O USO DO ANDON NA CONSTRUÇÃO CIVIL
1 Introdução
O Sistema Toyota de Produção (STP) mudou os paradigmas da administração da produção, trazendo à tona idéias simples e inovadoras baseadas em um objetivo comum: aumentar a eficiência da produção pela eliminação consistente e completa de desperdícios (OHNO, 1997).
Segundo Ohno (1997), o STP é sustentado por dois pilares: o Just-in-Time (JIT) e a Autonomação. Ghinato (2000) concorda com essa afirmação e busca representa-la de maneira simplificada por meio da Figura 1.
Figura 1 – Sistema Toyota de Produção (adaptado de GHINATO, 2000).
O STP ganhou notoriedade nos meios acadêmicos e industriais de todo o mundo, sobretudo em função da repercussão do JIT sobre os métodos de gerenciamento da produção. Apesar da inquestionável contribuição do JIT enquanto método de gestão da produção entende-se que interpretação do STP essencialmente como sendo JIT limita sua verdadeira abrangência e potencialidade (GHINATO, 1996).
Nesse sentido torna-se fundamental demonstrar que a autonomação ocupa uma
posição extremamente importante para o funcionamento do STP. Denominada por
Ohno (1997) como uma das bases do STP, a autonomação ou automação com um
toque humano, é essencial para o funcionamento do STP, pois mantém uma estreita
relação com o princípio fundamental da redução de custos por meio da eliminação
de perdas (GHINATO, 1996).
A autonomação busca eliminar a superprodução, além de evitar a produção de produtos defeituosos (OHNO, 1997). Para isso, procura-se dar autonomia aos trabalhadores no intento de assegurar um sistema de fluxo contínuo e sincronizado da produção. Ghinato (1996) salienta que a principal função da autonomação é a detecção de anormalidades e a subseqüente paralisação da linha de produção para a aplicação da imediata ação corretiva. As figuras 2 e 3 a seguir exemplificam o uso de andons no ambiente industrial.
Figura 2 – Andon em máquina industrial.
Figura 3 – Andon na linha de montagem.
Para Ohno (1997) a implementação da autonomação está a cargo dos gerentes e supervisores de cada área de produção. Neste sistema, os trabalhadores interrompem a produção caso apareça qualquer anormalidade e imediatamente o problema é compreendido pelo grupo tornando possível a melhoria contínua do processo (kaizen).
Ghinato (1995) afirma que “a prevenção da reincidência de deficiências (falhas) no processo, através da ação direta na causa fundamental, é a essência da função monitoramento para manutenção da qualidade”.
Quando questionados sobre quais são os aspectos organizacionais realmente importantes de uma fábrica enxuta, Womack et al. (1992) afirmam ser a transferência do máximo de tarefas e responsabilidade que agregam valor aos trabalhadores e a sistematização da detecção de defeitos, que rapidamente relaciona cada problema a sua causa.
Entende-se que a utilização do dispositivo Andon nos canteiros de obra vá ao encontro dos benefícios citados anteriormente. Entende-se também que os progressos alcançados por meio do uso desta ferramenta como as melhorias na comunicação em obra, prevenção de paradas na linha de produção com conseqüente alcance de fluxo contínuo, aumento da transparência no controle dos processos, além da promoção da autonomação possuam ligação com a Nova Filosofia de Produção (KOSKELA, 2000).
Dentre os benefícios citados no parágrafo anterior destaca-se o aumento da transparência. Segundo Bernardes (2001) existe a possibilidade de diminuir a ocorrência de erros na produção conferindo-se uma maior transparência aos processos produtivos, pois quando esse princípio é considerado a identificação dos problemas na execução dos serviços é facilitada.
Nesse sentido, Koskela (1992) afirma que tal identificação é viabilizada por meio da disposição de meios físicos, dispositivos e indicadores, que possam contribuir para melhorar a informação nos postos de trabalho.
