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A evolução do sigilo bancário no ordenamento jurídico brasileiro

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

COORDENAÇÃO DE ATIVIDADES COMPLEMENTARES MONOGRAFIA JURÍDICA

A EVOLUÇÃO DO SIGILO BANCÁRIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

RENO SILVA VASCONCELOS MATRÍCULA: 0276058

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1 RENO SILVA VASCONCELOS

A EVOLUÇÃO DO SIGILO BANCÁRIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação do Professor

Francisco de Araújo Macedo Filho.

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2 RENO SILVA VASCONCELOS

A EVOLUÇÃO DO SIGILO BANCÁRIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Fortaleza (CE), 13 de junho de 2012.

BANCA EXAMINADORA:

Francisco de Araújo Macedo Filho, Dr.

Prof. Orientador da Universidade Federal do Ceará

Denise Lucena Cavalcante, Dra.

Professora da Universidade Federal do Ceará

Fernanda Castelo Branco Araújo, Ms.

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3 AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, a minha família e a todas as pessoas especiais em minha vida e que de alguma forma sempre me incentivaram e torceram pelo meu sucesso.

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4 RESUMO

O objetivo do presente trabalho é examinar as diferentes concepções que foram dadas ao instituto do sigilo bancário ao longo do desenvolvimento do ordenamento jurídico brasileiro, identificando os problemas e as possibilidades de sua quebra pela Administração Tributária, a fim de garantir a efetivação da justiça fiscal no país, dentro de condições e limites impostos pela lei e frente aos direitos fundamentais e garantias individuais consagrados constitucionalmente. O trabalho parte da evolução histórica do instituto do sigilo bancário desde os seus primeiros indícios na sociedade e, posteriormente daremos enfoque ao seu tratamento jurídico no Brasil, apontando a sua legislação de regência, seu conceito, estrutura e fundamentos. Por fim, procederemos a uma análise da Lei Complementar n.° 105/2001, seus principais dispositivos e as inovações que trouxe ao instituto, abordando também a discussão existente na doutrina e nos tribunais acerca de sua constitucionalidade, com o objetivo de oferecer uma visão do cenário atual e das conseqüências desta nova abordagem dada ao sigilo bancário.

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5 SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 6

2. CONCEITO E FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA DO SIGILO BANCÁRIO 8

2.1 CONCEITO 8

2.2 FUNDAMENTOS JURÍDICOS 10

2.2.1 TEORIA DO SIGILO PROFISSIONAL 10

2.2.2 TEORIA DA BOA FÉ OU DO DEVER DE LISURA 11

2.2.3 TEORIA CONTRATUALISTA 11

2.1.1 TEORIA CONSUETUDINÁRIA 12

2.2.5 TEORIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL 13

2.2.6 TEORIA DO DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA 14

3 ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SIGILO BANCÁRIO 17

3.1 SIGILO BANCÁRIO – ANTIGUIDADE À IDADE MODERNA 17

3.2 SIGILO BANCÁRIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 19

3.2.1 LEI N.° 556/1850 (CÓDIGO COMERCIAL) 20 3.2.2 LEI N.° 3.071/1916 (CÓDIGO CIVIL) E DECRETO LEI N.° 2.848/1940

(CÓDIGO PENAL) 22

3.2.3 LEI N.° 4.595/1964 23

3.2.4 LEI N.° 5.172/1966 (CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL) 26

3.2.5 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 29

3.2.6 LEI N.° 8.021/1990 30

3.2.7 LEI COMPLEMENTAR N.° 70/1991 31

3.2.8 LEI N.° 9.311/1996 34

4 A LEI COMPLEMENTAR 105/2001 E O SIGILO BANCÁRIO NO

CENÁRIO ATUAL 36

4.1 ANÁLISE DOS PRINCIPAIS DISPOSITIVOS DA LEI COMPLEMENTAR

105/2001 36

3.2 A CONSTITUCIONALIDADE DA LEI COMPLEMENTAR 105/2001 42

4.3 A RELATIVIZAÇÃO DO SIGILO BANCÁRIO NA ATUALIDADE 46

5. CONCLUSÃO 48

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6 1 INTRODUÇÃO

O sigilo sempre esteve, intrinsecamente, interligado às operações que envolviam questões financeiras, sendo impossível precisar o momento histórico de sua origem. Entretanto, pode-se afirmar que, ele decorre da confiança recíproca existente na relação entre o banqueiro e o seu cliente, seja da parte daquele pela expectativa de adimplemento dos deveres contratuais deste último, seja por parte deste, pela segurança que a instituição bancária representa do ponto de vista da estabilidade, da liquidez e da discrição na prestação das atividades inerentes às suas funções.

Inicialmente o instituto do sigilo bancário revestia-se de cunho sagrado, foi, aos poucos, se desvinculando da atividade religiosa para se aproximar da bancária, deixando gradativamente de ter fundamento exclusivo na fidúcia havida na relação cliente-instituição financeira, passando a integrar o ordenamento jurídico dos países civilizados.

No Brasil, podemos encontrar traços de proteção a este instituto no ordenamento jurídico desde os tempos do império, mesmo que de maneira indireta. O primeiro texto normativo a regular a matéria de maneira mais específica foi o Código Comercial, o qual, em seu artigo 17, estabelece rígida segurança ao segredo dos livros e da escrituração mercantil, afastando, inclusive, a possibilidade de restrição por ato do Poder Judiciário.

Posteriormente, a Lei nº 4.595/64 representou importante inovação, ao permitir expressamente em seu artigo 38 a quebra do sigilo bancário pelo judiciário, Comissão Parlamentar de Inquérito e agentes fiscais.

E, finalmente, em 10 de janeiro de 2001, nova regulamentação foi veiculada pela Lei Complementar nº 105, que revogou expressamente o artigo 38 da Lei nº 4.595/64, prescrevendo expressamente a possibilidade de quebra de sigilo bancário pelo Fisco, em procedimento administrativo, independentemente de prévia ordem judicial.

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7 Para tal, no primeiro capítulo temos uma abordagem conceitual do sigilo bancário, estabelecendo seu alcance e as diversas formas possíveis de definir este instituto. Trataremos também acerca das principais teorias que tentam fundamentar o sigilo das operações financeiras dentro da esfera jurídica e mostrando a influencia destas teorias no tratamento que o ordenamento jurídico brasileiro dá ao instituto.

No segundo capítulo, faremos uma análise da evolução histórica do sigilo bancário, detalhando as grandes transformações na concepção que lhe foi dada pela sociedade ao longo do tempo. Posteriormente detalharemos as transformações sofridas pelo instituto no ordenamento jurídico brasileiro, especificando os dispositivos legais que regiam a relação das instituições financeiras com os particulares em relação à proteção das informações trocadas.

Por fim, no terceiro capítulo faremos um estudo do sigilo bancário na atualidade, iniciando-o com uma análise das inovações trazidas pela Lei Complementar 105/2001, que disciplina a transferência de informações submetidas ao sigilo bancário para a administração tributária da União, e da discussão existente no mundo jurídico acera da constitucionalidade desta norma. Trataremos também da atual tendência existente tanto no cenário nacional, como internacional, da relativização do instituto do sigilo bancário como forma de combater a lavagem de dinheiro, a sonegação fiscal e qualquer tipo de movimentação financeira de cunho criminoso.

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8 2 CONCEITO E FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA DO SIGILO BANCÁRIO

2.1 CONCEITO

O significado da palavra “sigilo” está invariavelmente ligado ao da palavra “segredo”, conforme se pode extrair da definição de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira: “sigilo sm. 1. Obrigação de guardar um segredo. 2. Segredo.”. Nesse sentido, entende-se que tal palavra indica algo que permanece escondido da vista ou do conhecimento de outros. Entretanto, no campo jurídico o sigilo ganha contornos mais nítidos, referindo-se a um segredo inviolável, segundo a lei, e cuja transgressão é punível perante esta. Pontes de Miranda se referia ao vocábulo para designar a liberdade de negação ou a possibilidade de não emitir pensamento, surgindo assim o direito à privacidade.

