, desde escolas nacionais de Belas Artes às estrangeiras. Autor de vários planos de urbanização, tanto na metrópole como nas ex-colónias. 15 GUC – Gabinete de Urbanização Colonial, foi fundado em Dezembro de 1944 por Marcelo Caetano, Ministro das Colónias durante a IIª Guerra Mundial. Foi um grupo de projecto urbano e de arquitectura, articulado ao quadro político e administrativo do Estado Novo. Este gabinete nasce com “um carácter de organismo comum a todas as colónias de África” (Dec. Nº34:173, 06/12/1994). in Milheiro et al, 2012.

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volume contém todo o levantamento referido e ainda os equipamentos implantados, as estruturas já traçadas e os bairros indígenas preexistentes. No segundo volume podemos encontrar a Memória Descritiva do plano elaborado.

A proposta de Aguiar no PGULM passa por fixar a cidade já existente e complementar as funções em falta. Em relação a termos conceptuais, segundo Morais e Malheiro (2012), o plano, (fig. 13),contempla a separação da cidade e dos subúrbios das áreas residências que estão em expansão.

A estrutura pública foi projectada dotando os edifícios com uma escala de monumento. Conforme Milheiro e Fiúza (2012), o plano promove uma maior monumentalidade das artérias principais da cidade. Aguiar pretende criar um novo centro cívico, associado a uma mudança de escala urbana, bipolarizando a cidade formal com a informal. Não fosse João Aguiar

Figura 13 - PGULM, planta de organização do solo, 1952

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discípulo de Alfred Donat-Agache16 e Etienne Groer17. No segundo volume do

plano podemos ler algumas das bases que foram seguidas no desenho do projecto e que seguem os princípios da Cidade-Jardim, como por exemplo, os arruamentos da cidade num traçado rectilíneo, a arborização dos arruamentos e das praças, zonas de parque de estacionamento, principalmente junto a zonas comerciais e residenciais, a expanção de zonas residenciais para a costa do Sol, o desenho de um bairro indígena, (fig. 14), dentro dos limites da cidade (destinado unicamente a indivíduos que trabalhem em serviços domésticos, comércio, zonas industriais, ferroviárias e/ou potuárias). Verifica-se ainda uma demarcação sectorial das funções da cidade, o reforço da monumentalidade urbana, plano de quarteirões em redor de rotundas ou edifícios marcantes da cidade e ainda uma separação da verticalidade, usada nos centros cívicos, da horizontalidade, predominante nas áreas residenciais. (PGULM, VOL. II, 1952)

Este plano prevê a sua implementação em 3 fases diferentes. Uma primeira fase centrada na reestruturação do preexistente onde seria feito um reforço da imagem urbana através do edificado excepcional. Numa segunda fase eram consolidadas as áreas periféricas, alvo de uma ocupação sem regra. Na última fase seriam realizadas as novas áreas de carácter predominantemente residencial. Apesar da recepção com que este plano foi acolhido, e mesmo contribuindo para a acentuação do carácter de zonamento da cidade, este parece ter pouca expressão na mesma e pouco do seu desenho foi aplicado. (Milheiro e Fiúza, 2012)

16 Arquitecto, nasceu em Paris no ano de 1875, projectou os planos urbanos do Rio de Janeiro, Recife, entre outras cidades brasileiras. Foi um dos fundadores da Sociedade Francesa de Urbanistas.

17 Arquitecto e Urbanista, nasceu em Varsóvia em 1882, foi professor no Instituto de Urbanismo de Paris. A partir de 1938 fixa-se em Lisboa e trabalha na elaboração de vários planos de urbanização nacionais.

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Uma década após a aprovação do PGULM, aparece a necessidade de transformar o plano oficial visto o desenvolvimento demográfico ter ultrapassado muito o que era esperado. Nesta altura, o plano de Aguiar começa a tornar-se desadequado face ao crescimento acelerado com que a cidade se debate. Como consequência surge o Plano Director de Urbanização de Lourenço Marques (PDULM), (fig. 15), sob a coordenação de Mário de Azevedo18, como nos explica Morais e Malheiro (2012).

18 Engenheiro Urbanista, responsável pela coordenação da equipa destacada para a elaboração do Plano Geral de Urbanização de Lourenço Marques;

Figura 14 - PGULM, plano de unidade residencial indigena, 1952

Imagem

Figura 1 - Mapa de assentamentos de grupos étnicos no território moçambicano;
Figura 9- Primeiro plano e plano de ampliação da cidade de Lourenço Marques, 1895;
Figura 10 - Cidade de Lourenço Marques com desenho da circunvalação, 1903;
Figura 11 - Planta da Cidade de Lourenço Marques, 1928
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Referências

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