Ademais, Novais e Jungles (2002) afirmam que a concessão de canais de
informação, discussão e participação aos operários podem torná-los comprometidos
com as melhorias, além de possibilitar melhores condições de gerenciamento.
2 Objetivo
O objetivo deste artigo é apresentar a experiência de uma construtora cearense na implantação e desenvolvimento da ferramenta Andon em suas obras. O trabalho busca promover a aplicação de inovações gerenciais ligadas à mentalidade enxuta de produção no ambiente da construção civil.
3 Metodologia 3.1 Estudo de caso
O estudo foi realizado em uma empresa de construção civil de médio porte de Fortaleza-CE. Destaca-se o envolvimento da construtora em programas de qualidade e inovação, sendo a mesma certificada pela ISO 9001 e participante do Programa Inovacon (Programa de Inovação da Indústria da Construção Civil no Estado do Ceará).
Diversos estudos (MAIA, 2000; BRASILEIRO NETTO et al., 2003; BARROS NETO et al. 2005, SOUZA et al, 2005) apresentam os trabalhos desenvolvidos no Inovacon-CE. Dentre esses estudos ressalta-se o trabalho desenvolvido por Barros Neto et al. (2005) onde são apresentados diversos exemplos da implantação dos princípios da mentalidade enxuta de produção no ambiente da construção civil.
O presente trabalho foi realizado por meio de um estudo de caso desenvolvido em um edifício de padrão médio-alto constituído de vinte e dois pavimentos tipo, além de dois subsolos, térreo, mezanino, spa panorâmico e cobertura.
Neste edifício foram instalados dispositivos de acionamento (interruptores triplos) em cada pavimento, além do quadro de controle no escritório da obra. A seguir será descrito a sistemática de funcionamento e acompanhamento do Andon desempenhada pela empresa.
3.2 Funcionamento do Andon
O funcionamento do dispositivo Andon adaptado ao canteiro de obras é simples.
Com a produção previamente protegida, ou seja, os materiais a serem utilizados no
local de execução, os projetos específicos disponibilizados, o serviço precedente
completamente finalizado e o pedido de argamassa já solicitado no dia anterior por
meio de kanbans (Figura 4) supõe-se que a equipe iniciará o serviço logo no
primeiro momento do expediente.
Figura 4 – Fichário com programação dos horários dos traços solicitados.
Deste modo, a equipe responsável pela execução do pacote de trabalho aciona a luz verde do Andon a partir do interruptor correspondente posicionado no local de execução (Figura 5) e inicia o serviço.
Figura 5 – Interruptor de acionamento do Andon.
No decorrer do dia, fatores diversos podem vir a ocasionar parada na produção. No entanto, quando a iminência da parada for percebida pela equipe, esta deve sinalizar o problema antes que a produção seja interrompida. Nesse sentido, quando a equipe percebe que poderá parar dentro de um período de aproximadamente trinta minutos, aciona a luz amarela.
Na sala técnica da obra encontra-se o quadro de controle do Andon (Figura 6) onde é possível visualizar a situação em que se encontra cada pavimento da edificação, isto é, identifica-se por meio de lâmpadas se o andar está em processo de produção (luz verde), se está sob a iminência da parada (luz amarela) ou se está parado (luz vermelha).
Figura 6 – Quadro de controle do Andon.
A partir do momento que o operário aciona a luz amarela em seu andar de trabalho a lâmpada correspondente começa a piscar no quadro de controle do Andon. Nesse momento a equipe técnica da obra fica ciente que há alguma necessidade surgindo para aquela equipe de produção e caso esta não seja resolvida dentro de um período de trinta minutos poderá acarretar parada na produção.
Dessa forma, o encarregado administrativo e de suprimentos (EAS) da obra solicita
via rádio que o operador de guincho de passageiros vá até o local de execução e
verifique junto à equipe qual é o problema. Dependendo do motivo de alerta o
próprio operador de guincho providencia a solução (em caso de possibilidade de
falta de argamassa, por exemplo, ele comunica a situação junto ao betoneiro para que o mesmo possa abastecer rapidamente a equipe).