Portanto, apesar de nascer como um dever ético/moral, percebe-se que em sua dimensão jurídica o dever de sigilo decorre da lei e sua não observância poderá implicar em responsabilização civil e/ou criminal. Diante disto, pode-se inferir que, juridicamente, o sigilo consiste numa obrigação, num dever de conduta, numa prestação negativa (não fazer), de não revelar a informação sigilosa. Com isto, pode-se afirmar que a natureza jurídica do sigilo é um vínculo obrigacional de natureza jurídica e não meramente um dever ético punível apenas com a desaprovação social.

É inerente a própria natureza humana a pretensão de manter alguns aspectos de sua vida econômica a salvaguarda, tanto das autoridades como dos olhos de terceiros. Esse comportamento faz surgir a necessidade da proteção da privacidade e da intimidade das pessoas e tal sentimento torna-se ainda mais latente quando relacionado às suas informações financeiras, sendo, o sigilo, bancário o meio de proteção destas informações.

Na concepção de Sergio Covello, tal instituto seria a “obrigação, por parte dos bancos, de não revelar, salvo por causa justa, as informações obtidas em decorrência da sua atividade profissional”.1

Nesse sentido, sigilo bancário representa para o cliente da instituição o direito ao segredo sobre os dados que lhe são concernentes e para o banco a correspondente obrigação de guarda desses mesmos dados, cujo conhecimento se obteve através do desempenho das funções que desempenha.

1

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9 Tem-se, portanto, que se trata da obrigação às instituições de crédito e organizações auxiliares, bem como seus empregados e integrantes de sua administração de não revelar, salvo em justa causa, direta ou indiretamente as informações e os dados que obtenham em virtude da atividade de realizam.

Do conceito acima disposto podem-se extrair os elementos que compõem a estrutura desta relação jurídica, os quais são: os elementos subjetivos (sujeito passivo e sujeito ativo) e o elemento objetivo (objeto).

O sujeito passivo, ou seja, aquele que está obrigado a sua observância (conservar o sigilo), não é representado somente pelos bancos, mas por qualquer instituição que seja definida pela lei como financeira ou que a ela seja equiparada, englobando seus dirigentes e empregados, razão pela qual a melhor denominação para o instituto seria sigilo financeiro.

Relativamente ao sujeito ativo, não só os clientes das instituições financeiras estão localizados no pólo ativo da relação jurídica obrigacional, assim, aqueles que utilizam os serviços bancários com habitualidade e detêm o direito de exigir o adimplemento da obrigação de conservar o sigilo. Ainda, pode-se afirmar que há a obrigação de sigilo até mesmo quando um terceiro que não seja cliente tenha recorrido à instituição para a prática de alguma operação ou serviço ou esteja de alguma forma vinculado a tais operações, incluídas as pessoas jurídicas.

Quanto ao objeto, consiste este na prestação que é devida pelo sujeito passivo em favor do sujeito ativo, que no presente caso é o sigilo em relação às informações obtidas a partir de tal prestação, tratando-se de uma obrigação de cunho negativo (não revelar o segredo), como já mencionado.

Pode-se falar ainda, segundo Covello2, que existe a divisão entre objeto imediato, ou seja, os fatos sobre os quais se vão guardar o sigilo, que estão expressamente discriminados na legislação de regência das instituições financeiras, ou seja, as operações bancárias propriamente ditas que é a própria prestação, e objeto mediato, referente aos dados envolvidos nessas operações (forma de pagamento, montante, juros, origem, destinação etc.) e todas as informações que a instituição colha para a realização das operações ou da prestação dos serviços (dados pessoais, endereço, estado civil, nome do cônjuge, valor dos vencimentos, local de trabalho, telefones, fax, email, relação de bens, etc.), mesmo que o negócio não venha a se consumar.

2

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10 2.2 FUNDAMENTOS JURÍDICOS

O recente disciplinamento legal do tema deste trabalho não só no Brasil, mas também em vários outros países e a grande discussão doutrinária ao seu entrono, fez com que surgissem diversas teorias sobre o fundamento jurídico do sigilo bancário. Dentre tais teorias, merecem destaque: a consuetudinária, a contratualista, a do segredo profissional, a da boa-fé ou dever de lisura, a da Responsabilidade Civil e a do Direito à Intimidade e à Vida Privada.

2.2.1 Teoria do Sigilo Profissional

A França foi primeiro país a estabelecer uma sanção penal em decorrência da quebra do sigilo profissional, incluindo entre os profissionais obrigados ao sigilo, os banqueiros, seguindo, assim, esta teoria que é dominante entre as doutrinas dos países europeus.

A teoria do segredo profissional é embasada no enquadramento do sigilo financeiro como segredo profissional e, conseqüentemente, das instituições financeiras como integrantes do rol das pessoas obrigadas à conservação do sigilo das informações e fatos que tenham ciência em virtude de suas atividades profissionais. Esta teoria busca como fonte da obrigação de guardar segredo a responsabilidade criminal sobre a sua violação. Portanto propõe a inclusão dos bancos dentre aqueles cujo exercício da atividade profissional leva a tomar conhecimento de certos fatos que dizem respeito à esfera íntima do indivíduo, fatos que devem ser legalmente resguardados.

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11 A segunda ordem de objeções a esta teoria diz respeito à questão do fundamento do sigilo financeiro, pois o fato de estar ele incluído na relação dos segredos profissionais não resolve o problema da explicação sobre o seu fundamento. Desta forma, sendo ambos espécies do gênero sigilos um não pode servir de fundamento para o outro, afinal tentando-se fundamentar o sigilo financeiro com o sigilo profissional, resta ainda a dúvida da fundamentação deste.

2.2.2 Teoria da Boa Fé ou do Dever de Lisura

Esta teoria sustenta que o fundamento do sigilo financeiro encontra-se no caráter fiduciário da atividade bancária, com base nos princípios gerais de direito, como os da boa fé e do dever de lisura, lealdade. O berço desta teoria está na doutrina italiana, sendo seus principais seguidores Vellotti e Di Amato.

Esta teoria assemelha-se em muito às teorias consuetudinária e contratualista - que serão abordadas posteriormente - uma vez que os princípios da boa fé e do dever de lisura são derivados dos costumes e das práticas das atividades comerciais e bancárias, podendo, ainda, estar previstos em contrato.

Desta forma, a teoria da boa fé ou do dever de lisura é válida, mas não encontra autonomia, por tratar-se de uma reprodução da teoria contratualista, conseqüentemente apresentando suas falhas, a serem apontadas posteriormente. Além disso, o dever de lisura só pode ser invocado, como fonte de obrigação, em países como a Itália, onde existe consagração legislativa expressa. Nas legislações onde falta regra parecida, esta teoria não encontra amparo que lhe dê validade, a menos que se recorra aos princípios gerais de direito – porquanto a boa fé como o dever de lisura são princípios gerais do direito – e, então chegaremos ao direito natural, cujo princípio básico é fazer o bem e evitar o mal. Portanto, a teoria não dá o fundamento do sigilo bancário, porque não aponta, senão de passagem, o fato do qual decorre a obrigação.

2.2.3 Teoria Contratualista

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12 após ser acolhida pela jurisprudência inglesa no célebre caso Tournier v. National Provincial Bank, em julgado de 19243, onde se lê:

"O contrato firmado entre o banqueiro e seu cliente contém cláusula implícita que obriga o banqueiro a não revelar a terceiros, sem consentimento expresso ou tácito do cliente, nem a situação da conta do cliente nem suas transações com o banco, nem qualquer informação que chegue ao conhecimento do banqueiro em virtude do relacionamento com o cliente".