Caso a iminência de parada tenha surgido em função de algo fora da alçada do operador de guincho, o mesmo informa o EAS que procura o profissional responsável e solicita que resolva o quanto antes. Em caso de dúvidas de projeto, por exemplo, o EAS aciona via rádio o supervisor de produção para que o mesmo possa esclarecer as dúvidas de imediato e com isso evitar a parada na linha de produção.
Se o problema não for resolvido a tempo, a produção acaba parando, o que também deve ser sinalizado. Para isso, a equipe aciona a luz vermelha do Andon, que além de ficar acesa no quadro de controle posicionado na sala técnica da obra, também emite sinal sonoro. Nesse momento, o EAS solicita novamente ao operador de guincho de passageiros que verifique o problema junto à equipe de maneira que possa providenciar a solução em caráter emergencial.
Tendo em vista as atribuições gerais do EAS, que vão desde cotações de materiais até pagamentos, bem como setor pessoal, acredita-se que munido de um rádio para comunicação ele possa monitorar as ocorrências do Andon e tomar as devidas providências para resolução dos problemas sem sair do seu posto de trabalho.
Em outras palavras, o EAS administra o sistema trabalhando em sintonia com o operador de guincho de passageiros. Em casos extremos, no entanto, a fim de evitar ao máximo a parada na produção, ele deve se dirigir ao local onde se encontra o problema e tomar as medidas necessárias.
Acredita-se que a eficácia do sistema de controle de andon só é alcançada quando todos os envolvidos no processo (equipes de produção, operadores de guincho, EAS, supervisores de produção, além das empresas terceirizadas) compreendem suas funções e importância.
Nesse sentido, deve ser realizado inicialmente um treinamento com todos os
colaboradores da obra, incluindo aqueles que não lidarão diretamente com o
sistema, os quais poderão também desempenhar papel de multiplicadores. A partir
desta explanação todos devem buscar contribuir com o correto funcionamento do
Andon, pois este trará benefícios a todos, sejam as equipes, com o aumento de sua
produtividade como também a empresa através da garantia do fluxo contínuo da
produção.
3.2 Acompanhamento do Andon
O início da utilização do sistema Andon e Kanban pela construtora foi marcado pela promoção de algumas mudanças. A princípio contratou-se uma estagiária, estudante do curso técnico em edificações do Centro Federal de Educação Tecnológica do Ceará (CEFET/CE). Esta iniciou suas atividades na construção de um prédio residencial de múltiplos pavimentos, recebendo a função de supervisão de fluxos em obra.
Assim, o acompanhamento da operação do sistema Andon e Kanban ficou sob sua responsabilidade, bem como a apresentação de relatórios de resultados à gerência de obras e diretoria da empresa. Para isso foi elaborado um formulário em meio físico contendo quantidade e causas das paradas ocorridas, o qual era alimentado diariamente e catalogado nos arquivos da obra. Esses registros eram analisados bimestralmente e os resultados finais apresentados na forma de relatório (Figura 7).
Figura 7 – Análise de paradas na produção
.
As análises possibilitaram a percepção dos fatores que ocasionam alertas e paradas na produção, sendo focados os motivos de paradas por meio da prática dos cinco por quês. Estas análises muitas vezes remetem a pontos comuns, as quais recebem uma única denominação (ex.: treinamento) que representa o motivo verdadeiro pelo qual a produção parou.
A partir da identificação dos motivos de cada problema elabora-se um gráfico no
qual se visualiza a incidência, em termos percentuais, de todos os itens
identificados. A figura apresentada a seguir (Figura 8) exemplifica tal afirmação.
PARADAS NA PRODUÇÃO EM JUNHO - 2005
51%
15%
30%
4%
TREINAMENTO
CAPACIDADE DO SISTEMA PLANEJAMENTO
ATRASO NA ENTREGA DE MATERIAIS
Figura 8 – Análise de paradas na produção.