Desta forma, teoria contratualista parte da premissa de que o sigilo bancário tem como fundamento jurídico o contrato estabelecido entre a instituição financeira e o cliente, havendo neste uma cláusula pela qual a instituição se obriga a guardar segredo das operações efetuadas pelo cliente, manifestada expressa ou tacitamente. Portanto, a obrigação de segredo seria um dever acessório, que se situa ao lado do dever principal objeto do contrato, tendo em vista o caráter fiduciário da relação bancária.

Contudo, esta teoria não explica porque as instituições financeiras devem conservar o sigilo mesmo quando por alguma razão o contrato não chega a vigorar ou quando vigorou, mas já se extinguiu ou ainda nos casos em que nem contrato há, como no caso das informações pertinentes a terceiros estranhos à relação jurídica entre instituição financeira e cliente, mas vinculados de alguma forma às atividades dessas instituições.

2.2.4 Teoria Consuetudinária

A teoria consuetudinária, como o próprio nome reflete, defende que o sigilo bancário tornou-se obrigação jurídica em virtude dos usos e costumes das práticas comerciais bancárias através dos tempos, tendo como seus principais seguidores na doutrina internacional Molle, Folco, Castelana e Garrigues; e na doutrina nacional Lauro Muniz Barreto.

Os defensores desta teoria entendem que o dever de sigilo encontraria seu fundamento no uso contínuo ao longo dos séculos, sendo observado como uma verdadeira tradição pelas instituições financeiras, ou seja, a obrigação de guarda das informações advém de uma

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GALLANT, Mary Michelle (2005). Money Laundering and the Proceeds of Crime: Economic Crime and

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13 tradição universalmente observada pelas instituições de crédito, desde a Antigüidade, o que vem sendo mantida ao longo dos séculos.

Para que o costume seja produtor de direito, seu uso deve ser prolongado e observado pela coletividade, que precisa ter a consciência de que ele é obrigatório e produziria conseqüências jurídicas.

Desta forma, se a relação entre o banco e o indivíduo desembocar numa operação, é desejável que aquela seja reduzível a um contrato; mas, se o mesmo não acontecer, ainda assim, haverá a obrigação do banco de assegurar o sigilo, já que o costume exprime a vontade coletiva, devendo, portanto, ser respeitado. Na hipótese de a instituição deixar de observar o sigilo, poderá incorrer em responsabilidade extracontratual.

Entretanto, esta teoria, ao confundir a origem do sigilo bancário com seu fundamento, não explica a razão de ser do sigilo quando este se encontra positivado na lei. Portanto, tal pensamento apenas é valido nos países em que não existe imposição legislativa para o sigilo, perdendo importância nos demais países, inclusive no Brasil, onde o sigilo foi consagrado legalmente.

2.2.5 Teoria da Responsabilidade Civil

A teoria da responsabilidade civil é antiga, sendo conhecida também como "Teoria Delitual" ou "Teoria do Ato Ilícito". Seus defensores sustentam que o sigilo bancário encontraria justificativa na responsabilidade civil da instituição financeira ou, mais precisamente, no dever geral de não prejudicar a outrem, já que a transgressão resultaria na obrigação de reparar o dano.

Especificamente no caso do sigilo financeiro, consiste na responsabilidade das instituições financeiras pelos prejuízos causados aos clientes ou a terceiros pela divulgação indevida das informações sigilosas.

A fragilidade desta teoria reside no fato de que ela aborda os efeitos, as conseqüências da não observância da obrigação de conservação do sigilo, mas não o seu fundamento jurídico.

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14 Entretanto, tais fatos não excluem a responsabilidade civil da concepção do sigilo bancário, ou seja, a violação ou divulgação indevida de dados bancários pode gerar responsabilização civil, mas não é suficiente para funcionar como seu fundamento jurídico.

2.2.6 Teoria do Direito à Intimidade e à Vida Privada

Esta teoria reflete o entendimento doutrinário e jurisprudencial majoritário e afirma que o sigilo bancário fundamenta-se no direito à intimidade, o qual se inclui no elenco dos direitos da personalidade, que tem o desiderato de garantir o direito à vida privada às pessoas.

No Brasil as expressões “intimidade” e “vida privada” possuem expressa menção no texto constitucional (v.g. artigo 5.°, inciso X, da CF). E para uma melhor compreensão da presente teoria é importante que se faça a distinção entre as definições de ambas as expressões, bem como da sua correta utilização para designar o objeto dos direitos aqui tratados.

Nesse sentido, apesar de alguns juristas utilizarem tais expressões como se fossem sinônimas, a maioria dos doutrinadores acreditam que existe uma sensível diferença entre elas. Corroborando com tal pensamento, Tércio Sampaio Ferraz Júnior 4 esclarece:

“A intimidade é o âmbito exclusivo que alguém reserva para si, sem nenhuma repercussão social, nem mesmo ao alcance da sua vida privada que, por mais isolada que seja, é sempre um viver entre os outros (na família, no trabalho, no lazer comum). Não há um conceito absoluto de intimidade. Mas é possível exemplificá-lo: o diário íntimo, o segredo sob juramento, as próprias convicções, as situações indevassáveis de pudor pessoal, o segredo íntimo cuja mínima publicidade constrange. Já a vida privada envolve a proteção de formas exclusivas de convivência. Trata-se de situações em que a comunicação é inevitável (em termos de relação de alguém com alguém que, entre si, trocam mensagens), das quais, em princípio são excluídos terceiros. Terceiro é, por definição, o que não participa, o que não troca mensagens, que está interessado em

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FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites a função

fiscalizadora do Estado. Disponível em:

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15 outras coisas. Numa forma abstrata, o terceiro compõe a sociedade, dentro da qual a vida privada se desenvolve, mas que com esta não se confunde. A vida privada pode envolver, pois, situações de opção pessoal (como a escolha do regime de bens no casamento) mas que, em certos momentos, podem requerer a comunicação de terceiros (na aquisição, por exemplo, de um bem imóvel). Por aí ela difere da intimidade, que não experimenta esta forma de repercussão.”

Assim, apesar de na linguagem cotidiana o conteúdo das expressões ser muito próximo, vida privada traz em sua raiz um conteúdo intersubjetivo, relacional, de “proximidade”, “confidência” e “amizade”, enquanto intimidade parece significar algo isolado, distante, solitário, ligando-se ainda ao sentido de “apropriação”, de “propriedade”.

Desta forma, muitos juristas entendem que a intimidade e a vida privada seriam verdadeiros reflexos da personalidade jurídica, elevando-se até a uma espécie de premissa geral desta, integrando a categoria dos direitos da personalidade, em suas diversas manifestações, como o direito à imagem, ao nome, à inviolabilidade do domicílio, o direito sobre o próprio corpo, à honra, à vida e à liberdade.

Entretanto, não parece adequada a associação do sigilo bancário, que pode ser renunciado pela própria vontade do titular, com os direitos da personalidade, que, por sua própria natureza, são irrenunciáveis. Vale ressaltar que o sigilo bancário não é um direito inerente ao homem, sendo permitido na legislação dos mais diversos países, inclusive no Brasil, o acesso aos dados bancários dos cidadãos, como instrumento de preservação do interesse público. Tal entendimento é compartilhado pelo Ministro Francisco Rezek em seu voto no julgamento do mandado de segurança n° 21.729-4 (DF) 5, abaixo:

Não obstante essa repercussão mais ampla, o núcleo da privacy situa-se na esfera das convicções íntimas do indivíduo, como as religiosas e políticas, nas relações de convivência familiar e afetiva, nos bons costumes sexuais, hábitos, dados clínicos, enfim naquele reduto que não se exteriorize no âmbito da vida pública. (...) que a locução "vida privada" sempre exprimiu o contraste claramente

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16 detectado pelo senso comum, que opõe o privado ao público, e que se agrega a um conjunto constituído em torno da idéia de família, de casa, de interior.(...)

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17 3 ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SIGILO BANCÁRIO

Os bancos e demais instituições financeiras desempenham, na atualidade, um papel fundamental na prestação de serviços na área financeira, tanto na esfera privada quanto nas relações com o Estado, a ponto de ser inimaginável pensar-se nas várias formas de transações financeiras que ocorrem no cotidiano das pessoas sem que haja a intermediação dessas instituições.

As operações bancárias precederam a existência da própria moeda, desenvolvendo-se de forma natural. Já se fazia referência ao sigilo bancário no Código de Hamurabi, escrito pelo então rei da Babilônia, que mencionava a proibição de um banqueiro, desvendar seus arquivos em caso de conflito com o cliente.

Desta forma, a gênese do sigilo bancário está indelevelmente ligada ao próprio surgimento dos bancos, sendo de crucial importância que se busque as raízes do surgimento dessas instituições para que se compreenda a origem daquele instituto.

3.1 SIGILO BANCÁRIO – ANTIGUIDADE À IDADE MODERNA

Conforme mencionado anteriormente, o sigilo bancário tem sua origem no alvorecer da própria atividade bancária, a qual remonta ao período antigo da civilização humana, tendo a sua própria gênese nas transações comerciais e no surgimento da moeda.

O Código de Hamurabi, rei da Babilônia, introduziu regras relativas a operações bancárias e de crédito, ao uso da moeda e à insolvência. As instituições bancárias babilônicas aceitavam depósitos, realizavam pagamentos em outras praças e faziam operações de compensação de créditos entre seus clientes6.

A mais antiga referência ao sigilo bancário é também encontrada neste instrumento lega l “[...] mencionava a possibilidade que tinha o banqueiro de desvendar seus arquivos em caso de conflito com o cliente. À contrario sensu, interpreta-se que, fora daí, o banco estava adstrito à obrigação do segredo”.7

Entretanto, na Antigüidade a atividade bancária ainda não se revestia do caráter profissional das instituições, estando fortemente vinculada com a atividade religiosa.

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ABRÃO, Nelson. Direito Bancário. 8. ed. rev., atual. e ampl. por Carlos Henrique Abrão. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 64

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18 Nas regiões da Babilônia, Egito e Fenícia, as operações bancárias eram realizadas nos templos religiosos, a cargo dos sacerdotes, e limitavam-se a guarda e empréstimo de valores. O segredo guardado em torno de tais operações, realizadas internamente, tinha íntima relação com a inviolabilidade dos próprios templos religiosos. Por sua origem mística infere-se que a atividade bancária deveria revestir-se de um caráter sagrado. É por isso que se chega a assemelhar as expressões léxica e ontologicamente: sagrado e segredo.

A diversificação das atividades bancárias vem a lume somente com o surgimento da civilização greco-romana.

Na Grécia da época homérica o pagamento nas operações comerciais era efetuado mediante a troca da própria mercadoria. Porém, com a intensificação das trocas e a expansão marítima foram criadas as condições para o aparecimento da moeda metálica “cunhada”, que se deu entre os séculos VIII e VII a.C..

Quanto ao sigilo das operações nesta época, acredita-se que ele tenha permanecido mesmo após as atividades bancárias terem deixado o recinto dos templos religiosos, uma vez que os banqueiros gregos exerciam, além da intermediação de crédito, a função de notários e confidentes de seus clientes. Sócrates sustentava: "Os negócios com banqueiros se fazem sem testemunhas"8.

Em Roma, a expansão econômica se deu com as conquistas militares, quando houve a introdução da moeda, fazendo com que sua economia sofresse transformações radicais. A antiga aristocracia rural se sobrepôs, então, uma aristocracia do dinheiro, a dos proprietários, em cujas mãos se acumularam grandes fortunas, expandindo-se também a atividade bancária. Assim, no século III a.C., Roma já possuía comércio bancário, que se praticava tanto nos templos como em outros recintos.

Quanto ao sigilo bancário, nota-se o início da separação da conotação religiosa e sagrada e começou a ser objeto de regulação jurídica, na medida em que o banqueiro só estaria obrigado a apresentar informações contidas no livro Codex, que as armazenava, diante da Justiça e assim mesmo somente em caso de litígio entre o banqueiro e seu cliente.

Posteriormente, no início da Idade Média, prevalecia a chamada economia natural, na qual a vida econômica se processava praticamente sem a utilização do dinheiro, baseando-se na permuta de bens. Período que foi fortemente marcado pela influência da Igreja Católica sobre a vida dos cidadãos. Em especial as proibições referentes à usura limitaram o desenvolvimento das atividades bancárias.

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19 Entretanto, as transformações ocorridas na sociedade medieval do ocidente nessa época fizeram com que a prática usurária se tornasse necessária. A “Carta sobre a Usura”, de Ítalo Calvino, de 1545, criticou esse entendimento, considerando incompreensível que um proprietário de terra pudesse arrendá-la, enquanto ao proprietário do capital não fosse lícito fazer o mesmo. Desta forma, percebe-se que a passagem da economia essencialmente feudal para uma economia monetária teve repercussão também no terreno religioso.

O fator preponderante na escalada do comércio e da atividade bancária na idade média foi o intercâmbio comercial das cidades italianas, como Florença, Gênova e Veneza, com o Oriente, uma vez que nesta região surgiram os primeiros bancos comerciais.

Tem-se a partir daí a consolidação do sigilo bancário como regra de conduta respeitada pelos banqueiros com a convicção de corresponder a uma necessidade ética e jurídica, estabelecendo-se na consciência comum da sociedade a idéia de que as operações bancárias devem permanecer sob reserva.

Na idade moderna, precisamente na época das grandes navegações e expedições marítimas, quando se via a necessidade de buscar recursos para financiar tais expedições, os grandes banqueiros e financistas desfrutavam de enorme respeito, prestígio e poder, tanto frente ao Estado como aos particulares.

A exploração dos recursos naturais encontrados nas novas terras (metais e pedras preciosas e produtos agrícolas) fez surgir a necessidade da internacionalização das operações bancárias e, com o advento da Revolução Industrial que consolidou o capitalismo liberal e promoveu a modernização das instituições financeiras, dinamizando suas operações para adaptar-se ao progresso econômico. A partir daí, a questão do sigilo destas operações financeiras desperta a atenção do legislador, deixando paulatinamente de ser costume para alcançar positivação legislativa.

3.2 SIGILO BANCÁRIO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

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20 mesmo século.

Atualmente os bancos e instituições financeiras desenvolvem atividades das mais variadas e complexas, tanto para satisfação das necessidades dos particulares como para as do Estado. Alem da prestação de serviços como a concessão de crédito em suas diversas modalidades, consultoria, seguros, investimentos, custódia de valores etc., estas instituições também auxiliam o poder público no desempenho de suas funções institucionais, como por exemplo, no recebimento de tributos, intermediação na negociação de títulos da dívida pública e fomento de atividades econômicas, sendo de extrema importância a regulamentação acerca da guarda das informações trocadas na realização de todos estes serviços.

A aplicação do sigilo bancário no Brasil, a exemplo do que ocorreu em outras partes do mundo, teve origem consuetudinária, vindo a integrar o sistema jurídico positivo pátrio somente no final do século XIX e sofrendo modificações estruturais desde então, como se verá adiante.

3.2.1 Lei n.° 556/1850 (Código Comercial)

Conforme mencionado anteriormente, a normatização do sigilo bancário no Brasil era inicialmente baseada nos costumes. Desta forma, os bancos sempre apresentaram resistência a fornecer informações sobre seus clientes e as operações que realizavam.

Tal posição foi reforçada com a entrada em vigor da Lei n.° 556, de 25 de junho de 1850, que instituiu o Código Comercial, aplicável aos banqueiros e às relações bancárias por força do disposto por seus artigos 119 e 120.

O artigo 17 deste Código previa o sigilo dos livros de escrituração mercantil, sendo, portanto, considerado como o primeiro a fornecer uma idéia de rígida proteção legal do sigilo, conforme se lê abaixo:

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21 A redação deste artigo serviu de forte argumento para que os bancos, desde aquela época, se negassem a prestar informações acerca das contas correntes de seus clientes, até mesmo para as autoridades judiciárias, dando ao instituto do sigilo bancário um caráter absoluto, ou seja, que não podia ser violado em hipótese alguma.

Entretanto, esta rígida proteção sofria as limitações previstas pelos artigos 18 e 19 do mesmo Código Comercial, pelos quais se permitia que os livros fossem exibidos judicialmente nos casos expressamente previstos, os quais são:

“Art. 18. A exibição judicial dos livros de escrituração comercial por inteiro, ou de balanços gerais de qualquer casa de comércio, só pode ser ordenada a favor dos interessados em questões de sucessão, comunhão ou sociedade, administração ou gestão mercantil por conta de outrem, e em caso de quebra.

Art. 19 - Todavia, o juiz ou Tribunal do Comércio, que conhecer de uma causa, poderá, a requerimento da parte, ou mesmo do ex ofício, ordenar, na pendência da lide, que os livros, ou de qualquer ou de ambos os litigantes sejam examinados na presença do comerciante a quem pertencerem e debaixo de suas vistas, ou na de pessoa por ele nomeada, para deles se averiguar e extrair o tocante à questão (...)”.

Assim, pode-se observar que, desde a sua introdução no ordenamento jurídico brasileiro, ao sigilo não foi imputado caráter absoluto. A própria lei estabelece os seus contornos, prevendo as suas exceções. Entendimento que foi reconhecido pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) que, por intermédio das Súmulas 390 e 439, entendeu que a exibição judicial dos livros comerciais poderia ser requerida como medida preventiva, estando também sujeitos à fiscalização da administração tributária ou previdenciária, sendo o exame limitado ao objeto da investigação.

(24)

22 intimidade e a vida privada dos cidadãos que utilizavam os serviços bancários e financeiros.

3.2.2 LEI N.° 3.071/1916 (CÓDIGO CIVIL) E DECRETO LEI N.° 2.848/1940 (CÓDIGO PENAL)

Em 1.° de janeiro de 1916 entrou em vigor a Lei n.° 3.071, que instituiu o hoje revogado Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, e em seu artigo 144 trazia a previsão de que ninguém poderia ser obrigado a depor sobre fatos que, por motivo profissional devesse guardar segredo. Tal previsão estabeleceu uma ligação entre o instituto do sigilo bancário com o sigilo profissional, portanto os banqueiros e funcionários de instituições financeiras estariam incluídos no campo de aplicação desta norma.

Posteriormente, foi aprovado o Decreto Lei n.° 2.848, de 7 de dezembro de 1940, que instituiu o Código Penal Brasileiro. Tal Decreto, confirmando o entendimento trazido pelo então vigente Código Civil, tipificou em ser artigo 154 o crime de violação do sigilo profissional, conforme podemos ler em sua redação abaixo:

“Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.”

Desta forma, passaram os segredos profissionais a contar com uma proteção penal contra a sua inviolabilidade. Entretanto, atualmente, não é pacífico o entendimento de que tal preceito aplica-se ao sigilo bancário, havendo parte da doutrina que acredita que este não está incluído entre as espécies de sigilo profissional, por dedicar-se a resguardar apenas o conteúdo das operações bancárias e das prestações dos serviços correlatos.

(25)

23 Art. 2º. No exercício de suas atribuições, poderão as comissões parlamentares de inquérito determinar as diligências que reputarem necessárias e requerer a convocação de ministros de Estado, tomar o depoimento de quaisquer autoridades federais, estaduais ou municipais, ouvir os indiciados, inquirir testemunhas sob compromisso, requisitar de repartições públicas e autárquicas informações e documentos e transportarse aos lugares onde se fizer mister sua presença e requerer a convocação de ministros de Estado.

3.2.3 LEI N.° 4.595/1964

A Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964, conhecida como Lei do Sistema Financeiro Nacional, foi inovadora ao reorganizar o sistema bancário brasileiro, apresentando previsões expressas acerca do sigilo em suas operações. Esta norma mostrou-se menos rígida em relação ao sigilo bancário em relação à posição adotada pelo Código Comercial permitindo que a administração tributária tivesse acesso às informações bancárias desde que dois requisitos fossem respeitados: deveria haver processo instaurado e os documentos deveriam ser indispensáveis segundo a autoridade, conforme podemos ler em seu artigo 38, in verbis:

Art. 38. As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.

§ 1º As informações e esclarecimentos ordenados pelo Poder Judiciário, prestados pelo Banco Central da República do Brasil ou pelas instituições financeiras, e a exibição de livros e documentos em Juízo, se revestirão sempre do mesmo caráter sigiloso, só podendo a eles ter acesso as partes legítimas na causa, que deles não poderão servir-se para fins estranhos à mesma.

(26)

24 podendo, havendo relevantes motivos, solicitar sejam mantidas em reserva ou sigilo.

§ 3º As Comissões Parlamentares de Inquérito, no exercício da competência constitucional e legal de ampla investigação (art. 53 da Constituição Federal e Lei nº 1579, de 18 de março de 1952), obterão as informações que necessitarem das instituições financeiras, inclusive através do Banco Central da República do Brasil.

§ 4º Os pedidos de informações a que se referem os §§ 2º e 3º, deste artigo, deverão ser aprovados pelo Plenário da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal e, quando se tratar de Comissão Parlamentar de Inquérito, pela maioria absoluta de seus membros. § 5º Os agentes fiscais tributários do Ministério da Fazenda e dos Estados somente poderão proceder a exames de documentos, livros e registros de contas de depósitos, quando houver processo instaurado e os mesmos forem considerados indispensáveis pela autoridade competente.

§ 6º O disposto no parágrafo anterior se aplica igualmente à prestação de esclarecimentos e informes pelas instituições financeiras às autoridades fiscais, devendo sempre estas e os exames serem conservados em sigilo, não podendo ser utilizados senão reservadamente.

§ 7º A quebra do sigilo de que trata este artigo constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatro anos, aplicando-se, no que couber, o Código Penal e o Código de Processo Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.

O dispositivo acima disciplinou de forma ampla e detalhada o instituto do sigilo bancário, confirmando o seu caráter relativo com estabelecimento de seus limites, bem como a previsão de punição criminal para o caso de sua violação em seu último parágrafo.

(27)

25 5.° refere-se a agentes fiscais tributários do Ministério da Fazenda e dos Estados, silenciando quanto aos Municípios, ao que parece, em razão da falta de autonomia dos Municípios à época, o que somente ocorreu com a promulgação da Constituição Federal de 1988, por força do disposto em seu artigo 18.

Neste mesmo parágrafo são previstas duas condições cumulativas para que possam ser realizados os exames pela autoridade fiscal. Em razão ambigüidade contida em sua redação, foram suscitadas várias controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais.

Primeiramente, lê-se que deve haver processo instaurado, deixando em aberto se trata de processo judicial ou administrativo. Posteriormente, dispõe que os documentos livros e registros de contas de depósitos devem ser considera dos indispensáveis pela autoridade competente, sem esclarecer qual autoridade.

Parte da doutrina defendeu a interpretação restritiva do dispositivo, onde processo e jurisdição são conceitos correlatos, sendo que a palavra processo traduz a própria jurisdição em exercício.

Desta forma pode-se compreender a interpretação dada pelo Banco Central ao dispositivo da seguinte forma: a norma determina como regra, a manutenção do segredo, estabelecendo exceções e tipificando ao final uma conduta criminosa, devendo, conseqüentemente, ser interpretada de modo estrito em razão do rigor da punição estabelecida para o crime de quebra de sigilo.

A interpretação do parágrafo 6.° do artigo 38 da Lei n.° 4.595/1964 não demanda maiores esforços, pois pela sua redação fica estendido autoridades fiscais a possibilidade de verificação e exame de documentos, livros e registros, a obtenção de esclarecimentos e informes pelas instituições financeiras. Em sua parte final está disposta a obrigação de manutenção do sigilo por parte das autoridades fiscais em relação às informações por ela obtidas.

(28)

26 responsabilidade, jamais poderá transmitir o que lhe foi dado a conhecer”.9 Portanto, tornou-se evidente que o STF, antes mesmo da vigência do CTN, teria adotado a tese da transferência de responsabilidade de observação ao sigilo dos bancos para o Fisco, ficando a cargo dos agentes fiscais e evidenciando a flexibilização do instituto. Entretanto, “transferência” não seria a expressão mais adequada para a situação, uma vez que o que ocorre é o acréscimo de um novo sujeito obrigado à conservação do sigilo, podendo falar-se em responsabilidade compartilhada.

Assim, quando as autoridades fiscais tomam conhecimento das informações sob sigilo, na forma estabelecida pelos parágrafos 5.° e 6.° da Lei n.° 4.595/64, há a responsabilidade agora não mais somente dos bancos responsáveis pelo sigilo, mas também, concorrentemente, os órgãos que passaram a conhecer dos dados. Nesse caso, somente ocorrerá quebra de sigilo quando terceiros não autorizados tomarem conhecimento das informações sigilosas, ou seja, enquanto a informação estiver no âmbito reservado dos órgãos públicos, que as recebeu legalmente, não havendo o fenômeno da quebra de sigilo.

3.2.4 LEI N.° 5.172/1966 (CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL)

Com a entrada em vigor da Lei n.° 5.172, de 25 de outubro de 1966, o Código Tributário Nacional, fortaleceu a tese da possibilidade de acesso direto aos documentos bancários pelo Fisco, mediante simples processo administrativo, dispensada a autorização judicial. Passou então a vigorar o seu artigo 197 que elencou uma nova possibilidade de exceção ao sigilo, conforme transcreveremos:

Art. 197. Mediante intimação escrita, são obrigados a prestar à autoridade administrativa todas as informações de que disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de terceiros: (...) II - os bancos, casas bancárias, Caixas Econômicas e demais instituições financeiras;(...)

Parágrafo único. A obrigação prevista neste artigo não abrange a prestação de informações quanto a fatos sobre os quais o informante

9

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tributário. Sigilo Bancário: agentes do imposto de renda. Ação fiscal

nos bancos. Recurso não provido. Recurso em mandado de segurança n.° 15925 – GB. Diário da Justiça.

(29)

27 esteja legalmente obrigado a observar segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão.

Para a maioria dos doutrinadores a polêmica sobre a possibilidade da quebra do sigilo bancário pela administração fazendária restou, portanto, definitivamente superada, ou seja, as instituições financeiras estavam obrigadas a prestar informações às autoridades fazendárias, desde que atendidas às condições impostas pela Lei n.° 4.595/1964.

Entretanto, outros questionamentos surgiram com a edição do CTN. Primeiramente, alguns doutrinadores vislumbram um conflito de normas entre os citados artigos do CTN e o artigo 38 da Lei n.° 4.595/1964, ambos recepcionados pela Constituição Federal de 1988 com status de lei complementar. Para eles, o caput do artigo 197 do CTN derrogou tacitamente os parágrafos 5.° e 6.° do artigo 38 da Lei n.° 4.595/1964, passando a ser permitido à Administração Tributária carrear as informações bancárias sigilosas mediante simples intimação escrita, não mais sendo necessário processo administrativo instaurado, porém tal derrogação só não foi argüida pela administração tributária em razão do fato de que para o fisco era muito mais fácil fazer constar nas intimações escritas a existência de processo instaurado e a imprescindibilidade da requisição do que enfrentar o mérito da derrogação, que demoraria muito mais e, não traria mudanças significativas.

Outro aspecto que causou polêmica, foi a previsão do parágrafo único do artigo 197 do CTN, uma vez que para os adeptos da teoria do segredo profissional ele excepcionava os bancos do dever de prestar informações às autoridades administrativas, uma vez que tais informações eram obtidas em razão de sua função.

Desta forma, chegou-se à conclusão de que a interpretação mais adequada dos dois dispositivos é aquela que busca compatibilizá-los de modo a fazer prevalecer a eficácia de ambos. Ainda, há que se ressaltar que o CTN traz disposições gerais, portanto não revoga a lei anterior naquilo que com ela for compatível. A aplicação do art. 195 não tinha o condão de afastar a Lei n.° 4.595/64, pois o seu art. 38 não limitou o direito de fiscalização, apenas criou procedimentos para o seu exercício, devendo-se entender que o poder de fiscalizar se aplica por interpretação extensiva aos municípios e que a expressão “processo instaurado” signifique já ter regularmente iniciado o procedimento fiscal na conformidade do art. 196 do CTN. O objeto da fiscalização continuou o mesmo.

(30)

28 Estados ou dos Municípios poderiam obter mediante intimação escrita, desde que houvesse processo administrativo (ou procedimento fiscal) ou judicial instaurado, informações sigilosas que fossem consideradas indispensáveis pela autoridade competente.

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu sobre a questão no julgamento do recurso extraordinário n. o 71.640/BA, em seção realizada em 17 de setembro de 1971. O entendimento foi de que o sigilo bancário não estaria tutelado pelo parágrafo único do artigo 197 do CTN, continuando em vigor o artigo 38 da Lei n. o 4.595/1964, numa interpretação harmônica com o CTN, e, tendo em vista o disposto no artigo 38 daquele diploma legal, estendeu a aplicação de seu parágrafo 5º aos agentes fiscais dos Municípios, os quais não vinham expressamente mencionados, possibilitando, então, que estes tivessem acesso às informações financeiras.

Foi também manifestado o entendimento de que a prestação de informações bancárias aos agentes fiscais não caracterizaria violação ao sigilo das comunicações previsto no artigo 153, parágrafo 9º, da Constituição Federal de 1967 (atualmente previsto no artigo 5º, inciso XII, da CF/88).

A promulgação do Decreto lei n. o 1.718, de 27 de novembro de 1979 confirmou de forma expressa o entendimento acima descrito, prevendo em seu artigo 2º, abaixo:

Art 2º. Continuam obrigados a auxiliar a fiscalização dos tributos sob a administração do Ministério da Fazenda, ou, quando

solicitados, a prestar informações, os estabelecimentos bancários,

inclusive as Caixas Econômicas, os Tabeliães e Oficiais de

Registro, o Instituto Nacional de Propriedade Industrial, as Juntas Comerciais ou as repartições e autoridades que os substituírem, as Bolsas de Valores e as empresas corretoras, as Caixas de Assistência, as Associações e Organizações Sindicais, as companhias de seguros, e demais entidades, pessoas ou empresas que possam, por qualquer forma, esclarecer situações de interesse para a mesma fiscalização.

(31)

29 competente do Ministério da Fazenda exigir informações periódicas, em formulário padronizado.(grifo nosso)

Contudo, esta tendência começou a mudar, sobretudo após a promulgação da Constituição Federal de 1988, quando, após reiteradas decisões, firmou-se o entendimento de que somente mediante processo judicial instaurado poderia o Fisco quebrar o sigilo bancário, como veremos adiante.

3.2.5 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o direito à intimidade e à vida privada foi incluído no rol de direitos e garantias fundamentais, conforme seu artigo 5.°, inc. X. Tal fato reforçou a posição que defendia a impossibilidade da quebra do sigilo bancário pelo Fisco em processo administrativo, sendo a principal fundamentação das decisões judiciais que negam o acesso do Fisco diretamente às informações bancárias dos contribuintes, uma vez que, tanto na doutrina majoritária, como na jurisprudência atual, o entendimento é de que o sigilo bancário possui natureza constitucional.

O Ministro Demócrito Reinaldo, da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), manifestou no julgamento do Recurso Especial n.° 37.5665RS, em 2 de fevereiro de 1994, o seguinte entendimento acerca da questão da adequação da Lei n.° 4.595/1964 e do CTN à Constituição Federal de 1988, manifestando o seguinte entendimento:

“Tributário. Sigilo Bancário. Quebra com base em procedimento administrativo fiscal. Impossibilidade. O sigilo bancário do contribuinte não pode ser quebrado com base em procedimento

administrativo fiscal, por implicar indevida intromissão na

privacidade do cidadão, garantia esta expressamente amparada

pela Constituição Federal (artigo 5.°, inciso X). Por isso, cumpre às

(32)

30 decorrentes de procedimento fiscal regularmente instaurado e subscrito por autoridade administrativa competente.

Apenas o Poder Judiciário, por um de seus órgãos, pode eximir as instituições financeiras do dever de segredo em relação às matérias arroladas em lei. Interpretação integrada e sistemática dos artigos 38, parágrafo 5.°, da Lei n.° 4.595/1964 e 197, inciso II e parágrafo 1.°, do CTN. Recurso improvido, sem discrepância”10.(grifo nosso)

Em análise ao voto do Ministro relator do acórdão, vimos que ele afirma que a interpretação sistemática do artigo 38 da Lei n.° 4.595/1964 e seus parágrafos, à luz da CF/88, levaria ao entendimento de que somente o Poder Judiciário e as Comissões Parlamentares de Inquérito teriam a faculdade de acessar as informações sigilosas, uma vez que estas estão protegidas pelo artigo 5.°, inciso X, da CF/88. Além disso, o parágrafo 5.° do artigo 38 da Lei n.° 4.595/1964 utiliza o substantivo “processo” ao invés de “procedimento fiscal”, o que denotaria tratar-se de processo judicial, levando a crer que a “autoridade competente” somente poderia ser aquela que preside tal tipo de processo.

3.2.6 LEI N.° 8.021/1990

Diante deste entendimento do STJ, com a necessidade de processo judicial para o acesso do Fisco às informações bancárias dos contribuintes, sobreveio a Lei nº 8.021/90, a qual derivou da Medida Provisória n.° 165, de 15 de março de 1990, que afastou expressamente as disposições do art. 38 da Lei nº 4.595/64, alterando as condições anteriores, trazendo literalmente em seu art. 8º, abaixo transcrito, que autoridade fiscal poderia solicitar às instituições financeiras informações sobre operações realizadas pelo contribuinte.

Art. 8° Iniciado o procedimento fiscal, a autoridade fiscal poderá solicitar informações sobre operações realizadas pelo contribuinte em instituições financeiras, inclusive extratos de contas bancárias, não se aplicando, nesta hipótese, o disposto no art. 38 da Lei n° 4.595, de 31 de dezembro de 1964.

10

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Tributário. Sigilo bancário. Quebra com base em procedimento

administrativo fiscal. Impossibilidade. Recurso especial n.° 37.5665RS. Diário da Justiça [da] República

(33)

31 Parágrafo único. As informações, que obedecerão às normas regulamentares expedidas pelo Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, deverão ser prestadas no prazo máximo de dez dias úteis contados da data da solicitação, aplicando-se, no caso de descumprimento desse prazo, a penalidade prevista no § 1° do art. 7°.

A promulgação da Lei nº 8.021/90, prevendo de forma expressa a possibilidade de a autoridade fiscal solicitar de informações às instituições financeiras de dados dos contribuintes, fez surgir questionamentos acerca de sua aplicação.

A primeira delas de caráter formal constitucional, uma vez que o art. 192 da Constituição Federal exigia que as diretrizes do Sistema Financeiro Nacional fossem disciplinadas através de lei complementar (dispositivo que atualmente conta com nova redação dada pela Emenda Constitucional nº 40, de 29 de junho de 03, não mais subsistindo essa exigência) a segunda dizia respeito ao vício formal cometido pelo legislador em decorrência impossibilidade de uma lei ordinária, como é a Lei 8.021/90, derrogar uma Lei que foi recepcionada pela ordem constitucional de 1988 como Lei Complementar, como é o caso da Lei 4.595/64. Além disso, a própria aplicabilidade da norma gera questionamentos, uma vez que o parágrafo único de seu art. 8º previa a expedição e a obediência de normas regulamentares a cargo do Ministro da Economia, Fazenda e Planejamento, que nunca foram regulamentadas.

Em sentido contrário, grande parte da doutrina afirmava que nos casos de leis que foram aprovadas originalmente como leis ordinárias e posteriormente ganharam status de leis complementares, por terem sido recepcionadas pela CF/88 como tal, as partes dessas leis que não tratam de matéria reservada à lei complementar continuam a vigorar como leis ordinárias, podendo ser alteradas ou revogadas por outra lei ordinária. Portanto, os parágrafos 5.° e 6.° do artigo 38 da Lei n.° 4.595/1964 podem ser alterados ou derrogados por lei ordinária, como o foram pelo artigo 8.° da Lei n.° 8.021/1990, posto não tratarem do Sistema Financeiro Nacional, mas sim de meros procedimentos fiscais.

(34)

32 A Lei Complementar n.° 70, de 30 de dezembro de 1991, instituiu a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS). Entretanto, em seu artigo 12, previu algumas disposições acerca do dever de informação das instituições financeiras à Administração Tributária Federal, mais especificamente sobre as informações cadastrais dos clientes destas instituições. Tal dispositivo tem a seguinte redação:

Art. 12. Sem prejuízo do disposto na legislação em vigor, as instituições financeiras, as sociedades corretoras e distribuidoras de títulos e valores mobiliários, as sociedades de investimento e as de arrendamento mercantil, os agentes do Sistema Financeiro da Habitação, as bolsas de valores, de mercadorias, de futuros e instituições assemelhadas e seus associados, e as empresas administradoras de cartões de crédito fornecerão à Receita Federal, nos termos estabelecidos pelo Ministro da Economia, Fazenda e Planejamento, informações cadastrais sobre os usuários dos respectivos serviços, relativas ao nome, à filiação, ao endereço e ao número de inscrição do cliente no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Geral de Contribuintes (CGC).

§ 1° As informações recebidas nos termos deste artigo aplica-se o disposto no § 7° do art. 38 da Lei n° 4.595, de 31 de dezembro de 196

§ 2° As informações de que trata o caput deste artigo serão prestadas a partir das relações de usuários constantes dos registros relativos ao ano-calendário de 1992.

§ 3° A não-observância do disposto neste artigo sujeitará o infrator, independentemente de outras penalidades administrativas à multa equivalente a trinta e cinco unidades de valor referidas no art. 5° desta lei complementar, por usuário omitido.

(35)

33 Para alguns, o sigilo bancário inclui toda informação obtida através da relação entre a instituição financeira e o cliente, abrangendo, portanto, os dados cadastrais e a informação sobre a abertura ou a existência da conta. Já para outros, as informações cadastrais são meros dados pessoais que identificam o sujeito em suas relações sociais e comerciais, não sendo, portanto, parte do escopo do sigilo bancário.

Tendo em vista sua posição de lei complementar, a fiscalização tributaria trazida por este dispositivo se rege sem as limitações estabelecidas na Lei 4.595/1964, não sendo as informações cadastrais submetidas ao sigilo bancário por não serem exclusivas da relação entre a instituição financeira e o cliente, embora sua revelação pelo Fisco possa provocar penalidade, o que indica que estão albergadas pelo sigilo fiscal.

Tércio Sampaio Ferraz Júnior11 esclarece que esse tipo de dado, embora privativo do sujeito, é condição de sua identificação para efeito dos intercâmbios sociais que ocorrem inclusive na vida privada. E completa explicando que não há dúvidas de que a Administração Fazendária, no exercício da fiscalização intermitente, pode exigir esse tipo de dado, uma vez que o artigo 12 da lei sob comento refere-se à fiscalização continuada. Ou seja, o que se pretende é alcançar, pelo cruzamento de cadastros de nomes, endereços, filiação e número do CPF ou CGC, pistas que conduzam a eventuais fraudes, como o uso de documento fiscal falso, ou de terceiros, etc. O interesse da fiscalização não está, aí, na identificação das relações de convivência próprias da vida privada, mas na identificação de um documento oficial e o respectivo portador. Não se quer atingir o uso do serviço bancário, mas a identidade tributária do usuário.

Nesse mesmo sentido, destacamos o voto do Ministro Sepúlveda Pertence, do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da medida cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade número 1.790-5/DF, onde afirmou que a Constituição Federal de 1988 autoriza a existência de bancos de dados pessoais em poder de instituições governamentais ou de caráter público (art. 5º, LXXII), conforme parte da ementa abaixo:

3 - A convivência entre a proteção da privacidade e os chamados arquivos de consumo mantidos pelo próprio fornecedor de credito ou integrados em bancos de dados, tornou-se um imperativo da economia da sociedade de massas: de viabilizá-la cuidou o CDC,

11

FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites a função

fiscalizadora do Estado. Disponível em:

(36)

34 segundo o molde das legislações mais avançadas: ao sistema instituído pelo Código de Defesa do Consumidor para prevenir ou reprimir abusos dos arquivos de consumo, hão de submeter-se as informações sobre os protestos lavrados, uma vez obtidas na forma prevista no edito impugnado e integradas aos bancos de dados das entidades credenciadas a certidão diária de que se cuida: é o bastante a tornar duvidosa a densidade jurídica do apelo da argüição à garantia da privacidade, que há de harmonizar-se à existência de bancos de dados pessoais, cuja realidade a própria

Constituição reconhece (art. 5°, LXXII, in fine) e entre os quais os

arquivos de consumo são um dado inextirpável da economia fundada nas relações massificadas de crédito.12 (grifo nosso)

3.2.8 LEI N.° 9.311/1996

A Lei n.° 9.311, de 24 de outubro de 1996, instituiu a, hoje extinta, Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira – CPMF. Em seu artigo 11 encontrava-se prevista a prestação de informações pelas instituições financeiras à Administração Tributária Federal, para fins de fiscalização do recolhimento do referido tributo, conforme redação abaixo:

Art. 11 Compete à Secretaria da Receita Federal a administração da contribuição, incluídas as atividades de tributação, fiscalização e arrecadação.

§ 1º No exercício das atribuições de que trata esse artigo, a Secretaria da Receita Federal poderá requisitar ou proceder ao exame de documentos, livros e registros, bem como estabelecer obrigações acessórias.

12

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tributário. Protesto cambial. M.Prov. 1638 1/98. Suspensão Cautelar Indeferida. Ação Direta de Inconstitucionalidade n.° 1790-5/DF. Diário da Justiça. República

(37)

35 § 2º As instituições responsáveis pela retenção e pelo recolhimento da contribuição prestarão à Secretaria da Receita Federal as informações necessárias à identificação dos contribuintes e os valores globais das respectivas operações, nos termos, nas condições e nos prazos que vierem a ser estabelecidos pelo Ministro de Estado da Fazenda.

§ 3º A Secretaria da Receita Federal resguardará, na forma da legislação aplicável à matéria, o sigilo das informações prestadas, vedada sua utilização para constituição do crédito tributário relativo a outras contribuições ou impostos.

§ 4º Na falta de informações ou insuficiência de dados necessários à apuração da contribuição, esta será determinada com base em elementos de que dispuser a fiscalização.

Vale ressaltar que a prestação de tais informações era imprescindível a própria criação do tributo, uma vez que a fiscalização tributária ficaria sem os meios necessários à verificação do seu correto recolhimento pelas instituições financeiras.

A princípio, os doutrinadores não foram contra os referidos dispositivos, tendo em vista o fato de que a lei exigiu apenas os montantes globais e não as operações individualizadas e, principalmente, em razão da vedação da utilização das informações para o lançamento de outros tributos.

Entretanto, com a alteração da redação do §3º de seu artigo 11, abaixo, pela Lei n.° 10.174, de 9 de janeiro de 2001, gerou fortes reações contrárias por parte da doutrina:

(38)

36 A controvérsia reside na possibilidade de utilização, pela administração tributária Federal, das informações prestadas para instauração de procedimento administrativo com o objetivo de realizar o lançamento de possível crédito tributário existente, relativo a outros impostos e contribuições. Desta forma, foram ajuizadas perante o Supremo Tribunal Federal Ações Diretas de Inconstitucionalidade com a finalidade de impugnar o dispositivo, entretanto tais ações não chegaram a ser julgadas em razão da promulgação da Lei Complementar 105/2001.

4 A LEI COMPLEMENTAR 105/2001 E O SIGILO BANCÁRIO NO CENÁRIO ATUAL

Em meio a uma verdadeira guerra jurídica a respeito da “quebra” do sigilo bancário pela Administração Tributária, nasceram os projetos de Lei nº 7 e 219/1995 de autoria dos Senadores Lúcio Alcântara e José Eduardo Dutra, que deram origem à Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001, que revogou a Lei n° 4.595, de 31 de dezembro de 1964, veiculando a nova regulamentação da matéria e representando uma ampla revisão da disciplina do sigilo financeiro, tendo em vista a defasagem do art. 38 da Lei anteriormente em vigor.

Por estabelecer a regra geral em matéria de sigilo financeiro, a Lei Complementar n.° 105/2001, merece estar no centro das atenções no que se refere à discussão acerca da possibilidade do acesso direto do Fisco às informações bancárias dos contribuintes, assunto que trataremos neste Capítulo.

4.1ANÁLISE DOS PRINCIPAIS DISPOSITIVOS DA LEI COMPLEMENTAR 105/2001

Conforme mencionado acima, como parte do conjunto de medidas do governo para facilitar a fiscalização tributária, foi publicada a Lei Complementar n° 105, de 10 de janeiro de 2001, tratando sobre sigilo bancário de acordo com as disposições abaixo:

Art. 1o As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.

(39)

37 Lei

Complementar:

I – os bancos de qualquer espécie;

II – distribuidoras de valores mobiliários;

III – corretoras de câmbio e de valores mobiliários; IV – sociedades de crédito, financiamento e investimentos; V – sociedades de crédito imobiliário;

VI – administradoras de cartões de crédito; VII – sociedades de arrendamento mercantil;

VIII – administradoras de mercado de balcão organizado; IX – cooperativas de crédito;

X – associações de poupança e empréstimo; XI – bolsas de valores e de mercadorias e futuros; XII – entidades de liquidação e compensação;

XIII – outras sociedades que, em razão da natureza de suas operações, assim venham a ser consideradas pelo Conselho Monetário Nacional.

§ 2o As empresas de fomento comercial ou factoring, para os efeitos desta Lei Complementar, obedecerão às normas aplicáveis às instituições financeiras previstas no § 1o.

§ 3o Não constitui violação do dever de sigilo: (...)

VI – a prestação de informações nos termos e condições estabelecidos nos artigos 2o, 3o, 4o, 5o, 6o, 7o e 9 desta Lei Complementar. (...)

Art. 5o O Poder Executivo disciplinará, inclusive quanto à periodicidade e aos limites de valor, os critérios segundo os quais as instituições financeiras informarão à administração tributária da União, as operações financeiras efetuadas pelos usuários de seus serviços. (...)

(40)

38 movimentados, vedada a inserção de qualquer elemento que permita identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados.

§ 3o Não se incluem entre as informações de que trata este artigo as operações financeiras efetuadas pelas administrações direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

§ 4o Recebidas as informações de que trata este artigo, se detectados indícios de falhas, incorreções ou omissões, ou de cometimento de ilícito fiscal, a autoridade interessada poderá requisitar as informações e os documentos de que necessitar, bem como realizar fiscalização ou auditoria para a adequada apuração dos fatos.

§ 5o As informações a que refere este artigo serão conservadas sob sigilo fiscal, na forma da legislação em vigor.

Art. 6o As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.

Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária. (...)

O caput do seu artigo 1.° introduz a regra geral do sigilo bancário, endereçada às instituições financeiras. O seu § 1.° define o que são instituições financeiras, para os efeitos da lei. Já o seu § 3.° disciplina as hipóteses legais de exceção ao sigilo.

Referências

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